Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I. RELATÓRIO
1. "INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL - Centro Distrital de Viana do Castelo, IP", inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 30 de Abril de 2020, que julgando procedente a acção administrativa instaurada pelo A./Recorrido AA, residente na Rua …, anulou o acto de 12 de Janeiro de 2018, pelo qual foram declaradas nulas as prestações atribuídas, a título de subsídio de doença, nos períodos compreendidos entre 9/9/2013 e 6/1/2015 e 9/3/2015 e 26/3/2016.
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Nas suas alegações, o recorrente ISSocial - IP, formulou as seguintes conclusões:
"1 - A sentença recorrida padece de ilegalidade por ter violado o disposto nas alíneas a) e c) do n. º 1 do artigo 24º, do Decreto – Lei n.º 28/84, de 14/8, interpretando tais disposições no sentido de que a prática de atos esporádicos e ou ocasionais de natureza profissional não constitui exercício de actividade profissional, para efeitos de cessação do direito ao subsídio de doença.
2 – O douto aresto está ferido de ilegalidade por enfermar de erro nos seus pressupostos, de erro no julgamento de direito, constando do processo elementos que por si conduziriam a decisão diversa.
3 – O ato impugnado, ora em crise, foi praticado pelo recorrente em 12 de janeiro de 2018 e declarou nulas as prestações de subsídio de doença atribuídas ao recorrido nos períodos compreendidos entre 9/09/2013 e 6/01/2015 e entre 9/03/2015 e 26/03/2016 com fundamento no facto de nesses períodos ter existido acumulação com a prática de actividade profissional por parte do recorrido.
4 – Perante os factos dados como provados, identificados de 1 a 29 e os factos dados como não provados, de A) a C), entendeu a Meritíssima Juiz que no que toca ao exercício de actividade profissional por parte do recorrido, nos períodos em que se encontrava a receber prestações substitutivas do rendimento do trabalho, em concreto prestações de subsídio de doença, aquele praticou três atos de gestão em 2014, dentro do primeiro de dois períodos em que o recorrido esteve de baixa por doença (de 9/09/2013 a 6/01/2015).cfr fls 22 e 23 do douto aresto em apreciação.
5 – Considera a decisão proferida, no que toca a apreciação da prática dos referidos três atos de gestão, que os mesmos não se podem traduzir na prática de actividade profissional devido ao facto de os atos em causa serem de número diminuto, o espaçamento temporal havido entre a prática dos mesmos e a longa duração do período de baixa, considerando ainda o douto aresto em apreciação que, para esse mesmo efeito, uma actividade profissional pressupõe, naturalmente, uma certa continuidade de acção prolongada no tempo.
6 – A douta sentença proferida entende que o disposto no artigo 24º, n.º 1 alínea c) do Decreto – Lei n.º 28784, de 14/8, com o sentido de que considerar que a prática de atos esporádicos e ou ocasionais de natureza profissional constitui exercício de atividade profissional, para efeitos de cessação do direito ao subsídio de doença, seria sufragar uma interpretação que não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, por ser suposto que o legislador sabe exprimir o seu pensamento de forma adequada (vide artigo 9º do Código Civil).
7 – Todavia, em caso de doença, como em todas as actividades, o recorrido está incapacitado para o trabalho e não pode, pura e simplesmente realizar tarefas próprias e características da actividade de gerente e, ao mesmo tempo, auferir subsídio de doença, uma vez que a sua atribuição pressupõe essa mesma incapacidade que se traduz, tal como encerra a própria etimologia da palavra, a impossibilidade de exercer a sua actividade e as tarefas próprias da mesma, sejam elas quais forem.
8 – Relativamente à natureza dos atos praticados sempre se dirá que “a gerência é, por força da lei e salvo casos excecionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir atuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr. objeto social), com a simples exceção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr. arts. 260º, n.º1 e 409º, nº1 do Código das Sociedades Comerciais). O gerente/administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o ato em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário se o ato respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o ato em causa tem apenas eficácia interna estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o ato tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação.” In Ac. do TCAN de 15/05/2014 – Proc. n.º 273/07.8BEMDL – www.dgsi.pt (sublinhado nosso)
9 – Atente-se ainda que “… a lei não exige que os gerentes, para que sejam responsabilizados pelas dividas da sociedade, exerçam uma administração continuada, apenas exigindo que eles pratiquem atos vinculativos da sociedade, exercitando desse modo a gerência de facto ...” in Ac de 29/09/2016 do TAF de Viseu proferido no proc. .00274/10.0BEVIS, da 2ª seção – Contencioso tributário
10 – Dos acórdãos supra referidos retira-se que a actividade profissional de gerência é ou pode ser, pela sua própria natureza, caracterizada pela prática de atos típicos ou próprios da gerência que poderão até ser esporádicos ou ocasionais mas que constituem o exercício dessa mesma actividade porque vinculam interna e externamente a sociedade e vão permitindo o seu giro no meio económico – social onde se move.
11 – A acolher-se a teoria consignada no douto aresto proferido onde encontrar-se, então, a linha distintiva entre a prática ou não prática de tarefas ou atos de gestão ou de representação de uma sociedade para considerarmos que um gerente está ou não está a praticar actividade profissional e qual o período de tempo em que teremos de realizar tal aferição? Mais de três atos, seis atos? E em que período de tempo? Seis meses, um ano? Se assim fosse estaríamos, em nosso entender e, salvo melhor opinião, a introduzir uma subjectividade, que o legislador não introduziu na alínea c) do n.º 1 do artigo 24º do Decreto – Lei n.º 28/2004, de 4 de fevereiro.
12- O legislador, nesta norma, apenas refere “O beneficiário tenha exercido actividade profissional...” e, de forma objectiva, em nosso modesto entender, o que ele pretende dizer é “exerceu ou não exerceu”, bastando para o efeito que a tenha exercido, seja por 15 minutos, uma hora ou meio dia, praticando apenas um único ato ou vários, desde que os mesmos tenham validamente vinculado a sociedade.
13 – O entendimento da douta sentença recorrida permite que um gerente em situação de incapacidade temporária para o trabalho possa, ano após ano, manter a sua actividade, prosseguindo a sociedade o seu giro normal, pela prática de atos ou tarefas profissionais que são típicas de uma actividade profissional que desse modo acaba por, eficazmente permitir a manutenção da vida da sociedade e, simultaneamente, ao gerente, receber rendimentos substitutivos dos rendimentos do trabalho, no pressuposto que está incapacitado para esse efeito.
14 – É à luz do previsto no artigo 9º do Código Civil e da natureza jurídica da actividade profissional de gerente que temos de aferir o sentido da norma no caso concreto sob pena de o resultado ser contrário àquilo que o próprio legislador consignou, sendo que consagrou que basta a prática de actividade profissional, independentemente até da prova de existência de qualquer remuneração, para cessar o direito ao subsídio de doença. cfr alínea c) do n.º 1 do artigo 24º.
15 – Se o legislador afastou até a necessidade de prova da existência de remuneração, bastando-se com o mero exercício da actividade profissional para cessar o direito ao subsídio de doença durante o período de concessão, deve o interprete ir mais além e considerar que tal actividade profissional deve ser constante e dentro dessa actividade destacar tarefas profissionais que entende não ser a mesma coisa que actividade profissional para concluir que os atos praticados, sendo tarefas não são actividade profissional e, por isso, não existiu qualquer actividade profissional.
16 – Nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal (da norma), intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica.
O elemento sistemático “compreende a consideração de outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda, isto é, regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos). Compreende ainda o (lugar sistemático) que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico.” O elemento histórico compreende todas as matérias relacionadas com a história do preceito material da mesma ou idêntica questão, as fontes da lei e os trabalhos preparatórios.” In anotação ao artigo 9º do Código Civil anotado de Abílio Neto, página 21, nota 15, 11ª Edição refundida e actualizada, 1997, Ediforum, Edições, Lda. Lisboa.
17 – O sentido atribuído à norma, no douto aresto em análise, não pode afastar-se da razão de ser da própria norma e do seu elemento sistemático, inserida no diploma que regula a atribuição do subsídio de doença, prestação do regime previdencial da segurança social, cuja atribuição depende de requisitos específicos consignados no mesmo diploma.
18 – A atribuição e cessação da prestação ocorre de acordo com os elementos teleológicos do sistema, a parcimónia na administração dos dinheiros públicos e os poderes vinculados da administração, norteados pela prossecução do interesse público e, é dentro deste espirito que deve ser interpretada a norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 24º, por forma a que o subsídio em causa seja, tal como deve ser, uma prestação substitutiva de rendimentos do trabalho atribuída a quem está, de facto incapacitado temporariamente de exercer a sua actividade profissional.
19 – A participação do recorrido em duas assembleias gerais de sócios da sociedade BB-Aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Equipamento informático, Lda., e em duas assembleias gerais de sócios da sociedade “CC...”,– vide ponto 20 e 21 da matéria fáctica provada -, tem de ser entendida como exercício de actividade profissional e, como tal, os atos de comparência e assinatura das atas são atos de gestão das respectivas sociedades.
20 – O recorrido e a sua mulher são os únicos sócios e gerentes das duas referidas sociedades (como ficou provado no ponto1 dos factos dados como provados) e não se “despiu” dessa qualidade ao participar nas respectivas assembleias e ao assinar as atas em causa.
21 – A não ser qualificada como atividade profissional, como se pretende no aresto em apreciação, estaria excluída a relação jurídica contributiva e deixaria todo e qualquer gerente de poder ser remunerado, efetuar descontos para o sistema de segurança social e beneficiar de proteção na doença.
22 – Independentemente da qualificação dos atos praticados pelo recorrido como de administração ou gestão, ou de representação, a verdade é que tal prática implica, ou tem inerente, o exercício da correlativa atividade profissional.
23 – Nos termos do artigo 259º do CSC, os gerentes, no âmbito da sua atividade profissional, devem praticar os atos que forem necessários ou convenientes para a realização do objeto social, com respeito pelas deliberações dos sócios, nomeadamente atos de gestão corrente, como por exemplo o pagamento de débitos, sem prejuízo de em situação de incapacidade esses atos possam ser praticados por outros gerentes, através da faculdade de delegação de competências, ou através do mecanismo da ratificação.
24 – O recorrido cumulou o exercício de atividade profissional com a atribuição de subsídio de doença, determinando-se assim a cessação da atribuição do subsídio, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 24º da Lei n.º 28/2004, de 4/2.
25 – Os serviços do recorrente apenas poderiam ter tomado conhecimento dessa situação se o recorrido, tal como lhe competia, informasse que se encontrava a trabalhar, o que decorre dos factos dados como provados e do teor da norma legal a cujo cumprimento o recorrido está adstrito.
26 – Cabe ao recorrido a restituição de todos os montantes recebidos indevidamente uma vez que, nos termos do artigo 3º, do Decreto – Lei n.º 133/88, de 20 de abril, a preterição desse seu dever de informar os serviços do recorrente acarreta a obrigatoriedade da respetiva restituição na totalidade dos montantes recebidos, independentemente do período de tempo da respetiva concessão.
27 – Deste modo, salvo melhor opinião, a douta sentença, ao decidir como decidiu violou por errada interpretação as alíneas a), c) do n.º 1 do artigo 24º e n.º 1, alínea b) e n.º 2 alíneas d) e g) do artigo 28º do Decreto – Lei n.º 28/2004 de 4 de fevereiro, artigo 60º n.º 2 e artigo 71º, n.º 2 da Lei n.º 4/2007 de 16/1, artigo 3º do Decreto – Lei n.º 133/88, de 20/4 e o artigo 259º do Código das Sociedades Comerciais e 163º n.º 1 do CPA, padecendo a douta sentença de erro de julgamento e ilegalidade, que expressamente se invocam.
28 – Assim, deverá o aresto produzido ser revogado e substituído por outro que julgue totalmente improcedente a presente acção administrativa por nada haver a apontar ao acto praticado em 12/01/2018 pelo recorrente".
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Notificadas as alegações, apresentadas pelo recorrente, supra referidas, veio o A./Recorrido, AA, apresentar contra alegações que concluiu com as seguintes proposições:
"1.ª A douta sentença recorrida considerou de forma exaustiva que efectivamente a concreta decisão proferida pela recorrente Segurança Social enfermava em vicio de violação da lei, porquanto aplicava indevidamente o disposto no art. 24º do DL n.º 28/04, aos factos provados, quando efectivamente tais factos não permitiam nem autorizam tal aplicação. Tendo presente os factos considerados como provados na douta sentença recorrida, a anulação da decisão proferida pela recorrente é acertadíssima não merecendo qualquer reparo.
2ª De notar que os gerentes de uma sociedade, que involuntariamente são acometidos de incapacidade por doença, não se podem considerar privados e ou impedidos de acautelar os interesses das entidades que gerem, sob pena de paralisia dessa entidade colectiva e consequentemente responsabilidade advinda dessa paralisia, ao nível financeiro, labora, fiscal, entre outros.
3ª Estamos em crer que o estado de doença não pode ser de todo excludente da responsabilidade que o cargo de gerente aporta, tanto mais que o trabalhador doente não está impedido de continuar a gerir a sua vida, o seu património e cumpria a suas obrigações, e tais actos, por mais diversos que sejam nunca poderiam configurar actuação profissional.
4ª Do mesmo modo as coisas se passam com o gerente, na qualidade de legal representante do ente colectivo que representa e administra, não podendo estar privado de intervir no limiar da necessidade de cumprir obrigações e exercer direitos, ainda que limitado pela doença.
5ª Ora, como bem se escreveu na douta sentença recorrida, o recorrido no período em que esteve acometido por doença não praticou com regularidade e reiteração a gerência na sociedade, mas também não a abandonou de todo, teve apenas a singela e episódica actuação que os factos provados evidenciam, o que não é suficiente para se poder concluir que nesses períodos exerceu actividade profissional, nos moldes prevenidos na norma legal.
6ª A decisão impugnada e que foi anulada, conclui que o recorrido AA, exerceu actividade profissional em acumulação com o subsídio de doença, estribando tal alegação na circunstância de que este, na qualidade de gerente, teria assinado documentos da sociedade da qual é gerente, BB… Lda., porem tal conclusão denotava uma errada interpretação das normas jurídicas.
7ª O recorrido padeceu de incapacidade para o trabalho nos períodos de 09/09/2013 a 06/01/2015 e de 09/03/2015 até 26/03/2016 conforme certificados de incapacidade médica apresentados, pelo que não compareceu nas empresas tendo permanecido recolhido na residência, aliás como foi confirmado nas várias visitas que recebeu dos inspetores da Segurança Social, sem prejuízo de estar autorizado pelo médico a ausentar-se do domicilio das 11 horas ás 15 horas e das 18 horas ás 21 horas. A situação clínica do recorrido foi examinada em diversas juntas médicas convocadas para o efeito pelos serviços da Segurança Social, que após minuciosa avaliação, confirmaram cada uma das situações de incapacidade.
8ª O sócio de uma sociedade, quando participa numa assembleia geral dessa sociedade não pratica qualquer actividade profissional pela simples razão de que ser sócio de uma sociedade não corresponde a qualquer profissão. A possibilidade de intervir em assembleia geral e de ter sido assinada a acta nº 14º e a acta nº 15 da BB… Lda., resulta da sua condição única de sócio nada tendo quer ver com qualquer actividade profissional, como bem se consignou na douta sentença recorrido.
9ª A intervenção do recorrido numa assembleia geral de sociedade da qual é sócio, em nada colide com a sua situação de doença, nem tem qualquer relevância em sede de direito a subsidio de doença, pois que o facto de estar doente não impede o Autor de praticar atos estritamente necessários à gestão da sua vida, pagar impostos, cumprir as suas obrigações integral e pontualmente e bem assim ao cumprimento da lei,
10ª Assim os actos assim praticados em nada constituem exercício de qualquer tipo de actividade profissional nos termos prevenidos na lei, uma vez que a qualidade de sócia de qualquer sociedade não constituir por natureza actividade profissional, na medida em que se traduz num acto de mera administração do seu património.
11ª Deste modo os actos provados, pelo modo em que ocorreram, em nada constituem exercício de qualquer tipo de actividade profissional nos termos prevenidos na lei, como bem fundamentou a douta sentença recorrida.
12ª Como resulta claramente da letra da lei e do elemento interpretativo logico/racional, o subsídio de doença apenas cessa aquando da concreta verificação da efectiva, continuada e reiterada actividade profissional, o que os factos provados não evidenciam nem demonstram. Tais actos estão obviamente excluídos da previsão normativo do art. 24º, nº 1 al. c) do D. L. 28/2004 de 04/02 que expressamente se refere ao exercício de actividade profissional, que se prossupõem efectiva e na sua plena dimensão, situação que se demonstrou não ter ocorrido.
13ª Numa palavra a interpretação que a Segurança Social pretende fixar aquela norma legal, conduziria à conclusão de que o gerente de uma sociedade nunca poderia estar em situação de incapacidade por doença beneficiando do respectivo subsídio, situação que configura uma clara violação dos direitos liberdades e garantias constitucionalmente protegidos, (violação dos arts. 63.º e 64.º da CRP - direito/garantia de acesso à proteção da saúde e apoio na doença), como bem se escreveu na douta sentença recorrida.
14ª Deste modo afigura-se evidente que o Autor não exerceu, relativamente aquelas sociedades BB, Lda., e CC... Lda., e no período em que esteve acometido de doença, qualquer acto passível de configurar actividade profissional, não tendo o acto impugnado qualquer fundamento uma vez que está sustentada numa errada interpretação e aplicação do disposto no art. 24, nº 1 al. c) do D. L. 28/2004, sendo por isso ilegal e injusta, como bem assinala a douta sentença recorrida.
15ª Por assim ser, conclui-se qua a douta sentença recorrida operou um correcto julgamento da matéria de facto e uma correcta interpretação e aplicação do disposto no art, art. 24, nº 1 al. c) do D. L. 28/2004, e arts. 63.º e 64.º da CRP, razão pela qual deverá ser integralmente mantida".
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O Digno Magistrado do M.º P.º, notificado nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, não emitiu Parecer.
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Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Juízes Desembargadores adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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2. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts. 1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, cuja fidelidade e completude não são questionados neste recurso:
1. O Autor e sua mulher, DD, são os únicos sócios e gerentes da sociedade “CC... – Gabinete de Gestão de Recursos Humanos ..., Lda.” e da sociedade “BB… – Aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Equipamento Informático, Lda.” [Cfr. docs. de fls. 12, 13, 24, 24 verso, 25 verso, 33, 32 verso, 37, 38 verso, 41, 41 verso, 61, 61 verso, 62 e 62 verso do ANEXO I-A, constante do Processo Administrativo (PA), apenso aos autos];
2. As funções de gerente que o Autor exerce, desde 01.05.2001, na sociedade CC... são remuneradas, efetuando o pagamento das correspondentes contribuições à Segurança Social. (Cfr. documento de fls. 1 a 4 e fls. 17 do PA, cujo teor de dá por integralmente reproduzido)
3. O Autor exerce o cargo de gerente da “Sociedade BB… – Aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Equipamento Informático, Lda.”, desde 02.08.2004, sem remuneração e sem o emergente pagamento de contribuição ao Instituto da Segurança Social. (Cfr. documento de fls. 15 a 21 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
4. O Autor esteve de baixa por doença nos períodos compreendidos entre 09-09-2013 a 06-01-2015 e entre 09-03-2015 a 26-03-2016, recebendo do Instituo da Segurança Social os correspondentes subsídios por doença (Cfr. fls. 1 a 18, 50 a 59 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
5. O Serviço de Fiscalização do Norte, da Entidade Ré – Sector de Viana do Castelo-, procedeu a averiguações referentes aos períodos de doença do Autor, referidos no Ponto 4, instaurando procedimento administrativo contra o Autor, correndo termos sob o n.º ...32 (Cfr. o Processo Administrativo apenso aos autos, contendo o Processo de Averiguações N.º ...32, identificado como Anexo I-A);
6. Em sede da tramitação levada a cabo no procedimento administrativo, foi proferido em 9.3.2016, projeto de decisão no sentido de ser declarada a “nulidade das prestações atribuídas a título de subsídio de doença nos períodos compreendidos entre 31/03 e 06/01/2015 (data em que foi declarada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho pela Comissão de Verificação de Incapacidades) e 09/03/2015 até à presente data, cessando para o futuro, por se ter verificado a acumulação com exercício de atividade profissional.” (Cfr. fls. 15 a 21 e 22 a 27 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7. Em 09.03.2016, o Diretor de Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital de Viana do Castelo proferiu despacho concordante com o projeto de decisão de cessação do subsídio de doença, fundamentando com o facto do Autor ter exercido atividade profissional no período de incapacidade para o trabalho. (Cfr. documento de fls.15, 22 a 27 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
8. Em 16.03.2016, o Autor foi notificado, para efeitos de Audiência Prévia, da intenção de cessação do subsídio de doença (Cfr. documento de fls. 33 e 34 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
9. O Autor, em 21.03.2016, usou do seu direito de resposta, requerendo a revogação do projeto de decisão e o consequente arquivamento dos autos (Cfr. documento de fls. 35 e 40 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
10. Por despacho de 03.11.2016 da Chefe do Setor de Bragança, Viana do Castelo e Vila Real do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, foram abertos, com referência ao período em que o Autor esteve em situação de doença subsidiada, os processos de averiguações n.º ...88 e ...112, com a finalidade de recolher prova documental suplementar, no âmbito dos quais, foi detetado o seguinte:
- o Autor incorreu em várias despesas de restauração por conta e em nome da CC..., Lda. (Cfr. fls. 42, 50 a 55, 81, 82, 83 do anexo II junto ao PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
- o Autor incorreu, em nome e por conta da CC..., Lda. em despesas referentes a uma viagem de cruzeiro, titulada pela Fatura xxxx, emitida em 27.08.2014, no montante de € 1.860,00, que lhes foram pagas através de uma transferência bancária, datada de 04.09.2014, pela conta da empresa CC..., Lda., n.º ...84, existente na CA – Crédito Agrícola (Cfr. documento de fls.69 e 68 do anexo II, junto ao PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
- o Autor comprou um veículo de matrícula ...**..., marca “P...”, modelo “... 2.7”, no montante de € 34.000,00, que integrou o ativo imobilizado da empresa – cfr. conta 434 por contrapartida da conta 1201 – que foi pago por cheque da CC..., LDA, por si assinado, datado de 15.05.2014 (Cfr. documento de fls. 66 e 67 do anexo II, junto ao PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
- o Autor adquiriu, em nome e por conta da CC.., Lda. bens e serviços à empresa “EE..., Lda.”, melhor discriminados na fatura “FAC yyy de 09.04.2014”, no montante de €36,90 (Cfr. documento de fls. 56 e 57 do anexo II junto ao PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
- o Autor incorreu, em nome e por conta da CC..., Lda., em despesas junto da agência de viagens on-line “FF.com”, referente à compra de três viagens para a República Checa com partida a 23.12.2015 e regresso a 27.12.2015, no montante total de € 905,42 (Cfr. documento de fls.44 a 46 do anexo II junto ao PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
11. Concluídas as averiguações, em 04.01.2018, foi proferida “INFORMAÇÃO” no sentido da declaração de nulidade das prestações atribuídas ao Autor, a título de doença, nos períodos compreendidos entre 09.09.2013 a 06.01.2015 e de 09.03.2015 a 26.03.2016, com a conclusão/fundamento do Autor ter exercido atividade profissional, na empresa “BB – Aluguer e Compra e Venda de Material de Escritório, Incluindo Equipamento Informático, Limitada” e na empresa “CC... – Gabinete Gestão de Recursos Humanos ..., Limitada”, durante os períodos em que esteve em situação de doença subsidiada, dado que, nesse período, tinha praticados atos de verdadeira gestão ao serviço daquelas empresas que se consubstanciaram no seguinte:
a) na empresa “BB”:
- assinatura de, pelo menos, duas atas – ata n.º 14 de 31.03.2014 e n.º 15 de 31.03.2015 – ambas com a ordem de trabalho de “discutir, aprovar ou modificar o balanço e contas”, onde estiveram reunidos em assembleia geral os sócios e também gerentes AA e GG;
- assinatura de, pelos menos, um Relatório de Gestão, Demonstração de Resultados e Balanço, respeitantes ao exercício de 2012 (assinado em 28.3.2013);
-b) na empresa “CC...”:
- assinatura de, pelo menos, duas atas – ata n.º 28 de 31.3.2014 e ata n.º 29 de 31.3.2015, respeitantes aos exercícios de 2013 e 2014, ambas com a ordem de trabalhos de “discutir, aprovar ou modificar o balanço e contas”, onde estiveram reunidos em assembleia geral os sócios e também gerentes AA e GG;
- realização das despesas a que se reportam as faturas seguintes: – fatura-recibo n.º 002/6965 de 18.11.2013, no valor de €12,80, – fatura simplificada de 20.11.2013, no valor de €43,10, e fatura simplificada n.º 81/13 de 1.12.2013, no valor de €94,00,
que foram reembolsadas ao gerente, através de cheque ao portador com o n.º 2832466763, no valor de €149,90;
- fatura VDVI14-000913, emitida em 27.8.2014, no valor de €1.860,00 referente a uma viagem de cruzeiro, paga através de uma transferência bancária, datada de 4.9.2014, pela conta da CC..., Lda, n.º ...84, existente da CA – Crédito Agrícola;
- fatura nº 1/709, emitida em 16/05/2014, respeitante à compra de um veículo automóvel no valor de €34.000,00 (que integrou o ativo imobilizado da empresa – cfr conta 434 por contrapartida da conta 1201) que foi paga através de um cheque (nº 27...17) sacado sobre a conta nº ...84, emitido em 15/05/2014 à ordem da empresa HH... – Comércio de Automóveis Novos e Usados, Limitada, que se encontra assinado pelo gerente AA;
- fatura FAC A14/26, emitida em 09/04/2014, referente a obras de reparação no valor de €36,90, que foi paga através de um cheque (nº 90...10) sacado sobre a conta nº ...84, emitido em 09/04/2014 à ordem da empresa EE...- Portas & Automatismos, Limitada, que se encontra assinado pelo gerente AA;
- fatura nº B/1144, de 10/03/2014, no valor de €36,90,
- fatura nº F004/2587 de 13/03/2014 no valor de €15,70,
- fatura nº F004/2581 de 12/03/2014 no valor de € 21,60,
- fatura/recibo nº 002/9174 de 05/03/2014 no valor de € 16,00,
- fatura/recibo nº 002/9137 de 03/03/2014 no valor de € 21,15,
- e fatura/recibo nº 002/9156 de 04/03/2014 no valor de € 16,00,
que foram reembolsadas ao gerente através do cheque ao portador com o nº 4932466793, nº valor global de € 127,35;
- fatura simplificada nº 102/10479 de 15/02/2014, no valor de € 35,90,
- fatura nº 14FT001/86, de13/02/2014, no valor de € 162,00,
- fatura simplificada nº 427/0118661, de 10/02/2014, no valor de € 5,90,
- fatura simplificada nº 002/12824, de 13/02/2014, no valor de € 18,90,
- e fatura/recibo nº 002/8668, de 11/02/2014, no valor de € 4,95,
E que foram reembolsadas ao gerente através do cheque ao portador com o nº 0632466787, no valor global de € 227,65;
- fatura simplificada nº 002/9058, de 27/02/2014, no valor de € 4,95,
- e fatura/recibo nº VB139957, de 25/02/2014, no valor de € 83,40,
que foram reembolsadas ao gerente através do cheque ao portador com o nº 6732466791, no valor global de € 88,35;
- fatura simplificada nº A /29773, de 22/05/2015, no valor de € 63,00 (paga através de um cartão visa eléctron da Caixa de Crédito Agrícola, pertencente à CC.., Limitada),
- fatura/recibo nº FT 426/1608, de 11/05/2015, no valor de € 6,95,
- fatura/recibo nº FT 426/1756 de 19/05/2015 no valor de € 6,95,
- e fatura/recibo nº FT 15/4757, de 23/05/2015, no valor de € 61,40,
e que foram reembolsadas ao gerente através do cheque ao portador nº 36...26, no valor global de € 138,30;
- fatura nº AEI-Z-00508, de 31/12/2015, no valor de € 905,42 (paga através de um cartão de crédito), emitida pela FF.com, agência de viagens online, referente à compra de 3 viagens (entre os quais se incluem os gerentes) para a República Checa, com partida a 23/12 e regresso a 27/12 ambos de 2015, que foi contabilizada como despesa da empresa CC..., Limitada;
- fatura nº PAA 194067/2015, de 27/12/2015, no valor global de € 1.136,00, que foi contabilizada como despesa da empresa CC ... e paga através do cheque no 4948159356 sacado sobre a conta nº ...84 (pertencente à mencionada sociedade);
- fatura simplificada nº FS SI 5/0026178, de 28/03/2016, no valor de € 29,25 (paga através de um cartão visa electron da Caixa de Crédito Agrícola, pertencente à CC.., Limitada);
- fatura/recibo nº FT 4A1605/273, de 26/03/2016, no valor de € 179,70 (paga através do mesmo meio de pagamento). (Cfr. fls. 42 a 49 do PA e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
12. A “INFORMAÇÃO” referida no Ponto 11 termina concluindo no sentido de que “se deverão declarar nulas as prestações atribuídas a título de subsídio de doença nos períodos compreendidos entre 09/09/2013 e 06/01/2015 (data em que foi declarada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho pela Comissão de Verificação de Incapacidades) e de 09/03/2015 até 26/03/2016, cessando a partir dessa data, por se ter verificado a acumulação com exercício de atividade profissional”. (Cfr. fls. 42 a 49 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
13. O Diretor do Núcleo de Prestações em 10.01.2018, emitiu “Parecer” de concordância com a “INFORMAÇÃO” constante dos Pontos 11 e 12, nos seguintes termos:
“Concordo, devendo ser declaradas nulas as prestações atribuídas e a cessação para o futuro, nos termos e com os fundamentos propostos na presente informação, face às provas carreadas para o processo pelo Serviço de Fiscalização, nomeadamente, nas diligências complementares efetuadas oficiosamente após audiência, nos termos do disposto no artigo 125.º do CPA, que permitem reforçar a prova da acumulação indevida de prestações (subsídio de doença) com o exercício de atividade (artigos 24.º e 28.º DL n.º 28/2004, de 04.02 e artigo 60.º, n.º 2 da Lei n.º 4/2007, de 16.01 e artigo 3.º do DL n.º 133/88 de 20/04” (Cfr. fls. 42 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
14. Em 12.01.2018, o Diretor da Unidade de Prestações e Contribuições proferiu despacho, nos seguintes termos: “Concordo, com os fundamentos e nos termos invocados no parecer.” (Cfr. fls. 42 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
15. Através do ofício n.º 79050, datado de 12.01.2018, a Entidade Ré comunicou ao Autor a decisão, referida no ponto 14, de cujo teor se extrai o seguinte:
“(...)
Ora, todos estes factos, concatenados com a assinatura dos documentos atrás referidos, em nosso entender, são suficientemente reveladores de uma atividade de controlo e gestão constante das empresas em causa.
Acresce ainda referir que, desde pelo 09.09.2013, ambos os gerentes têm estado sucessivamente e reiteradamente de baixa por doença, não sendo de todo plausível que as referidas empresas se mantenham a laborar sem qualquer controlo dos sócios e gerentes, o que, de resto, é comprovado pelas declarações e documentos anexos aos relatórios finais que foram elaborados pelo Departamento de Fiscalização, Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes do Sector de Bragança, Viana do Castelo e Vila Real.
(...) para além disso, os beneficiários devem ainda comunicar à instituição da Segurança Social, nos termos do n.º 2 das alíneas d) e g) do referido artigo 28.º, o exercício de atividade profissional, independentemente da existência de remuneração (...).
Assim sendo, atento o supra referido, fica V. Exa. notificado da decisão final de declaração de nulidade das prestações atribuídas a título de subsídio de doença nos períodos compreendidos entre 09.09.2013 e 06.01.2015 (data em que foi declarada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho pela Comissão de Verificação de Incapacidades) e de 09.03.2015 até 26.03.2016, cessando a partir dessa data, por se ter verificado a acumulação com exercício de atividade profissional, conforme melhor resulta dos processos de averiguações supra referidos e que foram efetuados pelo Departamento de Fiscalização, Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes do Sector de Bragança, Viana do Castelo e Vila Real. (...)”. (Cfr. de fls. 50 a 65 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
16. O Autor, em 15.01.2018, tomou conhecimento da notificação referente à decisão final referida nos pontos 14 e 15 (Cfr. Fls. 65 e 66 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
17. Em 31 de março de 2014, o Autor e mulher DD participaram na Assembleia Geral Ordinária da sociedade “BB – aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Incluindo Equipamento Informático, Lda.”, de que são os únicos sócios, cuja Ata sob o n.º 14 assinou (Cfr. Ata n.º 14, a fls. 62 do ANEXO I-A, constante do Processo Administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
18. No dia 31 de março de 2015, o Autor e mulher participaram na Assembleia Geral Ordinária da sociedade “BB – Aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Incluindo Equipamento Informático, Lda.”, de que são os únicos sócios e assinou a respetiva ata, sob o n.º 15, cujo teor aqui se dá por reproduzido. (Cfr. Ata n.º 15, de fls. 61 do ANEXO I-A, constante do PA, apenso aos autos);
19. Em 28 de março de 2013, o Autor assinou o Relatório de Gestão, Demonstração de Resultados e Balanço referente ao ano de 2012, da sociedade BB – Aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Incluindo Equipamento Informático, Lda. (Cfr. doc. de fls. 52 verso a 56 verso do referido Anexo I-A, constante do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
20. No dia 6 de março de 2015, o Autor assinou o Relatório de Gestão, Demonstração de Resultados e Balanço referente ao ano de 2014, da sociedade “BB – Aluguer, Compra e Venda de Material de Escritório, Incluindo Equipamento Informático, Lda.”. (Cfr. doc. de fls. 43 a 47 verso do referido Anexo I-A, constante do PA, cujo teor se da por integralmente reproduzido);
21. No dia 31 de março de 2014, o Autor participou na Assembleia Geral Ordinária da sociedade “CC... – Gabinete de Gestão de Recursos Humanos de ..., Lda” e assinou a respetiva Ata, sob o n.º 28, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (Cfr. Ata n.º 28, a fls. 41 do Anexo I-A, constante do PA);
22. No dia 31 de março de 2015, o Autor participou na Assembleia Geral Ordinária da sociedade “CC... – Gabinete de Gestão de Recursos Humanos de ..., Lda” e assinou a respetiva Ata sob o n.º 29, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (Cfr. Ata n.º 29, a fls. 41 verso do ANEXO I-A, constante do PA);
23. Em 6 de março de 2015, o Autor assinou o Relatório de Gestão, Demonstração de Resultados e Balanço, referente ao ano de 2014, da sociedade “CC... – Gabinete de Gestão de Recursos Humanos de ..., Lda.” (Cfr. doc. de fls. 24 a 28 verso do referido Anexo I-A, constante do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
24. Todas as faturas referidas no Ponto 11, sob a alínea b) e cujo teor aqui se dá por reproduzido, foram emitidas à sociedade “CC ...”, nas datas e nos montantes nelas declarados. (Cfr. documentos de fls. 42, 44, 45, 46, 48, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 57, 67, 69, 81 e 82 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
25. A fatura n.º 1/709, emitida em 16.05.2014, pela “HH... – Comércio de automóveis novos e usados, Lda.”, no valor de €34.000,00, referente à compra de um veículo automóvel, foi paga por cheque emitido pelo Autor, em 15.5.2015, sobre a conta da sociedade “CC...”. (Cfr. Doc. de fls. 66 do Anexo I, constante do PA);
26. A fatura FAC A14/26, emitida em 9.4.2014, por “EE... – Portas & Automatismos, Lda.”, no valor de €36,90, foi paga, através de cheque da conta da “CC...”, emitido pelo Autor, em 9.4.2014 (Cfr. docs. fls. 56 e 57 do Anexo I, constante do PA];
27. A fatura VDVI14-000913, emitida 27.8.2014, pela “TT Agência de Viagens”, no valor de €1.860,00, referente uma viagem de cruzeiro realizada pelo Autor, foi paga por transferência bancária, ignorando-se o agente dessa transferência e a conta bancária que suportou a mesma transferência, sendo certo que, em 4.9.2014, o Autor transferiu da conta n.º ...84, do Crédito Agrícola da qual é titular a CC..., a quantia de €1.860,00, para a sua conta pessoal n.º 0045 1429 4002483777959, da mesma instituição bancária. (Cfr. docs. de fls. 68 e 69 do Anexo I, constante do PA);
28. A fatura no AEI-Z-00508, de 31/12/2015, no valor de €905,42, emitida à CC..., pela “FF.com”, agência de viagens online, refere-se à compra de bilhetes de avião, de ida e volta a Praga, para três pessoas, entre as quais se incluía o Autor, com saída do Porto no dia 23 de dezembro de 2015 e com regresso ao Porto no dia 27 do mesmo mês e ano, paga com cartão de crédito. (Cfr. fls. 46 do Anexo II, constante do PA, cujo teor se dá, por integralmente reproduzido);
29. A fatura no PAA 194067/2015, de 27/12/2015, no valor global de €1.136,00, emitida à CC ... por “Hotel...”, refere-se ao alojamento do Autor na cidade de Praga, nos dias 23, 24, 25 e 26 de dezembro de 2015. (Cfr. fls. 44 e 45 do Anexo II, constante do PA, cujo teor se dá, por integralmente reproduzido)
2. MATÉRIA de DIREITO
Tendo em consideração, por um lado, a sentença recorrida, e, por outro, as alegações apresentadas pelo recorrente, sintetizadas nas supra transcritas conclusões, bem como a contra argumentação apresentada em sede de contra alegações, verificamos que, afastada a invalidade formal, suscitada na p.i., atinente à falta de fundamentação, julgada inverificada, a única questão que se coloca à apreciação deste Tribunal de recurso consiste apenas e só em saber se nos períodos em causa --- o 1.º, de 9/9/2013 até 6/1/2015 e o 2.º, de 9/3/2015 até 26/3/2016 (cfr. Ponto 4 dos factos provados) --- o A./recorrido, por ter recebido prestações de subsídio de doença também exerceu actividade profissional que o impossibilita de receber tais prestações, como decorre da al. c) do n.º1 do art.º 4.º do Dec. Lei 28/2004, de 4 de Fevereiro.
No que a este concreto ponto se objectiva o dissídio dos autos, o TAF de Braga, entendeu que, no período de 9/9/2013 a 6/1/2015, o A. praticou apenas 3 actos de gestão, como sócio gerente (Na medida em que - como se refere inquestionavelmente na sentença recorrida - o 4.º acto verificado/apurado --- acto de 28 de Março de 2013 - assinatura do Relatório de Gestão, Demonstração de Resultados e Balanço, referente ao ano de 2012, da Actividade da Empresa "BB, L. da" --- não se mostra relevante, porque verificado em data anterior ao período de baixa por doença e consequente recebimento das respectivas prestações, este apenas iniciado em 9/9/2013.), sendo que, no período de 9/3/2015 a 26/3/2016, não se provou qualquer acto passível de ser considerado como actividade profissional.
E, tirada esta conclusão, analisando a prática dos 3 actos em causa --- (1) em 15/5/2014, emissão de um cheque para pagamento de um automóvel - cfr. ponto 19 do probatório -, (2) em 9/4/2014, emissão de um cheque para pagamento de factura e (3) em 4/9/2014 - cfr. ponto 25 do probatório -, transferência do montante de 1.860,00€ da conta da empresa "CC..." para a sua conta pessoal - cfr. ponto 26 do probatório - o TAF de Braga entendeu que, por se tratar de actos isolados e esporádicos, a sua prática não se pode considerar como exercício de actividade profissional, indutora de impossibilidade de recebimento de subsídio de doença.
O ISSocial, IP, discordando da sentença, entende, por um lado, que foram praticados mais 4 actos no período em referência - cfr. conclusão 19.ª das alegações - e, por outro, pese embora se trate de apenas 3 ou 7 actos, essa prática, ainda que esporádica não permite concluir pela possibilidade do seu exercício em tempo de baixa por doença.
Prognosticando, desde já, que damos assentimento à fundamentação e decisão da Sr.ª Juíza de direito do TAF de Braga, corroborado pelo A./Recorrido, nas suas contra alegações, vejamos, nesta parte, a argumentação/fundamentação judicial propendida:
"A questão que se coloca é, pois, a de saber se o Autor exerceu ou não atividade profissional durante os períodos em que esteve de baixa por doença (de 9 de setembro de 2013 a 6 de janeiro de 2015 e de 9 de setembro de 2015 a 26 de março de 2016).
E, para decidir tal questão, temos de atender, apenas, aos factos que foram dados como provados.
Vejamos, então.
O Autor era sócio de ambas as sociedades – “BB...” e “CC...” – vide ponto 1 da matéria de facto assente -.
De relevante para a questão em apreço resulta provado que o Autor participou em duas assembleias gerais de sócios da sociedade “BB...”, uma realizada em 31.4.2014 e a outra em 31.3.2015, e participou também em duas assembleias gerais de sócios da sociedade “CC...”, realizadas nas mesmas datas, tendo assinados as respetivas atas – vide ponto 20 e 21 da matéria fáctica provada -.
Argumenta o Autor relativamente a estes factos que os mesmos não constituem exercício de qualquer atividade profissional, uma vez que ser sócio de uma sociedade comercial não corresponde a qualquer profissão.
Assiste, neste ponto, razão ao Autor, uma vez que a presença e a participação do Autor nas referidas assembleias, ocorreu pelo facto de ser sócio das referidas sociedades, como nas respetivas atas expressamente se refere, e não pelo facto de ser gerente das mesmas, sendo que a realização de uma assembleia geral de sócios não pode ser considerada como um ato de gestão da empresa.
Mas o mesmo não acontece com os seguintes factos que também constam do elenco dos factos provados:
- em 28 de março de 2013, o Autor assinou o Relatório de Gestão, Demonstração de Resultados e Balanço referente ao ano de 2012, da sociedade “BB” – vide Ponto 17 da matéria fáctica provada -;
- em 15.5.2014, o Autor emitiu um cheque da conta da “CC...”, no valor de €34.000,00, para pagar o veículo automóvel adquirido à sociedade “HH... – Comércio de automóveis novos e usados, Lda.” – vide Ponto 24 da matéria fáctica provada -;
- em 9.4.2014, o Autor emitiu um cheque da conta da CC..., no valor de €36,90, para pagar a fatura emitida pela “EE... – Portas & Automatismos, Lda.” – vide Ponto 25 da matéria fáctica provada-
- em 4.9.2014, o Autor fez uma transferência da conta da CC... para a sua conta pessoal, no montante de €1.860,00 – vide Ponto 26 da matéria fáctica provada -
Ora, estes quatro factos, e ao contrário do que o Autor defende, constituem atos de gestão, por contendem diretamente com a atividade e o giro comercial das empresas.
Sucede, porém, que o primeiro daqueles factos (Ponto 17 da matéria fáctica provada) não é relevante para a questão agora em apreço, dado ter ocorrido em data anterior (28 de março de 2013) àquela em que o Autor entrou de baixa por doença (9 de setembro de 2013).
Mas o mesmo já não acontece com os outros três factos, pois todos eles ocorreram em 2014, dentro, portanto, do primeiro dos dois períodos em que o Autor esteve de baixa por doença (de 9.9.2013 a 6.1.2015).
Sendo assim de concluir que, o Autor praticou três atos de gestão, no decurso daquele período e que, relativamente ao segundo período de baixa (de 9.3.2015 a 26.3.2016), nada ficou provado a esse respeito, o que implicaria, desde logo, a procedência da ação no que toca às prestações por ele recebidas no decurso daquele segundo período de baixa por doença.
A questão que, agora, se coloca é a de saber se a prática daqueles três atos de gestão conduz à conclusão do efetivo exercício de atividade profissional por parte do Autor, durante o primeiro período de baixa por doença.
Considerando o número diminuto daqueles atos, o espaçamento temporal havido entre eles (9 de abril, 15 de maio e 4 de setembro de 2014) e a longa duração do período de baixa (de 9 de setembro de 2013 a 6 de janeiro de 2015), entendemos que a resposta não pode deixar de ser negativa.
A prática de um ou outro facto esporádico de natureza profissional também não é suficiente para afirmar que houve um efetivo exercício de atividade profissional, uma vez que o exercício de uma atividade profissional pressupõe, naturalmente, uma certa continuidade de ação prolongada no tempo.
Interpretar o disposto no artigo 24.º, n.º 1, c), do Decreto-Lei n.º 28/84, de 14/8, com o sentido de que a prática de atos esporádicos e ou ocasionais de natureza profissional constitui exercício de atividade profissional, para efeitos de cessação do direito ao subsídio de doença, seria sufragar uma interpretação que não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, por ser suposto que o legislador sabe exprimir o seu pensamento de forma adequada (vide artigo 9.º do Código Civil).
Se esse tivesse sido o pensamento do legislador, certamente que a terminologia utilizada seria outra. Diria, por exemplo, a prática de tarefas profissionais, em vez de exercício de atividade profissional.
Como decorre do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 24.º, do Decreto-Lei n.º 28/84, nos termos da qual o direito ao subsídio de doença cessa quando “b) O beneficiário tenha retomado o exercício de atividade profissional por se considerar apto”, o que o legislador pretendeu foi a manutenção do direito ao subsídio de doença depois de o trabalhador ter retomado o exercício de atividade profissional.
Ora, na linguagem corrente, a prática de alguns atos isolados e esporádicos não é considerada como o exercício de atividade profissional.
Entendimento diferente levaria a situações de manifesta injustiça e ofenderia o princípio constitucional da proporcionalidade, ínsito no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.
Concluindo, decide-se não ter havido por parte do Autor exercício de atividade profissional, o que implica a procedência da ação, e torna prejudicial o conhecimento da “nulidade” de todas ou só de algumas das prestações que anteriormente lhe tinham sido atribuídas pelo Réu, a título de subsídio de doença (relativamente aos períodos de 9/9/2013 a 6/1/2015 e de 9/3/2015 a 26/3/2016)".
*
Vejamos!
Quanto aos 3 actos assumidos na sentença recorrida --- (1) em 15/5/2014, emissão de um cheque para pagamento de um automóvel - cfr. ponto 19 do probatório -, (2) em 9/4/2014, emissão de um cheque para pagamento de factura e (3) em 4/9/2014 - cfr. ponto 25 do probatório -, transferência do montante de 1.860,00€ da conta da empresa "CC..., L. da" para a sua conta pessoal - cfr. ponto 26 do probatório --- embora cientes da tese apresentada a este propósito pelo ISSocial, entendemos que a razoabilidade, pela singularidade dos actos, a par do seu carácter isolado e esporádico, não pode deixar de ser entendido como não correspondendo ao exercício de uma actividade profissional, enquanto gerente de empresas, assim, aderindo à tese/decisão do TAF de Braga, sob pena de violação do princípio da proporcionalidade, como defende o A./Recorrido nas suas contra alegações.
Quanto aos demais actos, concretamente 4, sendo referentes a participação e assinatura de actas referentes a 2 Assembleias Gerais Ordinárias de sócios na sociedade "BB, L. da", realizadas nos dias 31/4/2014 e 31/3/2015 e 2 Assembleias Gerais Ordinárias na sociedade "CC..., L. da" também realizadas nos dias 31/4/2014 e 31/3/2015 --- cfr. pontos 17/18 e 21/22 dos factos provados, respectivamente - que não pontos 20 e 21 como, por lapso, se refere na sentença (fls. 21) (Como assinala o ISSocial nas suas alegações.), também o TAF de Braga entendeu que não se poderiam qualificar como exercício de actividade profissional, integrante da al. c) do n.º1 do art.º 24.º do Dec. lei 28/2004, de 4 de Fevereiro, donde derivaria a impossibilidade de recepção de subsídio de doença.
Mas também, nesta parte, entendemos sufragar a posição da 1.ª instância, na medida em que, pese embora o A./Recorrido seja gerente dessas duas sociedades, a sua presença nessas quatro Assembleias Gerais Ordinárias (no caso, apenas para aprovação de contas - art.º 65.º, no 4 do CSC) não pode ser dissociada da sua qualidade de sócio, sendo certo que a sua presença se impunha por via desta qualidade, que não pela qualidade de gerente; essas assembleias ordinárias destinam-se aos sócios que não aos gerentes e é nessa estrita qualidade a sua participação.
Assim, não podendo essas participações ser entendidas como actos de gestão das sociedades em questão, não podem ter a repercussão que o ISSocial delas pretende retirar (cfr. Ponto 4 dos factos provados).
*
Impõe-se, deste modo, concluir pela total improcedência do recurso.
III. DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
Notifique-se.
DN.
Porto, 30 de Setembro de 2022
Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho |