Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00036/11.6BEPNF-A |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 12/03/2020 |
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Tribunal: | TAF de Penafiel |
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Relator: | Margarida Reis |
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Descritores: | RECURSO DE REVISÃO; INCONCILIABILIDADE COM DECISÃO DEFINITIVA DO TJUE; PRAZOS DE RECURSO. |
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Sumário: | Sendo alegado como fundamento do recurso de revisão de decisão transitada em julgado, interposto ao abrigo do disposto no art. 293.º do CPPT, na sua redação original, conferida pela Lei n.º 3-B/2000, de 4 de abril, a inconciliabilidade da decisão recorrida com acórdão proferido posteriormente pelo TJUE em sede de reenvio prejudicial, deve o mesmo ser aceite, por aplicação subsidiaria do disposto na alínea f) do art. 696.º do CPC, ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, como, de resto, foi já decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo no proferido em 7 de fevereiro de 2014, no proc. 0360/13. O recurso de revisão com fundamento na inconciliabilidade da decisão recorrida com acórdão proferido posteriormente pelo TJUE em sede de reenvio prejudicial, deverá, simultaneamente, respeitar os prazos previstos no n.º 2 e respetiva alínea f) do art. 697.º do CPC, respetivamente, de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão recorrida, e de 60 dias desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado. Estes prazos são adequados, não encerrando a sua previsão qualquer inconstitucionalidade ou qualquer violação do direito da União Europeia.* * Sumário elaborado pela relatora |
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Recorrente: | C., SA |
Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Indeferir a reclamação para a Conferência. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido da improcedência da Reclamação. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RElatório C., S.A., com os demais sinais nos autos, recorrente no processo principal, notificada da decisão singular que não admitiu o recurso de revisão por si interposto, dela vem reclamar para a conferência, nos termos do disposto no art. 288.º, n.º 3, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). A Recorrente, aqui Reclamante, encerra as suas alegações formulando as seguintes conclusões: “1ª Não se conformando com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte a 13 de Dezembro de 2012, que negou parcialmente provimento ao recurso por si interposto, veio a recorrente, nos termos do disposto no art. 696.º , al. f) e 697.º, n.º 2, al. b), do Código de Processo Civil ex vi art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 154.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos interpor RECURSO DE REVISÃO, tendo por base a prolação de um Acórdão pelo Tribunal de Justiça da União Europeia. 2ª Por decisão singular datada de 23 de Junho de 2016, o recurso excepcional de revisão interposto pela recorrente não foi admitido. 3ª Nomeadamente, por “improcedência manifesta da pretensão formulada, por carecer de suporte legal, inviabilizando ab initio o pedido por si formulado no âmbito dos presentes autos”. 4ª A decisão de que se reclama pugna pela tese de que no âmbito do processo tributário existe uma norma específica para a revisão de sentença, a qual se encontra prevista no n.º 2 do art. 293.º, do CPPT, diferente da prevista no Código de Processo Civil e no Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 5ª Fundamenta-se o recurso de revisão interposto pela aqui reclamante na prolação de um acórdão pelo TJUE, cujo conteúdo se afigura totalmente inconciliável com o teor do acórdão proferido no âmbito dos presentes autos, na parte em que negou provimento ao recurso interposto pela Recorrente. 6ª Não prevendo o regime de recursos no processo judicial tributário a possibilidade de revisão de uma decisão interna, transitada em julgado, por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, como é o caso de um acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, atenta a relevância desta ausência normativa e a natureza de tal omissão, impõe-se encontrar regulamentação adequada nas normas sobre a organização e processo nos tribunais administrativos e tributários (artigo 154.º a 156.º do CPTA ex vi artigo 2.º, al. c) do CPPT) e no Código de Processo Civil, sobre interposição processamento e julgamento dos recursos jurisdicionais, no caso, e concretamente, no preceituado pelo artigo 696.º, al. f) ex vi artigo 154.º, n.º 1, in fine do CPTA. 7ª Um acórdão proferido pelo TJUE assume carácter vinculativo para o Estado Português e pode ser invocado como fundamento de recurso de revisão ao abrigo da al. f) do artigo 696.º, do Código de Processo Civil, verificados que sejam os demais pressupostos, nomeadamente a inconciliabilidade com decisão interna transitada em julgado, conforme bem decidido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Fevereiro de 2014, processo n.º 0360/13, disponível em www.dgsi.pt. 8ª A decisão reclamada NÃO SÓ NÃO SE PRONUNCIOU SOBRE A TESE PUGNADA PELA RECLAMANTE, COMO NADA DISSE SOBRE AS CONCLUSÕES EXTRAÍDAS DO ALUDIDO ACÓRDÃO, em qualquer dos casos consubstanciando tal omissão de pronúncia causa de nulidade da mesma, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) ex vi 666.º, n.º 1 do CPC, nulidade que expressamente se invoca. 9ª A leitura que emana da decisão controvertida do artigo 293.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário viola as mais elementares regras de um Estado de Direito, possibilitando, por um lado, que se possa manter na ordem jurídica uma decisão proferida por um Tribunal interno materialmente desconforme com a interpretação vinculativa do mesmo quadro legal por parte do TJUE, recusando-se a revisão de sentença por força duma interpretação literal do regime de recursos à luz do regime previsto no artigo 293.º do CPPT e, por outro, recusando-se a revisão de sentença em todos os processos judiciais abrangidos pela jurisdição tributária com fundamento em sentença superveniente proferida pelo TJUE que seja materialmente inconciliável com decisão proferida por um órgão jurisdicional nacional. 10ª A interpretação veiculada na decisão reclamada é inadmissível por colocar em causa não só a pretensão da ora reclamante mas de todo e qualquer sujeito passivo destinatário de qualquer decisão judicial que venha a ser mais tarde tacitamente revogada por uma decisão do TJUE de efeitos erga omnes (Princípio do Primado do Direito Europeu). 11ª O legislador pretendeu estender o recurso de revisão também às situações em que a decisão transitada em julgado seja inconciliável com decisão jurisdicional incompatível com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ou com qualquer decisão ou norma emanada por um órgão internacional a que Portugal esteja vinculado, desde logo, porque entre o primado do caso julgado material de uma decisão interna e a aplicação uniforme do direito comunitário, tal como interpretado por uma instância internacional, é evidente que deverá prevalecer este último, sob pena de falta de coerência do sistema jurídico nacional e vício de inconstitucionalidade, por directa violação do artigo 8.º da CRP. 12ª Não se justifica - ou a decisão de que se reclama fundamentou - uma interpretação rígida e literal do artigo 293.º do CPPT, sob pena de cerceamento à reclamante das prerrogativas atribuídas pelas regras do processo administrativo comum, designadamente quanto ao exercício do seu direito de recurso de revisão. 13ª Deve a norma contida no artigo 293.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quando interpretada no sentido de que o legislador pretendeu limitar o recurso de revisão de sentença no âmbito do Processo Tributário apenas aos casos de decisão judicial transitada em julgado declarando a falsidade do documento, ou documento novo que o interessado não tenha podido nem devia apresentar no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, ou de falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia, excluindo expressamente a possibilidade do recurso de revisão de sentença no âmbito do Processo Tributário de uma decisão interna, transitada em julgado, por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, constante no artigo 696.º , al. f), do Código de Processo Civil, descurando as garantias de tutela jurisdicional efectiva atribuídas ao vencido no âmbito do processo administrativo ou declarativo comum, ser declarada materialmente inconstitucional por ser manifestamente desproporcionada tal interpretação da lei, cerceando a defesa dos interesses e direitos dos cidadãos, impossibilitando a sua tutela efectiva e consubstanciando um tratamento desigual dos cidadãos perante a lei, violando o disposto nos artigos 2.º, 8.º , 13.º, n.º 1, e 20.º , n.º 1, da CRP, ou seja, violando os Princípios da Proporcionalidade, do Primado do Direito da União Europeia, da Igualdade e do Acesso ao Direito e da Tutela Jurisdicional Efectiva. 14ª Considerando que sobre a admissibilidade do recurso de revisão no âmbito do Processo Tributário de uma decisão interna, transitada em julgado, por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, recaíram acórdãos pugnando por teses divergentes, no domínio da mesma legislação e quanto à mesma questão de direito e que a decisão ora em crise fez “escolhas”, perfilhando uma das teses contrárias, deve recair ACÓRDÃO, de molde a que possa o Supremo Tribunal Administrativo pronunciar-se, em sede de recurso com fundamento em oposição de acórdãos, nos termos do disposto no artigo 284.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.” Termina requerendo: “… a submissão da presente à conferência para que sobre a matéria da douta sentença reclamada seja proferido douto ACÓRDÃO.” *** Notificada para se pronunciar sobre o teor da presente Reclamação, vem a Representação da Fazenda fazê-lo, nos termos que se seguem:“1.º A presente reclamação deve ser indeferida. 2.º A sentença de fls. não merece, com efeito, qualquer censura. 3.º O art. 293.º, 2 do C.P.P.T. contém um elenco fechado de requisitos do recurso de revisão. 4.º De facto, a norma refere expressamente que “apenas é admitida a revisão em caso de decisão judicial transitada em julgado, declarando a falsidade do documento, ou documento novo que o interessado não tenha podido nem devia apresentar no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, ou de falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia”. 5.º O vocábulo “apenas” estabelece, de forma inequívoca, que os únicos fundamentos admissíveis para este tipo de recurso são os ali previstos, não sendo aceitáveis quaisquer outros. 6.º Desta forma, o recurso ao art. 696.º do C.P.C. e aos pressupostos neles estabelecidos encontra-se absolutamente vedado em sede de processo tributário. 7.º Acresce que a decisão em apreço não está viciada por qualquer nulidade, designadamente a arguida omissão de pronúncia. 8.º No seu requerimento de recurso, a recorrente aludiu efetivamente ao acórdão do STA de 7 de fevereiro de 2014, processo n.º 0360/13. 9.º Essa alusão constituiu um dos argumentos de defesa da tese da admissibilidade do recurso e da aplicabilidade subsidiária do art. 696.º do C.P.C. 10.º Ora essa tese foi apreciada pelo tribunal e a sua rejeição esteve na base da decisão ora reclamada. 12.º O tribunal apreciou, pois, a questão que lhe foi colocada pela recorrente embora não tenha apreciado todos os seus argumentos. 13.º Enfim a existência de uma norma especial, que estabelece um regime distinto do regime geral, não integra a violação do princípio da igualdade. 14.º A especificidade ou particularidade do regime dela decorrente é imanente à sua própria natureza. 15.º De facto, se ela não criasse uma distinção ou diferença, ela não teria razão de existir, inexistiria motivo para a emanação de uma norma desse tipo. 16.º A diferença por ela introduzida decorre, porém, da peculiaridade dos casos a que se aplica. 17.º E essa peculiaridade justifica o tratamento divergente porque, como é sabido, a igualdade significa tratar como igual o que é igual e desigualmente o que é desigual. 18.º Na situação que nos ocupa, óbvio é que o legislador entendeu que a natureza do processo tributário e dos interesses que lhe estão subjacentes impunha um maior cuidado na revisão das sentenças, em ordem a garantir uma maior estabilidade às relações jurídico-tributárias. 19.º Nestes termos, a presente reclamação só pode ser indeferida, o que expressamente se solicita.” *** O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência da Reclamação, argumentando, em síntese, que o despacho reclamado não padece da nulidade invocada, pois ainda que não tenha abordado o argumento adiantado pela Reclamante de que a tese da admissibilidade do recurso de revisão, com base na aplicação subsidiária do artigo 696.º, alínea f), do CPC, fora já decidida favoravelmente por Acórdão do STA, não deixou de apreciar devidamente a questão em causa – da admissibilidade do recurso de revisão; e que também não procede o invocado erro de julgamento, uma vez que o n.º 2 do art. 293.º contém os únicos fundamento admissíveis para o recurso de revisão.*** Tendo sido notificado para exercer o seu direito ao contraditório relativamente à questão da intempestividade do recurso, veio a ora Reclamante pronunciar-se através do requerimento constante a fls. 138 e segs. dos autos (numeração do SITAF), nos seguintes termos:“C., S.A., reclamante nos autos à margem melhor referenciados, em que é reclamada a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, Notificada do douto despacho com a referência supra, vem expor e requerer a V/ Exia. O SEGUINTE: 1º Foi a Autora notificada para se pronunciar sobre a tempestividade do recurso de revisão por si interposto a 17 de Junho de 2016, agora objecto de despacho, de acordo com o qual se constata que “o recurso de revisão interposto pela ora Reclamante não se afigura tempestivo”. 2º Pois que, embora o prazo de 5 anos previsto na primeira parte do art.º 697.º, n.º 2, do CPC, se mostre respeitado, “o mesmo já não parece acontecer relativamente ao prazo de 60 dias previsto no final do mesmo n.º 2, conjugado com a respectiva alínea b)”. 3º O requerimento de recurso de revisão foi remetido a este Digníssimo Tribunal a 17 de Junho de 2016 e o acórdão do TJUE foi proferido a 22 de Outubro de 2015 e publicitado no Jornal Oficial da União Europeia a 14 de Dezembro de 2015. ORA, PRIMEIRO 4º O douto despacho a que se responde, s. m o., parte de uma premissa errada: a premissa de que ao recurso de revisão interposto pela reclamante é aplicável a al. f), do art.º 696.º, do Código de Processo Civil. 5º Na verdade, ao recurso interposto pela reclamante é aplicável a alínea c), do mesmo artigo. SENÃO VEJAMOS, 6º De acordo com as regras de interpretação das normas jurídicas, tal qual como previstas no Código Civil, designadamente no art.º 9º daquele normativo: “1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.” 7º Devendo o aplicador do Direito, ao interpretar, tentar descobrir, de entre os sentidos possível da lei, qual o prevalente ou decisivo, fazendo um esforço para tentar compreender qual o pensamento e vontade do legislador real, histórico, da pessoa ou pessoas que detinham o poder legislativo no momento da publicação da lei. 8º Não se bastando com um puro trabalho de exegese literal mas procedendo – na medida do possível – a uma verdadeira reconstituição histórica do conflito de interesses subjacente. 9º Nesse sentido, é entendimento da reclamante que, quando o legislador redigiu texto dos artigos 696.º e 697.º do Código de Processo Civil: “Artigo 697.º Regime do recurso 1 - O recurso é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever. 2 - O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados: a) (...); b) No caso das alíneas f) e h) do artigo 696.º, desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado; (...)” “Artigo 696.º Fundamentos do recurso A decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando: a) (...) b) (...) c) (...) d) (...) e) (...) f) Seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português (...)” 10º Tinha como subjacente a ideia de, na eventualidade do Recorrente ser parte na decisão definitiva da instância europeia, lhe fosse dada a oportunidade de, no prazo de 60 dias do trânsito em julgado, poder interpor recurso de revista extraordinário de revisão nos tribunais nacionais. 11º Trata-se de um recurso complexo que, desde logo, tem que levar em consideração duas decisões, também elas complexas, pelo que o prazo ordinário de 30 dias para a sua interposição, não era suficiente. 12º Convencido da sua insuficiência, entendeu o legislador – e bem – proceder ao seu alargamento. 13º No entanto, entender-se que esta norma é aplicável “tout court”, numa qualquer decisão dum qualquer tribunal estrangeiro (só o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem profere cerca de 800 acórdãos por ano e o Tribunal de Justiça da União Europeia só no ano de 2019 apresentou 1739 processos findos, de acordo com dados oficiais1), 14º Em que, note-se, o Recorrente não foi parte ou teve qualquer intervenção, 15º Com todo o respeito, tal interpretação não tem qualquer cabimento e coarcta os seus direitos, por encurtamento injustificado e injusto do prazo de que dispõe para recorrer. 16º Entender-se desta forma é obrigar o Recorrente a todos os dias ler e analisar todos os Acórdãos proferidos e ver se algum deles contraria a decisão proferido pelo Tribunal Português, o que sempre teria de fazer desde o momento da prolação do Acórdão nacional, até ao final dos seus dias. 17º Não foi certamente essa a intenção do legislador quando redigiu aquela norma. REITERA-SE 18º A reclamante recorreu ao abrigo da al. c), do art.º 696.º, do CPC e não ao abrigo da al. f), circunstância em que, s.m.o., não lhe será aplicável o prazo de 60 dias previsto para aquelas situações: “Artigo 697.º Regime do recurso 1 - O recurso é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever. 2 - O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados: a) (...); (...) c) Nos outros casos, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão. (...)” 19º Cremos, assim, que, apenas a interpretação feita pela reclamante da norma em apreço cumpre o que o legislador pretendeu: assegurar os direitos do Recorrente e a harmonização do sistema jurídico como um todo (como aludido no Art.º 9º do CC). SEM PREJUÍZO, SEGUNDO, 20º Em termos de direito constituído cível aplicável, a possibilidade de se lançar mão do instituto do recurso de revisão apenas é possível porque se trata de uma situação em que se justifica o “afastamento das regras de segurança jurídica inerentes ao caso julgado, em favor de uma perspectiva de justiça”2. ISTO DITO, 21º De acordo com jurisprudência vinculativa do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) para o Estado Português, existe a obrigação de revisão de decisão administrativa quando estejam preenchidos, cumulativamente, os seguintes pressupostos: a) O órgão nacional, de acordo com o direito interno, tenha o poder de rever a decisão; b) A decisão administrativa se haja tornado definitiva em consequência de decisão de órgão jurisdicional decidindo em última instância; c) Tal decisão do órgão jurisdicional – face à jurisprudência do TJUE posterior a ela, se funde numa interpretação errada do direito da União, aplicada sem que ao TJUE tivesse sido submetida questão prejudicial nas condições previstas no art.º 267.ºdo TFUE. 22º O recurso de revisão interposto pela reclamante preenche – integralmente – os pressupostos ali previstos e enunciados em vários acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia. 23º Limitar a possibilidade de reexame da decisão administrativa através da imposição de prazos de caducidade ligados à data do trânsito da decisão em que o reexame se funda, constitui, assim, uma clara violação do princípio do primado do Direito da União Europeia, do princípio da lealdade e do princípio da aplicação uniforme, por traduzir a imposição de condições mais restritas que as estabelecidas pelo direito da União para definir o carácter obrigatório do reexame/revisão, 24º Tudo conforme melhor resulta da jurisprudência conforme do TJUE, nomeadamente no acórdão KUHNE & HEITZ de 13 de Janeiro de 2004, processo C-453/00 e no acórdão KEMPTER de 12 de Fevereiro de 2008, processo C-2/06 e Acórdão KAPFERER de 16 de Março de 2006, processo C-234/04. 25º Segundo o princípio do primado, o direito europeu tem um valor superior ao dos direitos nacionais dos Estados-Membros. ATÉ PORQUE 26º Deve o Tribunal, na dúvida sobre a aplicação do princípio enunciado, ao disposto no art.º 697.º, n.º 2, al. c) e f), recorrer ao reenvio prejudicial. E, SEGUINDO ESSE CAMINHO, 27º Num acórdão do TJUE de 19 de Junho de 1990 (FACTORTAME), o Tribunal de Justiça declarou que um órgão jurisdicional nacional, no âmbito de uma questão prejudicial sobre a validade de uma norma nacional, deve suspender de imediato a aplicação da referida norma, na pendência da solução preconizada pelo Tribunal de Justiça, bem como da sentença que o órgão jurisdicional proferir sobre a questão quanto ao mérito. 28º De modo genérico, decorre da jurisprudência que compete aos Estados-Membros assegurar no seu território a aplicação e o respeito do direito da União, de forma que aqueles devem prever um sistema de vias de recurso e de processos que permita assegurar aos interessados o respeito do seu direito a uma tutela jurisdicional efectiva nos domínios abrangidos pelo direito da União. 29º No acórdão de 9 de Março de 1978, SIMMENTHAL (106/77, EU:C:1978:49), o Tribunal de Justiça salientou, a este respeito, que «por força do princípio do primado do direito comunitário, as disposições do Tratado e os actos das instituições directamente aplicáveis têm por efeito, nas suas relações com o direito interno dos Estados-Membros, [...] tornar inaplicável, de pleno direito, desde o momento da sua entrada em vigor, qualquer norma de direito interno que lhes seja contrária». 30º Além disso, «qualquer juiz nacional tem o dever de, no âmbito das suas competências, aplicar integralmente o direito comunitário e proteger os direitos que este confere aos particulares». 31º «o juiz nacional responsável, no âmbito das suas competências, pela aplicação de disposições de direito comunitário, tem a obrigação de assegurar o pleno efeito de tais normas, decidindo, por autoridade própria, se necessário for, da não aplicação de qualquer norma de direito interno que as contrarie, ainda que tal norma seja posterior, sem que tenha de solicitar ou esperar a prévia eliminação da referida norma por via legislativa ou por qualquer outro processo constitucional». AINDA SEM PREJUÍZO, 32º A interpretação do disposto no art.º 696.º, al. c) e f) do Código de Processo Civil, no sentido de que, apesar de o Tribunal ter o poder atribuído por lei de rever a decisão administrativa que se tornou definitiva em consequência de decisão do órgão jurisdicional que, decidindo em última instância, interpretou erradamente o direito da União, sem que ao TJUE tenha submetido questão prejudicial nas condições previstas no art.º 267.º, do TFUE, como era sua obrigação, se o recurso de revisão for interposto depois de decorridos mais de 60 dias sobre a prolação do acórdão do TJUE ou da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia é extemporâneo, é materialmente inconstitucional por violação do princípio do primado do Direito da União Europeia previsto no art.º 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, 33º Inconstitucionalidade que expressamente se invoca e que deve, sob pena de nulidade por omissão de pronúncia, ser apreciada, com todas as legais consequências. MAIS, 32º No presente caso, a reclamante dirigiu-se a juízo – através do recurso de revisão – para fazer valer direito que lhe foi negado, de modo definitivo, por órgão jurisdicional que não cumpriu com a sua obrigação de reenvio prejudicial. 33º O que se trata é de uma revisão ou reexame de decisão proferida por órgão jurisdicional que julgou em última instância sem dar cumprimento à obrigação de reenvio prejudicial, decisão que se vem a demonstrar, face a interpretação entretanto feita pelo TJUE, em desconformidade com o Direito da União Europeia. 34º Neste caso, não se pode considerar que a reclamante não se tenha dirigido atempadamente a juízo exercendo o seu direito – o que acontece é que este direito lhe foi negado, estando essa improcedência da sua pretensão causalmente ligada ao incumprimento, pelo órgão jurisdicional que decidiu a causa em última instância, do dever de suscitar o reenvio prejudicial. MAIS AINDA, 35º O TJUE tem estabelecido limites à autonomia processual dos Estados-Membros, de forma a compatibilizar ambos os princípios em presença – a autonomia dos Estados-Membros e a aplicação uniforme e efectiva do Direito da UE – até para evitar tratamentos discriminatórios entre cidadãos europeus. 36º Estes limites têm como objectivo ressalva a aplicação minimamente uniforme do Direito da EU e garantir o seu primado, bem como acautelar o respeito pelos direitos e liberdades reconhecidos aos cidadãos por aquele Direito e pelo interesse da EU. 37º Ainda que se entenda que, caberá ao ordenamento jurídico interno de cada Estado-Membro regular, adjectivamente, o instituto do recurso extraordinário de revisão, 38º Tal regulação não pode, por um lado, ser menos favorável do que as das acções ou recursos análogos de natureza interna (princípio da equivalência) e, por outro, não pode tornar impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efectividade) (v., neste sentido, acórdão de 17 de Novembro de 1998, Aprile, C-228/96, Colect., p. I-7141). 39º No que se refere ao princípio da equivalência, é aquele logo violado se atendermos ao regime previsto no art.º 168.º, do CPA, de acordo com o qual: o prazo ordinário para a anulação é de seis meses a contar da data do conhecimento pelo órgão competente da causa de invalidade, sendo certo que, de acordo com o n.º 7: “Desde que ainda o possa fazer, a Administração tem o dever de anular o ato administrativo que tenha sido julgado válido por sentença transitada em julgado, proferida por um tribunal administrativo com base na interpretação do direito da União Europeia, invocando para o efeito nova interpretação desse direito em sentença posterior, transitada em julgado, proferida por um tribunal administrativo que, julgando em última instância, tenha dado execução a uma sentença de um tribunal da União Europeia vinculativa para o Estado português.” 40º Já no que se refere ao princípio da efectividade, o Tribunal de Justiça, apesar de considerar compatível com o direito da União a fixação de prazos razoáveis de recurso, sob pena de preclusão, no interesse da segurança jurídica que protege simultaneamente o interessado e a administração em causa, 41º Tais prazos não podem ser susceptíveis de, na prática, impossibilitarem ou dificultarem excessivamente o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União. 42º Uma regra de caducidade do direito ao recurso de revisão – que prevê um prazo de caducidade de exercício desse direito de 60 dias contados desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado (art.º 697.º, n.º 2, al. b), do CPC), mesmo quando o recorrente não foi parte em tal decisão, é, manifestamente, contrária ao princípio da efectividade, tornando virtualmente impossível a aplicação do Direito da UE. 43º O prazo de 60 dias previsto na parte final do art.º 697.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, quando aplicado a qualquer recorrente, independentemente deste ser parte na decisão estrangeira ou da mesma ter sido notificado, é susceptível de tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica europeia, por não se afigurar como um prazo razoável. 44º O referido prazo, além de não ser equivalente ao previsto para acções ou recurso análogos de natureza interna – como a anulação de acto administrativo prevista no art.º 168.º do CPA – traduz-se numa discriminação inadmissível considerando o princípio da aplicação uniforme do direito da União e numa clara discriminação entre cidadãos europeus. MAIS AINDA, 45º Um acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia – de acordo com o Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia (art.º 44.º) pode ser objecto de revisão “se se descobrir facto susceptível de exercer influência decisiva e que, antes de proferido o acórdão, era desconhecido do Tribunal e da parte que requer a revisão. O processo de revisão tem início com um acórdão do Tribunal que declare expressamente a existência de facto novo, lhe reconheça as características exigidas para a revisão e declare o pedido admissível com esse fundamento. 46º Continua aquele artigo dizendo que, nenhum pedido de revisão pode ser apresentado depois de decorrido o prazo de dez anos a contar da data do acórdão. 47º Não se prevendo, assim, qualquer prazo – desde a ocorrência do facto superveniente – em que pode tal revisão ser requerida. 48º Mas sim o momento a partir do qual pode aquele direito ser exercido, ou seja, o momento do conhecimento, conforme previsto no artigo 159.º do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça: Revisão 1. A revisão de uma decisão do Tribunal só pode ser pedida, em conformidade com o artigo 44.º do Estatuto, se for detetado facto que possa ter influência decisiva e que, antes de proferido o acórdão ou notificado o despacho, era desconhecido do Tribunal e da parte que requer a revisão. 2. Sem prejuízo do prazo de dez anos previsto no artigo 44., terceiro parágrafo, do Estatuto, o pedido de revisão deve ser apresentado, o mais tardar, no prazo de três meses a contar do dia em que o requerente teve conhecimento do facto no qual o pedido de revisão se baseia.” POR ÚLTIMO, 49º A Constituição da República Portuguesa consagra, em termos amplos, o direito de acesso aos tribunais no seu artigo 20.º. 50º Não é, no entanto, suficiente que a lei assegure essa possibilidade, há que garantir os meios necessários para que a garantia em causa seja efectiva. 51º De facto, de nada vale que a lei preveja a possibilidade de recurso contencioso de um acto se, como é o caso, os pressupostos de recorribilidade dos mesmos forem de tal forma apertados que inibam a possibilidade de recurso na grande maioria das situações em que o particular se tenha por lesado pela Administração. 52º Havendo necessidade de criar as condições necessárias para que o cidadão possa obter uma decisão jurisdicional resulta do Princípio da Tutela Judicial Efectiva. ASSIM, 53º Ao recurso em apreciação não é aplicável o disposto na alínea f) do art.º 696.º, mas o disposto na al. c), do mesmo normativo. 54º A al. f), e o n.º 2, al. b) do art.º seguinte são aplicáveis a situações em que a decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português foi proferida num processo em que o recorrente é parte. 55º Como é bom de ver, o recorrente não foi parte no acórdão em que fundamenta a sua revisão. 56º O prazo de 60 dias previsto no art.º 697.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, quando aplicável a situações em que o recorrente não foi parte no processo em que foi proferida a decisão estrangeira, além de violar princípios constitucionais relacionados com a aplicação do direito da União Europeia, como supra explanado, viola ainda o princípio da tutela jurisdicional efectiva – tal qual como previsto no art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa – ao impedir a revisão/reapreciação da decisão transitada em julgado quando decorridos mais de 60 dias da publicação no Jornal da União Europeia do Acórdão que lhe serve de fundamento. 57º A interpretação do disposto no art.º 697.º, n.º 2, al. b) in fine do Código de Processo Civil, no sentido de que, o recurso de revisão interposto por recorrente que não foi parte no processo estrangeiro, depois de decorridos mais de 60 dias sobre a prolação de um acórdão do TJUE ou da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia é extemporâneo, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva previsto no art.º 20º, da Constituição da República Portuguesa, 58º Inconstitucionalidade que se invoca expressamente para todos os legais efeitos e que deve ser declarada.” E termina requerendo que: “o recurso interposto pela reclamante ser objecto de despacho de admissão, seguindo-se os ulteriores termos até final” *** Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência dos juízes-adjuntos.*** Questões a decidir na Reclamação:Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Reclamante, ou seja, no caso em apreço, da nulidade e erro de julgamento do despacho de 23 de junho de 2016,que indeferiu o recurso de revisão da aqui Reclamante, e em caso afirmativo, se o mesmo reune os pressupostos processuais necessários à sua admissão. II. Fundamentação II.1. Fundamentação de facto Dos elementos juntos nos autos, constata-se a seguinte tramitação processual relevante para a decisão: A. Em 6 de dezembro de 2012 foi proferido por este Tribunal acórdão no processo principal, com n.º 36/11.6BEPNF, concedendo provimento parcial ao recurso interposto pela aqui Reclamante (por consulta ao SITAF). B. Em 13 de dezembro de 2012 foi emitida a notificação à ora Reclamante do acórdão proferido no processo principal n.º 36/11.6BEPNF (por consulta ao SITAF). C. Em 17 de junho de 2016, a aqui Reclamante apresentou perante este Tribunal um requerimento de Recurso de Revisão, acompanhado das respetivas alegações (cf. requerimento, e sobrescrito de remessa e vinheta de correio postal registado em 2016-06-17, tudo a fls. 1 a 32 dos autos, numeração do SITAF). D. Nas alegações do recurso de revisão interposto no processo principal, a ora Reclamante conclui como se segue (cf. alegações de recurso, a fls. 1 a 32 dos autos, numeração do SITAF): “CONCLUSÕES: 1ª - A recorrente vem interpor recurso de revisão do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte a 13 de Dezembro de 2012, que negou parcialmente provimento ao recurso por si interposto nos presentes autos. 2ª - O presente recurso enquadra-se na seguinte factualidade: • O Senhor Subdirector Geral dos Impostos, por subdelegação, procedeu ao indeferimento, por douto despacho de 26.01.2010, do Recurso Hierárquico apresentado em 29.04.2009; • Tal recurso hierárquico foi interposto na sequência do indeferimento da Reclamação Graciosa instaurada sob o n.º 1848200804000587; • Efectivamente, a recorrente foi notificada das liquidações adicionais de IVA nos anos de 2004 e 2005: • Pela dedução de IVA liquidado no montante de €610.053,05 no ano de 2004 e €750.388,79 no ano de 2005 em relação ao contribuinte n.º (…), com a denominação “A.”; • Pela dedução de IVA liquidado no montante de €49.001,67 no ano de 2004, em relação ao contribuinte n.º (…), com a denominação de “R., LDA.”; • Pela dedução de IVA liquidado no montante de € 357.037,72, no ano de 2005, em relação ao contribuinte n.º (…), com a denominação de “S., LDA.”. • A Administração Tributária (AT) na decisão impugnada, não aceitou o direito à dedução do IVA por parte da aqui recorrente, nos períodos acima referidos, do montante global de € 1.766.481,23, a que acresceram os juros no montante total de €216.143,61, o que perfez um total de €1.982.624,84 (um milhão e novecentos e oitenta e dois mil seiscentos e vinte e quatro euros e oitenta e quatro cêntimos). • A questão embora complexa no conteúdo é simples de resumir: a Recorrente vendeu resíduos de cobre a empresas espanholas, servindo-se para o efeito de fornecedores portugueses, que carregavam a mercadoria em Portugal e a transportavam por sua conta para a entregarem, nos clientes da Recorrente, em Espanha. Dessas transacções, a Recorrente fez todos os registos administrativos bancários e contabilísticos e deles extraiu todas as consequências, nomeadamente lançou as aquisições em custos, as vendas em proveitos e, por se tratarem de transacções intracomunitárias, isentas de IVA pois, deduziu o mesmo e solicitou a devolução do respectivo pagamento à A.F. • Entendeu a A.F. que os documentos e registos efectuados pela Recorrente, não correspondem a verdadeiras transacções comerciais e que as mesmas não existiram, sendo que todas elas são simuladas. • Assim sendo, extraiu a A.F. as respectivas consequências e não aceitou as aquisições efectuadas pela Recorrente e em consequência não só não aceitou o IVA por si deduzido como também não considerou os CUSTOS das aquisições referidas. • Apresentada que foi a Impugnação Judicial, correu a mesma os seus trâmites normais e após julgamento, foi proferida douta sentença que julgou improcedente a impugnação judicial das liquidações adicionais de IRC referentes aos exercícios de 2004 e 2005, e respectivos juros compensatórios, nos montantes de 1.071.853,96 (liquidação n.º 2008 8310032796) e €1.631.960, 12 (liquidação n.º 2008 8310032822). • Decisão da qual a Recorrente recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte, recurso este que foi admitido com subida nos próprios autos, e com efeito devolutivo. • Por Acórdão de 13 de Dezembro de 2012, acordaram os Juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência: revogar a decisão recorrida na parte em que confirmou a legalidade das correcções aos custos deduzidos e suportados em facturas emitidas por A., LDA., julgando - em substituição - procedente a impugnação na parte respectiva e anulando as liquidações na parte correspondente, com todas as legais consequência e negar, no mais, provimento ao recurso. • Para proferir a referida decisão, sustentou-se este Digníssimo Tribunal, no seguinte: “constitui indício fundado de que as operações comerciais tituladas em outras facturas não existiram a demonstração de que os emitentes respectivos não teriam capacidade as realizar''; “pelo que, relativamente a estas operações, o sujeito passivo já não beneficia da presunção de verdade dos dados da sua escrita e dos respectivos documentos de suporte - artigo 75. º, n.º 2 da Lei Geral Tributária.”; “Não viola os princípios da proporcionalidade e da justiça a decisão recorrida que, em tais circunstâncias, reverte para o sujeito passivo o ónus de provar a realização das transacções tituladas nas facturas correspondentes”; “Não comprova a realização das operações comerciais respectivas e ter suportado os custos correspondentes o sujeito passivo que não infirma os indicadores de que os seus fornecedores não teriam capacidade para as realizar nem fornece dados objectivos adicionais que confirmem a sua realização. “Não são aceites como custos os encargos cuja existência foi fundadamente posta em causa e o sujeito passivo não logrou comprovar - artigo 23. º, do Código do IRC.” 3ª - O acórdão objecto do presente Recurso de Revisão há muito transitou em julgado. 4ª - No dia 22 de Outubro de 2015, a Quinta Secção do Tribunal de Justiça da União Europeia proferiu um Acórdão, no âmbito do processo 14/C-277, na sequência de um pedido de decisão prejudicial concernente à interpretação da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho de 17 de Maio de 1977 relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membro respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do valor adicionado fiscal: uniforme colectável (JOL 1 45, p. 1), alterada pela Directiva 2002/38/CE do Conselho 7 de Maio de 2002 (JOL 128, p. 41, adiante da Sexta Directiva), concernente a uma disputa entre PPUH Stehcemp sp. j. Florian Stefanek, Janina Stefanek, Jaroslaw Stefanek (a seguir designado por PPUH Stehcemp para o Dyrektor lzby Skarbowej w Lodzi (Director do imposto da Câmara de LODZ) sobre a recusa a admitir o direito à dedução o imposto sobre o valor acrescentado (a seguir designado IVA) pago por PPUH Stehcemp em actividades consideradas como suspeitas). 13. Tendo o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declarando que: “As disposições da Sexta Diretiva 771388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, conforme alterada pela Diretiva 2002138/CE do Conselho, de 7 de maio de 2002, devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que recusa a um sujeito passivo o direito de deduzir o imposto sobre o valor acrescentado devido ou pago relativamente a bens que lhe foram entregues pelo facto de a fatura ter sido emitida por um operador que deve ser considerado, face aos critérios previstos nessa regulamentação, um operador inexistente e de ser impossível determinar a identidade do verdadeiro fornecedor dos bens, exceto se estiver provado, perante elementos objetivos, e sem serem exigidas ao sujeito passivo verificações que lhe não incumbem, que o sujeito passivo sabia ou tinha a obrigação de saber que a entrega estava envolvida numa fraude ao imposto sobre o valor acrescentado, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar”. 5ª - O fundamento do presente recurso de revisão é a prolação do acórdão do TJUE supra aludido, cujo conteúdo se afigura totalmente inconciliável com o teor do acórdão proferido no âmbito dos presentes autos, na parte em que negou provimento ao recurso interposto pela Recorrente. 6ª - O recurso de revisão, nos processos a que se aplica o regime de recursos jurisdicionais previsto no Código de Procedimento e Processo Tributário, encontra-se regulado no art. 293.º do Código de Procedimento e Processo Tributário. 7ª - Quanto aos pressupostos processuais do recurso de revisão de sentença, no que não se encontrar previsto no artigo 293.º do CPPT, haverá que recorrer à legislação subsidiária indicada no art. 2.º do Código de Procedimento e Processo Tributário. 8ª - Não prevendo o regime de recursos no processo o judicial tributário a possibilidade de revisão de uma decisão interna transitada em julgado por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, atenta a relevância desta ausência normativa e a natureza de tal omissão, impõe-se encontrar regulamentação adequada nas normas do Código de Processo Civil sobre interposição processamento e julgamento dos recursos jurisdicionais, no caso, e concretamente, no preceituado pelo art. 696.º, al. f). 9ª - Resulta do disposto no art. 696.º, al. f), do Código de Processo Civil, que o legislador pretendeu estender o recurso de revisão não só aos casos em que decisão interna seja inconciliável com uma decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como também aos casos em que se verifique inconciliabilidade com qualquer decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português. 10ª - Um acórdão proferido pelo TJUE assume carácter vinculativo para o Estado Português e pode ser invocado como fundamento de recurso revisão ao abrigo da al. f) do art. 696.º, do Código de Processo Civil verificados que sejam os demais pressupostos, nomeadamente a inconciliabilidade com decisão interna transitada em julgado, tudo conforme bem decidido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Fevereiro de 2014, processo n.º 0360/13, disponível em www.dgsi.pt. 11ª - No douto acórdão proferido a 13 de Dezembro de 2012, este Tribunal pronunciou-se sobre “o alegado erro de julgamento na aplicação das regras do ónus da prova dos pressupostos de facto da tributação (…) se as regras do ónus probatório aplicáveis, na interpretação que delas é feita pelo Tribunal recorrido, ofendem os princípios constitucionais de proporcionalidade e da justiça.” 12ª - No que concerne às facturas emitidas pela entidade A., S.A., e uma vez que, nos termos da decisão recorrida, “é uma empresa certificada cuja experiência no sector de sucatas tem mais de 30 anos que possui uma considerável capacidade instalada e que conhece, por isso obrigatoriamente, o sector de actividade onde opera” “(...) teria meios e condições, logísticas e de mercado, para fornecer à Recorrente pelo menos uma parte do cobre e do latão que lhe facturou”, concluiu pela revogação da decisão recorrida na parte em que confirmava a legalidade das correcções aos custos deduzidos e suportados e julgou - em substituição - procedente a impugnação na parte respectiva e anulando a liquidação na parte correspondente, com todas as legais consequências. 13ª - Quanto às entidades “S., LDA. e a R., LDA., empresas que nem sequer têm instalações, meios de transporte e humanos ou equipamentos adequados ao fornecimento de sucatas” decidiu este Digníssimo Tribunal negar qualquer provimento ao recurso interposto e confirmar a decisão proferida. 14ª - Sobre a mesma matéria - de facto e de Direito - foi proferido, entre outros, acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 22 de Outubro de 2015, que se sustentou, no seguinte: • “a F. não foi registada para efeitos de IVA, não foi pago imposto nenhum e não dispunha de uma concessão para a venda de combustíveis líquidos. Além disso, o estado dilapidado do edifício designado como sede, tornaria impossível qualquer actividade económica.” • O fornecedor das mercadorias em causa no processo principal não ter pago o IVA devido em operações de venda não ter nenhuma influência sobre o direito do sujeito passivo de deduzir o IVA pago. 15ª - Apesar da decisão fundamento do presente recurso ter por princípio o direito à dedução do IVA, o raciocínio técnico-jurídico que terá conduzido à prolação do Acórdão de 13 de Dezembro de 2012, bem como a factualidade em que se sustenta, pese embora conclua pela legalidade das correcções aos custos deduzidos e suportado em facturas emitidas por aquelas entidades, em sede de IRC, é exacta e necessariamente inconciliável com aquele prolatado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, ao aplicar o regime do IVA. 16ª - De acordo com o Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia a 22 de Outubro de 2015, até mesmo na situação de uma entidade emissora INEXISTENTE para efeitos de IVA, ou seja, até mesmo na situação de uma entidade que não se encontre registada, que não paga ou alguma vez pagou tal imposto, cujo edifício designado como sede se encontra de tal forma danificado que não permite o desenvolvimento de QUALQUER actividade económica, não podem ser exigidas do sujeito passivo verificações que lhe não incumbem, principalmente, não pode ser exigível ao sujeito passivo que soubesse, ou devesse saber, que a entrega estava envolvida numa fraude ao imposto sobre o valor acrescentado. 17ª - Aliás, sufraga aquele Tribunal a tese de que sempre caberia não ao sujeito passivo, neste caso à Recorrente, verificar, averiguar a existência daquela entidade emissora - quanto mais as condições em que laborava - mas à Autoridade Tributária! 18ª - A interpretação enunciativa das normas jurídicas em contenda, designadamente comunitárias, o desenvolvimento ou exploração das suas virtualidades através do raciocínio e da intuição conduziu-nos ao resultado de que a lei que permite o mais também permite o menos (argumento a maiori ad minus), pelo que partindo de uma interpretação por maioria de razão, se de acordo com jurisprudência comunitária, não é exigível do sujeito passivo o conhecimento de que uma entidade com quem estabelece uma relação comercial é INEXISTENTE, não lhe será, POR MAIORIA DE RAZÃO, exigível conhecer que uma entidade, devidamente constituída e registada nos serviços da Autoridade Tributária bem como no Registo Comercial, não terá CAPACIDADE ESTRUTURAL para fornecer, produzir ou vender a mercadoria que as suas facturas reflectem e que, note-se, foram efectivamente pagas pela Recorrente. 19ª - Não raras vezes, a soberania dum Estado é limitada por princípios jurídicos fundamentais do Direito que o Direito Internacional positiva nas relações que lhe cumpre disciplinar, designadamente no que respeita a Regulamentos, Directivas, Decisões, da Jurisprudência e dos Costumes Comunitários, cujas normas se aplicam directamente na ordem jurídica portuguesa e prevalecem sobre a legislação nacional, o que determina a possibilidade de serem invocadas perante os tribunais nacionais quer contra o poder político quer contra particulares. 20ª - É jurisprudência uniforme do Tribunal de Justiça da União Europeia que o direito de um sujeito passivo que efectue tais operações a deduzir o IVA pago a montante não pode ser afectado pela circunstância de, na cadeia de entregas na qual se inserem essas operações, sem que esse sujeito passivo saiba ou possa saber, uma outra operação, anterior ou posterior à realizada por este último, estar viciada por fraude ao IVA (cf. caso Optigen e proc. apensos C- 354/03, C-355/03 e C-484/03 [2006]). Também no Acórdão de 21 de Junho de 2012, tendo por objecto pedidos de decisão nos termos do artigo 267.º TFUE, apresentados no âmbito dos processos MAHAGÉBEN KFT contra NEMZETI ADÓ- ÉS VÁMHIAVATAL DÉL-DUNÁNTÚLI REGIOMÁLIS ADÓ FOIGAZGATÓSÁGA (C-80/1 1) e PÉTER DAVID contra NEMZETI ADÓ- ÉS VÁMHIAVATAL DÉL-DUNÁNTÚLI REGIOMÁLIS ADÓ FOIGAZGATÓSÁGA - o Tribunal de Justiça da União Europeia voltou a ser chamado a decidir a propósito da recusa da Administração Fiscal em admitir o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante sobre operações consideradas suspeitas. 21ª - O acórdão de 22 de Outubro de 2015 vai no sentido pugnado de forma uniforme pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, cuja interpretação do direito aplicável é totalmente inconciliável com o acórdão proferido por este Tribunal a 1 3 de Dezembro de 2012. 22ª - O acórdão de 22 de Outubro de 2015 proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia é uma decisão de uma instância internacional que vincula o Estado Português, já transitou em julgado, pelo que é uma decisão definitiva. 23ª - Uma vez que se encontram verificados todos os pressupostos do recurso de revisão previstos nos artigos 696.º, al. f), 697.º e 698.º, deve o presente recurso ser admitido e notificada pessoalmente a recorrida para responder no prazo de 20 dias.” E. Em 23 de junho de 2016, foi proferido o despacho aqui reclamado, com o seguinte teor (cf. fls. 34 e segs dos autos, numeração do SITAF): “ENQUADRAMENTO E APRECIAÇÃO DA PRETENSÃO De facto o art. 696º, al. f) do C. Proc. Civil estabelece como fundamento de revisão de decisão transitada em julgado a situação em que a decisão em apreço seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português [correspondente ao antigo art. 771.º al. f) do CPC] Todavia, no âmbito do processo tributário há norma específica para a revisão da sentença (acórdão ou despacho), no nº 2 do art. 293º do CPPT, o qual estabelece que: “Apenas é admitida a revisão em caso de decisão judicial transitada em julgado declarando a falsidade do documento, ou documento novo que o interessado não tenha podido nem devia apresentar no processo (…), ou de falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia. Esta a norma inserida no art. 293º do CPPT, que foi aditado ao CPPT, qual tal, pela Lei n.º 3-B/2000 de 4/4, pelo art. 68º, produz efeitos desde 1/1/2000. Por conseguinte trata-se de norma diferente do CPC e do CPTA [art. 154º do CPTA, antes e depois da revisão do respectivo código], pois que o regime de revisão do art. 293º aplica-se às decisões proferidas em processos a que se aplica o regime de “recurso dos actos jurisdicionais praticados no processo judicial tributário regulado neste Código”1 Estabelece ainda o n.º 5, do citado artigo que “no que não está previsto neste artigo, a revisão segue os termos do processo em que foi proferida a decisão revivenda.” Deduz-se assim da expressão “termos do processo” que esta norma reporta-se apenas à tramitação do recurso, não abrangendo, deste modo, as matérias que não se enquadram neste conceito, designadamente os pressupostos processuais. Por fim, claramente emerge da expressão legal “Apenas é admitida a revisão” que a admissibilidade de revisão é só para os fundamentos elencados na norma: falsidade de documento; documento novo, (que tem de ser documento que o interessado não podia nem devia apresentar no primeiro processo ou de que não tinha conhecimento); falta ou nulidade da notificação do requerente - revelia. Como diz o Requerente o seu pedido de revisão funda-se na prolação do acórdão do TJUE apontado nos autos, cujo conteúdo se afigura totalmente inconciliável com o teor do acórdão proferido no âmbito dos presentes autos. Carece, assim, de fundamento legal o pedido de revisão, pelo que se toma inadmissível a revisão pretendida. Nestes termos, vai indeferido o pedido de revisão por não ter sido invocado qualquer dos fundamentos a que alude a norma acima posta em evidência, o que equivale a afirmar a improcedência manifesta da pretensão formulada pela Requerente, por carecer de suporte legal, inviabilizando ab initio o pedido por si formulado no âmbito dos presentes autos. Custas a cargo da Requerente Registe e Notifique 1 – Neste sentido Conselheiro Jorge Lopes de sousa in CPPT anotado IV, 6.ª edição, pág. 552, Áreas Editora” *** II.2. Fundamentação de direito Assentes que estão as circunstâncias processuais relevantes para a decisão, cumpre apreciar o direito. Antes de mais, importa clarificar que o despacho sob reclamação não padece de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) ex vi art. 666.º, n.º 1, ambos do CPC, como sustenta a Reclamante. Com efeito, e por força do disposto naquele preceito, o que se impunha era que no despacho fossem apreciadas as questões suscitadas, não tendo, no entanto, que ser abordados todos os argumentos invocados pela Reclamante. A nulidade ocorreria se se verificasse a falta, em absoluto, da indicação dos fundamentos de direito da decisão, o que manifestamente, não sucede. Donde, e apesar de nada referir quanto à existência e teor da jurisprudência favorável à pretensão da Reclamante e por ela expressamente invocada, corporizada no Acórdão do STA proferido em 7 de fevereiro de 2014, no proc. 0360/13 (disponível para consulta em www.dgsi.pt/sta), o despacho não deixou de afrontar a questão da (in)admissibilidade do recurso de revisão, expondo os fundamentos de direito que conduziram à rejeição do recurso. Esta é, aliás, a interpretação do preceito há muito pacificada na jurisprudência, como resulta, por exemplo, do Acórdão do STA proferido em 2020-04-20, no proc. 02145/12.5BEPRT 01190/17 (disponível para consulta em www.dgsi.pt/jsta), no qual se sumaria “Nos termos do preceituado no citado art. 615, nº.1, al. d), do C. P. Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões (que não as meras “razões” ou “argumentos”) que devesse apreciar (seja por que foram alegadas pelas partes, seja por que são de conhecimento oficioso, nos termos da lei)” (itálico nosso) – argumentação que é transponível para o caso em apreço, sem prejuízo de aqui estar em discussão um despacho, e não uma sentença. Ou seja, o despacho reclamado não padece de nulidade por omissão de pronúncia. Questão diferente, e que deve merecer um desfecho diverso, é a do invocado erro de julgamento, que se reporta a uma incorreta interpretação do direito (processual) aplicado. Senão, vejamos. Os acórdãos do TJUE em sede de reenvio prejudicial, recaindo sobre a interpretação do direito da União Europeia – no caso, sobre interpretação do direito secundário, abrangida pelo disposto no art. 267.º, alínea b), do TFUE - são obrigatórios desde o próprio dia da sua prolação (cf. art. 91.º, n.º 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, disponível para consulta em https://curia.europa.eu/jcms/upload/docs/application/pdf/2012-10/rp_pt.pdf), e têm efeito retroativo. Com efeito, a interpretação que o TJ faz das normas de direito da UE no exercício da competência que lhe é conferida pelo art. 267.º do TFUE, esclarece e precisa (se necessário for) o significado e o alcance dessas normas tal como devem ou deveriam ter sido entendidas e aplicadas desde a sua entrada em vigor (interpretação “co extensiva” à provisão interpretada). Pelo que as normas assim interpretadas podem e devem ser aplicadas mesmo às relações jurídicas surgidas e constituídas antes de ser proferido o acórdão em causa (cf. acórdão do TJUE proferido em 1980-03-27, no processo 61/79, Denkavit Italiana, § 16). Deste entendimento que o TJUE faz da competência que lhe é dada pelo art. 267.º TFUE resulta um efeito retroativo automático das suas decisões, ou seja, sendo o TJUE (o único) competente para limitar temporalmente as consequências das suas decisões sobre a interpretação do direito da UE (cf. acórdão proferido em 1990-05-17, no processo C-262/88, Barber, § 41), em princípio os respetivos efeitos retroagirão automaticamente. Para que a restrição temporal de efeitos ocorra, deverá ser requerida no processo pelo Estado-Membro interessado (cf. acórdãos proferidos em 1988-02-02, processo 24/86, Blaizot, § 29; em 1999-05-09, processo C-262/96, Sürül, § 109; e em 2000-03-09, processo C-437/97, EKW, § 58). Em particular nas decisões referentes a questões fiscais, a restrição da retroatividade das decisões do TJUE é excecional (cf. acórdãos proferidos pelo TJUE em 1992-03-31, processo C-200/90, Dansk Denkavit, § 21 a §23; em 1995-08-11, processo C-367/93, Roders, § 48 a § 50; em 2007-01-18, processo C-313/05, Brzeziñski, § 55 a § 62; em 2007-03-06, processo C-292/04, Meilicke, § 34 a §41; e em 2009-02-12, processo C-138/07, Colbefret NV, § 68 a §70). De facto, e como afirma o próprio, “É apenas a título excecional que o Tribunal, como reconheceu no acórdão de 8 de abril de 1976 (…) pela aplicação de um princípio geral de segurança jurídica inerente à ordem jurídica comunitária, pode ser levado a limitar a possibilidade que qualquer interessado tem de invocar a disposição assim interpretada, pondo desse modo em causa as relações jurídicas estabelecidas de boa-fé. Semelhante limitação não pode ser admitida, de acordo com a jurisprudência constante do Tribunal, senão no próprio acórdão que decide sobre a interpretação solicitada.” (cf. acórdão proferido pelo TJUE em 1988-02-02, processo 24/86, Blaizot, § 28). Resultando também claramente dito no caso Meilicke e O., processo C-292/04 “(…) tal limitação só pode ser admitida, segundo a jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, no próprio acórdão que decide quanto à interpretação solicitada (acórdãos de 2 de fevereiro de 1988, Barra, 309/85, Colect., p. 355, n.º 13, e Blaizot, 24/86, Colect., p. 379, n.º 28; acórdãos de 16 de julho de 1992, Legros e o., C-163/90, Colect., p. I-4625, n.º 30; de 15 de dezembro de 1995, Bosman e o., C-415/93, Colect., p. I-4921, n.º 142; e de 9 de março de 2000, EKW e Wein & Co., C-437/97, Colect., p. I-1157, n.º 57). (…) Na verdade, os efeitos no tempo da solicitada interpretação de uma disposição de direito comunitário têm necessariamente de ser determinados pelo Tribunal num momento preciso. Neste aspeto, o princípio de que uma limitação só pode ser admitida no próprio acórdão que decide quanto à interpretação solicitada garante a igualdade de tratamento dos Estados-Membros e demais interessados face a esse direito e, simultaneamente, cumpre as exigências decorrentes do princípio da segurança jurídica.” (cf. § 36 e 37). Com efeito, a “autoridade interpretativa ou doutrinária da jurisprudência do TJ justifica-se à luz do objetivo primordial da garantia da uniformidade da interpretação e aplicação do Direito da União no conjunto das ordens jurídicas dos Estados-membros: «Corresponde esta conceção à função atribuída ao Tribunal de Justiça pelo artigo (267.º) e que visa assegurar a unidade de interpretação do direito comunitário nos (…) Estados-membros» (v acórdão de 27.03.1963, Da Costa, 28/62)” (cf. Duarte, Maria Luísa – Direito do Contencioso da União Europeia. Lisboa: AAFDL Editora, 2017, pág. 145). Ora, foi levando em conta a importância que assume o papel desempenhado pelo TJUE, e os efeito vinculativos e retroativos da sua jurisprudência interpretativa do direito da UE, que no acórdão do STA proferido em 02-07-2014, no processo 0360/13 (disponível para consulta em www.dgsi.pt/jsta) e invocado pela Reclamante, se fez a interpretação correta do direito processual aplicável. Ali se decidiu, em suma, que “Não prevendo o regime de recursos no processo o judicial tributário a possibilidade de revisão de uma decisão interna, transitada em julgado, por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, atenta a relevância desta ausência normativa e a natureza de tal omissão, impõe-se encontrar regulamentação adequada nas normas do Código de Processo Civil sobre interposição processamento e julgamento dos recursos jurisdicionais, no caso, e concretamente, no preceituado pelo art. 771.º, al. f) do Código de Processo Civil, na redacção do decreto-lei 303/2007”. Com efeito, e atendendo ao que se deixou dito sobre a força vinculativa, eficácia retroativa e, em suma, sobre a relevância das decisões proferidas pelo TJUE em sede de reenvio prejudicial, no caso, nos termos do disposto na alínea b) do art. 267.º do TFUE, não há qualquer razão para estabelecer diferença no regime aplicável ao recurso de revisão tendo por fundamento a inconciliabilidade de decisão transitada em julgado com um acórdão posterior prolatado pelo TJUE, seja em sede de reenvio prejudicial ou em sede de ação por incumprimento, devendo por isso assentar-se na similitude entre o caso em apreço e aquele que foi objeto do supracitado acórdão proferido pelo STA em 02-07-2014, no processo 0360/13. Acrescente-se ainda que o argumento adiantado pela Fazenda Pública nos autos, imputando à “natureza do processo tributário e dos interesses que lhe estão subjacentes (…) um maior cuidado na revisão das sentenças, em ordem a garantir uma maior estabilidade às relações jurídico-tributárias”, não só falece perante o caráter vinculativo e retroativo da jurisprudência do TJUE, como é desmentido pela amplitude da recente reforma do contencioso tributário. Com efeito, o art. 3.º da Lei n.º 118/2019, de 17/09, numa assentada revogou o n.º 2 do art. 293.º do CPPT, e enxertou no respetivo n.º 1 uma remissão expressa para “qualquer dos fundamentos previstos no Código de Processo Civil”, no que antes parece revelar o reconhecimento pelo legislador do anacronismo do anterior regime do recurso de revisão. Não resta, pois, senão concluir que o despacho reclamado, ao indeferir o recurso de revisão apresentado pela reclamante com fundamento na inconciliabilidade do acórdão recorrido com a decisão proferida pelo TJUE em 22 de outubro de 2015, no processo C-277/14, PPUH Stehcemp, sustentado na falta de enquadramento deste fundamento de recurso no n.º 2 do art. 293.º do CPPT (na sua redação original, conferida pela Lei n.º 3-B/2000, de 4 de abril), recusando a aplicação supletiva ao caso do disposto na alínea f) do art. 696.º do CPC, por força do disposto no art. 2.º, alínea e) do CPC – e atendendo a que também o art. 154.º do CPTA determina a aplicação supletiva do CPC ao recurso de revisão - se encontra ferido por erro de julgamento, errando na interpretação do regime processual aplicável. Sucede que, e para que o pretendido recurso de revisão seja aceite, o mesmo terá de preencher os restantes requisitos processuais impostos pela lei aplicável. Constata-se que nas alegações de recurso que acompanharam o respetivo requerimento de interposição a ora Reclamante identifica a existência de uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português, no caso o acórdão proferido em 22 de outubro de 2015 pelo TJUE, no processo C-277/14, com a qual alega ser inconciliável o acórdão proferido por este Tribunal Central Administrativo Norte em 13 de dezembro de 2012, inconciliabilidade essa que se encontra suficientemente alegada para efeito da admissão do recurso No entanto, e aqui chegados, verifica-se que a admissão do recurso encontra um obstáculo inultrapassável na sua manifesta intempestividade. De facto, e tal como resulta das ocorrência processuais supra referidas, o requerimento de recurso, acompanhado das respetivas alegações, foi remetido para este Tribunal por correio postal registado em 17 de junho de 2016, pelo que, e embora o prazo que previsto na primeira parte do n.º 2 do art. 697.º, do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT, se mostre respeitado, o mesmo já não sucede relativamente ao prazo de 60 dias previsto no final do mesmo n.º 2, conjugado com a respetiva alínea b), atendendo a que o acórdão proferido no processo C-277/14, PPUH Stehcemp, relativamente ao qual é invocada a inconciliabilidade com o acórdão recorrido, foi proferido em 22 de outubro de 2015 e publicitado no Jornal Oficial da União Europeia 14 de dezembro de 2015 (cf. https://eur-lex.europa.eu/legal-content/pt/TXT/PDF/?uri=uriserv%3AOJ.C_.2015.414.01.0007.01.POR), data em que, e tendo em conta o disposto no art. 91.º, n.º 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça (disponível para consulta em https://curia.europa.eu/jcms/upload/docs/application/pdf/2012-10/rp_pt.pdf), passou a ter força obrigatória. Notificada para se exercer o seu direito ao contraditório relativamente a esta questão, veio a Reclamante apresentar as razões para a sua discordância quanto à intempestividade do recurso, que cabe agora apreciar. O primeiro dos argumentos que apresenta é o de que o recurso que pretende interpor é o previsto na alínea c) do art. 696.º do CPC, e não o previsto na alínea f) da mesma disposição. Com o devido respeito, que é o maior, não tem a Recorrente, aqui Reclamante, razão. O recurso em questão foi claramente interposto nos termos do disposto na alínea f) do art. 696.º do CPC, como resulta amplamente demonstrado pelo teor das alegações de recurso, e da própria reclamação. O que por si só não seria argumento, caso este Tribunal entendesse que a Recorrente qualificara mal o respetivo regime, e atendendo ao princípio iura novit curia, acolhido no n.º 3 do art. 5.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT. Sucede que existindo uma previsão específica para as situações em que se pretende fazer valer a existência de uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português para por em causa a decisão proferida por um tribunal nacional com ela inconciliável, será essa que se deve aplicar. É aliás esse o entendimento unânime da jurisprudência (veja a propósito o acórdão proferido pelo STA em 2014-02-07 no processo n.º 0360/13, no qual a Reclamante sustentou em grande parte a sua argumentação) e da doutrina (veja-se a propósito MESQUITA, Maria José Rangel de - Introdução ao contencioso da União Europeia: lições. 3.ª edição. Coimbra: Almedina, 2018, versão em Ebook, pág. 240 e segs.). Uma vez mais, com todo o respeito, que é muito, o disposto no art. 9.º do CC pode esgrimir-se com propriedade, mas para sustentar que se o legislador tivesse pretendido distinguir no regime aplicável as situações em que o Recorrente “é parte” (o que, diga-se, também não será exatamente o caso relativamente ao reenvio prejudicial, uma vez que este se trata de um mecanismo singular, em que os particulares não são exatamente “partes” no mesmo, mas no processo onde é espoletado a titulo incidental) daquelas em que não o é, tê-lo-ia deixado expresso na norma. Refira-se ainda que o prazo de 60 dias contado desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado, previsto na alínea b) do n.º 2 do art. 697.º do CPC, ex vi art. 281.º do CPPT, e aplicável ao caso, correspondendo ao prazo ordinário em dobro, revela-se ajustado, atendendo à necessidade de preservação de outros valores em causa, como o da segurança jurídica, que terá certamente aqui norteado o legislador. A Recorrente, aqui Reclamante, esgrime um segundo conjunto de argumentos em torno do facto de a jurisprudência do TJUE ser vinculativa, para a Administração fiscal e para os Tribunais, argumentando, em síntese, que a existência de um prazo de caducidade ligados à data do trânsito da decisão em que o reexame se funda, violaria o princípio do primado do Direito da União Europeia, o princípio da lealdade, e o princípio da aplicação uniforme, tal como têm vindo a ser expressos na jurisprudência do TJUE. No entanto, o facto de o princípio do primado ser incontestável, tal não significa que não exista a necessidade de ordenação processual que regule o acesso aos direitos que dele resultem, designadamente, através de um regime recursivo interno. É de resto o próprio TJUE que o diz, afirmando que os sujeitos passivos devem respeitar o regime processual nacional para obterem o ressarcimento das quantias indevidamente pagas, em desrespeito pelo Direito Europeu, embora esse regime não possa tornar esse reembolso efetivamente impossível (caso C-61/79, DENKAVIT ITALIANA, § 25 a 28), tendo decidido a propósito que “O efeito direto do artigo 13(2) do Tratado CEE implica que, a partir do final do período de transição, os pedidos dirigidos contra encargos nacionais de efeito equivalente a direitos aduaneiros ou pedidos de reembolso de tais encargos podem, de acordo com as circunstâncias, ser apresentados perante as autoridades e tribunais dos Estados-Membros (…) cabendo, no entanto, à ordem jurídica de cada Estado-Membro estabelecer as condições em que os contribuintes podem contestar essa tributação ou reclamar o seu reembolso, desde que essas condições não sejam menos favoráveis do que as relativas a pretensões semelhantes de natureza nacional e não tornem na prática impossível o exercício dos direitos conferidos pela ordem legal da comunidade” (Caso C-61/79, Denkavit Italiana, § 28, tradução nossa). Subjacente a esta afirmação está o princípio da autonomia, nos termos do qual é aos Estados-Membros que cabe organizar das vias internas de recurso para garantir a plena eficácia do direito da União Europeia, tal como é dito pelo TJUE no caso C-6/90 e C-9/90, Francovich e o., no qual afirma que “… na ausência de regulamentação comunitária, é à ordem jurídica interna de cada Estado-membro que compete designar os órgãos jurisdicionais competentes e regulamentar as modalidades processuais das ações judiciais destinadas a assegurar a plena proteção dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito comunitário (…)” (§ 42) (cf. MESQUITA, Maria José Rangel de - Introdução ao contencioso da União Europeia: lições. 3.ª edição. Coimbra: Almedina, 2018, versão em Ebook, pág. 205). O mesmo resulta do disposto no art. 19.º, n.º 1, 2.º parágrafo, do Tratado da União Europeia (na sequência de alteração introduzida pelo Tratado de Lisboa), nos termos do qual “Os Estados-Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.”. Refira-se ainda que o regime aqui aplicável não comporta qualquer violação do princípio da equivalência, uma vez que o que o mesmo implica é que as vias internas de recurso não estabeleçam qualquer distinção entre situações em que se pretende fazer valer direitos conferidos pelo Direito Europeu e pelo direito interno, devendo por isso a comparação ser feita entre as diversas vias de recurso jurisdicional existentes no direito interno, e não, como parece pretender a Reclamante, entre vias de recurso jurisdicional e meios de impugnação administrativa ou jurisdicional. Ora, e como foi já referido, o prazo de 60 dias contra o qual se revolta a Reclamante corresponde ao dobro do prazo conferido para os recursos ordinários. Pelo que também no que respeita a esta ordem de argumentos não tem a Reclamante razão. Por último, assaca o vício de inconstitucionalidade ao disposto nos arts. 696.º, alínea f) e 607.º, n.º 2, alínea b) do CPC, por entender que o facto de se impedir que faça valer um direito que entende que lhe é conferido pelo Direito Europeu por se considerar que “o recurso de revisão for interposto depois de decorridos mais de 60 dias sobre a prolação do acórdão do TJUE ou da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia é extemporâneo”, é materialmente inconstitucional por violação do princípio do primado do Direito da União Europeia previsto no art.º 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, por um lado, e o direito de acesso aos tribunais, previsto no respetivo artigo 20.º, por outro. Uma vez mais, não tem a Reclamante razão. Com efeito, e como foi já referido, o princípio da efetividade implica uma comparação entre os diversos regimes de recurso jurisdicional internos, e não, como pretende, uma comparação entre o regime de recurso jurisdicional e o regime de impugnação administrativa previsto no art. 168.º, do Código de Procedimento Administrativo, não ocorrendo assim qualquer violação do princípio do primado do Direito da União Europeia, ou do disposto no art.º 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP). Também não se verifica qualquer violação do direito de acesso à justiça, previsto no art. 20.º da CRP. Com efeito, não se considera que o prazo de caducidade do direito de recurso de 60 dias se revele uma imposição ostensivamente excessiva e desrazoável, por inexistirem razões que a justifiquem, tendo desde logo a justificá-la os valores da certeza e da segurança e jurídicas (cf. neste sentido, designadamente os acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 99/88, 413/89, 451/89, 370/91, 140/94, 70/2000, 92/01 e 68/2014, disponíveis para consulta em www.tribunalconstitucional.pt). Como foi já referido, tal prazo corresponde ao dobro do prazo de recurso ordinário, de 30 dias, assim se procurando salvaguardar alguma dificuldade acrescida na respetiva fundamentação. Não se considera ainda que o mesmo se revele impeditivo da seleção decisão fundamentadora do reexame, tendo a Reclamante além do mais ao seu dispor bases de dados e literatura técnica que a suportam e auxiliam em tal tarefa. Não pode assim ser aceite o pretendido recurso, que se revela manifestamente intempestivo, tendo sido largamente ultrapassado o prazo para o efeito. * Pelo exposto, deve a presente Reclamação deve ser indeferida.* Sendo a presente Reclamação indeferido, com o decaimento a Reclamante, deve a mesma ser condenada em custas, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (cf. art. 7.º, n.º 4 do RCP e tabela II anexa).* Conclusão:Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva: Sendo alegado como fundamento do recurso de revisão de decisão transitada em julgado, interposto ao abrigo do disposto no art. 293.º do CPPT, na sua redação original, conferida pela Lei n.º 3-B/2000, de 4 de abril, a inconciliabilidade da decisão recorrida com acórdão proferido posteriormente pelo TJUE em sede de reenvio prejudicial, deve o mesmo ser aceite, por aplicação subsidiaria do disposto na alínea f) do art. 696.º do CPC, ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, como, de resto, foi já decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo no proferido em 7 de fevereiro de 2014, no proc. 0360/13. O recurso de revisão com fundamento na inconciliabilidade da decisão recorrida com acórdão proferido posteriormente pelo TJUE em sede de reenvio prejudicial, deverá, simultaneamente, respeitar os prazos previstos no n.º 2 e respetiva alínea f) do art. 697.º do CPC, respetivamente, de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão recorrida, e de 60 dias desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado. Estes prazos são adequados, não encerrando a sua previsão qualquer inconstitucionalidade ou qualquer violação do direito da União Europeia. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em indeferir a Reclamação. * Custas pela Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.* Porto, 3 de dezembro de 2020Margarida Reis (relatora) - Cláudia Almeida – Paulo Moura. |