| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL E REGIONAL (STAL), em representação da associada «AA», propôs acção administrativa de condenação à prática de acto devido contra o MUNICÍPIO ..., todos melhor identificados nos autos, visando os despachos do Presidente da edilidade de 16/08/2020 e de 08/09/2020, que homologaram - o primeiro - e confirmaram - em sede de reclamação administrativa - a proposta de avaliação de desempenho daquela associada de 3,999 valores, correspondente a Desempenho Adequado, no âmbito do SIADAP3 2017/2018.
Concluiu que os actos impugnados enfermam de vício de violação de lei, concretamente dos artigos 6.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) - princípio da igualdade - e 6.º, al. e), 75.º, n.ºs 1 e 2 e 84.º da Lei n.º 66-B/2007, devendo por isso ser declarados nulos ou anulados e, em consequência, ser a entidade demandada condenada nos seguintes pedidos:
“a) Proferir acto administrativo que valide a proposta de avaliação do avaliador correspondente às menções, quantitativa de 4,840 e qualitativa de “Desempenho Relevante”;
b) Proferir despacho de homologação da avaliação de desempenho, no período de 1/1/2017 a 1/1/2018, com a menção qualitativa de “Desempenho Relevante” e menção quantitativa de 4,840 valores”.
Por decisão proferida pelo TAF de Aveiro foi julgada procedente a acção e condenada a Entidade Demandada a proferir acto administrativo concretizado no despacho de homologação da proposta de avaliação da associada do autor com a menção quantitativa de 4,840 e a menção qualitativa de Desempenho Relevante no período de avaliação 2017/2018.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Entidade Demandada formulou as seguintes conclusões:
A) No cerne do presente recurso está a questão de saber se o MUNICÍPIO ... violou ou não o disposto no n.º 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28/12 (SIADAP), ao não homologar a proposta de avaliação da Associada do Autor com menção qualitativa de desempenho Relevante no período de avaliação 2017/2018;
B) Sendo que, o douto Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou a presente ação interposta pelo STAL – Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, em representação da sua associada «AA» procedente, tendo ainda declarado “a inimpugnabilidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal ... que confirmou em reclamação administrativa o despacho homologatório da classificação da avaliação de desempenho da associada do autor em 2017 e 2018, concentrando os autos neste último, e único, acto impugnável”, e após julgar o referido ato inimpugnável, o douto Tribunal concluiu ainda (sem precedência de contraditório), que inexistiam “nulidades absolutas, outras questões prévias ou excepções de conhecimento oficioso que obstem à prossecução dos autos no plano do mérito”;
C) Ora, não obstante a jurisprudência consolidada no sentido da reclamação do SIADAP configurar uma reclamação necessária, recentemente a jurisprudência tem entendido que a mesma é meramente facultativa, tendo sido nesse sentido que também o Tribunal a quo decidiu;
D) Sucede, porém, que ao adoptar o referido entendimento e a, consequentemente, declarar aquela exceção dilatória não pode, salvo o devido respeito, deixar de declarar a caducidade do direito de ação/intempestividade da prática do ato processual que o mesmo acarreta, sobretudo quando de uma exceção dilatória de conhecimento oficioso se trata – consubstanciando, por conseguinte, tal decisão, uma nulidade por omissão de pronúncia sobre questões que devesse apreciar (cfr. primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC aplicável ex vi n.º 3 do artigo 140.º do CPTA) ou, sem prescindir, caso assim não se entenda, certo é que por força da configuração da douta Sentença e atenta a matéria de facto dada como provada em “8” a “13” dos factos provados, sempre se impunha, de igual modo, declarar a caducidade do direito de ação/intempestividade da prática do ato processual;
E) Daí que, fornecendo os autos todos os elementos para o efeito, resulta inequívoco que, a considerar-se inimpugnável o despacho do Presidente da Câmara Municipal ... que confirmou em reclamação administrativa o despacho homologatório da classificação da avaliação de desempenho da associada do autor em 2017 e 2018, a Associada do Autor interpôs a presente ação para além dos prazos legalmente previstos para o efeito, em violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º, do n.º 2 do artigo 59.º e do n.º 2 do artigo 69.º, todos do CPTA, porquanto, o prazo para reagir contenciosamente terminou em 03/12/2020 e não a 09/12/2020, data em que a Associada do Autor deu entrada da ação;
F) Impunha-se, por isso, ao douto Tribunal a quo declarar a caducidade do direito de ação/intempestividade da prática do ato processual (a qual constitui exceção dilatória de conhecimento oficioso, que obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa), julgando, consequentemente, a ação improcedente e absolvendo o MUNICÍPIO ... da instância, pelo que, assim não procedendo, a sentença violou, entre o mais, o disposto no n.º 3 do artigo 58.º, no n.º 2 do artigo 89.º e alínea k) do n.º 4 do artigo 89.º, todos do CPTA, e ainda o artigo 88.º do CPTA de acordo com o propugnado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 17/01/2019, no âmbito do Processo n.º 01282/17.413ELRA, o que importa a sua revogação;
G) Acresce referir que, e salvo o devido respeito por diverso entendimento, não pode o MUNICÍPIO ... deixar de manifestar respeitosamente a sua discordância perante a decisão que veio a ser proferida na douta Sentença de que ora se recorre, atendendo aos factos com relevância para a decisão a proferir que indevidamente não foram dados como provados;
H) Assim, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 640.º do CPC aplicável ex vi n.º 3 do artigo 140.º do CPTA, reveste especial relevância para a decisão da causa o aduzido nos pontos 5 e 6 do Despacho do Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal ... datado de 25/02/2019, assim como a tabela designada “|DIFERENCIAÇÃO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|” constante da deliberação tomada pelo Conselho Coordenador da Avaliação na reunião de 10/02/2020 (cfr. fls. 186 do Sitaf e Doc. 1 junto com a contestação) e o aduzido nos pontos 8 e 9 da informação apresentada como Doc. 1 junto com a contestação, considerando o MUNICÍPIO ... que a mesma deverá ser julgada como provada, sendo certo, porém, que o douto Tribunal a quo não se pronunciou expressamente, julgando provada ou não provada a referida matéria, o que se impunha e desde já se requer a V. Exas.;
I) Ora, no que concerne à factualidade em causa, a mesma releva na medida em que o Tribunal a quo julgou a ação procedente por considerar, fundamentalmente, que houve violação do disposto no n.º 1 e 2 do artigo 75. º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, uma vez que, de acordo com a douta Sentença, a Associada do Autor estava “limitada absolutamente e à partida”;
J) Sucede, no entanto, que, dos pontos 5 e 6 do Despacho do Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal ... datado de 25/02/2019, consta que “5. Para conhecimento de todos os envolvidos, a distribuição inicial das percentagens de 25% para as avaliações finais qualitativas de desempenho Relevante e, de entre estas, 5% para o reconhecimento de desempenho Excelente, foi efetuada em termos referenciais, proporcional por todas as carreiras de cada Unidade Orgânica e encontra-se refletida na tabela seguinte” e “6. Esta fixação de percentagens garante a diferenciação de desempenhos e serve de referência aos avaliadores, podendo sofrer alterações na sequência das reuniões do Conselho Coordenador de Avaliação para validação das propostas de avaliação com menções de desempenho Relevante, garantindo-se, no entanto, o seu estrito cumprimento global”;
K) Assim sendo, o despacho do Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal ..., datado de 25/02/2019, além de definir as “distribuições iniciais”, serviu de “referência aos avaliadores, podendo sofrer alterações na sequência das reuniões do Conselho Coordenador de Avaliação para validação das propostas de avaliação com menções de desempenho Relevante, garantindo-se, no entanto, o seu estrito cumprimento global”;
L) Resulta, portanto, do referido despacho que a diferenciação de desempenhos foi fixada na percentagem de 25% para as avaliações da quota de “Desempenho Relevante” e, de entre estas, 5% do total dos trabalhadores para quota de “Desempenho Excelente”, conforme previsto no n.º 1º do artigo 75.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28/12;
M) Tendo por base tal normativo, certo é que, no caso, a aplicação da percentagem de 25% aos 129 trabalhadores da Câmara Municipal ... inseridos na carreira de Técnico Superior, determina que o número máximo de menções qualitativas de Desempenho Relevante apenas poderia ser atribuído a um número de 32,25 trabalhadores, o que, por arredondamento por excesso, era possível a 33 trabalhadores e, conforme decorre do aduzido no ponto 8 da informação apresentada como Doc. 1 junto com a contestação, traduziu-se na tabela designada “DIFERENCIAÇÃO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|” constante da deliberação tomada pelo Conselho Coordenador da Avaliação na reunião de 10/02/2020 (cfr. fls. 186 do Sitaf e Doc. 1 junto com a contestação) que também impunha ter sido dada como provada;
N) Assim sendo, o referido despacho, tal como aliás o mesmo previa que pudesse acontecer, considerou as possíveis alterações para o cumprimento global das percentagens que, de facto, ocorreram nos termos melhor descritos na tabela “|DIFERENCIAÇÃO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|” (cfr. fls. 186 do Sitaf e Doc. 1 junto com a contestação);
O) Tal denota, inclusivamente, o seu caráter não vinculativo – até porque o próprio Avaliador atribuiu a classificação quantitativa de “Revelante” à Associada do Autor (o que não pode, salvo o devido respeito, ser ignorado pelo douto Tribunal) – demonstrando que a Associada do Autor não estava “manietada” ou “limitada absolutamente e à partida”, o que, também se retira do aduzido no ponto 9 da informação apresentada como Doc. 1 junto com a contestação, do qual consta que “A DGU tinha a distribuição inicial de “quota zero” para a carreira de Assistente Operacional, tendo, em validação do CCA, a atribuição de uma avaliação de Desempenho relevante naquela carreira”;
P) Tal factualidade deve, por isso, constar também da matéria de facto dada como provada uma vez que demonstra que a Associada do Autor não “iniciou o procedimento de avaliação de desempenho sem chance de poder ser classificada com Relevante” em violação do disposto no n.º 1º do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, ou, ainda sem prescindir e por mera cautela, caso assim não se entenda, mais se requer se observe o disposto no artigo 662.º do CPC aplicável ex vi n.º 3 do artigo 140.º do CPTA;
Q) Considerando que a matéria em causa não foi corretamente julgada, e atenta a alteração da matéria de facto nos termos ora requeridos, impunha-se decisão diversa da que veio a ser proferida, isto é, considerando que o ato de homologação da avaliação de desempenho da Associada do Autor no biénio de 2017/2018 não enferma de violação do disposto no n.º 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, deve ser revogada a douta Sentença e não ser o MUNICÍPIO ... condenado a validar e homologar a proposta inicial do Avaliador;
R) Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 640.º do CPC aplicável ex vi n.º 3 do artigo 140.º do CPTA, o MUNICÍPIO ... considera que reveste, ainda, de especial relevância para a decisão da causa o aduzido no ponto 4.2.1. da ata da reunião do Conselho Coordenador da Avaliação, realizada em 10/02/2020, considerando o MUNICÍPIO ... que a mesma deverá ser julgada como provada;
S) Sendo certo, porém, que o douto Tribunal a quo não se pronunciou expressamente, julgando provada ou não provada a referida matéria, o que se impunha e desde já se requer a V. Exas.;
T) Ora, no que concerne à factualidade em causa, a mesma releva na medida em que o Conselho Coordenador da Avaliação atuou no âmbito das suas competências, tendo atendido à análise de mérito do desempenho dos avaliados, e “analisou todas as avaliações propostas pelos avaliadores da CM..., por grupo profissional e unidades orgânicas e verificou que existiam mais propostas de avaliação de Desempenho relevante do que as quotas de diferenciação estabelecidas o permitiam para cada grupo profissional”, tanto que, a própria tabela “final” foi designada como “|DIFERENCIAÇÃO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|”;
U) Deste modo, o MUNICÍPIO ... entende que a matéria em crise não foi corretamente julgada pelo que deverá a mesma ser também julgada como provada, o que se requer, ou, ainda sem prescindir e por mera cautela, caso assim não se entenda, mais se requer se observe o disposto no artigo 662.º do CPC aplicável ex vi n.º 3 do artigo 140.º do CPTA;
V) Porquanto, atenta a alteração da matéria de facto que se considera incorretamente julgada e cuja alteração se requer a V. Exas., impunha-se decisão diversa, tendo a presente ação, por conseguinte, de improceder, porquanto a atribuição das classificações teve em consideração o cumprimento global das percentagens em conformidade com o disposto no n.º 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12;
W) Importa, ainda, atentar que conforme “6” dos factos provados, o Tribunal a quo deu como provado, entre o mais, que o Conselho Coordenador da Avaliação deliberou, na reunião de 10/02/2020, “não validar as propostas com menção de avaliação de Desempenho relevante dos trabalhadores constantes na tabela infra |PROPOSTAS COM MENÇÃO DE AVALIAÇÂO DE DESEMPENHO RELEVANTE NÂO VALIDADAS - REUNIAO DO CCA DE 10/02/2020|, por excedem as quotas cujo estrito cumprimento deve ser assegurado, conforme tabela “|DIFERENCIAÇÂO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|”,
X) Não obstante ter dado tal factualidade como provada, o Tribunal a quo acaba por concluir que a proposta de avaliação do Avaliador “esbarrou no Conselho Coordenador da Avaliação, que reunindo em 10/02/2020 para analisar as propostas de classificação das avaliações de desempenho deliberou não validar aquela, por referência à associada do autor, por exceder as quotas de diferenciação de desempenhos estabelecida em conformidade com o despacho da edilidade de 25/02/2019”;
Y) Ora, com o devido respeito, a douta Sentença não considerou adequadamente as duas tabelas em causa, acabando, por isso, por adotar uma formulação diversa da que foi julgada como provada e que sempre deverá ser corrigida por via do presente recurso;
Z) Importa concluir, por outro lado, que o Conselho Coordenador da Avaliação está adstrito ao limite de fixação de quotas, apenas podendo atribuir classificação superior a “Desempenho Adequado”, no máximo a 25% dos trabalhadores, o que, por arredondamento por excesso, era possível a 33 trabalhadores – e que, conforme decorre da deliberação de 10/02/2020, tal foi observado em cumprimento com o disposto no n.º 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12;
AA) Mais decorre em “6” dos factos provados que da referia ata da deliberação do Conselho Coordenador da Avaliação , de 10/02/2020, consta que “Não obstante este CCA considerar justificadas as propostas de avaliação de Desempenho relevante, tendo por base as fundamentações constantes nas fichas de avaliação, que aqui se consideram integralmente reproduzidas, entendeu que a diferenciação de desempenhos seria justificada na análise do mérito do desempenho dos avaliados, a qual contempla a qualidade da prestação do trabalho e a importância das tarefas realizadas no biénio em referência para o alcance dos objetivos gerais da Autarquia e respetivos contributos relevantes para o serviço onde estavam integrados (...)”;
BB) Ora, salvo o devido respeito, conforme “6” dos factos provados, desde logo se conclui que a Associada do Autor não estava “manietada” nem “limitada absolutamente e à partida”, tendo, inclusivamente ocorrido situação semelhante à da Associada do Autor que teve atribuição de avaliação de desempenho Relevante (conforme ponto 9 da informação constante do Doc. 1 junto com a contestação) – o que o douto Tribunal a quo acaba por ignorar;
CC) De mais a mais, conforme “6” dos factos provados, impunha-se concluir que o parecer da Comissão Paritária, além de não ser vinculativo, reflete uma fundamentação diversa da que motivou a não homologação da proposta de avaliação da Associada do Autor, o que inclusivamente resulta refutado quer pelo teor da própria deliberação e da tabela “|DIFERENCIAÇÂO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|”, quer designadamente pelos factos que devem ser dados como provados, por noutra situação semelhante ter sido atribuída a avaliação de desempenho Relevante;
DD) Salvo o devido respeito, conclui-se, portanto, que a douta Sentença incorreu em erro na apreciação da prova, dado que a conjugação dos diversos elementos probatórios, mormente os elementos referidos na alínea anterior, impunham decisão diversa da proferida, ou seja, a de que não existiu a violação da lei, mormente do disposto no n.º 1 e no n.º 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, não podendo por isso ser o MUNICÍPIO ... condenado a validar e homologar a proposta inicial do Avaliador;
EE) Mais se conclui, com o devido respeito, que a douta Sentença incorre também em erro na apreciação da prova quando refere que “do despacho do Presidente da Câmara de 25/02/2019 resultaria que a diferenciação de desempenhos, como foi pensada e visou a associada do autor, padeceria de violação – grosseira, manifesta ou ostensiva – do princípio da igualdade, já que estava, nos termos previstos, vedada àquela associada, em absoluto, toda e qualquer sorte de um desempenho relevante em igualdade de oportunidades com as demais trabalhadoras avaliadas, do que o tribunal abraçaria a anulabilidade do acto impugnado, embora já não a respectiva nulidade (...)”;
FF) Ora, o MUNICÍPIO ... não concede com tal argumento, rejeitando-o veementemente, dado que a Associada do Autor não foi prejudicada comparativamente com as demais trabalhadoras avaliadas (referência do Tribunal a quo que nem se consegue alcançar, sendo certo também que em momento algum foi feita a avaliação por género), nem comparativamente com os demais trabalhadores avaliados, o que, aliás, resulta refutado quer pelo próprio teor da deliberação do Conselho Coordenador da Avaliação e tabela “|DIFERENCIAÇÃO DE DESEMPENHOS - PERCENTAGENS POR GRUPO PROFISSIONAL – 2017/2018 – SIADAP 3|” nela constante (o qual, acrescenta-se, nem sequer alude ao despacho do Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal ... datado de 25/02/2019), bem como pelos factos que devem ser dados como provados, designadamente o aduzido no ponto 9 do Doc. 1 junto com a contestação;
GG) Nada permitindo, portanto, sustentar a violação do princípio da igualdade, impõe-se concluir que a douta Sentença incorreu em erro na apreciação da prova, conduzindo inevitavelmente à revogação da douta sentença, o que desde logo se requer, devendo, por conseguinte, não ser o MUNICÍPIO ... condenado a validar e homologar a proposta inicial do Avaliador;
HH) Acresce referir ainda que, salvo o devido respeito por diverso entendimento, não pode também o MUNICÍPIO ... deixar de manifestar respeitosamente a sua discordância perante a decisão que veio a ser proferida na douta Sentença de que ora se recorre, designadamente quanto ao entendimento do Tribunal a quo ao aduzir que “a classificação da associada do autor, se de 4,840 valores, integrava um dos 25 melhores desempenhos relevantes, na medida em que o último avaliado com essa menção obteve a classificação quantitativa de 4,040”;
II) Não obstante, e salvo melhor entendimento, não decorre da lei, mormente do disposto no n.º 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, qualquer obrigatoriedade de graduação quantitativa das propostas de desempenho Relevante (estando apenas prevista a fixação de um sistema de percentagem para a diferenciação de desempenhos) e estando aquela prevista apenas para situações de alteração do posicionamento remuneratório (cfr. n.º 3 do artigo 156.º da LGTFP) e nos casos de atribuição dos prémios de desempenho (cfr. n.º 2 do artigo 167.º da LGTFP), tendo-se, desde logo, aqui em consideração o princípio "ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus" (quando a lei não distingue, não devemos distinguir nós);
JJ) Pelo que, de outra forma, estar-se-ia perante um esvaziamento das competências dos vários intervenientes no processo avaliativo, desde logo, do Conselho Coordenador da Avaliação a quem compete proceder à análise das propostas de avaliação e à sua harmonização de forma a assegurar o cumprimento das percentagens relativas à diferenciação de desempenhos bem como a validação dos Desempenhos relevantes e Desempenhos inadequados e de reconhecimento dos Desempenhos excelentes;
KK) Assim sendo, também deverá improceder este argumento aduzido pelo Tribunal a quo na decisão recorrida, pois que, no caso em apreço, viola o próprio artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12 e os vários princípios interpretativos consagrados no artigo 9.º do Código Civil justificam e impõem a interpretação aqui expendida pelo MUNICÍPIO ..., daí que, também deste modo, não se afigura ter existido violação da lei, por parte do MUNICÍPIO ..., mormente ao disposto no n.º 1 e no n.º 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, tendo, por conseguinte, a douta Sentença incorrido em violação da lei substantiva, na vertente de erro de interpretação ou, caso assim não se entenda, erro de aplicação do direito;
LL) Considerando tudo o exposto, ou seja, em virtude da exceção dilatória de caducidade do direito de ação/intempestividade do ato processual ocorrida, da alteração da matéria de facto que se considera incorretamente julgada e cuja alteração se requer, do erro de julgamento e do recurso em matéria de Direito, não se afigura ter existido violação da lei, por parte do MUNICÍPIO ..., mormente ao disposto no n.º 1 e no n.º 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-13/2007, de 28/12, não podendo, por conseguinte, ser o MUNICÍPIO ... condenado a validar e homologar a proposta inicial do Avaliador, revogando-se a douta Sentença.
Termos em que e nos melhores de Direito que suprirão, deverá ser concedido provimento ao Recurso interposto e revogada a douta Sentença, quer pela verificação da exceção dilatória de conhecimento oficioso de caducidade do direito de ação/intempestividade da prática do ato processual, reapreciação da prova, normas jurídicas violadas, ou pelo erro de julgamento quanto aos factos e Direito aplicável, assim se fazendo a COSTUMADA E SÃ JUSTIÇA!
O Autor juntou contra-alegações, concluindo:
a) O Recorrente vem, nas suas alegações aqui em causa, levantar uma questão de matéria de excepção, que jamais levantou na primeira instância constituindo estas contra-alegações o único momento de o Recorrido exercer o contraditório sobre a questão que aquele agora esgrime;
b) Nos parágrafos 14º a 17º e 22º a 23º das suas alegações de recurso o Recorrente sustenta, em síntese, que tendo o mui douto aresto recorrido decidido que o acto que decidiu a reclamação de um primeiro não era impugnável, por meramente confirmativo, então o prazo com a finalidade de impugnar contenciosamente o confirmado tinha expirado em 3/09/2020, na medida em que os três meses para o efeito só se suspenderam de 28/08/2020 data da entrada da reclamação, a 10/09/2020;
c) Isto porquanto, no dia 10/09/2020 foi comunicado à sócia do Recorrido o despacho que indeferiu a reclamação do acto confirmado, tendo-se reiniciado a partir daí, e não depois, a retoma da contagem do prazo de três meses de propositura da acção de acordo com o disposto no artigo 59.º, n.º 4 do CPTA;
d) Para tanto, o Recorrente refere constar do parágrafo 12, da Fundamentação de Facto, que o despacho de indeferimento da reclamação foi comunicado à sócia do Recorrido através de correio electrónico em 10/09/2020;
e) Em suma, para o Recorrente o facto de ter sido comunicado o despacho de indeferimento da reclamação, em 10/09/2020, encerra a virtualidade de corresponder à notificação da sócia do Recorrido e, assim, pôr termo à suspensão do prazo para instauração da acção nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 59.º do CPTA;
f) Assim será, se uma mensagem electrónica corresponder, juridicamente, à notificação do que através dela é veiculado, mas não é, por força das normas que regulam a notificação, designadamente as constates dos artigos 112.º e 113.º, do CPA na redacção anterior à conferida pela Lei n.º 72/2020, de 16/11;
g) O artigo 268.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, estatui como sendo direito fundamental o de os interessados serem notificados dos actos administrativos, na forma prevista na lei;
h) Só a notificação na forma legal, habilita o interessado a um conhecimento incondicionado e esclarecido do acto administrativo constituindo, por isso, de acordo com a melhor doutrina supracitada, uma garantia procedimental;
i) As notificações podiam ser efectuadas por correio electrónico ou notificação electrónica automaticamente gerada por sistema incorporado em sítio electrónico pertencente ao serviço do órgão competente ou ao balcão único electrónico de acordo com o disposto no artigo 112.º, n.º 1, alínea c), do CPA, na redacção anterior à Lei n.º 72/2020;
j) Podendo tal forma de notificação partir da Administração, sem necessidade de prévio consentimento, para plataformas informáticas com acesso restrito ou para os endereços de correio electrónico no caso de pessoas colectivas; nos restantes casos mediante o consentimento prévio do notificando, prestado por escrito, (cfr. artigos 63.º, n.ºs 1 e 2 e 112.º, n.º 2, na redacção anterior à Lei n.º 72/2020, de 16/11 do CPA), que se presume, na falta do consentimento escrito, concedido quando o interessado tenha estabelecido contacto regular através daqueles meios;
k) Só que esta forma de notificação não é assim tão fácil e livre como aparenta, na medida em que para ser perfeita apenas se pode considerar efectuada, no momento em que o destinatário aceda ao específico correio enviado para a sua caixa postal eletrónica, e, no caso de outras notificações por via de transmissão eletrónica de dados, no momento em que o destinatário aceda ao específico correio enviado para sua conta eletrónica aberta junto da plataforma informática disponibilizada pelo sítio eletrónico institucional do órgão competente;
l) Ainda de acordo com a melhor doutrina acima invocada, nomeadamente de Luiz S. Cabral de Moncada, na obra citada, páginas 367 e 368 «...Não basta um acesso generalizado à sua caixa postal. É preciso que o interessado tenha aberto a mensagem que a Administração especificamente lhe destinou. Para este efeito a Administração deve enviar ao interessado um «alerta». O mesmo vale para o acesso do interessado à sua conta eletrónica disponibilizada na plataforma informática do sítio institucional do órgão competente…»
m) Ora, para aferir se o Recorrente pode retirar da simples prova da comunicação o efeito jurídico da notificação torna-se imperioso chamar à colação as normas dos artigos 342.º, n.º 2 e 343.º, n.º 2, do Código Civil: estatuindo o primeiro normativo: «...A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita...», e o segundo: «...Nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução consignada na lei...»;
n) Competia ao Recorrente provar que lhe estava facultada esta forma de notificação por via electrónica porque, para tanto, tinha logrado o consentimento prévio da sócia do Recorrido, ainda que de modo tácito; isto é, tinha de trazer aos autos a prova do consentimento escrito da sócia do Recorrido, ou em última instância a demonstração de que esta regularmente se correspondia pela mesa via com o Recorrente;
o) Mas ainda que se concedesse na admissibilidade ab initio desta via de notificação ficaria sempre por fazer prova da perfeição da mesma, já que o Recorrente não demonstra que na data em que comunicou ou em outra qualquer a sócia do Recorrido ficou ciente e inteirada do conteúdo daquela mensagem e daquilo que a acompanhava;
p) O Recorrente não alegou qualquer facto que permita dar como provado a faculdade de usar aquela via de notificação e que esta tenha sido perfeita, nomeadamente não alegou que a sócia do Recorrido tivesse dado o seu consentimento para ser correspondida electronicamente, ou que esse consentimento tivesse sido tácito por aquela se corresponder regularmente com o Recorrente por correio electrónico;
q) Do incumprimento do ónus que ao Recorrente cabia resulta: I) que a sócia do Recorrido tomou conhecimento do acto de homologação da avaliação de desempenho no dia 21/08/2020 (cfr. ponto 9 da Fundamentação de Facto); II) que no dia 28/08/2020, a sócia do autor apresentou reclamação deste acto (cfr. ponto 10 da Fundamentação de Facto); III) que contando como primeiro o dia da notificação (21/08/2020) até ao dia em que entra a reclamação passaram 7 dias do prazo para instaurar a acção; IV) que o prazo máximo de 15 dias úteis a que alude o artigo 72.º, n.º 1, da Lei n.º 66-B/2007, terminava no dia 18/09/2020, sendo a partir daqui retomada a contagem do prazo para propor a acção de acordo com o disposto no artigo 59.º, n.º 4, do CPTA; V) que os noventa dias de prazo para instaurar a acção ocorreram no dia 16/12/2020;
r) Pelo que o mui douto aresto sob recurso fez a melhor interpretação e aplicação das normas dos artigos 63.º, n.ºs 1 e 2, 112.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, e 113.º, n.º 5, do CPA, na redacção anterior à Lei n.º 72/2020, e artigos 342.º, n.º 2 e 343.º, n.º 3 do CC.
B)
s) Com todo o respeito o esforço que emana das alegações sob resposta não logra êxito face à mui douta intervenção do Meritíssimo Senhor Juiz, no sentido de melhorar a base instrutória da sua decisão;
t) Com efeito, o que inexoravelmente se retira desta certidão junta aos autos, do mui douto despacho incorporado no processo com o número 005150782, página 180 do processo, que jamais tinha integrado o Processo Administrativo, é que a sócia do Recorrido na sua avaliação de desempenho, logrou uma menção quantitativa superior a muitas das que foram contempladas com a validação pelo Conselho Coordenador da Avaliação;
u) Não tendo sido apontada qualquer vicissitude, ou desvio, à avaliação de desempenho da sócia do Recorrido, que decorreu de escrutínio realizado através de objectivos e competências, será então que, mesmo assim, a sócia do Recorrido, com uma menção quantitativa de 4,480 valores, não conseguiu entrar no conjunto de 25% do universo de 129 técnicos superiores do Recorrente? Assim sendo, todas as avaliações dos técnicos superiores que atingiram os 25% eram verdadeiramente excelentes revelando um alto nível de desempenho dos técnicos superiores do Município; dito de outra forma, em que “bolo” a sócia do Recorrido estava inserida, com quem foi cotejada a sua avaliação? sendo manifesto, ostensivo, crasso mesmo, que a sócia do Recorrido ficou à margem, por força de um procedimento administrativo ferido de invalidade por violação das normas legais, designadamente as invocadas pelo mui douto aresto sob recurso;
v) Para o Recorrido, as normas do artigo 75.º, da Lei n.º 66-13/2007, dão expressão material às finalidades fundamentais do SIADAP3, enunciadas no artigo 6.º do mesmo diploma legal, nomeadamente a da diferenciação de desempenhos.
w) Pelo que, bem andou o mui douto aresto recorrido ao considerar violadas as normas do artigo 75.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 66-13/2007;
x) Em suma, a mui douta sentença recorrida fez impecável interpretação e aplicação das normas dos artigos 63.º, n.ºs 1 e 2, 112.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, e 113.º, n.º 5, do CPA, na redacção anterior à Lei n.º 72/2020, e artigos 342.º, n.º 2 e 343.º, n.º 3 do CC e 75.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 66-B/2007.
Termos em que deverá o presente recurso improceder sendo confirmada a mui douta sentença recorrida, cumprindo-se desta forma a lei e fazendo-se
JUSTIÇA
O Senhor Procurador Geral Adjunto notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão ficou assente a seguinte factualidade:
1. O autor é o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, Empresas Públicas, Concessionárias e Afins (STAL), que tem por associada «AA» – cfr. documento n.º 1 junto com a p.i.;
2. A associada do autor está vinculada à Câmara Municipal ..., sob o regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado – admitido por acordo (cfr. artigo 1.º da contestação);
3. No mapa de pessoal da Câmara Municipal ..., a associada do autor desempenha funções inerentes à carreira de técnico superior, adstrita à Divisão de Polícia Municipal e Fiscalização – admitido por acordo (cfr. artigo 1.º da contestação);
4. Relativamente ao biénio 2017/2018, compreendendo o período de 01/01/2017 a 31/12/2018, a associada do autor foi sujeita a procedimento de avaliação de desempenho, sobre o que foi deliberado, por despacho do Presidente da Câmara Municipal ... de 25/02/2019, a distribuição inicial das percentagens de 25% para as avaliações finais qualitativas de desempenho Relevante e, de entre estas, 5% para o reconhecimento de desempenho Excelente, em termos referenciais, proporcional por todas as carreiras dentro de cada Unidade Orgânica, de acordo com a seguinte tabela:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cfr. pp. 1 a 6 do processo administrativo;
5. No âmbito do procedimento de avaliação de desempenho da associada do autor, o respectivo avaliador propôs a atribuição da avaliação final de 4,840 valores, com a menção qualitativa de Desempenho Relevante – cfr. documento n.º 4 junto com a p.i.;
6. Por deliberação do Conselho Coordenador da Avaliação do desempenho dos trabalhadores da Câmara Municipal ... relativamente ao biénio 2017/2018, de 10/02/2020, não foi validada a proposta de avaliação de desempenho com menção relevante da associada do autor, deliberando aquele órgão a avaliação de Desempenho Adequado, com a classificação de 3,999 valores, com a seguinte fundamentação:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
ento n.º 6 junto com a p.i.;
7. Em 15/07/2020, a associada do autor requereu ao Presidente da Câmara Municipal ... que o seu processo de avaliação fosse submetido a apreciação da Comissão Paritária, que em reunião de 30/07/2020 deliberou propor a manutenção da nota inicial proposta pelo avaliador de 4,840 valores – Desempenho Relevante, com a seguinte fundamentação:
“A diferenciação do desempenho para estar em conformidade com a lei, apenas deve obedecer às percentagens que foram fixadas dentro da carreira em causa e nunca em função do número de trabalhadores da unidade orgânica, isoladamente! Não constitui fundamento válido o facto da sua unidade orgânica não ter “espaço” para avaliações de desempenho relevantes ou excelentes, por o número de trabalhadores da sua carreira na unidade orgânica em causa ser inferior a 4 técnicos superiores (para aplicação da percentagem dos 25%) e ser inferior a 20 (para o reconhecimento de Desempenho excelente). Portanto, a trabalhadora em causa, com a aplicação do presente juízo para tal procedimento começou o seu ciclo avaliativo sem nunca poder vir a ser classificada de relevante ou excelente! Num procedimento correto, a trabalhadora deveria ter integrado o bolo global de trabalhadores que existem na instituição, para depois se aplicar os critérios de desempate para efeitos de diferenciação dos 25% de desempenho relevantes e 5% de desempenhos excelentes!".
- cfr. pp. 71 a 73 do processo administrativo;
8. Por despacho de 06/08/2020, o Presidente da Câmara Municipal ... homologou a avaliação de 3,999 valores e a menção de desempenho Adequado atribuída pelo Conselho Coordenador da Avaliação à associada do autor - cfr. pp. 57 do processo administrativo;
9. A associada do autor tomou conhecimento da homologação aludida no ponto anterior em 21/08/2020 - cfr. pp. 57 do processo administrativo;
10. Em 28/08/2020, a associada do autor apresentou reclamação administrativa da decisão aludida em 8), dirigida ao Presidente da Câmara Municipal ..., pedindo a atribuição da menção qualitativa de Desempenho Relevante, com a classificação de 4,840 valores - cfr. pp. 18 a 20 do processo administrativo;
11. Por despacho do Presidente da Câmara Municipal ..., de 08/09/2020, foi indeferida a reclamação aludida no ponto anterior - cfr. pp. 15 do processo administrativo;
12. O despacho aludido no ponto anterior foi comunicado à associada do autor através de mensagem de correio electrónico em 10/09/2020 - cfr. pp. 16 e 17 do processo administrativo;
13. A presente acção administrativa foi apresentada neste tribunal em 09/12/2020 - cfr. fls. 1 ss do SITAF.
Ainda se provou, com interesse para a decisão a proferir, que:
14. No procedimento de avaliação de desempenho relativo ao período de 01/01/2017 a 31/12/2018, o último classificado com a menção de Desempenho Relevante, integrado na carreira de técnico superior da Câmara Municipal ..., obteve a classificação quantitativa correspondente a 4,040 valores - cfr. documento junto a fls. 186 do SITAF.
DE DIREITO
É objecto de recurso a decisão que julgou procedente a acção.
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 608.º, n.º 2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º do CPC e 140.º do CPTA.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por conhecer a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Vejamos:
“A censura que as alegações do Recorrente dirigem à sentença recorrida, assenta em dois segmentos: a) não ter conhecido da caducidade do direito de acção; b) falta de mérito na avaliação quando assacou ilegalidade ao acto e procedimento administrativo em causa.
Cumpre salientar que, relativamente ao primeiro ponto, o Recorrente só agora levanta esta questão, de matéria de excepção, pois jamais o fez na primeira instância.
A este propósito alega sinteticamente que, tendo o aresto julgado que o acto que decidiu a reclamação do confirmado não era impugnável então, o prazo para a acção com vista à impugnação contenciosa do primeiro já tinha expirado em 3/12/2020, na medida em que os três meses para o efeito só se suspenderam entre 28/08/2020 e 10/09/2020, como resulta do invocado nos parágrafos 14º, 15º, 16º, 17º, 21º, 22º e 23º das alegações aqui em causa.
Em suma, alega o Recorrente: que a associada do Recorrido tomou conhecimento do despacho de homologação em 21/08/2020; que a mesma apresentou reclamação administrativa no dia 28/08/2020; que tal reclamação foi indeferida por despacho de 8/09/2020; despacho este que foi comunicado à associada do Recorrido em 10/09/2020; que o prazo de impugnação contenciosa suspendeu-se em 28/08/2020 retomando o seu curso em 10/09/2020; que o prazo de impugnação contenciosa expirara em 3/12/2020. Ou seja, para o Recorrente o facto de ter sido comunicado o despacho de indeferimento da reclamação, de 8/09/2020, em 10/09/2020, corresponde à notificação da sócia do Recorrido.
Com efeito, do parágrafo 12 da fundamentação de facto consta que o despacho de indeferimento «foi comunicado à associada do autor através de correio electrónico em 10/09/2020», remetendo para páginas 16 e 17 do processo administrativo.
Ora, o artigo 268.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, estatui como sendo direito fundamental, o de os interessados serem notificados dos actos administrativos, na forma prevista na lei.
Numa linha de interpretação da lei ordinária em conformidade com o texto constitucional, Luiz S. Cabral de Moncada no Código do Procedimento Administrativo, anotado, 3.ª ed., página 358, refere o seguinte: «... A notificação é uma garantia procedimental dos interessados e consequentemente elemento muito importante da respectiva posição jurídica procedimental...». Isto na medida em que, só a notificação na forma legal, habilita o interessado a um conhecimento incondicionado e esclarecido do acto administrativo. Isto é, em face do nosso ordenamento constitucional e legal provar que se comunicou é diferente de provar que se notificou na forma que a lei determina.
Do processo administrativo consta uma impressão de mensagem electrónica da qual se retira ter sido enviada na data indicada, não se descortinando comprovativo de que tenha sido lida pela sócia do Recorrido naquela data, ou em qualquer outra. Daí que se considere (apenas) provado que o despacho de 8/09/2020, apenas foi comunicado.
Vejamos o que o Código do Procedimento Administrativo dispunha sobre a forma das notificações no procedimento administrativo, nomeadamente o que as normas do artigo 112.º deste diploma, à data, estatuíam. Concretamente, as notificações podiam ser efectuadas por correio electrónico ou notificação electrónica automaticamente gerada por sistema incorporado em sítio electrónico pertencente ao serviço do órgão competente ou ao balcão único electrónico (cfr. artigo 112.º, n.º 1, alínea c), do CPA). Podendo tal forma de notificação partir da Administração, sem necessidade de prévio consentimento, para plataformas informáticas com acesso restrito ou para os endereços de correio electrónico no caso de pessoas colectivas; nos restantes casos mediante o consentimento prévio do notificando. Neste contexto normativo, o Autor citado, na obra supra apontada, página 365, refere que: «...as notificações dos interessados feitas por correio electrónico pressupõem obviamente que a Administração tenha acesso à caixa postal electrónica respectiva. Tratando-se de particular é indispensável o consentimento, expresso ou tácito deste, nos termos do n.º 2 do art. 63.º, para o qual se remete...».
Em anotação ao artigo 63.º, n.º 2, o mesmo autor na obra citada, página 234, diz o seguinte: «...em suma: se o interessado envia regularmente emails à Administração já se sabe que é provável que esta passe a notifica-lo também por email. Torna-se assim possível a comunicação electrónica mesmo sem consentimento expresso do interessado...».
E, ainda sobre esta forma de notificação, o artigo 113.º, do CPA com a epígrafe "Perfeição das notificações", no seu n.º 5, estatuía o seguinte: «...A notificação por meios eletrónicos considera-se efetuada, no caso de correio eletrónico, no momento em que o destinatário aceda ao específico correio enviado para a sua caixa postal eletrónica, e, no caso de outras notificações por via de transmissão eletrónica de dados, no caso de outras notificações por via de transmissão eletrónica de dados, no momento em que o destinatário aceda ao específico correio enviado para sua conta eletrónica aberta junto da plataforma informática disponibilizada pelo sítio eletrónico institucional do órgão competente...».
Debruçando-se sobre a hermenêutica deste preceito legal, o mesmo Autor, ob. cit., páginas 367/368, refere: «...a notificação considera-se perfeita logo que o interessado aceda ao correio específico da sua caixa postal electrónica, se a tiver. Não basta um acesso generalizado à sua caixa postal. É preciso que o interessado tenha aberto a mensagem que a Administração especificamente lhe destinou. Para este efeito a Administração deve enviar ao interessado um «alerta». O mesmo vale para o acesso do interessado à sua conta eletrónica disponibilizada na plataforma informática do sítio institucional do órgão competente...».
Assim sendo, para o Recorrente transformar a prova de que enviou mensagem electrónica à sócia do Recorrido em 10/09/2020, em prova de que, na mesma data, a notificou do despacho de 8/09/2020, cumpria demonstrar ter completado o caminho e os respectivos obstáculos conforme o que de seguida se passa a mencionar:
Em primeiro lugar, tinha de demonstrar que lhe estava facultada esta forma de notificação por via electrónica porque, para tanto, tinha logrado o consentimento prévio, por escrito, da sócia do Recorrido, ou mesmo de modo tácito. Isto é, tinha de trazer aos autos a prova do consentimento escrito da sócia do Recorrido, ou em última instância, a demonstração de que esta regularmente se correspondia pela mesma via com o Recorrente. Neste conspecto, importará sempre reter que, embora a sócia do Recorrente tenha remetido a reclamação por esta via, isso não significa automaticamente regularidade, que nem sequer foi alegada, e que tivesse cabimento imediato resposta pela mesma via, tendo em conta o carácter confidencial do procedimento em causa (cfr. artigo 44.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 66-B/2007, de 28/12). Por tal razão é que as notificações no âmbito do SIADAP são pessoais, a sócia do Recorrido poderia não estar interessada em que, para além do avaliador e membros do CCA outrem pudesse saber que a sua avaliação relevante não esteve, afinal, entre as 25% melhores.
Mas, ainda que se concedesse na admissibilidade ab initio desta via de notificação haveria, sempre, que fazer prova da perfeição da mesma, já que o Recorrente não demonstra que na data em que comunicou, ou em outra qualquer, a sócia do Recorrido ficou ciente e inteirada do conteúdo daquela mensagem e daquilo que a acompanhava.
O que também remete para a temática do conteúdo das normas dos artigos 342.º, n.º 2 e 343.º, n.º 2, do Código Civil.
Com efeito, estatui o primeiro normativo: a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
Por seu turno dispõe o segundo: nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução consignada na lei.
Ora, o Recorrente nem sequer alegou qualquer facto alusivo a que estivesse provada a faculdade de usar aquela via de notificação e que esta tenha sido perfeita, nomeadamente não alegou factos demonstrativos de que a sócia do Recorrido tivesse dado o seu consentimento para ser correspondida electronicamente, ou que esse consentimento tivesse sido tácito por aquela se corresponder regularmente com o Réu por correio electrónico.
Em suma, não logrou fazer prova dos factos que constituíam a excepção peremptória aduzida.
Daqui decorrendo: I) que a sócia do Recorrido tomou conhecimento do acto de homologação da avaliação de desempenho no dia 21/08/2020 (ponto 9 da Fundamentação de Facto); II) que no dia 28/08/2020, a sócia do autor apresentou reclamação deste acto (ponto 10 da Fundamentação de Facto); III) que contando como primeiro o dia da notificação (21/08/2020) até ao dia em que entra a reclamação passaram 7 dias do prazo para instaurar a acção; IV) que o prazo máximo de 15 dias úteis a que alude o artigo 72.º, n.º 1, da Lei n.º 66-B/2007, terminava no dia 18/09/2020, sendo a partir daqui retomada a contagem do prazo para propor a acção, de acordo com o disposto no artigo 59.º, n.º 4, do CPTA; V) que os noventa dias de prazo para instaurar a acção ocorreram no dia 16/12/2020.
Logo, bem andou o aresto recorrido ao ignorar tal questão.
Do mérito/fundo da causa
Refira-se o despacho incorporado no processo com o número 005150782, página 180 do processo, motivado pelo Senhor Juiz, no que separava as partes, nomeadamente: o Recorrido ao alegar que a sua associada, sendo o único técnico superior da unidade orgânica acabaria sempre excluída do sistema de atribuição de quotas estabelecido; e, em sentido contrário, o Recorrente ao sustentar que aquela integrava o bolo geral de trabalhadores abrangidos pelo regime de quotas legalmente estabelecido, a classificação obtida não lhe permitia integrar a quota disponível, de acordo com os resultados finais atribuídos aos trabalhadores.
Neste quadro, o Senhor Juiz, invocando o artigo 87.º, n.º 1, do CPTA, determinou que, pela sua necessidade, dado não constarem do Processo Administrativo, o Recorrente juntasse aos autos os elementos de avaliação de onde constassem, discriminadamente, as classificações finais obtidas pelos trabalhadores que integraram, em função dos resultados conseguidos, a quota disponível de “Desempenho relevante”.
Por requerimento com o número de documento 005160464, página 185 deste processo, o Recorrente veio juntar certidão que consta dos documentos incorporados neste processo com os números 005160465, página 186 e 005160466, página 192.
Ora, o que se retira desta certidão junta aos autos, que jamais tinha integrado o Processo Administrativo, é que a sócia do Recorrido na sua avaliação de desempenho, logrou uma menção quantitativa superior a muitas das que foram contempladas com a validação pelo Conselho Coordenador da Avaliação.
Não tendo sido apontada qualquer vicissitude, ou desvio, à avaliação de desempenho da sócia do Recorrido, que decorreu de escrutínio realizado através de objectivos e competências, será então que, mesmo assim, a sócia do Recorrido, com uma menção quantitativa de 4,480 valores, não conseguiu entrar no conjunto de 25% do universo de 129 técnicos superiores do Recorrente? Assim sendo, todas as avaliações dos técnicos superiores que atingiram os 25% eram verdadeiramente excelentes, revelando um alto nível de desempenho dos técnicos superiores do Município. Dito de outra forma, em que bloco a sócia do Recorrido estava inserida? Com quem foi cotejada a sua avaliação?
É manifesto que a sócia do Recorrido ficou à margem, por força de um procedimento administrativo ferido de invalidade por violação das normas legais, designadamente as contidas no aresto sob recurso - extrai-se das contra-alegações e aqui corrobora-se.
As normas do artigo 75.º, da Lei n.º 66-13/2007, dão expressão material às finalidades fundamentais do SIADAP3, enunciadas no artigo 6.º do mesmo diploma, mormente a da diferenciação de desempenhos. Donde o julgamento efetuado pela sentença, de terem sido violadas as normas do artigo 75.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 66-13/2007, não merecer reparo.”
Como sentenciado: Olhando o caso dos autos de frente, temos que retratam o resultado classificatório da avaliação de desempenho da associada do autor, técnica superior da Câmara Municipal ... integrada na Divisão de Polícia Municipal e Fiscalização, que por relação ao biénio 2017/18 foi avaliada sob a notação correspondente a 3,999 valores, com a menção de Adequado, tudo a expensas de o Conselho Coordenador da Avaliação ter deliberado propor a não validação da proposta inicial de avaliação com a classificação quantitativa de 4,840 e qualitativa de Relevante, não por razões de mérito mas por excesso da quota disponível definida à luz dos percentis de diferenciação de desempenho impostos pela Lei n.º 66-B/2007, conforme despacho do Presidente da Câmara Municipal ... de 25/02/2019.
Vejamos, portanto, cônscios de que o autor reclama ali um vício de violação de lei - violação dos artigos 6.º, al. e), 75.º, n.ºs 1 e 2 e 84.º da Lei n.º 66-B/2007 e artigo 6.º do CPA, o último no tocante à violação do princípio da igualdade -, enquanto a entidade demandada defende a legalidade dos critérios de diferenciação de desempenho dos trabalhadores avaliados e descortina que mesmo a classificação não homologada de 4,840 valores ultrapassa a quota disponível de desempenho relevante.
Em frente.
É positivo que o universo de trabalhadores com vínculo de contrato de trabalho em funções públicas (não só por tempo indeterminado) está sujeito a um regime de avaliação de desempenho profissional, gizado por diploma próprio, recognitivo das especificidades das carreiras públicas (cfr. artigo 89.º da LGTFP).
Nessa premissa, a associada do autor, que exerce na Divisão de Polícia Municipal e Fiscalização funções inerentes à carreira de técnico superior na Câmara Municipal ... (cfr. factos provados 2 e 3), não passou ao largo da que é legalmente determinada pela Lei n.º 66B/2007, de 28/12, que estabelece o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na administração pública (SIADAP), de carácter bienal (cfr. artigo 41.º, n.º 1 da Lei n.º 66-B/2007) e em que são actores ou intervenientes do processo de avaliação o avaliado, o avaliador, o conselho coordenador da avaliação, a comissão paritária e o dirigente máximo de serviço (cfr. 55.º, nº 1, als. a) a e) da Lei n.º 66-B/2007).
No que lhe respeita, a avaliação de desempenho apresenta os seguintes objectivos globais (cfr. artigo 6.º da Lei n.º 66-B/2007): a) Contribuir para a melhoria da gestão da Administração Pública em razão das necessidades dos utilizadores e alinhar a actividade dos serviços com os objectivos das políticas públicas; b) Desenvolver e consolidar práticas de avaliação e auto-regulação da Administração Pública; c) Identificar as necessidades de formação e desenvolvimento profissional adequadas à melhoria do desempenho dos serviços, dos dirigentes e dos trabalhadores; d) Promover a motivação e o desenvolvimento das competências e qualificações dos dirigentes e trabalhadores, favorecendo a formação ao longo da vida; e) Reconhecer e distinguir serviços, dirigentes e trabalhadores pelo seu desempenho e pelos resultados obtidos e estimulando o desenvolvimento de uma cultura de excelência e qualidade; f) Melhorar a arquitectura de processos, gerando valor acrescentado para os utilizadores, numa óptica de tempo, custo e qualidade; g) Melhorar a prestação de informação e a transparência da acção dos serviços da Administração Pública; h) Apoiar o processo de decisões estratégicas através de informação relativa a resultados e custos, designadamente em matéria de pertinência da existência de serviços, das suas atribuições, organização e actividades.
Pois bem, foi a esse procedimento de avaliação, no que vale para os anos de 2017 e 2018 entre o universo de trabalhadores da Câmara Municipal ..., que houve então que dar ensejo à operacionalização das formalidades legais e procedimentais aplicáveis. Desde logo, à diferenciação de desempenhos aludida no artigo 75.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 66-B/2007, através da fixação da percentagem máxima de 25 % para as avaliações finais qualitativas de Desempenho relevante, das quais 5 % relevam para o reconhecimento de Desempenho excelente, mas devendo estas percentagens, em regra, ser distribuídas proporcionalmente por todas as carreiras (1 - Sem prejuízo do disposto na alínea a) do artigo 27.º, a diferenciação de desempenhos é garantida pela fixação da percentagem máxima de 25 % para as avaliações finais qualitativas de Desempenho relevante e, de entre estas, 5 % do total dos trabalhadores para o reconhecimento de Desempenho excelente. 2 - As percentagens previstas no número anterior incidem sobre o número de trabalhadores previstos nos nºs 2 a 7 do artigo 42.º, com aproximação por excesso, quando necessário, e devem, em regra, ser distribuídas proporcionalmente por todas as carreiras).
Continuando o desenrolar da história, foi nesse enquadramento e com a avaliação do biénio 2017/18 como pano de fundo que o Presidente da Câmara Municipal ..., por despacho de 25/02/2019, determinou a distribuição inicial das percentagens de 25% e 5% para as avaliações finais qualitativas de desempenho Relevante e Excelente, mas por referência às carreiras públicas dentro de cada Unidade Orgânica. No final, e na carreira de técnico superior, o universo de 129 trabalhadores consentia 32(,25) desempenhos relevantes, arredondados por inteiro para o algarismo superior, ou seja, 33 (cfr. facto provado 4).
Ora, uma vez ultrapassadas as etapas valorativas do procedimento, o avaliador propôs à associada do autor a classificação de 4,840 valores, com a menção qualitativa de Relevante (cfr. facto provado 5), o que, porém, esbarrou no Conselho Coordenador da Avaliação, que reunindo em 10/02/2020 para analisar as propostas de classificação das avaliações de desempenho deliberou não validar aquela, por referência à associada do autor, por exceder as quotas de diferenciação de desempenhos estabelecida em conformidade com o despacho da edilidade de 25/02/2019. No final, contas feitas, e embora considerasse justificada a proposta de avaliação de desempenho relevante, a deliberação do conselho pendeu pela atribuição da avaliação quantitativa de 3,999 valores, com a menção qualitativa de desempenho adequado, por ser essa a avaliação quantitativa máxima imediatamente inferior à avaliação qualitativa proposta pelo avaliador (cfr. facto provado 6).
Com efeito, é a este Conselho Coordenador que cabe a validação das propostas de avaliação com menções de Desempenho relevante e de Desempenho inadequado (cfr. artigo 69.º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 66-B/2007), competência que, seja na positiva ou na negativa, isto é, em caso de acolhimento ou não acolhimento da proposta apresentada, é levada para homologação do dirigente máximo de serviço, aqui o Presidente da Câmara Municipal ....
No caso da associada do autor isso aconteceu na negativa, por despacho do Presidente da Câmara Municipal ... que homologou a avaliação de desempenho adequado com a classificação de 3,999 valores (cfr. facto provado 8).
Aqui chegados, o que divide a posição das partes não entronca em juízos de oportunidade ou mérito acerca do resultado final da avaliação de desempenho, cingindo-se ao seguinte:
i) para o autor a diferenciação dos desempenhos determinada pelo Presidente da Câmara Municipal ..., uma vez aferida na carreira de técnico superior por relação de proporcionalidade entre unidades orgânicas da Câmara Municipal ..., limitou à partida toda a chance de a sua associada lograr uma classificação mensurada de Relevante, porque na unidade orgânica de pertença – DPMF – é a única trabalhadora integrada na carreira de técnico superior;
ii) por oposição, a entidade demandada, que aceita o mérito da proposta inicial de avaliação por 4,840 valores, esgrime argumentos que entende de legalidade estrita e em favor da aplicação dos critérios e percentis de diferenciação de desempenhos, do que no final resultou que a sua trabalhadora não foi avaliada com desempenho Relevante a montante, apenas, do cumprimento das quotas fixadas, não lhe permitindo a classificação inicial e não homologada integrar a quota disponível.
É do domínio matemático que a quota de desempenhos relevantes correspondia a 32(,25) entre o universo dos 129 técnicos superiores da Câmara Municipal ... no biénio 2017/18, o que por arredondamento ao patamar inteiro superior alvitrava uma quota de 33 desempenhos relevantes, nos termos do já citado artigo 75.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 66-B/2007.
Mas sendo as carreiras públicas (gerais) as de técnico superior, assistente técnico e assistente operacional (cfr. artigo 88.º, n.º 1 da LGTFP), era entre o universo global de trabalhadores da respectiva carreira que devia ocorrer a fixação dos percentis de 25% definidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66-B/2007, não por rateamento pelas distintas unidades orgânicas a que estão adstritos os técnicos superiores da Câmara Municipal ..., precisamente de forma a não excluir à partida a avaliada da menção relevante.
Ou seja, e quanto ao tribunal, a norma disputada é neste aspecto clara, estrita e sem elementos ônticos ou margens de livre apreciação administrativa: as percentagens de diferenciação dos trabalhadores públicos no procedimento de avaliação de desempenho devem, em regra, ser proporcionalmente distribuídas por todas as carreiras, admitindo-se apenas alguma margem para que a Administração destrince entre carreiras públicas entre si, mas não já se admitindo, dentro dos trabalhadores integrados em cada carreira – no caso, de técnico superior –, que a diferenciação dos desempenhos se cifre a montante do mais lato ou reduzido número concreto de trabalhadores afecto a cada unidade orgânica ou serviço.
No entanto, aquilo que os autos mostram é que o despacho do Presidente da Câmara Municipal ... fixou as percentagens de diferenciação de desempenho à razão de 25% entre os técnicos superiores, não como um todo, mas por referência às unidades orgânicas por onde se espalhavam e integravam aqueles técnicos superiores (cfr. facto provado 4). No final, portanto, unidades orgânicas integrativas de 4 técnicos superiores tinham a quota de 1, e assim sucessivamente multiplicando, mas a unidade orgânica da associada do autor – DPMF –, em que esta era a única técnica superior, não foi bafejada com nenhuma quota acessível de desempenho relevante.
Por conseguinte, entre os 129 técnicos superiores sob avaliação, obtivesse aquela um dos 25 melhores desempenhos e, sempre, acabaria manietada: a quota fixada tendo por referência a realidade das unidades orgânicas da Câmara Municipal ... limitava-a absolutamente e à partida.
E assim mesmo ocorreu, já que a proposta de classificação apresentada pelo avaliador, qual seja de 4,840 valores, com a menção de Relevante, foi aceite nas suas premissas pelo Conselho Coordenador da Avaliação mas não foi validada nem sucessivamente homologada apenas a pretexto de um invocado excesso da quota disponível (cfr. factos provados 6 e 8).
Porém, e como revelam os factos provados, a classificação da associada do autor, se de 4,840 valores, integrava um dos 25 melhores desempenhos relevantes, na medida em que o último avaliado com essa menção obteve a classificação quantitativa de 4,040 (cfr. facto provado 14).
Por conseguinte, e como defende o autor fazendo apelo às conclusões da comissão paritária (cfr. facto provado 7) – que, porém, é não vinculante (cfr. artigo 70.º da Lei n.º 66-B/2007) –, a sua associada iniciou o procedimento de avaliação de desempenho sem chance de poder ser classificada com Relevante, e tudo porque a diferenciação de desempenhos levou em conta, não o universo de técnicos superiores como um todo, mas a relação de forças pelas diversas unidades orgânicas da Câmara Municipal ....
Nesta compreensão, o procedimento acabou por veicular a violação do artigo 75.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 66-B/2007, que faz depender a diferenciação de desempenhos em função das carreiras públicas sob avaliação e não por consideração das unidades orgânicas em que se inserem os trabalhadores avaliados, tudo a reclamar para a associada do autor, no final, a anulação do acto de avaliação viciado nos termos do artigo 161.º, n.º 1 a contrario do CPA e o direito a ver revista a sua avaliação ou a ser-lhe atribuída nova avaliação (cfr. artigo 73.º, n.º 2 da Lei n.º 66-B/2007). No caso presente, em que a entidade demandada não discordou do mérito da proposta de classificação inicial de 4,840 se não a pretexto do excesso da quota disponível, o direito à avaliação em crise com a sua menção própria de Relevante.
Por outro lado, tratando o artigo 75.º, n.ºs 1 e 2 como delimitador de uma diferenciação de desempenho que não admite rateamentos ou proporções em função das unidades orgânicas a que estão afectos os trabalhadores das carreiras avaliadas – coisa diferente e prevista na lei é a diferenciação proporcional das carreiras públicas entre si –, movemo-nos em matéria de legalidade estrita ou vinculada, logo não se suscitando a jusante a violação de princípios jurídicos, nomeadamente do princípio da igualdade (cfr. artigo 6.º do CPA), porque o controlo da actividade administrativa por essa via funciona apenas em domínios de discricionariedade administrativa.
De qualquer modo, atalhando por essa tese, ainda que houvesse que reconhecer alguma discricionariedade na estatuição normativa ínsita aos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º da Lei n.º 66B/2007, do despacho do Presidente da Câmara de 25/02/2019 resultaria que a diferenciação de desempenhos, como foi pensada e visou a associada do autor, padeceria de violação – grosseira, manifesta ou ostensiva – do princípio da igualdade, já que estava, nos termos previstos, vedada àquela associada, em absoluto, toda e qualquer sorte de um desempenho relevante em igualdade de oportunidades com as demais trabalhadoras avaliadas, do que o tribunal abraçaria a anulabilidade do acto impugnado, embora já não a respectiva nulidade porque o fundamento previsto no artigo 161.º, n.º 1, al. d) do CPA reporta-se ao núcleo duro ou essencial de um direito fundamental (DLG), de que é possível inferir que a igualdade é, mas só no tocante às situações em que são atingidos os índices constitucionalmente delimitados no artigo 13.º, n.º 2 da CRP – ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual –, onde não cabe o direito à função pública (cfr. acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 16/02/2018, no processo 01663/17.3BEPRT [“A violação do princípio da igualdade (art. 13.° da CRP) só gerará nulidade nos casos em que ela fira o núcleo do conteúdo essencial do direito, o que se verificará apenas nas situações em que é atingido o cerne das categorias vertidas no n.º 2 do art. 13.°, através de discriminações com as causas ali previstas, e das contempladas no art. 36.°, n.º 4 da Constituição. Efetivamente, a simples violação do princípio da igualdade (no conteúdo, na motivação ou no procedimento) gera anulabilidade do ato administrativo (e não nulidade)”] e de 08/01/2016, no processo 01665/10.0BEBRG-A [“A violação do “conteúdo essencial de um direito fundamental” só gera a nulidade do acto administrativo e, consequentemente, a possibilidade da sua impugnação a todo o tempo, quando, em consequência do acto administrativo em causa, seja afectado o mínimo sem o qual esse direito não pode subsistir enquanto tal.”]).
Em suma, considerando o tribunal que o acto avaliativo do desempenho da associada do autor padece de vício de violação de lei (cfr. artigo 75.º, n.s 1 e 2 da Lei n.º 66-B/2007), e resultando dos factos provados que a classificação proposta de 4,840 permitia-lhe integrar o universo de desempenhos relevantes dos trabalhadores avaliados na carreira de técnico superior da C.M. ..., há de a pretensão merecer o sucesso devido, condenando-se a entidade demandada, que eximiu aquela classificação a pretexto exclusivo do excesso da quota disponível, à prolação de despacho de homologação da avaliação de desempenho com a menção quantitativa de 4,840 valores e qualitativa de relevante, tendo por referência o biénio de avaliação 2017/18.
Do exposto resulta a desnecessidade de se bulir no probatório.
De todo o modo sempre se dirá: entende a doutrina e jurisprudência, no que respeita à modificação da matéria de facto dada como provada pela 1ª instância, que o Tribunal de recurso só deve intervir quando a convicção desse julgador não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se, assim, a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova, bem como à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto - cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19/10/2005 proferido no âmbito do proc. 0394/05. Aí se refere, no que aqui releva, que “o art. 690º-A do CPC impõe ao recorrente o ónus de concretizar quais os pontos de facto que considera incorretamente julgados e de indicar os meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida. Este artigo deve ser conjugado com o 655° do CPCivil que atribui ao tribunal o poder de apreciar livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto. Daí que, dos meios de prova concretamente indicados como fundamento da crítica ao julgamento da matéria de facto deva resultar claramente uma decisão diversa. É por essa razão que a lei utiliza o verbo “impor”, com um sentido diverso de, por exemplo, “permitir”. Esta exigência decorre da circunstância de o tribunal de recurso não ter acesso a todos os elementos que influenciaram a convicção do julgador, só captáveis através da oralidade e imediação e, muitas vezes, decisivos para a credibilidade dos testemunhos. É pacífico o entendimento dos Tribunais da Relação, neste ponto. Só deve ser alterada a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando assim prevalência ao princípio da oralidade, da prova livre e da imediação - cfr. Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, II volume, 4ª edição, 2004, págs. 266 e 267, o Acórdão da Relação do Porto de 2003/01/09 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 2001/03/27, em Coletânea de Jurisprudência, Ano XXVI-2001, Tomo II, págs. 86 a 88).
A este propósito e tal como sustentado pelo Professor Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha “(…) é entendimento pacífico que o tribunal de apelação, conhecendo de facto, pode extrair dos factos materiais provados as ilações que deles sejam decorrência lógica (…). Por analogia de situação, o tribunal de recurso pode igualmente sindicar as presunções judiciais tiradas pela primeira instância pelo que respeita a saber se tais ilações alteram ou não os factos provados e se são ou não consequência lógica dos factos apurados. (…)” (In Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2017, 4.ª ed.).” (…) “Retomando o que supra fomos referindo sobre a amplitude dos poderes de cognição do tribunal de recurso sobre a matéria de facto temos que os mesmos não implicam um novo julgamento de facto, porquanto, por um lado, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorretamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no artº 690º-A n.ºs 1 e 2 do CPC, e, por outro lado, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.”
No mesmo sentido, os Acórdãos deste TCAN de 06/05/2010, proc. 00205/07.3BEPNF e de 22/05/2015, proc. 1625/07BEBRG: “Os poderes de modificabilidade da decisão de facto que o artigo 712º do CPC atribui ao tribunal superior envolvem apenas a deteção e correção de pontuais, concretos e excecionais erros de julgamento e não uma reapreciação sistemática e global de toda a matéria de facto. Para que seja alterada a matéria de facto dada como assente é necessário que, de acordo com critérios de razoabilidade, apreciando a prova produzida, “salte à vista” do Tribunal de recurso um erro grosseiro da decisão recorrida, aparecendo a convicção formada em 1ª instância como manifestamente infundada”.
In casu, esse erro crasso, grosseiro, manifesto, não se vislumbra.
Improcedem as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 09/5/2025
Fernanda Brandão
Isabel Jovita
Paulo Ferreira de Magalhães |