Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00773/18.4BEPRT |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 03/27/2025 |
| Tribunal: | TAF do Porto |
| Relator: | ANA PATROCÍNIO |
| Descritores: | DESPACHO DE REVERSÃO; PRESSUPOSTO DA REVERSÃO; INEXISTÊNCIA OU FUNDADA INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO DA DEVEDORA ORIGINÁRIA; |
| Sumário: | O pressuposto da inexistência ou da fundada insuficiência de bens deve verificar-se contemporaneamente à prolação do despacho de reversão, não bastando ocorrer em momento anterior ou posterior.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório «AA», contribuinte fiscal n.º ...37, com domicílio fiscal na Avenida ..., ..., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 29/08/2022, que julgou improcedente a oposição que intentou, na qualidade de revertido, contra o processo de execução fiscal n.º .......................843 e apensos, originariamente instaurado contra a sociedade comercial “[SCom01...], Lda.”, para cobrança de dívida de IVA e IRC, dos anos de 2003 e 2004, e IRS dos anos de 2003 a 2005, no montante global de €16.983,02. O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: «1. O recorrente não se conforma com a sentença proferida pelo Tribunal a quo no que diz respeito à decisão constante da douta sentença de que se recorre. 2. O Tribunal a quo deveria ter dado como provado a existência no património da devedora originária de ativos sob a forma de créditos sobre clientes no montante de € 132.592,88. 3. Que o Serviço de Finanças ..., teve perfeito conhecimento desses mesmos créditos de clientes, conforme ficou demonstrado pelo Balancete de Dezembro de 2010, junto e das declarações da testemunha «BB»: 4. Este conhecimento, dos créditos de clientes da Devedora Originária [SCom01...], por parte da AT, ocorreu desde o exercício do direito de audição prévia, seguindo-se com a propositura da Petição Inicial de Oposição, e por último em sede de audiência de Julgamento prestada pelo depoente «BB». 5. Também ficou provado, por documentos e por prova testemunhal, que o desmoronar da Devedora Originária se deveu à realização do contrato de MASTERFRANCHISING, entre a [SCom01...] e a [SCom02...], secundado pela [SCom03...], após a insolvência da [SCom02...]. 6. Que até à realização do contrato de MASTERFRANCHISING, a Devedora Originária sempre cumpriu com todas as suas obrigações, incluindo as tributárias. 7. Só após a realização deste contrato é que, motivado pelas empresas [SCom02...] e [SCom03...], é que a Devedora Originária entrou em incumprimento: 8. Porém, apesar disso, o Balancete da Devedora Originária, reportado a dezembro de 2010, refletia um saldo na conta de clientes de € 132.592,88, o suficiente para o pagamento das dividas tributárias constantes deste processo. 9. O Tribunal a quo ao decidir lançar mão do Princípio da Livre Apreciação da Prova, porém ao fazê-lo desvalorizou a prova apresentada pelo aqui Recorrente, apenas porque a mesma não está protegida pela presunção da culpa, a mesma não possui as mesmas armas! 10. O Recorrente apresentou várias provas que esclarecem a verdade dos factos, ou seja de que os créditos sobre clientes de que a Devedora Originária era detentora existiam no património desta, logo haviam bens. 11. Verifica-se um erro manifesto e grosseiro na apreciação da prova apresentada ao desvalorizar a prova apresentada pelo Recorrente em favorecimento da prova apresentada pelas Finanças Portuguesas. 12. O Tribunal ao considerar a presunção da culpa, como um todo, desvalorizou a contraprova produzida pelo Recorrente. 13. Cabia ao Recorrente ilidir a prova produzida por aquele, o que fez. 14. A prova apresentada pelo Recorrente deverá ser valorada! 15. Deve ser revogada a sentença ora recorrida, devendo ser proferido Acórdão que declare extinto quanto ao Recorrente o Processo de Execução Fiscal n.º ...43 e apensos. Termos em que revogando-se a douta sentença sub juditio e proferindo-se acórdão que acolha as conclusões precedentes será feita inteira e sã justiça!!!». **** Não houve contra-alegações. **** O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso. **** Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento. **** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que a AT cumpriu o seu ónus da prova ao verter no despacho de reversão que estão reunidos os pressupostos para operar a reversão, designadamente, a inexistência de património da devedora originária e a culpa do revertido. III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos: 1. Em 14 de dezembro de 2004, foi instruído o Processo de execução fiscal n.º .......................843 e apensos, em nome da sociedade comercial “[SCom01...], Lda.”, por dívidas de IVA e IRC, dos anos de 2003 e 2004, e IRS, dos anos de 2003 a 2005, no montante global de € 16.983,02 – cfr. documento n.º 1 junto com a petição, e páginas 1 e 5 do documento de fls. 61 e seguintes do SITAF; 2. Em 03 de março de 2006, foi elaborado auto de diligências, em sede do Processo de execução fiscal n.º .......................843 e apensos, pelo Serviço de Finanças ..., do qual consta o seguinte: “(…) a fim de darmos execução penhora ordenada, verificamos não poder efectuar, em virtude de a firma não exercer actividade, não são conhecidos bens penhoráveis na área deste Serviço. Mais informo que a firma tem instalações na Rua ..., ..., ....” – cfr. páginas 12 do documento de fls. 61 e seguintes do SITAF; 3. Em 20 de outubro de 2006, foi elaborada “certidão de diligência”, pela Direção Geral de Imposto, da qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) Executado: [SCom01...], Lda. (…) Certifico que não pude cumprir o determinado no mandado anexo, em virtude de se ter verificado que a executada acima identifica não está a exercer a actividade na Rua ..., ..., .... Com efeito, as instalações estão encerradas, não havendo quaisquer bens no seu interior, o que é perfeitamente visível, uma vez que a frente é toda em vidro (…)” - cfr. páginas 43 do documento de fls. 61 e seguintes do SITAF; 4. Em 10 de outubro de 2006, foi emitido mandado de penhora, pelo Chefe de Finanças ..., em que consta como executado a sociedade comercial “[SCom01...], Lda.”, e a identificação do Processo n.º .....................690 – cfr. páginas 53 do documento de fls. 61 e seguintes do SITAF; 5. Pelo menos entre 18 de setembro de 1990 e 07 de julho de 2009, o Oponente figurou no registo comercial como gerente da sociedade “[SCom01...], Lda.”, juntamente com «CC» – cfr. páginas 15 e 16 do documento de fls. 133 e seguintes do SITAF, concretamente a data da ap. ...1/........18 e a data da informação não certificada; 6. Em 10 de julho de 2009, no âmbito do Processo n.º .......................743, foi proferido despacho para efeitos de reversão da execução, contra o aqui Oponente, do qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) IDENTIFICAÇÃO DA DÍVIDA EM COBRANÇA COERCIVA N.º PROCESSO: .......................743 TOTAL DA QUANTIA EXEQUENDA 16.983,02 EUR 1)TOTAL DE ACRESCIDOS: 0,00 EUR TOTAL: 16.983,02 EUR (…)”– cfr. páginas 28 do documento de fls. 133 e seguintes do SITAF; 7. Em data não determinada, o Oponente exerceu o seu direito de audição prévia – páginas 33 a 47 do documento de fls. 133 e seguintes do SITAF; 8. Em 31 de agosto de 2009, foi o mandatário do Oponente, no seguimento do direito de audição prévia exercido pelo Oponente, notificado, através de carta registada com aviso de receção, com o registo CTT n.º RM 6088 7057 6 PT do seguinte: “(…) Assunto: Pedido de elementos (…) No seguimento do direito de audição exercido pelos contribuintes supra referenciados, nomeadamente no seu ponto n.º 44, solicito a V.Ex.ª que no prazo de 15 dias, apresente relação dos débitos dos clientes, com os respectivos números de identificação fiscal e que perfazem o montante de € 130.000,00” – cfr. páginas 21 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 9. Em data não determinada, o Oponente apresentou requerimento ao processo com vista a “juntar uma relação com os nomes dos clientes, números de identificação fiscal e montantes constantes das respectivas contas correntes” e cujo teor se dá aqui por reproduzido para os devidos efeitos legais – cfr. páginas 23 a 26 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 10. Em 25 de setembro de 2009, foi o mandatário do Oponente, no seguimento da resposta prestadas nos termos do ponto antecedente, notificado, através de carta registada com aviso de receção, com o registo CTT n.º RM 41...........0 0 PT do seguinte: “(…) Assunto: PEDIDO DE ELEMENTOS (…) Em face da lista de eventuais devedores que V. Ex.ª fez chegar a este Serviço de Finanças, solicito, que no prazo de 15 dias, entregue neste Serviço de Finanças: - O número de contribuinte dos trinta e dois (32) clientes, que VªEx.ª omitiram; O número de contribuinte dos doze (12) clientes, que Vª Exª referenciaram como 80x.xxx.xxx, números de contribuintes estes que já não são usados desde o ano 2000. - Cópia das respectivas facturas” – cfr. páginas 27 e 28 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 11. Em resposta à missiva referida no ponto antecedente, e por requerimento datado de 12 de outubro de 2009, o Oponente informou o Processo n.º .......................843, do seguinte: “(…) Nesta conformidade, venho pelo presente remeter-lhe, como solicitado, o número de contribuinte dos clientes devedores, bem como as respectivas importâncias em dívida. No que concerne à vossa terceira solicitação, cópia das respectivas facturas, sou de referir, que apesar dos nossos esforços, não nos é possível responder afirmativamente, nesta altura, a essa solicitação, encontrando-nos a olvidar todos os esforços no sentido de rapidamente as fazer chegar a V.Exa.” – cfr. páginas 30 a 32 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 12. Em 30 de novembro de 2009, foi o mandatário do Oponente, no seguimento da resposta prestadas nos termos do ponto antecedente, notificado, através de carta registada com aviso de receção, com o registo CTT n.º RM 52.......5 2 PT do seguinte: “(…) Assunto: PEDIDO DE ELEMENTOS (…) Em virtude do ofício remetido a este Serviço, em resposta ao nosso ofício nº 17.... de 18 de Setembro pp., ter os número de contribuintes dos eventuais clientes elegíveis, solicito a V.Ex.ª que remeta uma nova relação. Aproveito para solicitar os números dos contribuintes actuais, de todos aqueles indicados e que se iniciam por 800, pois os mesmos já não são usados desde 2000. Solicita-se mais uma vez cópia das facturas. Mais solicito que informe, se contra os eventuais devedores indicados, foi interposta alguma acção judicial, para serem ressarcidos daquelas importâncias, fazendo prova em caso afirmativo” – cfr. páginas 39 a 40 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 13. Em 11 de abril de 2011, no âmbito do Processo de execução fiscal n.ºs ......................843 – Aps, foi elaborada pelo Serviço de Finanças ..., Direção de Finanças ..., informação, com o seguinte teor: “(…) 1º Em face das diligências efectuadas e que fazem parte da tramitação do processo executivo. efectuou-se a notificação para audição dos responsáveis subsidiários da executada, a saber: - «DD» (fls. 94) e - «EE» (fls. 125) 2º As dívidas pelas quais foram responsabilizados nos presentes autos, dizem respeito a IRS/C Retidos na Fonte e Não Entregues, bem como Pagamentos em Falta do IVA, referentes aos anos de 2003/4/5. 3º A firma foi citada dos montantes em divida nos presentes autos, em 24 de Abril de 2007, na pessoa do seu sócio gerente «EE» (Aviso Recepção-fis. 59). 4º No entanto, não foi possível efectuar a penhora de qualquer bem, em virtude de os mesmos serem desconhecidos, informações a fls. 12 e 67. 5º O contribuinte alega a prescrição das dividas, no entanto, as mesmas dizem respeito aos anos já mencionados no ponto 2º. 6º Alega também, que os montantes exigidos em sede de IVA nos processos executivos, diferem dos valores existentes na contabilidade. No entanto os montantes em falta, dizem respeito a pagamento em falta, ou seja, declarações submetidas pelo contribuinte sem o respetivo pagamento. 7º Alega também, sobre a existência de uma quantidade de créditos existentes, que não foram penhorados. 8º Em face de alegado, foi notificada a firma na pessoa do seu mandatário, para anexar a relação dos débitos dos clientes (of. 15877 de 25 de Maio de 2009 a fls. 154) 9º Tendo sido entregue a relação que se encontra a fls 158/9. 10º No entanto verificou-se que: - Trinta e dois clientes, não tinham a indicação dos respectivos números de contribuinte; - Doze deles ainda vinham com a indicação de 80x xxx xxx, números estes que já não são usados desde o ano de 2000. 11º Os restantes, foram registados no SIPA (Sistema Informático de Penhoras Automáticas), mas sem sucesso, pois ou não foram reconhecidos ou as firmas já não existem. 12º Foi também através do ofício 17.... de 18/09/2009 a fls., 160, solicitado cópia das facturas, mas as mesmas nunca foram entregues. 13º Em 20 de Novembro de 2009, através do ofício 22.... (fls. 170), foi novamente solicitado cópia das facturas, no entanto não foi obtida qualquer resposta. Neste ofício foi também solicitado informação sobre a existência de eventuais acções judiciais interpostas contra os clientes devedores afim da firma ser ressarcida dos créditos, mas não foi obtida qualquer resposta. DESPACHO Estando concretizada a audição dos responsáveis subsidiários e em face da informação supra prestada, determino que só prossiga com a reversão da presente execução fiscal contra os contribuintes infra na qualidade de responsável subsidiário: -«DD» e - «EE» Com a seguinte fundamentação: - Face à análise da prescrição da dívida nos presentes autos, verifica se que as dívidas em questão não estão prescritas, por não ter decorrido o prazo geral de prescrição (nº 1 do art. 48 LGT); -Inexistência de bens penhoráveis do devedor originário (art.º 153.º, n.º 2, do CPPT); - Os contribuintes em questão exerceram funções de gerência nos períodos em causa (artº 24º n.º 1, al. b), da LGT); Atenta a fundamentação supra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do executado por reversão, acima mencionado, nos termos do art.º 160º , do CPPT, para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia exequenda que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (n.º 5, do art. 23° da LGT)” – cfr. páginas 41 e 43 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 14. Em 06 de maio de 2011, foi pelo Oponente rececionado ofício de “Citação” por reversão, remetido através de carta registada com aviso de receção, com o registo CTT n.º RM 72........8 9 PT do qual se retira o seguinte: “(…) FUNDAMENTOS DA REVERSÃO Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão (art.º 23º/n.º 2 da LGT) Dos administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entidades fiscalmente equipadas, por não terem provado não lhe ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24º/nº 1/b) LGT]” – cfr. páginas 46 e 47 do documento de fls. 188 e seguintes do SITAF; 15. Do documento intitulado de “Balancete Geral (Acumulado até Dezembro) – 2010”, extrai-se, o seguinte: “(…) Conta Descrição Mov. Débito Mov. Crédito Saldo Débito Saldo Crédito (…) 21 Clientes 132.592,88 2.169,26 130.423,62 0,00 (…) 218 Clientes de cobrança duvidosa 87.891,74 0,00 87.891,74 0,00 (…) 22 Fornecedores 5,90 97.740,29 0,00 97.734,39 (…) 24 Estado e Outros Entes Públicos 8.513,79 138.326,64 0,00 129.812,85 (…)” – cfr. documento de fls. 214 e seguintes do SITAF, Processo n.º 1817/17.2BEPRT; 16. A devedora originária celebrou com a empresa [SCom02...], S.A., um contrato designado de Masterfranchising, que consistia na atribuição àquela do direito de distribuir, em exclusivo, para Portugal, a marca de roupa, [SCom02...] – prova testemunhal; 17. Com base no referido contrato de Masterfranchising a devedora originária angariou clientes em Portugal em regime de franchising – prova testemunhal; 18. A partir de 2002, a empresa [SCom02...], S.A., atrasou-se no envio da mercadoria, concretamente, não entregava as coleções a tempo e horas para as lojas e entregava desfasado – cfr. documento n.º 3 junto com a petição e prova testemunhal; 19. Por fax de 09 de junho de 2004, remetido para a devedora originária, foi comunicado pelo Diretor Comercial da empresa [SCom03...] S.L., que a empresa [SCom02...] encerrou a sua atividade em 2003, tendo aquela empresa lhe sucedido na distribuição da marca [SCom02...] – cfr. documento n.º 3 junto com a petição e prova testemunhal. * FACTOS NÃO PROVADOS: Não resultaram provados quaisquer outros factos relevantes para a boa decisão da causa. * MOTIVAÇÃO: A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica dos documentos que integram o processo administrativo, bem como outra de conhecimento oficioso do Tribunal, incluído a prova carreada para o Processo n.º 1817/17.2BEPRT, em sede de audiência de julgamento, dispensando a respetiva alegação, nos termos do disposto no artigo 412.º do Código de Processo Civil, e ainda por recurso à prova testemunhal produzida, em sede do referido processo. Foi inquirida a testemunha «BB», contabilista da devedora originária. O depoimento da testemunha foi isento e credível, e permitiu formar a convicção deste tribunal quanto aos factos 11 a 14 do probatório, ainda que, conciliado com o documento n.º 3 junto com a petição. No mais, a testemunha corroborou a informação constante do balancete, nomeadamente no que respeita aos saldos dos clientes e dívidas ao Estado. A testemunha referiu, ainda, que o Oponente assumiu dívidas da empresa a fornecedor da sua conta particular, mas não conseguiu concretizar que dívidas seriam essas, demonstrando, assim, um eventual conhecimento indireto de tais factos. Concluiu que o Oponente era uma pessoa preocupada e que queria o bem da devedora originária, sendo um gerente cauteloso, sem se preocupar com o relato de alguma situação concreta que permitisse a este Tribunal concluir, de igual forma. Mais, declarou não ter conhecimento de que o Oponente tenha utilizado alguma coisa da empresa em proveito próprio.” 2. O Direito O Recorrente não se conforma com a sentença recorrida, além do mais, na parte em que decidiu verificarem-se os pressupostos substanciais para que possa operar a reversão. Desde logo, quanto ao pressuposto referente à inexistência/insuficiência patrimonial da devedora originária, terá alertado, desde o exercício do direito de audição prévia à reversão, para a existência de créditos de clientes da devedora originária, sem que a AT tenha demonstrado cabalmente a inexistência/insuficiência de bens, não cumprindo com o seu ónus. É, portanto, notório que o Recorrente dirigiu o seu inconformismo à falta de prova da inexistência/insuficiência patrimonial da devedora originária. No que concerne à fundada insuficiência de bens, pressuposto de reversão, preceitua o artigo 23.º da Lei Geral Tributária (LGT): “1. A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal. 2. A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão. 3- Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei (…)”. Por sua vez, o artigo 153.º, n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) estabelece que “o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores; b) fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido”. Atento o carácter subsidiário da responsabilidade tributária (cfr. artigo 22.º, n.º 3 da LGT), o órgão de execução fiscal está obrigado a exigir a prestação tributária em primeiro lugar ao devedor originário ou aos eventuais responsáveis solidários, satisfazendo o crédito somente à custa dos seus bens, e só no caso de se provar a inexistência ou insuficiência fundada de bens daqueles é que pode exigi-la aos devedores subsidiários. É, portanto, pressuposto da reversão, accionando validamente os gerentes ou administradores por dívidas fiscais da empresa que representam, que esta não tenha bens suficientes para através deles se obter o pagamento dos débitos (benefício da excussão). Como é pacífico na jurisprudência, a inexistência/insuficiência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se, portanto, ao momento em que a reversão ocorre e não ao momento em que o administrador ou gerente/responsável subsidiário exerceu esse cargo societário – cfr. Acórdão do STA, de 16/03/2016, tirado no processo n.º 0647/15. Atenta a factualidade apurada [cfr. ponto 14. do probatório], na data da reversão, em 06/05/2011, entendeu-se serem inexistentes ou insuficientes os bens da devedora originária para dar pagamento à quantia exequenda, não se mostrando, portanto, necessário que a devedora originária não possua bens, mas tão-só que os mesmos sejam insuficientes para pagamento da quantia exequenda (Vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 19/01/2006, 2ª Secção – Contencioso Tributário, “Em face do preceituado no art. 23º nºs 1 e 2 da LGT não é necessária a prévia excussão do património do devedor originário para que seja possível a reversão, sendo bastante que se verifique a fundada insuficiência desse património, resultante do auto de penhora ou de outros elementos de que o órgão de execução fiscal disponha.” - Processo nº 00032/05.2BEPNF). Relativamente a esta questão, a jurisprudência do STA inclinava-se maioritariamente (quer no domínio da vigência do CPT, quer na vigência do anterior CPCI) no sentido de que a reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários não podia ocorrer sem a prévia excussão do património do devedor originário. Contudo, a alteração legislativa que ocorreu com a LGT (artigo 23.º), conjugada com a citada norma do artigo 153.º, n.º 2, do CPPT, leva a concluir que a solução legal já não é a que encontrava eco na jurisprudência do STA. A referência à fundada insuficiência, resultante do auto de penhora ou de outros elementos de que o órgão de execução fiscal disponha, inculca a ideia de que, perante essa fundada insuficiência do património do originário devedor, ocorra logo a reversão. Sem embargo da excussão do património do devedor originário. Ou seja: não é hoje necessária a prévia excussão do património do devedor originário para que seja possível a reversão. Basta essa fundada insuficiência, baseada, por exemplo, no auto de penhora (ou de outros elementos que o órgão de execução fiscal disponha). Assim sendo, face ao vertido no artigo 23.º da Lei Geral Tributária, impunha-se que a AT tivesse procedido às averiguações necessárias, demonstrando a insuficiência de bens da devedora originária face ao montante em dívida, para poder concluir, na data do despacho de reversão, que se verificava esse pressuposto da mesma. O Recorrente alerta para a inexistência de qualquer prova que sustente as afirmações constantes do despacho de reversão quanto à inexistência/insuficiência de bens, não se conformando com a circunstância de a Meritíssima Juíza “a quo” ter decidido pela verificação da fundada insuficiência de bens, dado não detectar as averiguações/investigação aprofundada que terão sido realizadas ou outra prova para formar tal convicção. O Recorrente alega não se encontrar demonstrada a fundada insuficiência de bens da sociedade devedora originária, porquanto, tal como já havia invocado aquando do exercício do direito de audição prévia sobre o projecto de reversão, esta era possuidora de património de acordo com o balancete razão (acumulado até apuramento) – 2008, reportado a 31/12/2008, do qual resulta a existência de débitos de clientes no montante de €132.592,88, valor este superior ao montante da dívida exequenda. No caso vertente, como emerge do probatório, o órgão de execução fiscal promoveu diligências no sentido de apurar a existência de bens susceptíveis de penhora, em nome da sociedade devedora originária, diligências essas que se revelaram infrutíferas (cfr. pontos 2, 3 e 4 da decisão da matéria de facto), desencadeando o procedimento de reversão das dívidas exequendas contra o aqui Recorrente. Aquando do exercício do direito de audição prévia à reversão, o oponente invocou a existência de créditos da sociedade devedora originária sobre clientes, cujo montante global ascendia a €130.423,62, conforme resulta do balancete reportado a 31/12/2008, que apresentou nessa sede. Nessa sequência, a Administração Tributária tentou obter mais informações junto do Recorrente com vista a alcançar a eventual existência de tais créditos, obtendo as respostas que constam do probatório nos pontos 8 a 12, notificando também o oponente para apresentar as facturas de tais créditos, o qual informou não ser possível “responder afirmativamente (…) a essa solicitação”. O Recorrente apresentou, por duas vezes, listas identificativas dos clientes devedores, sendo a segunda mais completa que a primeira. É verdade que ainda existiam omissões na identificação de alguns números de contribuinte, mas foram identificados mais de 50 clientes devedores. Apesar da respectiva alegação, o Recorrente não chegou a concretizar as acções judiciais ou eventuais diligências encetadas com vista à cobrança desses créditos. Não obstante as informações solicitadas, em 2009, no âmbito do procedimento de reversão, o órgão de execução fiscal não chegou a aprimorar ou aprofundar a sua investigação e operou a reversão em 06/05/2011. No âmbito da instrução do processo n.º 1817/17.2BEPRT, cuja prova foi aproveitada nos presentes autos, no decurso da inquirição da testemunha «BB», foi admitida a junção de um documento no âmbito da diligência de inquirição de testemunhas, consubstanciado no balancete geral (acumulado até Dezembro) – 2010, revelador de créditos sobre clientes, resultando, ainda, que, daqueles créditos, €87.891,74 foram qualificados pela devedora originária como “de cobrança duvidosa”, e que a dívida ao Estado e outros Entes Públicos, era, em tal data, de €138.326,64 – cfr. ponto 15 do probatório. Afirma-se na sentença recorrida o seguinte: “(…) No presente caso, temos que resulta da factualidade provada, que foram realizadas diligências pela Autoridade Tributária e Aduaneira (factos 2 e 3 do probatório), com vista a apurar da existência de bens suscetíveis de penhora, em nome da devedora originária, diligências essas infrutíferas, tal como foi emitido mandado de penhora (facto 4 do probatório). Pelo que, cumpriu a Autoridade Tributária e Aduaneira com o ónus que sobre ela impendia. Acresce que, o Oponente alega a existência de créditos a favor da devedora originária, figurando no balancete que apresentou, a existência de dívidas de clientes, no valor de € 130.423,62, é certo. Tal como havia alegado, em sede do exercício do direito de audição prévia. Todavia, em tal sede a Autoridade Tributária e Aduaneira desenvolveu diligências com vista a determinar da existência de tais créditos (factos 10, 11, 12 e 13 do probatório), notificando, nomeadamente, o Oponente para apresentar as facturas de tais créditos, o qual informou que não ser possível “responder afirmativamente (…) a essa solicitação”. Mais, o Oponente alegou, tanto em sede de audiência prévia, como na Oposição apresentada, que havia instaurado ações judiciais, com vista à cobrança de tais créditos, mas a nenhum tempo as identificou ou provou ter apresentado tais ações, ou sequer provou ter realizado diligências com vista à cobrança dos mesmos, apesar do pedido formulado pela Fazenda Pública nesse sentido (facto 12 do probatório). Acresce que, do balancete junto aos autos do Processo n.º 1817/17.2BEPRT, resulta, ainda, que daqueles créditos, €87.891,74, foram qualificados pela devedora originária como “de cobrança duvidosa”, e que a dívida ao Estado e outros Entes Públicos, era, em tal data, de €138.326,64, o que permite concluir que a existirem créditos a favor da devedora originária, os mesmos não seriam suficientes para pagar a dívida ao Estado e a outros Entes Públicos, na qual se incluirá (atendendo à data do balancete) o montante em causa nos presentes autos. Mais, a alegação do Oponente é genérica quanto à indicação da existência de créditos, não tendo cuidado em indicar sobre quem dispunha de tais créditos, inviabilizando, assim a realização de diligências por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira. Pelo que, em face do exposto, é de improceder o fundamento. (…)” Tal discurso assenta na ideia de que a AT terá efectuado diligências no sentido de apurar a existência de bens penhoráveis. Contudo, urge repor a realidade dos factos e o circunstancialismo em que operou a reversão: Salientamos que a motivação constante do despacho de reversão e todos os elementos para os quais remete são essenciais na sindicância que o tribunal deve levar a efeito. Em sede de projecto de reversão, existe notícia da realização de diligências, em 2006, tendo em vista penhoras, que se revelaram infrutíferas. Porém, aquando da pronúncia do revertido na audição prévia à reversão, afirmou, expressamente, ser a devedora originária titular de créditos sobre clientes, anexando o balancete reportando a 2008, como vimos. Não obstante esta afirmação, os serviços do órgão de execução fiscal motivaram a reversão, além do mais, em 11/04/2011, sustentada na inexistência de bens, mas, na concretização da citação do revertido, em 06/05/2011, não chegaram a optar entre a inexistência e a insuficiência de património da devedora originária – cfr. pontos 13 e 14 do probatório. A verdade é que uma parte do circunstancialismo em que assenta o despacho de reversão remonta a cerca de dois anos antes da reversão, que operou em 2011, e a outra parte remonta a 2006 (cfr. pontos 2 a 4 do probatório), altura em que foram tentadas as penhoras de bens, sendo essencial averiguar a existência de bens penhoráveis à data da reversão; o que não parece ter sido levado a cabo. Com efeito, a notícia da existência de bens (direito de crédito), em sede de audição prévia do revertido ocorreu em 2009, antes do despacho de reversão, tendo o órgão de execução fiscal considerado bastantes as informações mais antigas de 2006, demonstrativas da inexistência de bens. Verifica-se, também, que, independentemente das dívidas revertidas e dos respectivos montantes em cobrança, o órgão de execução fiscal nunca efectuou qualquer ponderação do montante em dívida, provavelmente por, afinal, considerar a inexistência total de bens. Somente a sentença recorrida ponderou a relação dos créditos sobre os clientes, inclusivamente os de cobrança duvidosa, mas com a globalidade das dívidas ao Estado e a outros entes públicos, aludindo a uma dívida total da devedora originária de €138.326,64, sem considerar que a reversão, in casu, operou por €16.983,02. Note-se que trazer à liça os créditos provenientes de clientes faltosos na diligência de inquirição de testemunhas levada a efeito no processo n.º 1817/17.2BEPRT, desta feita, suportados em balancete geral mais próximo da data da reversão – reportado a Dezembro de 2010, com a inscrição parcelar da dívida de cada cliente devidamente identificado, que, aparentemente, existiriam à data da reversão, e corroborados pela testemunha inquirida (contabilista da devedora originária), conforme consta da motivação da decisão da matéria de facto (a testemunha corroborou a informação constante do balancete, nomeadamente no que respeita aos saldos dos clientes e dívidas ao Estado); relança a dúvida acerca da existência de bens, conforme invocado pelo oponente desde a sua audição prévia à reversão. Por tudo o exposto, é notório que, na data da reversão, nada foi averiguado a propósito da existência de bens indicada em sede de audição prévia à reversão, que o órgão de execução fiscal se bastou com a notícia de penhoras infrutíferas em 2006 e com as dificuldades encontradas, em 2009, na identificação de alguns clientes devedores. Ora, a AT deveria ter demonstrado, de forma inequívoca, fundada, que os bens são insuficientes. O despacho de reversão aponta para a inexistência de bens, mas tudo indica existirem créditos à data da reversão, sem que, nessa data (em 2011), os autos revelem qualquer averiguação ou tentativa de penhora de direitos de crédito. Face ao exposto, na medida em que inexistem quaisquer documentos comprovativos nos autos sobre a inexistência ou insuficiência de bens à data da reversão, é ostensiva a falta de demonstração desse pressuposto para que pudesse operar a reversão, sendo que o ónus dessa prova cabia, como vimos, à AT – cfr. artigo 74.º, n.º 1 da LGT. Atenta a discordância e a afirmação do oponente de que existiam bens penhoráveis bastantes (créditos sobre clientes no valor de €130.423,62), tendo em conta o valor da quantia exequenda a reverter (€16.983,02), importava observar se a AT cumpriu, em termos substanciais, com o seu ónus da prova para operar a reversão. Com efeito, é forçoso concluir que, à data do despacho de reversão, em Abril de 2011, não se mostrou evidenciada pela AT sequer a insuficiência de bens (muito menos a sua inexistência). Nesta conformidade, o recurso merece provimento, ficando, consequentemente, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no mesmo, sendo de revogar a sentença recorrida e julgar a oposição procedente, extinguindo o processo de execução fiscal quanto ao oponente, aqui Recorrente. Conclusão/Sumário O pressuposto da inexistência ou da fundada insuficiência de bens deve verificar-se contemporaneamente à prolação do despacho de reversão, não bastando ocorrer em momento anterior ou posterior. IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgar a oposição judicial totalmente procedente, extinguindo o processo de execução fiscal quanto ao oponente. Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias; sendo que, nesta instância, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou. Porto, 27 de Março de 2025 Ana Patrocínio Vítor Salazar Unas Cláudia Almeida |