Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03430/19.0BEPRT-S1
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/14/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CITAÇÃO DO ESTADO-CEJUR- ART.º 25.º, N.º4 DO CPTA
Sumário:1-A previsão do artigo 25.º, n.º4 do CPTA, na sua atual redação, determina a citação da pessoa coletiva Estado, quando o mesmo seja demandado no âmbito dos processos nos Tribunais Administrativos, através do Centro de Competências Jurídicas do Estado, serviço central da administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa, que se integra na Presidência do Conselho de Ministros e está sujeito ao poder de direção do Primeiro-Ministro ou do membro do Governo em quem aquele o delegar.

2-A representação do Estado pelo Ministério Público nos Tribunais Administrativos é fruto de uma opção legal, não resultando da Constituição que a sua representação orgânica, para defesa dos seus interesses patrimoniais, que são os que estão em causa nas ações sobre contratos e relativas à responsabilidade, esteja constitucionalmente acometida ao MINISTÉRIO PÚBLICO.
(Sumário elaborado pela relatora – art.º 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Condenação à Prática Acto Devido (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - RELATÓRIO.

1.1.SINDICATO INDEPENDENTE DE PROFESSORES E EDUCADORES, com sede na Rua (…), em representação dos direitos e interesses legalmente protegidos dos seus associados moveu a presente ação de condenação à prática de ato devido e de responsabilidade civil contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, com sede na Av. 24 de Julho, formulando os seguintes pedidos:
«a) Reconhecer que a aplicação da Portaria n.º 119/2018 de 4 de maio, nos moldes efetuados pelo Réu Ministério da Educação, conduz à violação, grave, do princípio da igualdade (por ultrapassagens ilegais, sem qualquer justificação ou fundamentação legalmente válida), relativamente a todos os docentes que tenham ingressado nos quadros do Ministério da Educação antes de 2011;
b) Ser o Réu Ministério da Educação condenado a repor a legalidade, posicionando os aqui docentes representados pelo Autor no escalão devido e correspondente índice remuneratório, desde 01/01/2018, atendendo aos anos de serviço que dispõe, com todas as devidas e legais consequências que daí advêm;
c)Ser o Réu Ministério da Educação condenado a repor a legalidade, efetuando o pagamento aos docentes aqui representados pelo Autor da totalidade do vencimento legalmente previsto para cada indicie remuneratório, sem qualquer corte salarial;
d)Subsidiariamente, o Réu Estado ser condenado a indemnizar pelos danos causados aos
aqui associados do Autor com tal violação.

1.2. A citação do Réu Estado Português para contestar efetuou-se por carta registada, datada de 09/01/20202, dirigida unicamente ao Centro de Competências Jurídicas do Estado.

1.3. Por requerimento apresentado em 15/01/2020, o Ministério Público requereu a recusa de aplicação, na presente ação, das normas constantes do segmento final do n.º 1 do artigo 11.º e do n.º 4 do artigo 25.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), com a redação da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, por inconstitucionalidade material emergente da violação do parâmetro constante do n.º 1, primeira proposição, e 2 do artigo 219.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) conjugados com os artigos 3.º, n.º 3 e 204.º da CRP e artigo 1.º, n.º 2, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF);
Mais pediu a declaração de nulidade por falta de citação do Réu – Estado Português (por força do disposto nos artigos 188.º, n.º 1, alínea a), e 187.º, alínea a), do Código de Processo Civil (CPC), subsidiariamente aplicáveis ex vi artigo 1.º do CPTA) e, a anulação do processado posterior à petição, requerendo a citação do Réu/Estado Português no Ministério Público para os subsequentes termos da ação, concretamente para, desde já, querendo, apresentar a sua contestação.

1.4. Com data de 18/05/2021, o TAF do Porto proferiu despacho que desatendeu a invocada inconstitucionalidade material das normas constantes do segmento final do nº 1 do artigo 11º e do nº 4 do artigo 25º do CPTA, na redação da Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, lendo-se nesse despacho « que, nem a nova redação do n.º 1 do artigo 11.º, nem tão pouco o novo n.º 4 do artigo 25.º do CPTA, padecem da alegada inconstitucionalidade material, pois que tanto o n.º 1 do artigo 11.º continua a possibilitar a representação do Estado pelo Ministério, tal como o n.º 4 do artigo 25.º não a põe em causa, apenas prescreve que a citação deve ser feita por intermédio do Centro de Competências Jurídicas do Estado, e logo, tais normas devem ser aplicadas ao presente caso».

1.5 Inconformado com despacho assim proferido, o Ministério Público interpôs o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes Conclusões:
«1 – A presente ação de responsabilidade civil foi intentada por Sindicato Independente de Professores e Educadores contra o Estado Português, tendo, nos termos do disposto no artigo 25º, nº 4 do Código de Português sido dirigida unicamente para o
Centro de Competências Jurídicas do Estado, e o Ministério Público não foi citado, nem sequer notificado da pendência da mesma, designadamente, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 85º, nº 1 do CPTA;
2 – A Lei nº 118/2019, de 17 de Setembro, que entrou em vigor no passado dia 16.11.2019, introduziu no CPTA nova norma acima referida, que estabelece que quando seja demandado o Estado já não é citado o Ministério Público, em representação deste, como até agora sempre esteve consagrado, mas sim o Centro de Competências Jurídicas do Estado, designado por JurisAPP, que é um serviço central da administração direta do Estado, integrado na Presidência do Conselho de Ministros;
3 – Sob a sua aparência puramente procedimental e regulamentar — o que bastaria para a considerar deslocada num diploma sobre processo administrativo —, trata-se de uma norma revolucionária, sobretudo quando conjugada com o disposto na parte final do nº 1 do artigo 11º do CPTA, na redação igualmente conferida pela mesma Lei nº 118/2019;
4 – Com efeito, onde na anterior redação desta norma se previa ¯(…) sem prejuízo da representação do Estado Pelo Ministério Público passou, com a referida alteração, a prever-se ¯(…) sem prejuízo da possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público, o que transformou numa exceção o que era uma regra, pois o possível tanto é o que pode ser como o que pode não ser vez alguma, sendo que não se vislumbra qualquer possibilidade de o Ministério Público ser eliminado, ao menos potencialmente, da representação do Estado no domínio do contencioso administrativo sem que daí resulte uma flagrante ofensa da primeira proposição do nº 1 do artigo 219º da CRP;
5 – Pelo que, esse conjunto normativo esvazia o essencial da função do Ministério Público nos tribunais administrativos, enquanto representante do Estado-Administração, mostrando-se desconforme ao parâmetro normativo consagrado na primeira proposição do nº 1 do artigo 219º da CRP;
6 – A norma do artigo 219º, nº 1 da CRP configura um imperativo constitucional, a observar pelo legislador ordinário, que contém a regra da atribuição de competência ao Ministério Público para representar o Estado;
7 – Em 1 de Janeiro de 2020 entrou em vigor o novo Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei nº 68/2019, de 27 de Agosto — i.e, menos de um mês antes da publicação da Lei nº 118/2019, de 17 de Setembro, que contém as normas cuja inconstitucionalidade se invoca, que continuou a confiar a representação do Estado ao Ministério Público (artigo 4º, nº 1, al. b)) e a prever a existência de ¯um departamento central de contencioso do Estado e interesses coletivos e difusos da Procuradoria-Geral da República‖, o qual passará a intervir também em matéria tributária e não apenas na cível e administrativa (artigo 61º, nº 1 e 2);
8 – A Lei nº 114/2019, de 12 de Setembro, que procedeu à 12ª alteração no ETAF/2002, — i.e., menos de uma semana antes da edição da Lei nº 118/2019, a que pertencem as normas aqui questionadas —, não introduziu qualquer alteração ao disposto no artigo 51º;
9 – A representação do Estado em juízo foi sempre confiada, a nível constitucional e da lei ordinária, ao Ministério Público (com a única exceção da hipótese residual contemplada na parte final do nº 1 do artigo 24º do vigente CPC), estando essa representação, nas áreas cível, administrativa e até tributária, inequivocamente prevista em diplomas recentíssimos e de uma evidente centralidade na conformação dos nossos sistemas jurídico e judiciário;
10 – A norma do nº 1 do artigo 219º da CRP, que confia ao Ministério Público a representação judiciária do Estado-Administração (central), possui natureza auto-exequível, incondicionada, sem necessidade de densificação pela legislação ordinária, configurando-se como uma intencional e estrutural opção constitucional, em consonância com a tradição jurídica do país;
11 – Tanto o legislador constituinte originário como o derivado ponderaram os atributos do Ministério Público como magistratura dotada de ¯autonomia (artigo 219º, nº 2 da CRP), com a sua atuação sempre vinculada a ¯critérios de legalidade e objetividade (artigo 3º, nº 2 do EMP) e, em razão desses atributos, confiaram-lhe a tarefa representativa do Estado em juízo, justamente a título de representação e não como advogado, patrono ou mandatário judicial; sendo a representação do Estado nos tribunais por parte do Ministério Público é configurável como um verdadeiro princípio judiciário constitucional, com alcance material;
12 – Porém, em flagrante contradição sistémica e teleológica, a parte final do nº 1 do artigo 11º do CPTA, na redação conferida pelo artigo 6º da Lei nº 118/2019, vem reduzir a representação do Estado por parte do Ministério Público a uma pura eventualidade;
13 – A nova redação limita-se a acrescentar o substantivo possibilidade, mas desse modo transforma a regra da representação do Estado pelo Ministério Público em exceção, pois o possível tanto é o que pode ser como o que pode não ser vez alguma, não sendo inócuo que o conjunto de alterações legislativas no âmbito da jurisdição administrativa que ocorreram em 2019, de que faz parte aquele preceito, não tenha introduzido, paralelamente, o referido substantivo no artigo 51º do ETAF.
14 – Do confronto da fórmula usada no CPTA (parte final do nº 1 do artigo 11º ¯sem prejuízo da possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público‖) com a acolhida no CPC (artigo 24º, nº 1: ¯O Estado é representado pelo Ministério Público, sem prejuízo dos casos em que a lei especialmente permita o patrocínio por mandatário judicial próprio…), resulta segura a conclusão de que, no âmbito do primeiro diploma, a representação do Estado por parte do Ministério Público tem caráter eventual e subsidiário, ao passo que no segundo constitui a regra, só passível de afastamento por lei concreta;
15 – A nova redação do artigo 11º, nº 1, in fine, do CPTA torna meramente eventual e subsidiária a intervenção do Ministério Público como representante do Estado no processo administrativo, pelo que, mesmo numa apreciação isolada, dificilmente a norma se compatibilizaria com o princípio judiciário constitucional da representação do Estado nos tribunais através do Ministério Público, imposta pelo primeiro segmento do nº 1 do artigo 219º da CRP;
16 – A desarmonia dessa norma com a Lex Fundamentalis torna-se ainda mais clara quando se proceda à sua interpretação conjugadamente com a do nº 4 do artigo 25º, também aditado pela referida Lei nº 118/20, que estabelece que quando seja demandado o Estado a citação é dirigida unicamente ao Centro de Competências Jurídicas do Estado;
17 – No que se reporta ao Estado, a norma destrói a mais elementar lógica de constituição da instância processual administrativa, visto que, por um lado, o réu Estado-Administração é unicamente citado numa entidade que não possui poderes legais para a sua representação em juízo e, por outro, não é citado através do órgão que possui tais poderes, por força de disposição constitucional (e também legal);
18 – Por outro lado, nos termos do artigo 223º, nº 1 do CPC, subsidiariamente aplicável ao contencioso administrativo, a citação das pessoas coletivas — como é o caso indiscutível do Estado-Administração — realiza-se na pessoa dos seus legais representantes;
19 – O único representante do Estado em juízo, pelo menos enquanto o Estado não manifestar a vontade de pretender ser patrocinado de outro modo (pressuposta, por necessidade de raciocínio, a validade dessa declaração), é o seu representante natural, o Ministério Público, em quem deve ser realizada a citação;
20 – O mecanismo implementado pelo nº 4 do artigo 25º, conjugado com a parte final do nº 1 do artigo 11º do CPTA, ambos na redação da Lei nº 118/2019, conduz em linha reta, de forma necessária, a uma presença subsidiária e minimalista do Ministério Público como representante do Estado no processo administrativo;
21 – Acresce que a norma do nº 4 do art.º 25º CPTA, na redação da Lei nº 118/2019, vem atribuir ao Centro de Competências Jurídicas do Estado a competência para coordenar os termos da (…) intervenção em juízo dos serviços a quem aquele entenda transmitir a citação, que, no caso dos autos (tal como noutros), não a transmitiu ao Ministério Público, estando sob sua decisão escolher quem vai representar o Estado;
22 – Só um construtivismo artificial e pré-ordenado pode sustentar a legitimidade constitucional da opção do legislador ordinário, creditando-a na faculdade de a Assembleia da República definir a competência do Ministério Público (cfr. artigo 165º, nº 1, al. p) da CRP), pois é verdade elementar que a lei formal também deve obediência ao princípio da constitucionalidade;
23 – Apesar da sua falta de clareza e desarmonia com a arquitetura do sistema processual, resulta do preceito que o dito Centro pode, se e quando lhe aprouver, confiar a representação judiciária do Estado ao Ministério Público — tratado como mero serviço administrativo — e coordenar os termos da respetiva intervenção em juízo;
24 – Ou seja, o dito Centro passará a decidir, caso a caso, e ao contrário do referido na decisão recorrida, se o Ministério Público representa ou não o Estado, sem que haja qualquer indicação dos critérios que conformam tal decisão, sendo que o teor da norma constitucional constante do artigo 219º, nº 1 da CRP não permite a supressão do Ministério Público como representante do Estado (tal como sucedeu no caso concreto dos autos);
25 – Ao atribuir ao Centro de Competências Jurídicas do Estado, um serviço central da administração direta do Estado, a competência para proferir decisões que delimitam a intervenção do Ministério Público enquanto representante do Estado, a norma jurídica resultante das disposições conjugadas dos artigos 11º, nº 1 e 25°, n° 4 do CPTA configura, dessa forma, uma inconstitucionalidade material, também por violação ao artigo 165°, n° 1, al. p) da CRP;
26 – A norma em causa prevê que, em vez do Estado, seja citado o referido Centro que transmitirá aos serviços competentes, e, se assim o entender (e quando o entender), a transmitirá ao Ministério Público. No entanto, o Ministério Público não é um serviço do Estado-Administração, mas sim um órgão constitucional da administração da justiça, pelo que o conhecimento da ação – a citação - quando seja demandado o Estado representado pelo Ministério Público não pode deixar de ter lugar no âmbito do contexto jurisdicional;
27 – No que concerne aos termos da respetiva intervenção em juízo, e ao contrário do referido na decisão recorrida, a norma ínsita na parte final do novo nº 4 do artigo 25º do CPTA confere à JurisApp competência para coordenar os próprios termos da intervenção do Ministério Público quanto a aspetos relativos à técnica do processo;
28 – Desse modo, sai gravemente ofendido o princípio da autonomia (externa) do Ministério Público, consignado no nº 2 do artigo 219º da CRP, degradando-se esta magistratura à condição de mera serventuária subordinada da vontade da Administração;
29 – Em face do exposto, é forçoso concluir que as normas constantes do segmento final do nº 1 do artigo 11º e do nº 4 do artigo 25º do CPTA, na redação da Lei nº 118/2019, de 17.09, são materialmente inconstitucionais, por violação do disposto no artigo 219º da CRP, nº 1, primeira proposição (¯Ao Ministério Público compete representar o Estado) e nº 2 (¯O Ministério Público goza de (…) autonomia…), violando igualmente o conteúdo material dos princípios e normas constitucionais do artigo 165°, n° 1 da CRP, pelo que são materialmente inconstitucionais, nos termos do artigo 277°, n° 1, da CRP;
30 – E, em consequência, verifica-se a nulidade emergente da falta de citação do Estado, por omissão completa do ato (artigos 188, nº 1, al. a) e 187, al. a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 1º do CPTA), uma vez que o Ministério Público não foi citado.
Nestes termos, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, deve o douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que determine:
a) A recusa de aplicação, neste processo, das normas constantes do segmento final do nº 1 do artigo 11º e do nº 4 do artigo 25º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), na redação da Lei nº 118/2019, de 17.09, por inconstitucionalidade material emergente da violação do parâmetro constante da primeira proposição do nº 1 do artigo 219º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do nº 2 desta mesma disposição, bem como do conteúdo material dos princípios e normas constitucionais do artigo 165°, n° 1 da CRP;
b) E, em consequência, que:
- Seja declarada a nulidade da falta de citação do réu Estado (artigos 188, nº 1, al. a) e 187, al. a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 1º do CPTA), com a consequente anulação de todo o processado posterior à Petição Inicial, e
- Seja determinada a citação do Estado no Ministério Público

1.5. O Ministério da Educação contra-alegou, apresentando as seguintes Conclusões:
«1.ª Na presente ação administrativa– movida contra o Estado Português, entre outros - o Ministério Público foi notificado da citação por parte do Centro de Competências Jurídicas do Estado (JurisAPP), como determina o artigo 25.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos;

2.ª Está, portanto, em juízo depois de devidamente notificado e em representação do Estado Português;

3.ª Apesar disso mesmo, o Ministério Público veio, por um lado, arguir a nulidade por não ter sido diretamente citado, facto que seria, no seu entendimento, determinante da anulação do processado posterior à petição, por força dos artigos 187.º, alínea a) e 188.º, n.º1, alínea a), do Código de Processo Civil (CPC), e bem ainda, alegar a inconstitucionalidade material das normas ínsitas nos artigos 11.º, n.º 1, segmento final, e 25.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), na versão resultante da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, cuja desaplicação, com efeitos circunscritos ao caso concreto, requereu por alegada violação do parâmetro constante do artigo 219.º, n.º 1, primeira parte, e n.º 2, da Constituição;

4.ª Contudo, em termos substantivos, os argumentos que o Ministério Público elenca não logram demonstrar qualquer desconformidade dos artigos 11.º, n.º 1, e 25.º, n.º 4, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, com o parâmetro constante do artigo 219.º, n.º 1, da Constituição;

5.ª Desde logo, a norma do novo n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos está muito longe de implicar um completo esvaziamento das competências constitucionais reconhecidas ao Ministério Público para assegurar a representação do Estado em Tribunal;

6.ª Com efeito, a norma constante do artigo 219.º, n.º 1, da Constituição – nos termos da qual “Ao Ministério Público compete representar o Estado” – é uma norma-princípio e não uma norma-regra, ao contrário do que quer fazer crer o Ministério Público e como é o caso da maioria das normas constitucionais;

7.ª Ou seja, não se trata de uma norma de tudo-ou-nada, que não admite quaisquer exceções e que comina com invalidade qualquer solução que com ela seja incompatível;

8.ª Assim, ao contrário do que é pretendido pelo Ministério Público, o artigo 219.º, n.º 1, da Constituição, contém uma norma-princípio – o princípio da representação do Estado pelo Ministério Público – que deve ser harmonizada em concreto com outros bens e princípios constitucionalmente protegidos por parte do legislador ordinário;

9.ª De resto, a tese do Ministério Público incorre em manifesto erro na aplicação do direito por várias razões, a saber:
(i) É objeto de exceções legais relevantes na própria ordem constitucional portuguesa;
(ii) Não se esgota no campo do contencioso administrativo;
(iii) Revela disfunções complexas na representação dos interesses do Estado;
(iv) É problemática do ponto de vista da responsabilização política do Governo pelos seus atos; e
(v) Não tem, há muito, arrimo no direito comparado europeu.
10.ª Em primeiro lugar (i), o legislador foi, com o tempo e atentas as necessidades de defesa de interesses do Estado-administração protagonizados pelo Governo, criando exceções relevantes à representação do Estado por parte do Ministério Público;
11.ª A redação atual do artigo 219.º, n.º 1, da Constituição, que confere à lei ordinária a faculdade de definir os interesses que o Ministério Público pode ou deve defender no âmbito do Estado-administração, ou fora dele, encontra-se em maior consonância com a jurisprudência constitucional, mormente com o Parecer da Comissão Constitucional n.º 8/82 que, de uma forma lapidar, clarificou que o Ministério Público não monopoliza a representação em juízo do Estado-administração, podendo a lei conferir também essa representação a outros órgãos ou entidades;
12.ª E o facto é que sucessivos atos legislativos atribuíram a outras entidades a representação de interesses públicos inerentes ao Estado-administração:
(a) Nos termos do artigo 15.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário e do artigo 53.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, há muito que a Fazenda Pública tem os seus próprios representantes, cingindo-se a legitimidade do Ministério Público em processo tributário à “[…]defesa da legalidade, [na] promoção do interesse público e representação dos ausentes, incertos e incapazes” (artigo 14.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário);
(b) Desde as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos que, no seguimento do seu artigo 11.º, que o Estado, enquanto entidade pública, não está, como anteriormente, exclusivamente representado pelo Ministério Público nas ações de responsabilidade civil ou sobre contratos;
(c) O artigo 24.º do Código de Processo Civil também criou desvios à regra geral de representação do Estado pelo Ministério Público; e
(d) Por fim, em sede de representação do Estado em juízo perante tribunais arbitrais, entendeu a própria Procuradoria-Geral da República não ter o Ministério Público competências legais para tal efeito.

13.ª Daí que, como concluiu o Tribunal Central Administrativo – Norte no seu Acórdão de 3 de julho de 2020, no Proc. n.º 902/19.0BEPNF-S1, “é aceite, sem reservas, a conformidade constitucional com o inciso «ao Ministério Público compete representar o Estado» constante da primeira parte do n.º 1 do artigo 219.º da CRP, quanto às demais opções legais em que a representação do Estado, e a defesa dos interesses patrimoniais deste, não são feitas pelo Ministério Público, mas pelas entidades ou órgãos integrados na administração direta ou indireta do Estado (tenham ou não personalidade jurídica), quando nos termos da lei processual aplicável lhes é reconhecida personalidade e capacidade judiciária. O que significa que restam apenas em discussão as ações relativas a contratos e a responsabilidade civil extracontratual em que o Estado seja demandado nos Tribunais Administrativos. E não se vê em como possam estas considerar-se núcleo essencial das funções do Ministério Público referidas no n.º 1 do artigo 219.º da CRP”.
14.ª Em segundo lugar (ii), a concretização da norma constitucional em causa não se esgota no âmbito do contencioso administrativo – aliás, o seu texto não refere sequer o contencioso administrativo especificamente, mas faz apenas referência à representação do Estado em geral, devendo aferir-se o seu respeito ou a sua violação de uma perspetiva global;
15.ª Sendo assim, mesmo com a configuração que resulta da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, o Ministério Público continua a representar o Estado:
(i) Em contencioso administrativo, nos termos abaixo descritos;
(ii) Em processo civil, nos casos previstos no artigo 24.º do Código de Processo Civil; e
(iii) Em processo do trabalho, em exclusivo, nos termos do artigo 6.º do Código de Processo do Trabalho.

16.ª Em terceiro lugar (iii), o modelo português assente na regra geral da representação do Estado pelo Ministério Público evidencia disfunções complexas na representação dos interesses do Estado – disfunções essas que determinam que o princípio da representação do Estado pelo Ministério Público seja ponderado com os princípios da unidade de ação e da eficiência administrativas;
17.ª Como refere a doutrina, por vezes é difícil assumir num dado processo a dupla natureza de protagonista de “uma intervenção imparcial para a promoção da legalidade” e o “patrocínio judiciário público da Administração estadual;
18.ª Desde logo, porque estão em causa duas perspetivas bem diferentes: o Ministério Público, enquanto responsável pela defesa da legalidade democrática, desempenha funções estritamente objetivistas, mas enquanto exerce a função de representação do Estado, exerce funções essencialmente subjetivistas;
19ª. E, estando em causa a sustentação de um ato ou de uma norma administrativa oriunda de um membro do Governo, este e o Ministério Público podem legitimamente divergir sobre a questão da sua legalidade ou podem pretender convocar argumentos e estratégias processuais muito diversas no tocante à sustentação dessa legalidade;
20.ª Basta pensar em casos em relação aos quais os órgãos competentes do Estado detenham margem de livre decisão administrativa, exercendo um conjunto de valorações próprias da função administrativa, ou em situações em que o Ministério Público, como titular da ação pública, pondera demandar o próprio Estado – caso em que, por absurdo, teria de atuar, por um lado, como autor, e por outro como representante do réu;
21.ª Pelo que facilmente se vê que o interesse público tal como é perspetivado e defendido em cada caso pelo Estado – e cuja prossecução também tem proteção constitucional não só no princípio da separação de poderes, mas também como um dos princípios constitucionais da atividade administrativa no n.º 2 do artigo 266.º da Constituição – nem sempre coincide com uma perspetiva de estrita legalidade;
22.ª Ora, em geral, mas em especial nestes últimos casos, o Governo não pode, na defesa da licitude da sua atuação ficar, necessariamente, amarrado ou dependente da “dupla personalidade” do Ministério Público ou do seu argumentário;
23.ª Em quarto lugar (iv), e na sequência do ponto anterior, entender que o Ministério Público representa sempre e necessariamente o Estado no quadro de uma autonomia que impede as entidades constitucionalmente competentes de fazer valer o interesse público tal como é por si perspetivado significa uma potencial aniquilação do esquema constitucional de responsabilização política;
24.ª. Atente-se que o princípio da responsabilidade política do Governo, com assento nos artigos 190.º e 191.º da Constituição, carece de ser ponderado com o princípio da representação do Estado pelo Ministério Público;
25.ª Efetivamente, a autonomia de qualquer órgão de soberania – entre os quais se conta o Governo – não se pode esgotar na decisão de prática ou não adoção de um qualquer ato jurídico, devendo incluir também a sua defesa contenciosa, caso os mesmos sejam objeto de contestação judicial;
26.ª Sob pena de o Governo não mais poder ser responsabilizado pelo exercício das suas competências pela Assembleia da República, pelo Presidente da República e pelo povo se as opções estratégicas de defesa da posição do Estado forem necessariamente de um órgão a quem é constitucionalmente atribuída autonomia;
27.ª. Em quinto lugar (v), o próprio Parecer n.º 8/82 da Comissão Constitucional dá nota de que, em 1982, a representação do Estado pelo Ministério Publico em juízo ocorria, para além de Portugal, essencialmente em Estados da América Latina, como a Colômbia, a Venezuela e a Guatemala;
28.ª Daí que o modelo tradicional português seja uma exceção, que a doutrina e jurisprudência não configuram como “natural, própria, especifica ou típica” do Ministério Público e que pode inclusivamente ser tida como algo obsoleta, no universo comparado da representação do Estado em tribunal, tal como esta é garantida pelos restantes Estados europeus e até por Estados de expressão portuguesa como o Brasil, onde opera a nível federal a Advocacia Geral da União;
29.ª Por outro lado, a norma do novo n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é insuscetível de implicar um completo esvaziamento das competências constitucionais reconhecidas ao Ministério Público para assegurar a representação do Estado em Tribunal;
30.ª A escassa jurisprudência constitucional vertida no domínio da representação do Estado pelo Ministério Público tem uma aceção minimalista do núcleo dessas competências, o que é demonstrado pelo Parecer n.º 8/82 da Comissão Constitucional supra referido;
31.ª Impõe-se, assim, confrontar diretamente o teor do n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos com o n.º 1 do artigo 219.º da Constituição, na linha interpretativa esboçada pela justiça constitucional portuguesa;
32.ª Em primeiro lugar (i), e na generalidade, regista-se que o essencial da redação do preceito foi introduzido pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, cuja inconstitucionalidade não foi anteriormente contestada pelo Ministério Público: a Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, manteve intocada essa redação, tendo apenas acrescentado o termo “possibilidade”;
33.ª Em segundo lugar (ii), o aditamento do vocábulo “possibilidade” ao n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos pela sobredita Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, não mais fez do que positivar ou “fotografar” normativamente uma realidade não só jurídica mas também existencial, dando uma maior clareza aos termos e ao âmbito da representação do Estado em juízo pelo Ministério Público, como uma regra geral sujeita a exceções, ditadas pela conveniência dos órgãos soberanos do mesmo Estado;
34.ª Por outras palavras, a junção do termo “possibilidade” (“sem prejuízo da possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público”) pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, e que é agora sindicada pelo Ministério Público, nada mais fez do que concretizar no Código de Processo nos Tribunais Administrativos algo que já estava consagrado, pelo menos desde 2015;
35.ª Em terceiro lugar (iii), partindo da interpretação da jurisprudência constitucional sobre os termos da representação do Estado pelo Ministério Público – que exclui, assertivamente, um monopólio dessa representação e da qual a nova redação do n.º 1 do artigo 219.º se aproximou, reforçando o papel do legislador na definição dos interesses que a nível estadual ou extra-estadual o Ministério Público pode representar em juízo – conclui-se, que o sobredito n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos nem priva “totalmente” o Ministério Público das competências de representação do Estado, nem as comete “por inteiro” a outras entidades;
36.ª. Antes pelo contrário: declarando que nos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de mandatário, o preceito admite que o Estado-administração, possa “fazer-se patrocinar em todos os processos por advogado, solicitador ou licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico”;
37.ª Trata-se de uma faculdade e não de uma imposição (clarificada pelo uso da expressão “podendo”) e que será solucionada, a nível do Governo, caso a caso, em razão na natureza dos processos e das particularidades da defesa do interesse público, tal como esta é perspetivada pelos órgãos que o compõem;
38.ª A intervenção do Ministério Público não é, de modo algum, arredada como o demonstra a fórmula “sem prejuízo da possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público”;
39.ª Ora, em boa verdade, esse caráter pontualmente subsidiário da intervenção do Ministério Público é expressamente admitido pelo Parecer n.º 8/82 da Comissão Constitucional, que o admite na medida em que considera que o atual artigo 219.º da Constituição “não imporá […] que a representação do Estado por outras entidades tenha que ser, sempre, uma representação concorrencial ou subsidiária da do Ministério Público”;
40.ª Por outras palavras: sempre que o Governo não incumba outrem do seu patrocínio judiciário, aplica-se a regra de que é representado pelo Ministério Público;
41.ª Em quarto lugar, no que diz respeito às alterações introduzidas pelo novo Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, deve assinalar-se, em boa verdade, que as mesmas têm um alcance bastante menor do que é alegado no recurso;
42.ª Em boa verdade, a criação do referido departamento de contencioso do Estado e interesses coletivos e difusos como um dos departamentos centrais da Procuradoria-Geral da República determina a necessidade de inclusão de normas de competência interna;
43.ª Esta parte do Estatuto do Ministério Público consubstancia, portanto, e essencialmente, um diploma de organização interna do próprio Ministério Público – no fundo, como acontece com os demais órgãos e serviços com autonomia, trata-se de uma verdadeira lei orgânica do Ministério Público;
44.ª Por conseguinte, o n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos em nada ofende o disposto no n.º 1 do artigo 219.º da Constituição;
45.ª Em todo o caso, no presente processo o Estado Português é representado pelo Ministério Público, motivo pelo qual a parte do artigo 11.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos “que dispõe que o Estado não tem de ser representado pelo Ministério Público nos processos que corram nos tribunais administrativos” não foi efetivamente aplicada no caso concreto;
46.ª Desta forma, não competindo aos tribunais controlar, de forma incidental, interpretações meramente hipotéticas de normas jurídicas em sentidos que não sejam efetivamente aplicados em concreto ao abrigo do artigo 204.º da Constituição, a mesma é irrelevante para o presente caso;
47.ª A outro tempo, o artigo 25.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – ao determinar que o Centro de Competências Jurídicas do Estado seja citado quando seja demandado o Estado ou vários ministérios na mesma ação – é plenamente conforme com a Constituição;
48.ª Sendo que apenas a norma constante do último segmento do preceito deve, por natureza, ser considerada inaplicável ao Ministério Público – ainda que essa norma seja irrelevante no presente processo, porque não foi aplicada e consiste, assim, numa interpretação meramente hipotética, irrelevante para efeitos de fiscalização incidental da constitucionalidade ao abrigo do artigo 204.º da Constituição;
49.ª De outra parte, o Ministério Público considera inconstitucional, por violação do n.º 1 do artigo 219.º da Constituição, o segmento normativo do n.º 4 do artigo 25.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, na redação dada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, que determina que quando “seja demandado o Estado, ou na mesma ação sejam demandados diversos ministérios, a citação é dirigida unicamente ao Centro de Competências Jurídicas do Estado, que assegura a sua transmissão aos serviços competentes”;
50.ª Procurando precisar o sentido da norma sindicada, cumpre tecer as considerações que se seguem;
51.ª Em primeiro lugar (i), o segmento do preceito que se encontra em análise não atribui diretamente poderes funcionais ao Centro de Competências Jurídicas do Estado para assegurar a representação do Estado, como alega o Ministério Público, mas antes para operar como órgão responsável pela receção e encaminhamento de citações judiciais sempre que seja demandado o Estado ou mais de um ministério;
52.ª O que o preceito determina, no que respeita à receção de citações e canal de remessa de processos, é apenas a necessidade de os tribunais, em sede de contencioso administrativo e nos dois casos que nele se encontram previstos, dirigirem a citação, unicamente, ao Centro de Competências Jurídicas do Estado, que as encaminhará aos órgãos e entidades competentes para assumirem essa representação;
53.ª O referido Centro funcionará, apenas, como uma espécie de estrutura estadual de receção e encaminhamento de processos, em representação do Estado, função processual de natureza instrumental que lhe pode ser pacificamente atribuída por lei, como é o caso do n.º 4.º do artigo 25.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos;
54.ª Trata-se de uma escolha compreensível na medida em que, encontrando-se muito frequentemente nas referidas demandas envolvidos ministérios, resulta ser essencial que seja o Governo a ter uma perceção de conjunto da ratio dessas demandas e a definir uma estratégia processual para certas categorias de ações que de algum modo o envolvem;
55.ª De resto, constituindo a representação do Estado pelo Ministério Público um caso de representação legal, bem se compreende que assim seja;
56.ª Em segundo lugar (ii), conclui-se no sentido de que o facto de o Centro de Competências Jurídicas do Estado constituir o destinatário das citações relativas a processos do contencioso administrativo em que o mesmo Estado seja demandado em nada afetará a competência constitucional genérica do Ministério Público de representação do Estado em juízo;
57.ª Isto porque o regime procedimental de citação e encaminhamento processual deve ser, naturalmente, distinguido do poder funcional de representação do Estado, constante do n.º 1 do artigo 11.º;
58.ª.E não se vê, porém, de que forma a mera circunstância de a citação ser dirigida ao Centro de Competências Jurídicas do Estado de acordo com a alteração introduzida pela Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, possa afetar/esvaziar a possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público, muito menos ainda, viole o estatuído nos artigos 51º do ETAF, nos artigos 4º, nº1 e 9º, nº1 do EMP e ainda nos artigos 187º, 188º do CPC, sendo certo neste caso estamos perante atos normativos aprovados pela Assembleia da República que revestem igual valor hierárquico formal, sendo aquela Lei editada em momento temporal posterior ao início da vigência destes atos legislativos;
59.ª Em terceiro lugar (iii), o artigo 165.º, n.º 1, alínea b), da Constituição reserva a matéria da competência do Ministério Público para lei da Assembleia da República ou decreto-lei autorizado;
60.ª Ora, não se alcança – nem com a mais caridosa das interpretações – a que propósito consta o referido artigo fundamento da inconstitucionalidade do recurso em causa;
61.ª É que as alterações ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos em que se incluem as duas normas desaplicadas foram aprovadas por lei parlamentar – pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, como se referiu –, e não por qualquer outro tipo de ato jurídico-público;
62.ª Em quarto lugar (iii), e em conclusão do que se disse antes, de facto, “nunca seria de aplicar ao caso em análise o disposto nos artigos 187.º, alínea a), e 188.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, pois, como resulta do processado, in casu, não se verifica qualquer omissão do ato de citação”;
63.ª Pelo que se pode asseverar que a norma sindicada que consta do n.º 4 do artigo 25.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos não viola as competências do Ministério Público na representação do Estado em juízo, não havendo, assim, qualquer inconstitucionalidade por suposta violação do artigo 219.º da Constituição;
64.ª Ainda assim, deve proceder-se a uma interpretação em conformidade com a Constituição do referido preceito, nos termos da qual a “coordenação” da “intervenção em juízo” aí referida apenas se aplica, como é natural, aos serviços jurídicos dos diversos ministérios, com os quais o Centro se encontra articulado, nomeadamente através da Rede de Serviços Jurídicos da Administração Pública;
65.ª Em qualquer caso, no que a este segmento do artigo 25.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos concerne, a questão não é suscetível de ser aplicada no caso concreto – na medida em que o Centro de Competências Jurídicas do Estado não coordenou, de forma alguma, a atividade do Ministério Público, nem o Ministério Público alega que isso tenha ocorrido;
66.ª Desta forma, não competindo aos tribunais controlar, de forma incidental, interpretações meramente hipotéticas de normas jurídicas em sentidos que não sejam efetivamente aplicados em concreto ao abrigo do artigo 204.º da Constituição, a mesma é, também aqui, irrelevante para o presente caso;
67.ª Por último, e atenta a ampla jurisprudência administrativista já prolatada e firmada sobre as questões substantivas suscitadas, constituem raríssimas exceções os casos em que tem havido desaplicação dos artigos 11.º, n.º 1, e 25.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Nestes termos, deve o despacho recorrido ser mantido e o presente recurso jurisdicional julgado totalmente improcedente por:
a) As normas ínsitas nos artigos 11.º, n.º 1, e 25.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos não padecerem de qualquer desconformidade com o artigo 219º, nºs 1 e 2, da Constituição, devendo por isso ser aplicadas em concreto, e, por conseguinte,
b) Não se verificando qualquer omissão do ato de citação, nem erro na identificação do citando, as previsões dos artigos 187.º, alínea a), e 188.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, não podem ser aplicáveis;
c) Inexistir qualquer nulidade processual por o Ministério Público não ter sido diretamente citado, devendo por isso, também por esta razão, manter-se todo o processado posterior à petição inicial.»

1.6. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.2. Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem passam por saber se as normas constantes do segmento final do nº 1 do artigo 11º e do nº 4 do artigo 25º do CPTA, na redação conferida pela Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, deviam ter sido desaplicadas porque materialmente inconstitucionais, em termos que ao invés da citação ter sido dirigida ao CENTRO DE COMPETÊNCIAS JURÍDICAS DO ESTADO devia ter sido dirigida ao MINISTÉRIO PÚBLICO por ser este quem deve representar na ação o demandado ESTADO PORTUGUÊS.
III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO
3.1. Os factos relevantes para a decisão a proferir são os que constam do relatório.
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III.B.DE DIREITO
3.2. Vem o presente recurso jurisdicional interposto da decisão proferida pela 1.ª Instância que indeferiu o requerimento formulado pelo Ministério Público para que fosse considerada nula a citação do Réu Estado Português efetuada na pessoa do Centro de Competências Jurídicas do Estado ao invés de ter sido efetuada na pessoa do Ministério Público, declarado nulo todo o processado a partir da petição inicial e ordenada nova citação do Réu, agora na pessoa do Ministério Público, para contestar.
A sentença recorrida julgou improcedente a inconstitucionalidade material que o Ministério Público impetrou ao último segmento do n.º 1 do artigo 11.º do CPTA, segundo o qual, esse enunciado normativo quando lido em conjugação com o n.º 4 do artigo 25.º do CPTA, em ambos os casos, na versão resultante da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, traduz uma violação do disposto a primeira proposição do n.º 1 do artigo 219.º da CRP (“Ao Ministério Público compete representar o Estado”) e do n.º 2 do mesmo artigo (“O Ministério Público goza de (…) autonomia”).
3.3. Sobre a referida questão este TCAN já foi chamado a pronunciar-se em vários arestos, que se encontram publicados na base de dados da DGSI, nos quais foi negada razão à tese de inconstitucionalidade professada pelo Ministério Pública relativamente a esse segmento do artigo 11.º do CPTA, na última redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro.
In casu, a decisão sob escrutínio acolheu essa jurisprudência, que subscrevemos, pelo que, salvo o devido respeito, não merece censura, imperando ser confirmada.
Assim, considerando a total correspondência entre as questões cuja apreciação constitui o objeto de cognição no âmbito do presente recurso jurisdicional e as que foram debatidas e decididas em vários arestos deste TCAN Cfr. Acs. do TCAN, processos n.ºs 1031/19.2BEAVR-S1; 895/20.1BEPRT-S1; 1240/19.4BEPNF, 732/19.0BECBR-S1, entre outros;, e que a relatora, inclusivamente, subscreveu como segunda adjunta o acórdão de 22.01.2021, proferido no processo n.º 00714/19.1BECBR-S1, que por sua vez acolheu a jurisprudência veiculada no Acórdão deste TCAN, de 03.07.2020, proferido no processo nº. 00902/19.2BEPNF-S1, remetemos a decisão das questões que constituem o objeto deste recurso para a solução que lhes foi dada nesse aresto, que passamos a reproduzir:
«B – De direito
(…)
2. Da tese do recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO
O recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO pugna pela revogação do despacho recorrido e sua substituição por outro que determine a recusa de aplicação, neste processo, das normas constantes do segmento final do nº 1 do artigo 11º e do nº 4 do artigo 25º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), na redação da Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, por inconstitucionalidade material da violação do parâmetro constante da primeira proposição do nº 1 do artigo 219º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do nº 2 desta mesma disposição, bem como do conteúdo material dos princípios e normas constitucionais do artigo 165°, n° 1 da CRP; e que em consequência, seja declarada a nulidade da falta de citação do réu Estado (artigos 188, nº 1, al. a) e 187, al. a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 1º do CPTA), com a consequente anulação de todo o processado posterior à Petição Inicial, e seja determinada a citação do Estado no Ministério Público, renovando o essencial da argumentação que já havia expendido no seu requerimento de arguição de nulidade de falta de citação.
3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 A questão essencial que vem colocada em recurso é a de saber se as normas constantes do segmento final do nº 1 do artigo 11º e do nº 4 do artigo 25º do CPTA, na redação dada pela Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, deviam ter sido desaplicadas, por materialmente inconstitucionais, em termos que ao invés da citação ter sido dirigida ao CENTRO DE COMPETÊNCIAS JURÍDICAS DO ESTADO devia ter sido dirigida ao MINISTÉRIO PÚBLICO por ser este quem deve representar na ação o demandado ESTADO PORTUGUÊS, e se, assim, o Tribunal a quo devia ter deferido a arguição de nulidade da falta de citação do réu ESTADO PORTUGUÊS.
3.2 A questão surge na decorrência das alterações introduzidas ao CPTA pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro que a nova versão dada aos artigos 11º e 25º do CPTA operou no que toca à representação do ESTADO nos processos nos Tribunais Administrativos.
Sendo que, naturalmente, a aferição da eventual inconstitucionalidade daquelas normas por violação do artigo 219º nºs 1 e 2 da CRP, que foi suscitada na arguição da nulidade por falta de citação do réu ESTADO PORTUGUÊS, relevará apenas na medida em que se for de concluir pela invocada inconstitucionalidade das indicadas normas, a sua aplicação deve ser recusada (cfr. artigo 204º da CRP).
3.3 Atentemos, então, nas normas em causa.
3.4 Dispõe o seguinte o artigo 219º da CRP:
“Artigo 219º
Funções e Estatuto
1. Ao Ministério Público compete representar o Estado e defender os interesses que a Lei determinar, bem como, com observância do disposto no número seguinte e nos termos da Lei, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a ação penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática.
2. O Ministério Público goza de estatuto próprio e de autonomia, nos termos da Lei.3. (…)
3. (…)
4. (…).
”O artigo 11º do CPTA na sua versão original (a da Lei nº 15/2002, de 22 de fevereiro), dispunha o seguinte:
“Artigo 11º
Patrocínio judiciário e representação em juízo
1 - Nos processos da competência dos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de advogado.
2 - Sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público nos processos que tenham por objeto relações contratuais e de responsabilidade, as pessoas coletivas de direito público ou os ministérios podem ser representados em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico, expressamente designado para o efeito, cuja atuação no âmbito do processo fica vinculada à observância dos mesmos deveres deontológicos, designadamente de sigilo, que obrigam o mandatário da outra parte.
3 - Para o efeito do disposto no número anterior, e sem prejuízo do disposto nos dois números seguintes, o poder de designar o representante em juízo da pessoa coletiva de direito público ou, no caso do Estado, do ministério compete ao auditor jurídico ou ao responsável máximo pelos serviços jurídicos da pessoa coletiva ou do ministério.
4 - Nos processos em que esteja em causa a atuação ou omissão de uma entidade administrativa independente, ou outra que não se encontre integrada numa estrutura hierárquica, a designação do representante em juízo pode ser feita por essa entidade.
5 - Nos processos em que esteja em causa a atuação ou omissão de um órgão subordinado a poderes hierárquicos, a designação do representante em juízo pode ser feita por esse órgão, mas a existência do processo é imediatamente comunicada ao ministro ou ao órgão superior da pessoa coletiva.”
Com a revisão operada ao CPTA pelo DL. nº 214-G/2015, de 2 de outubro os nºs 1 e 2 daquele artigo 11º foram alterados e aditado ainda um novo nº 6, os quais passaram a dispor o seguinte:
“Artigo 11º
Patrocínio judiciário e representação em juízo
1 - Nos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de mandatário, nos termos previstos no Código do Processo Civil, podendo as entidades públicas fazer-se patrocinar em todos os processos por advogado, solicitador ou licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico, sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público.
2 - No caso de o patrocínio recair em licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico, expressamente designado para o efeito, a referida atuação no âmbito do processo fica vinculada à observância dos mesmos deveres deontológicos, designadamente de sigilo, que obrigam o mandatário da outra parte.
3–(…).
4-(…).
5-(…).
6 - Os agentes de execução desempenham as suas funções nas execuções que sejam da competência dos tribunais administrativos.”
A Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, que veio mais recentemente, modificar os regimes processuais no âmbito da jurisdição administrativa e tributária, procedendo a diversas alterações legislativas, alterou a redação do nº 1 do artigo 11º do CPTA, a qual passou a dispor o seguinte:
“Artigo 11º
Patrocínio judiciário e representação em juízo
1 - Nos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de mandatário, nos termos previstos no Código do Processo Civil, podendo as entidades públicas fazer-se patrocinar em todos os processos por advogado, solicitador ou licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico, sem prejuízo da possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público.
(…)”
Simultaneamente também o artigo 25º do CPTA foi modificado.
Na versão original do CPTA (que veio a resultar da Lei nº 4-A/2003, de 19 de fevereiro) dispunha o seguinte:
“Artigo 25º
Citações e notificações
Sem prejuízo do que, neste Código, especificamente se estabelece a propósito da citação dos contra-interessados quando estes sejam em número superior a 20, é aplicável o disposto na Lei processual civil em matéria de citações e notificações.”
E com a revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015 passou a dispor o seguinte:
“Artigo 25
Citações e notificações
1 - Salvo disposição em contrário, as citações editais são realizadas mediante a publicação de anúncio em página informática de acesso público, nos termos a definir em portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
2 - Em todas as formas de processo, todos os articulados e requerimentos autónomos e demais documentos apresentados após a notificação ao autor da contestação do demandado são notificados pelo mandatário judicial do apresentante ao mandatário judicial da contraparte nos termos da Lei processual civil.
3 - A notificação determinada no número anterior pode realizar-se por meios eletrónicos, nos termos de portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.”
E com a Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, assumiu a atual versão, com a modificação da redação dos nºs 3 e 4, os quais passaram a dispor o seguinte:
“1–(…)
2–(…)
3 - A notificação determinada no número anterior realiza-se por via eletrónica, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
4 - Quando seja demandado o Estado, ou na mesma ação sejam demandados diversos ministérios, a citação é dirigida unicamente ao Centro de Competências Jurídicas do Estado, que assegura a sua transmissão aos serviços competentes e coordena os termos da respetiva intervenção em juízo.
3.5 Na atual versão dos dispositivos do artigos 11º e 25º do CPTA resulta que a presentação do ESTADO nas ações em que este seja parte demandada (por a ele lhe pertencer a legitimidade passiva nos termos do artigo 10º do CPTA) fica agora apenas garantida a possibilidade da sua representação em juízo ser assegurada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, e não já, como acontecia anteriormente, que essa representação a si lhe pertença. Simultaneamente, a citação do ESTADO deixou de se operar «na pessoa do magistrado do Ministério Público» na usual fórmula utilizada, e passou a ser dirigida ao Centro de Competências Jurídicas do Estado, serviço central da administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa, que se integra na Presidência do Conselho de Ministros e está sujeito ao poder de direção do Primeiro-Ministro ou do membro do Governo em quem aquele o delegar (cuja orgânica foi aprovada pelo DL. nº 149/2017, de 6 de dezembro, e posteriormente alterada pelo DL. nº 91/2019, de 5 de julho).
3.6 A questão está em saber se estes dispositivos, na sua atual redação, atentam a Constituição nos termos invocados pelo MINISTÉRIO PÚBLICO.
3.7 Mas estão aqui em causa duas vertentes da representação da pessoa coletiva ESTADO no âmbito do contencioso administrativo: uma a vertente orgânica (funcional), outra na vertente de patrocínio judicial.
3.8 Ora, se o que importa aferir é se ocorreu a invocada falta de citação do ESTADO, por a citação ter sido dirigida ao Centro de Competências Jurídicas do Estado nos termos atualmente previstos no artigo 25º nº 4 do CPTA (e não ao MINISTÉRIO PÚBLICO, como acontecia na solução legal anterior), não relevam aqui, e para a utilidade do presente recurso, os argumentos tecidos em torno da questão da invocada subalternização do MINISTÉRIO PÚBLICO à vontade da Administração, nem da invocada afronta à autonomia do MINISTÉRIO PÚBLICO, decorrente do artigo 219º nº 2 da CRP e legalmente definida no respetivo Estatuto (à data da instauração da ação o aprovado pela Lei nº 47/86, de 15 de outubro, atualmente o aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, cuja entrada em vigor ocorreu em 01/01/2020 – cfr. artigo 287º), os quais se prendem já com o papel do MINISTÉRIO PÚBLICO enquanto “advogado” do ESTADO.
Essa questão (atinente já ao patrocínio judiciário e representação em juízo) colocar-se-á a jusante da que agora nos interessa.
3.9 A que agora releva e importa é saber se a opção do legislador infraconstitucional, de fazer operar a citação da pessoa coletiva ESTADO, quando este seja demandado no âmbito dos processos nos tribunais administrativos, através do Centro de Competências Jurídicas do Estado, fere ou não o artigo 219º nº 1 da CRP.
Sabendo-se que a citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender (cfr. artigo 219º nº 1 do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA).
3.9 E a resposta tem que ser negativa.
3.10 É sabido que a questão do caráter necessário ou não da representação do ESTADO pelo MINISTÉRIO PÚBLICO no âmbito das ações sobre contratos ou relativas à responsabilidade civil não é de hoje.
Aliás, a opção legislativa acolhida pelo CPTA (na reforma do contencioso administrativo operada em 2002-2004) havia sido já amplamente debatida no debate universitário que antecedeu aquela reforma do contencioso administrativo, e continuou a sê-lo posteriormente.
A tal respeito, vide, designadamente, Vieira de Andrade, defendendo fim do patrocínio do Estado pelo Ministério Público, em especial nas ações de responsabilidade, in, “Reforma do Contencioso Administrativo – O debate universitário (trabalhos preparatórios), Vol. I, Coimbra Editora, 2003, pág. 70, e in, “A Justiça Administrativa (Lições)”, 5ª Edição, Almedina, 2004, pág. 267. No mesmo sentido, associando-se à critica de continuar a atribuir-se ao MINISTÉRIO PÚBLICO a representação do ESTADO, Pedro Gonçalves, in, “A ação administrativa comum” – “A Reforma da Justiça Administrativa”, STVDIA IVRIDICA nº 86, Boletim da Faculdade De Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, dezembro 2005, pág. 167 (n. 90). Veja-se, ainda, Maria Isabel F. Costa, in, "O Ministério Público no contencioso administrativo - Memória e "Razão de Ser"", Revista do Ministério Público, Ano 28, AbrJun 2007, pág. 28, destacando ser função nuclear do MINISTÉRIO PÚBLICO a defesa da legalidade democrática, com expressão na ação penal e na ação pública do contencioso administrativo.
3.11 O certo é que se manteve, na reforma do contencioso administrativo operada em 2002-2004 a regra da representação do ESTADO nas ações sobre contratos e relativas à responsabilidade civil. Opção legislativa que foi agora alterada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro.
3.12 Mas a questão objeto do recurso não é a de saber se o ESTADO, demandado que foi como réu na ação, se encontra ou não regularmente representado em juízo (enquanto pressuposto processual).
A questão é a de saber se ocorreu nulidade (falta) de citação (enquanto nulidade processual), se ao abrigo do artigo 25º nº 4 do CPTA, na sua versão atual, a citação foi dirigida ao CENTRO DE COMPETÊNCIAS JURÍDICAS DO ESTADO, por dever ser recusada a aplicação dessa norma com fundamento em inconstitucionalidade. E se, assim, deve ser anulado todo o processado, e determinada a citação do ESTADO através do MINISTÉRIO PÚBLICO [destaque nosso].
Atenha-se que nos termos do artigo 188º nº 1 alínea b) do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, há falta de citação “…quando tenha havido erro de identidade do citado”.
3.13 É sabido que o nomini nomine «ESTADO» tem várias aceções. Mas neste âmbito, a que essencial releva é a pessoa coletiva ESTADO, em especial na sua vertente Estado-administração, fazendo-o distinguir-se das outras pessoas coletivas públicas dotadas de personalidade jurídica (e, por conseguinte, também, judiciária).
Sendo que a qualificação do ESTADO como pessoa coletiva decorre da própria Constituição, designadamente dos seus artigos 3º nº3, 5º nº 3, 18º nº 1, 22º, 27º nº 5, 38º nº 2, 41º nº 4, 204º nº 1 alínea b) e nº 2, 269º nºs 1 e 2, 271º nºs 1 e 4 ou 276º nº 4, sendo particularmente significativas, neste conspecto, as disposições onde se atribuem direitos ou deveres ao ESTADO e às outras pessoas coletivas públicas – vide, a este respeito, Diogo Freitas do Amaral, in, “Curso de Direito Administrativo”, Vol. I, II edição, Almedina, pág. 213 ss.
3.14 Na versão anterior do CPTA o chamamento do ESTADO à ação sobre contrato ou relativa a responsabilidade civil que contra ele tivesse sido instaurada fazia-se através da citação dirigida ao MINISTÉRIO PÚBLICO, que era quem também, quem atuava na ação em sua representação legal.
Como refere Alexandra Leitão, in, “A Representação do Estado pelo Ministério Público nos Tribunais Administrativos”, JULGAR, nº 20, 2013, pág. 13 ss. tratava-se aí de uma representação legal e não propriamente, como representação orgânica, como vinha sendo entendido em alguma doutrina “(…) enquanto a representação orgânica decorre da própria natureza das coisas -é, por assim dizer, lógica e ontológica —, a representação legal decorre de uma opção do legislador. Por outras palavras: seria possível optar-se por não cometer ao Ministério Público a representação em juízo do Estado, mas seria impossível determinar que a pessoa coletiva deixasse de ser representada por um ou mais dos seus órgãos, pela simples razão que as pessoas coletivas são entidades imateriais que carecem sempre de um ou mais órgão(s) e do(s) seu(s) titular(es) para manifestar a sua vontade. Este é o cerne da distinção entre representação orgânica e legal.”
3.15 A circunstância de a expressão «representação», usada nas normas em causa, não é, assim unívoca, sendo aplicada com aceções diferentes. As suas repercussões são, aliás, explicitadas, no âmbito da versão original do CPTA, por Esperança Mealha, in, “Personalidade Judiciária e Legitimidade Passiva das Entidades Públicas”, CEDIPRE ONLINE I 2, novembro 2010, pág. 29, na análise que ali se efetua quanto à medida em que a representação do ESTADO pelo MINISTÉRIO PÚBLICO interferia com os critérios de atribuição de personalidade judiciária vertidos no artigo 10º CPTA.
3.16 Não vemos como a representação orgânica da pessoa coletiva ESTADO nos tribunais administrativos, em defesa dos seus interesses patrimoniais, que são os que estão em causa nas ações sobre contratos e relativas à responsabilidade, esteja constitucionalmente acometida ao MINISTÉRIO PÚBLICO.
Mas será que o artigo 219º nº 1 da CRP ao determinar, sob a epígrafe “Funções e Estatuto” que “ao Ministério Público compete representar o Estado”, lhe reserva a ele a representação legal do ESTADO nessas mesmas ações?
3.17 As justificações para a solução infra-constitucional adotada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro podem ser muitas. Mas uma delas adverirá, com certeza, da circunstância aos dois meios processuais principais - a «ação administrativa comum» e a «ação administrativa especial», cujos respetivos âmbitos e regras processuais eram distintas (cfr. artigos 35º, 37º, 42º e 46º do CPTA, na versão original) – com a revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015, ter resultado o abandono daquele modelo dualista de meios processuais principais não urgentes, através do estabelecimento de uma única forma de processo declarativo não urgente, a «ação administrativa», na qual passaram a poder ser cumulados pedidos que anteriormente pertenciam a cada uma daquelas distintas formas de processo. Daí emergindo múltiplas dificuldades ao nível da determinação da legitimidade passiva, resultando, não raras vezes, em decisões de forma, com absolvição da instância, e sem possibilidade de aproveitamento do ato de citação, nem da respetiva interrupção da prescrição ou da caducidade, a verificar-se. Podendo, até, raiar em situações de denegação de justiça, com prejuízo dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos
3.17 Assim se explicará que a citação deva ser dirigida uma única citação ao Centro de Competências Jurídicas do Estado quando numa na mesma ação sejam demandados diversos ministérios, quando numa ação seja demandado o ESTADO, ou quando na mesma ação sejam demandados diversos ministérios e o ESTADO, sendo que foi aliás esta última hipótese que sucedeu nos autos. E com essa citação, que o ESTADO (e/ou os Ministérios que sejam também demandados) é chamado à ação, e a instância fixada, nos termos do artigo 260º do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA (sem prejuízo das eventuais modificações que possam vir a ocorrer nos termos que processualmente sejam admitidos)
3.18 Não cabe aqui fazer qualquer juízo quanto ao melhor acerto da opção legislativa adotada na Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, já que num Estado de Direito assente no primado da Lei (cfr. arts. 2.º e 3.º, n.ºs 1 e 2 da CRP) na sua aplicação aos casos concretos têm de ser acatados os juízos de valor legislativamente formulados, quando não ofendam normas de hierarquia superior nem se demonstre violação de limitações legais de caráter geral “…não podendo o intérprete sobrepor à ponderação legislativa os seus próprios juízos sobre o que pensa que deveria ser regime legal, mesmo que os considere mais adequados e equilibrados que os emanados dos órgãos de soberania com competência legislativa.” (cfr., por todos, o Acórdão do Pleno do STA de 13/11/2007, Procº nº 01140/06, in, www.dgsi.pt/jsta).
3.19 Ainda que sejam de reportar as dificuldades da sua articulação com outras normas do sistema jurídico infra-constitucional.
Designadamente as decorrentes da o Estatuto do MINISTÉRIO PÚBLICO (à data da instauração da ação o aprovado pela Lei nº 47/86, de 15 de outubro, atualmente o aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, cuja entrada em vigor ocorreu em 01/01/2020 – cfr. artigo 287º), se referir à intervenção principal do MINISTÉRIO PÚBLICO quando representa o ESTADO, as REGIÕES AUTÓNOMAS ou as AUTARQUIAS LOCAIS, simultaneamente dispondo que “…em caso de representação de região autónoma, de autarquia local ou, nos casos em que a Lei especialmente o permita, do Estado, a intervenção principal cessa quando for constituído mandatário próprio” (cfr. artigo 5º nº 1 alíneas a) e b) e nºs do Estatuto antigo e artigo 9º do Estatuto novo) e de prever a existência de departamentos de contencioso do ESTADO enquanto órgão de coordenação e de representação do ESTADO em juízo em matéria cível, administrativa e tributária (cfr. artigo 51º do Estatuto antigo e 61º do Estatuto novo) aos quais compete (cfr. artigo 52º nº 1 do Estatuto antigo e 61º nº 1 do Estatuto novo) a “…representação do Estado em juízo, na defesa dos seus interesses patrimoniais, em casos de especial complexidade ou de valor patrimonial particularmente relevante, mediante decisão do Procurador-Geral da República (alínea a)); “…organizar a representação do Estado em juízo, na defesa dos seus interesses patrimoniais” (alínea b)); “…assegurar a defesa dos interesses coletivos e difusos” (alínea c)); “…preparar, examinar e acompanhar formas de composição extrajudicial de conflitos em que o Estado seja interessado” (alínea d)), e ainda “…apoiar os magistrados do Ministério Público na representação do Estado em juízo” (nº 2).
3.19 Sendo certo que por outro lado, e no que toca às ações cíveis, o CPC atual dispõe no seu artigo 24º, a respeito da representação do ESTADO que este é nelas “…representado pelo Ministério Público, sem prejuízo dos casos em que a Lei especialmente permita o patrocínio por mandatário judicial próprio, cessando a intervenção principal do Ministério Público logo que este esteja constituído” (nº 1), ressalvando que “…se a causa tiver por objeto bens ou direitos do Estado, mas que estejam na administração ou fruição de entidades autónomas, podem estas constituir advogado que intervenha no processo juntamente com o Ministério Público, para o que são citadas quando o Estado seja réu; havendo divergência entre o Ministério Público e o advogado, prevalece a orientação daquele”.
Não podendo deixar de se estranhar, que quando estejam em causa ações da mesma natureza, mas por não integrarem a área da competência da jurisdição administrativa e fiscal (cfr. artigo 4º do ETAF), estejam submetidas à jurisdição dos tribunais comuns, a representação do ESTADO possa ser feita de modo tão diametralmente distinto.
3.20 Claro que o inciso da parte final do nº 4 do artigo 25º do CPTA na sua versão atual, no qual, referindo-se ao Centro de Competências Jurídicas do Estado, se diz que este “assegura a sua transmissão aos serviços competentes e coordena os termos da respetiva intervenção em juízo” poderá criar dúvidas quanto à forma como será assegurada, em tal caso, a garantia da autonomia do MINISTÉRIO PÚBLICO, nos termos do artigo 219º nº 2 da CRP e do respetivo Estatuto, em relação aos demais órgãos do poder central, regional e local (cfr. artigo 2º do Estatuto antigo e 3º do Estatuto novo).
Mas não é despiciente relembrar que nos termos Estatuto antigo (aprovado pela Lei nº 47/86) não só era contemplada a interligação entre a atuação judicial do MINISTÉRIO PÚBLICO em representação do ESTADO e os demais serviços do Estado, cuja atuação estivesse implicada, como se previa que ao Ministro da Justiça competia transmitir, ainda que por intermédio do Procurador-Geral da República, instruções de ordem específica nas ações cíveis e nos procedimentos tendentes à composição extrajudicial de conflitos em que o Estado fosse interessado ou autorizar o Ministério Público, ouvido o departamento governamental de tutela, a confessar, transigir ou desistir nas ações cíveis em que o Estado fosse parte (cfr. artigo 80º alíneas a) e b) do Estatuto antigo).
3.21 E recentrando-nos na invocada desconformidade das normas em causa, temos que reafirmar a análise feita pela 1ª instância quanto à convocação do artigo 219º nº 1 da CRP, nos termos da qual “ao Ministério Público compete representar o Estado e defender os interesses que a Lei determinar, bem como, com observância do disposto no número seguinte e nos termos da Lei, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a ação penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática”. Dando por renovados os entendimentos doutrinais ali citados a tal respeito. Os quais evidenciam que a discussão em torno da representação do ESTADO pelo MINISTÉRIO PÚBLICO se encontra atualmente já limitada. Na medida em que é aceite, sem reservas, a conformidade constitucional com o inciso “ao Ministério Público compete representar o Estado” constante da primeira parte do nº 1 do artigo 219º da CRP, quanto às demais opções legais em que a representação do ESTADO, e a defesa dos interesses patrimoniais deste, não são feitas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, mas pelas entidades ou órgãos integrados na administração direta ou indireta do Estado (tenham ou não personalidade jurídica), quando nos termos da Lei processual aplicável lhes é reconhecida personalidade e capacidade judiciária.
O que significa que restam apenas em discussão as ações relativas a contratos e a responsabilidade civil extracontratual em que o ESTADO seja demandado nos Tribunais Administrativos. E não se vê em como possam estas considerar-se núcleo essencial das funções do MINISTÉRIO PÚBLICO referidas no nº 1 do artigo 219º da CRP.
3.22 E por último sempre importará ainda dizer que independentemente de estar ou não a matéria em causa, regulada nos dispositivos dos artigos 11º e 24º do CPTA na versão dada pela Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, no âmbito da reserva relativa da assembleia da república nos termos do artigo 165º nº 1 da CRP, também apontado como violado, o certo é que essa competência legislativa foi observada.
3.23 Aqui chegados, tem pois que concluir-se, dever ser negado provimento ao recurso e manter-se, com a antecedente fundamentação, a decisão do Mmº Juiz a quo que indeferiu a arguição de nulidade de falta da citação (…)”.
Examinando o aresto ora parcialmente transcrito, verifica-se, sem qualquer margem para dúvida, que a mesmo versa sobre a problemática trazida a juízo.
De facto, à semelhança do processo nº. 00902/19.2BEPNF-S1, também a decisão judicial recorrida cuidou de determinar a bondade da arguição da nulidade por falta de citação do Estado Português, aferida na vertente de se saber se, nas ações em que vem demandado o Estado Português, a citação do Ministério Público operada nos termos preconizados no nº.4 do artigo 25º do CPTA, na redação dada pela Lei n.º 118/2019, de 17/09, confronta[va] a C.R.P. nos mesmos termos e com o alcance invocado nos autos.
O que serve para concluir que a doutrina que emana do aresto supra transcrito tem pleno enquadramento no presente caso recursivo.
E no que tange à bondade de tal doutrina, não se vislumbra, nem descortina, qualquer argumento de natureza jurídica ou prática para inverter a direção seguida no referido processo, assomando a mesma, a nosso ver, como a mais concordante e consentânea com o bloco legal aplicável ao caso versado nos autos.»
O entendimento jurisprudencial que tem vindo a traçar caminho sobre esta matéria é muito consistente no sentido da inexistência de qualquer desconformidade dos artigos 11.º, n.º 1, e 25.º, n.º 4, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, com o parâmetro constante do artigo 219.º, n.º 1, da Constituição, de que são ainda exemplos os seguintes acórdãos:
I- DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE
- Acórdão de 19 de fevereiro de 2021, no Proc. n.º 952/20.4BEPRT, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos, de que fomos relatora;
- Acórdão de 22 de fevereiro de 2021, no Proc. n.º 462/20.0BECBR-S1, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão de 5 de março de 2021, no Proc. n.º 271/20.6BEVIS que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão de 9 de abril de 2021, no Proc. n.º 240/20.6BEPNF-S1, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão 09 de abril de 2021, no Proc. 510/19.6BEPRT-S3, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão 09 de abril de 2021, no Proc. n.º 22/20.5BEPRT-S1, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão de 18 de junho de 2021, no Proc. n.º 434/20.4BEPRT-S1, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão de 15 de julho de 2021, no Proc. n.º 2/21.3BEPNF-S1, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;

II- DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL
-Acórdão de 26 de novembro de 2020, no Proc. Nº213/20.9BEALM-S1 que negou provimento ao recurso do despacho referido na alínea (iii) supra;
- Acórdão de 21 de janeiro de 2021, no Proc. 221/20.0BEALM-S1, que que negou provimento ao recurso do despacho referido na alínea (v) supra;
- Acórdão de 21 de janeiro de 2021, no Proc. 216/20.9BEALM-S1, que que negou provimento ao recurso do despacho referido na alínea (iv) supra;
- Acórdão de 20 de maio de 2021, no Processo n.º 672/20.0BELRA-S1, que negou provimento ao recurso do despacho do Tribunal Administrativo que decidira pela não inconstitucionalidade das normas em causa;
- Acórdão de 17 de junho de 2021, no Processo n.º 59/21.7BEALM-S2, que negou provimento ao recurso ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;
- Acórdão de 7 de julho de 2021, no Processo nº 518/20.4BELSB-S1, que negou provimento ao recurso do Ministério Público com idêntico objeto e fundamentos;

III- DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
- Acórdão de 24 de setembro de 2020, no Proc. n.º 902/19.0BEPNF-1, que negou a admissão de um recurso de revista;
- Acórdão de 10 de dezembro de 2020, no Proc. n.º 92/20.6BELS-S1, que negou a admissão de um recurso de revista
- Acórdão de 11 de março de 2021, no Proc. n.º 1240/19.4BEPNF-S1, que negou a admissão de um recurso de revista;
- Acórdão de 25 de março de 2021, no Proc. n.º 213/20.9BEALM-S1, que negou a admissão de um recurso de revista;
- Acórdão de 21 de abril de 2021 no Proc. n.º 221/20.0BELSB-S1, que negou a admissão de um recurso de revista;
- Acórdão de 13 de maio de 2021, no Proc. 216/20.3BEALM-S1, que negou a admissão de um recurso de revista.

Em face do que antecede, considerando as razões detalhadamente expostas no aresto a que aderimos, e que se encontram igualmente espelhadas nos demais acórdãos que têm vindo a ser proferidos sobre esta matéria, é apodítico que a previsão do artigo 25.º do CPTA, na sua atual redação, que determina a citação da pessoa coletiva Estado, quando o mesmo seja demandado no âmbito dos processos nos Tribunais Administrativos, através do Centro de Competências Jurídicas do Estado, não fere o artigo 219º nº 1 da Constituição, não se descortinando nenhuma nulidade processual emergente da falta da citação do Ministério Público, por omissão completa do ato.

Termos em que soçobram os fundamentos de recurso aduzidos.
**

IV-DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em
negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam o despacho recorrido.
*
Sem custas.
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Notifique.
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Porto, 14 de janeiro de 2022


Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
Paulo Ferreira de Magalhães, em substituição