Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00572/11.4BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/10/2025
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:VITOR SALAZAR UNAS
Descritores:OPOSIÇÃO;
INQUISITÓRIO; INSTRUÇÃO;
REVERSÃO; FUNDAMENTAÇÃO FORMAL;
Sumário:
I - A questão da gerência de facto que não foi invocada na petição inicial, por constituir questão nova e não ser de conhecimento oficioso, não pode ser objeto de primeiro conhecimento por este tribunal de recurso.

II - Perante a falta de alegação de factos suscetíveis de prova, não existe a necessidade de produzir prova testemunhal, tal como bem decidiu o tribunal recorrido e não sem antes ter diligenciado pelo cumprimento do contraditório e após o silêncio das partes.

III – Daí que o tribunal não tenha incorrido na violação dos princípios da oficiosidade e do inquisitório ou em défice instrutório com a não realização da audição das testemunhas.

IV - Como é pacificamente assente na doutrina e na jurisprudência, impossibilita a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal a existência de pedidos correspondentes a formas processuais distintas, como se verifica no caso objeto.

V - No caso de a oposição ser julgada procedente com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão, a decisão a proferir pelo tribunal deverá ser de anulação daquele ato e consequente absolvição do oponente da instância executiva [e não a extinção da execução quanto ao oponente].*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO:
«AA», contribuinte fiscal n.º ...40, com os demais sinais nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, pela qual foi julgada improcedente a oposição que deduziu à execução fiscal, contra si revertida para cobrança de dividas à Segurança Social referentes ao período de 4 a 12 de 2008, no valor global de € 18216,63.
O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…).
1. Por douta sentença foi julgada improcedente a presente oposição por presunção de culpa na insuficiência do património da devedora originária e por não se verificar o vício de falta de requisitos da citação e falta de fundamentação do despacho de reversão.
2. Ora, em primeiro lugar, cumpre realçar que não foi carreada para os autos qualquer prova indicativa do exercício de funções de gerência de facto por parte do oponente.
3. Na verdade, a gestão de facto da originária devedora tem de estar provada nos autos.
4. Mais, essa prova da gestão de facto é essencial para que o aqui oponente possa ser revertido por responsabilidades da originária devedora.
5. Ora, em virtude do disposto no art. 24.º e 73.º da LGT, chega-se à conclusão que a gestão de facto cumpre ser provada pela Entidade Exequente.
6. Pois, é ela que exerce a reversão e aquela gestão é "um facto constitutivo" do direito a exercer a reversão.
7. O artigo 74.º da LGT é peremptório ao dispor que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração Tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
8. Aliás, neste mesmo sentido encontramos, igualmente, o art. 342.º do CC e o artigo 88.º do CPA.
9. Ora, dos presentes autos resulta claramente que a Administração Tributária não cumpriu com o ónus da prova que lhe incumbia, não tendo alegado suficientemente e muito menos provado a gerência de facto do revertido.
10. E, não tendo a Administração Tributária logrado obter tal prova no processo, temos de concluir que a douta decisão tinha de considerar a oposição procedente, por falta de prova da gestão de facto do revertido.
11. Contudo, a este propósito nada se diz na douta decisão.
12. Pelo que, há aqui uma clara omissão de pronúncia por parte do I. Tribunal a quo.
13. Acresce que, nos termos do art. 24.º da LGT, os gerentes das sociedades comerciais são subsidiariamente responsáveis em relação a estas pelas dívidas tributárias, desde que reunidos os requisitos ali previstos, entre os quais ter sido por culpa sua que o pagamento dessas dívidas não se efectuou.
14. Assim, a culpa pela falta de pagamento é um pressuposto essencial da reversão.
15. Ora, com base nos elementos de facto que foram trazidos aos autos, não foi feita prova da gestão de facto do oponente.
16. Pelo que, por maioria de razão, também nenhuma prova consta dos autos de que a conduta do oponente foi minimamente censurável.
17. Logo, o Tribunal a quo ao decidir em sentido contrário do que se deixou supra expresso, decidiu claramente em detrimento injustificado do particular.
18. Pelo que, deverá a douta sentença aqui em crise ser substituída por outra que reponha a legalidade.
19. Mais, não foi sequer assegurada a tutela jurisdicional efectiva dos direitos do oponente e a igualdade de armas entre o particular a administração fiscal.
20. Pois, para prova do articulado o aqui recorrente indicou duas testemunhas.
21. Todavia, a douta decisão foi proferida sem a inquirição das testemunhas arroladas pelo oponente.
22. Ora, no processo tributário vigora em pleno o princípio do inquisitório, patente nomeadamente no artigo 99.º da LGT.
23. Ora, o Tribunal a quo não deu cumprimento à diligência de prova requerida pelo oponente.
24. Pelo que, houve claramente omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo.
25. O que, conduz inevitavelmente à nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT.
26. E, mesmo que se considere que os fundamentos aduzidos pelo oponente não se integram nos admitidos pelo n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo continua adstrito à descoberta da verdade material, de acordo com o disposto no artigo 265.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 2.º do CPPT.
27. Ora, por tudo o que se deixa dito não poderia o Tribunal a quo concluir pela não verificação das nulidades invocadas se não estava na posse de todos os elementos de prova.
28. Aliás, para além de não ter sido feita a junção aos autos de elementos de prova que contrariem o alegado pelo recorrente.
29. Razão pela qual, temos de considerar que houve omissão de pronúncia, nos termos do artigo 125.º do CPPT.
30. Igualmente, se consideram violados os artigos 58.º e 99.º da LGT, o art. 13.º do CPPT e o art. 625.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º do CPPT.
31. Acresce que, a produção de prova testemunhal é essencial para a descoberta da verdade material, não podendo aceitar-se que os documentos já juntos aos autos fossem suficientes para essa mesma descoberta da verdade.
32. Por tudo isto, o I. Tribunal a quo ao decidir no sentido que se deixou supra expresso, decidiu claramente em detrimento injustificado do particular.
33. O oponente alegou ainda a nulidade da citação porque não veio acompanhada da totalidade das cópias dos títulos executivos.
34. Pois, a citação do oponente não continha os elementos essenciais da liquidação, nem a sua fundamentação, em violação do artigo 22.º, n.º 4 da LGT.
35. Sendo certo que, a falta de tais elementos determina a ineficácia do acto tributário, de acordo com o art. 77.º, n.º 6 e 36.º, n.º 1 do CPPT.
36. Por sua vez, a douta sentença recorrida considerou os alegados vícios improcedentes.
37. Todavia, não pode o oponente, ora recorrente, conformar-se com tal entendimento.
38. Porquanto, e em primeiro lugar, as referidas nulidades são passíveis de prova através de documento.
39. E, assim, consubstanciando o fundamento de oposição à execução previsto na al. i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
40. Acresce que, no processo tributário não é legalmente admissível a fundamentação a posteriori.
41. Ora, se a citação efectuada pela recorrida não estava devidamente fundamentada e instruída então, a sua fundamentação a posteriori é inadmissível.
42. Pelo que, permanecem intactas todas as nulidades invocadas e que se prendem com a citação efectuada pela recorrida, nomeadamente a falta de fundamentação e de outros elementos.
43. Pelo que, o I. Tribunal a quo tinha de se pronunciar acerca das invocadas nulidades, ao invés de considerar que elas não constituem objecto de oposição.
44. Pois, o recorrente claramente invocou um fundamento de oposição à execução previsto no artigo 204.º do CPPT, mais precisamente na al. i) do seu n.º 1.
45. E, a recorrida não veio contrariar tal fundamento, nomeadamente através da junção de prova documental.
46. Para além disso, no processo tributário vigora em pleno o princípio do inquisitório, patente nomeadamente no artigo 99.º da Lei Geral Tributária (LGT).
47. Por outro lado, considera-se na douta sentença, ora em crise, que os fundamentos aduzidos pelo oponente não integram os admitidos pelo n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
48. Todavia, havendo erro na forma do procedimento, o artigo 52.º do CPPT determina se "puderem ser aproveitadas as peças úteis ao apuramento dos factos, será o procedimento oficiosamente convolado na forma adequada "
49. Por último, o recorrente invocou de fundamentação do despacho de reversão.
50. Por sua vez, a douta sentença recorrida considerou o alegado vício da falta de fundamentação do despacho de reversão improcedente.
51. Contudo, não podem restar dúvidas de que estamos aqui em presença de uma situação de falta de fundamentação.
52. De facto, o despacho de reversão é obscuro e não esclarece, concretamente, a motivação do acto.
53. Para além disso, também não permite que dos seus termos se possa extrair conhecimento perfeito do processo lógico e jurídico que conduziu à decisão, revelando-se clara e inequívoca a violação dos artigos 77.º, n.ºs 1 e 2 da LGT e 125.º, n.º 2 do CPA.
54. Ora, ao acto em causa, falta a fundamentação de facto e de direito, clara, suficiente, congruente e expressa, exigida no artigo 125.º, n.ºs 1 e 2 do CPA e n.º 3 do artigo 268.º da CRP.
55. Ora, de tudo se conclui que, a Administração Tributária não fez uma enunciação expressa das razões de facto e de direito do despacho de reversão.
56. Logo, a ausência, quer das situações fácticas, quer das disposições legais aplicáveis, traduz-se em violação clara e inequívoca dos artigos 74.º, n.º 1 e 77.º, n.º 1 e da LGT.
57. Assim, e por tudo o que se deixa expresso, a douta decisão do Tribunal a quo enferma de diversas nulidades, designadamente de omissão de pronúncia e incorrecta apreciação de facto e de direito da presente questão.
58. Pelo que, deverá a douta sentença aqui em crise ser substituída por outra que reponha a legalidade.
Nestes termos e nos melhores de Direito,
Deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, consequentemente, ser revogada a douta decisão, com o conhecimento das ilegalidades invocadas.
Assim se fazendo a acostumada Justiça!»

Não foram apresentadas contra alegações

O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso do qual se extrata o seguinte:
«(…).
9 - Entendemos que não assiste razão ao recorrente.
10 — Não se acompanha, por isso, a argumentação desenvolvida nas suas alegações uma vez que a decisão questionada fez correcta valoração da prova e dos factos e, acertada interpretação e aplicação do direito, com apoio da jurisprudência, não violando qualquer norma legal, razão pela qual deverá ser mantida.
Vejamos:
11 — No que respeita às nulidades invocadas, remete-se para a fundamentação do despacho de sustentação ou reparação do agravo e, pelas razões e fundamentos aí desenvolvidos a que se adere, afigura-se-nos que a sentença impugnada não padece de nulidade.
Mas,
12 — Também não ocorre erro de julgamento, pois, a sentença recorrida encontra-se suficientemente fundamentada de facto e de direito.
Na verdade,
13 - O Tribunal seleccionou toda a matéria de facto relevante e pronuncia-se sobre todas as questões para a boa decisão da causa.
14 — Da factualidade provada concluiu ser aplicável o regime previsto no artº 24º, nº 1 da LGT e que o oponente, foi gerente de facto, da sociedade devedora originária no período a que respeitam as dívidas.
Assim,
15 — Não tendo o oponente logrado provar a ausência de culpa na falta de pagamento das obrigações fiscais da sociedade executada, o mesmo é subsidiariamente responsável pelas dívidas exequendas em pagamento na sua gerência.
16 — Sobre a fundamentação do despacho de reversão, já se pronunciou o STA no seu douto Acórdão do Pleno, de 16.10.2013, in Proc. nº 0458/13, onde no Sumário se escreveu:
" A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência á extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (nº 4 do artº 23º da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido."
17 — Por nada mais ter a acrescentar, concordando com o entendimento vertido na sentença recorrida, aliás, em sintonia com o parecer emitido pelo Mº Pº na 1a instância sou de parecer que deverá ser NEGADO provimento ao recurso
*
Com dispensa dos vistos legais, [cfr. artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso.
*
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR.
As questões que cumpre conhecer estão relacionadas com os vícios da sentença de nulidade por omissão de pronúncia e, na negativa, com os apontados erros de julgamento em que alegadamente incorreu o tribunal recorrido.
*
III – FUNDAMENTAÇÃO:
III.1 – DE FACTO
Na sentença foi fixada matéria de facto nos seguintes termos:
«A) Na Seç de Processos executivos de ..., do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social IP, foi instaurada execução fiscal nº ...90 e apensos contra “[SCom01...], Unipessoal, Lda.”, por dívidas à SS respeitantes ao período de 04 a 12 de 2008, no montante global de 18 216,63€, cfr. informação de fls. 14 e fls. 1 e segs. do apenso constituído por cópias do processo executivo, aqui dados por reproduzido, o mesmo se dizendo dos demais elementos infra referidos;
B) no processo executivo vindo de aludir, a executada, ao ser citada, veio através do seu sócio gerente, o ora Oponente, a requer o pagamento da dívida exequenda em prestações, vide fls. 6 a 12 do apenso;
C) no referido processo executivo, porque o pagamento em prestações não se verificou, em 13-03-2010 culminaram as diligências com vista à reversão contra o Oponente considerando a “inexistência de bens penhoráveis do devedor principal e Exercício da gerência no período ora em execução”, com o despacho a notificar o Oponente para querendo exercer audição prévia face ao projecto de reversão contra ela, vide fls. 13, 14, 21 e 22 do referido apenso;
D) porque não foi exercida a audição prévia, por despacho de 2010-05-24 foi proferido despacho de reversão, com fundamentação idêntica à constante no projeto de reversão, despacho comunicado em 2010-05-27, cfr. fls. 25 a 27 do apenso;
E) quatro dias antes do despacho de reversão foi proferida sentença a declarar insolvente a originária devedora, vide fls. 42 a 44 e 49 a 53 do apenso;
F) A petição inicial que deu origem aos presentes autos remetida ao Órgão de Execução Fiscal, via postal, em 2010-06-23, cfr. fls. 3 a 11.
Fatos não provados
Inexistem.
A convicção do Tribunal fundou-se nos elementos referidos em cada uma das alíneas dos factos assentes.»
*
Aditamento oficioso à matéria de facto :
D1 O Despacho de reversão apresenta o seguinte teor:
«(…).
Estando concretizada a audição do(s) responsável(veis) subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra «AA», (…), na qualidade de responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada.
(…).
FUNDAMENTO DA REVERSÃO

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. págs. 26 do suporte físico dos autos].
*
IV –DE DIREITO:
O Recorrente, entre os vícios apontados à sentença, invoca a sua nulidade por omissão de pronúncia, pelo facto de o tribunal nada ter dito relativamente ao incumprimento por parte da ATA da demonstração do exercício da sua gerência [cfr. conclusões [1.ª a 12.ª].
Vejamos, pois, se lhe assiste razão quanto a esta questão.

Nulidade da sentença por omissão de pronúncia?
Segundo o disposto no artigo 125.º, nº 1 do CPPT (à semelhança do previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC), é nula a sentença quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”. Esta nulidade está diretamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 608.º, n.º 2 do CPC, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão dessas questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia.
Assim, incumbe ao julgador a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, ou seja, os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais exceções invocadas), ficando apenas excluído o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicado pela solução dada a outras.
Nesta matéria, a jurisprudência tem reiteradamente afirmado que “só pode ocorrer omissão de pronúncia quando o juiz não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio” (vd., por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de Setembro de 2012, proferido no Processo nº 0862/12, integralmente disponível em www.dgsi.pt).
Por último, conforme é jurisprudência constante, poderá haver erro de julgamento, se for erróneo o entendimento em que se baseia o não conhecimento da(s) questão(ões), mas não nulidade por omissão de pronúncia (cfr., por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de novembro de 2020, proferido no Processo nº 0699/17.9BELRA, integralmente disponível em www.dgsi.pt).
Em síntese, só ocorrerá omissão de pronúncia quando o juiz (1) não toma posição sobre questão colocada pelas partes, (2) não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento, (3) nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento e (4) da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio. Usando uma formulação positiva, podemos, então, afirmar que, para efeitos da verificação da nulidade por omissão de pronúncia, constitui forma válida de conhecimento a afirmação justificada de que não se pode conhecer da questão.
Tendo como premissa estas considerações pacíficas sobre a nulidade por omissão de pronúncia a conclusão a retirar é que a mesma não ocorre.
Na verdade, impondo-se ao tribunal o conhecimento de todas as questões submetidas à sua apreciação, verifica-se no caso objeto que a concreta questão enunciada pelo Recorrente – falta de demonstração da gerência de facto – não foi elencada na causa de pedir da sua oposição à execução.
Revisitando a petição inicial detetamos, aliás, que sem colocar em causa o mencionado pressuposto é o próprio oponente que admite a gerência de facto, apenas, considerando que não lhe é imputável a culpa pela falta de pagamento das dívidas. Veja-se, a título de exemplo, o por si afirmado nos seguintes termos: «sempre seguiu uma gerência segundo uma diligência de um bónus pater famílias» [art. 5.º]; «Assim, não tem qualquer responsabilidade pela dissipação patrimonial» [art. 6.º]. Ou seja, o oponente pugna pela sua ilegitimidade para a reversão, tão somente, por falta do pressuposto relativo à culpa na falta de pagamento da quantia exequenda.
Nesta medida, por a matéria em análise não ter sido invocada na petição inicial e não ser de conhecimento oficioso, não padece a sentença de nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que o tribunal recorrido conheceu das questões que lhe era lícito conhecer, conforme preceituado no art. 608.º, n.º 2 do CPC.
*
Tendo improcedido o recurso quanto à nulidade da sentença, importa prosseguir no conhecimento do erro de julgamento, nas suas várias vertentes, imputado à sentença, a não ser que resulte prejudicado o conhecimento de alguma(s) questão(ões) pela solução encontrada anteriormente [cfr. art. 608.º, n.º 2 do CPC].
*
Erro de julgamento por défice instrutório?
Vejamos, pois, se o oponente alegou factos concretos no sentido de afastar a culpa e, na afirmativa, se existe défice instrutório, uma vez que o Recorrente entende que o tribunal a quo por não ter procedido à inquirição das testemunhas por si arroladas na petição inicial violou o princípio do inquisitório e incorreu em nulidade por omissão de pronúncia.
Antes de mais, assentamos que a patologia imputada à sentença não a compromete com o vício de nulidade, por não estar expressamente consagrada no catálogo exaustivo das nulidades previstas no art. 125.º do CPPT ou 615.º do CPC, mas com o erro de julgamento decorrente de défice instrutório.
Assim enquadrada, vejamos se tem mérito esta pretensão recursiva
Como é comummente sabido, os princípios da oficiosidade e da investigação ou do inquisitório ínsitos, que orientam o processo judicial tributário, encontram-se plasmado nos arts. 99.º, n.º 1 da LGT e 13.º do CPPT.
Prescreve, cada um destes preceitos, o seguinte:
· «O tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer.» [n.º 1 do art. 99.º da LGT];
· «Aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer». [n.º 1 do art. 13.º do CPPT].
Conforme resulta linear do teor literal dos preceitos citados (maxime partes por nós destacadas), a efetivação dos aludidos princípios só é devida relativamente aos factos alegados pelas partes ou aos que sejam de conhecimento oficioso.
A este propósito, referem o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa e outros, «a oficiosidade da investigação probatória só poderá respeitar aos factos que as partes alegaram no uso do seu direito de autonomia da vontade e do ónus de alegação dele decorrente ou aos factos cujo conhecimento esteja também oficiosamente permitido.» [in “LGT, anotada e comentada”, 4.ª edição 2012, encontro da escrita, pág. 859].
Importa então assentar que a oficiosidade da instrução apenas se impõe para prova (i) de factos alegados pelas partes ou (ii) de factos de conhecimento oficioso.
Por outro lado, é sobre os factos constantes dos articulados que a produção de prova e respetivos meios incidirão [cfr. artigos 452.º, nºs 1 e 2, 454.º, 460.º, 466.º, n.º 1, 475.º, 490.º e 495.º, n.º 1 do CPC], porquanto são os acontecimentos ou factos concretos que o n.º 4 do artigo 607.º do CPC impõe que sejam discriminados e declarados provados e/ou não provados pelo juiz na sentença, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos, que, se detetados, devem ser excluídos do acervo factual relevante [e/ou recusado o seu aditamento].
No caso objeto, e tal como se menciona na sentença, o ora Recorrente não alegou quaisquer factos suscetíveis de prova testemunhal (ou, diga-se, qualquer outra).
Lida a petição inicial verificamos que o opoente de forma, apenas e meramente, conclusiva entende que não lhe pode ser imputada a responsabilidade subsidiária por não ter culpa no pagamento da quantia exequenda ou a mesma não se presumir. Para concretizar esta ilação evidenciamos, a título de exemplo de entre os artigos em que a falta desse pressuposto é invocada, os seguintes:
· «sempre seguiu uma gerência segundo uma diligência de um bónus pater famílias» [art. 5.º];
· «Assim, não tem qualquer responsabilidade pela dissipação patrimonial» [art. 6.º].
· «Pois, não foi apresentado qualquer documento ou referência a imputar ao oponente a culpa por o património da empresa se ter tornado insuficiente para o pagamento da dívida» [art. ].
· «Pelo que, não se encontra satisfeito o condicionalismo essencial para que o ora oponente possa ser considerado responsável subsidiário» [art. 10.º].
· «Ou seja, para que a reversão se pudesse considerar efectuada nos termos legais, importava que no processo de execução fiscal estivessem apurados os respectivos pressupostos da responsabilidade atribuída ao oponente» [art. 11.º].
· «Só que tal não aconteceu, uma vez que não lhe foi atribuída a culpa de tal inexistência» [art. 12.º].
· «Na verdade, não lhe cabe qualquer responsabilidade dessa natureza» [art. 13.º].
· «Pois, não dissipou ou malbaratou, culposamente, o património da sociedade» [art. 14.º].
· «E, importa salientar não estar provado o contrário também no processo» [art. 15.º].
· «De resto, a culpa não se presume e o ónus da prova demonstrativa dos seus pressupostos pertence à Administração Tributária» [art. 16.º].
· «Pelo que, sendo a demonstração dessa prova essencial para o prosseguimento da execução, a sua falta implica que o processo à margem indicado fique suspenso» [art. 17.º].
Do exposto, resulta, conforme já adiantamos, que o oponente, de forma apenas meramente conclusiva entende que não lhe pode ser imputada a responsabilidade subsidiária por não ter culpa no pagamento da quantia exequenda ou que a mesma não se presume, sem alegar quaisquer factos concretos para o efeito.
Daí que, perante a falta de alegação de factos suscetíveis de prova, não existisse a necessidade de produzir prova testemunhal, tal como bem decidiu o tribunal recorrido e não sem antes ter diligenciado pelo cumprimento do contraditório e após o silêncio das partes [cfr. págs. 42 a 47 do sitaf], não tendo o tribunal violado os princípios da oficiosidade e do inquisitório.
Pelo exposto, não procede este segmento recursivo.

*
Erro de julgamento quanto à nulidade de citação?
O Recorrente ataca ainda a sentença por entender que a nulidade de citação por «porque não veio acompanhada da totalidade das cópias dos títulos executivos», constitui fundamento de oposição previsto na al. i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT. [cfr. conclusões 33 a 39].
Vejamos se lhe assiste razão, não sem antes exteriorizar a fundamentação da sentença quanto a esta questão:
«Sobre as alegadas falhas da citação sempre se referirá que elas não constituem objecto de oposição, não sendo admissível o alegado enquadramento na al. I) do nº 1 do artigo 204º do CPPT pois que elas podem e devem ser objecto de requerimento dirigido ao Órgão de Execução Fiscal e da decisão deste é que pode reclamar-se para o Tribunal nos termos do artigo 276º e segs. Neste sentido vejam-se v.g. os Acs. do Supremo Tribunal Administrativo de 19 e 12 de Janeiro, ambos de 2011, procs. 340/10-30, 969/10-30, relatados por Isabel M. Silva e Casimiro Gonçalves.
Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28-02-2007, P. 0803/04, disponível, este e os demais anteriormente referidos, em www.dgsi.pt, “a nulidade da citação consubstancia uma nulidade do processo executivo, e as nulidades devem ser invocadas e apreciadas no processo em que ocorreram, tendo em vista a sua sanação e o prosseguimento do processo. Ao passo que a oposição à execução persegue a extinção do processo ou, pelo menos – em casos restritos –, a sua suspensão”.
Assim, continua o referido aresto, “se a citação para a execução fiscal foi omitida ou, tendo tido lugar, enferma de vício equivalente à falta, tal constitui nulidade do processo executivo, que nele deve ser arguida, a todo o tempo, conduzindo a procedência dessa arguição ao suprimento da falta, efectuando-se a citação omitida, ou repetindo-se a inválida, com aproveitamento das “peças úteis ao apuramento dos factos”, mas com anulação “dos termos subsequentes do processo” que da citação dependam absolutamente”.
Conclui-se, pois, que a nulidade relativa à citação para a execução fiscal não serve de fundamento à oposição, ocorrendo erro na forma do processo. A oposição é, assim, ilegal, nessa parte, mas a ilegalidade não importa, no caso em apreço, a convolação da oposição em requerimento à execução, em virtude de se impor o prosseguimento dos autos para apreciação dos restantes fundamentos invocados pela oponente e relativamente aos quais se adequa o presente meio processual.
A solução é, pois, a de considerar sem efeito o pedido de declaração de nulidade da citação, conhecendo-se dos restantes fundamentos invocados na petição inicial, com supra se fez.»
Quanto à questão da nulidade da citação não ser fundamento de oposição, secundamos o vertido na decisão recorrida, pois, constitui jurisprudência há muito consolidada dos tribunais superiores, desde logo, do Supremo Tribunal Administrativo, que a nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal nos termos do art.º 204.º do CPPT, porquanto, “constituindo o acto de citação para a execução fiscal um acto processual, praticado no âmbito de um processo judicial, a invalidade desse acto tem de ser suscitada no respectivo processo executivo, perante o órgão de administração fiscal, com posterior reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância da eventual decisão de indeferimento, em harmonia com o preceituado nos artigos 276.º do CPPT e 103.º, n.º 2 da LGT” [vide, por todos, acórdãos do STA de 20.01.2016, proc. n.º 01124/15; de 04.03.2015, proc .n.º 01271/13; de 18.06.2013, proc. n.º 01276/12 e, ainda, por todos, acórdão deste TCA Norte de 07.12.2023, proc. n.º 1254/22.7BEBRG].
E como refere o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in «CPPT, anotado e comentado, 6.ª edição, 2011», III volume, Áreas Editora, pág. 500, em consonância com a jurisprudência, não integra fundamento de oposição, nos termos da alínea i), do n.º 1, do art. 204.º do CPPT, as nulidades do processo de execução fiscal (como a decorrente da nulidade da citação), que devem ser arguidas no próprio processo de execução.
Este entendimento consolidado é uma concretização do princípio estruturante e transversal dos processos judiciais previsto no art. 2.º, n.º 2 do CPC, segundo o qual a cada direito corresponde uma ação adequada para a sua defesa em juízo, por um lado; e de que a legalidade do despacho de reversão exige a declaração fundamentada os seus pressupostos e extensão temporal da responsabilidade subsidiária, a incluir na citação, embora com autonomia jurídica em relação a esta (art. 23.º n.º4 LGT), por outro. [vide acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 08.07.2020, processo n.º 0484/15.2BESNT].
Outrossim, ao contrário do pretendido pelo Recorrente [conclusão 48], existe um obstáculo à convolação, por, no caso, não obstante a nulidade da citação não poder ser conhecida na oposição, este meio se mostrar, no entanto, o adequado para conhecer das demais questões suscitadas na petição inicial com assento no pedido. Daí o tribunal a quo não ter concluído pela nulidade de erro na forma de processo, mas ter prosseguido com o conhecimento da oposição.
Na verdade, no caso objeto, sempre impossibilitaria a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal a existência de pedidos correspondentes a formas processuais distintas [sobre a impossibilidade de convolar no caso de pedidos correspondentes a meios processuais diferentes, ver, por todos, o acórdão recente deste TCAN, de 13.02.2025, proc. n.º 1946/24.6BEBRG, com intervenção do mesmo coletivo].
Em sintonia com a jurisprudência uniforme sobre esta questão, menciona o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in ibidem, pág. 503, «[s]erá de afastar também a convolação, no caso de haver erro na forma de processo quanto a algum dos fundamentos, mas não quanto a outros. A correcção do erro na forma de processo só é possível quando todo o processo passe a seguir a tramitação adequada.»
Nesta conformidade, não obtém provimento a pretensão recursiva analisada.

*

Erro de julgamento quanto à falta de fundamentação do despacho de reversão?

Invoca o Recorrente o erro de julgamento no que concerne à falta de fundamentação do despacho de reversão [conclusões 49 a 56], em consonância com o que já tinha alegado na oposição.
Assim, importa saber se o despacho de reversão contém os elementos necessários e suficientes que permitam ao respetivo destinatário apreender os motivos de facto e de direito pelos quais é chamado à execução fiscal para responder, na qualidade de responsável subsidiário, por dívida de terceira pessoa [devedora originária].
A sentença apresenta a seguinte fundamentação, quanto a questão em análise:
«Sobre a alegada falta de requisitos à citação e ao despacho de reversão integradores da previsão da al. I) do nº 1 do artigo 204º do Código de Procedimento e de processo tributário: a factualidade assente nas als. B) a D), factualidade que o Oponente bem conhece é elucidativa no sentido da não verificação das falhas alegadas, dispensando outras considerações. Só uma grande distração que ronda a má fé pode justiçar o alegado pelo Oponente. Também aqui o Oponente aproveita apenas a nota de citação olvidando que a citação incluiu outros elementos, dos quais constam os elementos alegadamente em falta. Elementos que o Oponente bem conhece veja-se, para além do mais, o requerimento que subscreveu na qualidade de gerente da originária devedora, a solicitar o pagamento das dívidas exequendas em prestações.»
Vejamos.
É indiscutível que a responsabilidade subsidiária se efetiva por reversão do processo de execução fiscal [cfr. o n.º 1 do artigo 23.º da Lei Geral Tributária] e que o despacho de reversão, sendo um ato administrativo tributário, está sujeito a fundamentação [cfr. o artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa e os artigos 23.º, n.º 4 e 77.º, n.º 1 da LGT], devendo o mesmo, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa [cfr. o n.º 1 do artigo 77.º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração dos pressupostos da reversão e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária [cfr. artigo 23.º, n.º 4 da LGT].
Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina, o ato encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática.
Daí que no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de Outubro de 2013, proferido no Processo n.º 0458/13, integralmente disponível em www.dgsi.pt, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» [cfr., no mesmo sentido, os Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 31 de janeiro de 2012 e 23 de janeiro de 2013, proferidos nos Processos nºs 580/12 e 953/12, respetivamente, também integralmente disponíveis em www.dgsi.pt].
Essencial é que a fundamentação, sendo contemporânea do ato, responda às necessidades de esclarecimento do contribuinte, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do ato administrativo permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática.
Ora, a fundamentação sempre tem de ser contemporânea do ato, e figurar, diretamente ou por remissão, no mesmo instrumento formal de decisão, não relevando, assim, para o efeito, quaisquer considerações produzidas a posteriori ou sequer anteriores, neste último caso, sem que seja feita a devida remissão.

Sendo que, em caso de discordância, o revertido exercerá o direito de defesa mediante dedução de oposição, como o Oponente efetuou nos presentes autos, funcionando depois as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às situações previstas legalmente.
Vejamos, pois se no caso se mostram cumpridas as exigências mínimas de fundamentação de modo a que seja compreensível ao seu destinatário, ora Oponente, compreender as razões pelas quais operou a reversão contra si e poder exercer convenientemente o seu direito de defesa.
O despacho de reversão, conforme espelhado no ponto D1, da matéria de facto, apresenta como fundamentação, tão somente, a «inexistência de bens penhoráveis do devedor principal e o exercício de gerência no período em execução».
Para aferir do cumprimento do dever de fundamentação do despacho de reversão por parte do órgão de execução fiscal, cumpre atentar na disciplina aplicável in casu no que ao regime jurídico da reversão respeita.
Assim, desde logo, há que considerar o disposto no artigo 23.º da LGT, decorrendo do seu n.º 1 que é através da reversão que se efetiva a responsabilidade tributária subsidiária.
Resulta deste mesmo artigo 23.º que a reversão depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor originário (n.º 2), sendo a este propósito de ter em consideração o disposto no n.º 2 do artigo 153.º do CPPT.
Nos termos do n.º 4 do mesmo artigo 23.º da LGT, a reversão é precedida de audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.
Somos ainda remetidos para o artigo 24.º, n.º 1, da LGT, nos termos do qual:
«1. Os administradores (…) e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».
Este artigo 24.º, n.º 1, da LGT determina que a simples gestão de facto é suficiente para acionar a responsabilidade em causa, não sendo, por outro lado, suficiente a mera gerência ou administração de direito.
O artigo 24.º da LGT demarca duas situações, nas duas alíneas do seu n.º 1.
A primeira, correspondente à sua alínea a), refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções quer no momento de ocorrência do facto tributário, quer após este momento, mas antes do término do prazo de pagamento da dívida tributária, sendo esta responsabilidade pelo depauperamento do património social, de molde a torná-lo insuficiente para responder pelas dívidas em causa. A culpa exigida aos gerentes ou administradores, nesta situação, é uma culpa efetiva - culpa por o património da sociedade se ter tornado insuficiente. Não há, aqui, qualquer presunção de culpa, o que nos remete para o disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, pelo que cabe à AT alegar e provar a culpa dos gerentes ou administradores.
A segunda, constante da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções no período no qual ocorre o fim do prazo de pagamento ou entrega do montante correspondente à dívida tributária. No artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT, presume-se que a falta de pagamento da obrigação tributária é imputável ao gestor. Assim, atentando na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, o momento relevante a considerar é o do termo do prazo para pagamento voluntário. A presunção constante da referida alínea b) do artigo 24.º, n.º 1, da LGT, deriva da consagração do dever de boa prática tributária, constante do artigo 32.º da LGT, que prevê “(...) um especial dever de diligência no cumprimento dos deveres tributários [das pessoas colectivas] (...) - dever de diligência que se presume violado caso tais deveres tributários não sejam cumpridos”. Esta presunção de culpa é ilidível, cabendo ao gestor revertido o ónus de a ilidir. [cfr. acórdão do TCANorte de 11.04.2024, proc. n.º 2733/10.4BEPRT, disponível para consulta no sítio da dgsi].
Feito este enquadramento do ponto de vista do cumprimento de dever de fundamentação formal do despacho de reversão, assevera-se ser exigido ao órgão de execução fiscal que:
· Indique as normas legais que determinam a imputação da responsabilidade;
· Mencione o preenchimento o pressuposto relativo à inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis da devedora originária (n.º 2 do artigo 23.º da LGT e n.º 2 do artigo 153.º do CPPT);
· Mencione o preenchimento o pressuposto relativo ao exercício efetivo do cargo nos períodos relevantes, dependendo do enquadramento da situação na alínea a) ou na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT;
· Mencione a sua extensão temporal.
Ora, analisado teor do despacho de reversão em conjugação com a doutrina sobre o seu dever de fundamentação (formal), a conclusão a retirar é que a sua fundamentação não cumpre os mínimos legais exigíveis, pois, apesar da referência à inexistência de bens e ao exercício da gerência de facto, não faz qualquer alusão ao quadro legal aplicável e nem ao período relativo à responsabilidade do oponente.
A omissão desses elementos limita a apreensão do itinerário cognoscitivo empreendido pelo autor do ato (órgão de execução fiscal) para concluir pela responsabilização do oponente e pela legitimação ao recurso ao instituo de reversão.
Na verdade, atendendo à fundamentação concreta, contemporânea, do ato desconhece-se qual a extensão temporal do período relevante do exercício da gerência e em qual das alíneas do n.º 1 do art. 24.º da LGT é imputada ao oponente essa responsabilidade, o que tem, desde logo, consequências ao nível do ónus de prova conforme acima dilucidamos.
Aliás, não será por acaso que na oposição o oponente alega «para que a reversão se pudesse considerar efectuada nos termos legais importava que no processo de execução fiscal estivesse apurados os respectivos pressupostos da responsabilidade atribuída ao oponente» [art. 11.º]; «Só que tal não aconteceu, uma vez que não lhe foi atribuída a culpa (…)[art. 12.º]. Para depois de tentar demonstrar que não teve culpa [art. 15.º], ainda assim concluir «de resto, a culpa não se presume e o ónus da prova demonstrativa dos seus pressupostos pertence à Administração Tributária» [art. 16.º]. Do expendido resulta que a alegação do oponente oscilou entre a não presunção de culpa e o seu contrário, certamente pela falta de fundamentação do despacho de reversão que, por deficiência, não lhe permitiu conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática.
Em suma, o despacho de reversão não se encontra devidamente fundamentado, do ponto de vista formal, impondo a sua anulação ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, tal como defende o Recorrente.
Nesta conformidade, impõe-se conceder provimento ao recurso e, nesta conformidade, julgar a oposição procedente com fundamentação na falta de fundamentação do despacho de reversão e, consequentemente, absolver o oponente da instância executiva [neste sentido, vide, por todos, acórdão do STA de 22.04.2015, processo 0511/14, cuja jurisprudência se mantém atual].
Fica, ainda, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas [art. 608.º, n.º 2 do CPC].


*
Nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC., formula-se o seguinte SUMÁRIO:
I - A questão da gerência de facto que não foi invocada na petição inicial, por constituir questão nova e não ser de conhecimento oficioso, não pode ser objeto de primeiro conhecimento por este tribunal de recurso.
II - Perante a falta de alegação de factos suscetíveis de prova, não existe a necessidade de produzir prova testemunhal, tal como bem decidiu o tribunal recorrido e não sem antes ter diligenciado pelo cumprimento do contraditório e após o silêncio das partes.
III – Daí que o tribunal não tenha incorrido na violação dos princípios da oficiosidade e do inquisitório ou em défice instrutório com a não realização da audição das testemunhas.
IV - Como é pacificamente assente na doutrina e na jurisprudência, impossibilita a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal a existência de pedidos correspondentes a formas processuais distintas, como se verifica no caso objeto.
V - No caso de a oposição ser julgada procedente com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão, a decisão a proferir pelo tribunal deverá ser de anulação daquele ato e consequente absolvição do oponente da instância executiva [e não a extinção da execução quanto ao oponente].
*
V – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos de Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso e, em consequência:
· julgar a oposição procedente por falta de fundamentação do despacho de reversão e
· absolver o oponente da instância executiva.


Custas pelo Recorrido em ambas as instâncias, sendo que nesta não incluem taxa de justiça por não ter contra alegado.

Porto, 10 de abril de 2025


Vítor Salazar Unas
Maria do Rosário Pais
Ana Paula Santos