Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01869/24.9BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/20/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:PAULO FERREIRA DE MAGALHÃES
Descritores:LEI N.º 60/2005, DE 29 DE DEZEMBRO; DIREITO DE INSCRIÇÃO NA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES;
LEI N.º 45/2004, DE 27 DE DEZEMBRO;
RETROACTIVIDADE DA INSCRIÇÃO;
Sumário:
1 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

2 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

3 - No que é atinente à entrada em vigor da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, não podendo ser obnubilado que está em apreço neste Tribunal Superior um recurso jurisdicional que visa impugnar a Sentença recorrida que aplicou o direito prévigente, e por outro lado, que aquele recente diploma legal convoca no seu articulado a apreciação de diferentes termos e pressupostos para efeitos da aplicação do regime jurídico nele vertido, de que ressaltamos os elencados sob a alínea b) do n.º 2 do seu artigo 2.º [que o Tribunal a quo veio a convocar], mesmo ao abrigo desse novo regime jurídico estabelecido, os factos que foram dados como provados [e quanto ao que a Recorrente não endereça qualquer pretensão recursiva] permitiram formar a convicção de que Autora ora Recorrida pode e deve ser enquadrada no regime legal previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 2.º daquela Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, situação jurídica essa que não obsta à consideração da retroactividade da reinscrição.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP [devidamente identificada nos autos], Co-Ré na acção que contra si foi intentada pela Autora «AA» [também devidamente identificada nos autos], inconformada com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual, em suma, julgou procedente o pedido de condenação por esta formulado a final da Petição inicial, assim a tendo condenado [e ao Ministério da Educação], veio interpor recurso de Apelação.

*

No âmbito das Alegações apresentadas pela Recorrente Caixa Geral de Aposentações, foram elencadas a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
CONCLUSÕES:
A - Com o devido respeito, o caso da Autora/Recorrida não tem enquadramento na argumentação vertida na sentença do Tribunal “a quo”!
B – A Autora/Recorrida foi inscrita na CGA 2001-09-01 pelo exercício de funções públicas tendo permanecendo inscrita com desconto de quotas até fevereiro de 2007.
C – Desconhece-se o que sucedeu à Autora, após fevereiro de 2007, a nível profissional e previdencial.
D - Resulta da leitura do registo biográfico da Autora/Recorrida junto com a PI a existência de alguns hiatos temporais entre vínculos, o primeiro dos quais entre 31 de agosto de 2006 e 23 de outubro de 2006 e logo a seguir entre 21 de novembro e 5 de dezembro de 2006, seguindo-se outro hiato entre 8 de janeiro de 2007 e 6 de março do mesmo ano,” e por aí fora”.
E - Em 2006 já vigorava a Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, que estabeleceu mecanismos de convergência do regime de proteção social da função pública com o regime geral da segurança social, a qual determina que a partir de 2006-01-01, a CGA deixa de proceder à inscrição de subscritores, sendo obrigatoriamente inscrito no regime geral da segurança social o pessoal que inicie funções a partir dessa data e ao qual fosse aplicável o regime de proteção social da função pública.
F - Pelo que, terá sido correta a sua inscrição no regime geral da Segurança Social com o estabelecimento do primeiro vínculo contratual no ano de 2006, o que não sabemos se sucedeu. e nem, mesmo, a Autora/Recorrida parece saber.
G - A tudo isto acresce que a sentença de que se recorre, ao reconhecer o Direito da Autora/recorrida com efeitos retroativos à data em que foi inscrita no RGSS viola o disposto no artigo 38.º, n.º2 do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos, pondo em causa o principio da certeza e segurança jurídicas.
H - Além disso, no decurso destes autos foi publicada a Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, que procede à interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro – norma que está na génese do presente litígio – sendo, portanto, este um diploma que também importa ser equacionado neste processo.
I - Aplicando o citado regime jurídico ao caso da ora Recorrida, para além da análise à questão da descontinuidade temporal entre vínculos, de que trata o número 2 do referido art.º 2.º, haverá ainda que ter em consideração o que se encontra estabelecido no n.º 3 do mesmo artigo, onde se esclarece que “Os períodos contributivos para o regime geral de segurança social dos trabalhadores abrangidos pelos números anteriores relevam para efeitos da aplicação do Regime Jurídico da Pensão Unificada, previsto no Decreto-Lei n.º 361/98, de 18 de novembro.”
J - Isto é, ainda que se concluísse que a Recorrida poderia ser enquadrada no regime legal previsto na alínea b) do n.º 2 do art.º 2.º da Lei n.º 45/2024 – o que carece de prova por parte da Autora/Recorrida e não resulta da leitura do seu registo biográfico – nunca a decisão poderia ser semelhante à tomada pela douto tribunal “a quo”, o qual decidiu assistir à Autora/Recorrida o direito a manter a subscrição na CGA com efeitos à data em que foi inscrita na Segurança Social, já que esta não observa a regra jurídica estabelecida no n.º 3 do art.º 2.º da Lei n.º 45/2024, a qual obsta à retroatividade da reinscrição.
K - Sendo que, como decorre do n.º 2 do art.º 4.º da Lei n.º 45/2024, este regime é aplicável a todos os casos, apenas com exceção daqueles “…cuja manutenção da inscrição no regime de proteção social convergente tenha sido determinada em execução de decisão judicial transitada em julgado em data anterior à entrada em vigor da presente lei.”
L - Por conseguinte, com o devido respeito, o Tribunal “a quo” não andou bem ao julgar a ação totalmente procedente e condenando os réus nos pedidos,
Termos em que, e nos mais de direito, deverá a douta sentença, de que se recorre, ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente, com as necessárias consequências.
[…]”

**

A Autora ora Recorrida, não apresentou Contra alegações.

**

O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

**

O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, no sentido da sua improcedência.



***

Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.


***

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], e que passam por saber se o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido em matéria de interpretação e aplicação do direito.

**

III - FUNDAMENTOS IIIi - DE FACTO

Para efeitos da prolação da Sentença recorrida, apreciou e decidiu o Tribunal a quo, nos termos que, por facilidade, para aqui se extraem como segue:

“[…]
Factos Provados
Com relevância para a decisão a proferir relativa às excepções e mérito julgam-se provados os seguintes factos:
a) A Autora iniciou a sua atividade docente, em 1 de Setembro de 2001, na situação de contratada ao abrigo do disposto no Decreto - Lei de execução orçamental conjugado com o nº2 do art. 33º do Estatuto da Carreira dos Educadores e dos Professores do Ensino Básico e Sec. Aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 26 de Abril, alterado pelo Decreto-Lei nº 1/98, de 2 de Janeiro, sendo, nesta data, inscrita na Caixa Geral de Aposentações com o nº ...51 (cfr. fls. 2 do PA e e doc. 1 junto com a p.i.);
a) Desde 1 de setembro de 2005 até ao presente ano lectivo, a Autora celebrou com o Ministério da Educação sucessivamente contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo (RCTFP) para exercer funções docentes em vários
Agrupamentos e estabelecimentos de ensino (cfr. fls. 2 do PA);
b) Em data que não foi possível apurar, a Autora foi inscrita no Regime Geral da
Segurança Social (cfr. fls. 2 do PA);
c) Onde se tem mantido até à presente data;
d) Em 11 de Outubro de 2024, deu entrada neste TAF a petição inicial que originou os presentes autos (cfr. fls. 1 dos autos).
Factos não provados
Com interesse e relevância para conhecimento dos presentes autos Inexistem. Motivação
Os factos dados como provados resultaram dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo incorporado no SITAF, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, e/ou não resultaram controvertidos. […]”

*

Tendo subjacente o disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, aditamos ao probatório, a factualidade que segue, por assim emergir do Processo Administrativo junto aos autos:

e) A Autora exerceu funções docentes dentro do período compreendido entre os anos de 2001 e 2023, nos termos que melhor estão constantes do seu registo biográfico, que por facilidade de enunciação, para aqui se extracta como segue:

“[…]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

[…]”

**

IIIii - DO DIREITO APLICAVEL

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que com referência ao pedido formulado a final da Petição inicial [deduzido contra o Ministério da Educação, a Caixa Geral de Aposentações, e o Instituto da Segurança Social], veio a julgar a acção procedente [tendo absolvido da instância o Instituto da Segurança Social], e em suma, no sentido de (i) ser reconhecido o direito da Autora a manter a sua inscrição e vínculo na CGA, com efeitos ao dia 2001/09/01, mantendo a qualidade de subscritora da CGA desde então; condenando-se os Réus a isso reconhecer; e (ii) serem os Réus condenados a praticar todos os actos que se mostrem necessários ao re-estabelecimento da inscrição/reinscrição/manutenção da Autora na CGA, integrando-a no regime de proteção social convergente, no prazo máximo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da acção, designadamente à transferência das contribuições entregues ao ISS para a CGA, com as consequências legais daí decorrentes.

Com o assim julgado não se conforma a Recorrente CGA, que no âmbito das conclusões das suas Alegações de recurso pugna, a final e em suma, pela revogação da Sentença proferida.

Como assim decorre do que está patenteado nas conclusões das Alegações de recurso apresentadas, sustentou a Recorrente, em suma, que o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido, desde logo e essencialmente, por resultar do registo biográfico da Autora que não houve continuidade no exercício de funções públicas, assim como houve quebras do vínculo laboral público [designadamente entre 31 de agosto de 2006 e 23 de outubro de 2006, e entre 21 de novembro de 2006 e 05 de dezembro de 2006], e no fundo, que perdeu o direito a estar inscrita no regime gerido pela CGA, porque no ano de 2006 já estava em vigor a Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, e que terá sido por essa razão que o estabelecimento de ensino a inscreveu no regime geral da Segurança Social. Referiu ainda, que o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 38.º, n.º 2 do CPTA, pondo em causa o princípio da certeza e segurança jurídicas.

Mais referiu, em suma, que no decurso dos autos foi publicada a Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, por via da qual o legislador efectuou a interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 2.º da referida Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, no sentido de considerar a obrigatoriedade de inscrição no regime geral de segurança social do pessoal que inicie funções a partir de 01 de janeiro de 2006, sendo que, no caso da Autora ora Recorrente, para além da questão atinente à descontinuidade temporal entre vínculos, em face do que se encontra estabelecido no n.º 3 do mesmo artigo, que nunca o Tribunal a quo poderia atribuir efeitos retroactivos por referência à data da reinscrição na CGA, e dessa forma, que a Sentença deve ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente.

Cumpre apreciar e decidir.

Depois de efectuar o saneamento dos autos, o Tribunal a quo fixou as questões a solucionar, o que passava [para lá da apreciação da matéria integrativa de excepção] pela interpretação a tirar do artigo 2.º n.º 2 da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, e da Lei n.º 45/20024, de 27 de dezembro, ou seja [e como assim veio depois a densificar], por decidir sobre se face ao disposto no art.º 2.º da Lei n.º 60/2005 e ao disposto no art. 2º da Lei nº 45/2024, de 27.12, a Autora tem ou não o direito de manter a sua inscrição na CGA, uma vez que, desde o ano de 2001 até ao presente, anualmente os vínculos laborais que a ligavam ao Ministério da Educação cessaram e anual e sucessivamente se constituíram novos vínculos, tendo ocorrido o início de novos vínculos já em data posterior à prevista no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, ou seja, após 01.01.2006, assim como, se o retomar de funções pela Autora, que tinha vínculo público e era subscritora da CGA, após períodos curtos em que não vigorou tal vínculo, deve ser considerado, para efeitos do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005 e art.2º da Lei nº 45/2024, de 27.12, como um início de funções ou como um mero retomar de funções. Tal passa, somente, pela aplicação dos requisitos constantes da alínea b) do nº 2, do art. 2º desta última lei interpretativa.

Como assim deflui da Sentença recorrida, o Tribunal a quo julgou pela procedência da pretensão formulada pela Autora ora Recorrida, em suma, com fundamento em que a Autora foi indevidamente inscrita no regime previdencial da Segurança Social, quando o deveria ter sido na Caixa Geral de Aposentações, tendo por base o facto de a mesma ser já subscritora da CGA, desde 2001, com o n.º ...51.

Neste conspecto, para aqui extraímos a essencialidade da fundamentação de direito aportada pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida, como segue:


Início da transcrição
“[…]
Como resulta da factualidade acima dada como provada, a Autora ingressou nas funções docentes em 2001, tendo sido inscrita como subscritora da Caixa Geral de Aposentações.
Até data não apurada, a Autora foi subscritora da Caixa Geral de Aposentações e, após nova colocação passou a estar inscrita no Instituto da Segurança Social. Da leitura do art. 2, da Lei nº 60/2005 e art- 2º da Lei nº 45/2024, supra transcritos, é possível depreender que o legislador pretende que a Caixa Geral de Aposentações deixe de proceder à inscrição de novos subscritores, a partir de 1 de janeiro de 2006. Tal significa que aos funcionários e agentes que “iniciem” funções, a partir daquela data, passa a aplicar-se o regime da segurança social.
Neste sentido de ser esta a interpretação correcta pronunciou-se o Supremo Tribunal Administrativo, no seu acórdão de 06.03.2014, proferido no recurso de revista excecional, Processo n.º 0889/13 (disponível para consulta em www.dgsi.pt), nos seguintes termos: “Retira-se imediatamente da letra dos nºs 1 e 2 do preceito que o legislador pretende que a CGA deixe de proceder à inscrição de subscritores, a partir de 1 de janeiro de 2006, o que significa que aos funcionários e agentes que “iniciem” funções, a partir daquela data, passa a aplicar-se o regime da segurança social. Neste sentido, a utilização do inciso “inicie” funções, afigura-se inequívoco no sentido de abranger os trabalhadores que ingressem pela primeira vez (ex novo) na função pública. O objetivo a alcançar é o de não aumentar o número de inscrições através do cancelamento da entrada de novos subscritores e, nessa medida, caminhar para a convergência ao mesmo tempo que se limita o crescimento da despesa pública nesta área.
No mesmo sentido, na exposição de motivos constante da Proposta de Lei nº 38/X pode ler-se, entre o mais, que “A concretização da convergência não deve, porém, fazer-se nem à custa do sacrifício das expectativas daqueles que, no quadro do regime atualmente em vigor, já reúnem condições para se aposentarem. Nem de ruturas fraturantes, optando-se antes por um modelo de transição gradual que aplica aos funcionários, agentes da Administração Pública e demais servidores do Estado o regime de pensões do Estatuto da Aposentação, o regime de segurança social ou ambos simultaneamente.”
Assim sendo, considerando a letra do preceito e a sua razão de ser, afigura-se claro poder retirar-se do preceito que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a CGA estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública.”.
O nº 2 do do art, 2º da Lei 45/2024 permite em qualquer caso nova inscrição se o antigo subscritor vier a ser readmitido em quaisquer funções públicas contempladas no art. 1º do mesmo Estatuto se houver a descontinuidade temporal for de natureza involuntária, limitada no tempo e justificada pelas especificidades próprias da carreira em que o funcionário ou agente está inserido e o funcionário não tenha exercido atividade remunerada durante o período em que interrompeu o vínculo público.
Assim, da leitura conjugada das referidas normas retira-se que, para o legislador, só haverá cancelamento da inscrição do subscritor que cesse definitivamente o exercício do seu cargo, assistindo-lhe, porém, o direito a ser de novo inscrito, se voltar a ingressar em funções públicas mesmo em situações de descontinuidade temporal, se esta for alheia à sua vontade, ocorrer por motivos específicos da carreira em que se insere e não tiver exercido outra actividade remunerada.
Ora, a Autora tinha vínculo público desde 2001 e anualmente retomou este vínculo, após cada nova colocação em estabelecimento de ensino público na sequência de apresentação a concurso para o efeito.
Assim, a Autora podia e tinha o direito de pedir a renovação da sua inscrição como subscritora da CGA quando constituiu novo vínculo laboral com o Ministério da Educação.
Em suma, a Autora, aquando da assinatura dos contratos para o exercício da actividade docente sempre deveria ter mantido a situação anteriormente vigente, ou seja, como subscritora da CGA, a efetuar descontos para tal entidade.
Pelo exposto, procede a presente acção, condenando-se as Entidades Demandadas a reconhecerem aquela qualidade de subscritora à Autora, devendo praticar todos os actos necessários a tal, mormente proceder à reinscrição da Autora como subscritora da CGA, com efeitos à data em que foi inscrita na Segurança Social.
[…]”
Fim da transcrição

Ora, em torno da questão nuclear que o Tribunal a quo elencou, está o momento da inscrição da Autora na Segurança Social [que como assim resulta do probatório, ocorreu em data não apurada, mas que como assim referiu a Recorrente na conclusão B das suas Alegações de recurso, julgamos que tal terá ocorrido a partir de fevereiro de 2007], sendo que desde 2001 que era subscritora da Caixa Geral de Aposentações, portanto, em data anterior à prevista no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, ou seja, antes de 01 de janeiro de 2006, sendo que foi por esse julgamento de base que o Tribunal a quo julgou pela procedência da pretensão da Autora, de resto, com amparo em jurisprudência tirada pelo Supremo Tribunal Administrativo.

Efectivamente, quanto a essa questão fundamental, o Tribunal a quo suportou a fundamentação aportada na Sentença recorrida, tendo presente para tanto que a Autora já esteve inscrita na CGA, e que por essa razão não se tratava da sua inscrição neste regime de previdência de um novo subscritor, e também, porque antes da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, já a mesma tinha sido subscritora, o que julgamos tratar-se de um julgamento em conformidade com os normativos que a Recorrente, ao invés, fundada em erro de erro de interpretação, apresentou na sua Contestação, e que no fundo, vem a reiterar nesta sua pretensão recursiva como tendo sido violados.

O Tribunal a quo alinhou o seu julgamento em conformidade com o Acórdão do STA datado de 06 de março de 2014, proferido no Processo n.º 0889/13, do qual para aqui extractamos o seu sumário, como segue:

Início da transcrição
“I – Considerando a letra do art. 2º da Lei nº 60/2005, de 29 de Dezembro, que se refere apenas ao pessoal que “inicie funções” e a sua razão de ser (proibir a entrada de novos subscritores), afigura-se claro poder retirar-se que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a Caixa Geral de Aposentações estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública.
II – Assim sendo, tendo em conta a letra do preceito e visando o mesmo cancelar novas entradas no sistema e não eliminar os subscritores que permanecem no mesmo, temos de concluir não haver quebra do estatuto de subscritor quando o funcionário ou agente se limita a transitar de uma entidade administrativa para outra sem qualquer descontinuidade temporal, nos termos do estatuído no art. 22º, nº1, do Estatuto da Aposentação, devendo apenas o inciso “direito de inscrição” ser objecto de interpretação correctiva de modo a harmonizar-se com a letra e a teologia intrínseca do art. 2º da Lei nº 60/2005.
III – Se o Associado do Recorrente (professor do ensino superior politécnico) rescinde o contrato administrativo de provimento que o liga a uma instituição de ensino e celebra com outra instituição novo contrato, com efeitos a partir do dia seguinte, embora em termos formais haja descontinuidade do vinculo jurídico, não havendo descontinuidade temporal, a situação não cai no âmbito do art. 2º da Lei nº 60/2005, de 29 de Dezembro, em conjugação com o disposto no art. 22º, nº 1, do Estatuto de
Aposentação.”
Fim da transcrição

De igual modo, por também julgarmos com relevância para a decisão a proferir, para aqui extractamos o sumário do Acórdão deste TCA Norte, datado de 14 de fevereiro de 2020, proferido no Processo n.º 01771/17.0BEPRT, como segue:

Início da transcrição
“I - Os nº. 1 e 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, de 29 de dezembro, preconizam a inadmissibilidade de novas inscrições na Caixa Geral de Aposentações, e, bem assim, a obrigatoriedade de inscrição no regime geral de segurança social de todo o pessoal que “inicie funções” a partir 1 de janeiro de 2006, ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de proteção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito.
II - Na determinação do que se deve entender relativamente à previsão “iniciem funções” contida nos nº. 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, dever-se-á atender ao teor da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, espraiada seu aresto de
06.03.2014, no processo nº. 0889/13, que, quanto a este conspecto, considerou que o disposto no nºs.1 e 2 do artigo da Lei nº. 60/2005 visa apenas abranger o pessoal que inicie absolutamente funções.
III - Por razões atinentes a uma interpretação harmoniosa com a letra e a teleologia intrínseca do art. 2º da Lei nº 60/2005, a eliminação da subscrição do trabalhador em funções públicas decorrente da cessação do exercício do seu cargo prevista no nº.1 do artigo 22º do EA só ocorrerá se este não for investido noutro cargo a que antes de 01.01.2006 correspondesse direito de inscrição.”
Fim da transcrição

Ora, desde já referimos que nos revemos nesta jurisprudência [de entre outra prolatada por este TCA Norte, de que destacamos o Acórdão datado de 28 de janeiro de 2022, proferido no Processo n.º 496/20.4BEPNF, o Acórdão datado de 28 de janeiro de 2022, proferido no Processo n.º 1100/20.6BEBRG, o Acórdão datado de 11 de fevereiro de 2022, proferido no Processo n.º 99/21.6BEBRG, o Acórdão datado de 10 de março de 2022, proferido no Processo n.º 1974/20.0BEBRG, o Acórdão datado de 08 de abril de 2022, proferido no Processo n.º 307/19.3BEBRG, o Acórdão datado de 30 de setembro de 2022, proferido no Processo n.º 708/20.4BEPRT - todos disponíveis em www.itij.pt], e o recente Acórdão deste TCA, datado de 22 de novembro de 2024, proferido no Processo n.º 148/24.6BEPNF, em que o ora Relator interveio na sua formação em julgamento, como 2.º Adjunto], e cuja fundamentação aqui damos por enunciada [com as adaptações que se mostrem devidas, designadamente em torno da matéria de facto], a fim ser prosseguida e obtida, em consonância com o disposto no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil, uma interpretação e aplicação uniformes do direito.

Salientamos ainda que em formação de admissão preliminar, o STA negou a admissão de recurso de revista no Acórdão datado de 09 de junho 2022, proferido no Processo n.º 099/21.6BEBRG, de 14 de julho de 2022, proferido no Processo n.º 0496/20.4BEPNF, de 22 de setembro de 2022, proferido no processo
1974/20.0BEBRG, e de 06 de outubro de 2022, proferido no Processo n.º 307/19.3BEBRG, em situações cuja matéria de facto é similar à que ora está em causa nestes autos, e que na essência do que vinha sustentado pelos aí Recorrentes, a argumentação apresentada na instância superior não foi de molde a abalar a jurisprudência que vinha sendo firmada neste domínio.

Efectivamente, como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

Ou seja, o cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que torna a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo
22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

Atenta a factualidade constante do probatório, em particular o vertido sob as alíneas
a) e b), julgamos ser cristalino que assiste à Autora ora Recorrida o direito a verse/manter-se inscrita sob o regime da CGA e não sob o regime da Segurança Social, pelo facto de desde o dia 01 de setembro de 2001, que é beneficiária da CGA, inscrita sob o n.º ...51, estatuto que sempre teria de lhe ser garantido face à posterior [à sucessiva] outorga de contratos de trabalho com o Ministério da Educação para o exercício das mesmas funções de docência.

E contrariamente ao sustentado pela Recorrente sob a conclusão G) das suas Alegações de recurso, não divisamos por que termos é que o Tribunal a quo incorreu na violação do disposto no artigo 38.º, n.º 2 do CPTA, porquanto, e como assim emerge da fundamentação aportada na Sentença recorrida, o que está em causa é o pedido de reconhecimento de um direito, o que assim resulta assaz fundamentado.

Ou seja, a CGA não poderia ter deixado de ter e manter a inscrição da Autora como beneficiária, e sempre e de todo o modo, caso assim não tivesse prosseguido, sempre deveria ter prolatado acto administrativo nesse sentido, o que assim não resulta do probatório.

Finalmente, no que é atinente à entrada em vigor da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, não podemos obnubilar que está em apreço neste Tribunal Superior um recurso jurisdicional que visa impugnar a Sentença recorrida que aplicou o direito pré-vigente, e por outro lado, que aquele recente diploma legal convoca no seu articulado a apreciação de diferentes termos e pressupostos para efeitos da aplicação do regime jurídico nele vertido, de que ressaltamos os elencados sob a alínea b) do n.º 2 do seu artigo 2.º.

Tendo o Tribunal a quo convocado no julgamento por si prosseguido aquele recente diploma legal, o que ressalta da Sentença recorrida é que mesmo ao abrigo desse novo regime jurídico estabelecido, os factos que foram dados como provados [e quanto ao que a Recorrente não endereça qualquer pretensão recursiva] permitiram ao Tribunal a quo formar a convicção de que Autora ora Recorrida pode e deve ser enquadrada no regime legal previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 2.º daquela Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, situação jurídica essa que não obsta à consideração da retroactividade da reinscrição.

Efectivamente, em conformidade com a jurisprudência, firme e reiterada, tirada pelos Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa, julgamos que a interpretação do direito prosseguida pelo Tribunal a quo em torno do referido artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, assim como do artigo 22.º do EA, e a final, aquela que conduziu à solução jurídica por si alcançada, no sentido de que só haverá cancelamento da inscrição do subscritor na CGA que, tendo cessado o exercício de anterior cargo, não venha a ingressar no exercício futuro de outras funções públicas, é aquela se mostra mais consentânea com a Lei e o Direito, sendo assim de salientar que a argumentação de que se vale a Recorrente está desprovida de qualquer indício de conformidade legal, pois que a Autora não pode ser qualificada como nova subscritora, pois que já o era desde o ano de 2001, não podendo assim dar-se o cancelamento da sua inscrição enquanto subscritora, pois que veio a ser investida no exercício de funções públicas a que se reportava o artigo 1.º do EA.

Daí que o julgamento prosseguido pelo Tribunal a quo, não é merecedor da censura que lhe vem imputada pela CGA, como assim patenteado nas conclusões das respectivas Alegações de recurso, sendo por isso de confirmar, mantendo-se assim a Sentença recorrida.

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E assim, formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro; Direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações; Lei n.º 45/2004, de 27 de dezembro; Retroactividade da inscrição.

1 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

2 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

3 - No que é atinente à entrada em vigor da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, não podendo ser obnubilado que está em apreço neste Tribunal Superior um recurso jurisdicional que visa impugnar a Sentença recorrida que aplicou o direito prévigente, e por outro lado, que aquele recente diploma legal convoca no seu articulado a apreciação de diferentes termos e pressupostos para efeitos da aplicação do regime jurídico nele vertido, de que ressaltamos os elencados sob a alínea b) do n.º 2 do seu artigo 2.º [que o Tribunal a quo veio a convocar], mesmo ao abrigo desse novo regime jurídico estabelecido, os factos que foram dados como provados [e quanto ao que a Recorrente não endereça qualquer pretensão recursiva] permitiram formar a convicção de que Autora ora Recorrida pode e deve ser enquadrada no regime legal previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 2.º daquela Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, situação jurídica essa que não obsta à consideração da retroactividade da reinscrição.

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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Social da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pela Recorrente Caixa Geral de Aposentações, IP, confirmando assim a Sentença recorrida.

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Custas a cargo da Recorrente – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

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Notifique.


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Porto, 20 de junho de 2025.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Rogério Martins
Fernanda Brandão