Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00970/22.8BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/09/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:VITOR SALAZAR UNAS
Descritores:OPOSIÇÃO;
REJEIÇÃO LIMINAR;
FALTA FUNDAMENTOS;
Sumário:
I – O despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior.

II – Residindo a ilegalidade no ato tributário e prevendo a lei meio de impugnação contenciosa, é manifesto que, neste caso, não se mostra preenchida nenhuma das situações taxativas elencadas no artigo 204.º do CPPT.

III – O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido.

IV - Inexiste erro na forma de processo quando pelo menos um dos pedidos é adequado à forma escolhida, no caso a oposição.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:


I – RELATÓRIO:

«[SCom01...], LDA.» NIPC ...64, com os demais sinais nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que rejeitou liminarmente, nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 209.º do CPPT, a oposição por si deduzida contra a execução fiscal n.º ....................0192, que a Secção de Processo Executivo do ..., do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. instaurou contra si, para cobrança coerciva de dívidas relativas a Entidades Empregadoras emergente de prestações indevidamente pagas, no valor global de € 22.289,82.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…).
I – De forma tempestiva e com legitimidade para o efeito, a Recorrente ofereceu garantia idónea, mediante caução, através de depósito, para a conta da Banco 1... ...79, titulada pela Segurança Social, pelo que deve o recurso ter efeito suspensivo, o que se requer;
II – Contudo, sempre salvo o devido respeito, merece censura a decisão proferida pelo Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto;
III - O presente recurso tem como objeto a decisão recorrida ao indeferir liminarmente a oposição por entender ser manifesta a sua improcedência, como de falta de alegação de fundamentos de oposição à execução fiscal consagrados no artigo 204º, n.º 1 do CPPT, ambas causas de rejeição liminar da oposição, nos termos das alíneas b) e c), do n.º 1 do art.º 209.º do CPPT, bem como a improcedência da exceção de litispendência arguida;
IV - Em 25 de maio de 2020, a aqui Recorrente foi notificada da Nota de Reposição N.º ...66 datada de 15 de maio de 2020, com o seguinte teor que se transcreve: “Informamos que de acordo com a comunicação anteriormente enviada, foi apurado o valor correspondente à totalidade do período de atribuição da prestação de desemprego que foi paga ao(s) seguinte(s) trabalhador(es):”conforme notificação inserta nos autos a fls…;
V - Os acordos de cessação celebrados ao abrigo do nº 1 e alínea a) do nº 4 do art. 10º do D.L. Nº 220/2006 e sucessivas alterações do D.L. Nº 68/2009 de 20.03, Lei nº 5/2010 de 05.05, D.L. Nº 72/2010 de 18.06 e D.L. Nº 64/2012 de 15.03 e D.L. Nº 13/2013 de 25.01, se deverem ao facto da Recorrente, na qualidade de entidade empregadora ter necessidade de extinguir postos de trabalho, reestruturando os serviços, resultante da execução da declaração do estado de emergência que ordenou o encerramento do estabelecimento;
VI - Em bom rigor, deveria ter recorrido ao despedimento coletivo invés do acordo de cessação do contrato de trabalho através do DL 220/2006, no entanto devido ao encerramento forçado do estabelecimento, a entidade empregadora entendeu que a norma legal tinha aplicabilidade e que não seriam tidas em conta as quotas, uma vez que a empresa encerrou;
VII - Pelo que, se tratou de um despedimento coletivo com o encerramento da empresa, cumprindo os critérios numéricos, qualitativos, cuja convolação a Recorrente requereu; Sem prescindir,
VIII - Com a 3º fase do plano de desconfinamento, a Recorrente decidiu abrir novamente o estabelecimento com data de 3 de junho de 2020, tendo procedido novamente à contratação das funcionárias «AA», «BB» e «CC», conforme comprovativos de admissão que constam dos autos a fls…;
IX - Pelo que, todas as trabalhadoras acima referenciadas já suspenderam o subsídio de desemprego;
X - O Instituto da Segurança Social, I.P. só pode exigir da entidade patronal, ao abrigo do art.° 63.° do Dec. Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, o reembolso das prestações a que o trabalhador teve efetivamente direito e não do que corresponderia à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego;
XI - Efetivamente o empregador só tem de compensar a Segurança Social pelo valor que esta efetivamente despendeu visto a responsabilidade ora em causa ser indemnizatória e não punitiva e, por essa razão, advir do prejuízo efetivamente sofrido pelo lesado e ter como medida o valor desse dano;
XII - Assim, sendo ilegal ressarcir alguém de um prejuízo que ele não teve (art.º 483.º do CC), é forçoso concluir que se a Segurança Social, por qualquer razão, só pagou uma parte do subsídio de desemprego a que as trabalhadoras tinham direito a entidade responsável pelo ressarcimento dessa quantia só terá o dever de a compensar por esse valor visto, de outra forma, se estar a exceder o dever indemnizatório do empregador e a provocar um enriquecimento sem causa da Segurança Social;
XIII - Nesse sentido se pronunciou já o Colendo Supremo Tribunal Administrativo e citando o Acórdão nº 01308/13 de 19-06-2014 (disponível em www.dgsi.pt): “A Segurança Social só pode exigir da entidade patronal, ao abrigo do art.° 63.° do Dec. Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, o reembolso das prestações a que o trabalhador teve efectivamente direito e não do que corresponderia à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego. (*)”;
XIV - Também nesse sentido se pronunciou o Tribunal Central Administrativo Norte e citando o Acórdão 00903/11.7BEAVR de 10-10-2014 (disponível em www.dgsi.pt): 1. Por força do que se dispõe no art.º 63.º do DL 220/2006, a entidade patronal não está obrigada a pagar à Segurança Social a totalidade das prestações devidas mesmo que – por qualquer razão – o trabalhador tenha perdido o direito à sua perceção e, por essa razão, aquele subsídio não tenha sido pago na sua totalidade.
2. Efetivamente o empregador só tem de compensar a Segurança Social pelo valor que esta efetivamente despendeu visto a responsabilidade ora em causa ser indemnizatória e não punitiva e, por essa razão, advir do prejuízo efetivamente sofrido pelo lesado e ter como medida o valor desse dano. 3. Assim, sendo ilegal ressarcir alguém de um prejuízo que ele não teve (art.º 483.º do CC), é forçoso concluir que se a Segurança Social, por qualquer razão, só pagou uma parte do subsídio de desemprego a que o trabalhador tinha direito a entidade responsável pelo ressarcimento dessa quantia só terá o dever de a compensar por esse valor visto, de outra forma, se estar a exceder o dever indemnizatório do empregador e a provocar um enriquecimento sem causa da Segurança Social.*”
XV - O ato que se impugna está, por todo o exposto, ferido de anulabilidade, nos termos do disposto no art.º 163.º do Código do Procedimento Administrativo, devendo a Segurança Social proceder à prática do ato devido, ou seja emissão de decisão em que apenas se exija o valor das prestações efetivamente recebidas pelos trabalhadores; e em termos subsidiários, e se o Douto Tribunal entender não existir ato impugnável, o enriquecimento sem causa da entidade pública Instituto da Segurança Social, I.P.; Sem prescindir,
XVI - A litispendência, pressupondo a repetição da mesma causa em dois processos, depende, pois, da verificação cumulativa da identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir;
XVII - A exceção de litispendência pressupõe a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência;
XVIII - A dívida e matéria em causa no âmbito do processo executivo acima referenciado, foram objeto de impugnação judicial contra a entidade credora Instituto da Segurança Social, I.P., encontrando-se a correr termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, Unidade Orgânica 2, sob o número 1597/20.4BEPRT;
XIX - Pelo que, com a presente execução fiscal ocorre a repetição da mesma causa em dois processos, verificando-se cumulativa a mesma identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir, pois a causa se repete estando a anterior ainda em curso, pelo que há lugar à litispendência;
XX - Termos em que deverá ser revogada a douta sentença recorrida ser revogada e consequentemente deverá ser proferida outra que considere a exceção de litispendência por provada, seguindo os autos os seus ulteriores termos; Sem prescindir,
XXI - O Tribunal "a quo" não atendeu corretamente ao objeto do processo, bem como aos elementos de prova que constam do processo executivo, muito pelo contrário não foram produzidas quaisquer provas para aferir da veracidade dos factos invocados pela ora recorrente, pelo que, daqui se entende, salvo melhor opinião que andou mal o tribunal "a quo" ao rejeitar a oposição por ser manifesta a improcedência, dado que não constam da sentença recorrida nenhum fundamento que justifique tal improcedência;
XXII - Nem tão pouco foram realizadas as diligências probatórias necessárias para se aferir da séria existência séria ou não dos factos e do direito invocado pela oponente;
XXIII - Por diversas vezes, a jurisprudência do douto Supremo Tribunal Administrativo expressou o entendimento de que o indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo em todo impossível o aproveitamento da petição inicial, isto tendo em atenção que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo;
XXIV - Pelo que, o despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial», vide Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 26.09.2012, Recurso 377/12, de 16.05.2012, Recurso 212/12, de 12.01.2011, Recurso 766/10 e de 24.02.2011, Recurso 765/10, todos in www.dgsi.pt:
XXV - Desta forma, não estamos perante um caso que justifique a manifesta improcedência, pois a inviabilidade da oposição deduzida pela ora recorrente, salvo o devido respeito, não pode ser considerada irremediavelmente evidente;
XXVI - Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 203.º e seguintes do CPPT, o Tribunal "a quo" deveria ter recebido a presente oposição e, em consequência, determinar a suspensão do processo executivo;
XXVII - Termos em que e por violação do disposto nos artigos 203.º, 204.º e 209, n.º 1, alínea c) do CPPT deverá a sentença recorrida ser revogada e consequentemente deverá ser proferida outra que receba a presente oposição, e, em consequência, determine a suspensão do processo executivo, seguindo os autos os seus ulteriores termos;
XXVIII - Pelo que a sentença recorrida se encontra ferida de nulidade nos termos do disposto na alínea d), do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável subsidiariamente;
XXIX - A sentença recorrida refere que estão assegurados meios judiciais de impugnação das liquidações, sendo manifesto que, também aqui, não é possível a procedência da Oposição à Execução, indiciando mais uma vez que podemos estar perante um erro na forma do processo, erro esse que consubstancia uma nulidade processual de conhecimento oficioso (artigos 193.º e 196.º do Código de Processo Civil, “ex vi" do artº.2, alínea e), do C.P.P.T.), o que deve ser conhecido no despacho saneador, conforme estipulado no (artigo 595.º, nº.1, al. a), do Código de Processo Civil) ou, não existindo este, até à sentença final (artigo 200.º, nº.2, do Código de Processo Civil) e só pode ser arguido até à contestação ou neste articulado (artigo 198.º, nº.1, do Código de Processo Civil), sendo que, a causa de pedir é irrelevante para efeitos de exame do eventual erro na forma do processo, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado pela parte;
XXX - ln casu, no processo judicial tributário, o erro na forma do processo igualmente substância uma nulidade processual de conhecimento oficioso, consistindo a sanação na convolação para a forma de processo correta, importando, unicamente, a anulação dos atos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei, conforme estipulado no artigo 97.º, nº.3, da L.G.T. e artigo 98.º, n.º 4, do C.P.P.T.;
XXXI - Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição;
XXXII - O que pode e deve ser objeto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efetuadas por aquelas decisões, conforme previsto no artigo 204.º, da C.R. Portuguesa;
XXXIII - Ao abrigo do artigo 268.º, n.º 4, da C.R. Portuguesa, é garantido aos administrados tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer atos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, e a determinação da prática de atos administrativos legalmente devidos;
XXXIV - Na mesma linha, no artigo 9, n.º 1, da L.G. Tributária, garante-se o acesso à justiça tributária para a tutela plena e efetiva de todos os direitos ou interesses legalmente protegidos, e o direito a uma tutela jurisdicional efetiva consubstancia-se como o direito a obter, em prazo razoável, decisões que apreciem, com força de caso julgado, as pretensões regularmente deduzidas em juízo (isto é, as pretensões que forem apresentadas na observância dos pressupostos processuais de cujo preenchimento depende, nos termos da lei, a obtenção de uma pronúncia judicial sobre o respetivo mérito) e a possibilidade de fazer executar essas decisões;
XXXV - O artigo 103.º, da C.R.P., principalmente os seus nºs. 2 e 3, consagra o princípio da legalidade fiscal como um dos elementos estruturantes do Estado de direito constitucional, especificamente o artigo 103.º, nº.3, da C.R.P., reconhece, além do mais, o direito de não pagamento de impostos cuja liquidação e cobrança se não façam na forma prescritas na lei, assim consagrando uma espécie de direito de resistência à imposição de exações fiscais inconstitucionais ou ilegais (vide artigo 21.º, da C.R. Portuguesa);
XXXVI - A sentença recorrida é inconstitucional por violação do artigo 103.º, da C.R.P., em conjugação com o artigo 17.º também da C.R.P. que estabelece o direito fundamental de natureza análoga de que ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, cuja liquidação e cobrança não se façam nos termos da lei, inconstitucionalidade essa que desde já se invoca para efeito de eventual e futuro recurso para o Tribunal Constitucional;
XXXVII - Termos em que deverá ser revogada a douta sentença recorrida ser revogada e consequentemente deverá ser proferida outra que receba a presente oposição, e, em consequência, determine a suspensão do processo executivo, seguindo os autos os seus ulteriores termos;

Nestes termos, e nos melhores de direito que mui doutamente serão supridos, deve a douta sentença em apreço ser revogada, e, em consequência, substituída por outra que julgue no sentido defendido pela ora Recorrente, isto é que receba a presente oposição, e, em consequência, determine a suspensão do processo executivo, seguindo os autos os seus ulteriores termos, assim se fazendo Justiça!»

*
Não foram apresentadas contra alegações.
*
O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*

Com dispensa dos vistos legais [cfr. artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre apreciar e decidir o presente recurso.

*


II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR.
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações - cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em saber, em suma, se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao ter concluído pela rejeição liminar da oposição, nos termos do disposto no art. 209.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPPT, por inexistência de invocação de fundamentos válidos de oposição e por ser manifesta a sua improcedência.
*
III – FUNDAMENTAÇÃO:
Na decisão em discussão não foi selecionada e autonomizada matéria de facto, pelo que se passa a transcrever todo o seu discurso fundamentador, do qual se retira a matéria de facto subjacente à decisão tomada.
«Nos termos do disposto no art.º 209.º, n.º1 do Código de Processo Tributário “Recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por um dos seguintes fundamentos:
a) Ter sido deduzida fora do prazo;
b) Não ter sido alegado algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º;
c) Ser manifesta a improcedência”.
Ora, a questão que importa decidir, desde logo, é a viabilidade do prosseguimento dos autos, considerando os intervenientes processuais, a causa de pedir e o pedido formulados, ainda, em conjugação com o disposto no n.º 1 do art.º 590.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art.º 2.º, alínea e) do CPPT., sob pena de ser determinada a prática de actos inúteis, igualmente proibidos por lei, em situações como a presente em que dos autos constam todos os elementos necessários à decisão da questão identificada, dispensando-se o contraditório por manifesta desnecessidade de acordo com o disposto no artigo 3.º n.º 3 do Código de Processo Civil aplicável por força do artigo 2º al. e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Vejamos.
Diga-se desde já que a presente oposição está irremediavelmente votada ao insucesso.
Tal como supra referimos a Opoente sustenta e apresenta como causa de pedir da presente oposição a circunstância de, de acordo com o seu entendimento, não ser devedora das dívidas exequendas, ou, pelo menos, na sua globalidade. Sendo que nem sequer indica em qual(is) do(s) fundamento(s) do elenco do n.º 1 do artigo 204º do CPPT sustenta a sua pretensão.
Donde resulta manifesto que a Opoente vem no presente processo de oposição à execução fiscal sustentar a ilegalidade da concreta dívida exequenda, afirmando que, nos termos legais aplicáveis, a Opoente não é devedora da globalidade da mesma.
Afirma-se desde já que tal alegação, concatenando a causa de pedir formulada pela Opoente (não ser devedora da globalidade da dívida exequenda) com os fundamentos de oposição à execução fiscal consagrados nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 204º do CPPT), irá irremediavelmente soçobrar e, consequentemente, improceder.
Pois como bem sedimentado está na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, a ilegalidade concreta da dívida exequenda não é fundamento de oposição à execução fiscal, sendo excelente súmula do referido entendimento o Acórdão STA, de 14/09/2016, tirado no processo n.º 0191/16, onde se exarou: “…A Oponente invocou também como fundamento da oposição à execução fiscal a ilegalidade da liquidação que deu origem à dívida exequenda, considerando que esse acto tributário de liquidação enferma de ilegalidades várias …
Como bem salientou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra no despacho recorrido, os fundamentos admissíveis de oposição à execução fiscal são exclusivamente os que constam do rol taxativo do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
Ora, apesar de a alínea h) do n.º 1 do invocado art. 204.º do CPPT possibilitar que a legalidade em concreto da liquidação se aprecie também em sede de oposição, tal possibilidade está limitada aos casos em que «a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação», o que não é, manifestamente, o caso dos autos, em que a liquidação teve origem em acto tributário (cfr. art. 268.º, n.º 4, da Constituição da República e arts. 99.º e 124.º, n.º 1, do CPPT)…
Ora, manifestamente, a ilegalidade a que se refere a Oponente na petição inicial é a ilegalidade em concreto, a resultante da aplicação da lei à concreta situação factual. Ela mesma o admite, ao afirmar que a invocada ilegalidade é «decorrente da inaplicabilidade do imposto ao caso concreto» (cfr. conclusão XV)… O que a Oponente questiona é, isso sim, a existência de facto tributário e, subsidiariamente, a quantificação da matéria tributável. Ora, a alegada não verificação dos pressupostos fácticos e de direito considerados pela entidade exequente na liquidação do tributo exequendo (de cuja falta de pagamento voluntário resultou a emissão do título executivo) não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, pois tal alegação reconduz-se à ilegalidade concreta da liquidação, a qual só pode erigir-se em fundamento de oposição à execução fiscal nas situações em que a dívida exequenda não tenha origem em acto tributário ou administrativo prévio.
Assim, no caso nunca a oposição à execução fiscal poderia proceder com fundamento na ilegalidade da liquidação, nos termos em que a ora Recorrente a conformou.
A discussão contenciosa do fundamento invocado pela Oponente só poderia ter lugar em sede de impugnação judicial. Não é sequer de ponderar a convolação da petição inicial de oposição em impugnação judicial (ao abrigo do disposto no art. 97.º, n.º 3, da LGT e do art. 98.º, n.º 4, do CPPT) – para a qual sempre se teria de indagar da possibilidade de interpretar o pedido (cuja formulação nem sequer indica, como devia, qual o efeito jurídico pretendido) como de anulação da liquidação (possibilidade que este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a admitir) –, uma vez que a Oponente já deduziu a impugnação judicial…” – acórdão disponível para consulta em www.dgsi.pt.
Mobilizando a jurisprudência supra referida para o caso vertente, temos que ressalta evidente que a Opoente vem nos presentes autos suscitar a ilegalidade concreta da dívida exequenda. Pelo que, conferindo o pedido formulado pela Opoente – procedência da presente oposição à execução fiscal – com a causa de pedir mobilizada pela mesma, temos que a Opoente por um lado não logrou apresentar fundamentos de oposição à execução fiscal legalmente admitidos, e, por outro, não logrou apresentar factos e/ou elementos que se subsumissem nos fundamentos de oposição à execução fiscal, pelo que a presente acção a prosseguir irá sempre improceder.
Devendo-se ainda referir que de acordo com o conteúdo dos docs. juntos pela Opoente, manifesto é que existe meio legal próprio para a impugnação judicial da decisão de onde emergiu a dívida exequenda. Sendo que tanto assim é, que a próprio Opoente refere no artigo 9º da sua petição de oposição que apresentou impugnação judicial onde sindica a legalidade da dívida exequenda.
E o mesmo se diga quanto à alegação de litispendência formulada pela Opoente.
Refira-se desde já que a arguição da excepção de litispendência em nada beneficiará a Opoente. Pois que o resultado que, caso a mesma se verificasse, emergiria seria o da absolvição da Fazenda Pública da instância, e não a extinção de qualquer processo executivo.
Depois porque a impugnação judicial de actos administrativos que determinam ou impõem o pagamento de quantias por parte de particulares (junto dos Tribunais Administrativos de Círculo – artigos 44º, n.º 1 e 4º, n.º 1 alínea b) do ETAF) ou de actos de liquidação de tributos (junto dos Tribunais Tributários – artigo 49º, n.º 1 do ETAF) e os processos de execução fiscal onde se procede à cobrança coerciva de dívidas consubstanciam processos judiciais de diferente natureza – sendo o 1º um processo de natureza constitutiva e o 2º um processo de natureza executiva – o qual visa dar execução a decisão previamente proferida, verificando-se somente no processo tributário a especificidade de se desencadear o processo executivo ainda enquanto sobre o acto a executar não se formou caso decidido ou julgado ( artigos 97º e 102º, 86º, 88º e 188º do CPPT). Sendo que no presente caso a Opoente não litiga em ambos os processos na mesma qualidade, pois no processo litiga enquanto impugnante, isto é, enquanto sujeito que coloca em causa a validade de um acto que sobre si foi emitido, e nos presentes autos de oposição litiga enquanto sujeito de um processo executivo, no qual lhe está a ser cobrado uma dívida que o mesmo não pagou no respectivo prazo de pagamento e não lhe foi concedida causa de suspensão deste processo executivo.
Donde resulta que manifesto é que não existe litispendência entre um processo de impugnação e uma oposição à execução fiscal, ainda que o Opoente seja o impugnante daquela acção e mobilize a mesma causa de pedir em ambos os processos.
Embora os pedidos formulados na oposição e na impugnação sejam os mesmos e a causa de pedir seja idêntica, o sujeito não intervém nas duas acções na mesma qualidade jurídica - pois que o faz na qualidade de oponente na oposição e na de impugnante na impugnação – não se verificando, pois, repetição da causa, e consequentemente excepção de litispendência.” – Acórdão STA, de 19/09/2012, processo n.º 0472/12, disponível em www.dgsi.pt.
Donde resulta que também é manifesto e evidente que no presente caso também nunca procederá a excepção de litispendência arguida pela Opoente.

Assim, por tudo quanto ficou exposto, resta concluir que a oposição aqui deduzida pela Opoente está visível e inexoravelmente votada ao insucesso, configurando a presente acção, desse modo, tanto uma situação de manifesta improcedência da oposição, como de falta de alegação de fundamentos de oposição à execução fiscal consagrados no artigo 204º, n.º 1 do CPPT, ambas causas de rejeição liminar da oposição, nos termos das alíneas b) e c), do n.º 1 do art.º 209.º do CPPT, o que se decide – cfr. em, idêntico sentido Acórdão TCA Sul de 28/04/2017, processo n.º 9422/16, disponível para consulta em www.dgsi.pt.»

*
IV - DE DIREITO:
Cumpre, então, apreciar e conhecer as questões suscitadas no presente recurso, conforme supra enunciadas, sendo certo que o tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito [cfr. artigo 5.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art.º 2.º, alínea e) do CPPT.].
*
DO ERRO DE JULGAMENTO.
Nos termos do disposto no art.º 209.º, n.º 1 do Código de Processo Tributário “Recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por um dos seguintes fundamentos:
a) Ter sido deduzida fora do prazo;
b) Não ter sido alegado algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º;
c) Ser manifesta a improcedência”.
A jurisprudência do STA já, por várias vezes, expressou o entendimento de que o indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo em todo impossível o aproveitamento da petição inicial, isto tendo em atenção que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo.
Assim, o despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» - cfr. neste sentido, vide, por todos, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 26.09.2012, proc. n.º 377/12, de 16.05.2012, proc. n.º 212/12, de 12.01.2011, proc. n.º 766/10 e de 24.02.2011, proc. n.º 765/10, disponíveis para consulta em www. dgsi.pt.
Vejamos, então, se no caso concreto errou o tribunal a quo ao ter rejeitado liminarmente a oposição, considerando as conclusões de recurso.
As conclusões IV. a XIV., são uma súmula do teor dos pontos 11.º a 34.º da motivação do recurso, sendo estas uma repetição literal da causa de pedir gizada nos artigos 13.º a 36.º da petição inicial.
Em suma, alega a Recorrente que o Instituto da Segurança Social, I.P. só pode exigir da entidade patronal, ao abrigo do art.° 63.° do Dec. Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, o reembolso das prestações a que o trabalhador teve efetivamente direito e não do que corresponderia à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego (que constitui a dívida exequenda). Pugnando, por isso, que «[o] ato que se impugna está, por todo o exposto, ferido de anulabilidade, nos termos do disposto no art.º 163.º do Código do Procedimento Administrativo.»
Ora, atendendo à fundamentação da sentença sub iudice, acima transcrita, considerando o teor da causa de pedir, em conjugação com as referidas conclusões de recurso, nenhuma censura merece o que judiciosamente ali ficou espelhado.
Vejamos.
Nos termos da alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT é fundamento de oposição à execução fiscal a «ilegalidade da liquidação da dívida exequenda», mas logo aí se ressalva que a discussão da legalidade da liquidação só é possível quando «a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação».
Conforme se afirma no acórdão do STA, de 16.01.2019, proc. n.º 011/16, disponível para consulta em www.dgsi.pt, «[é] jurisprudência uniforme dos tribunais tributários, designadamente do Supremo Tribunal Administrativo, que não é possível discutir em sede de oposição à execução fiscal a legalidade da liquidação que deu origem ao tributo, nem a legalidade do ato administrativo que esteja na origem da dívida exequenda, uma vez que a lei assegura meio judicial de impugnação desses atos.
Salienta ainda a jurisprudência que não se equipara à ausência de meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato aquela em que o executado não foi oportunamente notificado para exercer o direito de impugnar; nesta situação, a falta de notificação apenas determinará a não abertura do prazo para exercer o direito de impugnação e já não a possibilidade de transferir a discussão da legalidade da liquidação do meio próprio para a oposição à execução fiscal.» - sublinhados nossos [neste sentido, vide, por todos, os acórdãos do STA de 28.10.2020, proc. n.º 0539/13.8BEBRG e de 26.10.2022, proc. n.º 0446/18.8BELRA, disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.
Outrossim, a oponente não invoca qualquer facto que seja subsumível às situações previstas na alínea a) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, (ilegalidade abstrata) como sejam (1) a inexistência do tributo nas leis em vigor à data dos factos a que respeita ou (2) não estar autorizada a sua cobrança à data da liquidação, se se tratar de um tributo relativamente ao qual ela dependa de autorização. Ao invés, clama a ilegalidade (concreta) do ato que ordenou a restituição das prestações indevidamente pagas, por falta de pressupostos de facto e de direito, pelo que, também, é manifesto que não se mostram preenchidas, pela realidade material convocada na petição inicial, as condições do normativo legal sob exegese.
Finalmente, não tem a factualidade alegada cobertura legal na alínea i) do n.º 1 daquele preceito legal. Na verdade, como se extrai do normativo em evidência, na oposição poderão ser invocados «[q]uaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.». – sublinhado nosso. Ora, do exposto, inelutavelmente, se conclui que todos os factos invocados pela oponente, nos aludidos pontos da PI. reconduzem-se à invocação de vício de violação de lei por erro nos pressupostos da liquidação subjacente à instauração da execução fiscal, que, por contender com a legalidade concreta da liquidação, não tem enquadramento na referida alínea i).
Destarte, não se verifica no presente caso, relativamente às questões suscitadas na petição inicial referentes à ilegalidade das liquidações que estão na origem da instauração do processo de execução fiscal, o preenchimento de nenhum dos fundamentos taxativos do tecido legal previsto no artigo 204º do CPPT.
E, assim sendo, como é, improcede o presente recurso, neste segmento.
*
Da litispendência.
Nas conclusões XVI. a XX. [que refletem uma súmula dos pontos 36.º a 42.º da motivação do recurso, que, por sua vez, reproduzem ipsis litteris os artigos 5.º a 12.º da PI.], pugna a Recorrente pela verificação da litispendência.
Para o efeito, concretiza a sua pretensão aduzindo que a «dívida e matéria em causa no âmbito do processo executivo acima referenciado, foram objeto de impugnação judicial contra a entidade credora Instituto da Segurança Social, I.P., encontrando-se a correr termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, Unidade Orgânica 2, sob o número 1597/20.4BEPRT [conclusão XVIII]; «Pelo que, com a presente execução fiscal ocorre a repetição da mesma causa em dois processos, verificando-se cumulativa a mesma identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir, pois a causa se repete estando a anterior ainda em curso, pelo que há lugar à litispendência [conclusão XIX].
Para melhor análise, replicamos o excerto da decisão recorrida, na parte, que conheceu desta questão.
«(…).
Refira-se desde já que a arguição da excepção de litispendência em nada beneficiará a Opoente. Pois que o resultado que, caso a mesma se verificasse, emergiria seria o da absolvição da Fazenda Pública da instância, e não a extinção de qualquer processo executivo.
Depois porque a impugnação judicial de actos administrativos que determinam ou impõem o pagamento de quantias por parte de particulares (junto dos Tribunais Administrativos de Círculo – artigos 44º, n.º 1 e 4º, n.º 1 alínea b) do ETAF) ou de actos de liquidação de tributos (junto dos Tribunais Tributários – artigo 49º, n.º 1 do ETAF) e os processos de execução fiscal onde se procede à cobrança coerciva de dívidas consubstanciam processos judiciais de diferente natureza – sendo o 1º um processo de natureza constitutiva e o 2º um processo de natureza executiva – o qual visa dar execução a decisão previamente proferida, verificando-se somente no processo tributário a especificidade de se desencadear o processo executivo ainda enquanto sobre o acto a executar não se formou caso decidido ou julgado ( artigos 97º e 102º, 86º, 88º e 188º do CPPT). Sendo que no presente caso a Opoente não litiga em ambos os processos na mesma qualidade, pois no processo litiga enquanto impugnante, isto é, enquanto sujeito que coloca em causa a validade de um acto que sobre si foi emitido, e nos presentes autos de oposição litiga enquanto sujeito de um processo executivo, no qual lhe está a ser cobrado uma dívida que o mesmo não pagou no respectivo prazo de pagamento e não lhe foi concedida causa de suspensão deste processo executivo.
Donde resulta que manifesto é que não existe litispendência entre um processo de impugnação e uma oposição à execução fiscal, ainda que o Opoente seja o impugnante daquela acção e mobilize a mesma causa de pedir em ambos os processos.
“Embora os pedidos formulados na oposição e na impugnação sejam os mesmos e a causa de pedir seja idêntica, o sujeito não intervém nas duas acções na mesma qualidade jurídica - pois que o faz na qualidade de oponente na oposição e na de impugnante na impugnação – não se verificando, pois, repetição da causa, e consequentemente excepção de litispendência.” – Acórdão STA, de 19/09/2012, processo n.º 0472/12, disponível em www.dgsi.pt.
Donde resulta que também é manifesto e evidente que no presente caso também nunca procederá a excepção de litispendência arguida pela Opoente.»
Sendo esta a fundamentação extratada da sentença recorrida somos levados, desde já, a adiantar que a mesma, também neste segmento, não merece qualquer reparo ou censura, antes, granjeando a nossa anuência, pela sua clareza, justeza e conformidade com os factos apurados, acrescentando, apenas, o que se segue.
A exceção de litispendência encontra-se prevista, desde logo, como sendo dilatória e de conhecimento oficioso, no art.º 89.º, n.ºs 1, 2 e 4, al. l), do CPTA [aplicável por força da alínea d), do art. 2.º do CPPT]. No entanto, o seu regime geral resulta do estabelecido no CPC (aplicável por remissão do art.º 1.º do CPTA), sendo certo que, também neste caso, vem prevista como exceção dilatória e igualmente de conhecimento oficioso, nos termos dos art.ºs 577.º, al. i) e 578.º.
Segundo o art.º 580.º, n.º 1, do CPC, as exceções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência. O n.º 2 da mesma norma clarifica o regime, estabelecendo que tanto a exceção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior.
O cerne do regime da litispendência resulta, no entanto, do instituído pelo art.º 581.º do CPC, o qual fixa os requisitos de que depende a verificação de litispendência, e que, pela sua importância, se transcreve:
«Artigo 581.º
Requisitos da litispendência e do caso julgado
1. Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2. Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3. Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4. Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico. Nas ações reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas ações constitutivas, e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.»
Como a propósito referem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “[d]á-se a litispendência (…) quando se instaura um processo, estando pendente, no mesmo ou em tribunal diferente, outro processo entre os mesmos sujeitos, tendo o mesmo objecto, fundado na mesma causa de pedir. A litispendência, como excepção dilatória, pressupõe assim a repetição da acção em dois processos diferentes” – cfr. Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2004, pág. 301.
Estamos, assim, perante o requisito da tríplice identidade, ou seja, para que exista litispendência é necessário que, cumulativamente, se verifique entre as ações em análise: identidade de sujeitos processuais; identidade de causa de pedir; e identidade dos pedidos formulados.
Como se deixou assinalado, entre outros, no sumário do acórdão do STA de 15.10.2014, proferido no processo n.º 0906/14, disponível em www.dgsi.pt, “a litispendência só ocorrerá se, cumulativamente, nas acções em apreciação, intervierem as mesmas partes, sob a mesma qualidade jurídica, pretendendo obter, nessas acções, o mesmo efeito jurídico e esse efeito jurídico tiver por causa o mesmo facto jurídico”.
Vejamos se, in casu, se verifica essa tríplice identidade. E, desde já, avançamos que não.
Ora, na ação administrativa n.º 1597/20.4BEPRT, a autora é a ora Reclamante e Ré o Instituto da Segurança Social, I.P., na execução fiscal, o Exequente é a Secção de Processo do ... do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP e executada a ora Recorrente. Donde, para além de não serem os mesmos os sujeitos processuais, também a posição assumida pelas partes não é a mesma (o que, inelutavelmente, vai, também, ter reflexos nos (diferentes) fins visados por cada uma das ações.
Concluindo-se, pois, pela falta de, pelo menos, um dos requisitos cumulativos da litispendência, a mesma não se verifica, no caso sub judice.
Destarte, não se podendo acolher também nesta sede recursiva a pretensão da Recorrente, terá a mesma que improceder.
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Em conclusão, no caso objeto, verificando-se de forma patente e evidente quer a falta de fundamentos válidos de oposição quer a manifesta improcedência da oposição, não merece qualquer reparo a decisão recorrida que rejeitou liminarmente a oposição, nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 do art.º 209.º do CPPT, sem necessidade de qualquer contraditório, pois, qualquer instrução (produção de prova) e discussão posterior sobre a matéria alegada traduzir-se-ia num desperdício manifesto da atividade judicial, tal como é jurisprudencialmente consagrado.
Assim, improcedem, também, tudo o que vem exteriorizado nas conclusões XXI a XXII.
Prosseguindo.
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Na conclusão XXVIII., a Recorrente, no seguimento do que vem alegado nas conclusões anteriores, remata «[p]elo que a sentença recorrida se encontra ferida de nulidade nos termos do disposto na alínea d), do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável subsidiariamente». Ora, atendendo a toda a explanação levada a cabo nas conclusões e respetiva motivação, a Recorrente a única patologia que imputa à decisão recorrida é o erro de julgamento, conforme foi conhecido, e não, também, nulidade de sentença por omissão de pronúncia. E, sendo assim, tal remate, para além de não vincular o tribunal [art.º 5.º, n.º 3 do CPC], não traduz o vício imputado à decisão em crise, razão pela qual não se encontra minimamente sustentado (não refere quais as questões que teriam que ser objeto de conhecimento e que não o foram).
No entanto, no sentido de pacificar as partes, sempre se dirá que o tribunal a quo conheceu das questões que cumpria conhecer. Assim, considerando os factos que estruturavam a causa de pedir da oposição, relativos à ilegalidade concreta da dívida exequenda, julgou não serem fundamentos de oposição. Motivo pelo qual lhe estava vedado o conhecimento sobre o mérito da oposição, nesta parte; e, no que diz respeito à litispendência, conhecendo da questão, julgou-a manifestamente improcedente.
Donde, sem necessidade de maiores considerações, sempre seria de improceder a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
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Nas conclusões XXIX. e XXX., insurge-se contra a decisão recorrida, com esforço interpretativo por parte do tribunal, por não ter convolado na forma de processo correta face à verificação de erro na forma de processo.
Tendo presente a fundamentação da sentença recorrida, adiantamos que teremos que responder negativamente à questão aqui em análise.
Em primeiro lugar, porque, tal como se verifica pelo teor da decisã em escrutínio, a sentença não concluiu pela ocorrência de erro na forma de processo, pressuposto para que se pudesse avançar para a possibilidade de convolação, mas pela rejeição liminar da oposição.
Ora, o erro na forma de processo afere-se pelo pedido ou pretensão que o autor pretende obter do tribunal com o recurso à ação.
O pedido é o efeito jurídico que se pretende obter com a ação, ou seja, a finalidade, o resultado, a providência que se quer alcançar, e constitui vinculação temática para o tribunal, como decorre da conjugação do disposto nos artigos 3.º, n.º 1, 609.º, n.º 1, e 615.º, n.º 1, al. e), do CPC.
Ora, o pedido formulado nos seguintes moldes: «(…), deve: (…) A oposição ser julgada procedente, por provada, conforme os fundamentos acima descritos e absolver a executada de todo o pedido, é adequado ao meio processual utilizado, v. g. à oposição à execução fiscal e ao efeito com esta visado, qual seja, o de obter a extinção do processo executivo, relativamente, no caso, à Oponente.
E, com efeito, aferindo-se unicamente a adequação do meio processual pelos pedidos formulados a final da PI., ter-se-á de concluir pela inexistência de erro na forma de processo.
Por outro lado, como é pacificamente assente na doutrina e na jurisprudência, sempre impossibilitaria a convolação da petição inicial em Ação Administrativa a existência de pedidos correspondentes a formas processuais distintas, como se verifica no caso objeto. Ademais, encontra-se pendente a Ação Administrativa que corre os seus termos sob o n.º 1597/20.4BEPRT,instaurada pela Recorrente contra o ISS, IP., com vista à anulação do despacho que determinou a restituição das verbas recebidas, que constituem o objeto da execução fiscal, pelo que sempre seria inoperante a convolação, por se traduzir na prática de um ato inútil dos quais o tribunal tem de se abster de praticar [art. 130.º do CPC].
Pelo exposto, improcede igualmente o recurso neste segmento recursivo.

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Nas conclusões XXXIII a XXXVII, invoca os artigos 268.º, n.º 4 e 103.º (em conjugação com o arts. 17.º e 21.º) da Constituição da República Portuguesa para concluir inconstitucionalidade da sentença por violação dos referidos direitos/princípios.
Nesta sede, cumpre dizer que, não obstante a enunciação dos artigos ínsitos na Lei Fundamental, a verdade é que o Recorrente não ensaiou sequer uma tentativa de densificar em que medida é que a sentença recorrida fez uma interpretação da lei que violasse os mencionados artigos de modo a permitir ao tribunal uma sindicância sobre a bondade da sua argumentação, pelo que tanto bastaria para que o recurso improcedesse, sem mais.
No entanto, não será despiciendo mencionar que não se vislumbra a este tribunal que, em concreto, tenha sido violado qualquer direito ou princípio constitucional. O que se verifica é que à ora Recorrente foram-lhe garantidos o acesso ao direito e a tutela jurisdicional efetiva, conforme propugnado no art.s 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Desde logo, através do recurso à via judicial através da presente oposição judicial. Por outro lado, no caso concreto, a falta de invocação de fundamentos de oposição, originadora da rejeição liminar, só à ora Recorrente é imputável. Sendo certo que, tendo sido notificada anteriormente do despacho que determinou a devolução dos montantes recebidos pelo ISS, IP, que constituem a quantia exequenda, a Recorrente deu entrada da Ação Administrativa contra este Instituto, com vista à anulação de mencionado despacho e que corre os seus termos sob o n.º 1597/20.4BEPRT. Nesta medida, encontram-se salvaguardados os seus direitos de defesa e à tutela jurisdicional efetiva.
Destarte, improcede o recurso nesta parte.

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Nestes termos, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença recorrida no ordenamento jurídico.

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Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC., formula-se o seguinte SUMÁRIO:
I – O despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior.
II – Residindo a ilegalidade no ato tributário e prevendo a lei meio de impugnação contenciosa, é manifesto que, neste caso, não se mostra preenchida nenhuma das situações taxativas elencadas no artigo 204.º do CPPT.
III – O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido.
IV - Inexiste erro na forma de processo quando pelo menos um dos pedidos é adequado à forma escolhida, no caso a oposição.

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V – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença recorrida no ordenamento jurídico.


Custas a cargo da Recorrente.


Porto, 09 de maio de 2024

Vítor Salazar Unas
Maria do Rosário Pais
Cristina Travassos Bento