Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00741/22.1BEAVR |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 04/10/2025 |
| Tribunal: | TAF de Aveiro |
| Relator: | VITOR SALAZAR UNAS |
| Descritores: | RECURSO DE CONTRAORDENAÇÃO; PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO; |
| Sumário: | I – O prazo de prescrição do procedimento por contraordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração depender daquela liquidação – cfr. artigo 33.º, n.º 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias. II – A infração depende da liquidação da prestação tributária sempre que a determinação do tipo de infração ou da sanção aplicável depender do valor daquela prestação, pois é a liquidação o meio de determinar este valor. III - Para os efeitos do artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, a prescrição do procedimento tem lugar quando desde a data em que se verificou o facto tributário, tiver decorrido o prazo de quatro anos acrescido de metade. IV - A prescrição dos procedimentos por contraordenação, em causa nos autos, tem sempre lugar quando, desde o seu início, tiver decorrido o prazo de seis anos, ressalvado o tempo máximo de suspensão, de seis meses [n.º 2 do art.º 27.º-A, do RGCO].* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte: I – Relatório: A «[SCom01...], S.A.», com o NIPC ...19, com os demais sinais nos autos, vem apresentar recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF de Aveiro que, julgou improcedente a impugnação apresentada contra a decisão de aplicação de coima proferida no processo de contraordenação n.º ...20 pelo Serviço de Finanças ..., que lhe aplicou uma coima no valor de € 4.521 (quatro mil quinhentos e vinte e um euros), acrescida de custas no valor de € 76,50 (setenta e seis euros e cinquenta cêntimos), pela violação do disposto nos artigos 21.º, n.º 1, alíneas a) e d), e 29.º, n.º 1, al. c), ambos do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (“CIVA”), contra-ordenação prevista e punida pelo disposto nos artigos 114.º, n.º 2 e n.º 5, al. a), 119.º, n.º 1, e 26.º, n.º 4, do Regime Geral das Infracções Tributárias (“RGIT”). A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: «(…). 1) No caso sub judice está em causa o facto de a Recorrente, com referência aos períodos de tributação de Março, Abril, Julho, Agosto e Dezembro de 2015, ter praticado omissões e inexactidões nas declarações periódicas de IVA e ter procedido à dedução indevida de IVA [cfr. facto provado n.º 9)]. 2) Nos termos do disposto no art. 33.º-1-2 do RGIT, o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação cifra-se em cinco anos, sendo «reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação». 3) Uma vez que no caso em apreço estão em causa contra-ordenações tributárias previstas nos artigos 114.º e 119.º, n.º 1, do RGIT [cfr. facto provado n.º 9)] – ou seja, contraordenações cuja existência depende da liquidação da prestação tributária –, o prazo de prescrição do procedimento de contra-ordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária. 4) Atendendo a que no caso no caso sub judice está em causa «imposto sobre o valor acrescentado» (IVA), o referido prazo de caducidade de quatro anos – e, consequentemente, o prazo de prescrição do procedimento de contra-ordenação – conta-se partir de 01/01/2016 (cfr. art.º 45.º-1-4 da LGT). 5) De acordo com o disposto no art.º 33.º-3 do RGIT, o prazo de prescrição do procedimento de contra-ordenação tributária interrompe-se e suspende-se nos termos do RGCO, «mas a suspensão da prescrição verifica-se também por efeito da suspensão do processo, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 42.º, no artigo 47.º e no artigo 74.º /…/», sendo que, ao prazo geral de prescrição previsto nos n.ºs 1 e 2 dessa disposição deve acrescer «metade» quando ocorrerem factos interruptivos desse mesmo prazo (cfr. art.º 28.º-3 do RGCO). 6) Nesse caso (e só nesse caso), a lei estabelece um prazo máximo de prescrição, ou seja, um prazo que, uma vez ultrapassado, extinguirá o procedimento contra-ordenacional independentemente do número de factos interruptivos que tiverem ocorrido, desde que ressalvado, naturalmente, o prazo de suspensão a que se alude no artigo 27.º-A do RGCO. 7) A propósito do disposto na alínea a) do n.º 1 da citado a artigo 27.º-A do RGCO, e uma vez que tal questão vem suscitada na Sentença recorrida, importa chamar aqui à colação o artigo 55.º-1 do RGIT, norma nos termos da qual sempre que uma contra-ordenação tributária implique a existência de facto pelo qual seja devido tributo ainda não liquidado, o processo de contra-ordenação será suspenso depois de instaurado ou finda a instrução, quando necessária, e até que ocorra uma das seguintes circunstâncias: (i) o tributo seja pago no prazo previsto na lei ou no prazo fixado administrativamente, (ii) haja decorrido o referido prazo sem que o tributo tenha sido pago nem reclamada ou impugnada a liquidação, (iii) ocorra o trânsito em julgado da decisão proferida em processo de impugnação ou o fim do processo de reclamação. 8) Transpondo o acima exposto para o caso sub judice, os autos do procedimento contraordenacional onde foi proferida a decisão de aplicação da coima só poderiam ter sido legalmente suspensos (depois de instaurados ou finda a instrução, se a mesma fosse necessária), nos termos do disposto no art. 55.º-1/a/b/c do RGIT, até ao termo do prazo de impugnação administrativa ou contenciosa das liquidações ou, no caso de ter sido deduzida impugnação ou reclamação, até ao trânsito em julgado das respectivas decisões. 9) Conforme resulta daquilo que consta a fls. 5 do processo administrativo remetido ao Tribunal pela Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças ..., «o imposto /…/ não foi pago, nem reclamada ou impugnada a sua liquidação». 10) É manifesto, pois, que com referência ao disposto no art. 55.º-1/a/b/c do RGIT, os autos do processo de contra-ordenação só poderiam ter sido suspensos pelo prazo máximo de 120 dias contados do termo do prazo de pagamento voluntário da liquidação que está na origem desses mesmo autos, conforme dispõem os arts. 70.º-1 e 102.º-1/a) do CPPT. 11) Carece assim de todo e qualquer fundamento a decisão do Chefe do Serviço de Finanças ... em manter aqueles autos suspensos entre 25/11/2019 e 22/03/2022 (cfr. fls. 3 e 5 do processo administrativo remetido ao Tribunal pela Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças ...), sendo igualmente desprovida de fundamento, por maioria de razão, a afirmação que consta da Sentença recorrida no sentido de que «o procedimento em apreço esteve suspenso por força do disposto no artigo 55.º do RGIT» por «858 dias, relegando assim o termo do prazo de prescrição para 08/05/2024». 12) Essa suspensão por «858 dias» constitui um acto arbitrário e injustificado por parte do Chefe do Serviço de Finanças ... – uma vez que, não tendo o imposto sido pago nem reclamada ou impugnada a liquidação, os autos só poderiam ter sido suspensos pelo prazo máximo de 120 dias contados do termo do prazo de pagamento voluntário dessa mesma liquidação –, afigurando-se como um mero expediente para evitar a prescrição do procedimento contra-ordenacional. 13) Ainda que no caso sub judice tenham ocorrido quaisquer factos interruptivos da prescrição, o respectivo prazo máximo cifra-se em 6 anos (prazo de prescrição de 4 anos correspondente caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, acrescido de metade – cfr. arts. 33.º-2 do RGIT, 45.º-1 da LGT e 28.º-3 do RGCO), ressalvando-se unicamente os eventuais seis de meses de suspensão previstos no citado artigo 27º-A, n.º 2, do RGCO e, por referência à alínea a) do n.º 1 desse mesmo artigo 27º-A do RGCO e ao artigo 55.º-1 do RGIT, os 120 dias de suspensão contados do termo do prazo de pagamento voluntário da liquidação que está na origem dos autos do procedimento contra-ordenacional, conforme dispõem os arts. 70º- 1 e 102º-1/a) do CPPT. 14) Assim, a verdade é que, mesmo nesse caso, o referido prazo de seis anos, contado a partir de 01/01/2016 e acrescido dos eventuais seis meses e 120 dias de suspensão, já há vários meses se havia completado aquando da data da prolação da Sentença ora recorrida. 15) Termos em que deverá a douta Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que, com fundamento na prescrição do procedimento contra-ordenacional, julgue procedente o recurso interposto da decisão proferida pelo Exma. Senhora Chefe do Serviço de Finanças ... em 01/09/2022, com as legais consequências. 16) Ao ter negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, a Sentença recorrida violou o disposto nos arts. 33.º-1-2-3 e 55.º-1 do RGIT, 27.º-A e 28.º-3 do RGCO, bem como no artigo 45.º-1 da LGT, as quais deveriam ter sido interpretadas e aplicadas com o sentido constante nas presentes alegações e conclusões. * Nestes termos e nos melhores de direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente, com as legais consequências. Não foi apresentada resposta ao recurso. O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer do qual se extratam os seguintes termos: «(…). Inconformada com a sentença proferida no presente processo, na parte em que não reconheceu a prescrição do procedimento contra-ordenacional referente às infracções por que foi sancionada, da mesma recorreu a arguida, imputando-lhe erro de julgamento. Radicando a sua divergência na relevação como período de suspensão do prazo prescricional em causa, a coberto do artº 55º, nº1, alínea b) do RGIT, do (período) compreendido entre as datas da notificação à própria dos despachos administrativos que ordenaram, respectivamente, a suspensão do processo contra-ordenacional prevista no corpo do nº1 do cit. preceito legal (28/11/2019) e o prosseguimento do mesmo (04/04/2022) – hiato temporal que na sentença se computou em 858 dias. (…). Anotando-se que o presente processo foi instaurado com base em auto de notícia lavrado em 13/11/2019, nele tendo sido proferido em 25/11/2019 o seguinte despacho: “Verificando-se pelos elementos constantes dos autos que a qualificação e aplicação da infracção dependem do imposto ou do apuramento da situação tributária, determino, nos termos do artº 55º do Regime Geral das Infracções Tributárias, a suspensão do presente processo contra-ordenacional para efeitos de liquidação do imposto. Notifique-se o(s) arguido(s), nos termos e para os efeitos do Artº 35º e seguintes do Código do Procedimento e Processo Tributário” (cfr. SITAF, pp 8/10). Sabido sendo que “O regime de suspensão dos processos de contraordenação, previsto e regulado, pelo art. 55.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), unanimemente, na doutrina e jurisprudência, é considerado como estando ao serviço do objetivo de, na medida do possível, impedir a assunção de decisões contraditórias, quanto à existência do facto tributário e/ou da dívida tributária, entre o processo administrativo e/ou judicial onde esse e/ou essa são (ou não) afirmados/executados e um, pendente, processo contraordenacional, em que se partiu, para a respetiva instauração, do pressuposto da verificação daqueles.” (v. Acórdão do STA de 18/11/2020, tirado no Proc. nº0822/18.6BEAVR, editado in www.dgsi.pt). Vindo o despacho determinando o prosseguimento dos autos – referido no ponto 5 do probatório - a ser proferido em 22/03/2022, na sequência de “Informação” nele exarada na mesma data (…). Não constando, porém, dos autos nenhuma outra referência a tal liquidação, designadamente as datas da sua emissão e notificação ao sujeito passivo - actos que neles também não estão documentados. Ora, salvo o devido respeito, tais elementos mostram-se necessários à demonstração, no processo, da circunstância erigida na alínea b) do nº 1 do artº 55º do RGIT como causa de cessação da sua verificada suspensão e, bem assim, ao cômputo da duração de tal suspensão - cujo concreto apuramento se perfila como indispensável à indagação sobre o esgotamento ou não do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional. Afigurando-se-nos, salvo o devido respeito, que a cessação da sobredita suspensão, sendo obrigatória logo que materializada a circunstância normativa que a estatui e desencadeia, operará, nessa eventualidade, ope legis - não ficando condicionada ao conhecimento da mesma (circunstância/situação) no processo contra-ordenacional - e, consequentemente, ao maior ou menor grau de diligência, a respeito, da AT-, nem se protelando, pois, seja para a data do despacho administrativo que ali a venha a reconhecer, seja para a da notificação do mesmo (despacho) ao arguido. Daí que, quanto à apreciada questão prescricional, a sentença recorrida evidencie, a um tempo, desaplicação da norma inserta no artº 55º, nº1, alínea b) do RGIT e insuficiência da nela assentada matéria fáctica para a decisão. Neste entendimento, deverá anular-se tal sentença e determinar-se a baixa do processo à 1ª instância, com vista à reapreciação, depois de recolhidos todos os elementos necessários ao cômputo do prazo da nele ocorrida suspensão para liquidação do tributo, da questão da prescrição do procedimento contra-ordenacional.». * Dispensam-se os vistos nos termos das disposições conjugadas do art.º 419.º do Código de Processo Penal e, supletivamente, do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi alínea b) do art.º 3.º do RGIT e n.º 4 do art.º 74.º do RGCO, sendo o processo submetido à conferência para julgamento. * II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAr No artigo 75.º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGCO) estabelece-se que a decisão do recurso jurisdicional pode alterar a decisão recorrida sem qualquer vinculação aos seus termos e ao seu sentido, com a limitação da proibição da reformatio in pejus, prevista no artigo 72.º-A do mesmo diploma. Não obstante, o objeto do recurso é delimitado pelas respetivas conclusões (cfr. artigo 412.°, n.º 1, do Código de Processo Penal ex vi artigo 74.°, n.º 4 do RGCO), pelo que cumpre saber se a sentença padece de erro de julgamento quanto à (não) declaração da prescrição do procedimento contraordenacional. O Digno Procurador Geral Adjunto, conforme parecer supra transcrito, pugnou pela nulidade da sentença por défice instrutório relativamente à demonstração dos factos essenciais para a demonstração do período de suspensão do procedimento decorrente da aplicação do art. 55.º do RGIT, conforme assinalado na sentença. Todavia, o conhecimento desta questão será relegado para final e posto que não se mostre, entretanto, prejudicado pela solução encontrada quanto à prescrição. Na verdade, mostrando-se os factos relevantes quanto à demonstração da suspensão do art. 55.º do RGIT, compreendendo uma maior amplitude temporal, fixados, na sentença, de um modo mais desfavorável à pretensão da recorrente e se, ainda assim, se concluir pela prescrição do procedimento, entendemos, por uma questão de eficiência processual, por efetivação do princÍpio da prevalência das decisões de mérito sobre as de forma e na concretização da tutela jurisdicional efetiva, nesta conjugação, haver razões para considerar prejudicado o conhecimento do alegado défice instrutório. * III – FUNDAMENTAÇÃO: III.1 – MATÉRIA DE FACTO Na sentença recorrida foi fixada a matéria de facto nos seguintes termos: «Com relevo para a boa decisão da causa, julgo provados os seguintes factos: 1) Em 13 de Novembro de 2019 foi autuado pelo Serviço de Finanças ... o processo de contra-ordenação n.º ...20, imputando à ora recorrente a prática de uma conduta infractora do disposto no artigo 21, n.º 1, al. a) do CIVA, ilícito previsto e punido como contra-ordenação nos artigos 114.º, n. os 2 e 5, al. a), e 26.º, n.º 4, do RGIT (cfr. capa do PA); 2) Em 13 de Novembro de 2019, foi lavrado auto de notícia pelos Serviços de Inspecção Tributária e Aduaneira da Direcção de Finanças ..., imputando à ora recorrente a prática de uma infracção, dando-se integralmente por reproduzido o respectivo teor (cfr. fls. 2 do PA), designadamente: [imagem no original] 3) Em 25 de Novembro de 2019, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças ..., determinando a suspensão do processo de contra-ordenação para efeitos de liquidação de imposto, nos termos do disposto no artigo 55.º do RGIT (cfr. fls. 3 do PA); 4) Em 23 de Novembro de 2019 foi remetido à ora recorrente, recebido na sua sede em 28 de Novembro de 2019, ofício subordinado ao assunto “Notificação Art.º 55º RGIT”, dando-se integralmente por reproduzido o seu teor (cfr. fls. 4-5 do PA), designadamente: [imagem no original] 5) Em 22 de Março de 2022 foi proferido despacho pela Chefe do Serviço de Finanças ... determinando o prosseguimento dos autos, com notificação da arguida para os efeitos do artigo 70.º do RGIT (cfr. fls. 5 do PA); 6) Por ofício datado de 23 de Março de 2022 subordinado ao assunto “Notificação para apresentação de defesa/Pagamento antecipado - Art. 70º, nº 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias – RGIT”, recebido na sede da ora recorrente em 04 de Abril de 2022, foi a ora recorrente notificada para exercer o direito de defesa, dando-se integralmente por reproduzido o seu teor (cfr. fls. 6 do PA), designadamente: [imagem no original] 7) Em 20 de Abril de 2022 deu entrada no Serviço de Finanças ... defesa apresenta pela ora recorrente, onde pugna, a final, pelo arquivamento do processo de contra-ordenação por prescrição (cfr. fls. 7-9 do PA); 8) Em 01 de Setembro de 2022 foi proferido pela Chefe do Serviço de Finanças ... despacho de indeferimento da defesa apresentada, fundando-se na informação dos serviços da mesma data que se reproduz (cfr. fls. 10 do PA): [imagem no original] 9) Em 01 de Setembro de 2022 foi proferida pela Chefe do Serviço de Finanças ... decisão de aplicação de uma coima à recorrente no âmbito do processo de contra-ordenação n.º ...20, cujo teor se dá integralmente por reproduzido (cfr. fls. 13-15 do PA), designadamente: «(…). [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…).” 10) Foi remetido por via postal registada à ora recorrente o ofício n.º ...90 para notificação, recebido na sua sede em 14 de Setembro de 2022, subordinado ao assunto “Notificação da decisão de aplicação da coima – Pagamento ou recurso judicial”, dando-se integralmente por reproduzido o seu teor (cfr. fls. 16 do PA), designadamente: [imagem no original] 11) Em 04 de Outubro de 2022 deu entrada no Serviço de Finanças ... recurso da decisão de aplicação de coima (cfr. fls. 17-35 do PA); 12) A ora recorrente beneficiou de pagamento de coima com redução no processo de contraordenação n.º ...55, instaurado em 19/10/2017, e extinto em 01/11/2017 por pagamento em 31/10/2017 da coima no valor de Eur. 187,50 (documentos n. os 1 a 5 juntos aos autos pela Fazenda Pública em 27/01/2023). FACTOS NÃO PROVADOS Não existem factos não provados com relevância para a boa decisão da causa. MOTIVAÇÃO A formação da nossa convicção, para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados, teve por base os documentos que constituem o processo administrativo e os juntos com o recurso, conforme aí melhor assinalado.» * Ao abrigo do disposto no art.º 431.º al. a) do Código de Processo Penal [CPP] ex vi dos arts. 41.º e 74.º, n.º 4, do RGCO, aplicáveis por força do art.º 83.º e 3.º al. b) do RGIT, adita-se a seguinte factualidade por existirem nos autos elementos que a sustentam: 13. A 06.12.2022, foi proferido despacho de admissão liminar do recurso - cfr. fls. 59 da paginação eletrónica. 14. O despacho mencionado no ponto anterior foi notificado via eletrónica no dia 09.01.2023 – cfr. fls. 61 e 62 da paginação eletrónica. * III.2 – DE DIREITO: Vejamos, antes de mais, a fundamentação da sentença por forma a detetarmos se a mesma padece de erro de julgamento em conformidade com a pretensão da Recorrente, desenvolvida nos seguintes termos: «A recorrente vem impugnar a decisão que lhe aplica uma coima no valor de Eur. 4.521 (quatro mil quinhentos e vinte e um euros), acrescida de custas no valor de Eur. 76,50 (setenta e seis euros e cinquenta cêntimos), pela violação do disposto nos artigos 21.º, n.º 1, alíneas a) e d), e 29.º, n.º 1, al. c), ambos do CIVA, contra-ordenação prevista e punida pelo disposto nos artigos 114.º, n.º 2 e n.º 5, al. a), 119.º, n.º 1, e 26.º, n.º 4, do RGIT, no âmbito do processo de contra-ordenação n.º ...20. Antes de mais, debrucemo-nos sobre aquelas normas. No exercício relativamente ao qual é imputada a prática dos factos ilícitos (exercício de 2015), dispunham os artigos 21.º e 29.º do CIVA, naquilo que releva: Artigo 21.º Exclusões do direito à dedução 1 - Exclui-se, todavia, do direito à dedução o imposto contido nas seguintes despesas: a) Despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação, à utilização, à transformação e reparação de viaturas de turismo, de barcos de recreio, helicópteros, aviões, motos e motociclos. É considerado viatura de turismo qualquer veículo automóvel, com inclusão do reboque, que, pelo seu tipo de construção e equipamento, não seja destinado unicamente ao transporte de mercadorias ou a uma utilização com carácter agrícola, comercial ou industrial ou que, sendo misto ou de transporte de passageiros, não tenha mais de nove lugares, com inclusão do condutor; (…) d) Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções; (…) Artigo 29.º Obrigações em geral 1 - Para além da obrigação do pagamento do imposto, os sujeitos passivos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º devem, sem prejuízo do previsto em disposições especiais: (…) c) Enviar mensalmente uma declaração relativa às operações efectuadas no exercício da sua actividade no decurso do segundo mês precedente, com a indicação do imposto devido ou do crédito existente e dos elementos que serviram de base ao respectivo cálculo; Já os artigos 114.º, 119.º e 26.º do RGIT dispõem: Artigo 114.º Falta de entrega da prestação tributária 1 - A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido. 2 - Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre 15 % e metade do imposto em falta, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido. (…) 5 - Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da prestação tributária: a) A falta de liquidação, liquidação inferior à devida ou liquidação indevida de imposto em factura ou documento equivalente, a falta de entrega, total ou parcial, ao credor tributário do imposto devido que tenha sido liquidado ou que devesse ter sido liquidado em factura ou documento equivalente, ou a sua menção, dedução ou rectificação sem observância dos termos legais; (…) Artigo 119.º Omissões e inexactidões nas declarações ou em outros documentos fiscalmente relevantes 1 - As omissões ou inexactidões relativas à situação tributária que não constituam fraude fiscal nem contra-ordenação prevista no artigo anterior, praticadas nas declarações, bem como nos documentos comprovativos dos factos, valores ou situações delas constantes, incluindo as praticadas nos livros de contabilidade e escrituração, nos documentos de transporte ou outros que legalmente os possam substituir ou noutros documentos fiscalmente relevantes que devam ser mantidos, apresentados ou exibidos, são puníveis com coima de (euro) 375 a (euro) 22 500. (…) Artigo 26.º Montante das coimas (…) 4 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, os limites mínimo e máximo das coimas previstas nos diferentes tipos legais de contra-ordenação, são elevados para o dobro sempre que sejam aplicadas a uma pessoa colectiva, sociedade, ainda que irregularmente constituída, ou outra entidade fiscalmente equiparada. Cumpre apreciar e decidir. Tem prioridade nos autos o conhecimento da questão da prescrição do procedimento contraordenacional, por constituir um pressuposto negativo da condenação contra-ordenacional e dele dever ser tomado conhecimento mesmo oficiosamente, em qualquer estado do processo e enquanto este não tiver terminado (neste sentido, o acórdão do STA de 16-09-2020 tirado no processo n.º 01476/15.7BELRA), além de que, no caso concreto, foi expressamente invocado pela ora recorrente. Vejamos. O RGIT, sob a epígrafe de “Prescrição do procedimento”, prevê no artigo 33.º: 1 - O procedimento por contra-ordenação extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos. 2 - O prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação. 3 - O prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos na lei geral, mas a suspensão da prescrição verifica-se também por efeito da suspensão do processo, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 42.º, no artigo 47.º e no artigo 74.º, e ainda no caso de pedido de pagamento da coima antes de instaurado o processo de contra-ordenação desde a apresentação do pedido até à notificação para o pagamento. A decisão de fixação das coimas alude aos tipos de ilícito previstos nos artigos 114.º e 199.º do RGIT, pelo que aplicar-se-á, no caso, a regra do n.º 2 do artigo 33.º do RGIT, que nos remete para o prazo de caducidade da liquidação dos tributos (neste sentido, os acórdãos do STA de 12/12/2018 no processo n.º 367/14.3BELRA e de 02/02/2022 tirado no processo n.º 03/16.3BESNT, ambos disponíveis em www.dgsi.pt). O prazo de caducidade do direito à liquidação remete-nos para o disposto no artigo 45.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), que dispõe: 1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro. 2 - No caso de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo o prazo de caducidade referido no número anterior é de três anos. 3 - Em caso de ter sido efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito. 4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. (…) Tratando-se de infracções atinentes ao exercício de 2015, aplicar-se-á, conjugando o disposto nos n. os 1 e 4 do artigo 45.º da LGT, o prazo de caducidade de 4 anos, contabilizado desde o início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a infracção, ou seja, 01/01/2016. Por outro lado, dispõe o artigo 28.º, n.º 3, do RGCO que, independentemente das causas de interrupção da prescrição, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão (que não pode ser superior a seis meses – artigo 27.º-A, n.º 2, do RGCO), tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade. No caso teríamos de contabilizar seis anos (4+2), fixando-se a prescrição em 01/01/2022. Sucede, porém, que ocorreram várias causas de suspensão, causas, essas, que relevam para efeitos de acréscimo ao prazo máximo de prescrição previsto no artigo 28.º, n.º 2, do RGCO. A primeira delas é a prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO: a prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se durante o tempo em que o procedimento não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal. Ora, o procedimento em apreço esteve suspenso por força do disposto no artigo 55.º do RGIT, ou seja, mostrou-se suspenso para liquidação do tributo e até que se verificasse uma das hipóteses previstas no n.º 1 daquele artigo. A decisão de suspensão foi notificada à arguida em 28/11/2019, e a decisão de prosseguimento dos autos em 04/04/2022. Mediaram entre as duas datas 858 dias, relegando o termo do prazo de prescrição para 08/05/2024.» Contabilizando o prazo de prescrição com as suas interrupções e suspensões regulares também não se verifica a prescrição do procedimento. Com efeito, o termo inicial do prazo de prescrição de 4 anos fixa-se em 01/01/2016. Em 28 de Novembro de 2019 a ora recorrente é notificada da suspensão do processo de contra-ordenação nos termos do artigo 55.º do RGIT, o que consubstancia causa de interrupção da prescrição nos termos do disposto no artigo 28.º, n.º 1, al. a), do RGIT. Uma vez que a interrupção do prazo de prescrição determina a inutilização do prazo decorrido e a contagem de novo prazo, a prescrição de 4 anos verificar-se-ia apenas em 28/11/2023, data posterior à presente. Acresce que existem, ainda, outras causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição, pelo que é manifesto que o processo de contra-ordenação não se encontra prescrito, soçobrando a causa de pedir.» Vejamos, pois, se a sentença realizou um incorreto juízo subsuntivo dos factos ao direito. Comanda o artigo 33.º do RGIT: «1 - O procedimento por contra-ordenação extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos. 2 - O prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação. Nos termos do art. 33.º, n.º 1 do RGIT, em regra, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional é de cinco anos, podendo ser encurtado para o prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração dependa daquela liquidação [n.º 2 do mencionado art. 33.º]. Conforme doutrinam Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, in «Regime Geral das Infracções Tributárias Anotado», 4.ª edição, 2010, Áreas Editora, pág. 323, «a infracção depende da liquidação da prestação tributária sempre que a determinação do tipo de infracção ou da sanção aplicável depende do valor daquela prestação, pois é a liquidação o meio de determinar o seu valor». Esclarecem, ainda, estes autores, in ibidem, os «(…) casos em que a existência da contra-ordenação depende da liquidação da prestação tributária são os previstos nos arts. 108º, nº 1, 109º, nº 1, 114º, 118º e 119º, nº 1 do RGIT». [destacado da nossa autoria]. Sobre esta questão importa, ainda, chamar à colação o entendimento, também, pacificado na jurisprudência, vertido, entre outros, no acórdão do STA, de 30.04.2019, proc. n.º 679/11.8BEALM, disponível para consulta em www.dgsi.pt, do qual se extrata o seguinte: «As contra-ordenações p.p. nos artigos 114.º, 118.º e 119.º do RGIT dependem da prévia determinação do valor da prestação tributária devida para a determinação da coima aplicável, pois que os limites mínimo e máximo se determinam tendo por referência o valor do imposto em falta, no caso da p.p. no artigo 114.º, ou tais limites dependem de haver ou não imposto a liquidar, nos casos das previstas nos artigos 118.º e 119.º do RGIT, sendo-lhes aplicável o prazo de prescrição do procedimento correspondente ao prazo de caducidade do direito à liquidação.» [destacado da nossa autoria]. Ora, no presente caso, as contraordenações imputadas à arguida são puníveis pelo art. 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea a) e 119.º, n.º 1, ambos do RGIT, pelo que, conforme decorre da jurisprudência e doutrina enunciadas, o prazo de prescrição é de 4 anos, nos termos do disposto no art. 33.º, n.º 2 do RGIT e art. 45.º, n.ºs 1 e 4, da LGT, como de forma irrepreensível se espelhou na sentença. Vejamos, agora, as causas de suspensão e de interrupção do prazo de prescrição. Ora, nos termos do artigo 33.º, n.º 3 do RGIT, acima transcrito, o prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos na lei geral, para além dos casos previstos nos artigos 42.º, n.º 2, 47.º e 74.º, do referido diploma legal, e, ainda, no caso de pedido de pagamento da coima antes de instaurado o processo de contraordenação, desde a apresentação do pedido até à notificação para pagamento. A remissão feita no citado n.º 3 do artigo 33.º do RGIT é, pois, para a aplicação das normas sobre suspensão e interrupção da prescrição do processo contraordenacional previstas no RGCO. O artigo 27.º-A do RGCO – sob a epígrafe – Suspensão da Prescrição - estabelece, no seu n.º 1, que a «prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento: a) não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal; b) Estiver pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa; c) Estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso.» Por seu lado, estabelece o n.º 2, do referido normativo que, «[n]os casos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior «a suspensão não pode ultrapassar seis meses» – destacado nosso. Daí que suspensão da prescrição nos procedimentos pendentes não pode, pois, ultrapassar seis meses. Como referem Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos, in ob. cit., p. 327, a «existência desta norma especial [artigo 27º-A do RGCO] sobre o regime da suspensão da prescrição do procedimento contra-ordenacional, que reproduz uma das situações de suspensão previstas no art. 120º, nº 1 do C. Penal, leva a concluir que não são aplicáveis neste procedimento as restantes causas admitidas no processo penal que poderiam ser aplicadas em processo contra-ordenacional (…).» Por seu lado, estabelece o artigo 28.º do RGCO, sob a epígrafe Interrupção da prescrição, o seguinte: «1 – A prescrição do procedimento por contra-ordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com quaisquer declarações que o arguido tenha proferido no exercício do direito de audição. d) Com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima.» A este propósito, transcreve-se, uma vez mais, os autores e obra citada, pág. 328, na parte em que referem que «estando expressamente previstas as causas interruptivas da prescrição do procedimento contra-ordenacional, está afastada a possibilidade de fazer apelo às causas previstas no art. 121º do C. Penal». A inaplicabilidade do Código Penal, em matéria de suspensão e interrupção da prescrição, limita-se, portanto, às causas, e não aos efeitos e limites dos prazos, matérias que, não vindo reguladas no RGCO e no RGIT, terão de ser resolvidas com recurso àquele Código. É, assim, de aplicar o artigo 120.º do Código Penal, cujo n.º 6 enuncia que a prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a suspensão e, bem assim, o n.º 2 do artigo 121.º do mesmo Código, que estipula que a interrupção inutiliza o prazo até então decorrido, começando a correr novo prazo, depois de cada interrupção. Contudo, importa ter presente o que se encontra disposto no artigo 28.º, n.º 3 do RGCO, aplicável às contraordenações fiscais, por força do disposto no art.º 3.º, alínea b) do RGIT [neste sentido, vide, entre outros, acórdãos do STA, de 05.02.2020, processo n.º 273/12.6BEALM, de 20.05.2020, processo n.º 1901/15.BELRA; de 16.09.2020, processo n.º 1476/15.7BELRA e de 7.04.2021, processo n.º 635/15.7BEVIS]. Nos termos do disposto no art.º 28.º, n.º 3 do RGCO, «A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de prescrição, acrescido de metade». Assim, e para os efeitos do citado artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, a prescrição do procedimento teria lugar quando desde a data em que se verificou o facto tributário, tivesse decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade [4 + 2]. Donde, prescrição dos procedimentos por contraordenação, em causa nos autos, terá sempre lugar quando, desde o seu início, tiver decorrido o prazo máximo de prescrição, no caso, 6 anos, ressalvado o tempo máximo de suspensão, de seis meses [n.º 2 do art.º 27.º-A, do RGCO]. Aplicando os aludidos conceitos ao caso dos autos, o dies a quo se inicia a contagem é 01.01.2016 [todas as infrações dizem respeito ao período de tributação do ano de 2015], em conformidade com o consignado no artigo 45.º, n.º 4 da LGT, como bem ponderou e decidiu o tribunal a quo. Evidenciam os autos que ocorreram várias causas de interrupção, destacando-se a notificação da Recorrente para o exercício do direito de defesa [alínea a) do artigo 28º do RGCO] e a prolação e notificação das decisões da autoridade administrativa [alínea d) da mesma disposição legal]. Havendo várias causas de interrupção, há que atender à última ocorrida, o que tem como efeito, como se viu, a desconsideração do período de tempo já decorrido [cfr. artigo 121.º, n.º 2 do Código Penal]. Por outro lado, o limite máximo da prescrição, ou seja, seis anos [4+2 anos - cfr. art.º 28.º, n.º 3 RGCO], ocorreria, em princípio, a 31.12.2021 Em tese seria assim, mas como, na realidade, os autos evidenciam eventos interruptivos e suspensivos, como se passará a expor, a contagem do prazo será por eles influenciada. Os autos, revelam, desde logo, duas causas suspensivas decorrentes do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do art. 27.º-A do RGCO, conforme irradia a matéria de facto plasmada nos seus pontos 3 e 4 [despacho e respetiva notificação de suspensão nos termos do art. 55.º do RGIT] e 13 e 14 [despacho judicial de admissão do recurso e respetiva notificação]. Quanto à primeira causa suspensiva identificada, acompanhando a sentença, dizemos «[a] primeira delas é a prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO: a prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se durante o tempo em que o procedimento não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal. Ora, o procedimento em apreço esteve suspenso por força do disposto no artigo 55.º do RGIT, ou seja, mostrou-se suspenso para liquidação do tributo e até que se verificasse uma das hipóteses previstas no n.º 1 daquele artigo. A decisão de suspensão foi notificada à arguida em 28/11/2019, e a decisão de prosseguimento dos autos em 04/04/2022.» Relativamente à segunda causa, prevista na alínea c), do n.º 1, do mencionado art. 27.º-A [a pendência do procedimento após a notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima] tem a duração máxima de 6 meses, como preconizado no n.º 2 do mesmo preceito legal. Sendo certo que, a partir da cessação das causas suspensivas, o prazo de prescrição volta a correr, ou seja, recomeça a sua contagem [art. 120.º, n.º 3 do Código Penal]. Diferentemente, depois de cada interrupção, começa a correr novo prazo [art. 121.º, n.º 2, do Código Penal]. Neste último caso, ao contrário da suspensão, a interrupção inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente começando a correr novo prazo a partir da interrupção, o que se encontra, aliás, harmonizado com o regime civilista desenhado nos arts. 318.º a 327.º, maxime art. 326.º, n.º 1, do Código Civil. No entanto, como bem se compreende, a renovação do prazo de prescrição depois de cada interrupção conduziria a que pudesse, indesejavelmente, eternizar-se a possibilidade de prosseguir o processo contra o arguido. Em ordem a evitar uma tal situação, estabeleceu-se no RGCO (como, de resto, já sucedia no Código Penal) um limite à admissão de um número infinito de interrupções e à ideia de que cada interrupção da prescrição implica um novo decurso da totalidade do prazo, através da norma do n.º 3 no artigo 28.º, supra citada, na qual, expressamente, se consagra que “a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade” [4+2]. Tendo como premissa esta diferenciação, estamos em condições que nos permitem avançar que o tribunal a quo incorreu em erro quando na sentença assevera que «[c]ontabilizando o prazo de prescrição com as suas interrupções e suspensões regulares também não se verifica a prescrição do procedimento. Com efeito, o termo inicial do prazo de prescrição de 4 anos fixa-se em 01/01/2016. Em 28 de Novembro de 2019 a ora recorrente é notificada da suspensão do processo de contra-ordenação nos termos do artigo 55.º do RGIT, o que consubstancia causa de interrupção da prescrição nos termos do disposto no artigo 28.º, n.º 1, al. a), do RGIT. Uma vez que a interrupção do prazo de prescrição determina a inutilização do prazo decorrido e a contagem de novo prazo, a prescrição de 4 anos verificar-se-ia apenas em 28/11/2023, data posterior à presente. Acresce que existem, ainda, outras causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição, pelo que é manifesto que o processo de contra-ordenação não se encontra prescrito, soçobrando a causa de pedir.» [sublinhado da nossa autoria]. Na verdade, este extrato espelha um evidente lapso em que incorreu o tribunal que, partindo da ocorrência de um facto suspensivo, decorrente da notificação da suspensão do procedimento contraordenacional nos termos do art. 55.º do RGIT, eliminou todo o tempo anteriormente decorrido e iniciou a contagem de um novo prazo, como se estivesse em presença de um facto interruptivo e sem aplicar o disposto no art. 28.º, n.º 3 do RGCO. Sendo assim, importa, então, sanar o vício encontrado, procedendo à contagem do prazo prescricional atendendo a todas as causas suspensivas e interruptivas relevantes e aos respetivos efeitos. Exteriorizam os autos o seguinte: · O prazo de prescrição iniciou-se a 01.01.2016. · Tendo ocorrido várias causas interruptivas, o limite máximo da prescrição, ou seja, seis anos [4+2 anos - cfr. art.º 28.º, n.º 3 RGCO], ocorreria, em princípio, a 31.12.2021, pois, é necessário acautelar o período de suspensão. · A contagem do prazo esteve suspensa entre 28.11.2019 e 22.03.2022, nos termos do art. 55.º do RGIT. · A contagem esteve suspensa pelo prazo máximo de 6 meses, nos termos do disposto no art. 27.º-A, n.º 1, alínea c) e n.º 2. Destarte, até 28.11.2019, data em que o prazo foi suspenso ocorreram 3 anos, 10 meses e 27 dias, faltando 2 anos, 1 mês e 3 dias para se completar o prazo máximo de 6 anos, sem contabilizar o prazo de 6 meses de suspensão, igualmente, assinalada. Pelo que, retomando a contagem a 23.03.2022 (dia seguinte ao fim da suspensão ocorrida nos termos do art. 55.º do RGIT), a prescrição verificar-se-ia, em teoria, a 26.04.2024. Como no cálculo há que que se considerar os mencionados 6 meses de suspensão, tudo somado, o término do prazo de prescrição ocorreu no dia 26.10.2024. Deixamos uma última nota para dizer que, no caso objeto, não é aplicável a suspensão que decorreu das leis especiais emanadas no âmbito da pandemia COVID19, que fez suspender todos prazos de prescrição, no âmbito do confinamento ocorrido nos anos de 2020 e 2021, conforme passamos de forma perfunctória, mas que se pretende suficiente e eficaz, a dilucidar. Todos os prazos de caducidade e de prescrição estiveram suspensos entre o dia 09 de março de 2020 e o dia 02 de junho de 2020, num total de 86 dias, conforme as disposições conjugadas do artigo 7.º, n.º 3 da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e do artigo 6.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, que determinou o seguinte: «Sem prejuízo do disposto no artigo 5.º, os prazos de prescrição e caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão.». E, por força do artigo 6.º-B, n.º 3, da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, ocorreu nova suspensão relativa no período temporal de 22 de janeiro de 2021 a 05 de abril de 2021, num total de 74 dias. Ora, nos períodos temporais contemplados nas referidas leis [ocorridos nos anos de 2020/2021], o procedimento já se encontrava suspenso [entre 28.11.2019 e 22.03.2022], pelo que não há que os que considerar no caso concreto, embora, ainda que assim não fosse, o procedimento já se encontraria igualmente prescrito. Em suma, embora não estivesse prescrito à data da prolação da sentença, conforme a fundamentação supra espelhada, o procedimento contraordenacional prescreveu, entretanto, a 26.04.2024. Face ao exposto, mostra-se prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas na presente instância recursiva. * Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso e, nessa conformidade, julgar extinto, por prescrição, o procedimento contraordenacional, determinando-se a sua extinção e bem como a revogação da sentença. * Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, formula-se o seguinte SUMÁRIO: I – O prazo de prescrição do procedimento por contraordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração depender daquela liquidação – cfr. artigo 33.º, n.º 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias. II – A infração depende da liquidação da prestação tributária sempre que a determinação do tipo de infração ou da sanção aplicável depender do valor daquela prestação, pois é a liquidação o meio de determinar este valor. III - Para os efeitos do artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, a prescrição do procedimento tem lugar quando desde a data em que se verificou o facto tributário, tiver decorrido o prazo de quatro anos acrescido de metade. IV - A prescrição dos procedimentos por contraordenação, em causa nos autos, tem sempre lugar quando, desde o seu início, tiver decorrido o prazo de seis anos, ressalvado o tempo máximo de suspensão, de seis meses [n.º 2 do art.º 27.º-A, do RGCO]. * IV – DECISÃO: Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso e, nessa conformidade: · Julgar extinto, por prescrição, o procedimento contraordenacional, determinando-se a sua extinção e bem como a revogação da sentença. Sem custas. Notifique. Porto, 10 de abril de 2025 Vítor Salazar Unas Ana Paula Santos Cláudia Almeida |