Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01062/17.7BEPRT-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/19/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:João Beato Oliveira Sousa
Descritores:PROVIDÊNCIA ANTECIPATÓRIA; TRABALHO TEMPORÁRIO; ISS, IP
Sumário:
A tutela provisória pode produzir o mesmo efeito que a tutela comum, mas não a título definitivo, como se comprova pela previsão do artigo 112º/2/b)/c)/d) do CPTA, que contempla exemplificativamente situações de antecipação funcional da decisão definitiva, cuja instrumentalidade praticamente se afere e esgota no seu carácter provisório. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:NC– ETT, Ld.ª
Recorrido 1:INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Providência Cautelar Antecipatória - Recurso jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:
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RELATÓRIO
NC– ETT, Ld.ª veio interpor recurso da sentença do TAF do PORTO que indeferiu o decretamento de providência cautelar antecipatória, consubstanciada na condenação provisória à prática dos actos legalmente devidos, contra o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL I.P., simultaneamente com a propositura da acção administrativa de anulação dos actos que de seguida se identificam e de condenação à prática dos actos legalmente devidos.
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Conclusões da Recorrente:
1 - Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, que indeferiu as providências cautelares requeridas nos autos, considerando não se verificarem os requisitos legais para o seu decretamento.
2 - A Recorrente não se conforma com tal decisão, considerando que a mesma padece de erro de julgamento, em matéria de facto e matéria de direito.
3 - As questões objeto da douta sentença recorrida que merecem a discordância da Recorrente são as seguintes:
1 - Fixação do valor da causa;
2 - Pedido de ampliação objetiva da instância;
3 - Antecipação do Juízo da causa principal;
4 - Caducidade do direito de acção por intempestividade, relativamente aos requerimentos identificados nos pontos 1 a 6 do artigo 6 do requerimento inicial;
5 - Requisitos do decretamento da providência cautelar;
6 - Convolação para o meio processual principal urgente de intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias, artigo 109 CPTA.
4 - Relativamente à questão da fixação do valor da causa, considerou a douta sentença que, com as providências cautelares requeridas, a Recorrente visa evitar um prejuízo no valor de €68.000,00, cfr. artigo 170 do requerimento inicial, tendo atribuído esse valor à causa, nos termos do artigo 31 n° 1 e 32 n° 6 do CPTA e artigo 306 nºs 1 e 2 do CPC.
5 - Com a devida vénia, a Recorrente não se conforma com o valor atribuído à causa, por considerar que, com o decretamento da providência requerida, não visa evitar a ocorrência de prejuízos avaliados em €68.000,00.
6 - A quantia de €68.000,00, diz respeito ao valor das faturas que os clientes da Requerente deixaram de pagar por força da situação descrita nos autos, encontrando-se a ser reclamada através das competentes injunções europeias.
7 - Com o devido respeito, os prejuízos que a Recorrente pretende evitar com as providências cautelares não se deverão cingir aos valores que a Recorrente, à data da propositura da acção, estava a tentar recuperar dos seus clientes.
8 - A Recorrente considera que os prejuízos que pretende evitar com as providências cautelares requeridas nos autos não possuem tradução pecuniária direta, uma vez que se reconduzem à reposição da legalidade, manutenção do exercício normal da atividade da Recorrente, manutenção e subsistência da empresa e dos postos de trabalho, e fazer face aos eventuais processos-crime e contraordenacionais decorrentes da inspeção da URSSAF.
9 - Na falta de um valor objetivamente determinável dos prejuízos da Recorrente que justificam o decretamento das providências, a mesma considerou adequado atribuir o valor de €5.000,01 à causa, valor que não mereceu contestação por parte da Requerida.
10 - Pelo que, com a devida vénia, requer que seja aceite e fixado o valor atribuído aos autos de €5.000,01, ao invés do fixado na douta sentença, o que peticiona, com todas as consequências legais.
11- Relativamente ao pedido de ampliação objetiva da instância, referido no ponto 2 da conclusão 3, conforme resulta dos autos, a Recorrente, através do seu requerimento de tis 278 a 296, requereu a ampliação objetiva da instância, no sentido de pretender abranger ou estender a decisão a proferir nos autos a mais duas decisões de indeferimento idênticas às dos autos, relativas aos requerimentos RV1018 apresentados em 8/05/2017 e 12/06/2017.
12 - Abstratamente, a douta sentença subsumiu os pedidos de ampliação objetiva da instância ao disposto no artigo 63 n° 1 do CPTA, tendo concluído que a cumulação superveniente é admissível se os pedidos pudessem, desde logo, ser cumulados ab initio, ou seja, desde que estejam verificados os requisitos da cumulação inicial de pedidos."
13 - Conclui igualmente a douta sentença, ser admissível a ampliação objetiva da instância em sede cautelar.
14 - Descendo ao caso concreto, considera a douta sentença que, nos autos, a Recorrente não pretende proceder a uma ampliação objetiva da instância, mas sim a uma ampliação da causa de pedir primitiva, aumentando o universo de trabalhadores destacados por via da apresentação de mais dois requerimentos de autorização da sujeição à legislação da Segurança Social portuguesa de trabalhadores destacados que não obtiveram resposta favorável da Requerida.
15 - Subsumindo assim o requerimento da Recorrente à disciplina dos articulados supervenientes, prevista no artigo 86 n° 1 do CPTA, considerando não serem os mesmos admissíveis em sede cautelar, indeferindo o pedido de ampliação da instância formulado pela Recorrente,
16 - A Recorrente não se conforma com o enquadramento da situação dos autos ao regime dos articulados supervenientes previsto no artigo 86 n° 1 do CPTA, considerando que o seu requerimento deverá ficar sujeito ao disposto nos artigos 63 n° 1 e artigo 4 n° 1 alíneas a) e b) do CPTA.
17 - Tal como se conclui na douta sentença, a Recorrente considera que o pedido de ampliação da instância, no caso concreto, está intimamente relacionado com a cumulação inicial de pedidos, por aplicação da parte final do n° 1 do artigo 63 do CPTA.
18 - Sendo possível ampliar a instância, para abranger mais requerimentos RV1018 e trabalhadores, relativamente aos quais se devem estender os efeitos da providência a decretar nos autos, se, inicialmente, fosse possível incluir os respetivos requerimentos RV1018 na petição inicial do presente processo cautelar.
19 - Ora, nos presentes autos, inicialmente, foram cumulados diversos requerimentos RV1018, apresentados em períodos diferentes, que abrangeram diferentes trabalhadores e que foram objeto de despachos de indeferimento diferentes, não tendo existido, por parte do Tribunal, qualquer entrave a que tais requerimentos fossem abrangidos na mesma petição inicial, para serem objeto de apreciação e decisão conjunta.
20 - Não se compreende pois, como, perante os mesmos pressupostos e circunstâncias fáticas, o Tribunal tenha agora entendimento diferente, não admitindo a inclusão destes novos requerimentos apresentados no âmbito da mesma relação material, para serem igualmente abrangidos pela providência requerida, tal como foram os requerimentos e despachos de indeferimento iniciais, considerando antes estarmos na presença de uma ampliação da causa de pedir através de articulado superveniente, nos termos do artigo 86 do CPTA.
21 - A Recorrente considera, pois, ter existido erro de julgamento em matéria de direito quanto a esta questão, impondo-se a revogação da douta sentença, substituindo-se a mesma por douto acórdão que admita o requerimento da Recorrente de folhas 335 a 344, conforme requerido, com todas as consequências legais.
22 - No que tange à questão da antecipação do juízo da causa principal, referida no ponto 3 da conclusão 3, a douta sentença indeferiu o pedido de antecipação formulado nos autos, considerando que não se verificava um dos respetivos requisitos cumulativos previstos no n° 1 do artigo 121 do CPTA, designadamente, a urgência na resolução definitiva, tendo dito o seguinte:
"Na verdade, não existe, nos presentes autos, uma urgência qualificada que torne insuficiente a tutela provisória cautelar, antes se afigurando que esta se mostra apta a evitar a situação alegadamente irreversível a que a Requerente se refere no requerimento inicial.".
23 - Com a devida vénia, a Recorrente não se pode conformar com tal decisão, considerando que a douta sentença se limitou a formular um juízo conclusivo, não indicando as razões pelas quais considera não estarmos perante uma urgência qualificada na resolução definitiva das questões dos autos, sendo a tutela cautelar suficiente para defesa dos interesses da Recorrente.
24 - Com a devida vénia, entende a Recorrente que a natureza eminentemente antecipatória das providências cautelares requeridas e a relevância e natureza dos interesses abrangidos pela questão dos autos expostos no artigo 154 e seguintes do requerimento inicial, imprime uma especial urgência na decisão dos autos.
25 - Por outro lado, a necessidade de esclarecer as questões jurídicas que antagonizam a Recorrente à Segurança Social demandam uma decisão definitiva impossível de alcançar no processo cautelar.
26 - Pelo que, com a devida vénia, no entender da Recorrente, justificava-se e justifica-se a antecipação do juízo final em sede cautelar, considerando-se estarem reunidos todos os requisitos para a antecipação do juízo da causa principal, nos termos do artigo 121 n° 1 do CPTA, designadamente, a urgência na resolução definitiva da questão.
27 - Ao decidir em sentido contrário, com o devido respeito, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento em matéria de facto e direito, devendo, por isso, ser revogada e substituída por douto acórdão, que, reconhecendo a verificação dos pressupostos para o decretamento das providências requeridas, como infra se peticionará, ordene ou promova a antecipação do juízo da decisão principal, nos autos cautelares, o que requer, com todas as consequências legais.
28 - Quanto à questão da impugnabilidade dos actos identificados nos pontos 5, 6 e 7 da matéria de facto assente, referida no ponto 4 da conclusão 3,
29 - Considera a douta sentença, de acordo com a contagem dos respetivos prazos para a impugnação contenciosa dos referidos actos, que, a quando da propositura dos presentes autos cautelares, os actos eram já impugnáveis,
30 - Tendo decretado a absolvição da instância da Requerida relativamente a esses actos, nos termos do artigo 89 n° 1 alínea k) do CPTA.
31 - A Recorrente não se conforma com tal decisão, considerando que, a quando da propositura dos presentes autos, os actos em questão eram ainda impugnáveis, em consequência da Requerida ter indicado nos respetivos ofícios de notificação de tais actos, que o prazo de impugnação contenciosa se suspenderia, caso fosse apresentado recurso hierárquico.
32 - Efetivamente, nos ofícios de notificação dos actos de indeferimento relativos aos requerimentos identificados nos pontos 2, 3, 4 e 6, do artigo 6 do requerimento inicial, documentos 5, 6, 7 e 9 que instruíram o requerimento inicial, A Administração da Segurança Social referiu, expressamente:
"Informa-se que dispõe dos seguintes prazos:


3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenham reclamado ou recorrido hierarquicamente."
33 - Em todas as situações abrangidas nos pontos 5, 6 e 7 da matéria de facto assente, a Recorrente interpôs recurso hierárquico, conforme resulta dos respetivos documentos juntos aos autos e dos pontos 5, 6 e 7 da matéria de facto assente, não tendo os mesmos ainda sido decididos,
34 - Pelo que, aquando da propositura dos presentes autos, a Recorrente considerou, legitimamente, seguindo a informação transmitida pela Requerida, que os respetivos actos eram ainda impugnáveis, devido à suspensão do prazo de impugnação contenciosa decorrente da pendência do recurso hierárquico que se manteria até à respetiva decisão.
35 - A Requerida fez constar de um documento oficial, uma informação errada que transmitiu à Recorrente, quando tem o dever legal de agir de boa-fé e de respeitar o princípio da legalidade.
36 - A Recorrente não poderá ser prejudicada por confiar e acreditar numa informação oficialmente transmitida pela Administração pública, sob pena da violação das mais elementares regras do Estado de Direito.
37 - Pelo que, face ao exposto, considera a Recorrente que os actos em questão eram ainda impugnáveis aquando da propositura dos presentes autos, não se verificando a exceção dilatória declarada nos autos.
38 - Igual entendimento é perfilhado por este Tribunal Central Administrativo Norte, conforme se extrai do ac. Datado de 5/02/2016, proferido no proc. 00178/10.5BEMDL, da 1ª Secção - Contencioso Administrativo, cujo respetivo sumário, com a devida vénia, se transcreve, destacando os pontos 2 e 3:
Sumário:
1 - Resulta do artigo 58.° n° 2 do CPTA que os atos administrativos que enfermam de mera anulabilidade podem ser impugnados, em regra, no prazo de três meses, a contar da data da notificação do ato a impugnar. A contagem do prazo de três meses, estabelecido no art. 58, n.º 2, al. b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) para a impugnação de atos administrativos, quando esse prazo abranja período correspondente a férias judiciais é contínuo, mas suspende-se durante as férias judiciais. Assim, quando o prazo abranja período em que decorram férias judiciais, deve o referido prazo de três meses ser convertido em 90 dias, para efeito da suspensão imposta pelo artigo 138.°, números 1 e 4 do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 58.°, número 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
2 - Mesmo estando-se perante um Recurso Hierárquico Facultativo, tendo aquando da notificação do ato a Administração feito constar do correspondente oficio que o prazo de recurso à via contenciosa se suspenderá "caso tenha recorrido hierarquicamente", em consideração, designadamente, ao princípio da boa-fé, tal determinará que aquela se tenha auto vinculado a tal comando, em face do que ficará suspenso o prazo de apresentação da Ação Contenciosa.
3 - Mostra-se legítimo que o destinatário de ato que aguarda decisão hierárquica, perante a ausência de resposta tempestiva da Administração, opte por não reagir ao silêncio desta, a qual manterá o dever de decidir.
39 - Pelo exposto, com a devida vénia, entende a Recorrente ter existido erro de julgamento em matéria de facto e de direito, relativamente à questão da intempestividade/caducidade do direito de acção, relativamente aos actos identificados na douta sentença.
40 - Por se mostrar essencial para a boa decisão da causa, impõe-se, no entender da Recorrente, proceder ao aditamento na matéria de facto assente, de um ponto relativo a esta matéria, propondo-se a seguinte redação:
15 - A Administração da Segurança Social, nos respetivos ofícios de notificação dos despachos impugnados, relativos aos requerimentos identificados nos pontos 2, 3, 4 e 6, do artigo 6 do requerimento inicial, documentos 5, 6, 7 e 9 que instruíram o requerimento inicial, referiu, expressamente:
"Informa-se que dispõe dos seguintes prazos:


3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenham reclamado ou recorrido hierarquicamente."
41 - Pelo exposto, deverá ser revogada a decisão de absolvição da instância proferida nos autos, e substituída por douto acórdão que, aditando um novo ponto à matéria de facto assente, considere que, à data da propositura dos presentes autos, os actos administrativos em causa eram ainda impugnáveis.
42 - Relativamente à questão dos requisitos para o decretamento das providências cautelares, referido no ponto 5 da conclusão 3, considera a douta sentença que, nos autos, não se verificam os requisitos da instrumentalidade e provisoriedade, nos termos dos artigos 112 e 113 do CPTA, tendo, consequentemente, indeferido as providências requeridas.
43 - A Recorrente não se conforma igualmente com tal decisão, considerando ter existido erro de julgamento em matéria de direito, por violação dos artigos 112 e 113 do CPTA, impondo-se decisão em sentido contrário.
44 - Relativamente ao requisito da instrumentalidade, face à natureza das questões suscitadas nos autos e aos interesses em causa, as providências cautelares requeridas, no entender da Recorrente, mostram-se absolutamente necessárias para evitar o "Periculum in mora" alegado nos autos.
45 - A regulação provisória da situação dos autos, face ao lapso de tempo necessário para decidir definitivamente o processo principal, é a única forma realista de acautelar os direitos e interesses da Recorrente e de evitar a concretização ou a irreversibilidade dos prejuízos alegados nos autos.
46 - No que tange ao requisito da provisoriedade, apesar de a douta sentença recorrida admitir a possibilidade da providência cautelar poder coincidir com a pretensão definitiva requerida no processo principal, no caso concreto, entendeu a douta sentença que as providências, sendo decretadas, esgotam e consolidam a situação dos autos, tomando irreversível qualquer decisão favorável à Recorrente, pelo que não cumprem com o requisito da provisoriedade, pois implicaria a inutilidade da decisão a proferir no processo principal.
47 - A Recorrente discorda frontalmente de tal entendimento, considerando que as providências dos autos são iminentemente antecipatórias, admitidas nos termos do n° 1 do artigo 112 do CPTA, e, por isso, o seu efeito é idêntico à respetiva tutela definitiva,
48 - Contudo, no caso dos autos, o decretamento das providências requeridas não inviabiliza uma decisão definitiva nos autos principais em sentido diverso, pois que nada obsta a que as autorizações de destacamento concedidas em sede cautelar sejam posteriormente revogadas, que terá como único efeito a anulação das contribuições e quotizações efetuadas a favor da Segurança Social e devolução das respetivas quantias à Recorrente.
49 - Pelo que, com a devida vénia, deverá reconhecer-se nos autos que se verifica igualmente o requisito da provisoriedade, pressuposto para o decretamento das providências requeridas.
50 - Pelo que, ao ter decidido em sentido diferente, a douta sentença incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, devendo por isso ser revogada e substituída por douto acórdão que considere verificados os requisitos da instrumentalidade e provisoriedade, inerentes aos processos cautelares, e que, em consequência, conheça os pedidos cautelares formulados nos autos, ou, se assim o entender, que ordene a baixa dos autos ao Tribunal recorrido para conhecimento dos mesmos, com todas as consequências legais.
51 - Relativamente à questão da convolação dos presentes autos cautelares para o processo principal urgente para a proteção de direitos, liberdades e garantias, previsto no artigo 109 do CPTA, que se enumerou no ponto 6 da conclusão 3,
52 - Considera a douta sentença recorrida não ser de admitir nos autos, por entender que a Recorrente não invocou a necessidade urgente de proteção definitiva de um direito, liberdade ou garantia, nem que tal se vislumbra na causa de pedir.
53 - Com o devido respeito, a Recorrente discorda de tais conclusões, considerando ter existido erro de julgamento em matéria de facto e de direito.
54 - Com efeito, a Recorrente considera que estão reunidos os requisitos da instrumentalidade e provisoriedade inerentes aos processos cautelares, pelo que deverão ser apreciados e decididos os respetivos pedidos, todavia, se este venerando Tribunal assim o não entender, pugna pela convolação dos presentes autos no processo principal urgente previsto no artigo 109 n° 1 do CPTA,
55 - Pois que, face aos seus articulados e requerimentos de antecipação da causa principal, é manifesto que resulta a alegação da necessidade urgente de proteção dos direitos que visa proteger com os presentes autos.
56 - Pelo exposto, deverá a douta sentença ser revogada, substituindo-se a mesma por douto acórdão que proceda à convolação dos presentes autos para o processo principal urgente de intimação para a proteção de um direito, liberdade ou garantia, previsto no artigo 109 do CPTA, caso considere, tal como a douta decisão recorrida, que não estão reunidos nos autos os requisitos da instrumentalidade e provisoriedade para que sejam admitidas as providências cautelares requeridas nos autos, o que requer, com todas as consequências legais.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Ex.ª, requer se dignem admitir o presente recurso, julgando o mesmo totalmente procedente, por provado, e, em consequência, seja revogada a douta sentença recorrida, substituindo-se a mesma por douto acórdão que defira todos os pedidos da Recorrente formulados no presente recurso, designadamente, as constantes das conclusões 10, 21, 27, 41, 50 e 56, com todas as consequências legais.
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FACTOS
Consta na sentença:
Com interesse para a presente decisão, consideram-se indiciariamente provados os seguintes factos:
1) A requerente e uma sociedade comercial por quotas, cujo objecto social, em 27/01/2014, era a selecção e colocação temporária de pessoal, sendo que, a partir de 19/03/2015, passou a inclui a cedência temporária de pessoal, orientação e formação profissional, consultadoria e gestão de recursos humanos e prestação de serviços de limpeza geral em edifícios e serviços conexos e, a partir de 19/07/2016, passou a incluir também a construção civil de obras públicas e particulares (inscrições 1, 2 e 4 da certidão permanente do registo comercial de fls. 54 a 58 do processo físico).
2) À requerente foi atribuído o alvará de empresa de trabalho temporário n.º 768/15 (alvará de fls. 59 do processo físico).
3) No âmbito da actividade referida no ponto anterior, a requerente apresentou, junto da entidade requerida, os requerimentos datados de 23 07 2015, 16 09 2015, 15 10 2015, 09 11 2015, 30 05 2016, 16 11 2016, 12 12 2016, 27 12 2016 e 23 01 2017, solicitando a sujeição a legislação portuguesa da Segurança Social dos trabalhadores temporários que iriam ser colocados ao serviço das correspondentes empresas utilizadoras situadas em França, os quais foram indeferidos expressamente, pela entidade requerida, por despachos datados de 14/08/2015, 19/10/2015, 04/11/2015, 03/12/2015, 08/07/2016, 10/02/2017 (três) e 06/03/2017, respectivamente (documentos de fls. 62 a 71 e 75 a 91 do processo físico e documentos n.º 3 das pastas 1, 2, 3, 4, 6, 7, 8, 9 e 10 do CD de fls. 136 do processo físico).
4) Ainda no âmbito da actividade referida em 2), a requerente apresentou junto da entidade requerida, requerimentos datados de 30/11/2015, 24/01/2017, 16/02/2017, 01/03/2017, 06/03/2017, 23/03/2017, 19/04/2017 e 28/04/2017, os quais foram objecto de proposta de intenção de deferimento, mas não de decisão final (documentos de fls. 72 a 74 e 92 a 118 do processo físico e documentos n.º 1 das pastas 5, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 do CD de fls. 136 do processo físico).
5) A requerente reclamou, em 07/09/2015, perante a entidade requerida, do despacho de indeferimento datado de 14/08/2015, do qual teve conhecimento no dia 19/08/2015, tendo a referida reclamação sido indeferida por despacho de 19/10/2015, de que terá sido notificada no dia 21/10/2015, tendo apresentado recurso, perante a mesma entidade, em 14/01/2016, o qual foi remetido ao órgão decisor em 16/02/2016, não tendo ainda sido decidido (respectivamente, documentos n.º 4, 5, 6, registo da carta recurso hierárquico 13 de Janeiro 2016 e 7 da pasta 1 do CD de fls. 136 do processo físico).
6) A requerente apresentou recursos, em 14/01/2016, perante a entidade requerida, dos despachos de indeferimento datados de 19/10/2015, 04/11/2015, 03/12/2015 e da omissão ilegal do dever de decidir do requerimento de 30/11/2015, os quais foram remetidos ao órgão decisor em 16/02/2016, não tendo ainda sido decididos (documentos n.º 4, 5 e registo da carta recurso hierárquico 13 de Janeiro 2016 das pastas 2, 3 e 4 e documentos n.º 2, 3 e registo da carta recurso hierárquico 13 de Janeiro 2016 da pasta 5 do CD de fls. 136 do processo físico).
7) A requerente apresentou recurso, em 07/10/2016, perante a entidade requerida, do despacho de indeferimento datado de 08/07/2016, o qual foi remetido ao órgão decisor em 25/10/2016, não tendo ainda sido decidido (documentos n.º 4, 5 e registo da carta recurso hierárquico 13 de Janeiro 2016 da pasta 6 do CD de fls. 136 do processo físico).
8) No ano de 2014, a requerente obteve um total de rendimentos do período no valor de 267.659,21€ (fls. 79 e documento IRC – MOD22 da pasta documentos que acompanham os requerimentos RV1018 da pasta 8 do CD de fls. 136 do processo físico).
9) No ano de 2015, a requerente obteve um total de rendimentos do período no valor de 728.137,21€ (fls. 79 e documento IRC – MOD22_2015 da pasta documentos que acompanham os requerimentos RV1018 da pasta 4 do CD de fls. 136 do processo físico).
10) No ano de 2016, a requerente obteve um total de rendimentos do período no valor de 1.173.137,00€ (fls. 80 do processo físico).
11) A requerente intentou 13 processos de injunção europeus contra várias empresas francesas, para cobrança de dívidas, no valor global de 67.464,00€ (13 documentos da pasta INJUNÇÕES do CD de fls. 136 do processo físico).
12) A URSSAF, autoridade francesa, remeteu à requerente uma carta datada de 22/09/2016, sobre o controlo no âmbito da luta contra o trabalho não declarado a que esta foi sujeita, assinada pelo inspector da colecta FM (carta de fls. 125 e 126 do processo físico).
13) Em 07/12/2016, a requerente recebeu um e-mail da empresa francesa B…, no qual se refere que a parceria estabelecida entre ambas as empresas não pode continuar e que não será paga a factura que está em dívida, até que a situação da requerente com a URSSAFF esteja resolvida (e-mail de fls. 133 do processo físico).
14) A presente acção foi instaurada no dia 03/05/2017 (fls. 3 do processo físico).
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O Ministério Público foi notificado nos termos do artigo 146º/1 CPTA.
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DIREITO
Segue-se a apreciação das críticas submetidas á apreciação desse Tribunal.
Fixação do valor da causa (Conclusões 4-10)
Decidiu o TAF:
«Dispõe o artigo 32.º, n.º 6 do CPTA que “o valor dos processos cautelares é determinado pelo valor do prejuízo que se quer evitar, dos bens que se querem conservar ou da prestação pretendida a título provisório.”.
Com a presente acção, a requerente pretende evitar a ocorrência de prejuízos que estimou em € 68.000,00 (cfr. Artº 170º do r.i.).
Face ao exposto, fixo o valor da acção em 68.000,00€ (sessenta e oito mil euros).»
A Recorrente, impugnando, pretende que o valor da causa é indeterminável e deve ser fixado em € 5.000,01.
Ou seja, embora sem mencionar a norma, pretende que o caso seja regido pelo critério supletivo do artigo 34º/2 CPTA, “Quando o valor da causa seja indeterminável, considera-se superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo”.
Nesse pressuposto normativo o cálculo feito pela Recorrente é errado, pois o valor da causa seria então de €30.000,01.
Mas nada impede que na mesma providência se pretenda evitar cumulativamente diversos tipos de prejuízos, uns determináveis e outros indetermináveis. Como é o caso.
Nesta hipótese, existindo prejuízos quantificáveis que excedem o valor de €30.000,01 inerente ao critério supletivo, é razoável utilizar o critério geral previsto no artigo 32º/6 CPTA.
A Recorrente pretende afastar a relevância dos aludidos €68.000,00 para efeito de fixação do valor da causa, alegando que dizem respeito a valores de facturas que os clientes deixaram de pagar e se encontram a ser reclamados através das competentes injunções europeias.
Mas o facto de tais valores serem reclamados noutra instância estrangeira não os arreda do objectivo prosseguido com a presente providência cautelar.
Pelo contrário, a própria Recorrente associa a recusa de pagamento dessas facturas ao indeferimento pela Segurança Social dos requerimentos que são objecto desta providência. Como consta no corpo da sua alegação de recurso:
“Mais acrescentou, artigo 171 e sgs do requerimento inicial, que os clientes da Recorrente se recusam naturalmente a contratar os seus serviços enquanto esta não apresentar os referidos modelos A1, o que, na prática, impede a Requerente de exercer normalmente a sua atividade, colocando em risco a sua subsistência e a manutenção dos postos de trabalho dos funcionários, que só a muito custo tem sido possível salvaguardar.”
E como alega no artigo 167º do R.I.:
“E, em reacção à falta de autorização de destacamento da Segurança Social portuguesa, modelo A1, a grande maioria das empresas utilizadoras recusou-se a pagar à Requerente os últimos serviços prestados, enquanto a Requerente não regularizar a situação…”
Ou seja, a própria Recorrente admite ser provável que a regularização da situação perante a Segurança Social viria desbloquear o pagamento voluntário de tais facturas.
Em suma, independentemente e em paralelo às invocadas injunções, a Requerente visa, mediante a presente providência, uma solução alternativa do mesmo problema prático (reunir as condições propícias à cobrança desses € 68.000,00).
E portanto o TAF relevou acertadamente essa quantia pecuniária na fixação do valor da causa.
Ampliação objectiva da instância (conclusões 11-21)
Dispõe sobre isto o CPTA:
«Artigo 63.º
Ampliação da instância
1 - Até ao encerramento da discussão em primeira instância, o objeto do processo pode ser ampliado à impugnação de atos que venham a surgir no âmbito ou na sequência do procedimento em que o ato impugnado se insere, assim como à formulação de novas pretensões que com aquela possam ser cumuladas.
….»
A instância, supõe-se, deve ter a flexibilidade propícia à garantia da tutela jurisdicional efectiva. Mas deve igualmente estar sujeita a algum enquadramento, em nome da segurança e certeza do direito, pois seria algo absurdo (tratando-se de processo, poderia dizer-se “Kafkiano”) que a lei avalizasse uma situação em que o Réu, sabendo que era demandado, não pudesse saber exactamente porquê.
Perante a norma transcrita afigura-se que o legislador forneceu um quadro constituído por duas bases que permitem a enxertia dos pedidos ampliatórios supervenientes. Ou no mesmo procedimento (a ampliação traduz-se em impugnação de novos actos do mesmo procedimento) ou na mesma relação jurídica material (a ampliação será então configurada em novas pretensões, de índole diversa da inicial, atinentes ao objecto impugnatório original).
Sucede que cada requerimento de autorização de sujeição à Segurança Social portuguesa de um trabalhador instaura um procedimento autónomo, com as suas próprias circunstâncias e mérito. Ora, na sequência dos novos procedimentos, o Requerente veio estender as mesmas pretensões iniciais aos novos actos, e não formular novas pretensões, diferentes, sobre os procedimentos inicialmente cumulados. Na verdade, como alega o Recorrente “O Requerimento de fls 278, diz respeito a novos requerimentos RV1018, relativos a diferentes trabalhadores e períodos de destacamento e que foram objeto de diferentes despachos de indeferimento, apresentados, contudo, no âmbito da mesma relação material estabelecida entre a Recorrente e a Segurança Social e no mesmo contexto e circunstâncias dos requerimentos RV1018 apresentados na petição inicial do presente processo cautelar.”
Entende-se, portanto, que este pedido de ampliação extravasa do quadro admissível de ampliação do pedido e, como tal, improcede.
Antecipação do juízo da causa principal (Conclusões 22-27)
Transcreve-se o essencial da decisão recorrida:
«Estabelece o artigo 121.º, n.º 1 do CPTA que “quando, existindo processo principal já intentado, se verifique que foram trazidos ao processo cautelar todos os elementos necessários para o efeito e a simplicidade do caso ou a urgência na sua resolução definitiva o justifique, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal, proferindo decisão que constituir a decisão final desse processo”.
De acordo com o citado preceito legal, a convolação do processo cautelar em processo principal depende do preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: i) já tenha sido intentado o processo principal; ii) tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para permitir a antecipação; iii) simplicidade do caso ou urgência na sua resolução definitiva; iv) audição prévia das partes.
(…)
Já o terceiro requisito não se encontra verificado. Na verdade, não existe, nos presentes autos, uma urgência qualificada que torne insuficiente a tutela provisória cautelar, antes se afigurando que esta se mostra apta a evitar a situação alegadamente irreversível a que a requerente se refere no requerimento inicial.
Por outro lado, a questão jurídica em discussão esta longe de se revelar “simples e de solução incontroversa ao ponto de legitimar o operar dum juízo de mérito da causa antecipando-o no processo cautelar”, porquanto implica uma análise detalhada de inúmera documentação relativamente a cada trabalhador em concreto, naquelas circunstâncias de tempo, modo e lugar concretas, bem como a análise e a interpretação de normas do direito da União Europeia.
Pelo exposto, não se verificando um dos requisitos cumulativos de que o artigo 121.º, n.º 1 do CPTA faz depender a possibilidade de antecipação da decisão da causa principal, a título definitivo, impõe-se indeferir tal pedido.»
O caso em questão é de grande complexidade, sobretudo porque envolve a análise coordenada de três ordens jurídicas, Europeia, Portuguesa e Francesa. A pretensão da Recorrente, empresa de trabalho temporário, é que a mão-de-obra alocada em Portugal e cedida a empresas de construção civil em França, deve ser sujeita à Segurança Social portuguesa. Mas os dados da questão devem ser aprofundados, pois perante a legislação comunitária importa saber se o enquadramento desses trabalhadores deve ser na Segurança Social Portuguesa ou na Francesa. Obviamente os encargos para a Segurança social Portuguesa, mais reduzidos, são mais apetecíveis para a Requerente.
Rege na matéria o REGULAMENTO (CE) N.º 883/2004 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 29 de Abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social, onde se estatui:
«Artigo 12.º
Regras especiais
1. A pessoa que exerça uma atividade por conta de outrem num Estado-Membro ao serviço de um empregador que normalmente exerce as suas atividades nesse Estado-Membro, e que seja destacada por esse empregador para realizar um trabalho por conta deste noutro Estado-Membro, continua sujeita à legislação do primeiro Estado-Membro, desde que a duração previsível do referido trabalho não exceda 24 meses e que essa pessoa não seja enviada em substituição de outra pessoa destacada.
…»
Ignora-se se o legislador europeu teve em conta na formulação desta regra, e outras, as características muito específicas das empresas de trabalho temporário. E, no entanto, a questão é candente a vários títulos, jurídico, social, económico, político.
A complexidade da questão foi justamente realçada pelo STA, no Proc. 0405/15, Acórdão de 16-06-2015, que admitiu a revista excepcional em processo similar, nestes termos (sumário):
«I – A questão de determinação do regime de segurança social a que ficam sujeitos os trabalhadores de uma empresa, com sede num Estado membro, destacados por curtos períodos para desempenhar funções noutro Estado membro da União Europeia, assume dificuldade jurídica superior ao comum, pela necessidade de interpretação e aplicação conjugada de normativos de direito comunitário de diverso grau hierárquico e por convocar, na aplicação concreta, diversos critérios e recurso a conceitos relativamente indeterminados como o de “actividade significativa”.
II – Por outro lado, trata-se de um domínio em que a regulação jurídica transcende os meros interesses imediatos dos sujeitos envolvidos, tendo importantes reflexos económicos e sociais e, pela pluri-localização da relação de trabalho, até supra-nacionais, reforçando a exigência de certeza e uniformidade na aplicação, que garanta a concorrência leal e impeça expedientes de “dumping social”».
Ora, entende-se que esta manifesta complexidade basta para descartar o factor “simplicidade do caso” que é uma das condições da possibilidade de antecipação do juízo da causa principal, nos termos do artigo 121º/1 CPTA.
Posto isto e sem mais delongas sustenta-se a decisão do TAF nesta questão.
Caducidade do direito de acção (conclusões 28-41)
Importa transcrever algumas passagens decisivas da decisão nesta matéria:
«Impõe-se, desde já, conhecer da suscitada caducidade do direito de acção em relação aos actos administrativos de indeferimento datados de 14/08/2015, 19/10/2015, 04/11/2015, 03/12/2015 e 08/07/2016 e da omissão ilegal do dever de decidir o requerimento de 30/11/2015.
(…)
A formação de caso decidido ou resolvido pressupõe que a Administração tenha definido a situação jurídica do interessado e que este não reaja atempadamente.
A caducidade do direito de acção, prevista no artigo 89.º, n.º 4, alínea k) do CPTA, configura a existência de uma causa que impede o conhecimento do mérito, devendo, a sua apreciação, preceder o conhecimento das demais.
Nos termos do disposto no artigo 185.º, n.º 1 do CPA, “as reclamações e os recursos são necessários ou facultativos conforme dependa, ou não, da sua prévia utilização a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de impugnação ou de condenação à prática do acto devido”, sendo que, conforme estipula o n.º 2 do mesmo preceito legal, regra geral, “as reclamações e os recursos têm carácter facultativo, salvo se a lei os denominar como necessários.”.
Por seu turno, o artigo 192.º, n.º 2 do CPA determina que “o prazo para o órgão competente apreciar e decidir a reclamação é de 30 dias (…)”. E o artigo 198.º, n.º 1 do CPA estabelece que “quando a lei não fixe prazo diferente, o recurso hierárquico deve ser decidido no prazo de 30 dias, a contar da data da remessa do processo ao órgão competente para dele conhecer”.
Por força do estatuído no artigo 190.º, n.º 3 do CPA, “a utilização de meios de impugnação administrativa facultativos contra actos administrativos suspende o prazo de propositura de acções nos tribunais administrativos, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal”, acrescentando o artigo 59.º, n.º 4, in fine do CPTA, que contém a mesma previsão, “(…) consoante o que ocorra em primeiro lugar”. (…)
Por fim, os artigos 58.º, n.º 2, alínea b) e 69.º, n.º 2, ambos do CPTA estipulam o prazo geral de 3 meses para a propositura de acção destinada a impugnar actos administrativos de indeferimento anuláveis, sendo de um ano para a propositura de acção destinada à condenação à prática do acto devido decorrente da inércia da Administração, conforme resulta do n.º 1 do ora mencionado preceito legal.
A contagem dos referidos prazos, na redacção do CPTA anterior à Lei n.º 214-G/2015, de 02/10, ou seja, até 01/12/2015, efectuava-se nos termos do artigo 138.º do CPC, isto é, de forma contínua, suspendendo-se, no entanto, durante o período de férias judiciais, as quais decorrem entre 22 de Dezembro e 3 de Janeiro, de Domingo de Ramos a Segunda-Feira de Páscoa e de 16 de Julho a 31 de Dezembro (artigo 28.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto - LOSJ), sendo que, terminando o prazo num destes períodos ou em dia em que os tribunais estiverem encerrados, o seu termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
Na redacção actual do CPTA, ou seja, desde 02/12/2015, a contagem é efectuada nos termos do artigo 279.º do CC, ou seja, conta-se de forma contínua, sendo que, terminando o prazo num feriado, Domingo ou em período de férias judiciais, o seu termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, se o acto tiver de ser praticado em juízo.
Nos presentes autos, o requerimento especificado sob o número 1, datado de 23/07/2015 foi objecto de decisão de indeferimento expresso no dia 14/08/2015, notificada à requerente em 19/08/2015. Em 07/09/2015, a requerente apresentou reclamação graciosa facultativa (pois a lei não a impõe como pressuposto processual da acção administrativa), a qual foi objecto de indeferimento expresso em 19/10/2015, que terá sido notificado à requerente em 21/10/2015. Em 14/01/2016, a requerente interpôs recurso hierárquico facultativo (pois a lei não o impõe como pressuposto processual da acção administrativa), o qual foi remetido ao órgão decisor no dia 16/02/2016, não tendo, até ao momento, sido proferida decisão (vd. factos indiciariamente provados 3) e 5)).
Ora, face ao exposto, o prazo para a propositura da presente acção, que é de 3 meses, decorreu de 20/08/2015 a 06/09/2015 (18 dias), esteve suspenso de 07/09/2015 até 19/10/2015 (período que decorreu desde a interposição da reclamação até ao final do prazo legal para decisão), decorreu de 20/10/2015 até 21/12/2015 (63 dias), esteve suspenso de 22/12/2015 até 03/01/2016 (período de férias judiciais), retomou a contagem de 04/01/2016 até 13/01/2016 (10 dias) e esteve suspenso de 14/01/2016 até 31/03/2016 (período que decorreu desde a interposição do recurso até ao final do prazo legal para decisão). Donde resulta que entre 20/08/2015 até 31/03/2016, decorreram 91 dias. Decompondo o prazo de 3 meses em 90 dias, o que se afigura necessário face às suspensões ora descritas, resulta que o mesmo terminou no dia 12/01/2016.
O requerimento especificado sob o número 2, datado de 16/09/2015 foi objecto de decisão de indeferimento expresso no dia 19/10/2015, que terá sido notificada à requerente em 21/10/2015. Em 14/01/2016, a requerente interpôs recurso hierárquico facultativo (pois a lei não o impõe como pressuposto processual da acção administrativa), o qual foi remetido ao órgão decisor no dia 16/02/2016, não tendo, até ao momento, sido proferida decisão (vd. factos indiciariamente provados 3) e 6)).
Ora, face ao exposto, o prazo para a propositura da presente acção, que é de 3 meses, decorreu de 22/10/2015 a 21/12/2015 (61 dias), esteve suspenso de 22/12/2015 até 03/01/2016 (período de férias judiciais), retomou a contagem de 04/01/2016 até 13/01/2016 (10 dias), esteve suspenso de 14/01/2016 até 31/03/2016 (período que decorreu desde a interposição do recurso até ao final do prazo legal para decisão), tendo retomado a contagem a partir do dia 01/04/2016. Decompondo o prazo de 3 meses em 90 dias, o que se afigura necessário face às suspensões ora descritas, resulta que o mesmo terminou no dia 19/04/2016.
O requerimento especificado sob o número 3, datado de 15/10/2015 foi objecto de decisão de indeferimento expresso no dia 04/11/2015, que terá sido notificada à requerente em 05/11/2015. Em 14/01/2016, a requerente interpôs recurso hierárquico facultativo (pois a lei não o impõe como pressuposto processual da acção administrativa), o qual foi remetido ao órgão decisor no dia 16/02/2016, não tendo, até ao momento, sido proferida decisão (vd. factos indiciariamente provados 3) e 6)).
Ora, face ao exposto, o prazo para a propositura da presente acção, que é de 3 meses, decorreu de 06/11/2015 até 21/12/2015 (46 dias), esteve suspenso de 22/12/2015 até 03/01/2016 (período de férias judiciais), retomou a contagem de 04/01/2016 até 13/01/2016 (10 dias) e esteve suspenso de 14/01/2016 até 31/03/2016 (período que decorreu desde a interposição do recurso até ao final do prazo legal para decisão), retomando a contagem a partir do dia 01/04/2016. Decompondo o prazo de 3 meses em 90 dias, o que se afigura necessário face às suspensões ora descritas, resulta que o mesmo terminou no dia 04/05/2016.
O requerimento especificado sob o número 4, datado de 09/11/2015 foi objecto de decisão de indeferimento expresso no dia 03/12/2015, que terá sido notificada à requerente em 07/12/2015. Em 14/01/2016, a requerente interpôs recurso hierárquico facultativo (pois a lei não o impõe como pressuposto processual da acção administrativa), o qual foi remetido ao órgão decisor no dia 16/02/2016, não tendo, até ao momento, sido proferida decisão (vd. factos indiciariamente provados 3) e 6)).
Ora, face ao exposto, o prazo para a propositura da presente acção, que é de 3 meses, decorreu de 08/12/2015 a 13/01/2016 (37 dias) e esteve suspenso de 14/01/2016 até 31/03/2016 (período que decorreu desde a interposição do recurso até ao final do prazo legal para decisão), retomando a contagem a partir do dia 01/04/2016. Decompondo o prazo de 3 meses em 90 dias, o que se afigura necessário face à suspensão ora descrita, resulta que o mesmo terminou no dia 23/05/2016.
O requerimento especificado sob o número 5, datado de 30/11/2015 foi objecto de proposta de intenção de indeferimento no mesmo dia, que terá sido notificada à requerente em 01/12/2015, para exercer o direito de audiência dos interessados, pelo prazo de dez dias, não tendo sido proferido acto final expresso. Em 14/01/2016, a requerente interpôs recurso hierárquico facultativo (pois a lei não o impõe como pressuposto processual da acção administrativa), o qual foi remetido ao órgão decisor no dia 16/02/2016, não tendo, até ao momento, sido proferida decisão (vd. factos indiciariamente provados 4) e 6)).
Ora, no período em que decorreu este procedimento administrativo já não existia a figura do acto de indeferimento tácito, previsto no artigo 109.º do antigo CPA/1991, o qual foi eliminado desde a sua última alteração, efectuada pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 07/01, que entrou em vigor em 07/04/2015 (…)
Assim, no caso concreto deste procedimento administrativo, está-se perante uma situação de omissão ilegal, pura inércia da entidade requerida, decorrente do incumprimento do dever legal de decidir, o que significa que não se aplica a regra da suspensão prevista no artigo 190.º, n.º 3 do CPA, que apenas tem aplicação, tal como aí é referido, quando exista um acto administrativo.
Pelo que, no caso deste procedimento administrativo em concreto, o prazo legal de decisão, após o decurso do prazo de audiência dos interessados, era de 90 dias, conforme resulta do artigo 128.º, n.º 1, 1.ª parte do CPA, o qual terá terminado no dia 27/04/2016. Donde se retira que a requerente interpôs recurso hierárquico desta omissão ilegal do dever de decisão antes de findo o prazo legal para decisão.
Face ao exposto, o prazo para a propositura da acção judicial contra esta omissão ilegal do dever de decisão pela entidade requerida, que é de um ano, decorreu de 28/04/2016 a 27/04/2017.
O requerimento especificado sob o número 6, datado de 30/05/2016 foi objecto de decisão de indeferimento expresso no dia 08/07/2016, que terá sido notificada à requerente em 13/07/2016. Em 07/10/2016, a requerente interpôs recurso hierárquico facultativo (pois a lei não o impõe como pressuposto processual da acção administrativa), o qual foi remetido ao órgão decisor no dia 25/10/2016, não tendo, até ao momento, sido proferida decisão (vd. factos indiciariamente provados 3) e 7)).
Ora, face ao exposto, o prazo para a propositura da presente acção, que é de 3 meses, decorreu de 14/07/2016 a 06/10/2016 (85 dias) e esteve suspenso de 07/10/2016 até 09/12/2016 (período que decorreu desde a interposição do recurso até ao final do prazo legal para decisão), retomando a contagem a partir do dia 10/12/2016. Decompondo o prazo de 3 meses em 90 dias, o que se afigura necessário face à suspensão ora descrita, resulta que o mesmo terminou no dia 14/12/2016.
Assim, forçoso é concluir que, quando a presente acção foi instaurada, no dia 03/05/2017 (vd. facto indiciariamente provado 14)), já os prazos de impugnação supra explicitados tinham terminado.
Motivo pelo qual, em relação aos actos, especificados sob os números 1, 2, 3, 4 e 6 e à omissão especificada sob o número 5, todos do artigo 6.º do requerimento inicial, por, face à inércia da requerente se verificar a existência de caso resolvido, a situação jurídica relativamente aos mesmos considera-se cristalizada no ordenamento jurídico, não sendo mais possível colocá-la em discussão com a presente acção. Constituindo, assim, o decurso do tempo, sem que a requerente tenha intentado, em prazo devido, a correspondente acção, uma causa impeditiva ou extintiva do direito de que se arroga que, no âmbito do processo administrativo, é qualificada como excepção dilatória, que conduz à absolvição da instância, conforme resulta do artigo 89.º, n.º 2 e 4, alínea k) do CPTA.»
Assiste razão à Recorrente quanto à relevância da matéria de facto que indica na conclusão 32 e 40. No entanto, essa matéria está contida por remissão em 5, 6 e 7 da matéria de facto. E assim, para ressalvar a sua posição basta confirmar que nos ofícios de notificação dos despachos impugnados consta:
“Informa-se que dispõe dos seguintes prazos:
“15 dias úteis para reclamar;
3 meses para recorrer hierarquicamente;
3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenham reclamado ou recorrido hierarquicamente”.
No ofício de 11/07/2016 consta:
“Informa-se que dispõe dos seguintes prazos:
3 meses para recorrer hierarquicamente;
3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenham reclamado ou recorrido hierarquicamente”.
Ora, nesta situação entende-se ser de reiterar a jurisprudência invocada pela Recorrente, contida no 00178/10.5BEMDL deste TCAN, 1ª Secção - Contencioso Administrativo, Acórdão de 05-02-2016, cujo sumário transcreve na conclusão 38.
Lê-se com proveito nesse acórdão:
«E não se diga que, estando-se perante um Recurso Hierárquico Facultativo, o mesmo era insuscetível de suspender o prazo da impugnação contenciosa, uma vez que o ISS IP se auto vinculou a tal suspensão, ao afirmar no oficio de notificação do ato, que “da decisão cabe recurso hierárquico no prazo de 3 meses … e recurso contencioso no prazo de 3 meses (prazo que se suspende caso tenha recorrido hierarquicamente) ”.
Assim, até em consideração ao princípio da boa-fé, terá de se considerar que o Recurso Hierárquico suspendeu o prazo de apresentação da Ação Contenciosa, sendo legítimo que o particular aguardasse pela decisão hierárquica, em linha do defendido por Mário Esteves de Oliveira e Outros (In CPA Anotado 2ª Edição – Artº 109º pág. 490) ao afirmar que “se … o interessado opta por não presumir indeferida (tacitamente) a sua pretensão, então deve entender-se que a Administração está (ainda) constituída no dever de decidir…”».
Deste modo, reiterando tal jurisprudência no caso destes autos, se conclui que a sentença recorrida não pode subsistir na parte em que declarou tais actos inimpugnáveis por caducidade do direito de acção.
Requisitos do decretamento da providência cautelar (conclusões 42-50)
Em relação aos actos que considerou não abrangidos pela caducidade do direito de acção ponderou o TAF (transcreve-se o mais decisivo):
«No caso em apreço, caso a requerente obtivesse o deferimento do pedido formulado sob a alínea a) do petitório, ou seja, o deferimento dos requerimentos por si apresentados junto da entidade requerida ou do pedido formulado sob a alínea b), ou seja, a condenação da entidade requerida a reapreciar os actos administrativos impugnados, expurgando-os das ilegalidades invocadas pela requerente, atendendo a que são pedidos adequados a uma composição definitiva do litígio, em sede de acção principal e não provisória, como é mote da espécie processual cautelar, fica, desde logo, definitivamente realizado o efeito pretendido por via da acção principal. Aliás, com o intuito de demonstrar que a acção principal terá êxito, por via da indicação que assim sucedeu no âmbito do processo n.º 2899/14.7BEPRT, que correu termos na unidade orgânica 1 deste Tribunal, a requerente limitou-se a transferir a condenação da entidade requerida naqueloutra acção principal em pedido cautelar, descurando que este, por ser instrumental e provisório, não pode consubstanciar-se no mesmo pedido de tutela definitiva.
A eventual procedência da pretensão do requerente em sede cautelar implicaria, assim, esgotar o objecto da acção principal, pondo-se em causa as mencionadas características estruturais da providência cautelar.
Inexistem, por isso, in casu, quer a instrumentalidade, quer a provisoriedade, na medida em que a procedência de ambos os pedidos formulado no petitório, ao esgotar o objecto da acção principal, já não necessitará da tutela definitiva, que deixa de ser útil, uma vez que a pretensão formulada já se encontra satisfeita.»
Não se sufraga o entendimento do TAF no sentido de que com a eventual procedência da pretensão da Requerente ficaria definitivamente realizado o efeito pretendido pela via da acção principal.
Como referem Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha (Comentário ao CPTA, 4ª ed., p. 917) “as providências cautelares antecipatórias desempenham a função de antecipar, a título provisório, a constituição de uma situação jurídica nova, diferente da existente à partida: a situação que se pretende obter, a título definitivo, coma sentença a proferir no processo principal”.
Nas suas linhas gerais trata-se de uma tutela que passa pela antecipação provisória da utilidade pretendida no processo principal. De resto, o artigo 112º/2/b)/c)/d) do CPTA, de índole exemplificativa, contempla situações similares às destes autos, ou seja, a atribuição de situações que representam uma antecipação funcional da decisão definitiva e cuja instrumentalidade praticamente se afere e esgota no seu carácter provisório.
Por outras palavras, a tutela provisória pode produzir o mesmo efeito que a tutela comum, mas não a título definitivo.
Nada é simples quando se trata de antecipar o futuro, mas não se vê que a decisão definitiva ficasse necessariamente inutilizada por força da regulação provisória obtida em sede cautelar.
Na hipótese de decisão adversa no processo principal, a situação seria revertida e a Requerente certamente se veria na conjecturável contingência de ter que regularizar a situação dos trabalhadores junto da Segurança social Francesa.
Mas há que prosseguir ao conhecimento de mérito da providência nos termos do artigo 149º do CPTA, pois os critérios do fumus boni iuris e do periculum in mora reentram em cena com a instrumentalidade e a provisoriedade da providência.
Consta no Acórdão deste TCAN de 29-08-2016, proc. 00940/16.5BEPRT (sumário):
«1 – O requerente em sede cautelar deve alegar e demonstrar de modo razoavelmente plausível, quer em termos de facto quer de direito, a probabilidade da procedência da sua pretensão principal.
Recai pois sobre o requerente de Providência Cautelar o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, enquanto receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação e do fumus boni iuris, enquanto sumária avaliação da probabilidade de existência do direito invocado, ao que acresce ainda a eventual necessidade de ser feita uma ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados).
2 – Com o novo CPTA deixou de existir a distinção (contante da anterior redação do Artº 120º do CPTA) entre providências conservatórias, como a suspensão da eficácia do ato, e providências antecipatórias, sendo agora exigível para a adoção de qualquer providência cautelar, para além do fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, ainda e cumulativamente, a verificação da probabilidade de êxito da ação principal.
Não ocorrerá a necessária probabilidade da procedência da pretensão formulada ou a formular na ação principal, quando a questão jurídica fundamental subjacente ao ato se mostre controversa.»
Já se realçou a complexidade das questões jurídicas a resolver no processo principal. Trata-se de um caso típico de impossibilidade de prever, na via da summaria cognitio, o desfecho provável do caso e, nesse sentido, trata-se certamente de uma questão “controversa” que não permite uma resposta positiva ao critério do artigo 120º/1 in fine do CPTA, ou seja não permite afirmar que “seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”.
E, por outro lado, também se constata a impossibilidade de uma verificação conscienciosa do periculum in mora (“fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”, na expressão legal).
Isto porque a Requerente, movida pela sua vontade e convicção de pertinência de todos os casos invocados às atribuições da Segurança Social portuguesa, esquece o nó górdio do problema, que reside exactamente no dilema sobre a jurisdição nacional competente, perante a qual a situação dos trabalhadores deve ser regularizada.
Seria portanto essencial que a Requerente fornecesse dados quantitativos relativamente ao sobrecusto da regularização da situação contributiva dos trabalhadores pela legislação francesa e o seu peso proporcional na facturação global da empresa, de modo a permitir um juízo valorativo sobre a sua capacidade económica para encaixar esse incremento de custos.
Posto isto, também no plano dos prejuízos de difícil reparação existem incógnitas básicas relativamente às quais a Requerente não cumpre o ónus que lhe compete de fornecer dados suficientes e fidedignos para demonstrar o periculum in mora.
E assim a providência improcede por falta de requisitos legalmente exigíveis, embora com fundamentos diversos dos que o TAF relevou.
Convolação para o meio processual de intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias (conclusões 51-56)
Sobre esta matéria lê-se na sentença recorrida:
«Poder-se-ia, por outro lado, equacionar a possibilidade de convolação para o meio processual principal urgente a que se refere o artigo 109.º do CPTA, a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, cujo n.º 1 estipula que “a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131.º”, ou seja, só poderia ter lugar se se preenchessem os pressupostos de que depende a utilização deste processo principal urgente e não fosse possível, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar. O que significa que, para tal, a requerente devia ter invocado a necessidade de tutela de um direito, liberdade ou garantia, ou, pelo menos, que se vislumbrasse, na causa de pedir, a necessidade urgente de protecção definitiva de um direito, liberdade ou garantia, o que não ocorre nos presentes autos.
A este propósito, Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 4.ª edição, Almedina, 2017, pág. 892, nota de rodapé 1100, expõem: “na vigência da redacção primitiva do Código, alguma jurisprudência assumiu a possibilidade da convolação oficiosa de processos cautelares em processos de intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, em situações que não se compadeciam com uma regulação meramente provisória, como e próprio das providências cautelares (cfr. acórdão do TCA Norte de 25 de janeiro de 2007, Processo n.º 678/06). Esta orientação afigura-se, contudo, questionável, na medida em que, embora o juiz disponha de um amplo poder de conformação em matéria cautelar, que lhe permite adotar outra ou outras providências em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, ou ainda impor ao requerente certo tipo de contra providências como contrapartida para o deferimento da providência cautelar solicitada (artigo 120.º, n.ºs 2, in fine, 3 e 4, do CPTA), a verdade e que esse poder conformativo se limita a fazer atuar os critérios de decisão de que, nos termos da lei, depende o decretamento de uma providência cautelar, destinando-se essencialmente a assegurar que a concessão da providência, tal como foi requerida, não represente uma violação do princípio da proporcionalidade e, portanto, um encargo ou gravame excessivo para os interesses públicos ou privados contrapostos (critério da proibição do excesso), nem vá além do que e necessário para satisfazer o interesse do requerente (critério da necessidade). A referida liberdade de conformação decisória tem, portanto, como limite a essencial instrumentalidade do processo cautelar: o juiz não pode decretar uma providência que se não compatibilize com os objectivos que o requerente pretende realizar no processo principal, nem pode decretar uma providência que obrigue o requerente a adoptar um melo processual principal diverso daquele que tinha em vista utilizar. O poder de conformação do juiz no domínio da tutela cautelar tem, pois, como limite, em última análise, o princípio do dispositivo.»
É fácil compreender que o TAF aludiu a esta questão em abstracto, com algum excesso de zelo teórico, e que na realidade não foi configurada nem substanciada nenhuma pretensão concreta no sentido dessa convolação.
Deste modo a decisão recorrida permanece imune às conclusões em análise.
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DECISÃO
Pelo exposto acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Porto, 19 de Abril de 2018
Ass. João Beato
Ass. Hélder Vieira
Ass. Rogério Martins