Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00677/13.7BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/29/2025
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:PAULA MOURA TEIXEIRA
Descritores:ISENÇÃO IVA;
PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES LEGAIS;
DIREITO DE AUDIÇÃO;
Sumário:
I. A alínea a) do n. º1 do artigo 14.º do CIVA, isenta de imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.

II. O n.º 8 do art.º 29.º do CIVA sobre a epigrafe “Obrigação Geral “ preceitua que “As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.”

III. Por sua vez, o n.º 9 do art.º 29.º do CIVA “A falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador de serviços de liquidar o imposto correspondente".*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, [SCom01...], S.A., com o NIPC ...20, com os demais sinais dos autos, interpôs recurso da sentença prolatada, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação judicial por si interposta, visando o ato de liquidação adicional de IVA referente ao período de abril 2013.

A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…)
a) A sentença recorrida subverteu o âmbito de eficácia vinculante dos princípios da legalidade, da igualdade, da e têm a natureza de princípios constitucionais estruturantes do Estado material democrático de direito, pois tais princípios atingem toda a actividade do Estado democrático de direito, todas as normas jurídicas e todos os actos jurídicos, pelos quais se rege a vida de toda a administração e dos próprios cidadãos;
b) No caso, estão em causa mercadorias, para comércio, que foram exportadas para uma empresa associada da ora recorrente existente em território angolano e sujeita ao respectivo regime legal, e que foram transportadas, na sua bagagem, de Portugal para Angola por um dos administradores de ambas as empresas a quando da sua deslocação a este país, como resulta do relatório de fiscalização tributária;


c) Não sendo mercadorias, para comércio, que fossem exportadas através de terceira empresa transportadora, mas como bagagem da pessoa do administrador de ambas as empresas (de Portugal e de Angola), não havia obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros para emitir o documento alfandegário apropriado à exportação através dessa terceira empresa transportadora;
d) Sendo assim, a obrigação legal de exportação de mercadorias, para efeito de isenção de IVA nos termos do art.º 14.º, n.º 1, alínea a), do CIVA, comprova-se através de “declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado”, nos termos do referido n.º 8 do art.º 29.º do CIVA;
e) Não se vê que outra hipótese factual possa caber no n.º 8 do art.º 29.º do CIVA, quando fala “de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhe irá ser dado”: a interpretar-se este preceito do jeito sufragado pela sentença recorrida, equivalerá a admitir que o legislador construiu o dispositivo legal com base em hipóteses absurdas de impossibilidade de verificação;
f) É precisamente para excluir essa posição hermenêutica que tem inteira pertinência a convocação dos referidos princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé;
g) A apresentação da declaração por parte do adquirente do País terceiro satisfaz inteiramente as exigências de controlo por parte dos Países da Comunidade da transacção das mercadorias para países terceiros da Comunidade Europeia, bem como as exigências do controlo de entrada de mercadorias no mercado deste País terceiro, para efeitos de tributação;
h) Uma concepção substancial do direito de audição demanda forçosamente que o respeito pela sua natureza de direito procedimental de imposição constitucional seja aferido pela função que é concretamente atribuída ao direito: se o direito de audição não postular a estrita obrigação da administração de necessariamente se pronunciar sobre as razões de facto e de direito que o administrado invoca como fundamento para a decisão a proferir por ela dever ter determinado sentido, o direito de audição resumir-se-á a um simples formalismo e não estará impregnado de qualquer valor de garantia do administrado que constitui a ratio da sua previsão constitucional;
i) Pese embora a recorrente tenha exercido o direito de audição com notória densidade, como se colhe do processo administrativo, o certo é que a decisão da AT de tributação não contradisse as razões de direito alegadas pela contribuinte e demitiu-se de ouvir a testemunha indicada sobre os factos sob o argumento da eventual inutilidade do depoimento futuro, como se o agente tivesse o condão de adivinhar o conteúdo do depoimento futuro;
j) Tal omissão da AT de se pronunciar sobre o fundo da resposta da ora recorrente apresentada no exercício do direito de audição, bem como a falta de audição da testemunha indicada no direito de audição, não permite excluir que a administração não tenha sopesado, na prática do acto tributário, as razões alegadas pelo contribuinte e não pode deixar de afectar os termos em que o contribuinte pode exercer os seus direitos de defesa no recurso aos tribunais;
k) Tanto basta para, do ponto de vista substancial, se ter de concluir que a sentença recorrida errou ao não considerar procedente o vício de forma alegado pela ora recorrente.

Termos em que e sempre contando com o douto suprimento de V.ªas Excelências deve o presente recurso ser julgado procedente com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA!. (…)”

1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal, emitiu parecer tendo concluído pela manutenção da sentença recorrida devendo improceder o recurso.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, com a sua concordância, submetendo-se à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se a sentença padece de erro de julgamento de direito por: (i) subversão do âmbito de eficácia vinculante dos princípios da legalidade, da igualdade, e têm a natureza de princípios constitucionais estruturantes; (ii) errada interpretação e aplicação do n.º 8 do art.º 29.º do CIVA; e, (iii) erro de julgamento quanto à violação do direito audição.

3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)
1. A Impugnante é uma sociedade anónima que tem como atividade principal a construção civil e obras públicas e como atividades secundárias o comércio de materiais de construção, a comercialização de peças e acessórios para viaturas automóveis, a revenda de combustíveis e a compra e venda de máquinas, viaturas e equipamentos – cf. RI a fls. 37 e ss. do p.a. apenso;
2. Entre 14.12.2011 e 13.01.2012 a Impugnante foi alvo de uma ação inspetiva que teve origem no pedido de reembolso de IVA relativo ao período de 11-09, na qual se concluiu “ser legitimo” o apontado reembolso - cf. RI junto como doc. 1 com a contestação cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
3. Entre 04.06.2012 e 11.06.2012 a Impugnante foi alvo de uma ação inspetiva que teve origem no pedido de reembolso de IVA relativo ao período de 201003, tendo sido proposto o deferimento total do reembolso solicitado - cf. RI junto com doc. 2 com a contestação cujo teor se dá por integralmente reproduzido
4. Em 25.01.2013 a Impugnante emitiu a Fatura n.º 26/2013 a “[SCom02...], Lda.”, no valor de 4.549,22€ - cf. fatura integrante do anexo 1 do Projeto de RI a fls. 38 dos autos;
5. As mercadorias mencionadas na fatura a que aludimos no ponto antecedente deram entrada nas instalações da adquirente, em ..., Luanda – cf. declaração integrante do anexo 1 do Projeto de RI a fls. 38 dos autos;
6. Em 07.06.2013 a Impugnante solicitou reembolso de IVA no valor de 417.389,26€ - cf. doc. a fls. 54 do processo administrativo tributário (p.a.) em apenso;
7. Em cumprimento das ordens de serviço n.ºs ...59 de 02.07.2013 foi a Impugnante sujeita a procedimento de inspeção externa, de âmbito parcial, em sede de IVA, pelos Serviços de Inspeção Tributária afetos à Direção de Finanças ..., relativamente ao mês de abril de 2013; – cf. ordem de serviço a fls. 6 do processo administrativo tributário (p.a.) em apenso; 8. Na sequência da inspeção tributária referida em 7., foi elaborado o projeto de relatório de inspeção (RI) de fls. 9 e ss. do p.a., que foi remetido à Impugnante pelo Ofício n.º ...85 de 11.07.2013, para efeitos de exercício do direito de audição, podendo aí ler-se, entre o mais, o seguinte: “(…)
II. 3. OUTRAS SITUAÇÕES
II 3.1. Identificação do sujeito passivo
[SCom01...], s.a. é um sujeito passivo com sede na Rua ... - lote 34 na Zona Industrial ... - ..., local onde se situam o armazém e escritórios da sua atividade, cujas instalações pertencem ao próprio. O sujeito passivo é representado pelo Sr. «AA» (NIF - ...26) presidente do Conselho de Administração.
A Contabilidade encontra-se centralizada na sede, sendo que o técnico oficial de contas é a Dr.a «BB» (NIF- ...38).
II-3.2 - Enquadramento fiscal do sujeito passivo
Enquadramento em sede de IVA: o sujeito passivo encontra-se enquadrado no regime normal de periodicidade mensal. Há ainda a referir que o sujeito passivo é um prestador de serviços de construção civil, e a maioria das prestações de serviços enquadramse na regra de inversão do sujeito passivo imposta pelo artigo 2.°, n.° 1, alínea j) do Código do IVA.
Enquadramento em sede de IRC: o sujeito passivo encontra-se enquadrado no regime geral de determinação do lucro tributável.
11-3.3 - Descrição sumária da atividade do sujeito passivo
A empresa tem como atividade principal a construção civil e obras públicas e como atividades secundárias o comércio de materiais de construção, a comercialização de peças e acessórios para viaturas automóveis, a revenda de combustíveis e a compra e venda de máquinas, viaturas e equipamentos.
Dada a atual conjuntura económica, particularmente no setor da construção civil, a atividade da empresa tem vindo a desenvolver-se na área do comércio de materiais de construção, peças e acessórios para viaturas e na compra e venda de máquinas, viaturas e equipamentos, especialmente para exportação.
O seu principal (único) cliente no mercado externo é a [SCom02...], Lda empresa cujos sócios são comuns ao sujeito passivo em análise. Para o desenvolvimento da sua atividade a empresa conta com a colaboração, de 90 funcionários.
Os resultados da atividade e os resultados fiscais apresentados nos anos de 2010 a 2012 foram os seguintes:

201020112012
Vendas e prestações de serviços€ 9 956 207,24€ 16 064 339,16€ 13 599 298,05
Resultado líquido do exercício€ 537 242,17€ 235 626,70€ 118421,74
Resultado tributável€ 439 830,68€ -243 155,24)€-205 872,85

II. 3. 4. ANÁLISE PEDIDO REEMBOLSOS DE IVA - PERÍODO 201203
Analisados os elementos referentes ao pedido de reembolso n° ........98/0, solicitado na DP 201304, no valor de € 417 389,26, cumpre-me informar o seguinte:
1) O reembolso solicitado resulta do acumular de crédito desde o período 201212.
2) O sujeito passivo encontra-se enquadrado no regime normal mensal do IVA, pela atividade de construção civil, CAE 41 200
3) O crédito de imposto apurado, no período de 201212 a 201304 resultou, essencialmente da conjugação de duas situações:
- Por um lado, efetuou prestações de serviços de construção civil, no montante de € 1.451.154,95, que se enquadram na regra de inversão prevista no artigo 2.°, n.° 1, alínea j) do Código do IVA e decreto-lei n° 21/2007, de 29/01 e representam 26,91% do volume de negócios
- Por outro, efetuou no referido período, vendas e prestações de serviços, no montante de € 3.796,964,55, não tributadas em Portugal, nos termos do art. 14°, n° 1, alíneas a) e p) e art. 6o , n°11, al. c) do Código do IVA, relacionadas com exportações para a firma - [SCom02...], Lda, com sede em Luanda, que representam 70,42% do volume de negócios.
- O valor deste tipo de vendas e prestações de serviços representa no seu conjunto 97,33% do total do valor do volume de negócios. Concomitantemente, estamos perante um sujeito passivo que não procede à liquidação de imposto em relação às referidas vendas e prestações de serviços, sem contudo deixar de deduzir o imposto relativamente às aquisições efetuadas, nos termos dos artigos 19.° a 26.° do Código do IVA, o que justifica e suporta a situação de crédito de importo. - Da análise da contabilidade e do ficheiro SAF-T (PT) da contabilidade e faturação relativamente ao período em análise verificou-se que os valores das declarações periódicas de IVA estão em consonância com os valores da Contabilidade e que a totalidade dos documentos comerciais que constam da faturação se encontram contabilizados;
- No decorrer da Inspeção verificou-se que existem várias transmissões de bens consideradas isentas de IVA nos termos da ai. a) do n.° 1 do art.° 14° do CIVA, tituladas por faturas. Verificou-se que estes bens destinados a uso comercial expedidos para fora do Território Aduaneiro Comunitário foram transportados na bagagem pessoal de vários portadores, sem qualquer intervenção dos serviços aduaneiros, o que contraria o disposto no Código Aduaneiro Comunitário. Assim e não existindo documentos alfandegários apropriados nos termos do n°s 8 do art.° 29° do CIVA, não se encontra comprovada a isenção, pelo que e de acordo com o n° 9 do mesmo artigo apurou-se IVA em falta no montante de € 20 067,32.
- Analisado o comportamento fiscal que o sujeito passivo tem vindo a assumir nos últimos dois exercícios fiscais cumpre-nos informar o seguinte:
- As obrigações declarativas em sede de IVA, IRC e IRS encontram-se devidamente cumpridas; - Consultado o Sistema de Execuções Fiscais (SEF) verificou-se que o sujeito passivo não evidencia dívidas fiscais.
- Face ao exposto nos pontos anteriores propomos o deferimento parcial do reembolso supra solicitado, no montante de € 397 321,94 calculado de acordo com o quadro seguinte:

Reembolso solicitado€417 389,26
Correções propostas€20 067,32
Reembolso deferido€397 321,94

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS A MATÉRIA TRIBUTÁVEL
Como já referido, a empresa efetua vendas e prestações de serviços relacionadas com exportações para a firma - [SCom02...], Lda, com sede em Luanda que representam atualmente grande parte do volume de negócios do sujeito passivo.
A saída de mercadorias (bens destinados a uso comercial) do Território Aduaneiro da Comunidade, obriga à intervenção das respetivas autoridades aduaneiras, conforme resulta do Código Aduaneiro Comunitário. , Artigo 161.° do Código Aduaneiro Comunitário O regime de exportação permite a saída de mercadorias comunitárias do território aduaneiro da Comunidade Com exclusão das mercadorias sujeitas ao regime de aperfeiçoamento passivo ou a um regime de trânsito em conformidade com o artigo 163.° e sem prejuízo do disposto no artigo 164.°, qualquer mercadoria comunitária destinada a ser exportada deverá ser sujeita ao regime de exportação
As operações de exportação, enquanto transmissões de bens e prestações de serviços, efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal, incluem-se no conceito de operação objetivamente sujeita a imposto, nos termos da alínea a) do n,° 1 do artigo 0 1 do CIVA. Embora as exportações sejam consideradas como operações tributáveis em sede do IVA, são operações que, respeitando o princípio do destino, se tornam operações isentas do imposto, encontrando-se este facto materializado no n.° 1 do artigo 14° do CIVA, que vem impedir que as operações de exportação sejam tributadas, isentando-as.
Nos termos do n.° 8 do art. 29° do CIVA " As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas, ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.° 1 do artigo 14° (...) devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legai de intervenção dos serviços alfandegários, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá se dado.’’
Na situação em concreto verificamos que no que respeita às exportações o sujeito passivo tem dois procedimentos distintos:
Na generalidade das transmissões de bens com destino a país terceiro (Angola) junto da fatura, encontra-se o exemplar 3 do Documento Administrativo Único (DAU) a documentar a operação de exportação, conforme estabelecido no n°8 do art.0 29° do CIVA;
Noutras situações (menos frequentes) verificamos que junto da fatura se encontra uma “declaração tipo " da empresa [SCom02...] onde é declarado que as mercadorias constantes da fatura foram adquiridas à [SCom01...], tendo as mesmas dado entrada nas suas instalações e com destino ao seu estaleiro central (ver anexo 1).
Solicitados esclarecimentos sobre a 2a situação, foi-nos explicado que estas mercadorias são expedidas através de portador na sua bagagem pessoal sempre que existe alguém relacionado com a empresa que se desloque a Angola (Sr. «AA» - presidente do Conselho de administração, funcionários da empresa ou de outras empresas relacionadas). Esta prática afigura-se-nos como uma ilegalidade, porquanto existe obrigatoriedade de intervenção dos serviços aduaneiros quando se verifique a saída de bens, destinados a uso comerciando Território Aduaneiro da Comunidade. Estas transmissões de bens para fora do território comunitário aduaneiro devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados e nos termos do n.° 9 do art.29° do CIVA, a falta destes documentos determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador de serviços de liquidar o imposto correspondente. Da análise à contabilidade verificou-se que existem várias transmissões de bens consideradas isentas de IVA nos termos da al. a) do n.° 1 do art.° 14° do CIVA, tituladas por faturas, não estando, no entanto, comprovada tal isenção pelos documentos alfandegários apropriados nos termos dos n°s 8 do art.° 29° do mesmo código. Assim, de acordo, com o n° 9 do mesmo artigo apurou-se IVA em falta no montante de € 20 067,32, de acordo com o quadro abaixo:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]


O valor do IVA resulta da aplicação da taxa prevista na alínea c) do n.° 1 do art.° 18° do CIVA (23%) ao valor tributável declarado em cada uma das faturas.
Atendendo a que o sujeito passivo tem crédito de imposto em todos os períodos que contribuem para o valor do reembolso (dezembro de 2012 a abril de 2013), as correções serão efetuadas no período de abril de 2013. (…)” – cf. projeto de correções a fls. 9 e ss. do p.a. em apenso.
9. A Impugnante exerceu o seu direito de audição nos termos que constam do requerimento de fls. 23 e ss. do p.a. apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
10. Em 25.07.2013 foi elaborado o Relatório Final de Inspeção em que se propuseram as mesmas correções aritméticas em sede de IVA constantes do projeto de correções, e que mereceu a concordância do Diretor de Finanças ..., por despacho de 01.08.2013; – cf. RI a fls. 37 e ss. do p.a. apenso; 11. Em tal Relatório consta, para além do que foi vertido no projeto e/ou diferentemente, o seguinte:
“(…)
IX DIREITO DE AUDIÇÃO
(…)
Refere o sujeito passivo que as exportações para Angola se iniciaram em junho de 2008 e desde “novembro de 2008, por necessidades de máxima urgência, esporadicamente, começou a enviar pequenas mercadorias (peças, acessórios, ferramentas e outros materiais de construção) por malas na bagagem de mão de colaboradores que viajam para Angola”, alegando que desde então foram solicitados vários reembolsos que foram deferidos na totalidade, dois deles com a intervenção da inspeção tributária, sem nunca ter sido corrigida esta situação.
A situação agora detetada pela inspeção, que se consubstancia numa prática ilegal por parte do sujeito passivo, que tem como consequência o não enquadramento de algumas vendas como exportações, pelo facto de as mesmas não reunirem os requisitos legais para assim serem consideradas, em nada fica prejudicada por este procedimento advir já de períodos anteriores e nunca ter sido corrigida pela inspeção, tanto mais que como é referido no direito de audição, o mesmo só ocorre “por necessidades de máxima urgência, esporadicamente (…)”, sendo que a maioria das exportações estão corretamente comprovadas e sustentam, a par com a não liquidação de IVA por efeito da regra de inversão, a situação permanente de crédito de imposto da empresa (…)”. – cf. ponto IX do Relatório de Inspeção a fls. 47 e 48 do p.a. apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
12. Em 14.08.2013 foi autorizado o reembolso de IVA à Impugnante, no valor de 397.321,94€ – cf. doc. a fls. 54 do p.a. apenso;
13. A p.i. da presente impugnação foi remetida a este Tribunal por via postal, em 15-02-2010 – cf. sobrescrito junto com a p.i. a fls. 30 dos autos no SITAF.
*
Mais se provou, com interesse:
14. As transmissões de bens correspondentes aos documentos mencionados no quadro do ponto III do RI foram efetuadas sem intervenção dos serviços aduaneiros – acordo - cf. art.º 7 e 40.º da p.i. e RI.
*
Inexistem factos que importe dar como não provados(…)”

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A primeira questão que cumpre apreciar é a de saber se sentença padece de erro de julgamento de direito por subversão do âmbito de eficácia vinculante dos princípios da legalidade, da igualdade, que têm a natureza de princípios constitucionais estruturantes.
Vejamos.
No que concerne a esta questão a sentença baseando-se na fundamentação da sentença proferida no proc 744/15.2BECBR em 27.10.2016, considerou que :
“(…) Bem assim, sempre se diga que competiria à Impugnante alegar não apenas que os princípios que descreve foram violados mas também factos capazes de gerar uma situação suscetível de ser como violadora dos mesmos, de forma especificada, o que, perscrutado o articulado inicial, de modo algum acontece.
(…)
Revertendo ao caso em análise, verifica-se, além do que se mencionou na decisão supra transcrita, que, não obstante a Impugnante descreva exaustivamente a ordem jurídica constituída, não alega que factos concretos da vida servem de fundamento ao efeito jurídico que pretende, isto é, em que medida é que, por anteriormente ter adotado um comportamento diverso (se é que o foi), a administração violou o princípio da igualdade, ou o princípio da proporcionalidade, ou qualquer um dos princípios que menciona. Deste modo, por não se vislumbrar, atendendo ao alegado, existir qualquer violação aos princípios apontados pela Impugnante, improcede a ação com este fundamento.”
Em sede de recurso a Recorrente limita-se a alegar genérica e vagamente, e na mesma linha da petição inicial, sem, contudo, contrariar os fundamentos e a posição sustentado pela MMª juíza na sentença recorrida, ignorando o que nela foi decidido.
O recurso terá de demonstrar a sua discordância com a decisão proferida, ou melhor, os fundamentos por que a Recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento delas e as aprecie.
A Recorrente terá de convocar argumentos contra os vários fundamentos desfavoráveis sob pena de o decidido não poder ser alterado, na parte não impugnada.
A propósito da imposição do ónus de alegação do recorrente já referia Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 357 que: “(...) em vista obrigar o recorrente a submeter expressamente à consideração do tribunal superior as razões da sua discordância para com o julgado, ou melhor, os fundamentos por que o recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento delas e as aprecie.(…)”.
Como se referiu no acórdão do STA de 11/5/2011, Processo n.º 04/11, constituindo o recurso jurisdicional “ … um meio de impugnação da decisão judicial com vista à sua alteração ou anulação pelo tribunal superior após reexame da matéria de facto e/ou de direito nela apreciada, correspondendo, assim, a um pedido de revisão da legalidade da decisão com fundamento nos erros e vícios de que padeça, pelo que está votado ao insucesso o recurso que se alheia totalmente da fundamentação factual e/ou jurídica que determinou a decisão de improcedência da impugnação.”
Se a Recorrente se alheou em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, não atacando o julgado, não pode o tribunal de recurso alterar o decidido pelo tribunal a quo.
Nesta conformidade, não sendo a questão em causa de conhecimento oficioso, tendo a mesma sido conhecida pela decisão recorrida e não vindo questionado o julgamento em que assentou, não pode este Tribunal conhecer agora essa questão (artigo 627º, nº 1 do CPC), pelo que o recurso nunca poderia obter provimento nesta parte.

4.2. A segunda questão que cumpre apreciar é a de saber se sentença padece de erro de julgamento de direito por errada interpretação e aplicação do n.º 8 do art.º 29.º do CIVA no art.º 161.º do Código Aduaneiro.
Nas conclusões b) a g) alega que estão em causa mercadorias, para comércio, que foram exportadas para uma empresa associada da, ora, Recorrente existente em território angolano e sujeita ao respetivo regime legal, e que foram transportadas, na sua bagagem, de Portugal para Angola por um dos administradores de ambas as empresas a quando da sua deslocação a esse país, como resulta do relatório de fiscalização tributária.
Entende que não sendo mercadorias, para comércio, que fossem exportadas através de terceira empresa transportadora, mas como bagagem da pessoa do administrador de ambas as empresas (de Portugal e de Angola), não havia obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros para emitir o documento alfandegário apropriado à exportação através dessa terceira empresa transportadora.
Sendo assim, a obrigação legal de exportação de mercadorias, para efeito de isenção de IVA nos termos do art.º 14.º, n.º 1, alínea a), do CIVA, comprova-se através de “declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado”, nos termos do referido n.º 8 do art.º 29.º do CIVA.
E que não se vê que outra hipótese factual possa caber no n.º 8 do art.º 29.º do CIVA, quando fala “de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhe irá ser dado”, a interpretar-se este preceito do jeito sufragado pela sentença recorrida, equivalerá a admitir que o legislador construiu o dispositivo legal com base em hipóteses absurdas de impossibilidade de verificação.
É precisamente para excluir essa posição hermenêutica que tem inteira pertinência a convocação dos referidos princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.
A apresentação da declaração por parte do adquirente do País terceiro satisfaz inteiramente as exigências de controlo por parte dos Países da Comunidade da transação das mercadorias para países terceiros da Comunidade Europeia, bem como as exigências do controlo de entrada de mercadorias no mercado deste País terceiro, para efeitos de tributação.
Apreciemos.
A alínea a) do n. º1 do artigo 14.º do CIVA, isenta de imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.
Por sua vez, o n.º 8 do art.º 29.º do CIVA sobre a epigrafe “Obrigação Geral “ preceitua que “As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.”
Por sua vez, o n.º 9 do art.º 29.º do CIVA “A falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador de serviços de liquidar o imposto correspondente.”
E como refere a sentença recorrida “Para sabermos quando é que existe obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros teremos que recorrer ao disposto no Código Aduaneiro (cf. REGULAMENTO (CE) N.º 450/2008 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 23 de abril de 2008 que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (Código Aduaneiro Modernizado)).
Efetivamente, a regra em matéria aduaneira é a da necessidade de documento apresentado ou exibido na estância aduaneira competente antes de as mercadorias saírem do território aduaneiro da Comunidade, conforme dispõem os artigos 175.º e ss. do CAC.
Tal como denota Carlos Batista da Costa em Código do IVA e RITI, Notas e Comentários, Coordenação e organização Clotilde Celorico Palma e António Carlos dos Santos, Almedina, junho 2014, anotação ao artigo 14.º, p. 191: “Na alínea a), a exportação concretiza-se através da transmissão de bens expedidos ou transportados para fora do território fiscal da União Europeia pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste, irrelevando a nacionalidade das partes intervenientes nas operações. Em última análise, o que é determinante é a saída para fora do território fiscal da União Europeia. Ainda assim, para que essas transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da União Europeia beneficiem desta isenção deve ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados, com a correspetiva indicação do destino que lhes irá ser dado. (artigo 29º/8)”
Isto é, incumbe ao sujeito passivo provar a transmissão de bens expedidos ou transportados para fora do território fiscal da União Europeia e, existindo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, como sucede na situação controvertida, a prova adequada e obrigatória tem que ser fundada nos documentos alfandegários apropriados à comprovação da exportação.
Facilmente se compreende porque é que o legislador nacional entendeu que o melhor meio de assegurar a aplicação correta e simples da isenção na exportação e de evitar qualquer possível situação de fraude, evasão ou abuso, seria condicioná-la à apresentação de prova, mediante a apresentação dos documentos alfandegários apropriados. E mais, afigura-se-nos que tais meios de prova são os adequados e respeitam os princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica, conforme jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE (TJUE) que veremos de seguida.
No Acórdão de 21 de Fevereiro de 2008, Processo C-271/06, Caso Netto Supermarkt, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 15.º, n.º 2, da Sexta Diretiva, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que os Estados membros isentem de IVA uma entrega de bens para exportação para fora da Comunidade quando os pressupostos dessa isenção não estão preenchidos, mas o sujeito passivo não pudesse aperceber-se disso, mesmo tendo atuado com a diligência de um comerciante avisado, devido à falsificação da prova de exportação apresentada pelo adquirente.
O TJUE faz notar que, “Como resulta da primeira parte do proémio do artigo 15.º da Sexta Diretiva, cabe aos Estados-Membros fixar as condições de aplicação da isenção de uma entrega de bens para exportação para fora da Comunidade. Esta disposição precisa igualmente que os Estados-Membros fixam essas condições com o fim «de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso.”.
Contudo, tal como nota, no exercício dos poderes que as diretivas comunitárias lhes conferem, os Estados membros devem respeitar os princípios gerais de direito que fazem parte da ordem jurídica comunitária, entre os quais, designadamente, os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade, bem como o da proteção da confiança legítima.
No Acórdão de 19 de Dezembro de 2013, Proc C-563/12, Caso BDV Hungary Trading, questiona-se, nomeadamente, se é compatível com os princípios da neutralidade fiscal, da segurança jurídica e da proporcionalidade, o facto de legislação de um Estado membro prever requisitos adicionais aos estabelecidos nas Diretivas e fazer depender de requisitos objetivos e cumulativos que delas não constam a qualificação de uma exportação como isenta, tendo em vista a prevenção da evasão, do abuso e da fraude fiscais, tendo em vista a uma correta liquidação e cobrança do imposto, podendo a Administração Fiscal alterar a qualificação de uma exportação isenta e exigir o pagamento do imposto ao sujeito passivo.
O TJUE volta a salientar que, “… como resulta do artigo 131.º da Diretiva 2006/112, as isenções previstas nos capítulos 2 a 9 do título IX desta diretiva, de que o artigo 146.º faz parte, aplicam-se nas condições fixadas pelos Estados-Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.”
Voltando a invocar o respeito pelos princípios da segurança jurídica, da proporcionalidade e da proteção da confiança legítima, o TJUE salienta que, embora seja legítimo que as medidas adotadas pelos Estados membros se destinem a preservar o mais eficazmente possível os direitos do Tesouro, essas medidas não devem exceder o necessário para atingir esse fim.
Volvendo ao caso dos autos, sabe-se que a AT indeferiu parcialmente um pedido de reembolso de IVA formulado pela Impugnante, tendo efetuado correções aritméticas em sede de IVA porquanto, relativamente aos bens exportados, “o sujeito passivo tem dois procedimentos distintos:
2. Na generalidade das transmissões de bens com destino a país terceiro (Angola) junto da fatura, encontra-se o exemplar 3 do Documento Administrativo Único (DAU) a documentar a operação de exportação, conforme estabelecido no n°8 do art.º 29° do CIVA;
Noutras situações (menos frequentes) verificamos que junto da fatura se encontra uma “declaração tipo " da empresa [SCom02...] onde é declarado que as mercadorias constantes da fatura foram adquiridas à [SCom01...], tendo as mesmas dado entrada nas suas instalações e com destino ao seu estaleiro central (ver anexo 1).
Solicitados esclarecimentos sobre a 2ª situação, foi-nos explicado que estas mercadorias são expedidas através de portador na sua bagagem pessoal sempre que existe alguém relacionado com a empresa que se desloque a Angola (Sr. «AA» - presidente do Conselho de administração, funcionários da empresa ou de outras empresas relacionadas).”
Ora, efetivamente, consideramos que não merece censura a atuação da AT, na medida em que, conforme vimos de expor, o legislador nacional, embora tenha deixado ao intérprete alguma margem de manobra ao referir-se a “documentos alfandegários apropriados”, faz depender a isenção invocada pela Impugnante de um tipo de documento específico – alfandegário – o que se compreende, uma vez que fazer depender, de uma forma geral, a atribuição da isenção, da mera declaração do adquirente, abriria a porta a um sem número de possibilidades de fraude.
Com efeito, entendemos que a “declaração tipo " da empresa [SCom02...] onde é declarado que as mercadorias constantes da fatura foram adquiridas à [SCom01...], tendo as mesmas dado entrada nas suas instalações e com destino ao seu estaleiro central, não é um documento que permita considerar as operações declaradas como exportações comprovadas através de documentos alfandegários apropriados.”
Com efeito, o assim decidido não nos merece censura.
Acresce referir que não pode vingar o argumento que “tais mercadorias só poderiam tratar-se de mercadorias cuja necessidade em Angola era urgente e poderiam ser facilmente transportadas como bagagens por uma pessoa, normalmente peças de máquinas ou acessórios.”
E que “… não sendo, também mercadorias que fossem exportadas através de terceira empresa transportadora mas como bagagem de pessoa do administrador de ambas empresas (de Portugal e de Angola), não havia obrigação legal da intervenção dos serviços aduaneiros para emitir o documento alfandegário apropriada à exportação através desta terceira transportadora.”
O facto da mercadoria ser transportada como bagagem de pessoa do administrador, de ambas empresas, não desculpabiliza a ausência do documento alfandegário, pois não deixa de configurar uma exportação de mercadoria.
Como resulta da matéria de facto provada no ponto 8, onde consta parcial transcrição do Relatório – no Item III – existe uma extensa lista de mercadoria (34 faturas) que estava contabilizada na contabilidade da Recorrente sem documento adequado.
Nesta conformidade improcede a pretensão da Recorrente.

4.3. Nas conclusões h) a k), a Recorrente alega, em síntese, que se o direito de audição não postular a estrita obrigação da administração de necessariamente se pronunciar sobre as razões de facto e de direito que o administrado invoca como fundamento para a decisão a proferir por ela dever ter determinado sentido, o direito de audição resumir-se-á a um simples formalismo e não estará impregnado de qualquer valor de garantia do administrado que constitui a ratio da sua previsão constitucional.
E que, pese embora a Recorrente tenha exercido o direito de audição com notória densidade, o certo é que a decisão da AT de tributação não contradisse as razões de direito alegadas pela contribuinte e demitiu-se de ouvir a testemunha indicada sobre os factos sob o argumento da eventual inutilidade do depoimento futuro, como se o agente tivesse o condão de adivinhar o conteúdo do depoimento futuro.
E que a sentença recorrida errou ao não considerar procedente o vício de forma alegado pela ora Recorrente.
Sobre a questão a sentença recorrida após fazer um enquadramento legal e jurisprudencial que não vem questionado, fez o seguinte julgamento “Na presente situação, não há dúvidas que a audiência prévia foi momento procedimental que não foi obliterado. Todavia, a Impugnante alega que a Administração não se pronunciou sobre a violação dos princípios por si invocada, o que consubstancia, no seu entender preterição de formalidade legal.
Efetivamente, de harmonia com o preceituado no artigo 60.º, nº.7, da LGT, se o titular do direito de audiência, no exercício deste direito, suscitar elementos novos, eles deverão ser considerados na fundamentação da decisão.
A apresentação destes elementos novos, se se tratar de elementos atinentes à matéria de facto, poderá justificar a realização de novas diligências que deverão ter lugar, oficiosamente ou a requerimento dos interessados, caso se devam considerar como convenientes para apuramento da matéria factual em que deve assentar a decisão (cfr. artigos 58.º, da LGT e 125.º, do CPA). A obrigatoriedade de ter em conta estes elementos novos, na fundamentação da decisão, traduz-se em eles deverem ser mencionados e apreciados. A falta de apreciação dos elementos factuais ou jurídicos novos invocados pelos interessados constituirá vício de forma, por deficiência de fundamentação, suscetível de levar à anulação da decisão do procedimento (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/02/2017, proc.5428/12; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita Editora, 4ª. Edição, 2012, pág.513; Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.437).
Todavia, in casu, como resulta do probatório (cfr. ponto 11 da matéria de facto), a AT tomou posição expressa sobre os argumentos expendidos pela Impugnante, na medida em que conduta que esta considerou, aquando do exercício do direito de audição (assim como na presente impugnação), violadora dos princípios da legalidade, igualdade, proporcionalidade, justiça e boa-fé – o facto de noutros procedimentos inspetivos a AT não ter efetuado qualquer correção, quando a situação de facto aqui em causa já se verificava – foi apreciada, para posteriormente se concluir que “A situação agora detetada pela inspeção (…) em nada fica prejudicada por este procedimento advir já de períodos anteriores e nunca ter sido corrigida pela inspeção”.
Nestes termos, deve concluir-se que no relatório da ação de inspeção, o teor dos argumentos expendidos pela Impugnante foram objeto de apreciação, muito embora tivessem sido considerados irrelevantes para a alteração do projeto de relatório final.
Com estes pressupostos, não vislumbra este Tribunal qualquer violação do regime de participação/audição prévia constante do citado artigo 60.º da LGT, pelo que improcede também o vício de preterição de formalidade legal em análise, improcedendo, in totum, a presente Impugnação.”
Com efeito decorre do facto provado ponto 11 da matéria de facto, que a AT tomou posição expressa sobre os argumentos expendidos pela Impugnante/Recorrente, apreciando as alegações as quais se limitava alegar a violação dos princípios da legalidade, igualdade, proporcionalidade, justiça e boa-fé e o facto de noutros procedimentos inspetivos a AT não ter efetuado qualquer correção.
A AT analisou substancialmente os argumentos pelo que não existe aqui qualquer violação do direito de audição.
A Recorrente alega ainda que a AT demitiu-se de ouvir a testemunha indicada sobre os factos sob o argumento da eventual inutilidade do depoimento futuro, como se o agente tivesse o condão de adivinhar o conteúdo do depoimento futuro.
Compulsado requerimento de audição efetuado pela Recorrente, e constante do PA apenso aos autos, dele não consta a indicação de qualquer testemunha, pelo que a AT não se demitiu de ouvir nem podia pronunciar-se sobre a utilidade do seu depoimento.
Acresce referir que o direito de audição confere ao contribuinte o direito de participar no projeto de decisão, trazendo à discussão factos novos, interpretação dos factos e do direito, não lhe garantindo que essa visão tenha vencimento.
Nesta conformidade, improcede o recurso.

4.4. E assim formulamos as seguintes conclusões/sumário:
I. A alínea a) do n. º1 do artigo 14.º do CIVA, isenta de imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.
II. O n.º 8 do art.º 29.º do CIVA sobre a epigrafe “Obrigação Geral “ preceitua que “As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.”
III. Por sua vez, o n.º 9 do art.º 29.º do CIVA “A falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador de serviços de liquidar o imposto correspondente.”

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso interposto, mantendo a sentença na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente, nos termos dos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

Porto, 29 de maio de 2025

Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Paulo Moura (1º Adjunto)
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes (2º Adjunto)