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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00123/24.0BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/21/2025
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA/MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES E INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL;
SUBSCRITORA DA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES;
ARTIGO 2º, N.º 2 DA LEI N.º 60/2005, DE 29 DE DEZEMBRO;
ARTIGO 22º, Nº 1 DO ESTATUTO DA APOSENTAÇÃO;
INÍCIO DE FUNÇÕES;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento aos recursos.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
«AA» propôs ação administrativa contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES e o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., todos melhor identificados nos autos, pedindo:
“a) O reconhecimento do direito da Autora à manutenção da inscrição e do vínculo na Caixa Geral de Aposentações e da qualidade de subscritora da CGA com efeitos à data em que o requereu, isto é, setembro de 2023;
b) A condenação dos Réus à prática dos atos materiais conducentes à reposição da situação legalmente devida, nomeadamente à manutenção/reinscrição da Autora na CGA integrando-a no regime de proteção social convergente, bem como à transferência das contribuições entregues à Segurança Social para a Caixa Geral de Aposentações;
c) A notificação dos Réus para procederem à junção de todo o procedimento administrativo da Autora do qual devem constar, nos termos do disposto no artigo 84.º, n.º 1 do CITA, todos os documentos com relevância para a decisão dos presentes autos;
d) A condenação dos Réus no pagamento de custas e demais encargos com o processo”.
Por saneador-sentença proferido pelo TAF de Coimbra foi decidido assim: Julga-se a presente ação totalmente procedente e, em consequência:
a) Reconhece-se o direito da Autora à reinscrição na Caixa Geral de Aposentações e à qualidade de subscritora, com efeitos reportados a setembro de 2023;
b) Condena-se os Réus à prática dos atos materiais conducentes à reposição da situação legalmente devida, nomeadamente à reinscrição da Autora na CGA, integrando-a no regime de proteção social convergente e à transferência das contribuições entregues à Segurança Social para a Caixa Geral de Aposentações.
Deste vêm interpostos recursos pela CGA e pelo ISS, I.P..
Alegando, aquela formulou as seguintes conclusões:
A - Para que possa “reativar” a sua inscrição no Regime Previdencial gerido pela CGA não é suficiente ter existido um vínculo à função pública, que conferiu esse direito, antes de 31 de dezembro de 2005. É necessário existir uma continuidade temporal entre vínculos com a administração pública!

B - É isto que resulta da maioria da jurisprudência dos Tribunais superiores Nacionais! Veja-se, por exemplo, o Acórdão 889/13, de 2014-03-06, oriundo do Supremo Tribunal Administrativo, ao qual muitos outros foram buscar, parte, da sua fundamentação para condenar a CGA a proceder à reinscrição de ex-subscritores em situação semelhante à da aqui recorrida, esquecendo-se, todavia da tão importante necessidade de continuidade temporal entre vínculos públicos.

C - Da leitura do referido Acórdão resulta claro que o critério a seguir não poderá ser unicamente o de saber se se trata de uma situação em que já tinha existido exercício em funções públicas, com inscrição, antes de janeiro de 2006 ou, se se trata de uma situação em que o funcionário ou agente público nunca havia sido detentor da qualidade de subscritor da CGA.

D - Deverá, igualmente, ter-se em conta se se encontra verificado o critério da continuidade temporal.

E - É o que resulta a contrario do referido Acórdão, o qual não deixa margem para dúvidas ao afirmar que não cai no âmbito do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, em conjugação com o disposto no artigo 22.º n.º1 do Estatuto da Aposentação, a situação de um professor que rescinde o contrato administrativo de provimento que o liga a uma instituição de ensino e celebra com outra instituição um novo contrato com efeitos a partir do dia seguinte - ou seja, em termos formais há descontinuidade do vínculo jurídico mas não há descontinuidade temporal.

F - Donde, resulta que a situação da Autora/Recorrida cai dentro do âmbito daquela disposição legal uma vez que, no seu caso, não só existe uma descontinuidade do vínculo jurídico em termos formais pela estabelecimento de um novo vínculo contratual com o agrupamento de escolas para onde foi lecionar em outubro de 2012, como uma descontinuidade temporal, dado o tempo decorrido entre os vínculos públicos - cessou um vínculo contratual em 1989/90 e voltou a estabelecer novo vínculo para lecionar em outubro de 2012.

G - Refira-se que a Autora/recorrida iniciou funções docentes em 1987 o que lhe permitiu a inscrição na CGA tendo permanecido inscrita até ao ano letivo de 1989/90 e, que entre 1996 e outubro de 2012 não exerceu cargos na Administração Pública, tal como decorre da matéria de facto assente.

H - Quando a Autora/Recorrida celebrou contrato, em outubro de 2012, com a administração pública, já estava em vigor a Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, razão pela qual foi inscrita no Regime Geral da Segurança Social.

I - E bem! Uma vez que desde que interrompeu o vínculo que lhe permitia a inscrição na CGA - ano letivo de 1989/90 - até estabelecer um novo vínculo com a função pública - para lecionar a partir de outubro de 2012, existiu um hiato temporal, uma descontinuidade temporal entre os vínculos contratuais, de mais de 20 anos.

J - E, como em 2012, já se encontrava em vigor a Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, o Agrupamento de Escolas para onde a Autora foi lecionar, cumprindo rigorosamente, a Legislação em vigor, promoveu a sua inscrição no Regime Geral da Segurança Social!

K - Ou seja, por força do hiato temporal verificado entre a cessação do vínculo contratual que lhe permitia a inscrição na CGA e o estabelecimento de novo vínculo contratual para lecionar em outubro de 2012, a Autora/Recorrida perdeu a qualidade de subscritora da CGA, motivo pelo qual, em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, foi, corretamente, inscrita no regime geral de segurança social, descontando para aquele regime previdencial desde então.

L - A tudo isto acresce que a sentença de que se recorre, ao reconhecer o Direito da Autora/recorrida com efeitos retroativos à data requerida pela Autora - setembro de 2023 - viola o disposto no artigo 38.º, n.º 2 do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos, pondo em causa o principio da certeza e segurança jurídicas.

M - Com o devido respeito, o Tribunal “a quo” não andou bem ao julgar a ação totalmente procedente e condenando os réus à manutenção da inscrição da Autora na CGA com efeitos a setembro de 2023.

N - Não apreciou bem a situação da Autora nem aplicou corretamente a Lei, devendo a sentença ora recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente e absolva os réus de todos os pedidos.

Termos em que, e nos mais de direito, deverá a douta sentença, de que se recorre, ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente, com as necessárias consequências.
O ISS, I.P., em alegações, concluiu:
1.ª
Por força do disposto no artigo 2.° da Lei n.° 60/2005, de 29 de dezembro, a partir de 01/01/2006 a CGA deixou de proceder à inscrição de subscritores, sendo obrigatoriamente inscrito no regime geral da segurança social todo o pessoal que iniciou funções a partir dessa data e ao qual fosse aplicável o regime d3 proteção social da função pública.

2.ª
A Meritíssima Sr.' juiz a quo entende que o referido artigo 2.° da Lei n.° 60/2005 só se aplica às situações de primeira inscrição na CGA, ou seja ab initio e não às situações de inscrição pré-existentes à entrada em vigor da Lei n.° 60/2005, de 29 de dezembro, tendo concluído que um funcionário público que, à data da entrada em vigor da Lei n.° 60/2005, se encontrasse inscrito no regime de proteção social convergente, perde o direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações se cessar o seu vínculo à Administração Pública, assistindo-lhe todavia tal direito se voltar a exercer funções públicas.

3.ª
Ora, entendemos que a conclusão da Sr.ª juiz a quo, padece de erro notório na apreciação da prova, pois devemos seguir o princípio geral da "primazia da realidade", pois que é apenas na realidade do caso concreto que podemos concluir se determinada pessoa deve ou não ser reinscrita na CGA.

4.ª
De facto, podem ocorrer situações muito diversas, que deverão ser tratadas de forma diferente, nomeadamente a situação de um funcionário/agente público, inscrito na CGA antes de Janeiro de 2006, que rescinde o seu contrato de trabalho em funções públicas e inicia antes ou depois da entrada em vigor da Lei n.° 60/2005 um novo contrato para exercício de atividade privada que não lhe dá direito a inscrição na CGA mas sim no Regime Geral da Proteção Social, e que depois celebra novamente, já na vigência da Lei n.° 60/2005, de 29 de dezembro, novo contrato em funções públicas, ou a situação de um funcionário/agente público que interrompe o exercício das funções que lhe conferiram direito à inscrição na CGA para desenvolver, durante algum tempo, uma atividade profissional por conta própria e, passado algum tempo, até mesmo largos anos, tem a oportunidade de voltar a exercer funções públicas mediante um novo contrato em funções públicas, ou mesmo, a situação em que um funcionário/agente público que após interromper o vinculo com a função pública fica sem ocupação durante algum tempo celebrando, posteriormente, outro contrato para exercer funções públicas.

5.ª
Para que se possa "reativar a inscrição na CGA não é suficiente ter existido um vinculo à função pública (que conferiu esse direito, antes de 31 de dezembro de 2005), mas é necessário existir uma continuidade temporal entre vínculos com a administração pública.

6.ª
Como se pode concluir à contrário do ponto III sumário do acórdão citado pela Meritíssima Juiz a quo, de 6 de março de 2014, proferido no processo n° 889113, há quebra do estatuto de subscritor sempre que existe descontinuidade temporal de vínculos laborais públicos.

7.ª
Em tais situações, é forçoso concluir que há lugar a inscrição na Segurança Social e não na CGA.

8.ª
Na situação da Recorrida não existe continuidade de vínculo laboral público e por essa razão, entende-se que não se verificam os pressupostos que o STA considerou necessários para a manutenção do direito à inscrição na CGA.

9.ª
A situação da Recorrida cai dentro do âmbito de aplicação do artigo 2.° da Lei n.° 60/2005, de 29 de dezembro, uma vez que, no seu caso, existe uma clara descontinuidade 'do vínculo jurídico laboral não só em termos formais, mas temporal, pois esteve 13 anos consecutivos sem exercer funções publicas de docência, tendo sido Trabalhadora Independente e trabalhadora por conta de outrem no setor privado.

10.ª
Nessa altura, e bem, foi inscrita no Regime Geral da Segurança Social, sendo que mensalmente lhe foram sendo processados todos os vencimentos e deduzidos os descontos legais obrigatórios - IRS, Segurança Social e ADSE.

11.ª
Acresce ainda que, como é do conhecimento público, a matéria de reinscrições na CGA encontram-se a ser objeto de avaliação pelo Governo, tendo em conta as suas implicações no regime geral de Segurança Social e no regime de proteção social convergente, tendo sido aprovada em Conselho do Ministros a adoção de uma medida interpretativa relativamente a este tema, conforme ponto 4 do Comunicado do Conselho de Ministros de 11 de julho de 2024, publicado na página institucional do Governo) a qual foi devolvida pelo Presidente da República ao Governo sem promulgação "...solicitando que seja convertido em proposta de lei ou proposta de lei de autorização legislativa, assim permitindo conferir legitimidade política acrescida a tema que dividiu o topo da jurisdição administrativa e merece solução incontroversa.", conforme consta publicado na página institucional da Presidência da República, tendo em 05/09/2024 sido aprovada em Conselho do Ministros "...uma Proposta de Lei que, em linha com decisão do Supremo Tribunal Administrativo, clarifica a interpretação da Lei n.° 60/2005, de 29 de dezembro, no que respeita a convergência do regime de proteção da função pública (Caixa Geral de Aposentações) com o regime geral da Segurança Social, garantindo o direito de reinscrição aos trabalhadores que tenham continuidade temporal no exercício de funções públicas." (cfr. ponto 5 do Comunicado do Conselho de Ministros de 5 de setembro de 2004, publicado na página institucional do Governo).

12.ª
Foi o recorrente condenado a praticar os atos materiais conducentes à reposição da situação legalmente devida, nomeadamente à transferência das contribuições entregues à Segurança Social, para a CGA com efeitos reportados a setembro de 2023.

13.ª
O direito à reinscrição da Autora na CGA, I.P., a ser reconhecido, deve sê-lo apenas a partir do trânsito da decisão que considere procedente esta ação, pois como consta das Fl. 19 do Processo Instrutor, o Recorrente pagou à Recorrida subsídio de doença em janeiro de 2024, correspondentes a 23 dias de doença no valor de E 804,40.

14.ª
Foi com base nas receitas de contribuições e quotizações oriundas das entidades empregadoras e da própria recorrida, que o Instituto de Segurança Social, I.P. obteve o financiamento necessário para lhe processar, por exemplo, subsídio de doença.

15.ª
A transição da carreira da Autora desde setembro de 2023 para a CGA, fará com que este instituto público acarrete com o prejuízo de ter custeado o subsídio de doença pago à Recorrida, vendo-se despojado das respetivas contribuições sociais.

16.ª

Ora, quer no âmbito do anterior Regime de Proteção Social da Função Pública (RPSFP), quer no âmbito do Regime de Proteção Social Convergente (RPSC), a proteção social dos trabalhadores nas eventualidades imediatas continua a ser da responsabilidade do empregador público.

17.ª
Assim, caso o Venerando tribunal entenda que deverão ser transferidas as contribuições sociais da Autora, do ISS, I.P. para a CGA, I.P, desde setembro de 2023 até ao trânsito desta ação deverá o Ministério da Educação vir restituir ao ISS os montantes pagos por este a título de subsídio de doença, sob pena de se verificar uma situação de enriquecimento ilícito.

18.ª
Foi assim violado o artigo 2.° da Lei n.° 60/2005, de 29 de dezembro

Termos em que, com o suprimento, deve a sentença ser revogada e a acção julgada improcedente, com as legais consequências, só assim se fazendo

JUSTIÇA
A Autora juntou contra-alegações, sem conclusões, finalizando assim:
Da leitura conjugada do disposto no nºs.1 e 2 do artigo da Lei nº. 60/2005 com o disposto no nº 2 do artigo 22º do EA, só haverá cancelamento da inscrição caso o subscritor cesse, de forma definitiva o exercício do seu cargo.

Pelo exposto e nos demais de direito, deve ser considerado o recurso improcedente, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!
O Senhor Procurador Geral Adjunto notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1- A Autora é titular de licenciatura em Engenharia Mecânica, ramo de Termodinâmica e fluidos- cfr. registo biográfico elaborado pelos serviços do Ministério da Educação, junto como documento nº 1 da petição inicial;
2- Em 01.10.1987, antes de concluir a licenciatura, a Autora iniciou funções docentes como professora contratada, na Escola Preparatória de ...- cfr. registo biográfico elaborado pelos serviços do Ministério da Educação, junto como documento nº 1 da petição inicial;
3- Na mesma data foi inscrita na Caixa Geral de Aposentações com o número de subscritora ...99- cfr. documento n.° 2 junto à petição inicial;
4- Entre 01.12.1996 e 31.12.2000, a Autora foi trabalhadora independente e pagou as suas contribuições à Segurança Social- cfr. pág. 4, do processo administrativo instrutor, a fls. 67 a 102 do Sitaf;
5- Entre 01.12.2002 e 26.10.2005, a Autora foi trabalhadora por conta de outrem na sociedade “[SCom01...], S.A.”- cfr. pág. 4 do processo administrativo instrutor, a fls. 67 a 102 do Sitaf;
6- Nos anos letivos de 2005/2006; 2006/2007; 2007/2008; 2008/2009; 2009/2010; 2010/2011, a Autora foi formadora da DRAE; JADRC, E.P. ... e INEDS- cfr. registo biográfico elaborado pelos serviços do Ministério da Educação, junto como doc. n° 1 da petição inicial;
7- No período compreendido entre 01.02.2007 e 11.11.2009, e entre 01.10.2010 e 31.12.2010, a Autora foi trabalhadora independente e pagou as suas contribuições à Segurança Social- cfr. págs. 4 e 3 do processo administrativo instrutor a fls. 67 a 102 do Sitaf;
8- A Autora cumulou a prestação de serviços de formação com o exercício de funções por conta de outrem, nos seguintes períodos de tempo e sociedades:
- de 01.10.2007 a 30.11.2007, na “[SCom02...], Unipessoal, Lda.”;
- de 01.12.2007 a 30.11.2009, na “[SCom03...], Lda”;
- de 22.04.2010 a 16.12.2012, na “[SCom04...], Lda.”
- cfr. págs. 3 e 4 do processo administrativo instrutor a fls. 67 a 102 do Sitaf;
9- Em 01.10.2012, na sequência da celebração de contrato de trabalho em funções públicas, a Autora começou a dar aulas na Escola Secundária ...- cfr. registo biográfico elaborado pelos serviços do Ministério da Educação, junto como doc. nº 1 da petição inicial;
10- A partir de outubro de 2012 foi enquadrada no regime de proteção social dos “Trabalhadores que exercem funções públicas” e passaram a ser deduzidas à remuneração da Autora, contribuições para o Regime Geral da Segurança Social- cfr. pág 5 do processo administrativo instrutor a fls. 67 a 102 do Sitaf;
11- A partir de outubro de 2012 não foram entregues, sobre a remuneração paga à Autora, quaisquer quotas para a aposentação ou contribuições à Caixa Geral de Aposentações- por acordo;
12- Em 28.07.2023, a Ré CGA, emitiu o ofício circular n.º 1/2023, com o assunto “Direito de reinscrição na CGA”, do qual se extrai:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cfr. doc. n.º 3 junto à petição inicial;
13- Através de requerimento datado de 28.09.2023, a Autora pediu ao Diretor da Escola Secundária ... que fosse efetuada a sua reinscrição no regime previdencial da CGA- cfr. doc. n.º 4 junto à petição inicial;
14- Em 06.11.2023, através de mensagem de correio eletrónico, a Secretária da Escola Secundária de ... solicitou à Segurança Social a mudança da taxa de contribuição da Autora, para 4,9%, uma vez que a partir do mês de novembro descontava para a CGA- cfr. doc. n.º 5 junto à petição inicial;
15- No vencimento do mês de novembro de 2023, da A., o R. Ministério da Educação não procedeu a qualquer desconto para a Ré CGA- cfr. doc. n.º 6 junto à petição inicial;
16- Em data não concretamente apurada, o Instituto de Gestão Financeira da Educação I.P., fez constar da sua página eletrónica informação sobre reinscrições na CGA de ex-subscritores, com o seguinte teor:
“(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
-cfr. doc. n.º 7 junto à petição inicial;
17- A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 07.03.2024- cfr. fls 1 do Sitaf.
DE DIREITO
É objecto de recurso o saneador-sentença que julgou procedente a ação.
É entendimento pacífico na doutrina e jurisprudência, com consagração nos artigos 635.º, n.º(s) 4 e 5, 639.º, n.º(s) 1 e 2 e artigos 1.º, 140.º, n.º 3 e 146.º, n.º 4 do CPTA que o objeto do recurso se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, pelo respetivo recorrente, o que se traduz no impedimento do tribunal ad quem de conhecer de matéria que aí não tiver sido invocada, exceto as situações de conhecimento oficioso, seja de mérito ou de natureza adjetiva.
Dado que os recursos se cruzam, serão analisados em conjunto.
Assim, vejamos,
Na óptica dos Recorrentes a Autora não tem direito à manutenção da sua inscrição na Caixa Geral de Aposentações pela descontinuidade temporal verificada nos seus vínculos de emprego público a termo que, no seu entender, em cada contrato, representam o início de funções públicas para efeito do disposto no artigo 2º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro.
Invocam, em síntese, que não basta ter estado inscrito na CGA antes de 31 de dezembro de 2005, mas que é necessária a existência de continuidade temporal com a Administração Pública.


Não vemos que tenham razão.
A decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra atendeu, e bem, a pretensão da Autora.
Não se verifica qualquer dos vícios apontados à sentença, muito menos, a errada interpretação das disposições normativas invocadas pelos Réus/Recorrentes.
Como é sabido, a Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro estabelece os mecanismos de convergência do regime de proteção social da função pública com o regime geral da segurança social, no que respeita às condições de aposentação e cálculo das pensões.
Prevê este diploma, quanto à inscrição de subscritores na Caixa Geral de Aposentações que:
1 - A Caixa Geral de Aposentações deixa, a partir de 1 de janeiro de 2006, de proceder à inscrição de subscritores.
2 - O pessoal que inicie funções a partir de 1 de janeiro de 2006 ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de protecção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito, é obrigatoriamente inscrito no regime geral da segurança social.
Este dispositivo normativo impõe, portanto, um limite na inscrição de novos subscritores, a partir de 1 de janeiro de 2006, vedando o acesso ao regime social convergente de trabalhadores ou agentes que exerçam funções públicas e se inscrevam após esta data, e, consequentemente, a obrigatoriedade da inscrição destes trabalhadores no regime geral da segurança social.
Neste sentido, a Caixa Geral de Aposentações está impedida de inscrever trabalhadores que, pela primeira vez, estejam a exercer funções públicas após o limite temporal estabelecido por aquela norma. Ou seja, o que o legislador pretendeu foi não aumentar o número de inscrições através do cancelamento da entrada de novos subscritores e, nessa medida, caminhar para a convergência ao mesmo tempo que se limita o crescimento da despesa pública nesta área.
Aliás, na exposição de motivos constante da Proposta de Lei nº 38/X pode ler-se, entre o mais, que “A concretização da convergência não deve, porém, fazer-se nem à custa do sacrifício das expectativas daqueles que, no quadro do regime actualmente em vigor, já reúnem condições para se aposentarem. Nem de rupturas fracturantes, optando-se antes por um modelo de transição gradual que aplica aos funcionários, agentes da Administração Pública e demais servidores do Estado o regime de pensões do Estatuto da Aposentação, o regime de segurança social ou ambos simultaneamente.”
Assim, a jurisprudência tem sido unânime em considerar que a norma do n.º 2 do artº 2º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, apenas proíbe a inscrição de novos subscritores que, efetivamente, iniciem ex novo funções públicas, independentemente, de terem ocorrido ou não hiatos temporais entre contratos celebrados com o Ministério da Educação para o exercício de funções docentes.
A interpretação seguida é a de que a norma em causa visa impedir a entrada de novos subscritores no sistema e não eliminar os subscritores que permanecem no mesmo.
O Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, de 06/03/2014, no Proc. n.º 0889/13, sumaria que:
“I - Considerando a letra do art. 2º da Lei nº 60/2005, de 29 de Dezembro, que se refere apenas ao pessoal que “inicie funções” e a sua razão de ser (proibir a entrada de novos subscritores), afigura-se claro poder retirar-se que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a Caixa Geral de Aposentações estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública.”
Na sua fundamentação, e quando em abstrato, este Acórdão se dedica a discorrer acerca do sentido e do alcance da norma, conclui: “assim sendo, considerando a letra do preceito e a sua razão de ser, afigura-se claro poder retirar-se do preceito que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a CGA estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública”.
A referência que este Acórdão faz em relação à (des)continuidade temporal entre vínculos de emprego público surge, apenas, no contexto de aplicação dessa norma ao caso concreto e tendo em conta a sua factualidade própria. Veja que o julgador refere: “para além do mais, considerando que, no caso, não tendo havido sequer hiato temporal nem sequer descontinuidade na prestação do trabalho, a prevalecer a interpretação sufragada no Acórdão recorrido a mesma conduziria a um resultado desproporcionado e a ruturas fraturantes não desejadas pelo legislador, atenta a razão de ser das normas em causa”.
Efetivamente, à situação profissional da Autora não é de aplicar o disposto no artº 2º, n.º 2 da Lei n.º 60/2005, uma vez que o início das suas funções docentes ocorreu em data anterior a 1 de janeiro de 2006.
A descontinuidade temporal verificada nos seus vínculos de emprego público a termo não pode ser imputada à Autora.
Como é do conhecimento público, fruto do regime de recrutamento e contratação de docentes que vigorou nos últimos anos, no período em questão milhares de docentes, tal como a Autora, foram sempre opositores ao concurso nacional, mas não obtiveram colocação anual (com início a 1 de setembro e término a 31 de agosto de cada um daqueles anos letivos).
As interrupções entre alguns desses contratos não impediram que a Autora voltasse a exercer funções e às quais correspondia o direito de manter a sua inscrição no regime social convergente.
O Supremo Tribunal Administrativo assim julgou nos Acórdãos proferidos em 09/06/2022, no Proc. n.º 099/21.6BEBRGe e em 22/09/2022, nos Procs. n.ºs 877/21.6BEBRG e 1974/20.0BEBRG, ao não admitir os recursos interpostos pela CGA e pelo Ministério da Educação em processos de docentes que tiveram hiatos temporais entre contratos, tendo confirmado as decisões judicias que reconheceram o direito daqueles docentes em manter o direito de inscrição na CGA, com efeitos retroativos.
Idêntica interpretação tem sido feita por este Tribunal Central Administrativo do Norte, sempre que tem sido chamado a interpretar o sentido e o alcance do artigo 2º da Lei nº 60/2005, de 29 de dezembro e aplicar esta norma a situações de facto idênticas à da Autora.
Com efeito, os nºs 1 e 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, de 29 de dezembro, preconizam a inadmissibilidade de novas inscrições na Caixa Geral de Aposentações, e, bem assim, a obrigatoriedade de inscrição no regime geral de segurança social de todo o pessoal que “inicie funções” a partir 1 de janeiro de 2006, ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de proteção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito.
Na determinação do que se deve entender relativamente à previsão “iniciem funções” contida nos nºs 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, dever-se-á atender ao teor da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, espraiada, entre muitos outros, no aresto de 06/03/2014, no âmbito do processo nº. 0889/13, que, quanto a esta temática, considerou que o disposto no nºs.1 e 2 do artigo da Lei nº. 60/2005 visa apenas abranger o pessoal que inicie absolutamente funções.
Como aí se sinalizou, por razões atinentes a uma interpretação harmoniosa com a letra e a teleologia intrínseca do artº 2º da Lei nº 60/2005, a eliminação da subscrição do trabalhador em funções públicas decorrente da cessação do exercício do seu cargo prevista no nº. 1 do artigo 22º do EA só ocorrerá se este não for investido noutro cargo a que antes de 01.01.2006 correspondesse direito de inscrição.
Os Acórdãos proferidos por este Tribunal Central Administrativo Norte, em 2022/01/28, no Processo nº 01100/20.6BEBRG, e em 2022/04/08, no Processo nº 00307/19.3VBEBRG concretizam que: “Verificando-se que antes de 01/01/06, a Autora estava inscrita na CGA e que posteriormente a essa data foi investida, através da celebração de sucessivos contratos com o Ministério da Educação, em cargo a que antes de 01.01.2006 correspondia o direito de inscrição na CGA, a mesma tem o direito à sua reinscrição, de acordo com o disposto no artigo 2º da Lei nº 60/2005.”.
Sistematicamente também assim temos decidido.
Em suma,
Considerar, tal como os Réus/Recorrentes o fazem, que a Autora está a iniciar funções nos termos desta disposição legal apresenta-se uma interpretação que não cabe na letra do artigo 2º, n.º 2, da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro;
A Autora não estava pela primeira vez a exercer funções públicas na data em que foi erradamente inscrita no regime geral da segurança social;
O artigo 22º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 09 de dezembro prevê as situações em que se verifica a “eliminação do subscritor”, com o respetivo cancelamento da inscrição:
“1. Será eliminado o subscritor que, a título definitivo, cesse o exercício do seu cargo, salvo se for investido noutro a que corresponda igualmente direito de inscrição.
2. O antigo subscritor será de novo inscrito se for readmitido em quaisquer funções públicas previstas nos artigos 1.º e 2.º e satisfizer o disposto no artigo 4.º.”;
Determina-se neste preceito que assiste ao ex subscritor o direito de ser de novo inscrito, caso pretenda voltar a ingressar em funções públicas, resultando que, o cancelamento da inscrição do subscritor ocorre caso exista cessação definitiva do exercício do cargo, assistindo-lhe, porém, o direito de ser de novo inscrito, se voltar a ingressar no exercício de funções públicas;
In casu, não se pode dizer que a Autora/Recorrida por ter celebrado, na Administração Pública e em anos sucessivos contratos com o mesmo empregador - o Ministério da Educação -, estivesse a iniciar funções nos termos e para os efeitos do artigo 2º, n.º 2 da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro;
Tal norma visa a proibição de entrada de novos subscritores e não a eliminação daqueles que já integravam a CGA;
Neste sentido é irrelevante a existência de interrupções temporais entre contratos, quer se trate de uma interrupção de dias ou anos do exercício de funções públicas docentes. O limite subjacente na norma prende-se unicamente com a entrada de novos subscritores para o regime social convergente, no sentido de que sejam aqueles que, primeira vez, exercem funções às quais corresponda o direito de inscrição;
Deste modo, pese embora a interrupção temporal entre os seus vínculos de emprego público, resulta da factualidade provada que a Autora iniciou a sua prestação de trabalho como trabalhadora em funções púbicas em momento anterior ao dia 1 de janeiro de 2006, às quais correspondia o direito de inscrição na CGA, antes da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005, de 29 de janeiro;
Como bem refere a sentença recorrida, resulta do probatório que a Autora/Recorrida iniciou funções docentes como professora contratada na Escola Preparatória de ..., em 01.10.1997 (cfr. ponto 2), e foi inscrita na Caixa Geral de Aposentações com o número de subscritora ...99 (cfr. ponto 3);
Não é, pois, admissível à luz do mais elementar sentido de justiça que seja prejudicada no direito à sua reinscrição como beneficiário da Caixa Geral de Aposentações;
Bem andou, pois, a decisão recorrida, que condenou as Entidades Demandadas nos pedidos, em conformidade, repete-se, com a posição da jurisprudência que defende que a proibição constante do nº 2 do artº 2º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, se aplica a novos subscritores que iniciem ex novo funções públicas, a partir de 1 de janeiro de 2006;
Nessa medida, a Autora não é ex subscritora da CGA, ao abrigo do disposto no artº 22º do Estatuto de Aposentação.
Improcedem as Conclusões das alegações.

DECISÃO
Termos em que se nega provimento aos recursos.
Custas pelos Recorrentes.
Notifique e DN.

Porto, 21/02/2025

Fernanda Brandão
Isabel Jovita
Paulo Ferreira de Magalhães