Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00677/15.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/31/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:PAULO MOURA
Descritores:ISENÇÃO IMT. ART.º 6.º- G);
CIMT;
PRÉDIO INDIVIDUALMENTE CLASSIFICADO;
Sumário:
Apenas os prédios individualmente classificados como de interesse nacional (monumentos nacionais), de interesse público ou de interesse municipal, estão isentos de IMT, não beneficiando desta isenção os prédios classificados em conjunto.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


[SCom01...], SOC. UNIPESSOAL, LDA, interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a Ação Administrativa Especial, intentada contra o ato de indeferimento tácito do pedido de isenção de IMT, relativo à aquisição, no ano de 2014, de vários imóveis situados na zona histórica do Porto.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo TAF do Porto que julgou improcedente a ação administrativa proposta pela ora Recorrida por referência ao indeferimento tácito do pedido de reconhecimento de isenção de IMT pela DSIMT, que havia sido apresentado pela aqui Recorrente nos termos da alínea g) do artigo 6º do Código do IMT, relativamente à aquisição de quatro prédios urbanos, devidamente identificados nos autos, situados no Centro Histórico do Porto, no ano de 2014.

B. Para tanto, o Tribunal a quo considerou, em suma que:

(i) a classificação exigida pela alínea g) do n.º 1 do artigo 6.º do CIMT terá de ser individual” e que, apesar da junção aos autos das competentes certidões, “Os imóveis em causa são classificados como monumento nacional, porém, integram um conjunto, pelo que a sua classificação advém do facto de integrarem um conjunto, não se podendo afirmar [...] que cada um dos prédios foi classificado individualmente por revestir interesse nacional”
(ii) No que à invocada inconstitucionalidade se refere, “os adquirentes de prédios individualmente classificados beneficiam da isenção de IMT, porém, estes estão em situação diferente. Na verdade, se o prédio foi objecto de classificação individual, por certo apresenta características únicas, que o distingue dos demais e por isso lhe é conferida especial protecção e impostos especiais deveres aos seus proprietários”

C. Decorre da matéria de facto provada em 1.ª instância que, com base nas certidões juntas aos autos com a petição inicial, cada um dos imóveis em causa adquiridos pela ora Recorrente está classificado como “Monumento Nacional, de acordo com o n.º 3 e n.º 7 do artigo 15.º da Lei n.º 107/2001, por estar inscrito na Lista do Património Mundial da Unesco, em 1996, como “Centro Histórico do Porto” e que, para além disso, cada um desses imóveis está ainda classificado como Monumento Nacional por fazer parte integrante do conjunto denominado “Centro Histórico do Porto” – cf., em especial, pontos 3 a 6 da matéria de facto provada
D. A classificação em causa vem atestada pela competente DRCN e tem por efeito, nos termos da mesma certidão e expressamente, a “instrução do processo de benefícios fiscais”, nomeadamente, a isenção prevista na “al. g) do art.º 6º do CIMT” – cf., em especial, pontos 3 a 6 da matéria de facto provada.
E. Assumindo uma coerência entre o fim a que se destina a certidão e a forma como ela se encontra previamente redigida – sendo que o impresso de entrega obrigatória para efeitos de comprovação do pressuposto da isenção não consta, em campo algum, a alusão expressa a uma “individual classificação do prédio” –, não é defensável que, encontrando-se atestado que o imóvel está simultaneamente classificado como Monumento Nacional e como imóvel integrante de determinado Conjunto, também classificado como Monumento Nacional, isso queira, afinal, significar, como resulta da sentença aqui posta em crise, que os imóveis em causa são inelegíveis para beneficiar da isenção de IMT a que a mesma certidão se destina.
F. O legislador fiscal não impõe, no que se refere a este pressuposto em concreto da individualização da classificação, critérios seus – fiscais – ou conceitos civilísticos de prédio, mas remete, isso sim, para a respetiva legislação aplicável a observância ou não desta qualificação.
G. Do ponto de vista do património cultural, o conceito de bem imóvel classificado abstrai do número de artigos matriciais que compõem determinado Monumento Nacional, pelo que a “individualização” da classificação deve ser interpretada como referente a um todo homogéneo e único, que abrange os diferentes prédios que o compõem.
H. Contrariamente à interpretação veiculada na sentença aqui recorrida, se o conjunto composto pelos prédios transmitidos e outros se encontra (duplamente) classificado como Monumento Nacional, por ser Património Mundial da Unesco e por integrar o conjunto denominado “Centro Histórico do Porto”, resulta claro que os elementos que compõem tal conjunto – entre os quais, os prédios transmitidos – estão abrangidos por essa classificação.
I. Este e, aliás, o entendimento consagrado na decisão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 14.07.2020, proferida no âmbito do processo n.º 1361/16.5BEPRT (relatora: Bárbara Tavares Teles) – cuja cópia, por uma questão de facilidade de consulta, adiante se juntou.
J. A classificação de um conjunto de prédios como monumento nacional implica que o conjunto desses prédios detém tal classificação, não carecendo os prédios que constituem o conjunto de qualquer classificação individualizada como monumento nacional/imóvel de interesse público.
K. O facto de poderem coexistir prédios individualmente classificados, em caso de delimitação de um conjunto ou de um sítio, nos termos do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, apenas tem relevo provisório para delimitar a zona de protecção desse imóvel ate à publicação da classificação do conjunto ou do sítio (cf. o disposto no n.º 2 da mesma disposição legal), pelo que não faz sentido o exemplo da Estação de São Bento plasmado na sentença.
L. À luz do conjunto das disposições legais relativas ao Património Cultural aludidas nas alegações (que consubstanciam, precisamente, a “legislação aplicável” para a qual expressamente remete a parte final da alínea g) do artigo 6.º do Código do IMT), mostra-se incorreta a interpretação veiculada na decisão aqui recorrida, no sentido que a classificação individual a que se alude nessa norma de isenção quanto aos imóveis de interesse nacional terá de ser uma classificação concreta de cada imóvel (civilisticamente ou matricialmente entendido) e não uma classificação que decorra do facto de o imóvel consubstanciar uma parte de um Monumento Nacional.
M. Ao concluir que os imóveis em causa nos autos, não são subsumíveis à norma de isenção prevista na alínea g) do artigo 6.º do Código do IMT, apesar de decorrer do probatório que as entidades competentes certificaram que os mesmos se encontram classificados (duplamente) como Monumento Nacional para esse efeito, a sentença aqui recorrida violou o disposto na parte final dessa mesma disposição legal, devendo ser revogada em conformidade, com todas as consequências legais, o que se requer.
N. A interpretação da norma ínsita na alínea g) do artigo 6.º do Código de IMT, no sentido de que “a classificação exigida [...] terá de ser individual também no caso de imóveis de interesse nacional, plasmada e subjacente à sentença aqui posta em crise, redunda na inconstitucionalidade material da referida norma, por ofensa do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP.
O. A isenção de IMT em apreço visa a facilitar as transmissões de imóveis classificados, permitindo uma poupança financeira aos seus adquirentes que deverá ser funcionalizada para suportar os ónus e encargos de conservação de prédios classificados, com as restrições inerentes.
P. Estes ónus e encargos não são distintos para prédios objeto de uma classificação singular e para prédios objeto de uma classificação por estarem integrados num conjunto.
Q. Se os bens classificados de igual grau (i.e., interesse nacional) têm o mesmo valor cultural e estão sujeitos ao mesmo regime de proteção, é contrário ao natural e constitucional princípio da igualdade que um adquirente de um prédio objeto de uma classificação singular como monumento nacional possa beneficiar da isenção de IMT, mas a aqui Recorrente não, porque os prédios que adquiriu foram objeto de uma classificação conjunta como monumento nacional.
R. Interpretar a alínea g) do artigo 6º do Código do IMT neste sentido, seria ainda admitir que a lei fiscal possa estabelecer uma graduação do valor cultural dos bens que é contrária à própria Lei de Bases do Património Cultural, com base num critério que é meramente quantitativo, consoante o número de prédios abrangidos pelo ato classificatório como Monumento Nacional.
S. Admitir um tratamento desigual – que decorre de beneficiar ou não da isenção de IMT – entre o proprietário de um prédio objeto de uma classificação singular e os proprietários de prédios objeto da mesma classificação que abrange vários prédios, sem que esse tratamento diverso tenha subjacente alguma diferenciação no plano dos interesses tutelados, constitui uma clara violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP.
T. As faculdades de disposição, transformação e fruição da aqui Recorrente e deveres que lhe são impostos em concreto no que tange aos seus imóveis inseridos no conjunto classificado como Monumento Nacional, não são diferentes das que são permitidas e dos que são impostos ao titular de um prédio individualmente classificado como Monumento Nacional.
U. Perscrutada a Lei de Bases do Património Cultural (Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, já citada) e o respetivo regime de proteção dos bens culturais classificados consagrado no respetivo Capítulo II, não se vislumbra que, dentro da categoria de bens classificados como de interesse nacional, se imponham diferentes deveres consoante o bem classificado seja composto por um só prédio ou por vários prédios (categoria “conjunto”), sendo que, na imposição de deveres aos proprietários, a Lei refere-se sempre à categoria de bens classificados como de “interesse nacional”, nos quais se enquadram ambas as situações artificialmente distinguidas na sentença recorrida.
V. o feixe de ónus e encargos que, por força da classificação como monumento nacional, impende sobre os respetivos proprietários não é distinto consoante o bem classificado seja composto por um só prédio ou por vários prédios.
W. O tratamento desigual que decorre da interpretação da alínea g) do artigo 6.º do Código do IMT consagrada na decisão aqui recorrida e que autoriza a isenção de IMT em causa para um Monumento Nacional individualmente considerado e nega a mesma isenção para os prédios que, no seu conjunto, componham um Monumento Nacional, é efetivamente atentatório do princípio da igualdade (artigo 13º da CRP), para mais quando o benefício de isenção em apreço acarreta contrapartidas limitativas que coartam a autonomia dos proprietários dos referidos prédios, que se vêem limitados na sua actuação sobre o mesmo imóvel, contrapartidas estas que não diferenciadas em função de o Monumento Nacional ser um conjunto ou um só prédio (ou artigo matricial).
X. A interpretação da norma legal em que assenta a decisão recorrida não se poderá manter, por se revelar ilegal e inconstitucional, nos termos apontados, devendo a decisão do Tribunal a quo ser revogada em conformidade, o que se requer.

NESTES TERMOS deve o presente recurso proceder, revogando-se a decisão recorrida, com todas as consequências legais.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões de acordo com o disposto nos artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA e dos artigos 635.º, n.º 4, 639.º e 608.º, n.º 2 do CPC, são as de saber se os imóveis adquiridos pela Autora beneficiam de isenção de IMT.

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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
II – Fundamentação:
Factos Provados:

1. No dia 24.9.2014, a autora apresentou requerimento, endereçado à Direcção de Serviços do IMT, dirigido ao Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, alegando que vai adquirir vários imóveis, que identifica, e pedindo, nos termos do art. 6º al g) do CIMT, que seja reconhecida a isenção de IMT, aplicável aos referido imóveis por via da sua localização no Centro Histórico do Porto, classificado como monumento nacional (cfr. doc. junto com a p.i. e constante do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzido).

2. No dia 25 de Setembro de 2014, mediante a celebração de escrituras públicas de compra e venda, a autora adquiriu os seguintes prédios:
- Prédio urbano sito na Rua ..., no Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...56 da Freguesia de São Nicolau, e inscrito na matriz da União de freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória sob o no ...42... (antigo artigo matricial n o ...46 da extinta Freguesia de São Nicolau);
- Prédio urbano sito na Rua ..., no Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...4 da Freguesia de São Nicolau, e inscrito na matriz da União de freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, ..., São Nicolau e Vitória sob o no ...47...;
- Prédio urbano sito na Rua ...-A, no Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...4 da Freguesia de São Nicolau, e inscrito na matriz da União de freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória sob o nº ...52 U;
- Prédio urbano sito na Rua ..., no Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o no ...44 da Freguesia de São Nicolau, e inscrito na matriz da União de freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória sob o n o ...57... (antigo artigo matricial no ...49 da extinta Freguesia de São Nicolau) (docs. juntos com a p.i.).

3. Pela Direcção Regional da Cultura do Norte, em 12.6.2014, foi emitida certidão, com vista “à instrução de processo para obtenção de benefícios fiscais”, onde se certifica que «o imóvel identificado em C e B1 [prédio urbano sito na Rua ..., Porto, inscrito na matriz sob o art. ...49 da União de Freguesias de Cedofeita, Sto. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória], está classificado como Monumento Nacional (M.N.) de acordo com o nº 3 e nº 7 do art. 15º da Lei nº 107/2001, de 2001.09.08, D.R. 209, I Série-A, por estar inscrito na Lista do Património Mundial da Unesco, em 1986, como “Centro Histórico do Porto”». Mais se certifica que “o imóvel identificado em C e B1 faz parte integrante do conjunto denominado “Centro Histórico do Porto”, classificado como Monumento Nacional (M.N.)” (doc. nº 5 junto com a p.i.).

4. Pela Direcção Regional da Cultura do Norte, em 22.9.2014, foi emitida certidão, com vista “à instrução de processo para obtenção de benefícios fiscais”, onde se certifica que
«o imóvel identificado em C e B1 [prédio urbano sito na Rua ..., Porto, inscrito na matriz sob o art. ...47 da União de Freguesias de Cedofeita, Sto. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória], está classificado como Monumento Nacional (M.N.) de acordo com o nº 3 e nº 7 do art. 15º da Lei nº 107/2001, de 2001.09.08, D.R. 209, I Série-A, por estar inscrito na Lista do Património Mundial da Unesco, em 1986, como “Centro Histórico do Porto”)). Mais se certifica que “o imóvel identificado em C e B1 faz parte integrante do conjunto denominado “Centro Histórico do Porto”, classificado como Monumento Nacional (M.N.)” (doc. nº 5 junto com a p.i.).

5. Pela Direcção Regional da Cultura do Norte, em 22.9.2014, foi emitida certidão, com vista “à instrução de processo para obtenção de benefícios fiscais”, onde se certifica que «o imóvel identificado em C e B1 [prédio urbano sito na Rua ...­A, Porto, inscrito na matriz sob o art. ...52 da União de Freguesias de Cedofeita, Sto. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória], está classificado como Monumento Nacional (M.N.) de acordo com o nº 3 e nº 7 do art. 15º da Lei nº 107/2001, de 2001.09.08, D.R. 209, I Série-A, por estar inscrito na Lista do Património Mundial da Unesco, em 1986, como “Centro Histórico do Porto”)). Mais se certifica que “o imóvel identificado em C e B1 faz parte integrante do conjunto denominado “Centro Histórico do Porto”, classificado como Monumento Nacional (M.N.)” (doc. nº 5 junto com a p.i.).

6. Pela Direcção Regional da Cultura do Norte, em 22.9.2014, foi emitida certidão, com vista “à instrução de processo para obtenção de benefícios fiscais”, onde se certifica que «o imóvel identificado em C e B1 [prédio urbano sito na Rua ..., Porto, inscrito na matriz sob o art. ...46 da União de Freguesias de Cedofeita, Sto. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória], está classificado como Monumento Nacional (M.N.) de acordo com o nº 3 e nº 7 do art. 15º da Lei nº 107/2001, de 2001.09.08, D.R. 209, I Série-A, por estar inscrito na Lista do Património Mundial da Unesco, em 1986, como “Centro Histórico do Porto”». Mais se certifica que “o imóvel identificado em C e B1 faz parte integrante do conjunto denominado “Centro Histórico do Porto”, classificado como Monumento Nacional (M.N.)” (doc. nº 5 junto com a p.i.).

7. Em 24.9.2014, foram efectuadas as liquidações de IMT, relativamente à aquisição onerosa do direito de propriedade sobre os prédios identificados em 2., no valor total de € 200.874,75 (docs. juntos com a p.i.).

8. No dia, 25.9.2014, através de cheque, a autora procedeu ao pagamento das liquidações de IMT (doc. junto com a p.i., a fls. 47 do proc. físico).

Factos não Provados:
Inexistem factos não provados com relevância para a decisão a proferir.

Motivação:
A convicção do tribunal baseou-se nos documentos apresentados com a petição inicial e constantes do PA, como se indicou ao longo dos factos provados.

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Apreciação jurídica do recurso.

Alega a Recorrente que a classificação de um conjunto de prédios como monumento nacional implica que o conjunto desses prédios detém tal classificação, não carecendo os prédios que constituem o conjunto de qualquer classificação individualizada como monumento nacional/imóvel de interesse público, pelo que a interpretação efetuada pela sentença de que o prédio deve estar individualmente classificado para poder beneficiar de isenção de IMT, está incorreta.
Alega, ainda, a Recorrente que a interpretação da norma da alínea g) do artigo 6.º do Código do IMT, no sentido de a classificação do imóvel ter de ser individual, também no caso de imóveis de interesse nacional, redunda numa inconstitucionalidade material dessa norma, por violação do princípio da igualdade, na medida em que a poupança financeira permitida com a isenção de IMT, deverá ser adstrita aos encargos com a conservação e deveres que lhe são impostos, que não são distintos dos tidos com os prédios detentores de uma classificação individual.
A sentença recorrida entendeu que a isenção de IMT apenas está prevista para os imóveis individualmente classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal e não para imóveis classificados como integrantes de um conjunto.
Relativamente à alegada inconstitucionalidade, a sentença referiu que a classificação individual apresenta características únicas, que o distingue dos demais e por isso lhe é conferida especial proteção e impostos especiais deveres aos proprietários.
Apreciando.
Na situação em apreço nos autos, o pedido de isenção reporta-se ao ano de 2014, pelo que se deve ter em atenção a redação da lei aplicável, em vigor nessa data, que era a conferida pelo artigo 116.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2011). Assim, no ano de 2014, estabelecia o artigo 6.º do Código do IMT, o seguinte:
Artigo 6.º Isenções
Ficam isentos de IMT:
(…)
g) As aquisições de prédios individualmente classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável.

A redação inicial deste artigo 6.º era a seguinte:
Artigo 6.º Isenções
Ficam isentos de IMT:
(…)
g) As aquisições de prédios classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal, ao abrigo da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro;

A norma em apreço teve duas alterações: uma foi a introdução do advérbio de modo “individualmente”; e outra a de que a classificação resultava da lei aplicável e não apenas da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.
Desta forma, verifica-se, por um lado, que referindo a norma que a classificação resulta da legislação aplicável, se deve ter em atenção toda a legislação nacional ou internacional a que o Estado esteja vinculado, sobre a classificação do património arquitetónico.
Por outro lado, a introdução do advérbio de modo “individualmente” classificado, pretendeu efetivamente realizar uma alteração nos requisitos de isenção de IMT; a qual seja, a de que os prédios isentos deste imposto, devem estar individualmente classificados e não conjuntamente.
Neste sentido pronunciou-se já o Supremo Tribunal Administrativo em 07/02/2024, no processo n.º 01977/19.8BEPRT, segundo o qual a interpretação a conceder ao disposto na alínea g) do artigo 6.º do Código do IMT, deve ser no sentido de que apenas estão isentos deste imposto, os prédios individualmente classificados, conforme se pode ver pala seguinte passagem do citado Acórdão:
«(…) enquanto, em cédula de IMT, desde 1 de janeiro de 2011, só as aquisições dos prédios classificados, individualmente, como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável, passaram a poder beneficiar da respetiva isenção. Ou seja, em termos concretos, o legislador introduziu o advérbio, de modo, “individualmente”, para os prédios classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, desde 1 de janeiro de 2007, no IMI, e concretizou o mesmo acrescento, adverbial, após 1 de janeiro de 2011, em IMT, para os imóveis classificados como de interesse nacional (diferentemente), de interesse público ou de interesse municipal.
Sendo, pois, inquestionável a diferença de vontade, do legislador, expressa, num caso e noutro, importando, ainda, ter presente que a alteração produzida no IMT ocorreu quatro anos após a que havia sido concretizada para o IMI, não sendo admissível, nem sustentável, o (seu) desconhecimento dos moldes desta pioneira modificação e a nítida distinção, no posicionamento, frásico, do, comum, aditado “individualmente”, temos de, forçosamente, concluir pela existência da previsão de isenções de IMT e IMI que assentam em pressupostos, condições, exigências legais, diferentes, no que tange aos prédios classificados como monumentos nacionais (de interesse nacional), circunstância que, só por si, inviabiliza uma interpretação do disposto no art. 6.º al. g) do CIMT em moldes iguais ao da previsão do art. 44.º n.º 1 al. n) do EBF.».

Relativamente à invocação da Recorrente, sobre a certidão onde consta a classificação do imóvel em apreço, fazendo crer que a isenção de IMT deve ser concedida em função de tal certidão, conforme a respetiva redação, apenas se pode dizer, que a isenção de IMT não é concedida pelo tipo de modelo do impresso ou segundo a redação da certidão, mas tal concessão decorre da Lei. Assim, não é o impresso ou sequer o que nele vai redigido, que alguma vez possa conceder um direito que apenas a Lei consente.
Assim, no caso em apreço, nunca está mencionado na certidão que o prédio da Recorrente se encontra individualmente classificado, mas que a classificação como monumento nacional, resulta de o prédio estar inscrito na Lista do Património Mundial da UNESCO, fazendo parte do conjunto denominado como «Centro Histórico do Porto» - vide pontos 3, 4, 5 e 6 da matéria e facto. Portanto a classificação dos prédios em apreço como monumento nacional, resulta do facto de se encontrarem integrados num conjunto arquitetónico de diversos imóveis, não que cada um desses prédios possua condições de, por si só, poder ser classificado como monumento nacional.
Conforme já referido, apenas a classificação individual é que permite conceder a isenção de IMT, não a classificação em conjunto com outros imóveis. Não detendo os imóveis adquiridos pela Recorrente uma classificação individualizada para cada um, não existe isenção de IMT.

No que concerne à alegação de que uma classificação em conjunto também se trata de uma classificação individual de cada prédio, tal argumento não é de acolher.
Isto porque, se uma classificação individual é a mesma coisa que a classificação de um conjunto, então não se percebe o motivo pelo qual a Lei faz essa distinção. Se a Lei faz a distinção, é porque um imóvel classificado em conjunto com outros, não tem a mesma categoria para ser classificados individualmente, pelo que a classificação só vale enquanto integrado no conjunto de imóveis que coletivamente foram classificados. Portanto, a valia do imóvel classificado num conjunto de imóveis, não é a mesma que a de um imóvel individualmente classificado. O imóvel classificado individualmente vale por si mesmo, enquanto os imóveis classificados num conjunto, só enquanto integrado num conjunto de imóveis, é que acabam por possuir a categoria segundo a qual foram classificados. Significa isto, que se está a tratar de diferentes realidades.

Por sua vez, no que concerne à invocação de que a poupança financeira permitida com a isenção de IMT, deverá ser adstrita aos encargos com a conservação, é apenas um argumento e não uma verdadeira alegação de uma interpretação inconstitucional de uma norma legal. Isto porque, salvo melhor entendimento, uma alegação nesse sentido, carecia de invocar e demonstrar que o legislador teve em mente isentar as aquisições de IMT, para que o valor decorrente dessa poupança, fosse alocado à manutenção do imóvel. Não estando descortinada a intenção do legislador em isentar de IMT, não se vislumbra que possa haver violação do princípio da igualdade entre a isenção de IMT para os imóveis individualmente classificados e os classificados conjuntamente.
O Estatuto dos Benefícios Fiscais prevê situações de reabilitação urbana que concedem isenção de IMI (vide artigo 45.º do EBF), mas não prevê isenção de IMT, pelo que, não é possível concluir que a poupança que pudesse haver com a dispensa de pagamento de IMT, fosse intenção do legislador que tal poupança tivesse de ser alocada a obras de restauro ou conservação do imóvel adquirido.
No entanto, sempre se diga, que estão em causa realidades diferentes, tal como decorre da legislação aplicável, que chamamos à colação e que é o artigo 1.º da Convenção para a Salvaguarda do Património Arquitetónico da Europa (aliás, referida na sentença recorrida), que teve lugar em Granada (aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 5/91 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República nº 5/91), que estabelece:
«Artigo 1.º
Para os fins da presente Convenção, a expressão «património arquitectónico» é considerada como integrando os seguintes bens imóveis:
1) Os monumentos: todas as construções particularmente notáveis pelo seu interesse histórico, arqueológico, artístico, científico, social ou técnico, incluindo as instalações ou os elementos decorativos que fazem parte integrante de tais construções;
2) Os conjuntos arquitectónicos: agrupamentos homogéneos de construções urbanas ou rurais, notáveis pelo seu interesse histórico, arqueológico, artístico, científico, social ou técnico, e suficientemente coerentes para serem objecto de uma delimitação topográfica;
3) Os sítios: obras combinadas do homem e da natureza, parcialmente construídas e constituindo espaços suficientemente característicos e homogéneos para serem objecto de uma delimitação topográfica, notáveis pelo seu interesse histórico, arqueológico, artístico, científico, social ou técnico.».

Salvo melhor interpretação, podemos retirar do citado normativo, que uma classificação individual implica algo mais do que uma classificação de um conjunto arquitetónico, pois inclui as instalações e os elementos decorativos, situações não abrangidas para as classificações de conjuntos de imóveis. Donde decorre, que também será diferente o tipo de manutenção exigida a tais imóveis, pelo não se vislumbra que haja violação do princípio da igualdade.


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Face ao exposto, o recurso não merece provimento.
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No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
Apenas os prédios individualmente classificados como de interesse nacional (monumentos nacionais), de interesse público ou de interesse municipal, estão isentos de IMT, não beneficiando desta isenção os prédios classificados em conjunto.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Subsecção Tributária Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Porto, 31 de outubro de 2024.

Paulo Moura
Maria Celeste Oliveira
Isabel Ramalho dos Santos]