Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01675/17.7BEBRG |
![]() | ![]() |
Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 06/28/2018 |
![]() | ![]() |
Tribunal: | TAF de Braga |
![]() | ![]() |
Relator: | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
![]() | ![]() |
Descritores: | CONTENCIOSO PRÉ CONTRATUAL; HONORABILIDADE PROFISSIONAL |
![]() | ![]() |
Sumário: | I-Entendeu o Tribunal a quo, e aqui corrobora-se, que os certificados de registo criminal da pessoa colectiva ora Recorrente e ainda de um dos seus administradores, constituídos por condenações crime pelos tipos de ilícito de “abuso de confiança fiscal” consubstanciam crimes que representam uma efectiva afectação da idoneidade profissional - porque emergente da pessoal - do legal representante da pessoa colectiva aqui Recorrente, bem como da própria Autora/Recorrente enquanto tal; I.1-por outro lado, não se detectam vícios que afectem as deliberações e decisões tomadas no procedimento pré-contratual sub judice, razão pela qual se mantém na ordem jurídica a sentença sob censura que declarou essa conformidade legal. * *Sumário elaborado pelo relator |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Recorrente: | AC & Filhos, SA |
Recorrido 1: | Administração Regional de Saúde do Norte, IP |
Votação: | Unanimidade |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Meio Processual: | Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO AC & Filhos, SA, NIPC 5…32 deduziu acção administrativa de contencioso pré contratual contra a Administração Regional de Saúde do Norte, IP (ARSNorte), indicando como Contra Interessada FGS, Lda., todas melhor identificadas nos autos, insurgindo-se contra o acto que determinou a caducidade da adjudicação que lhe foi notificado em 28/08/2017, no âmbito do concurso público para adjudicação da empreitada do “Centro de respostas integradas de Braga - Adaptação e Remodelação das Instalações”. Formulou o seguinte pedido: “(…) a) Ser anulado o ato administrativo de caducidade da adjudicação da proposta apresentada pela Autora e, em consequência, manter a adjudicação da proposta apresentada pela Autora; b) Ser anulado o ato final de adjudicação da proposta apresentada pelo concorrente FGS, Lda; c) Ser a Ré condenada a excluir a proposta da FGS, Lda, com as demais consequências de acordo com os fundamentos expostos supra”. Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção. Desta vem interposto recurso. Alegando, a Autora concluiu: I. Vem o presente Recurso interposto da, aliás, douta decisão que julgou improcedente o pedido da Recorrente; II. Por mais respeito que o Tribunal recorrido nos mereça - que é, de facto, muito -, entendemos que, nos presentes autos, fez uma menos boa interpretação da factualidade e uma incorreta aplicação do direito; III. As questões centrais que a Recorrente pretende ver esclarecidas por este Venerando Tribunal são, essencialmente, quatro: - A condenação da Recorrente e do seu Administrador pela prática do crime de abuso de confiança fiscal, é suscetível de configurar um crime que afete a honorabilidade profissional constituindo impedimento à participação em procedimentos de contratação pública, nos termos e para os efeitos do artigo 55.º, al. b), do CCP? - Considerando a Entidade competente para o efeito (IMPIC) que a Recorrente Preenche todos os requisitos de idoneidade/honorabilidade profissional para o acesso e permanência na atividade de construção e execução de empreitadas de obra pública, é legítimo à Recorrida decidir pelo contrário? - Por via da condenação pela prática do crime de abuso de confiança fiscal pode, ope legis e sem que lhe tenha sido aplicada como pena acessória a proibição do exercício da profissão em causa, ser a Recorrente impedida de participar em procedimentos de contratação pública? Subsidiariamente: - Um Concorrente que apresente documentos de submissão obrigatória (artigo 9.º, n.º 1., al. h), do Programa de Procedimento) contendo termos ou condições que violam aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos (Cláusula 41.ª, do Caderno de Encargos), tem de ser excluído? Vejamos, IV. in casu o Tribunal o que entendeu que, o crime de abuso de confiança fiscal consubstancia um crime que afeta a honorabilidade profissional do Operador Económico, aqui Recorrente e, por via disso, decorre automaticamente (ope legis) do CCP a proibição da Recorrente celebrar contratos públicos; V. Há erro de julgamento porque não decorre da lei ou de qualquer princípio jurídico que o crime de abuso de confiança fiscal consubstancie um crime contra a honorabilidade profissional, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 55.º, al. b), do CCP e no artigo 9.º, da lei 41/2015, de 03 de junho; VI. O elenco dos crimes suscetíveis de afetar a idoneidade/honorabilidade profissional são aqueles que constam do artigo 9.º, da Lei n.º 41/20/5, de 03 de junho, sendo que, em parte alguma vêm referidos crimes tributários e fiscais, pelo que, o crime de abuso de confiança fiscal não é um crime suscetível de afetar a honorabilidade profissional, ao ponto de consubstanciar um impedimento à celebração de contratos públicos, nos termos do disposto no artigo 9.º, da lei n.º 41/2015, de 03 de junho e da alínea b), do n.º 1, do artigo 55.º, do CCP; VII. Uma interpretação atualista da lei tendo em conta os elementos gramatical, histórico, sistemático e teleológico quando integrada num ordenamento vivo e, muito em especial, enquanto harmonicamente integrada na "unidade do sistema jurídico", aponta no sentido, claro e inequívoco, de que o crime de abuso de confiança fiscal não é um crime que afeta a honorabilidade profissional, suscetível de, por si só, constituir um impedimento à celebração de contratos públicos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 55.º, n.º 1, al. b), do CCP; VIII. Na interpretação do conceito de crimes que afetem a honorabilidade profissional deve atentar-se na natureza estritamente jurídica deste conceito, deve considerar-se excluído qualquer espaço de discricionariedade administrativa, uma vez que, não estamos num campo de juízos morais, referenciados em geral à honra ou honorabilidade da pessoa; IX. A identificação sobre o que seja um crime que afete a honorabilidade profissional não pode deixar de exigir uma ligação íntima entre a conduta criminal e o exercício de uma profissão; terá de ser um crime relacionado com a conduta profissional e abrange, apenas, os delitos que se traduzem na violação de regras específicas de uma profissão, nomeadamente, os que se relacionam com a violação das leis de emprego, da saúde e da segurança no local de trabalho, com exigências ambientais relativas à empresa ou com a igualdade de acesso ao emprego; X. Pelo que, o crime de abuso de confiança fiscal não consubstancia um crime que afete a idoneidade/honorabilidade profissional, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b), do artigo 55.º, do CCP; XI. Resulta idas disposições conjugadas contidas no artigo 17.º, do Decreto-Lei n.º 11/2014; de 22 de janeiro e no artigo 3.º, do Decreto-Lei n.º 232/2015, de 13 de outubro, que a competência exclusiva para regular e fiscalizar o setor da construção, para atribuir os títulos habilitantes para o exercício das diversas atividades do setor da construção e das empreitadas de obra pública e para verificar as respetivas condições de permanência na atividade compete ao IMPIC; XII. Tendo o IMPIC conhecimento da situação em que se encontra a Recorrente considerou que esta detinha a necessária idoneidade/honorabilidade para o exercício da profissão, para a participação em procedimentos de contratação pública e para a celebração de contratos públicos, sendo ilegítimo à Recorrida considerar o contrário; XIII. Há erro de julgamento porque a proibição de participação, ao contrário do que a norma ínsita na al. b), do artigo 55.º, do CCP aparenta, não pode decorrer automaticamente da lei, sendo necessário que haja sido aplicada ao impedido, como pena acessória, a proibição do exercício da profissão em causa; XIV. O entendimento propugnado pela Recorrida e pelo Tribunal a quo, no sentido de que proibição do exercício da profissão decorre automaticamente do CCP (ope legis) é inconstitucional, por violação do artigo 30.º, n.º 4, da CRP; XV. A norma ínsita na alínea b), do artigo 55.º, do CCP, é materialmente inconstitucional, por violação do artigo 30.º, n.º 4, da CRP, por impor de forma automática, mecânica, independentemente de decisão judicial, por efeito direto da lei (ope legis), uma pena de perda de direitos profissionais, que tanto pode querer significar perda definitiva, como incapacidade ou Impossibilidade temporária de os exercer, isto porque, nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais, ou políticos; XVI. Inconstitucionalidade que expressamente se Invoca; XVII. E é só isto quanto interessa para o bom julgamento do presente recurso, uma vez que, no caso, foi declarada a caducidade da adjudicação a favor da Recorrente em virtude de esta, e o seu Administrador, terem sido condenados pela prática de crimes de abuso de confiança fiscal, tendo o Recorrido considerado a Recorrente como "impedida" de celebrar contratos públicos, sem que, (i) decorra da lei que o crime de abuso de confiança fiscal integra o elenco dos crimes referidos na alínea b), do artigo 55.º, do CCP e do artigo 9.º, da lei 41/2015, sem que, (ii) o IMPIC assim o considere e, sem quer, (iii) tenha sido aplicada, pelo Tribunal, qualquer sanção acessória de proibição de exercício da profissão; Sem prescindir e SUBSIDIARIAMENTE, DA EXCLUSÃO DA PROPOSTA DA CI; XVIII. O artigo 9.º, n.º 1, al. h) do Programa de Procedimento, sob a epígrafe "Documentos que instruem a proposta" estabelece que: "1- A proposta deve ser constituída pelos seguintes documentos: h) Declaração do concorrente com indicação dos responsáveis pela orientação da obra, acompanhada dos respetivos certificados de habilitações literárias e profissionais, designadamente dos: Diretor técnico da empreitada;" XIX. O único elemento submetido à concorrência é o preço, logo a referida declaração, acompanhada dos respetivos certificados de habilitações, era um documento da proposta que contém termos ou condições, nos termos das disposições conjugadas do artigo 57.º, n.º1, al. c), do CCP; X. As exigências a que devia obedecer esse documento (os seus termos e condições) encontravam-se previstas na Cláusula 41ª do Caderno de Encargos; XXI. De acordo com o disposto na Cláusula 41ª do Caderno de Encargos, durante a execução do Contrato, o empreiteiro é representado por um Diretor Técnico da Empreitada, com a qualificação mínima de Engenheiro Civil; XXII. Tendo a CI instruído a sua proposta com uma declaração onde refere que o Diretor Técnico da Empreitada seria um "Técnico Superior Construção Civil", a proposta viola termos e condições do Caderno de Encargos, sendo tal violação culminada com a sanção de exclusão (vide artigo 70.º, n.º 2, al. b), do CCP); DO NÃO AFASTAMENTO DO EFEITO ANULATÓRIO: XXIII. O Tribunal a quo considerou que, ainda que se verificasse a invalidade da adjudicação à CI por dever ser excluída, tal ilegalidade/invalidade/anulação não traz qualquer vantagem para a Autora, deixando-a na mesma posição, pelo que, a existência de um vício não deve conduzir à anulação, por aplicação do princípio da inoperância dos vícios ou utile per inutile non vitiatur; XXIV. Ora, também aqui, salvo o devido respeito, errou o Tribunal a quo, isto porque, caso a proposta da CI fosse excluída, isso significaria que todas as propostas no presente procedimento fossem excluídas, logo, sempre a Recorrida teria, ou a lançar novo concurso, ou de celebrar um ajuste direto (24.º, n.º 1, al. b), do CCP), sendo que, nessa fase, e em caso de não proceder a primeira parte do Recurso, sempre a Recorrente poderá adotar medidas de "Self-Cleaning" tendentes a afastar o impedimento que, reitera-se, não se verifica; XXV. Pelo que, a exclusão da proposta da CI não é inócua para a Recorrente. XXVI. Concluindo-se pela procedência do presente Recurso, deve ser anulado o ato que declarou a caducidade da adjudicação a favor da proposta Recorrente, condenando-se o Recorrido a Adjudicar a empreitada à proposta da Recorrente, por ser a que ficou graduada no primeiro posto; XXVII. Pelo que, deve revogar-se a decisão Recorrida. Nestes termos e nos demais de direito, como certamente suprirão, deve ser dado provimento ao Recurso, por provado, revogando-se a decisão recorrida. E, deste modo, farão JUSTIÇA! * A Ré contra-alegou, concluindo assim:1ª O ato impugnado não padece de qualquer ilegalidade que o inquine, centrando-se a sua substância em dois segmentos distintos, o do fundamento legal da caducidade da adjudicação e o da elegibilidade, por inverificação de quaisquer vícios, da proposta da contra-interessada; 2ª A condenação por crime de abuso de confiança fiscal, afeta e de forma grave a idoneidade / honorabilidade profissional de um cidadão, porque não existe segmento profissional da vida sem enquadramento pessoal, e fiscal, relacionando o indivíduo com o Estado, representando o universo dos seus concidadãos; 3ª A interpretação restritiva segundo a qual a idoneidade profissional apenas ficaria afetada pelo cometimento de crimes «relacionados com a profissão» e que contendam com a «violação das leis do emprego, da saúde e da segurança no local de trabalho» (da conclusão IX) não pode ser acolhida por desconsiderar as regras do mercado da contratação pública; 4ª É precisamente uma interpretação axiológica e holística do direito que exige, contra o sentido da conclusão VII, que o crime de abuso de confiança fiscal imponha a reputação da inidoneidade profissional do concorrente a um procedimento de concurso público; 5ª A idoneidade exigida pelo regime do Código dos Contratos Públicos é um «mais» que acresce às exigências previstas no regime do artigo 9º da Lei nº 41/2015, de 3 de junho, e no regime geral desta, que projeta as exigências aí consagradas para o desenvolvimento da atividade no mercado e comércio em geral; 6ª O conceito de “honorabilidade profissional” previsto na norma do artigo 55º do CCP é um conceito indeterminado cuja densificação não pode deixar de ser feita tendo em consideração o objeto da matéria, de contratação pública, sendo a parte adjetiva constituída pelos procedimentos pré-contratuais e a parte substantiva pelo estabelecimento e regime dos contratos a celebrar entre os operadores privados, como sucede no caso dos autos, e a Administração Pública em sentido amplo; 7ª Não existe qualquer ‘numerus clausus’ ou tipicidade da densificação daquele conceito, tendo a Administração no espectro do seu poder, não discricionário mas de boa gestão da coisa pública, qualificar como o fez quanto à inidoneidade da autora; 8ª E não convoca nem contende com qualquer juízo de inconstitucionalidade porque a decisão administrativa, de densificação do conceito, parte de uma asserção judicial estabelecida, essa sim definitiva e vigente; 9ª Finalmente, não padece a proposta da contra-interessada, enquanto tal, no âmbito e plano da adjudicação, como o sublinha a sentença recorrida, de qualquer vício que obste ao proferimento do despacho de adjudicação. 10ª Ao julgar como o fez, a sentença recorrida não só não violou qualquer norma ou princípio identificável de direito, como estabeleceu bem os factos e aplicou adequada e fundadamente o direito, com o nível que os seus próprios termos patenteiam; 11ª Não merecendo, pois, outra apreciação que não seja esse reconhecimento pelo Tribunal ad quem. Termos em que, E nos melhores de direito do douto suprimento, Deve proferir-se acórdão que mantenha incólume a douta sentença recorrida. Assim se fazendo justiça! * O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos contidos no artº 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.* Cumpre apreciar e decidir.FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1. A Autora foi condenada no âmbito do Processo nº 390/12.2IDBRG do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, por sentença de 12.02.2014, transitada em 14.03.2014, pelo crime de abuso de confiança fiscal previsto e punido pelo art. 105º nº 1, 4 e 7 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT) com referência ao art. 7º do RGIT, tendo sido aplicada uma multa de 300 dias no montante global de € 6.000,00 – Cfr. fls. 47, frente e verso, do processo físico cujo teor se tem por reproduzido para os devidos efeitos legais. 2. A Autora foi condenada no âmbito do Processo nº 447/11.7IDBRG do 3º juízo criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, por sentença de 19.06.2014, transitada em 08.06.2015, pelo crime de abuso de confiança fiscal previsto e punido pelo art. 105º nº 1, 4 e 5 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT) com referência ao art. 7º do RGIT, tendo sido aplicada uma multa de 600 dias no montante global de € 12.000,00 – Cfr. fls. 48, frente e verso, do processo físico cujo teor se tem por reproduzido para os devidos efeitos legais. 3. O administrador da Autora, AFC, foi condenado no âmbito do Processo nº 390/12.2IDBRG do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, por sentença de 12.02.2014, transitada em 14.03.2014, pelo crime de abuso de confiança fiscal previsto e punido pelo art. 105º nº 1 e 4 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT), tendo sido aplicada uma multa de 250 dias no montante global de € 3.750,00 – Cfr. fls. 50, frente e verso, do processo físico cujo teor se tem por reproduzido para os devidos efeitos legais. 4. O administrador da Autora, AFC, foi ainda condenado no âmbito do Processo nº 447/11.7IDBRG do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, por sentença de 02.09.2015, transitada em 25.06.2015, pelo crime de abuso de confiança fiscal previsto e punido pelo art. 105º nº 1, 4 e 5 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT), tendo sido aplicada uma pena de prisão de 1 (um) ano e 8 (oito) meses suspensa por igual período de 1 ano e 8 meses, com sujeição a deveres e multa de 180 dias no montante global de € 2.700,00 – Cfr. fls. 51, frente e verso, do processo físico cujo teor se tem por reproduzido para os devidos efeitos legais. 5. Através de anúncio publicado na parte L da 2ª série do Diário da República nº 91/2017, de 11 de Maio de 2017, sob número 3837/2017, foi lançado o concurso público para adjudicação da Empreitada do “CENTRO DE RESPOSTAS INTEGRADAS DE BRAGA – ADAPTAÇÃO E REMODELAÇÃO DAS INSTALAÇÕES”- Cfr. anúncio junto ao PA a fls. 18/20. 6. Decorre do Capitulo IV do Caderno de encargos do procedimento concursal referido em 05), entre o mais, o seguinte: “(…) CAPITULO IV – Representação das partes e controlo da execução do contrato Cláusula 41ª – Representação do empreiteiro 1- Durante a execução do contrato, o empreiteiro é representado por um director de obra, salvo nas matérias em que, em virtude da lei ou de estipulação diversa no caderno de encargos ou no Contrato, se estabeleça diferente mecanismo de representação. 2- O empreiteiro obriga-se, sob reserva de aceitação pelo dono da obra, a confiar a sua representação a um técnico com a seguinte qualificação mínima: Engenheiro Técnico Civil 3- Após a assinatura do contrato e antes da consignação, o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director de obra, indicando a sua qualificação técnica e ainda se o mesmo pertence ou não ao seu quadro técnico, devendo esta informação ser acompanhada por uma declaração do técnico designado…assumindo a responsabilidade pela direcção técnica da obra e comprometendo-se a desempenhar essa função com proficiência e assiduidade (…)” – Cfr. Caderno de Encargos junto com Doc. 8 da PI cujo teor se tem por reproduzido para os devidos efeitos legais 7. A Autora e a Contra-interessada apresentaram propostas no concurso referido em 05) – Facto não controvertido; Cfr. propostas juntas ao PA cujo teor se tem por reproduzidas. 8. Com a proposta referida em 05) a Contra Interessada (CI) FGS, Lda apresentou uma declaração onde refere, nomeadamente, o seguinte: “(…) em caso de adjudicação da referida empreitada, disponibilizará para a concretização da mesma, uma equipa composta pelos técnicos abaixo indicados, que possuirão as qualificações e habilitações estabelecidas e que os mesmos só poderão ser substituídos em caso de força maior e neste caso sempre com a aprovação da entidade adjudicante… 1) Director Técnico da empreitada: Nome: FGS Qualificação: Mestrança – Construção Civil – Tecn. Sup. Construção Civil Vínculo de ligação à Empresa: Socio Gerente da empresa 2) …” – Cfr. Doc. 09 junto com a PI. 9. A Autora com a sua proposta, referida em 07), emitiu uma declaração onde afirma que não foi condenada por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional nem os titulares dos seus órgãos sociais de administração, direcção ou gerência – Facto não controvertido. 10. Em 09.06.2017, no âmbito do procedimento concursal referido em 05) o Júri elaborou Relatório Preliminar manifestando intenção de propor a adjudicação à proposta da Autora pelo valor de € 192.999,99 – Cfr. doc 1 junto com a PI. 11. Em 21.06.2017 foi elaborado Relatório Final tendo proposto a adjudicação à Autora pelo valor de € 192.999,99 com base no critério do preço mais baixo – Cfr. Doc 2 junto com a PI. 12. Através de deliberação de 23.06.2017 a Ré decidiu adjudicar à Autora o contrato referido em 05) – Cfr. fls. 34 do processo físico. 13. A Ré comunicou à Autora em 27.06.2017, através de ofício de 23.06.2017, que lhe foi adjudicada a empreitada do “Centro de Respostas Integradas – Adaptação e Remodelação das Instalações”, tendo solicitada à mesma, entre o mais, o envio dos documentos de habilitação constantes do artigo 20º do Programa do Procedimento e exigidos nos termos do artigo 81º do CCP – Cfr. Doc. 3 junto com a PI cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; Cfr. ponto 10 da PI. 14. Em 04.07.2017 a Autora remeteu os documentos de identificação solicitados – Facto não controvertido. 15. Em 01.08.2017 foi solicitado à Autora, por um elemento do júri do concurso, via correio electrónico uma “ autorização do administrador judicial provisório, por escrito, para celebração do contrato nos termos dos nºs 2 a 5 do artigo 17º-E do CIRE e apresentada esta autorização a esta ARS Norte, IP, ou informação desse administrador judicial de que não considera o contrato como necessitando dessa autorização” – Cfr. doc. 4 junto com a PI. 16. Em 11.08.2017 à Autora foi comunicado pela Ré o seguinte: “…Na apresentação da proposta a empresa AC & Filhos, SA junta o Anexo I do CCP onde assevera que “ não foi condenado (a) por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afete a sua honorabilidade profissional (4) (ou os titulares dos seus órgãos sociais de administração, direcção ou gerência não foram condenados por qualquer crime que afete a sua honorabilidade profissional” (Cfr. nº 4 alínea b) da declaração). Na fase de habilitação com a apresentação dos documentos constituídos por certificado de registo criminal” verifica-se que as situações declaradas no anexo I não correspondem à verdade porque existem registos de condenações crime, transitadas em julgado, tanto na pessoa colectiva, quanto de um dos seus administradores, AFC. Deste modo estamos perante uma desarmonia entre os factos declarados e os documentados, sendo que esta situação consubstancia um dos impedimentos à contratação pública previsto na norma do art. 55º alínea b) do CCP. Assim propõe-se a caducidade da adjudicação da empreitada “Centro de respostas integradas de Braga – Adaptação e Remodelação de instalações” à empresa AC & Filhos, Lda”- Cfr. Doc. 6 junto com a PI. 17. Em 18.08.2018 a Autora pronunciou-se sobre a proposta de caducidade da adjudicação referida no ponto anterior – Cfr. Doc. 7 junto com a PI. 18. A proposta de caducidade da adjudicação referida em 16) foi mantida pela Ré e comunicada à Autora em 28.08.2017 – Facto não controvertido. 19. AFC é vice-presidente do conselho de administração da Autora – Cfr. Fls. 43/46 do processo físico. * Em sede de factualidade não provada o Tribunal registou: Com interesse para a decisão a proferir, inexistem. * E no que à motivação de facto respeita consignou que os factos dados como provados, resultam, no essencial, da apreciação livre, da prova documental junta aos autos pelas partes, incluindo o PA, consoante se enuncia em cada um dos pontos do probatório. Apoiou-se ainda o Tribunal na factualidade por ambas as partes aceite nos seus articulados e com eco, também, na documentação junta aos autos, nomeadamente os factos não controvertidos a que alude o probatório. * DE DIREITOÉ objecto de recurso a sentença que ostenta este discurso fundamentador: Importa agora, então, analisar a factualidade dada por provada para, à luz dos normativos legais, verificar se é de acudir ou não à pretensão da Autora. Começa a Autora por referir que depois de lhe ter sido adjudicada a empreitada do “Centro de respostas integradas de Braga – Adaptação e Remodelação das Instalações”, foi notificada da caducidade daquela adjudicação em virtude da sociedade e seu administrador terem sido condenados pelo crime de abuso de confiança fiscal, com o que discorda, salientando que as penas aplicadas foram cumpridas, inexistindo fundamento para a caducidade da adjudicação nos termos do artigo 55º nº 1 al. b) do CCP. Defende ainda que o crime de abuso de confiança fiscal não é susceptível de afectar a honra e reputação do agente e por essa razão, também, é ilegal o ato que determinou a caducidade da adjudicação nos termos do art. 55º nº 1 al. d) do CCP. Acrescenta ainda que, para operar o impedimento referido no artigo 55º nº 1 b) do CCP tinha de existir a aplicação de uma pena acessória de inibição para o exercício da profissão sob pena de inconstitucionalidade por violação do art. 34º nº 4 da CRP. Apreciando. - DA ILEGALIDADE DA CADUCIDADE DA ADJUDICAÇÃO: Consultando o probatório constatamos que efectivamente a Autora declarou por sua honra, aquando da apresentação da sua proposta para a empreitada em causa nestes autos, nos termos do art. 57º nº 1 al. a) do CCP, que não tinha sido condenada pela prática de nenhum crime, nem os seus administradores, que afectasse a sua honorabilidade profissional – Cfr. ponto 09) dos factos provados. Sucede, porém, que após ter sido adjudicada a empreitada à Autora e no seguimento da notificação para juntar a documentação de habilitação, nos termos do disposto no art. 81º e 85º do CCP, veio a mesma juntar ao procedimento o certificado do seu registo criminal e do seu administrador, donde decorria que os mesmos haviam sido condenados em 2014 e 2015, em dois processos-crime, pelo(s) crime(s) de abuso de confiança fiscal p. e p. no art. 105º do RGIT, tendo sido aplicadas penas de multa à Autora e ao seu administrador, AFC, uma pena de multa e uma pena de prisão suspensa por um ano e oito meses extinta em Março de 2017. Com efeito, consultando os factos provados, os mesmos noticiam que em 12.02. 2014 e 19.06.2014 a Autora foi condenada pelos crimes de abuso de confiança fiscal p. e p. pelo art. 105º nº 1, 4 e 5 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT), tendo sido condenada em 300 dias de multa no montante global de € 6.000,00 no Proc. 390/12.2IDBRG do Tribunal Judicial da Comarca de Braga e em multa de 600 dias no montante global de € 12.000,00 no Processo nº 447/11.7IDBRG, sentença esta última transitada em 25.06.2015 – Cfr. ponto 01) e 02) dos factos provados. Noticia igualmente o probatório que o administrador da Autora foi igualmente condenado pela prática de crimes de abuso de confiança fiscal previsto e punido pelo art. 105º nº 1 e 4 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT), por sentenças transitadas em 14.03.2014 (Processo nº 390/12.2IDBRG do Tribunal Judicial da Comarca de Braga) e 25.06.2015 (Processo nº 447/11.7IDBRG do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Braga), tendo sido condenado, respectivamente, em pena de multa de 250 dias no montante global de € 3.750,00 e pena de prisão de 1 (um) ano e 8 (oito) meses suspensa por igual período de 1 ano e 8 meses, com sujeição a deveres e multa de 180 dias no montante global de € 2.700,00 – Cfr. pontos 03) e 04) dos factos provados. Certo é que, para a Autora, o facto de ter sido condenada, assim como o seu administrador, não implica a caducidade da adjudicação nos termos dos artigos 55º nº 1 al. b) e 86º do CCP porque, em seu entender, os crimes pelos quais foram acusados e condenados – abuso de confiança fiscal p. e p. art. 105º do RGIT - não afectam a sua honorabilidade, tendo as penas sido cumpridas. Vejamos o que diz a lei. Decorre do artigo 55º nº 1 do CCP, na redacção aplicável (DL nº 149/2012, de 12 de julho), com interesse para a situação em análise, o seguinte: “Impedimentos Não podem ser candidatos, concorrentes ou integrar qualquer agrupamento, as entidades que: a) Se encontrem em estado de insolvência (…) b) Tenham sido condenadas por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas, tenham sido condenados por aqueles crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções; c) Tenham sido objeto de aplicação de sanção administrativa por falta grave em matéria profissional (…) d) Não tenham a sua situação regularizada relativamente a contribuições para a segurança social em Portugal ou, se for o caso, no Estado de que sejam nacionais ou no qual se situe o seu estabelecimento principal; e) Não tenham a sua situação regularizada relativamente a impostos devidos em Portugal ou, se for o caso, no Estado de que sejam nacionais ou no qual se situe o seu estabelecimento principal; f) Tenham sido objeto de aplicação da sanção acessória prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, na alínea b) do n.º 1 do artigo 71.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, e no n.º 1 do artigo 460.º do presente Código, durante o período de inabilidade fixado na decisão condenatória; g) Tenham sido objeto de aplicação da sanção acessória prevista na alínea b) do n.º 2 do artigo 562.º do Código de Trabalho; h) Tenham sido objeto de aplicação, há menos de dois anos, de sanção administrativa ou judicial pela utilização ao seu serviço de mão-de-obra legalmente sujeita ao pagamento de impostos e contribuições para a segurança social(…) i) Tenham sido condenadas por sentença transitada em julgado por algum dos seguintes crimes, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas, tenham sido condenados pelos mesmos crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação: i) Participação em atividades de uma organização criminosa, tal como definida no n.º 1 do artigo 2.º da Ação Comum n.º 98/773/JAI, do Conselho; ii) Corrupção, na acepção do artigo 3.º do Ato do Conselho, de 26 de maio de 1997, e do n.º 1 do artigo 3.º da Ação Comum n.º 98/742/JAI, do Conselho; iii) Fraude, na acepção do artigo 1.º da Convenção relativa à Protecção dos Interesses Financeiros das Comunidades Europeias; iv) Branqueamento de capitais, na acepção do artigo 1.º da Diretiva n.º 91/308/CEE, do Conselho, de 10 de junho, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais; j) Tenham, a qualquer título, prestado, direta ou indiretamente, assessoria ou apoio técnico na preparação e elaboração das peças do procedimento que lhes confira vantagem que falseie as condições normais de concorrência”. Na situação trazida a entidade adjudicante apoiou legalmente a sua decisão de caducidade da adjudicação na al. b) do normativo transcrito donde decorre que aquela caducidade ocorre quando a adjudicatária tenha sido condenadas por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas (como é o caso), tenham sido condenados por aqueles crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções. Na situação colocada, como se viu quer a Autora quer o seu administrador, AFC, foram condenados pela prática do crime de abuso de confiança fiscal e aquele seu administrador contínua no exercício de funções – Cfr. pontos 19), 03) e 04) dos factos provados. Nestas situações, de modo a “suprir” este impedimento futuramente, os operadores económicos que pretendam concorrer aos procedimentos da contratação pública que tem na mira uma maior participação, podem adoptar medidas “Self-Cleaning” que lhes assegurem, quando abrangidos por casos de impedimento, a possibilidade de “reaquisição” do direito de participar em procedimentos de contratação pública, devendo para tanto demonstrar ter adoptado certas providências de carácter organizacional. Veja-se actual artigo 55º -A do CCP, introduzido pelo DL nº 111-B/2017 de 31.08 e Rectificação nº 36-A/2017 de 30.1.0 Refere PEDRO COSTA GONÇALVES [In, O Direito dos Contratos Públicos, Almedina, p. 243.], a este respeito que: “Um afloramento desta ideia de regeneração pode ver-se na referência ao facto de, tratando-se de pessoas colectivas, os impedimentos indicados nas alíneas b), c) e i) do artigo 55º existirem apenas enquanto os responsáveis se encontrarem “em efectividade de funções”. Mas, como se disse, na situação trazida, independentemente do cumprimento das penas aplicadas, o certo é que o administrador condenado em processo-crime permanece “em efectividade de funções”, o que não afasta o impedimento e suas consequências ao nível da caducidade da adjudicação nos termos dos artigos 81º, 86º e 55º nº 1 b) do CCP. Não obstante, como se disse igualmente, entende a A. que o tipo de crime previsto no art. 105º do RGIT, não afecta a honorabilidade da Autora. Como sabemos, o crime de abuso de confiança fiscal vem definido no artigo 105º do RGIT donde decorre o seguinte: “1 - Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar é punido com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias.” Para a Autora, o que importa é o facto das penas aplicadas nas condenações que padeceu, assim como o seu administrador, terem sido cumpridas, entendendo que o crime em causa não afecta a honorabilidade do(s) agente(s). Mas não é assim. Alude o normativo à honorabilidade profissional e ao facto de continuar em exercício de funções o gerente ou administrador condenado (art. 55º nº 1 al. b)). O administrador continua em funções, como se viu, o que aponta em sentido inverso ao da reabilitação pretendida, sendo certo, ademais, que a pena de prisão suspensa aplicada ao administrador da Autora apenas extinguiu em 09.03.2017, conforme decorre do registo criminal. Relativamente à honorabilidade profissional, cremos que efectivamente o crime de abuso de confiança fiscal afecta a honorabilidade do seu agente, in casu da Autora e seu administrador, desde logo por estar na previsão da norma incriminadora em causa (art. 105º do RGIT), uma apropriação de verbas/dinheiros provenientes de impostos, os quais constituem receita pública do Estado para satisfação de necessidades colectivas. A apropriação por via de arrecadação/liquidação quer do IVA que é propriedade do Estado (e que tem de lhe ser entregue depois das deduções legais), de contribuições ou do IRS retido aos trabalhadores, tem de ser entregue nos cofres do Estado por se tratar de verba que não pertencem às empresas mas ao Estado, por assim ser é que o incumprimento desta entrega merece censura contra-ordenacional e penal (abuso de confiança de que vimos falando), a tal não obstando as circunstancias de crise em que se encontre determinada empresa obrigada àquela entrega, não sendo razão válida para legitimar a apropriação de dinheiros que nos cofres do Estado devem ser entregues para satisfação de necessidades colectivas/públicas, os interesses privados na gestão da orgânica da empresa e suas opções em razões de dificuldades da mesma, os quais devem ceder perante os interesses prevalecentes do Estado credor no recebimento que lhe é devido. É necessário garantir e impor às empresas, através dos seus gestores/administradores, “ um dever de conduta de modo a que não se verifique a sistemática preterição das obrigações para com o Estado, a favor de outros credores com maiores possibilidades de pressionar a empresa no sentido do cumprimento (em especial, em impostos retidos na fonte ou cobrados pela empresa, como o IVA).” [Sanches, J.L. Saldanha, Manual de Direito Fiscal, 3ª Edição, Coimbra Editora, 2007 (cf. a pág. 272).] Como se disse no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 04.02.2013, dizemos também nós que: “A obrigação de entregar os impostos ao Estado é uma obrigação legal, mais relevante que a obrigação de pagar os salários aos trabalhadores ou que o pagamento das despesas correntes duma empresa.”- Cfr. Ac. TRG de 04.02.2013, Proc. nº 285/11.7IDBRG.G1. Disse-se ainda no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09.10.2013, Proc. nº 1033/10.4TAVFR.P1: “I – A obrigação de pagamento dos salários aos trabalhadores da empresa é hierarquicamente inferior ao dever legal de entregar à Segurança Social a contribuição descontada no salário dos mesmos trabalhadores, a qual visa satisfazer bens coletivos essenciais á existência e funcionamento do Estado Social de Direito (artºs 1º e 63º CRP) II - O pagamento dos salários não constitui causa de exclusão da culpa nem da ilicitude quanto ao crime de abuso de confiança á Segurança Social; III - Não há desconformidade entre o artº 36º do CP e o artº 59º, n.º 1 da CRP. IV - Não viola a Constituição o entendimento de que é punível a conduta daquele que não entrega á Segurança Social os valores descontados nos salários dos trabalhadores, mesmo que tais valores tenham servido para manter a empresa em laboração e pagar os salários aos mesmos trabalhadores”. Ante o exposto, temos por certo que o facto da empresa/Autora se apropriar ou reter dinheiros de impostos que deve entregar nos cofres do Estado, que arrecada por via dessa sua actividade empresarial, incumprindo ou retardando essa sua tarefa afecta, necessariamente, a sua capacidade de honrar os seus deveres legais e profissionais, constituiu o crime de abuso de confiança fiscal, afectando, por conseguinte, a honorabilidade profissional. Mais ainda quando, visto ao nível da contratação pública em que se obsta a que acedam à celebração com a administração contraentes incumpridores, por via de impedimentos, designadamente dos compromissos fiscais/pagamento de impostos ao Estado (cfr. art. 55º nº 1 al. d) e e) do CCP) e, por maioria de razão, que tenham sido condenadas por crimes de abuso de confiança fiscal pois que em causa fica a sua capacidade de honrar compromissos e deveres junto da Administração Fiscal e, quando incumpre e é punida criminalmente, naturalmente a sua honorabilidade profissional é posta em crise e questionada. De resto, em sede de Direito Fiscal, a simples falta de pagamento dos impostos pelos gerentes e administradores da sociedade onde exercem funções faz já presumir a culpa dos mesmos pelo não pagamento dos impostos (art. 24º nº 2 al. b) da LGT), o que afecta a sua honra profissional, sobretudo se a esta presunção de culpa acrescer uma censura penal, como in casu, quer da sociedade Autora quer do seu administrador (que exterioriza a vontade da mesma à luz do CSC, como sabemos). Além disso, o próprio TJ tem entendido que uma falta profissional grave contende, também ela, com um comportamento culposo que tenha incidência na honorabilidade profissional do operador que não se baste com a violação de regras deontológicas, sobretudo se esse comportamento foi sancionado com uma coima – Veja-se Acórdão de 13.12.2012, Forposta, Proc. C-465/11 e o Acórdão 18/12/2014, Generali – Providencia Bistositó Zrt, Proc. C-470/13. Deste modo, por maioria de razão um crime, como o abuso de confiança fiscal, com os contornos acima referidos, afecta a honorabilidade do agente económico/concorrente aqui Autora. Também não cremos que era necessário a aplicação de uma sanção acessória de modo a que o impedimento do artigo 55º nº 1 al. b) operasse, desde logo por não decorrer daquele normativo, à semelhança daquilo que sucede com algumas contra ordenações (Cfr. artigo 55º nº 1 al. f) e g) do CCP). Na situação trazida a norma apenas implica a condenação em processo-crime, transitada em julgado que afecte a honorabilidade profissional e não também que haja inibição acessória de exercer a actividade ou concorrer a procedimentos concursais, inexistindo, pois, também, qualquer afronta à lei fundamental, nomeadamente do art. 30º nº 4 da CRP, como entende a Autora. O artigo 30.º da CRP respeita aos Limites das penas e das medidas de segurança, estabelecendo que não poderá haver penas ou medidas de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, nem de duração ilimitada ou indefinida (nº 1). E que: “4. Ninguém pode ser privado, por motivos políticos, da cidadania portuguesa, da capacidade civil ou do nome. Mas, como se viu, o impedimento em causa está justificado como forma de protecção da administração de contraentes que ofereçam risco de incumprimento por sair beliscada a sua honorabilidade profissional, não criando condições desiguais para o universo dos concorrentes, sem que assim se afronte o artigo 30º nº 4 da CRP pois o motivo da não adjudicação ocorre na medida do impedimento, mercê da condenação num processo-crime, inexistindo qualquer privação (menos ainda eternizada) na contratação que não seja por esta razão legal vertida no artigo 55º nº 1 al. b) do CCP e não pelas razões referidas no art. 30º nº 4 da CRP que aqui não tem aplicação. De resto, como se viu, na redacção aplicável, o art. 55º nº 1 al. b) do CCP reportava-se à honorabilidade profissional das pessoas colectivas que fossem condenadas em processo-crime com a manutenção dos seus administradores na administração e gestão da empresa, nada mais referindo, nomeadamente para reabilitação (ao contrário da actual redacção em vigor desde Janeiro de 2018). Relativamente à condenação das sociedades nos crimes tipificados na alínea i) do nº 1 daquele art. 55º (crimes de Participação em actividades de uma organização criminosa, Corrupção, Fraude e Branqueamento de capitais), ao contrário do artigo 55º nº 1 b), este normativo não se referia à honorabilidade profissional do agente mas, antes, à manutenção dos administradores na gestão/administração e à reabilitação. São pois, situações (e crimes) diferentes as vertidas na alínea b) e i) do nº 1 do artigo 55º do CCP, contrariamente ao que, se bem vemos, é entendimento da Autora. Certo é, no entanto, que, em ambas as alíneas o fundamento do impedimento à adjudicação se prende com razões de ética na contratação pública e idoneidade profissional, pretendendo-se que na contratação pública participem apenas concorrentes responsáveis como forma de protecção da administração pública adjudicante, tanto assim que a participação em procedimento de adjudicação em situação de impedimento previsto no artigo constitui contra ordenação – Cfr. art. 456º a) e 458º do CCP. Aqui chegados, temos para nós que improcedem as ilegalidades apontadas ao ato de caducidade da adjudicação. - DA EXCLUSÃO DA PROPOSTA DA CONTRA INTERESSADA (C.I.) FGS, LDA: Entende a Autora que a proposta da C.I. FGS, Lda deveria ser excluída por violação do art. 41º nº 2 do Caderno de Encargos (CE), nos termos do art. 70º nº 2 al. b) e 146º nº 2 al. o) do CCP. Vejamos. Na situação que nos cabe analisar, o capítulo IV do C.E., onde se insere o normativo alegadamente violado pela C.I. (art. 41º nº 2), respeita à fase de execução do contrato. Decorre, com efeito daquele capítulo e normativo o seguinte: “(…) CAPITULO IV – Representação das partes e controlo da execução do contrato Cláusula 41ª – Representação do empreiteiro 4- Durante a execução do contrato, o empreiteiro é representado por um director de obra, salvo nas matérias em que, em virtude da lei ou de estipulação diversa no caderno de encargos ou no Contrato, se estabeleça diferente mecanismo de representação. 5- O empreiteiro obriga-se, sob reserva de aceitação pelo dono da obra, a confiar a sua representação a um técnico com a seguinte qualificação mínima: Engenheiro Técnico Civil 6- Após a assinatura do contrato e antes da consignação, o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director de obra, indicando a sua qualificação técnica e ainda se o mesmo pertence ou não ao seu quadro técnico, devendo esta informação ser acompanhada por uma declaração do técnico designado…assumindo a responsabilidade pela direcção técnica da obra e comprometendo-se a desempenhar essa função com proficiência e assiduidade - Cfr. ponto 06) dos factos provados. No Programa do concurso, designadamente do artigo 15º nº 2 do mesmo decorre os motivos pelos quais as propostas podem ser excluídas, dali não resultando que a não identificação de um Engenheiro Civil na proposta leve à exclusão. Consta, com efeito, daquele normativo o seguinte: “2. São excluídas as propostas cuja análise revele: a) Que não apresentam, algum dos atributos, nos termos disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 57º do CCP, e descritos neste procedimento; b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspectos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto no nº 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49º do CCP c) A impossibilidade de avaliação em virtude da forma de apresentação dos respectivos atributos d) Que o preço contratual seja superior ao preço base e) Um preço anormalmente baixo… f) Que o contrato a celebrar implicaria a violação de qualquer vinculação legal ou regulamentar aplicável g) A existência de fortes indícios de actos, acordos, práticas ou informações susceptíveis de falsear as regras da concorrência h) Não tenham sido recebidas no prazo fixado para apresentação de propostas.” O que está em causa nestes autos é o facto da CI não ter indicado na sua proposta um engenheiro civil para a representar, estando em causa não um atributo da sua proposta submetido à concorrência (art. 57º nº 1 al. b) do CCP), mas um aspecto respeitante à representação do empreiteiro na fase de execução do contrato. Trata-se de um elemento do CE que não está submetido à concorrência, não sendo objecto de avaliação de acordo com o critério de adjudicação (Preço mais baixo), uma vez que os aspectos não submetidos à concorrência são todos aqueles que não são objecto de avaliação e classificação, como é o caso – Cfr. art. 42º do CCP. No critério de adjudicação do mais baixo preço (artº 74º nº 1 b) CCP) o conteúdo dos aspectos de execução submetidos à concorrência (atributos - artº 56º nº 2) mostra-se reduzido à sua expressão mínima, sendo total a definição dos restantes aspectos não submetidos à concorrência (parâmetros - artº 42º nºs. 3/4/5), pelo que o único aspecto submetido à concorrência para efeitos de avaliação é o preço contratual (artº 97º nº 1) proposto pelos concorrentes. O critério de adjudicação do presente concurso público é o do mais baixo preço, o que significa que nestas circunstâncias a Administração deve apresentar um caderno de encargos que defina todos os restantes aspectos da execução do contrato a celebrar, submetendo apenas à concorrência o preço a pagar pela entidade adjudicante pela execução de todas as prestações que constituem o objecto daquele. – artº 74º nº 2 CCP. Do outro lado da relação jurídica procedimental, significa que os concorrentes não carecem de desenvolver nenhuma actividade concretizadora de aspectos essenciais do caderno de encargos, na exacta medida em que são chamados simplesmente a aderir ao projecto contratual que o respectivo clausulado configura, com a única excepção do factor preço a pagar pela entidade adjudicante na empreitada. O mesmo é dizer que o conteúdo dos aspectos de execução submetidos à concorrência se mostra reduzido à sua expressão mínima, como se disse, sendo total a definição dos restantes aspectos não submetidos à concorrência (parâmetros base, artº 42º nºs. 3, 4 e 5 CCP), dado que o único aspecto submetido à concorrência e, nessa medida, aberto à apresentação de propostas por parte dos concorrentes, é o preço. Relativamente aos aspectos da execução do contrato a celebrar, não submetidos à concorrência, devem também constar da proposta (art. 57º nº 1 c) CCP). A questão é saber se podem motivar a exclusão da proposta, como na situação colocada, em que não foi indicado um engenheiro civil para representar o empreiteiro na fase de execução do contrato. Consultando o CE, dali decorre que a representação do empreiteiro tem ser assegurada por um engenheiro civil, efectivamente. Contudo, o mesmo CE estabelece que “Após a assinatura do contrato e antes da consignação, o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director de obra, indicando a sua qualificação técnica e ainda se o mesmo pertence ou não ao seu quadro técnico, devendo esta informação ser acompanhada por uma declaração do técnico designado…assumindo a responsabilidade pela direcção técnica da obra e comprometendo-se a desempenhar essa função com proficiência e assiduidade - Cfr. nº 3 do art. 41º do CE a que alude o ponto 06) dos factos provados. O assim estabelecido no CE não corresponde a uma razão de exclusão se na proposta não for indicado o Engenheiro civil, quando daquela peça do procedimento resulta e se extrai que, só após a assinatura do contrato e antes da consignação o técnico/Engenheiro civil é de facto indicado, pois só nesse momento o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director de obra, indicando a sua qualificação técnica e ainda se o mesmo pertence ou não ao seu quadro técnico. Decorre do artigo 70º (Análise das propostas e adjudicação), nº 2, al. b) do CCP, o seguinte: 2 - São excluídas as propostas cuja análise revele: (…) b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos n.os 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49.º; (…)” Estabelecendo o artigo 146º (Relatório Preliminar), nº 2 al. o) do mesmo diploma legal que: “2 - No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas: (…) “o) Cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º”. Não cremos que, ainda que não fosse indicado um Engenheiro Civil com a Proposta, tal fosse causa de exclusão na medida em que em momento posterior poderá ser indicado apenas para representar o empreiteiro, nomeadamente aquando da execução material do contrato, devendo a declaração do mesmo ser entregue depois da assinatura do contrato e antes da consignação (Cfr. artigo 41º nº 3 do CE.), sendo certo, como se disse, que só depois da consignação é que se confirma quem é o técnico que terá essa função de representação do empreiteiro. Temos para nós que, não se verifica nenhuma das circunstância tipificadas no artigo 146º nº 2 que impusesse logo ao júri em sede preliminar propor a exclusão da proposta da CI, nomeadamente por falta dos documentos aludidos no artº. 57º nº 1 al. b) e c) do CCP, como se viu (b) Documentos que, em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar; c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule). A não junção ou indicação pela CI ao procedimento concursal identificado, com a respectiva proposta, de um Engenheiro Civil para acompanhar a execução do contrato, não é motivo de exclusão da referida proposta ao abrigo do disposto nos artigos 146.º, n.º 2, 57.º e 70º nº 2 do CCP, por não respeitar a documentos exigidos pelo programa de procedimento “que contenham os termos ou condições” respeitantes a “aspectos da execução do contrato” submetidos à concorrência aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule, tratando-se de uma formalidade quanto à representação do empreiteiro na execução que poderá ser indicada posteriormente (41º nº 3 do CE) e que também, o júri, antes de pretender excluir deveria mandar juntar/esclarecer/suprir. Não se trata propriamente de um elemento ou condição que viole a execução do contrato em si mas que tem que ver, apenas, com a representação do empreiteiro na execução do contrato a concretizar em momento posterior à consignação do contrato. Segundo M. E R. ESTEVES DE OLIVEIRA[ In, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina, p. 442.], essencial seria a falta ou irregularidade que prejudicasse a igualdade entre os concorrentes ou a possibilidade da correcta e imparcial comparação de uma com as outras propostas; caso contrário, a irregularidade da proposta será não essencial, e isso independentemente de tais irregularidades serem de carácter formal ou substantivo Por outro lado sempre se dirá que, ainda que ocorresse razão de exclusão e não adjudicação à CI, tal seria irrelevante/inoperante para a esfera jurídica da Autora na medida em que, o afastamento da adjudicação à CI graduada em segundo lugar ou lugar subsequente ao do concorrente impedido (artigo 86º nº 4 do CCP), mercê do impedimento da A. (art. 55º nº 1 al b) do CCP), nunca determinaria que o contrato fosse adjudicado àquela Autora com quem se verificou, como se viu supra, a caducidade da adjudicação. Assim sendo, ainda que se verificasse a invalidade da adjudicação à CI por dever ser excluída, concluindo-se que tal ilegalidade/invalidade/anulação não traz qualquer vantagem para a Autora, deixando-a na mesma posição, a existência de um vício não deve conduzir à anulação, por aplicação do princípio da inoperância dos vícios ou utile per inutile non vitiatur, razão pela qual será de manter a adjudicação ao CI graduado seguinte, nos termos do artigo 86º nº 4 do CCP. Como se disse no sumário do Acórdão do TCA Norte, de 08/01/2016, no P. 02366/14.6BEBRG, diremos também nós que: “(…) Efetivamente, o princípio do aproveitamento do ato administrativo, vem sendo reconhecido quanto à sua existência e relevância, admitindo-se operar em determinadas circunstâncias. Tal princípio permite negar relevância anulatória ao erro da Administração, mesmo no domínio dos atos proferidos no exercício de um poder discricionário, quando, pelo conteúdo do ato e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar-se, com segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa. Não está em causa sanar os vícios detetados, mas tão-só tornar inoperante a força invalidante dos mesmos, em resultado da verificada inutilidade da anulação resultante do juízo de evidência quanto à conformidade material do ato com a ordem jurídica, uma vez que a anulação do ato não traduz vantagem real ou alcance prático para o impugnante. Na realidade, se não obstante a verificação de vício anulatório do ato recorrido, se concluir que tal anulação não traria qualquer vantagem para o recorrente, deixando-o na mesma posição, a existência de tal vício não deve conduzir à anulação, por aplicação do princípio da inoperância dos vícios ou utile per inutile non vitiatur.” Aqui volvidos, ante todo o exposto, terá de se concluir pela improcedência da pretendida exclusão da proposta da CI e consequente anulação da adjudicação à mesma. X Vejamos:Na óptica da Recorrente a sentença padece de erro de julgamento de direito. Sustenta que o Tribunal a quo fez uma menos boa interpretação da factualidade e uma incorreta aplicação do direito. Todavia mais não faz do que reiterar a posição assumida nos articulados, como se não tivesse sido bem escalpelizada, de tal modo que nos revemos, por inteiro, na leitura efectuada pela Senhora Juíza. De facto o julgado está alicerçado na lei, na doutrina e na jurisprudência e assenta na factualidade levada ao probatório e não impugnada pela partes, mormente pela Recorrente. Ora, relativamente à honorabilidade profissional, cremos que efectivamente o crime de abuso de confiança fiscal afecta a honorabilidade do seu agente, in casu da Autora e seu administrador, desde logo por estar na previsão da norma incriminadora em causa (artº 105º do RGIT), uma apropriação de verbas/dinheiros provenientes de impostos, os quais constituem receita pública do Estado para satisfação de necessidades colectivas, tal como sentenciado. Além disso, o próprio TJ tem entendido que uma falta profissional grave contende, também ela, com um comportamento culposo que tenha incidência na honorabilidade profissional do operador que não se baste com a violação de regras deontológicas, sobretudo se esse comportamento foi sancionado com uma coima - Acórdãos de 13/12/2012, Proc. C-465/11 e de 18/12/2014, Proc. C-470/13. Deste modo, por maioria de razão um crime, como o abuso de confiança fiscal, com os contornos acima referidos, afecta a honorabilidade do agente económico/concorrente, no caso, a aqui Autora 3. Aqui chegados, temos para nós que improcedem as ilegalidades apontadas ao ato de caducidade da adjudicação.» - lê-se na sentença e aqui corrobora-se. E acrescenta «Consultando o probatório constatamos que efectivamente a Autora declarou por sua honra, aquando da apresentação da sua proposta para a empreitada em causa nestes autos, nos termos do art. 57º nº 1 al. a) do CCP, que não tinha sido condenada pela prática de nenhum crime, nem os seus administradores, que afectasse a sua honorabilidade profissional – Cfr. ponto 09) dos factos provados. Sucede, porém, que após ter sido adjudicada a empreitada à Autora e no seguimento da notificação para juntar a documentação de habilitação, nos termos do disposto no art. 81º e 85º do CCP, veio a mesma juntar ao procedimento o certificado do seu registo criminal e do seu administrador, donde decorria que os mesmos haviam sido condenados em 2014 e 2015, em dois processos-crime, pelo(s) crime(s) de abuso de confiança fiscal p. e p. no art. 105º do RGIT, tendo sido aplicadas penas de multa à Autora e ao seu administrador, AFC, uma pena de multa e uma pena de prisão suspensa por um ano e oito meses extinta em Março de 2017. Com efeito, consultando os factos provados, os mesmos noticiam que em 12.02. 2014 e 19.06.2014 a Autora foi condenada pelos crimes de abuso de confiança fiscal p. e p. pelo art. 105º nº 1, 4 e 5 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT), tendo sido condenada em 300 dias de multa no montante global de € 6.000,00 no Proc. 390/12.2IDBRG do Tribunal Judicial da Comarca de Braga e em multa de 600 dias no montante global de € 12.000,00 no Processo nº 447/11.7IDBRG, sentença esta última transitada em 25.06.2015 – Cfr. ponto 01) e 02) dos factos provados. Noticia igualmente o probatório que o administrador da Autora foi igualmente condenado pela prática de crimes de abuso de confiança fiscal previsto e punido pelo art. 105º nº 1 e 4 do Regime Geral de Infracções Tributárias (RGIT), por sentenças transitadas em 14.03.2014 (Processo nº 390/12.2IDBRG do Tribunal Judicial da Comarca de Braga) e 25.06.2015 (Processo nº 447/11.7IDBRG do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Braga), tendo sido condenado, respectivamente, em pena de multa de 250 dias no montante global de € 3.750,00 e pena de prisão de 1 (um) ano e 8 (oito) meses suspensa por igual período de 1 ano e 8 meses, com sujeição a deveres e multa de 180 dias no montante global de € 2.700,00 - Cfr. pontos 03) e 04) dos factos provados. Certo é que, para a Autora, o facto de ter sido condenada, assim como o seu administrador, não implica a caducidade da adjudicação nos termos dos artigos 55º nº 1 al. b) e 86º do CCP porque, em seu entender, os crimes pelos quais foram acusados e condenados – abuso de confiança fiscal p. e p. art. 105º do RGIT - não afectam a sua honorabilidade, tendo as penas sido cumpridas. Vejamos o que diz a lei: … … … [artigo 55º nº 1 do CCP] Na situação trazida a entidade adjudicante apoiou legalmente a sua decisão de caducidade da adjudicação na al. b) do normativo transcrito donde decorre que aquela caducidade ocorre quando a adjudicatária tenha sido condenada por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas (como é o caso), tenham sido condenados por aqueles crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções. Na situação colocada, como se viu quer a Autora quer o seu administrador, AFC, foram condenados pela prática do crime de abuso de confiança fiscal e aquele seu administrador contínua no exercício de funções - Cfr. pontos 19), 03) e 04) dos factos provados. Nestas situações, de modo a “suprir” este impedimento futuramente, os operadores económicos que pretendam concorrer aos procedimentos da contratação publica que tem na mira uma maior participação, podem adoptar medidas “Self Cleaning” que lhes assegurem, quando abrangidos por casos de impedimento, a possibilidade de “reaquisição” do direito de participar em procedimentos de contratação pública, devendo para tanto demonstrar ter adoptado certas providências de caracter organizacional. Veja-se actual artigo 55º -A do CCP, introduzido pelo DL nº 111-B/2017 de 31.08 e Rectificação nº 36-A/2017 de 30.1.0 Refere Pedro Costa Gonçalves, a este respeito que: “Um afloramento desta ideia de regeneração pode ver-se na referência ao facto de, tratando-se de pessoas colectivas, os impedimentos indicados nas alíneas b), c) e i) do artigo 55º existirem apenas enquanto os responsáveis se encontrarem “em efectividade de funções”. Mas, como se disse, na situação trazida, independentemente do cumprimento das penas aplicadas, o certo é que o administrador condenado em processo-crime permanece “em efectividade de funções”, o que não afasta o impedimento e suas consequências ao nível da caducidade da adjudicação nos termos dos artigos 81º, 86º e 55º nº 1 b) do CCP. Não obstante, como se disse igualmente, entende a A. que o tipo de crime previsto no art. 105º do RGIT, não afecta a honorabilidade da Autora. Como sabemos, o crime de abuso de confiança fiscal vem definido no artigo 105º do RGIT donde decorre o seguinte: “1 - Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar é punido com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias.” Para a Autora, o que importa é o facto das penas aplicadas nas condenações que padeceu, assim como o seu administrador, terem sido cumpridas, entendendo que o crime em causa não afecta a honorabilidade do(s) agente(s). Mas não é assim. Alude o normativo à honorabilidade profissional e ao facto de continuar em exercício de funções o gerente ou administrador condenado (art. 55º nº 1 al. b)). O administrador contínua em funções, como se viu, o que aponta em sentido inverso ao da reabilitação pretendida, sendo certo, ademais, que a pena de prisão suspensa aplicada ao administrador da Autora apenas se extinguiu em 09.03.2017, conforme decorre do registo criminal. Relativamente à honorabilidade profissional, cremos que efectivamente o crime de abuso de confiança fiscal afecta a honorabilidade do seu agente, in casu da Autora e seu administrador, desde logo por estar na previsão da norma incriminadora em causa (art. 105º do RGIT), uma apropriação de verbas/dinheiros provenientes de impostos, os quais constituem receita pública do Estado para satisfação de necessidades colectivas. A apropriação por via de arrecadação/liquidação quer do IVA que é propriedade do Estado (e que tem de lhe ser entregue depois das deduções legais), de contribuições ou do IRS retido aos trabalhadores, tem de ser entregue nos cofres do Estado por se tratar de verbas que não pertencem às empresas mas ao Estado, por assim ser é que o incumprimento desta entrega merece censura contra-ordenacional e penal (abuso de confiança de que vimos falando), a tal não obstando as circunstâncias de crise em que se encontre determinada empresa obrigada àquela entrega, não sendo razão válida para legitimar a apropriação de dinheiros que nos cofres do Estado devem ser entregues para satisfação de necessidades colectivas/públicas, os interesses privados na gestão da orgânica da empresa e suas opções em razões de dificuldades da mesma, os quais devem ceder perante os interesses prevalecentes do Estado credor no recebimento que lhe é devido. É necessário garantir e impor às empresas, através dos seus gestores/administradores, “ um dever de conduta de modo a que não se verifique a sistemática preterição das obrigações para com o Estado, a favor de outros credores com maiores possibilidades de pressionar a empresa no sentido do cumprimento (em especial, em impostos retidos na fonte ou cobrados pela empresa, como o IVA). Como se disse no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 04.02.2013, dizemos também nós que: “A obrigação de entregar os impostos ao Estado é uma obrigação legal, mais relevante que a obrigação de pagar os salários aos trabalhadores ou que o pagamento das despesas correntes duma empresa.”- Cfr. Ac. TRG de 04.02.2013, Proc. nº 285/11.7IDBRG.G1. Disse-se ainda no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09.10.2013, Proc. nº 1033/10.4TAVFR.P1: “I-A obrigação de pagamento dos salários aos trabalhadores da empresa é hierarquicamente inferior ao dever legal de entregar à Segurança Social a contribuição descontada no salário dos mesmos trabalhadores, a qual visa satisfazer bens coletivos essenciais à existência e funcionamento do Estado Social de Direito (artºs 1º e 63º CRP) II-O pagamento dos salários não constitui causa de exclusão da culpa nem da ilicitude quanto ao crime de abuso de confiança à Segurança Social; III - Não há desconformidade entre o artº 36º do CP e o artº 59º, n.º 1 da CRP. IV - Não viola a Constituição o entendimento de que é punível a conduta daquele que não entrega à Segurança Social os valores descontados nos salários dos trabalhadores, mesmo que tais valores tenham servido para manter a empresa em laboração e pagar os salários aos mesmos trabalhadores”. Ante o exposto, temos por certo que o facto da empresa/Autora se apropriar ou reter dinheiros de impostos que deve entregar nos cofres do Estado, que arrecada por via dessa sua actividade empresarial, incumprindo ou retardando essa sua tarefa afecta, necessariamente, a sua capacidade de honrar os seus deveres legais e profissionais, constituiu o crime de abuso de confiança fiscal, afectando, por conseguinte, a honorabilidade profissional. Mais ainda quando, visto ao nível da contratação pública em que se obsta a que acedam à celebração com a administração contraentes incumpridores, por via de impedimentos, designadamente dos compromissos fiscais/pagamento de impostos ao Estado (cfr. art. 55º nº 1 al. d) e e) do CCP) e, por maioria de razão, que tenham sido condenadas por crimes de abuso de confiança fiscal pois que em causa fica a sua capacidade de honrar compromissos e deveres junto da Administração Fiscal e, quando incumpre e é punida criminalmente, naturalmente a sua honorabilidade profissional é posta em crise e questionada. De resto, em sede de Direito Fiscal, a simples falta de pagamento dos impostos pelos gerentes e administradores da sociedade onde exercem funções faz já presumir a culpa dos mesmos pelo não pagamento dos impostos (art. 24º nº 2 al. b) da LGT), o que afecta a sua honra profissional, sobretudo se a esta presunção de culpa acrescer uma censura penal, como in casu, quer da sociedade Autora quer do seu administrador (que exterioriza a vontade da mesma à luz do CSC, como sabemos). Além disso, o próprio TJ tem entendido que uma falta profissional grave contende, também ela, com um comportamento culposo que tenha incidência na honorabilidade profissional do operador que não se baste com a violação de regras deontológicas, sobretudo se esse comportamento foi sancionado com uma coima - Veja- se Acórdão de 13.12.2012, Forposta, Proc. C-465/11 e o Acórdão 18/12/2014, Generali – Providência Bistositó Zrt, Proc. C-470/13. Deste modo, por maioria de razão um crime, como o abuso de confiança fiscal, com os contornos acima referidos, afecta a honorabilidade do agente económico/concorrente aqui Autora.» E acrescenta o Tribunal a quo: «Também não cremos que era necessário a aplicação de uma sanção acessória de modo a que o impedimento do artigo 55º nº 1 al. b) operasse, desde logo por não decorrer daquele normativo, à semelhança daquilo que sucede com algumas contra ordenações (Cfr. artigo 55º nº 1 al. f) e g) do CCP). Na situação trazida a norma apenas implica a condenação em processo-crime, transitada em julgado que afecte a honorabilidade profissional e não também que haja inibição acessória de exercer a actividade ou concorrer a procedimentos concursais, inexistindo, pois, também, qualquer afronta à lei fundamental, nomeadamente do art. 30º nº 4 da CRP, como entende a Autora. O artigo 30.º da CRP respeita aos Limites das penas e das medidas de segurança, estabelecendo que não poderá haver penas ou medidas de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, nem de duração ilimitada ou indefinida (nº 1). E que: “ 4. Ninguém pode ser privado, por motivos políticos, da cidadania portuguesa, da capacidade civil ou do nome. Mas, como se viu, o impedimento em causa está justificado como forma de protecção da administração de contraentes que ofereçam risco de incumprimento por sair beliscada a sua honorabilidade profissional, não criando condições desiguais para o universo dos concorrentes, sem que assim se afronte o artigo 30º nº 4 da CRP pois o motivo da não adjudicação ocorre na medida do impedimento, mercê da condenação num processo-crime, inexistindo qualquer privação (menos ainda eternizada) na contratação que não seja por esta razão legal vertida no artigo 55º nº 1 al. b) do CCP e não pelas razões referidas no art. 30º nº 4 da CRP que aqui não tem aplicação. De resto, como se viu, na redacção aplicável, o art. 55º nº 1 al. b) do CCP reportava-se à honorabilidade profissional das pessoas colectivas que fossem condenadas em processo-crime com a manutenção dos seus administradores na administração e gestão da empresa, nada mais referindo, nomeadamente para reabilitação (ao contrário da actual redacção em vigor desde Janeiro de 2018). Relativamente à condenação das sociedades nos crimes tipificados na alínea i) do nº 1 daquele art. 55º (crimes de Participação em actividades de uma organização criminosa, Corrupção, Fraude e Branqueamento de capitais), ao contrário do artigo 55º nº 1 b), este normativo não se referia à honorabilidade profissional do agente mas, antes, à manutenção dos administradores na gestão/administração e à reabilitação. São pois, situações (e crimes) diferentes as vertidas na alínea b) e i) do nº 1 do artigo 55º do CCP, contrariamente ao que, se bem vemos, é entendimento da Autora. Certo é, no entanto, que, em ambas as alíneas o fundamento do impedimento à adjudicação se prende com razões de ética na contratação pública e idoneidade profissional, pretendendo-se que na contratação pública participem apenas concorrentes responsáveis como forma de protecção da administração pública adjudicante, tanto assim que a participação em procedimento de adjudicação em situação de impedimento previsto no artigo constitui contra ordenação - Cfr. art. 456º a) e 458º do CCP. Aqui chegados, temos para nós que improcedem as ilegalidades apontadas ao ato de caducidade da adjudicação. E sobre a matéria relativa às deficiências invalidantes da proposta da adjudicatária, aqui contra-interessada, sustenta a sentença recorrida: No Programa do concurso, designadamente do artigo 15º nº 2 do mesmo decorre os motivos pelos quais as propostas podem ser excluídas, dali não resultando que a não identificação de um Engenheiro Civil na proposta leve à exclusão. Consta, com efeito, daquele normativo o seguinte: “2.São excluídas as propostas cuja análise revele: a) Que não apresentam, algum dos atributos, nos termos disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 57º do CCP, e descritos neste procedimento; b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspectos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto no nº 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49º do CCP c) A impossibilidade de avaliação em virtude da forma de apresentação dos respectivos atributos d) Que o preço contratual seja superior ao preço base e) Um preço anormalmente baixo… f) Que o contrato a celebrar implicaria a violação de qualquer vinculação legal ou regulamentar aplicável g) A existência de fortes indícios de actos, acordos, praticas ou informações susceptíveis de falsear as regras da concorrência h) Não tenham sido recebidas no prazo fixado para apresentação de propostas. O que está em causa nestes autos é o facto da contra - interessada não ter indicado na sua proposta um engenheiro civil para a representar, estando em causa não um atributo da sua proposta submetido à concorrência (artº 57º/1/b) do CCP), mas um aspecto respeitante à representação do empreiteiro na fase de execução do contrato. Trata-se de um elemento do CE que não está submetido à concorrência, não sendo objecto de avaliação de acordo com o critério de adjudicação (Preço mais baixo), uma vez que os aspectos não submetidos à concorrência são todos aqueles que não são objecto de avaliação e classificação, como é o caso - cfr. art. 42º do CCP. No critério de adjudicação do mais baixo preço (artº 74º/1/b) CCP) o conteúdo dos aspectos de execução submetidos à concorrência (atributos - artº 56º/2) mostra-se reduzido à sua expressão mínima, sendo total a definição dos restantes aspectos não submetidos à concorrência (parâmetros - artº 42º/3/4/5), pelo que o único aspecto submetido à concorrência para efeitos de avaliação é o preço contratual (artº 97º/1) proposto pelos concorrentes. O critério de adjudicação do presente concurso público é o do mais baixo preço, o que significa que nestas circunstâncias a Administração deve apresentar um caderno de encargos que defina todos os restantes aspectos da execução do contrato a celebrar, submetendo apenas à concorrência o preço a pagar pela entidade adjudicante pela execução de todas as prestações que constituem o objecto daquele - artº 74º/2 do CCP. Do outro lado da relação jurídica procedimental, significa que os concorrentes não carecem de desenvolver nenhuma actividade concretizadora de aspectos essenciais do caderno de encargos, na exacta medida em que são chamados simplesmente a aderir ao projecto contratual que o respectivo clausulado configura, com a única excepção do factor preço a pagar pela entidade adjudicante na empreitada. O mesmo é dizer que o conteúdo dos aspectos de execução submetidos à concorrência se mostra reduzido à sua expressão mínima, como se disse, sendo total a definição dos restantes aspectos não submetidos à concorrência (parâmetros base, artº 42º/3, 4 e 5 do CCP), dado que o único aspecto submetido à concorrência e, nessa medida, aberto à apresentação de propostas por parte dos concorrentes, é o preço. Relativamente aos aspectos da execução do contrato a celebrar, não submetidos à concorrência, devem também constar da proposta (artº 57º/1/ c) do CCP). A questão é saber se podem motivar a exclusão da proposta, como na situação colocada, em que não foi indicado um engenheiro civil para representar o empreiteiro na fase de execução do contrato. Consultando o CE, dali decorre que a representação do empreiteiro tem de ser assegurada por um engenheiro civil. Contudo, o mesmo CE estabelece que “Após a assinatura do contrato e antes da consignação, o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director de obra, indicando a sua qualificação técnica e ainda se o mesmo pertence ou não ao seu quadro técnico, devendo esta informação ser acompanhada por uma declaração do técnico designado…assumindo a responsabilidade pela direcção técnica da obra e comprometendo-se a desempenhar essa função com proficiência e assiduidade - cfr. nº 3 do artº 41º do CE a que alude o ponto 6) dos factos provados. O assim estabelecido no CE não corresponde a uma razão de exclusão se na proposta não for indicado o Engenheiro civil, quando daquela peça do procedimento resulta e se extrai que, só após a assinatura do contrato e antes da consignação o técnico/Engenheiro civil é de facto indicado, pois só nesse momento o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director de obra, indicando a sua qualificação técnica e ainda se o mesmo pertence ou não ao seu quadro técnico. Decorre do artigo 70º (Análise das propostas e adjudicação), nº 2, al. b) do CCP, o seguinte: 2 - São excluídas as propostas cuja análise revele: (…) b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos nºs 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49.º; (…)” Estabelecendo o artigo 146º (Relatório Preliminar), nº 2 al. o) do mesmo diploma legal que: “2 - No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas: (…) “o) Cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º”. Não cremos que, ainda que não fosse indicado um Engenheiro Civil com a Proposta, tal fosse causa de exclusão na medida em que em momento posterior poderá ser indicado apenas para representar o empreiteiro, nomeadamente aquando da execução material do contrato, devendo a declaração do mesmo ser entregue depois da assinatura do contrato e antes da consignação (cfr. artigo 41º/3 do CE), sendo certo, como se disse, que só depois da consignação é que se confirma quem é o técnico que terá essa função de representação do empreiteiro. Temos para nós que não se verifica nenhuma das circunstâncias tipificadas no artigo 146º/2 que impusesse logo ao júri em sede preliminar propor a exclusão da proposta da CI, nomeadamente por falta dos documentos aludidos no artº 57º/1/b) e c) do CCP, como se viu (b) Documentos que, em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar; c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule). A não junção ou indicação pela CI ao procedimento concursal identificado, com a respectiva proposta, de um Engenheiro Civil para acompanhar a execução do contrato, não é motivo de exclusão da referida proposta ao abrigo do disposto nos artigos 146º/2, 57º e 70º/2 do CCP, por não respeitar a documentos exigidos pelo programa de procedimento “que contenham os termos ou condições” respeitantes a “aspectos da execução do contrato” submetidos à concorrência aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule, tratando-se de uma formalidade quanto à representação do empreiteiro na execução que poderá ser indicada posteriormente (artº 41º/3 do CE) e que também, o júri, antes de pretender excluir deveria mandar juntar/esclarecer/suprir. Não se trata propriamente de um elemento ou condição que viole a execução do contrato em si mas que tem que ver, apenas, com a representação do empreiteiro na execução do contrato a concretizar em momento posterior à consignação do contrato. Essencial seria a falta ou irregularidade que prejudicasse a igualdade entre os concorrentes ou a possibilidade da correcta e imparcial comparação de uma com as outras propostas; caso contrário, a irregularidade da proposta será não essencial, e isso independentemente de tais irregularidades serem de carácter formal ou substantivo. Por outro lado sempre se dirá que, ainda que ocorresse razão de exclusão e não adjudicação à CI, tal seria irrelevante/inoperante para a esfera jurídica da Autora na medida em que, o afastamento da adjudicação à CI graduada em segundo lugar ou lugar subsequente ao do concorrente impedido (artigo 86º/4 do CCP), mercê do impedimento da Autora (artº 55º/1/b) do CCP), nunca determinaria que o contrato fosse adjudicado à Autora com quem se verificou, como se viu supra, a caducidade da adjudicação. Assim sendo, ainda que se verificasse a invalidade da adjudicação à CI por dever ser excluída, concluindo-se que tal ilegalidade/invalidade/anulação não traz qualquer vantagem para a Autora, deixando-a na mesma posição, a existência de um vício não deve conduzir à anulação, por aplicação do princípio da inoperância dos vícios ou utile per inutile non vitiatur, razão pela qual será de manter a adjudicação ao CI graduado seguinte, nos termos do artigo 86º/4 do CCP. Como se referiu no sumário do Acórdão deste TCAN de 08/01/2016/proc. 02366/14.6BEBRG, “(…) Efetivamente, o princípio do aproveitamento do ato administrativo, vem sendo reconhecido quanto à sua existência e relevância, admitindo-se operar em determinadas circunstâncias. Tal princípio permite negar relevância anulatória ao erro da Administração, mesmo no domínio dos atos proferidos no exercício de um poder discricionário, quando, pelo conteúdo do ato e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar-se, com segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa. Não está em causa sanar os vícios detetados, mas tão-só tornar inoperante a força invalidante dos mesmos, em resultado da verificada inutilidade da anulação resultante do juízo de evidência quanto à conformidade material do ato com a ordem jurídica, uma vez que a anulação do ato não traduz vantagem real ou alcance prático para o impugnante. Na realidade, se não obstante a verificação de vício anulatório do ato recorrido, se concluir que tal anulação não traria qualquer vantagem para o recorrente, deixando-o na mesma posição, a existência de tal vício não deve conduzir à anulação, por aplicação do princípio da inoperância dos vícios ou utile per inutile non vitiatur. Aqui volvidos, ante todo o exposto, terá de se concluir pela improcedência da pretendida exclusão da proposta da CI e consequente anulação da adjudicação à mesma - lê-se na sentença e aqui corrobora-se. Em suma: -a questão nuclear a dirimir nos presentes autos é a de analisar a norma do artigo 55º do Código dos Contratos Públicos (CCP); -inexiste factualidade controversa no que concerne à tramitação do procedimento pré-contratual; -a única verdadeira divergência centra-se em analisar os factos e concluir pela sua subsunção, ou não, àquela norma - artº 55º do CCP -; -a matéria relativa à caducidade da adjudicação - -entendeu o Tribunal que os certificados de registo criminal da pessoa colectiva aqui Recorrente e ainda de um dos seus administradores, constituídos por condenações crime pelos tipos de ilícito de “abuso de confiança fiscal” consubstanciam crimes que representam uma efectiva afectação da idoneidade profissional - porque emergente da pessoal - do legal representante da pessoa colectiva, ora Recorrente, bem como da própria Autora/Recorrente enquanto tal; -no essencial está em questão saber se os crimes estabelecidos nos registos criminais, afectando tanto a Autora pessoa colectiva como o seu legal representante são ou não aptos a consubstanciar um crime qualificável como apto a afectar a “honorabilidade profissional” dos visados, a quem os registos criminais respeitam; -parte-se da aproximação de que a lei não definiu o que deve entender-se pelo impedimento aqui em causa: está ou não afectado de impedimento, nos termos da norma do artº 55º/1/b) do CCP quem foi condenado pelo crime de abuso de confiança fiscal? -a Autora/Recorrente defende que um tal crime “em nada belisca” a honorabilidade profissional do concorrente ao procedimento concursal mas seguro é concluir-se que não só belisca como põe gravemente em crise essa honorabilidade profissional; porque não há exercício profissional, com a representação financeira / contabilística das vantagens patrimoniais reflexas, sem incidência fiscal - que constitui a mais profunda responsabilidade dos sujeitos perante o Estado / Administração Pública; -com efeito este segmento normativo do impedimento previsto no Código dos Contratos Públicos pretende abranger não apenas os crimes específicos próprios, vg os crimes previstos nos artºs 372º e segs, mas aquela acção criminosa (em abstracto) que abala a credibilidade do agente perante a própria Administração Pública, de que o crime de evasão fiscal ou de abuso de confiança fiscal, mais grave que aquele, é um expoente; -na verdade, não faria sentido e colidiria com a aplicação em plenitude, do Direito, que a própria Administração Pública estabelecesse relações contratuais, com repercussão financeira, com quem prevaricou perante si; -e que tendo meios de levantar esses impedimentos, não o fez; -a concorrente “AC & Filhos, S.A.”, então adjudicatária no concurso público “Centro de Respostas Integradas de Braga”, notificada para apresentar os documentos de habilitação, apresentou certidões de registo criminal de um dos administradores, a saber, AFC, bem assim como da própria sociedade, dos quais constam condenações por crimes de abuso de confiança fiscal, a saber, seis crimes; -o Código dos Contratos Públicos exige que o adjudicatário se encontre habilitado para essa adjudicação, designadamente através da demonstração, nessa fase, de que não possui qualquer impedimento derivado de - entre outros - crime que afete a sua honorabilidade profissional se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, pelo qual tenham sido condenados titulares de órgãos sociais de administração e estes se encontrem em efectividade de funções; -ora, o administrador em causa é membro do Conselho de Administração, e conforme certidão apresentada pela própria sociedade encontra-se em efectividade de funções; não se encontra reabilitado dos crimes cometidos e esses crimes afectam a honorabilidade profissional, como bem decidiu o Tribunal recorrido; -esse mesmo é o entendimento de Jorge Andrade da Silva em “Código dos Contratos Públicos - Comentado e Anotado”, Almedina, março 2009, págs. 204 a 205, que aduz que de entre os crimes que se incluem naquela qualificação, se conta o de “abuso de confiança”, como tal punido pelo artigo 205º do Código Penal; -o crime constante dos registos criminais do administrador e da sociedade é precisamente um de abuso de confiança, com o caráter particular que é do foro fiscal, ou seja, atinge o próprio Estado - lê-se nas contra-alegações; -tratou-se de crime praticado no exercício da actividade profissional e por causa dela; -a pugnar-se, como entende a Autora/Recorrente que tal crime não afecta a honorabilidade profissional teríamos que actos desenvolvidos no âmbito da actividade profissional e que foram sujeitos a um processo judicial no qual, com todas as garantias de um processo-crime, foi sentenciado constituírem actividade criminosa, não teriam qualquer impacto na avaliação que é feita da conduta profissional do administrador e sociedade, entendimento que não podemos subscrever; -e também não pode proceder o entendimento de que um abuso de confiança fiscal que consubstancia um crime contra o património e, mais concretamente, um crime contra a propriedade, possa não afectar a honorabilidade profissional se se considera, por outro lado, que um crime de abuso de confiança que afecta a propriedade de outrem que não o Estado, afecta essa honorabilidade. -a reabilitação relativamente aos crimes não ocorreu ainda, pois nesse caso já nada constaria no certificado de registo criminal; -e não se diga, como pretende a Recorrente que a caducidade da adjudicação levou ao afastamento de um operador do mercado ou um impedimento / proibição de exercício da profissão proibido pela Constituição da República Portuguesa; -é que esse operador não está impedido de desenvolver a sua actividade, não estando como tal impedido do exercício de qualquer direito civil ou profissional; existe, isso sim, um impedimento legal à contratação pública, com o Estado ou pessoas abrangidas pelo Código dos Contratos Públicos quando exista um crime contra a honorabilidade profissional, como aqueles pelos quais foram condenados administrador e sociedade; -ademais assistiria também aos Autores a possibilidade de requerer o cancelamento provisório, total ou parcial, das decisões que deveriam constar do certificado de registo criminal, nos termos do artigo 12º da LIC, uma vez que o fim a que este se destina é um de exercício de actividade, nos termos do nº 6 do artigo 10º da LIC; -no entanto, este cancelamento provisório - que permitiria o desenvolvimento da actividade inclusive ao nível da administração pública - também não terá sido requerido ou decretado pelo juiz de execução de penas, já que as inscrições das penas subsistem nos certificados de registo criminal; -quanto ao vício afectando a proposta adjudicanda - -imputa a Autora à proposta da Contra-Interessada o vício de não apresentar técnico qualificado com a exigência constante do Caderno de Encargos, designadamente, a habilitação académica de licenciado em engenharia técnico civil; -no entanto, certo é consignar a lei que a habilitação apresentada pela contra interessada é a bastante para o exercício profissional da actividade, como o mostram as normas da Lei 40/2015, de 1 de Junho que “estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, coordenação de projetos, direção de obra pública ou particular, condução da execução dos trabalhos das diferentes especialidades nas obras particulares de classe 6 ou superior e de direção de fiscalização de obras públicas ou particulares, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 31/2009, de 3 de julho”; -em síntese, a Autora veio ainda apontar vícios à proposta da actual adjudicatária: que o representante do dono da obra apresentado pela adjudicatária não detém a qualificação mínima de engenheiro técnico civil, conforme exigido pelo nº 2 da cláusula 41ª do caderno de encargos; -sucede que o que foi determinado pelo caderno de encargos foi cumprido pela adjudicatária; -isto porque o que está previsto no caderno de encargos, apenas no nº 3 da cláusula 41ª citada pela Autora, é que após a assinatura do contrato e antes da consignação, o empreiteiro confirmará, por escrito, o nome do director da obra, indicando a sua qualificação técnica; -será então e não em sede de documentação a apresentar com a proposta que o representante do empreiteiro será apresentado e, de resto, sob reserva de aceitação pelo dono da obra (nº 3 da cláusula 41ª), o qual, entende-se que poderá até rejeitar o nome proposto ainda que este reúna a qualificação mínima exigida pelo adjudicatário, de acordo com o previsto naquela cláusula; -como é do conhecimento da Autora, o procedimento pré-contratual em causa foi um de concurso público sem prévia fase de qualificação técnica; -assim sendo, não é admissível a avaliação de qualquer capacidade técnica, pelo que qualquer declaração apresentada pelos concorrentes conjuntamente com a proposta seria irrelevante. Perfilhando-se a visão da Ré/Recorrida, acolhida pelo Tribunal a quo, naturalmente sucumbem as conclusões da Recorrente. Dito de outro modo, não se detectam vícios que afectem as deliberações e decisões tomadas no procedimento pré-contratual sub judice, razão pela qual se mantém na ordem jurídica a sentença sob censura que declarou essa conformidade legal. *** DECISÃOTermos em que se nega provimento ao recurso. Custas pela Autora/Recorrente. Notifique e DN. Porto, 28/06/2018 Ass. Fernanda Brandão Ass. Frederico Branco Ass. João Sousa |