Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00462/23.8BEBRG-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/05/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:PAULO FERREIRA DE MAGALHÃES
Descritores:PROCESSO CAUTELAR; REQUISITOS DETERMINANTES DO DECRETAMENTO DAS PROVIDÊNCIAS;
INCAPACIDADE PERMANENTE E PARCIAL DE DOCENTE;
PERICULUM IN MORA;
Sumário:
1 – Nos termos do artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente, situação em que, como dispõe o n.º 2 deste normativo, mesmo ainda na eventualidade de terem sido julgados verificados esses requisitos determinantes, sempre a adopção das providências pode ser recusada quando em sede da ponderação dos interesses públicos e privados em presença, for julgado que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.

2 - A existência de perigosidade [seja na vertente do receio da constituição de uma situação de facto consumado, seja na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação], e da aparência do bom direito [enquanto avaliação sumária da probabilidade de existência do direito invocado] para os interesses que os Requerentes visam assegurar no processo principal, constituem requisitos determinantes para efeitos de ser apreciada a providência requerida, recaindo sempre sobre eles o ónus de fazer a prova sumária desses requisitos.

3 - O juízo que cabe levar a cabo no artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, não pode ser misturado com o juízo que deve ser feito a título principal, visto tratar-se dum juízo perfunctório, sumário, tal como é reclamado pelo legislador em termos cautelares, por constituir um juízo que é formulado sob reserva de se poder chegar a uma conclusão diversa em sede do processo principal.

4 - Fixada a dialética factual, entre a prestação do horário de trabalho da representada do Requerente ora Recorrente com sujeição a um regime de horário completo por um lado, e a prestação no período da manhã, e/ou sob o regime da jornada contínua por outro, que o Recorrente entende ser de 20 horas mas que imputa ao Recorrido ter fixado em 21 horas, não dilucida assim este Tribunal de recurso, por que termos e pressupostos é que esta fixação é passível de gerar a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação.

- Se no âmbito da relação jurídica administrativa que a representada do Requerente tem e mantém com o Requerido ora Recorrido, veio a ser fixado um horário de trabalho à representada do Requerente, tendo por pressuposto de que essa fixação dá satisfação ao que foi apreciado pela junta médica da ADSE quer pela medicina do trabalho, e desta feita, que assim dá satisfação à pretensão deduzida, mas se como assim entende o Requerente ora Recorrente, tal viola a lei, desde logo por entender que foi fixado à sua representada não um horário de 20 horas, mas um horário de 21 horas, e que não foi assim observado o que foi determinado em sede das determinações de ordem médica, nem garantido o direito à jornada contínua, tal não se revela, porém, apto a poder fazer inflectir o julgamento tirado pelo Tribunal recorrido, no sentido de que não está preenchido o requisito da perigosidade, que por si é determinante para que possa vir a ser adoptada, com a verificação dos demais requisitos, a providência cautelar requerida.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


SINDICATO DOS PROFESSORES DO NORTE, em representação da sua associada «AA» [ambos devidamente identificados nos autos], Requerente no processo cautelar que intentou contra o Ministério da Educação [também devidamente identificado nos autos], no qual foi requerido o decretamento provisório da “[…] mudança do horário de trabalho da representada do requerente para o regime de jornada contínua e, consequentemente, procedam-se às reduções horárias semanais de uma hora diária na instituição em que for colocada, perfazendo-se o limite horário semanal de trabalho de 20 horas semanais, com prevalência da redução do tempo letivo, conforme indicações médicas de medicina do trabalho - até decisão transitada em julgado em sede de ação principal.”, inconformado com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual foi julgado totalmente improcedente o processo cautelar, e em consequência, recusada a concessão da providência requerida, veio interpor recurso de Apelação.

*
No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:


“[...]
CONCLUSÕES:

A. Na douta sentença ficou estabelecido na sua página 7 que: “Conforme decorre do probatório supra, desde 13 de Setembro de 2023, na sequência das recomendações formuladas pelo médico do trabalho, à associada do Requerente foi atribuído um horário de trabalho a decorrer somente no período compreendido entre as 8h15 e as 13h05, variando a data de inicio e término conforme o dia da semana, com período letivo reduzido e constatando-se um total de horas de trabalho semanais que não ultrapassa as 20 horas.”
B. Respeitosamente a recorrente não pode concordar com a decisão de facto proferida e assim sustentada.
C. Ao contrário do vertido na sentença em crise, o valor de horas totais atribuídas à docente foi de 21 horas e não 20 horas como é sustentado na douta sentença no facto provado o) não se tendo assim cumprido a orientação de que o seu horário deveria ser organizado em regime de jornada continua tendo-se violado a orientação da Ficha da Aptidão para o Trabalho.
D. O regime de jornada continua (Art. 114 n.º 1, 3 alínea f da LGTFP) implica a redução de uma hora de trabalho diário – assim sendo a docente teria sem jornada continua 25 horas de trabalho (22 letivas (nos termos estabelecidos do Art.77 n.º 2 do Estatuto da Carreira Docente) mais 3 não letivas) com a redução de uma hora diárias nos 5 dias da semana passaria ao limite de 20 horas semanais e não 21 horas como estão aplicadas à docente.
E. Não se pode concluir como o douto tribunal fez que “as recomendações médicas para fixação de horário de trabalho foram, em setembro de 2023, todas tidas em consideração aquando da fixação do referido horário de trabalho da sua associada” – estando o tribunal em erro de julgamento.
F. Na sentença cautelar em referência deve-se notar que foi aí dado como facto provado letra o) que “foi atribuído um horário de trabalho a decorrer somente no período compreendido entre as 8h15 e as 13h05”. Sucede que, tal constatação judicial não tem suporte probatório uma vez que a autora, no dia de quinta-feira tem de trabalhar das 17h20 às 18h10 – conforme se demonstra pela consulta do horário objeto da presente decisão.
G. O Tribunal a quo fez uma errada interpretação e valoração da prova produzida a partir do horário junto aos autos pela ré, ao dar como provado o facto identificado com a letra o), já que tal prova permitiria dar como demonstrado factos que erroneamente alterariam o elenco dos factos provados, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento de facto.
H. A A. entende que existiu um erro insanável de Julgamento acerca do número de horas de trabalho, sendo tal facto uma contradição absoluta com a prova produzida tendo em conta que da prova produzida resulta expressamente que foi atribuído à recorrente 21 horas de trabalho.
I. O tribunal fundamentou a sua decisão de absolver a Ré do pedido tendo por base a convicção errada de que a A. já beneficiava de um horário em regime de jornada continua de 20 horas, o que é redonda e inequivocamente falso.
J. Nem o autor nem a ré juntou aos autos nenhuma prova documental de que se encontra aplicado o horário em tal regime. Por isso, não se pode de todo aceitar que para a fundamentação da decisão da matéria de facto o tribunal tenha feito constar tal conclusão.
K. O facto o) deverá ser eliminado dos factos dados como provados, devendo dar-se como provado o facto da ré ter atribuído à autora um horário de 21 horas semanais (sem prejuízo de que este termina em 31-08-2024).
L. O douto tribunal conclui na sentença que “ o horário de trabalho foi fixado de acordo com todas as indicações médicas da medicina do trabalho, que, por sua vez, foram de encontro às recomendações dos médicos que acompanham a associada do Requerente nas suas patologias”.
M. Na ficha de Avaliação de Medicina do Trabalho na matéria relativa à avaliação de fatores de risco no posto de trabalho frisou-se que a autora “Não deve executar tarefas de vigilância e devem sempre que possível ser convertidas aulas letivas em não letivas.” O que não se verifica.
N. Das 21 horas atribuídas à docente – 15 horas foram atribuídas como letivas, 6 horas como não letivas. Destas 6 horas (4 foram atribuídas em virtude do artigo 79.º do Estatuto da Carreira Docente pelo tempo de serviço e da idade) e uma não letiva foi atribuída tal como foi concedida a todos os docentes de todos os grupos disciplinares para reuniões obrigatórias designada no horário como Tempo de Escola).
O Tirando os direitos estatuariamente adquiridos em função da sua idade derivados do artigo 79.º do Estatuto da Carreira Docente, apenas uma hora não letiva lhe foi concedida, uma vez que lhe foi aplicado o valor máximo possível de horas letivas (6 turmas).
P. Deve dar-se como provado que o horário de trabalho só vigora até 31-08-2024, mudando todos os anos, não protegendo a docente para além dessa data.
Q. Pelos factos expostos, não foi atribuído pela entidade profissional qualquer conversão de período letivo para não letivo (uma vez que a autora tem 15 horas letivas e 6 não letivas). Muito pelo contrário a ré esticou o período de tempos letivo ao máximo atribuindo à autora aquilo que por lei já lhe é garantido.
R. Do mesmo modo, com o devido respeito, o Tribunal a quo não analisou se a quantidade de aulas e turmas atribuídas à docente, é compatível com o ponto 3 da Ficha de Aptidão e junta médica da ADSE. Nestas, foi mencionado que a autora não pode executar tarefas que impliquem ortostatismo prolongado e que lhe devem atribuir tarefas moderadas. Recomendação esta que no nosso entendimento não se compadece com a aplicação de 6 turmas.
S. No quadro da componente não letiva o artigo 82.º do ECD dispõe um conjunto de atividades não letivas com um nível de exigência e esforço menor tomando em reflexão as orientações e exigências individuais da docente emitidas pela Ficha de Aptidão para o Trabalho e pela Junta Médica da ADSE, especificamente a recomendação de que não deve executar tarefas que impliquem ortostatismo prolongado e adaptado a tarefas moderadas.
T. O Tribunal constitui-se erro de julgamento ao não se pronunciar nunca sobre os factos trazidos ao processo pela autora com pertinência para o cumprimento das indicações da ficha de medicina do trabalho e junta médica da ADSE, factos que foram apresentados pela autora e nunca foram contestados pela ré.
U. Como disse o TRG no processo 42/14.... “A não apreciação de algum argumento ou razão jurídica invocada pela parte pode, eventualmente, prejudicar a boa decisão sobre o mérito das questões suscitadas.”
V. Entrou assim o douto tribunal em erro de julgamento dado no seu juízo terem sido ocultado elementos essenciais que pela sua natureza põe em causa a decisão jurisdicional.
W. O tribunal não fez qualquer ponderação ou avaliação sobre o requisito da Ficha de Aptidão para o Trabalho “Não deve executar tarefas que impliquem ortostatismo prolongado (estar em pé mais de 30 minutos)”, nem da indicação da Junta Medica da ADSE que à docente tem de ser atribuídos trabalhos moderados. Ainda assim, o Tribunal concluí estarem todos os requisitos da Ficha de Aptidão para o Trabalho cumpridos, nem se pronunciando sobre o relatório da Junta Médica da ADSE.
X. A fundamentação da matéria apresentada é insuficiente para convencer a A. das razões pelas quais o Tribunal a partir do horário atribuído concluiu que o mesmo permitia que a autora tivesse poucas tarefas que impliquem ortostatismo prolongado.
Y. Pelo exposto não se pode concluir que esteja aplicado o regime de jornada continua à recorrente (artigo 114 n.º1, 3 al.f) da LGTF) , uma vez que não foram aplicadas à docente 20 horas de trabalho, como a sentença alega como facto provado.
Z. Dado que os elementos da sentença na qual se baseiam as suas conclusões partem de premissas factuais erradas, a sentença padece de erro de julgamento.

AA. Na matéria relativa ao pedido da autora que pedia que a providência cautelar fosse decretada até ao trânsito em julgado em sede de ação principal, ocorreu uma total ausência de pronuncia, uma vez que o Tribunal não tomou qualquer posição em relação ao mesmo.
BB. O tribunal a quo, em momento algum se pronunciou sobre a parte do pedido em que a “decisão cautelar fosse decretada até ao transito em julgado em sede de acção principal”.
CC. Tal realidade fáctica e processual significa objetivamente que a autora ao longo do decorrer da ação principal irá ser submetida a diferentes instituições de ensino e consequentemente diferentes horários e diretores escolares ( já no presente ano 2024).
DD. Foi essa instabilidade e incerteza quanto ao comportamento das direções escolares que desencadeou a necessidade da autora intentar uma providência cautelar com vista a garantir o seu direito à jornada continua e o respeito por todos os requisitos da ficha de aptidão da medicina do trabalho enquanto decorrer o processo principal. Por isso a Autora requereu expressamente que a decisão da providência cautelar fosse decretada até ao transito em julgado da decisão principal.
EE. A alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.C., comina com a nulidade a decisão em que se verifica a omissão ou excesso de pronuncia por parte do juiz.
FF. Dos fundamentos expostos verifica-se na sentença, que a mesma em momento algum ocorreu uma análise ou sequer uma ponderação sobre a necessidade da providência ser decretada até ao trânsito em julgado da ação principal (nunca se salvaguardando que este horário termina em 31-08-2024).
GG. O Tribunal debruçou-se somente sobre o horário de um ano escolar, quando o que sempre foi requerido na providência cautelar não foi apenas um pedido incidente sobre a estruturação do horário concreto, mas também de todos os horários que venha a ter até ao transito em julgado da decisão principal.
HH. Nunca esteve em causa apenas um horário específico, mas, a aplicabilidade
do direito à jornada continua (artigo 114.º n.º 3 alinea f) abstratamente, em termos futuros, nos horários que forem atribuídos pelas entidades competentes para que as mesmas respeitem tal obrigação jurisdicional.
II. Não foi nunca explicado pelo Tribunal qual o motivo pela qual tal providência não poderia ser decretada até ao transito em julgado, ficando assim parte do pedido apresentado pela autora completamente sem resposta jurisdicional.
JJ. Verificou-se na sentença uma violação dos artigos 608º, nº 2 e 615º, nº 1, al. d), por força do disposto no artigo 613º, nº 3, todos do Cód. Proc. Civil.
KK. Deve ser a decisão judicial considerada completamente nula por omissão de pronuncia!
LL. Por ter dado erroneamente como provado o facto da alínea o) da sentença, e não ter realizado qualquer ponderação sobre os requisitos da ficha de aptidão para o trabalho, desviou-se da realidade factual, representando assim falsamente a satisfação plena da pretensão da autora.
MM. Não foi aplicado à autora um horário semanal de 20 horas, não se cumprindo-se o disposto legalmente previsto no regime da jornada continua, não se podendo concluir como fez o tribunal erroneamente que o pedido apresentado pela autora esteja assim satisfeito no que concerne à matéria peticionada do seu horário laboral.
NN. Em momento algum o tribunal para além de não ter demonstrado como concluiu o seu raciocínio que “analisados os autos, constata-se que a pretensão do Requerente, manifestada nestes mesmos autos, já se encontra satisfeita, pois que as recomendações médicas para fixação de horário de trabalho foram, em Setembro de 2023, todas tidas em consideração”, o mesmo não ponderou se efetivamente as horas letivas foram reduzidas ou pelo menos atenuadas em detrimento das horas não letivas, e que este o horário não prevalece até ao transito em julgado.
OO. Contrariamente ao raciocínio do Tribunal a quo podemos verificar objetivamente que do horário aplicado à autora- 15 horas foram letivas e 6 não letivas. Nestes termos, ocorreu uma prevalência do tempo letivo em mais do dobro quanto ao horário de tempo não letivo, tendo a ficha de aptidão para o trabalho indicado que na redução do tempo de trabalho deveria ser dado prevalência à conversão do período letivo para não letivo. Assim sendo, considerando o horário objeto da decisão cautelar nada permite concluir que o pedido apresentado pela autora estivesse satisfeito.
PP. Houve um erro de julgamento do Tribunal quanto à matéria da satisfação da pretensão da autora. Este erro consubstanciado numa má e errada avaliação das provas obtidas conduziu a uma deficiente apreciação da matéria de facto e direito, e pôs em causa toda a decisão jurisdicional.
QQ. As premissas na qual se alicerçou a decisão estão completamente contaminadas pelo erro na matéria de facto e direito atinente à satisfação da pretensão da autora, e assim os requisitos exigíveis para o decretamento da providência cautelar mostram-se erroneamente avaliados.
RR. Demonstrou-se que a requerente alegou vários factos com interesse para a decisão da causa, o tribunal reconheceu tais factos como provados como se constata nas alíneas g), h), i), j), k), l), m) e n) do elenco dos factos provados, mas não os teve em consideração na avaliação do periculum in mora.
SS. Os fundamentos médicos, tidos como factualidade inteiramente provada, não foram nunca tidos em consideração no preenchimento do critério do periculum in mora.
TT. O tribunal não valorou as avaliações de três juntas médicas (Atestado Multiusos, ADSE e Medicina do Trabalho como prova produzida por colégios periciais.
UU. Assim a requerente alegou e demonstrou que a sua condição de saúde é bastante frágil, que a submissão a um horário completo é desaconselhado pelos médicos, e que a exposição a um horário excessivo de horas letivas lhe causa enormes dores.
VV. Os factos relativos à questão da saúde estão todos provados, uma vez que o tribunal mencionou que não há factos não provados, e portanto, todos eles são relevantes para a boa decisão da providência cautelar requerida.
WW. Na seleção dos factos relevantes e irrelevantes, incorreu em erro no julgamento da matéria de facto e de direito quando os omitiu por completo no preenchimento do critério do periculum in mora, o que determina a invalidade da decisão proferida.
XX. Constam do processo elementos probatórios suficientes para que o tribunal considerasse que os requisitos que permitem o decretamento da providência cautelar requerida estão, todos eles, preenchidos.
YY. Decorre da sentença proferida que “que, na situação concreta dos presentes autos, não se constata a possibilidade de uma situação de facto consumado, ou seja, a eventual procedência da acção principal não é incompatível com a reintegração da situação conforme à legalidade, nem a existência de um prejuízo efectivo para a saúde da associada do Requerente, pois que esta encontra-se a cumprir um horário de trabalho fixado de acordo com todas as orientações médicas manifestadas para a sua situação concreta”;
ZZ. O Tribunal debruçou-se somente sobre o horário de um ano escolar, quando o que sempre foi requerido na providência cautelar, não foi apenas um pedido incidente sobre a estruturação do horário concreto, mas sim de todos os horários que venha a ter até ao transito em julgado da decisão principal.
AAA. Nunca esteve em causa um apenas horário específico mas, a aplicabilidade do direito à jornada continua (artigo 114.º n.º 3 alínea f) abstratamente, em termos futuros, nos horários que forem atribuídos pelas entidades competentes e as mesmas respeitam tal obrigação jurisdicional.
BBB. Como se viu já anteriormente é falso que a autora tenha beneficiado da aplicação do regime de jornada continua com aplicação do horário em setembro de 2023, como também é falso que tal regime tenha sido aplicado de acordo com todas as orientações de medicina do trabalho.
CCC. O agravamento da situação clínica da requerente em virtude de não beneficiar do regime de jornada continua, nos futuros anos escolares, bem como das restantes orientações de medicina do trabalho,






determinam o agravamento do estado de saúde débil da requerente, o que, como é evidente, provoca uma situação de facto consumado ou, pelo menos causa prejuízos de difícil reparação (atente-se nas várias patologias da requente).
DDD. O Tribunal nunca considerou o facto do horário atribuído no presente ano letivo ser insuficiente para a garantia da saúde da docente até ao transito em julgado do ponto de vista temporal já que em setembro tal horário não está em vigor porque a autora muda de escola todos anos.
EEE. O tribunal nunca tomou em consideração a posição assumida por todas as entidades a quem a autora implorou a concessão do regime e viu o completamente negado, só tendo a ré alterado a sua posição quando foi pressionada judicialmente e somente por este ano. Isto significa que a ré não cumpre voluntariamente o direito à jornada continua sem ser com recurso à via judicial, transformando a vida da A. num calvário.
FFF. É manifesto que que o tribunal a quo não andou bem ao ter concluído, sem fundamentar, que não se pode afirmar que a atividade da requerente ficaria comprometida se tivesse de exercer a sua atividade profissional sem as adaptações emanadas pela Medicina do Trabalho, demonstrando-se, em face do supra exposto, que o requisito do periculum in mora, no caso em apreço, está manifestamente preenchido.
GGG. O tribunal entende que o perigo não é “efetivo, atual e irreparável” ainda que, contraditoriamente, origine a impossibilidade de a requerente cumprir com a sua atividade e afete a atividade da requerente de modo irremediável, tendo só em conta o horário que termina em Setembro de 2024.
HHH. A Autora não consegue perceber como é que o risco não é “efetivo, atual e irreparável” quando se reconhece que os prejuízos a causar à requerente poderão traduzir-se num agravamento da sua saúde e que tal incumprimento afetaria a atividade da requerente “de modo irremediável”.

III. Se o perigo de afetar a saúde individual da requerente não consubstancia uma situação de facto consumado e um prejuízo de difícil reparação, então a requerente não consegue vislumbrar em que situações é que tal pode acontecer.
JJJ. Esqueceu-se o tribunal que já no próximo mês de setembro a requerente terá um novo horário de trabalho e não tendo sido decretada a providência atempadamente a recorrente terá obrigatoriamente de passar de novo por todo o calvário pondo em causa a sua saúde e um horário não compatível com a mesma.
KKK. Se a ré não deferisse a sua pretensão, faria sentido a Autora colocar nova providência cautelar em cada ano, quando este risco era previsível?
LLL. Estando em causa uma providência cautelar, nem se exige que estejamos perante um risco efetivo, atual e irreparável, bastando-se o legislador com um risco fundado, de probabilidade ou verosimilhança – cfr., neste sentido, acórdão do TCA Sul, de 07.04.2016, processo n.º 13092/16, in www.dgsi.pt;
MMM. Ora, do supra exposto resulta que o tribunal a quo disponha de elementos factuais mais do que suficientes para concluir pela necessidade da tutela cautelar que deveria de ter sido decretada, desde logo por se verificar, entre outros, o fundado receio de produção de prejuízos, pelo menos, de difícil reparação.
NNN. O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de direito ao ter considerado como não verificado o requisito do perículum in mora, impondo-se, assim, a revogação da referida decisão. Tal decisão deverá ser substituída por outra que, não apenas considere como preenchido o mencionado requisito, como todos os restantes, que determinam a procedência da presente providência, nos termos que melhor resultam do requerimento inicial (salvo se o tribunal considerar que existem factos relevantes para a decisão que devam ser objeto de prova, constatando-se que, neste caso, os autos deverão ser remetidos para o tribunal de 1.ª instância).

OOO. A sentença recorrida, viola entre outras, as disposições dos artigos entre outras as disposições do artigo 2.º alínea f) do Despacho normativo n.º 10-B /2018, artigo 71 n.º 2 da CRP, artigo 114 n.º 3 alínea f) da LTPF, artigo 114 n.º 4 da LTFP, artigo 152.º do CPA, artigo 212 n.º 2 alínea a) do Código do Trabalho ex vi artigo 4 n.º 1 alínea h) da LTFP, artigo 23 n.º 1 alínea b) do Código de Trabalho ex vi artigo 4 n.º 1 alínea c) da LTFP, artigo 5 n.º 2 e 27 n.º 1 alínea i), da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 56/2009, de 30/07; ratificada pelo Decreto do Presidente da República
n.º 71/2009, de 30/07.
Nestes termos deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue a providência totalmente procedente, cumprindo o Direito e fazendo a costumada Justiça.
[...]. ”

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O Recorrido não apresentou Contra Alegações.

*

O Tribunal a quo proferiu despacho visando a não ocorrência da invocada nulidade, assim como a admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.


***

Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

***

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.°, n.° 1 do CPTA, e artigos 639.° e 635.° n.°s 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.° e 140.°, n.° 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que venha a declarar a sua nulidade, sempre tem de decidir [Cfr. artigo 149.°, n.° 1 do CPTA] “... o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.”, reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões suscitada pelo Recorrente e patenteadas nas conclusões apresentadas consistem, em suma e a final, em apreciar e decidir, sobre se a Sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia, e de erro de julgamento em matéria de facto e de direito.

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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, foram fixados os seguintes factos:

“[…]
A) Factos provados
a) «AA» é licenciada em Engenharia Zootécnica, com profissionalização, e professora do Quadro da Escola Básica e Secundária de ..., ..., grupo de recrutamento 230 (cfr. documento nº ... junto com a p.i. da acção principal);
b) No ano lectivo de 2022/2023, «AA» exerceu funções de docente no Agrupamento de Escolas ... (cfr. documento nº ... junto com a p.i. da acção principal);
c) No ano lectivo de 2023/2024, «AA» exerce funções de docente no Agrupamento de Escolas ... e ... (cfr. fls. 124 dos autos);
d) No ano lectivo de 2022/2023, o Agrupamento de Escolas ... atribuiu a «AA» um horário lectivo de 25 horas semanais (cfr. doc. nº ... junto com a p.i. da acção principal);
e) Em 6 de Janeiro de 2023, «AA» requereu à Directora do Agrupamento de Escolas ... a fixação de um horário de trabalho em regime de jornada contínua para o ano de 2022/2023 e a aplicação das indicações do médico de Medicina no Trabalho (cfr. doc. nº ... junto com a p.i. da acção principal);
f) Em 16 de Janeiro de 2023, a Directora do Agrupamento de Escolas ..., sobre o requerimento referido em e), proferiu o seguinte despacho “Conforme já comunicado oralmente em Setembro em conversa presencial, o quadro normativo em vigor não permite atender ao solicitado, salvo se houver despacho favorável de junta médica da ADSE, após requerimento apresentado pela docente – informação similar já foi proferida pelo Sr. DGESTE-Norte. Nestes termos, é indeferido o pretendido.(..)” (cfr. doc. nº ... junto com a p.i. da acção principal);
g) «AA» é portadora de deficiência que lhe confere uma incapacidade permanente global de 94% (cfr. doc. nº ... junto com a p.i. da acção principal);
h) «AA» é seguida nas especialidades médicas de cirurgia geral, gastrenterologia, urologia, endocrinologia, oncohematologia, oncologia médica, ortopedia, reumatologia, medicina interna, medicina física e reabilitação, psiquiatria e psicologia (cfr. doc. nº ...0 junto com a p.i. da acção principal);
i) Em 16 de Dezembro de 2011, o médico ortopedista do Hospital da Luz «BB» declarou e atestou que “«AA» padece de Síndrome de Fadiga Crónica III – encefalomielite miálgica crónica + sinovite poliarticular + doença de Whipple pelo que dada a sintomatologia / sinais graves evidenciados pela doença ainda se acentuarão mais ao longo do dia (astenia severa, perturbações mnésicas, incapacidade para a realização de atividades de vida diária físicas), se aconselha um horário de trabalho concentrado na parte matinal, nunca excedendo as 3 horas/dia, assim como dispensa completa de todas as atividades não letivas e as atividades em que tenha de permanecer de pé ou andar muito.” (cfr. doc. nº ...1 junto com a p.i. da acção principal);
j) Em 8 de Fevereiro de 2012, o médico de Medicina Interna do Hospital Particular de Guimarães «CC», registou o seguinte “A doente acima mencionada sofre de encefalopatia miálgica grave (Síndrome de fadiga crónica) - Grado IV. Com má evolução e múltiplas complicações. Severa incapacidade e intolerância para o stress físicopsíquico. Precisando de repouso prolongado. Acrescentando riscos de maior complicações. Em relação ao processo médico, deve limitar a atividade profissional. Existe contraindicação absoluta pelos esforços em situação de fadiga.
Aconselhando-se: - redução significativa da capacidade horária letiva. Ademais sempre deve ser realizada em horário de manhã, após repouso prolongado.
- Evitar ultrapassar 4 horas/dia. (Adaptado pela doente as suas condições.
Podendo precisar períodos de descanso.)
- Exceção das atividades não letivas.”. (cfr. doc. nº ...3 junto com a p.i. da acção principal);
k) Em 06 de Fevereiro de 2012, a médica psiquiatra «DD» referiu que “Como a doente mantém o intuito de continuar a exercer a sua atividade profissional, esta deverá ser limitada, havendo contraindicação absoluta para esforços em situação de fadiga (grande capacidade e intolerância para fatores de stress físico, necessitando de períodos de repouso prolongado, dado o risco de maiores complicações. Já foi por demais salientada a absoluta necessidade de redução significativa da carga horária lectiva, a qual deverá ter lugar durante a manhã, após o período noturno de repouso prolongado. Será de evitar trabalhar mais de 4 horas por dia, dada a necessidade de períodos de descanso. Deverá ser completamente dispensada de atividades não lectivas.
Estas são as diretrizes fundamentais que a doente possa usufruir do seu direito ao trabalho, muito embora condicionada por uma doença crónica. (…)” (cfr. doc. nº ...5 junto com a p.i. da acção principal);
l) Em 19 de Outubro de 2022, «AA» sofreu esofagite virica, pelo qual esteve internada no Hospital de Braga até 30 de
Novembro de 2022 (cfr. doc. nº ...2 junto com a p.i. da acção principal);
m) Em 26 de Junho de 2023, a Junta Médica da ADSE deliberou “a) Funcionário apto a regressar ao serviço do Artigo 11º do Decreto-Regulamentar nº 41/90, de 29 de Novembro. (…) Devem ser atribuídos serviços moderados a definir pelo médico do trabalho (…)” (cfr. doc. nº ... junto com a oposição);
n) Em 23 de Agosto de 2023, pelo médico do trabalho foi recomendado o seguinte “não deve executar tarefas de vigilância de exames”, “Deve sempre que possível converter-se aulas lectivas em aulas não lectivas”, “não pode executar tarefas que impliquem o ortoestaísmo prolongado (estar em pé mais de 30 minutos)”, “As suas tarefas devem ser organizadas em jornada continua e deve ser isentada da direcção de turma” (cfr. fls. 98 dos autos);
o) Na sequência das recomendações referidas em m), em Setembro de 2023, a Direcção do Agrupamento de Escolas ... e ... atribuiu a «AA» o seguinte horário de trabalho:
- Segunda feira – início às 08h15m e término às 12h10, com 2 aulas lectivas e período não lectivo;
-Terça feira – início às 09h20m e término às 12h10m, com 3 aulas lectivas;
-Quarta-feira – início às 09h20m e término às 13h05m, com 3 aulas lectivas;
-Quinta-feira – início às 09h20m e término às 12h10m, com 2 aulas lectivas; -Sexta-feira - início às 08h15m e término às 13h05m, com 4 aulas lectivas. (cfr. fls. 137 dos autos).
p) Em 25 de Julho de 2023, deu entrada neste TAF o presente processo cautelar (cfr. fls. 1 dos autos).
B. Factos não provados
Com interesse para a decisão da causa, inexistem factos não provados.
C. Motivação de Facto
A matéria de facto indiciariamente provada resulta da posição assumida por cada uma das partes nos seus articulados, bem como dos documentos juntos aos autos pelas partes e referidos supra, em cada uma das alíneas da matéria de facto indiciariamente provada.
[...]”

**

Como assim patenteado sob as conclusões das Alegações de recurso, designadamente em torno das vertidas sob as alíneas A) a K), o Recorrente impugna a matéria vertida sob o ponto o) do probatório, assim como o demais julgamento que o Tribunal a quo vem a tirar com base nessa factualidade, tendo mesmo sustentado que este facto deve ser eliminado dos factos provados, e outro tanto, que deve ser levado ao probatório que o Requerido atribuiu à representada do Requerente um horário de 21 horas.

Ora, ainda que não seja totalmente claro o teor do mapa com o horário de trabalho que o Agrupamento de Escolas fixou à representada do Requerente, e que consta a fls. 137 dos autos, mesmo assim, nestes autos de processo cautelar, assoma com evidência que foi esse concreto horário de trabalho que lhe foi fixado, e quanto ao qual até chegou a ser perspectivada pelo Tribunal a quo a inutilidade superveniente da lide.

De modo que o facto o) do probatório passará a ter a seguinte redacção:
“o) Na sequência das recomendações referidas em m), em Setembro de 2023, a Direcção do Agrupamento de Escolas ... e ... atribuiu a «AA» o horário de trabalho que está constante a fls. 137 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzido.”

**

IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual, com referência ao pedido formulado a final do Requerimento inicial pelo Requerente no sentido do decretamento provisório da mudança do horário de trabalho da sua representada para o regime de jornada contínua e que, consequentemente, se procedam às reduções horárias semanais de uma hora diária na instituição em que for colocada, perfazendo-se o limite horário semanal de trabalho de 20 horas semanais, com prevalência da redução do tempo letivo, conforme indicações médicas de medicina do trabalho - até decisão transitada em julgado em sede de ação principal, veio a julgar pelo indeferimento da providência cautelar requerida, decisão com a qual o mesmo [ora Recorrente], não se conforma.

É fundamento para a concessão de tutela cautelar, por via da adopção da/s providência/s requerida/s, que o Tribunal aprecie da ocorrência de periculum in mora [numa das suas duas vertentes], e que indague da aparência do bom direito invocado pelo Requerente, no sentido de aferir sobre se é provável que a pretensão por si formulada, que é causa/fundamento do processo principal, venha a ser julgada procedente, requisitos estes que são de verificação cumulativa, e neste sentido, sendo julgado não verificado um deles, fica prejudicado o conhecimento do outro.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Tanto quanto conseguimos apreender, o Recorrente sustenta nas conclusões das suas Alegações de recurso, para além da impugnação do ponto o) do probatório, de que já tratamos supra [e cuja apreciação se encontra prejudicada] a ocorrência da nulidade da Sentença, por omissão de pronúncia, tendo subjacente o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, assim como de erros de julgamento em matéria de interpretação e aplicação do direito, por se verificar o requisito determinante do decretamento das providências cautelares, atinente ao periculum in mora, assim como o fumus iuris e a ponderação dos interesses, em favor da sua representada.

Enquanto Tribunal de recurso e tendo subjacente o disposto no artigo 627.º, n.º 1 do CPC, este TCA Norte conhece dos recursos jurisdicionais interpostos onde devem ser evidenciadas as irregularidades de que a Sentença pode enfermar [que se reportam a nulidades que afectam a Sentença do ponto de vista formal e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade], assim como os erros de julgamento de facto e/ou de direito, que por si são resultantes de desacerto tomado pelo Tribunal na formação da sua convicção em torno da realidade factual, ou da interpretação e aplicação do direito, em termos tais que o decidido não está em correspondência com a realidade fáctica ou normativa.

E por reporte à nulidade imputada à Sentença recorrida, cumpre para aqui extrair o artigo 615.º do CPC, como segue:

“Artigo 615.º
Causas de nulidade da sentença
1 - É nula a sentença quando: [sublinhado da autoria deste TCA Norte]


a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; [sublinhado da autoria deste TCA Norte]
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; [sublinhado da autoria deste
TCA Norte]
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
[…]
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.”

Ora, tratando os autos de um processo cautelar, que se caracteriza pela sumariedade da sua instrução, e estando assim em causa a apreciação da tutela cautelar requerida pelo Requerente ora Recorrente, o que importava ser prosseguido, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, era saber, a final, se estavam ou não verificados todos os requisitos, que são de verificação cumulativa, tendentes à adopção da providência cautelar por parte do Tribunal.

E tal foi efectuado, como assim julgamos, no âmbito do julgamento prosseguido pelo Tribunal a quo, nos estritos termos em que o mesmo veio a fundamentar a sua decisão, e é por via dessa fundamentação, de facto e de direito colhida pelo Tribunal a quo, que será apreciado por este Tribunal de recurso sobre se incorreu o mesmo em algum erro de julgamento.

O Recorrente sustenta a ocorrência da invocada nulidade por omissão de pronúncia, alegando tanto que o Tribunal a quo não analisou nem ponderou sobre a necessidade da providência requerida ser decretada até ao trânsito em julgado da acção principal [Cfr. alíneas EE) a KK) das conclusões das Alegações de recurso].

Mas como assim julgamos, por aqui não assiste razão alguma ao Recorrente, porquanto, manifestamente, e para efeitos do que o mesmo invoca, isto é, de que devia ser decretada a providência cautelar requerida e pelo período temporal por si perspectivado, era fundamental que o Tribunal a quo tivesse julgado como cumulativamente preenchidos, todos os requisitos determinantes da concessão das providências, a que se reporta o artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA.

E se tal assim tivesse sido julgado, ou seja, pela verificação cumulativa desses requisitos, e assim, pelo deferimento da tutela cautelar requerida [enformada pelo pedido deduzido a final do Requerimento inicial], só com o trânsito em julgado da decisão a proferir na acção principal, e na eventualidade de ser desfavorável à representada do Recorrente, é que se daria a caducidade da providência que tivesse sido adoptada [Cfr. artigo 123.º, alínea e) do CPTA].

Como assim foi julgado por este TCA Norte, por seu Acórdão datado de 17 de janeiro de 2016, proferido no processo 02279/11.5BEPRT, “[…] Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).[…]”

Conforme assim tem julgado o Supremo Tribunal Administrativo, e de forma reiterada, só se verifica omissão de pronúncia quando o Tribunal, pura e simplesmente, não chegue a tomar posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento – neste sentido, Cfr. Acórdão datado de 19 de fevereiro de 2014, proferido no recurso 126/14, Acórdão datado de 09 de abril de 2008, proferido no recurso 756/07, e Acórdão datado de 23 de abril de 2008, proferido no recurso 964/06.

Efectivamente, o que se torna relevante é que o Tribunal a quo decida a questão decidenda, e não, que tenha que apreciar todos os fundamentos ou razões que foram invocados para suporte dessa pretensão.

E em torno da questão que veio colocada ao Tribunal a quo, e que neste domínio passava por saber se no caso em apreço se verificavam os requisitos consignados no artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, ou seja, se se encontravam [ou não] preenchidos, com vista ao decretamento da providência cautelar requerida, tal efectivamente sucedeu.

De maneira que, como assim julgamos, a Sentença recorrida não padece da assacada nulidade, por omissão de pronúncia, fundada na violação do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.

Falece assim a invocação da ocorrência da nulidade imputada à Sentença.

Prosseguindo, cumpre agora apreciar e decidir sobre a ocorrência dos invocados erros de julgamento em matéria de direito.

Tendo enunciado o regime jurídico que julgou ser convocável para efeitos da decisão a proferir, a saber, a apreciação e decisão da requerida tutela cautelar tendo por base a verificação dos requisitos a que se reporta o artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, em face do discurso fundamentador que o Tribunal a quo veio a aportar na Sentença recorrida, decidiu conforme para aqui se extracta, na sua essencialidade, o que segue:

Início da transcrição
“[...]
Com os presentes autos, em sede cautelar, o Requerente, em representação da sua associada, pretende que o horário atribuído a esta ocorra conforme indicações médicas, ou seja, que lhe seja atribuído horário no período da manhã, em jornada continua, com redução do tempo lectivo e perfazendo o limite horário semanal de trabalho de 20 horas, conforme resulta dos pedidos por si formulados no requerimento inicial dos presentes autos.

O Requerente fundamenta a sua pretensão, no que diz respeito ao periculum in mora, apenas em prejuízos para a saúde da sua associada, no caso de não lhe ser fixado horário de trabalho de acordo com as indicações médicas.

Conforme decorre do probatório supra, desde 13 de Setembro de 2023, na sequência das recomendações formuladas pelo médico do trabalho, à associada do Requerente foi atribuído um horário de trabalho a decorrer somente no período compreendido entre as 8h15 e as 13h05, variando a data de inicio e término conforme o dia da semana, com período lectivo reduzido e constatandose um total de horas de trabalho semanais que não ultrapassa as 20 horas.

Desta forma, analisados os autos, constata-se que a pretensão do Requerente, manifestada nestes mesmos autos, já se encontra satisfeita, pois que as recomendações médicas para fixação de horário de trabalho foram, em Setembro de 2023, todas tidas em consideração aquando da fixação do referido horário de trabalho da sua associada.

Analisado o horário de trabalho que foi fixado à associada do Requerente, em Setembro de 2023, conclui-se que esta não corre um eventual risco de ver a sua saúde a deteriorar-se ainda mais em consequência do horário de trabalho fixado pela Entidade Requerida, uma vez que este horário de trabalho foi fixado de acordo com todas as indicações médicas da medicina do trabalho, que, por sua vez, foram de encontro às recomendações dos médicos que acompanham a associada do Requerente nas suas patologias.

Conclui-se, assim, que, na situação concreta dos presentes autos, não se constata a possibilidade de uma situação de facto consumado, ou seja, a eventual procedência da acção principal não é incompatível com a reintegração da situação conforme à legalidade, nem a existência de um prejuízo efectivo para a saúde da associada do Requerente, pois que esta encontra-se a cumprir um horário de trabalho fixado de acordo com todas as orientações médicas manifestadas para a sua situação concreta.

Nesta conformidade, não assistem dúvidas sobre a não verificação, in casu, do requisito do periculum in mora previsto no n.º 1, primeira parte do artigo 120.º, do CPTA.

Sendo os requisitos previstos no art. 120º do CPTA de verificação cumulativa, e não se encontrando preenchido o requisito do periculum in mora, torna-se desnecessário o conhecimento dos demais pressupostos, pelo que não se analisará o requisito do fumus boni iuris e também não se fará a ponderação dos interesses públicos e privados em presença, por desnecessária.
Não se constatando o preenchimento do critério do periculum in mora tem o presente processo cautelar que improceder.
[...]“
Fim da transcrição

Se bem que não subscrevemos a integralidade desta fundamentação aportada pelo Tribunal a quo, porquanto não resulta objectivo do julgamento prosseguido em sumaria cognitio que a representada do Requerente só trabalha [ou só pode trabalhar] 20 horas e de que o horário de trabalho que lhe foi fixado tenha sido elaborado em consonância com as recomendações da medicina do trabalho, desde já adiantamos, todavia, que o sentido decisório tomado pelo Tribunal a quo, é para manter, por não ser merecedor da censura jurídica que lhe vem apontada pelo Recorrente.

Com efeito, para alcançar o julgamento que a final vem a derivar no indeferimento do pedido de tutela cautelar, o Tribunal a quo apreciou e decidiu, em suma, que não estava verificado o requisito do periculum in mora, seja por via da ocorrência de uma situação de facto consumado, seja por via da ocorrência de prejuízos de difícil reparação, e que o pedido formulado pelo Requerente tinha de ser julgado improcedente, encontrando-se assim prejudicado o conhecimento dos demais requisitos inerentes ao decretamento das providências [o fumus iuris e a ponderação dos interesses em presença].

Vejamos então.

Compulsada a Petição inicial que motiva os autos da acção principal, dela se retira e nela se congrega aquilo que identificamos como sendo o enfoque da pretensão, vindo invocado que a Autora tem vários problemas de saúde, padecendo de uma incapacidade permanente parcial significativa, e que tendo requerido ao Ministério da Educação que o seu período normal de trabalho fosse prestado em regime de jornada continua, como modo de acautelar o seu agravamento clínico, que tal pedido veio a ser indeferido [Cfr. designadamente, os pontos 1, 20, e 53 a 77], em violação da lei.

Dela mais se retira que a questão nuclear da sua pretensão está em que pretende que lhe seja concedida a prestação de trabalho em regime de jornada contínua, referindo que esse pedido foi motivado atendendo à gravidade do estado de saúde da mesma e dos constrangimentos que o exercício em regime de horário integral implica na sua saúde [Cfr. ponto 108 da Petição inicial], e que nenhuma razão existe que a tanto possa obstar.

Já em sede do Requerimento inicial que motivou os autos de processo cautelar, daí se retira que o pedido de adopção de tutela cautelar foi apresentado na pendência do processo principal, que a representada do Requerente interpôs para impugnação do acto de indeferimento de aplicação do regime de jornada continua, vindo para o efeito invocada idêntica matéria de facto e de direito aquela que vem vertida na Petição inicial, e no fundo, alegado que foi apresentado requerimento tendente à concessão de jornada contínua, por ter esse direito, devido ao seu débil estado de saúde e como forma de acautelar o seu agravamento clínico [Cfr. designadamente, os pontos 36 a 40].

Em sede do periculum in mora foi referido no Requerimento inicial [cfr. pontos 95 a 134], em suma, que por padecer de graves problemas que comprometem a sua saúde, deve ser tomada uma decisão que acautele esse agravamento clínico, por ser provável que a sua exposição a um horário de trabalho completo irá agravar o seu quadro de saúde.

E neste conspecto, para aqui extraímos o vertido sob os pontos 122 a 130 do Requerimento inicial, como segue:

“[…]
122. Deste modo, a sujeição a um regime de horário completo inibe a representada do requerente de poder trabalhar sem que tenha dores físicas e agrava as restantes doenças.
123. Acontece que a docente, ainda que o seu estado de saúde e as imensas doenças de que padece limitem a sua atividade não quer parar de lecionar pois esse é o seu único meio de sustento.
124. Torna-se, assim, imperioso que a representada do requerente, com a maior brevidade passe a estar integrada no regime de jornada continua com redução do horário letivo, para que possa sem riscos e sofrimentos maiores poder exercer a sua profissão com dignidade.
125. A Requerente tem receio de que se constitua uma situação de produção de prejuízo de difícil ou impossível reparação para os seus interesses e que estarão em causa no processo principal – especificamente a proteção da sua saúde. 126. Com efeito, existe, efetivamente, um fundado receio por parte da representada do Requerente, que o decurso do tempo necessário à tramitação da ação administrativa principal de que a presente providência é dependente, possa acarretar prejuízos irreparáveis à sua saúde porque irreversíveis.
127. Ao ser impedida de poder exercer o seu trabalho em regime de jornada continua a docente fica completamente condicionada no desempenho das suas funções profissionais, e com consequências prejudiciais para a sua saúde. 128. Para que não restem quaisquer dúvidas basta observar com cuidado todas as recomendações de várias especialidades médicas que constam da documentação pericial que a requerente já juntou com a AP (docs. ...0 a doc....2) 129. No caso vertente estão assim em crise o cumprimento dos deveres da entidade empregadora que podem, em última análise, impedir que a docente possa exercer com dignidade e sem sofrimento a sua função.
130. Sucede que este prejuízo se torna irreparável se a presente providência não for decretada.
[…]”

Ora, conforme assim se extrai do que enunciamos supra, o Requerente não cumpriu cabalmente com o ónus de prova que sobre si impendia, isto é, de alegar e de provar carecer a sua representada de tutela cautelar, para efeitos, desde logo, de obstar à ocorrência de um facto consumado ou à produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que visa assegurar na acção principal, antes se pautando por alegações vagas e conclusivas, sem objectividade para efeitos da adopção da providência cautelar requerida.

Como assim patenteado no Requerimento inicial, foi com referência ao pedido que a representada do Requerente formulou à Diretora do Agrupamento de Escolas ..., datado de 06 de janeiro de 2023, no sentido de lhe ser atribuída jornada continua, em face do disposto no artigo 114.º, n.º 3, alínea f) da LGTFP, que foi indeferido em 16 de janeiro de 2023, que foi apresentada a Petição inicial.

Como assim resulta do probatório, a Direcção do Agrupamento de Escolas ... e ... fixou à representada do Requerente, ora Recorrente, um horário de trabalho, que teve em vista a organização da sua prestação enquanto docente e dar satisfação às prescrições ditadas pela medicina do trabalho, que o Requerido ora Recorrido juntou aos autos [Cfr. ponto o) do probatório], e quanto ao que este apresentou requerimento onde expendeu o que segue:

“[…]
Por outro lado, sem prejuízo de continuarmos a defender que no caso dos docentes, atentas as especificidades do ECD, não poderá falar-se em “jornada contínua”, o certo é que sempre o ME afirmou que se conformaria com o que fosse determinado no âmbito da medicina do trabalho.
Porém, dentro do razoável, e não postergando as especificidades do horário dos docentes, tal como consignado no Estatuto da Carreira Docente.
Nessa conformidade, no caso aqui em apreço, foi entendimento dos serviços do ME que o horário da docente «AA» deveria comportar 30 horas semanais (e não as 35 a que é obrigado qualquer trabalhador), distribuídas proporcionalmente na componente letiva, não letiva e trabalho
individual, salvaguardando as 4 horas de redução ao abrigo do artigo 79.º do ECD, de que a Autora beneficia.
Cumprindo rigorosamente estas determinações o horário semanal da docente foi alterado no dia 13 de setembro.
[…]”

Ou seja, o Ministério da Educação alinhavou a sua posição no sentido de que não se podendo falar em jornada contínua, que de todo o modo, e dentro do possível, daria seguimento às orientações da medicina do trabalho [Cfr. ponto n) do probatório].

A fixação desse horário de trabalho ocorreu já no decurso da acção principal, e também do processo cautelar, o que veio a merecer o despacho proferido em 21 de setembro de 2023, a fls. … dos autos [do processo cautelar], tendo em vista aferir da eventual ocorrência da inutilidade superveniente da lide, ao que o Requerente ora Recorrente veio aduzir pronúncia, conforme para aqui se extrai, como segue:

“[…]
1. Conforme consta dos autos, foi distribuído, à Requerente, um horário letivo com 21 horas de trabalho.
2. Atendendo ao conteúdo de Ficha de Aptidão de Medicina do Trabalho datada de 23-08-2023 requisição pedida pela requerida e cujo cumprimento foi prometido pela mesma cumpre referir que no referido documento existem dois pontos fundamentais que cumpre destrinçar:
3. No ponto relativo à “Outras recomendações” frisou-se que “as suas tarefas devem ser organizadas em jornada continua.”
4. Ora, o regime de jornada continua implica a redução de uma hora de trabalho diário – assim sendo a docente teria sem jornada continua 25 horas de trabalho ( 22 letivas (Art.77 n.º2 do ECD) + 3 não letivas) com a redução de uma hora diárias nos 5 dias da semana passaria ao limite de 20 horas semanais e não 21 horas como estão aplicadas à docente.
5. Refira-se que cada “tempo” ou “hora” do trabalho de qualquer docente é definido nos termos artigo 94 n.º 1 alínea a) e b) do Estatuto da Carreira Docente bem como da alínea b) do n.º 2 do artigo 1.º prevista no Despacho normativo
n.º 13-A/2012 do Ministério da Educação e da Ciência.
6. Pelo exposto, tendo sido aplicadas 21 horas e não 20 horas não foi aplicado a orientação de que o seu horário deveria ser organizado em regime de jornada continua tendo-se violado a orientação da Ficha da Aptidão para o Trabalho.
7. Ainda na mesma Ficha de Avaliação de Medicina do Trabalho na matéria relativa à avaliação de fatores de risco no posto de trabalho frisou-se que a autora “Não deve executar tarefas de vigilância e devem sempre que possível ser convertidas aulas letivas em não letivas.”
8. Observando o horário aplicado à docente verifica-se que, mesmo que seja retificado um tempo que se encontra a mais como já explicado acima:
8.1. Das 20 horas legalmente previstas - 15 foram atribuídas como letivas, 4.º não letivas são referentes ao artigo 79.º do ECD (adquirido em virtude do tempo de serviço e da idade) e uma não letiva foi atribuída tal como foi concedida a todos os docentes de todos os grupos disciplinares para reuniões obrigatórias. 8.2. Assim sendo constata-se que tirando os direitos estatuariamente adquiridos em função da idade, nenhuma hora letiva lhe foi reduzida, uma vez que lhe foi aplicado o valor máximo possível de horas letivas (6 turmas) não atribuindo nenhum tempo adicional não letivo para além do estatutariamente previsto
8.3. Sabe-se também que na escola ... e ... após a atribuição deste novo horário à docente, foi contratado um docente do mesmo grupo disciplinar com horário incompleto não existindo deste modo obstáculos à diminuição dos tempos letivos para não letivos.
8.4. Pelo exposto, não foi cumprido pela ré o primeiro pressuposto da ficha de aptidão referente à conversão das aulas lectivas em não letivas uma vez que era possível a diminuição da carga letiva e ainda assim, sabendo dessas exigências a ré atribuiu o máximo de horas letivas possíveis à docente.
9. Também no ponto 3 da Ficha de Aptidão para o Trabalho foi mencionado que a autora não pode executar tarefas que impliquem osteoartismo prolongado, recomendação que não se compadece com a aplicação de 6 turmas.
10. Cumpre referir que a providência cautelar mantêm-se do mesmo modo necessária e útil tomando em consideração que a docente todos os anos se candidata no regime de concurso de mobilidade por doença, impondo-se acautelar garantias de organização do tempo de trabalho em cada ano letivo e em cada escola.
11. Ademais não sabendo a previsão da data do desfecho do processo principal e tendo em consideração a mutabilidade da docente e a possibilidade de incumprimentos de horário em cada escola, urge acautelar preventivamente os direitos de organização do seu tempo de trabalho.
12. Torna-se assim necessário ajustar o horário da docente àquilo que a lei prescreve bem como às imposições da Ficha de Aptidão para o Trabalho, ou seja:
a. retirar do horário semanal da Requerente um tempo concedendo-se assim a jornada continua de 20 horas
b. Proceder-se à definição do número de horas letivas que deverão ser convertidas no horário da docente em não letivas em cada horário atribuído à docente até ao transito em julgado da decisão.
[…]”

Em face do que assim está patenteado no pedido deduzido a final do Requerimento inicial, o Requerente parte do pressuposto de que o Agrupamento de Escolas não fixou à sua representada um horário de trabalho em regime de jornada contínua, e que não lhe foi fixada a redução horária semanal de uma hora diária, perfazendo o limite horário semanal de trabalho de 20 horas semanais, com prevalência da redução do tempo letivo, conforme indicações médicas da medicina do trabalho, e que lhe deve assim tal ser fixado provisoriamente, até ser proferida decisão transitada em julgado na ação principal.

No que é atinente à providência peticionada pelo Requerente ora Recorrente [de natureza antecipatória], a mesma tem assim subjacente, em suma, a invocação pela sua parte, de que a não colocação da sua representada sob o regime jurídico da jornada contínua irá provocar-lhe o agravamento da sua situação clínica, concluindo dessa forma pela ocorrência de “um facto consumado” e de
“prejuízos de difícil reparação”.

Do que assim resultou da instrução destes autos de processo cautelar no TAF de Braga, e em conformidade com o sustentado sob as conclusões N), Q), Y), HH), AAA), BBB) e CCC) das Alegações de recurso, pode ser alcançado, em suma, o julgamento de que o Requerente ora Recorrente entende que à sua representada foi fixado um horário de 21 horas, quando devia ser de 20 horas, e que neste horário [de 20 horas] deviam ser definidas as horas lectivas que devem ser convertidas em horas não lectivas, devendo ser-lhe reconhecido o direito à jornada contínua, nos termos do artigo 114.º, n.º 3, alínea f) da LGTFP, sob pena de a sua representada ver agravado o seu estado de saúde, e dessa forma ser provocada “… uma situação de facto consumado ou, pelo menos causa de prejuízos de difícil reparação […]”.

Ora, depois de fixar a factualidade que entendeu por relevante e com referência aos elementos de prova que a suportam, o Tribunal a quo apreciou e decidiu sobre os termos e pressupostos pelos quais julgou não verificado o periculum in mora, e dessa feita prejudicada a apreciação dos demais requisitos, vindo assim a negar provimento à pretensão deduzida pelo Requerente.

Com reporte ao horário de trabalho que o Requerido fixou à representada do Requerente, em 13 Setembro de 2023, tendo o Tribunal a quo apreciado e decidido, entre o mais, que a mesma não corre um eventual risco de ver a sua saúde a deteriorar-se ainda mais em consequência do horário de trabalho fixado pela Entidade Requerida, e independentemente de o horário ser de 20 horas e organizado em termos de jornada contínua, o Recorrente não alega nem prova por que termos é que a sua representada está numa situação de perigo, que só pode ser debelada se trabalhar 20 horas em vez das 21 horas que refere teremlhe sido fixadas no horário de trabalho.

Com respeito pelo estado de saúde da representada do Recorrente, como assim patenteado sob os pontos g) a l) do probatório, sendo certo que que a representada quer desempenhar as suas funções docentes, não dilucidamos todavia que estejam substanciadas nestes autos de processo cautelar, razões ponderosas para obviar à constituição dum invocado facto consumado e/ou de invocados prejuízos de difícil reparação, que de resto não foram identificados e por isso foram julgados inverificados.

Como assim julgamos, o cerne da questão que incumbia ao Tribunal a quo apreciar nos termos e para efeitos da decisão a proferir, passava pela verificação ou não dos pressupostos determinantes do decretamento das providências cautelares, e para conhecimento do periculum in mora, ou seja, sobre se existiam fundamentos para ser determinada a antecipação da situação pretendida pelo Recorrente quanto à sua representada, o que foi prosseguido pelo Tribunal a quo em termos claros e suficientes.

É de salientar que a matéria em causa requer uma análise factual e jurídica mais aprofundada, que sempre não cabe levar a cabo num processo cautelar, dada a sumariedade da sua tramitação, principalmente quando no julgamento prosseguido por este TCA Norte, o que importa apreciar e decidir é se ocorre fundamento, como sustentado pelo Recorrente, para dar como verificado, desde logo, o periculum in mora, sem que para tanto seja relevante e/ou se imponha a quantidade de erros de julgamento que nesse domínio e para esse efeito, possam vir sindicados pelo Recorrente.

Em face do que assim resulta da Sentença proferida, assim apreciou e decidiu o Tribunal a quo, em suma, que o Requerente ora Recorrente não alegou e provou da existência de facto consumado ou prejuízo de difícil reparação, que por si fosse determinante para efeitos de dar por verificado um dos requisitos [que são de verificação cumulativa] determinantes do pedido de adopção da tutela cautelar requerida.

Tendo o Requerente ora Recorrente identificado no Requerimento inicial qual a sua pretensão e por referência ao pedido que havia sido objecto de indeferimento por parte da Direcção do Agrupamento de Escolas, em 16 de janeiro de 2023 [que constitui também o acto visado na acção principal], e tendo sobrevindo naquela que era a relação jurídica administrativa controvertida estabelecida entre a representada do Requerente e o Requerido, a decisão pela qual lhe foi fixado um horário de trabalho, que no entender do Requerido visa dar satisfação às disposições médicas em que a representada daquele é visada, na falta da prova desse requisito [e sempre, é claro, com observância de que a sua representada é portadora de uma incapacidade permanente, assim fixada pelo menos desde o ano de 2017, e de que a mesma sempre quer prosseguir no exercício das suas funções de docente, sob o regime de horário de trabalho da jornada contínua], o mérito desse pedido terá de ser apreciado na acção principal, que no fundo se reconduzirá [como assim circunstanciado, se bem entendemos o que veio sustentado pelo Requerente], no sentido de que o Ministério da Educação não apreciou e decidiu a sua situação concreta [envolvendo a vertente médica e fisiológica da sua representada] em consonância com o disposto no artigo 114.º, n.º 3, alínea j) da LGTFP.

Ou seja, e como assim julgamos ter sido o entendimento do Requerente e já na pendência dos autos, após o Tribunal a quo ter suscitado a ocorrência da inutilidade superveniente da lide, por ter sido fixado um horário de trabalho no período da manhã, e no pressuposto de que se trata de um horário semanal de 20 horas, o Requerente prossegue o entendimento de que essa fixação viola a lei. Mas essa invocação não é suficiente ou bastante para ser determinada a adopção de uma providência cautelar, que no fundo visa a antecipação do mérito do pedido deduzido na acção principal.

Como assim julgamos, para efeitos da apreciação do mérito do pedido cautelar formulado, o que releva é a invocação de factos que sejam determinantes do preenchimento dos requisitos para efeitos do decretamento cautelar, relativamente aos quais, aplicado o direito que ao caso seja convocável, possa ser julgado como provável que o pedido formulado na acção principal venha a ser julgado procedente.

Tomando de base o ónus de prova que impendia sobre si [enquanto Requerente], não podemos deixar de referir que o julgamento que foi alcançado pelo Tribunal a quo se encontra estruturado e com a aplicação dos dispositivos legais que na situação presente são passíveis de ser convocados, nele não detectando qualquer dos imputados erros de julgamento em matéria de direito, já que nos situamos no domínio da apreciação da verificação dos requisitos determinantes do decretamento de providências cautelares, sendo que, em torno do invocado erro de julgamento em matéria de facto e visando o vertido sob a alínea o) do probatório, como apreciamos supra, tal não assoma qualquer relevância, para efeitos de que o julgamento do Tribunal a quo enferma de erro que faz inquinar o sentido decisório da Sentença proferida.

Em suma, se no âmbito da relação jurídica administrativa que a representada do Requerente tem e mantém com o Requerido ora Recorrido, veio a ser fixado um horário de trabalho à representada do Requerente, tendo por pressuposto de que essa fixação dá satisfação ao que foi apreciado pela junta médica da ADSE quer pela medicina do trabalho, e desta feita, que assim dá satisfação à pretensão deduzida, mas se como assim entende o Requerente ora Recorrente, tal viola a lei, desde logo por entender que foi fixado à sua representada não um horário de 20 horas, mas um horário de 21 horas, e que não foi assim observado o que foi determinado em sede das determinações de ordem médica, nem garantido o direito à jornada contínua, tal não se revela, porém, apto a poder fazer inflectir o julgamento tirado pelo Tribunal recorrido, no sentido de que não está preenchido o requisito da perigosidade, que por si é determinante para que possa vir a ser adoptada, com a verificação dos demais requisitos, a providência cautelar requerida.

Com efeito, fixada a dialética factual, entre a prestação do horário de trabalho da representada do Requerente ora Recorrente com sujeição a um regime de horário completo por um lado, e/ou a prestação no período da manhã, ou sob o regime da jornada contínua por outro, que o Recorrente entende ser de 20 horas mas que imputa ao Recorrido ter fixado em 21 horas, não dilucida assim este Tribunal de recurso, por que termos e pressupostos é que esta fixação é passível de gerar a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação.

De maneira que, tem assim de improceder a pretensão recursiva do Recorrente, e de ser confirmada a Sentença recorrida, embora com diferente fundamentação.

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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Processo cautelar; Requisitos determinantes do decretamento das providências; Incapacidade permanente e parcial de docente; Periculum in mora.

1 – Nos termos do artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente, situação em que, como dispõe o n.º 2 deste normativo, mesmo ainda na eventualidade de terem sido julgados verificados esses requisitos determinantes, sempre a adopção das providências pode ser recusada quando em sede da ponderação dos interesses públicos e privados em presença, for julgado que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.

2 - A existência de perigosidade [seja na vertente do receio da constituição de uma situação de facto consumado, seja na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação], e da aparência do bom direito [enquanto avaliação sumária da probabilidade de existência do direito invocado] para os interesses que os Requerentes visam assegurar no processo principal, constituem requisitos determinantes para efeitos de ser apreciada a providência requerida, recaindo sempre sobre eles o ónus de fazer a prova sumária desses requisitos.

3 - O juízo que cabe levar a cabo no artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, não pode ser misturado com o juízo que deve ser feito a título principal, visto tratar-se dum juízo perfunctório, sumário, tal como é reclamado pelo legislador em termos cautelares, por constituir um juízo que é formulado sob reserva de se poder chegar a uma conclusão diversa em sede do processo principal.

4 - Fixada a dialética factual, entre a prestação do horário de trabalho da representada do Requerente ora Recorrente com sujeição a um regime de horário completo por um lado, e a prestação no período da manhã, e/ou sob o regime da jornada contínua por outro, que o Recorrente entende ser de 20 horas mas que imputa ao Recorrido ter fixado em 21 horas, não dilucida assim este Tribunal de recurso, por que termos e pressupostos é que esta fixação é passível de gerar a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação.

5 - Se no âmbito da relação jurídica administrativa que a representada do Requerente tem e mantém com o Requerido ora Recorrido, veio a ser fixado um horário de trabalho à representada do Requerente, tendo por pressuposto de que essa fixação dá satisfação ao que foi apreciado pela junta médica da ADSE quer pela medicina do trabalho, e desta feita, que assim dá satisfação à pretensão deduzida, mas se como assim entende o Requerente ora Recorrente, tal viola a lei, desde logo por entender que foi fixado à sua representada não um horário de 20 horas, mas um horário de 21 horas, e que não foi assim observado o que foi determinado em sede das determinações de ordem médica, nem garantido o direito à jornada contínua, tal não se revela, porém, apto a poder fazer inflectir o julgamento tirado pelo Tribunal recorrido, no sentido de que não está preenchido o requisito da perigosidade, que por si é determinante para que possa vir a ser adoptada, com a verificação dos demais requisitos, a providência cautelar requerida.
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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.° da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Social deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Recorrente Sindicato dos Professores do Norte [em representação da sua associada «AA»], confirmando a Sentença recorrida.

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Custas a cargo do Recorrente - Cfr. artigo 527.°, n.°s 1 e 2 do CPC.
** Notifique.

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Porto, 05 de abril de 2024.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Isabel Costa
Rogério Martins