Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00898/12.0BEAVR |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 04/10/2025 |
| Tribunal: | TAF de Aveiro |
| Relator: | IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES |
| Descritores: | IRC; MENOS-VALIAS; POTENCIAIS VERSUS REALIZADAS; 24º, N.º1 ALÍNEA B) DO CIRC; 75º, N.º2, ALÍNEA B), DO CIRC; REGIME DA LIMITAÇÃO DA DEDUTIBILIDADE; |
| Sumário: | I. O disposto do artigo 24º n. º1, alínea b) do CIRC só é aplicável às situações de menos-valia potenciais ou latentes por contraposição as menos-valia ou mais-valia realizadas (artigo 43º n.º 1 do CIRC, actual 46º). II. O artigo 75º, n.º 2, alínea b), do CIRC (actual artigo 81º, n. º2 al. b)), não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas. III. Dado o regime especial assim fixado e na ausência de remissão para o regime de limitação da dedutibilidade então fixado pelo n.º 3 do artigo 42.º do CIRC (actual artigo 45º, n.º3), este não é aplicável àquela situação.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 22.01.2024, que julgou procedente a impugnação, intentada pela [SCom01...], S.A (Recorrida), contra a liquidação adicional de IRC e derrama municipal referente ao exercício de 2007, e respectivas liquidações de juros compensatórios e moratórios, das quais resultou a pagar o total de € 472.244,45, bem como o indeferimento tácito do pedido de revisão da autoliquidação também referente a IRC do exercício de 2007, na qual deduziu o valor de € 1.666.695,37 correspondente a metade (50%) do valor da menos-valia apurada com a partilha da sociedade [SCom03...] Limited inconformada veio dela recorrer. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «(…) a) Vem o presente recurso apresentado nos termos do disposto no artigo 640.º n.º 1 b) do CPC, entendendo que na decisão sob recurso o Meritíssimo Juiz a quo efectuou uma incorrecta delimitação da matéria de facto dada como provada, incumprindo o artigo 607.º n.º 3 e n.º 4 do CPC, posto que errou na delimitação de um facto, dando-o como provado, e porque deveria ter considerado como provado facto que não o foi. b) Facto este, o não provado, que tem absoluta e incontornável relevância para a boa e adequada decisão da causa. c) A decisão sob recurso veio a fixar como provado facto constante, concretamente, no ponto 13, o qual, no enquadramento dado na sentença e do itinerário seguido pelo tribunal, foi o principal fundamento de facto para a decisão de anulação da liquidação de IRC impugnada, assim como da anulação da autoliquidação. d) No entanto, do processo administrativo (PA) oportunamente remetido pela Fazenda Pública, assim como da petição de impugnação, extrai-se outro fundamento de facto para a autoliquidação e, consequentemente, para a primeira liquidação de imposto. e) De facto, a liquidação corrigida teve a sua génese na transmissão dos activos e negócio da sociedade [SCom03...] Limited ([SCom03...]) para a esfera da sociedade [SCom04...] Limited ([SCom04...]), empresas ambas detidas pela recorrida, f) contrariamente ao afirmado pelo tribunal a quo, que assentou a sua decisão na dissolução daquela primeira sociedade, anulando a liquidação e a autoliquidação com sustento no artigo 75.º do CIRC (actual 81.º), como vigente à época. g) Impõe-se clarificar que a dissolução da sociedade [SCom03...] ocorreu muito depois da sua incorporação e transmissão dos respectivos activos para a outra sociedade, ambas detidas pela recorrida, razão porque o facto relevante é este último, sendo para o efeito ora aquilatado inócua a posterior dissolução da sociedade transmitida. h) Contudo o tribunal a quo entendeu não levar ao probatório o facto em questão, o que não se pode aceitar. i) Deste modo, impõe-se a correcção da matéria dada como assente pelo tribunal a quo, devendo determinar-se a exclusão, de entre a matéria dada como assente, a respeitante ao ponto 13 do probatório. j) Em sua substituição deve considerar-se como provado que a inicial liquidação de imposto teve como fundamento o facto de ter ocorrido a transmissão do negócio e dos activos entre as duas sociedades detidas pela recorrida, conforme consta no PA anexo ao processo, com apuramento e declaração de menos valias nos termos dos artigos 42.º e 43.º do CIRC. k) Consequentemente, sendo diversa a fundamentação de facto para a liquidação inicial de imposto, tal como para as correcções fiscais, resulta clara a legalidade da liquidação impugnada, que foi erradamente anulada na sentença sob recurso. l) Com efeito, em sede de mais ou menos valias, a recorrida [SCom01...] não teve nem um ganho nem uma perda, posto que, verificando-se a transmissão de todo o negócio da [SCom03...] para a [SCom04...], quando aquela [SCom03...] foi dissolvida já todos seus activos, assim como o seu negócio e, consequentemente, o seu valor intrínseco, estavam incorporados e consolidados na dita [SCom04...], assim se mantendo integralmente o que fora transmitido no seio da [SCom01...], ora recorrida. m) O que impõe que se considere que não ocorreu qualquer menos valia realizada, seja por via da anterior transmissão do negócio e dos activos, seja pela posterior dissolução de sociedade, porque a [SCom01...], aqui recorrida, tinha e continuou a deter todo o valor anteriormente directa e indirectamente associado à actividade antes desenvolvida pela sociedade dissolvida. n) Julgamos que esta perspectiva cumpre e tem acolhimento no princípio da prevalência da substância sobre a forma, de acordo com o disposto artigo 11.º n.º 3 da LGT, pelo qual se procura relevar o apuramento da verificada e efectiva realidade, não bastando, para subsumir qualquer situação em contexto tributário, a forma do negócio jurídico envolvido. o) Assim, a menos valia, apurada contabilisticamente, apenas pode ser considerada latente ou potencial, não concorrendo por isso para o apuramento da matéria tributável do período em causa, nos termos do artigo 24.º n.º 1 b) do CIRC, só podendo ser realizada quando, e se, o negócio e activos transmitidos entre as sociedades detidas pela recorrida vierem a sair da sua esfera de influência. p) Afigura-se-nos, portanto, que a douta sentença ora recorrida, porque incorrendo numa errónea delimitação da factualidade relevante, errou no apuramento dos factos julgados como pertinentes para a decisão da causa e, consequentemente, fez uma errada interpretação e aplicação do direito, consubstanciada na violação do disposto artigo 24.º n.º 1 alínea b) do CIRC. q) Na mesma senda e por maioria de razão, não deve ser considerada a dedução integral da menos valia de 3.333.391,00 EUR, contrariamente ao decidido pelo tribunal a quo. r) Face ao exposto, defende a Fazenda Pública que a liquidação de IRC em causa não padece de qualquer ilegalidade que possa conduzir à sua anulação, devendo por isso permanecer na ordem jurídica, devendo a sentença ora recorrida ser revogada. TERMOS EM QUE, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, deve ser revogada a sentença recorrida, como é de inteira JUSTIÇA.» 1.2. A Recorrida [SCom01...], S.A., notificada da apresentação do presente recurso, apresentou as seguintes contra-alegações: (…) A) A Fazenda Pública interpôs recurso da Sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida do ato de liquidação adicional referente a IRC do período de tributação de 2007, no valor de € 472.244,45 e respetiva liquidação de juros compensatórios, bem como do ato de autoliquidação de IRC do mesmo período; B) Em suma, os factos relevantes para a decisão da causa e que resultam da matéria de facto dada como provada na Sentença recorrida são os seguintes: a. em causa estava a tributação da menos-valia apurada pela Recorrida na sequência da dissolução e liquidação da sociedade participada [SCom03...], cujo capital adquiriu totalmente em 1999 pelo valor de € 3.683.730,28; b. aquando da partilha da [SCom03...], a Recorrida recebeu a totalidade do ativo desta, correspondente a um crédito sobre a sociedade [SCom04...], no valor de € 350.339,26, o que conduziu ao apuramento de uma menos-valia, na esfera da Recorrida, no valor de € 3.333.391,00; c. a Recorrida, na modelo 22 de IRC de 2007, apenas deduziu metade de menos-valia apurada com a dissolução e partilha do ativo da [SCom03...], pelo que, na impugnação judicial, pugnou não apenas pela anulação da liquidação adicional de IRC de 2007 emanada pela AT e respetivos juros compensatórios, como igualmente pela anulação da autoliquidação de IRC de 2007 e sua substituição por liquidação que considerasse a menos-valia apurada integralmente dedutível; C) O Tribunal a quo entendeu, e bem, que: a. como consta da matéria de facto dada como provada na Sentença recorrida, em 2007, ocorreu a dissolução e liquidação da [SCom03...], sociedade detida a 100% pela Recorrida, tendo o respetivo ativo, que era constituído unicamente pelo crédito sobre a sociedade [SCom04...], sido objeto da partilha e recebido pela Recorrida; b. o valor de participação financeira detida pela Recorrida na [SCom03...] diminuiu efetivamente em consequência da dissolução e partilha do ativo desta sociedade participada; c. está em causa uma menos-valia efetivamente realizada, inerente à extinção de partes sociais, detidas há mais de três anos e, como tal, a situação em apreço é subsumível ao preceituado no artigo 75.º n.º 2, alínea b), do Código do IRC; d. a menos-valia apurada com a dissolução e liquidação da sociedade participada pode ser integralmente deduzida pela sociedade participante, desde que as respetivas partes sociais tenham permanecido na sua titularidade durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução (como sucede in casu); e. o artigo 42.º n.º 3, do CIRC é inaplicável em conjugação com o artigo 75.º do CIRC, em linha, de resto, com jurisprudência do STA; f. entendimento diverso deste será materialmente inconstitucional por violação do princípio da tributação pelo rendimento real, previsto no artigo 104.º, n.º 2 da CRP; D) Com base no entendimento supra, o Tribunal a quo anulou a liquidação adicional de IRC e respetivos juros compensatórios, bem como o ato de autoliquidação de IRC de 2007; E) A Fazenda Pública interpôs recurso da Sentença recorrida, tendo requerido a exclusão do ponto 13 da matéria de facto dada como provada e sua substituição pelo seguinte: "No exercício de 2007, a Impugnante deduziu à matéria tributável de IRC o valor de 1.666.695,37 EUR, correspondente a 50% da menos-valia, em respeito do disposto nos artigos 42.º e 43.º do CIRC, que apurou com referência à transmissão da actividade e dos activos da sociedade [SCom03...] Limited; (cfr, no PA, a fl. 16 e fl 20 ponto 10, do relatório de inspeção; e petição de impugnação)"; F) De acordo com o recurso interposto, este pedido de alteração da matéria de facto tem, alegadamente, por base o Relatório de Inspeção, a petição inicial que originou o presente processo e a declaração Modelo 22 submetida pela Recorrida quanto ao IRC de 2007; G) Contudo: a. o facto vertido no ponto 13 do probatório da Sentença recorrida e o ponto III.1.1.1. do Relatório de Inspeção coincidem; b. os artigos da petição inicial invocados pela Fazenda Pública não permitem sustentar que a Recorrida tenha entendido que a menos-valia apurada decorreu da transmissão de ativos da [SCom03...] para a [SCom04...]; de resto, há um conjunto vasto de artigos da petição inicial dos quais resulta que o facto tributário que a Recorrida considera relevante é a dissolução e liquidação da sociedade participada [SCom03...]; c. não se consegue entender qual seria, na opinião da Fazenda Pública, a forma correta de inscrever na declaração periódica Modelo 22 a menos-valia apurada, já que, em termos declarativos, nada distingue uma menos-valia determinada na sequência da alienação de um ativo da menos-valia resultante da dissolução e partilha de uma sociedade; H) O pedido de alteração da matéria de facto deve, por isso, ser rejeitado; I) Quanto ao direito aplicável, em causa está, indiscutivelmente, a dissolução e liquidação da [SCom03...], sociedade participada da Recorrida e de uma perda apurada nessa sequência, facto que a AT não contesta; J) O único facto tributário com relevância em Portugal é a dissolução e liquidação da [SCom03...]; K) A transmissão dos ativos e negócio da [SCom03...] para a [SCom04...] ocorrida em 30.04.2007 não assume relevância fiscal em Portugal: os resultados desta operação consubstanciaram rendimentos auferidos fora do território português por entidades não residentes, encontrando-se fora do âmbito de aplicação da lei portuguesa; L) O valor de participação financeira detida pela Recorrida na [SCom03...] diminuiu efetivamente em consequência da dissolução e partilha do ativo desta sociedade participada; M) A Recorrida apurou, por isso, em causa, uma menos-valia real (e não latente) apurada pela Recorrida na sequência da dissolução e liquidação de uma sociedade participada; N) É aplicável o disposto no artigo 75.º, n.º 2, alínea b) do CIRC, sendo por isso a menos-valia dedutível integralmente dedutível; O) À dedutibilidade da menos-valia realizada pela Recorrida com a dissolução e liquidação da [SCom03...] não é aplicável o disposto no artigo 42.º, n.º 3 do CIRC, sob pena de se defender um entendimento materialmente inconstitucional, por violação do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real, nos termos do artigo 104.º, n.º 2 da CRP, Termos em que, em face da fundamentação exposta e porque a douta sentença recorrida bem decidiu, deve esta ser mantida na ordem jurídica e, por conseguinte, negado provimento ao recurso apresentado pela fazenda pública, com as demais consequências legais.» 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 260 e ss. do SITAF, pugnando pela procedência do recurso. 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, cumpre aferir se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e erro de julgamento de direito, sendo que a matéria em litigio se prende, em suma, com o regime legal aplicável em sede de menos valias realizadas pela Impugnante (recorrida) decorrentes da liquidação e dissolução de uma sua participada não residente. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 De facto 2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «1. A Impugnante é uma sociedade anónima constituída em 06.09.1994, com sede no lugar ..., ..., em ..., que se dedica à produção e comercialização de embalagens metálicas e de plástico; 2. No exercício de 2007, em sede de IRC, a Impugnante estava enquadrada no regime geral de tributação – cfr. teor do comprovativo de entrega da declaração Modelo 22, a fls. 195 do processo de reclamação graciosa; 3. No decurso do ano de 1999, a Impugnante adquiriu a totalidade do capital social da sociedade [SCom03...] Limited, pela quantia de € 3.683.730,28; 4. A Impugnante registou contabilisticamente o valor da aquisição, decompondo-a em duas parcelas: € 788.776,00 referente ao valor dos capitais próprios da sociedade adquirida e € 2.894.954,28 referente ao diferencial entre esse valor e a quantia paga; 5. No decurso do ano de 2004, a Impugnante adquiriu a totalidade do capital social da sociedade [SCom04...] Limited; 6. No início do ano de 2007, a Impugnante detinha a totalidade do capital social das sociedades [SCom03...] Limited e [SCom04...] Limited, ambas estabelecidas no Reino Unido; 7. À data de 30.04.2007, a Impugnante já havia amortizado totalmente o diferencial de € 2.894.954,28, mencionado no ponto 4; 8. Com efeitos a 30.04.2007, a sociedade [SCom03...] Limited transmitiu a totalidade dos seus ativos e atividade para a sociedade [SCom04...] Limited, pelo montante de € 350.339,26, correspondente ao valor dos capitais próprios daquela sociedade; 9. Por acordo entre as duas sociedades, o valor da transmissão assumiu a forma de empréstimo, a amortizar após 20.12.2007; 10. Em 20.12.2007, foi dissolvida a sociedade [SCom03...] Limited; 11. À data da sua dissolução, a sociedade [SCom03...] Limited tinha como único ativo o crédito sobre a [SCom04...] Limited, mencionado nos pontos 8 e 9; 12. A Impugnante acresceu o valor de € 350.339,00 ao valor pelo qual a sociedade [SCom04...] Limited estava registada na sua contabilidade – cfr. reprodução dos registos contabilísticos, de fls. 30 a 34 do processo administrativo; 13. No exercício de 2007, a Impugnante deduziu à matéria tributável de IRC o valor de € 1.666.695,37, correspondente a 50% da menos-valia que apurou com referência à dissolução e partilha da sociedade [SCom03...] Limited; 14. No mesmo exercício, a Impugnante acresceu à matéria tributável de IRC o valor de € 438.436,74, correspondente à menos-valia contabilística do valor dos capitais próprios da sociedade [SCom03...] Limited; 15. A Impugnante foi alvo de ação inspetiva que incidiu sobre os anos de 2007 a 2010 – cfr. teor do relatório de inspeção, de fls. 1 a 26 do processo administrativo; 16. Em 09.10.2011, foi elaborado o relatório de inspeção, propondo correções, para além do mais, em sede de IRC do exercício de 2007 com fundamento na dedução indevida de menos-valias apuradas com a dissolução da sociedade [SCom03...] Limited, no valor de € 1.666.695,37 – cfr. teor do relatório de inspeção; 17. Para sustentar as mencionadas correções em sede de IRC do exercício de 2007, ficou expresso no relatório de inspeção o seguinte: “I. DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO » Em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) […] CORRECÇÕES À MATÉRIA TRIBUTÁVEL - Exercício de 2007 …………………… 1.666.695,37 €
(1) Dedução de Menos-valias fiscais No exercício de 2007 foi deduzido 50% da menos-valia fiscal, no valor de 1.666.695,37 €, relativa à dissolução da [SCom03...] Limited, empresa de direito inglês, em 30.04.2007. Esta empresa era detida a 100% pela [SCom01...]. De acordo com as explicações dadas pela empresa os cálculos efectuados foram os seguintes: Valor de aquisição: 3.683.730 € Valor atribuídos aos accionistas: 350.339 € Menos valia total: 3.333.391 € Dedução de 50% da Menos valia nos termos do n.º 3 do art.º 45 do CIRC 1.666.695 € Da análise da dissolução verifica-se que no exercício de 2007, a actividade e os activos da filial [SCom03...] Limited foram transferidos para a filial [SCom04...] Limited, que também é detida a 100% pela [SCom01...], tendo disso pedida de seguida a dissolução da empresa. […] III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL III.1. IRC – ANO DE 2007 III.1.1. DEDUÇÃO DE MENOS-VALIAS FISCAIS III.1.1.1. FACTOS 1. Da análise do quadro 07 da modelo 22 do exercício de 2007 verificou-se que a empresa deduziu 50% da menos valia resultantes da dissolução da [SCom03...] Limited, doravante designada por [SCom03...], no valor de 1.666.695,37 € e acresceu uma menos valia contabilística no valor de 450.460,22 € […] 2. Da análise das contas da empresa verificou-se que essa menos-valia fiscal resulta dos seguintes cálculos: Valor pago pela participação da [SCom03...]: Valor de aquisição: 788.776 € Goodwill 2.894.954 € Total 3.683.730 € Valor atribuídos aos accionistas: 350.339 € Menos valia total: 3.333.391 € Dedução de 50% da Menos valia fiscal (nos termos do n.º 3 do art.º 45 do CIRC) 1.666.695 € 3. O valor da menos valia contabilística encontra-se contabilizado na conta ‘69411000 – perdas Imob. – Aplicações F.’ no valor de 438.436,74 [= 350.339 – (3.683.730 – 2.894.954)]. Este valor resulta da diferença entre o valor contabilizado como custo de aquisição e o valor do capital e reservas da [SCom03...], uma vez que a Goodwill se encontra totalmente amortizado; 4. […] o valor da menos valia contabilística foi acrescido no campo 215 do quadro 07 da modelo 22; 5. Conforme se verifica no relatório de contas da empresa, em 30.04.2007, o valor do capital da empresa mais os resultados era de 350.339 €; 6. O valor do capital mais reservas da [SCom03...] à data de 30.04.2007 começou por ser levado para uma conta de terceiros por contrapartida da conta ‘694 11000 – Perdas Imob. – Aplicações F.’, tendo sido posteriormente saldada por contrapartida do custo de aquisição da [SCom04...] Limited […] - Lançamento n.º 9085016693
7. Nas contas consolidadas da empresa em 2007 […] verificamos a seguinte inscrição: ‘No exercício de 2007, a atividade e os ativos da filial [SCom03...] Limited foram transferidos para a filial [SCom04...] Limited, tendo sido pedido de seguida a dissolução da empresa. 8. A [SCom04...] Limited também é detida a 100% pelo [SCom01...], SA 9. Na notificação de 16 de Agosto 2011 […] questionou-se o contribuinte do seguinte: a. Justificar a que título foi efetuada a transferência do estabelecimento e activos da [SCom03...] Limited com posterior dissolução? b. Justificar porque razão deduziram no quadro 07 da Modelo 22 as menos valias fiscais em virtude da dissolução da [SCom03...] Limited, uma vez que tudo indica que esta operação tenha beneficiado do disposto na Directiva n.º 90/434/CEE de 23 de Julho de 1990. Não estão as menos valias resultantes da dissolução da [SCom03...] Limited excluídas do resultado tributável. 10. Na resposta recebida nestes serviços em 1 de Setembro de 2011, o sujeito passivo refere o seguinte: a. ‘A transferência do estabelecimento e dos ativos foi efectuada a título de transferência de acordo com a legislação inglesa com posterior dissolução da empresa’. b. ‘Deduzimos no quadro 07 da Modelo 22, metade da menos valia apurada com a dissolução da filial, de acordo com art. 45.º do CIRC’. Conforme se constata pela análise a resposta o contribuinte não respondeu às questões que lhe foram colocadas sobre os preceitos legais que lhe permitem fazer concorrer para a matéria tributável a dissolução da [SCom03...]. 11. Da análise do acordo entre a [SCom03...] e a [SCom04...] […] verificamos que: a. A actividade (negócio) e os ativos da filial [SCom03...] Limited foram transferidos para a filial [SCom04...] Limited, com efeitos a partir de 30.04.2007 b. O valor a considerar para a transferência dos ativos será o valor contabilístico líquido e assumirá a forma de ‘empréstimo’ inter-companhias; c. A transferência terá lugar: i. nos termos da secção 343 ICTA 1988, os ‘accordingly capital allowances’ serão transferidos pelo seu valor de registo; ii. a transferência de uma empresa em continuidade está fora do âmbito do IVA; iii. nos termos do artigo 171 TCGA os ‘chargeable assets’ serão considerados como não havendo lugar a ganhos ou perdas. 13. Nesta acordo é dito, ainda, […q]ue o crédito inter-companhias resultante da transferência do negócio e activos será amortizado após 20.12.2007; 15. A [SCom03...] Limited dissolve-se voluntariamente, o que ocorreu em 20.12.2007. Todavia, o registo definitivo ocorreu em 31.07.2008. 16. No acordo de transferência do negócio e bens entre as duas empresas é feita referência à legislação inglesa […] 17. Podemos […] concluir o seguinte: a. Trata-se de uma operação de restruturação que beneficia da neutralidade à luz da legislação inglesa; b. O negócio e activos da [SCom03...] foram transferidos para a [SCom04...] Limited pelo seu valor contabilístico, não houve apuramento de resultados na [SCom03...]; c. A beneficiária desta transferência foi a [SCom04...] Limited que os recebeu pelo seu valor contabilístico; d. A [SCom04...] Limited é detida a 100% pela [SCom01...]; e. A [SCom03...] era detida a 100% pela [SCom01...]; f. A [SCom03...] dissolveu-se em 20.12.2007; g. Em virtude desta reestruturação a [SCom01...] não sofreu qualquer ganho ou perda, uma vez que, o que se verificou foi a passagem do negócio e activos de uma empresa para a outra, ambas detidas a 100% pela [SCom01...]; h. O valor do capital da [SCom03...] mais os resultados foram acrescidos ao valor pela qual a [SCom04...] Limited esta registada na [SCom01...]; i. A perda registada pela [SCom01...] é uma perda potencial, uma vez que poderá vir a ocorrer quando os ativos e negócio da [SCom03...] saírem definitivamente do grupo e não no momento em que os ativos são transferidos da [SCom03...] para a [SCom04...] Limited. III.1.1.2. ENQUADRAMENTO Antes de prosseguir, queremos registar o teor do disposto no artigo 11.º da Lei Geral Tributária (LGT), o qual refere que ‘Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis’. O n.º 3 do mesmo artigo prossegue estabelecendo que ‘Persistindo dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários’. Daqui resulta que as normas de natureza fiscal devem atribuir preponderância à realidade económica em detrimento dos factos jurídicos. Contudo, importa ter presente que tal atribuição não pode colocar em causa a certeza e a segurança do direito fiscal assim como o princípio da legalidade dos próprios impostos. Tendo por base a interpretação dos factos anteriormente descritos, fazendo assentar essa interpretação na substância económica que lhe subjaz e não na forma que lhe foi atribuída e tendo presente a certeza, a segurança e a legalidade do enquadramento tributário, temos que o n.º 3 do artigo 11.º da LGT dá suporte à interpretação efetuada que conduz à proposta de correção que se apresenta. Está assim consumada a ponte entre a abordagem legal abaixo efectuada e os factos anteriormente descritos, que resumimos: 1. A [SCom01...] detinha duas filiais em Inglaterra a [SCom03...] e a [SCom04...] Limited, com uma participação de 100% em cada uma delas; 2. Em 30.04.2007 em virtude de uma operação de reestruturação o negócio e activos da [SCom03...] foram transferidos para a [SCom04...] Limited, pelo seu valor contabilístico; 3. A [SCom03...] dissolveu-se em 20.12.2007; 4. Em virtude desta operação, a [SCom01...] não teve qualquer ganho ou perda, uma vez que, a [SCom03...] extinguiu-se, mas o negócio e os activos que detinha passaram pelo seu valor contabilístico para a [SCom04...] Limited, não tendo sido determinado o valor de mercado para os activos transferidos, nem para o valor de negócio, quanto muito ocorreu uma menos valia potencial. Se considerarmos que ocorreu uma menos-valia potencial o artigo 24.º do CIRC relativo às variações patrimoniais negativas, na alínea b) do n.º 1 refere que as menos-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade não concorrem para a formação da matéria tributável, pelo que a empresa não poderia ter deduzido ao resultado tributável o valor de 1.666.695,37 €, a título de menos valia fiscal. Sem prescindir, mas admitindo a hipótese de se tratar de uma operação de reestruturação prevista na Directiva 90/434/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados-Membros diferentes, também não concorre para a formação da matéria tributável, uma vez que no artigo 8.º esta directiva refere o seguinte: ‘Em caso de fusão, cisão ou permuta de acções, a atribuição de títulos representativos de capital social da sociedade beneficiária ou adquirente a um sócio da sociedade contribuidora ou adquirida, em troca de títulos representativos do capital social desta última, não deve, por si mesma, implicar qualquer tributação sobre o rendimento, os lucros ou mais-valias do referido sócio’. Em resumo, as operações de reestruturação ocorridas entre empresas de diferentes Estados-Membros obedecem a um regime de adiamento de tributação até à sua realização efectiva, isto é, observa-se o regime de neutralidade fiscal, o mesmo se verificando relativamente aos sócios das empresas envolvidas. Entendimento semelhante encontramos no ordenamento jurídico interno, no artigo 76.º do CIRC, relativo ao regime aplicável aos sócios das sociedades fundidas ou cindidas, refere que: ‘1 - Nos casos de fusão de sociedades a que seja aplicável o regime especial estabelecido no artigo 68.º, não há lugar, relativamente aos sócios das sociedades fundidas, ao apuramento de ganhos ou perdas para efeitos fiscais em consequência da fusão, desde que, na sua contabilidade, seja mantido quanto às novas participações sociais o valor pelo qual as antigas se encontravam registadas.” O que se verificou na [SCom01...]. III.1.1.3. CORRECÇÕES PROPOSTAS Face ao enquadramento explanado no ponto anterior a empresa não deveria ter deduzido no quadro 07 do modelo 22, declaração de rendimentos do exercício de 2007, o Valor de 1.666.695,37 € a título de menos valia fiscal, quando esta operação de reestruturação do grupo estava sujeita a um regime de adiamento da tributação, isto é, de neutralidade fiscal. Consequentemente tal perda não concorre para formação do lucro tributável, pelo que deverá ser acrescido ao lucro tributável do exercício 2007 o montante de 1.666.695,37 €. […] IX. DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO […] importa referir o seguinte: i. O sujeito passivo limitou-se a indicar que: - não se trata de mais valias latentes; - não praticou nenhuma operação que goze do neutralidade ao abrigo da Directiva 90/434/CEE de 23 de Julho de 1990; - explicitar como foi determinado o valor da menos-valia. Em ponto algum demonstra as razões de facto e de direito que se sustentam o por si afirmado. Logo não acresce nada aquilo que era conhecido pela administração tributária. 2. O procedimento de inspeção tributária visa a observação das realidades tributárias, sendo que esta tarefa torna-se particularmente complexa quando estamos na presença de empresas sedeadas em países diferentes e consequentemente diferente de sistemas fiscais. 3. Sendo certo que a administração tributária deve realizar todas as diligências que se mostrem necessários à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material. Também é verdade, que a entidade inspeccionada se encontra obrigada a cooperar com os órgãos inspetivos na busca da verdade material. 4. No ponto n.º 5 da introdução do CIRC é referido que: «O conceito de lucro tributável que se acolhe em IRC tem em conta a evolução que se tem registado em grande parte das legislações de outros países no sentido da adopção, para efeitos fiscais, de uma noção extensiva de rendimento, de acordo com a chamada teoria do incremento patrimonial. Este conceito - que está também em sintonia com os objetivos de alargamento da base tributável visados pela presente reforma - é explicitamente acolhida pelo Código, ao reportar-se o lucro à diferença entre o património líquido no fim e no início do período de tributação». Na verdade, o art.º 3.º, n.º 2 do CIRC estabelece que «… o lucro consiste na diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação com as correções estabelecidas neste código.». 5. Ora o património líquido da [SCom01...] após esta estruturação não sofreu qualquer alteração, senão vejamos: i. A [SCom04...] Limited é detida a 100% pela [SCom01...]; ii. A [SCom03...] era detida a 100% pela [SCom01...]; iii. A [SCom03...] dissolveu-se em 20.12.2007; iv. O negócio e activos da [SCom03...] foram transferidos para a [SCom04...] Limited pelo seu valor contabilístico, não houve apuramento de resultados na [SCom03...]; v. A beneficiária desta transferência foi a [SCom04...] Limited que os recebeu pelo seu valor contabilístico; vi. O que se verificou foi a passagem do negócio e activos de uma empresa para a outra, ambas detidas a 100% pela [SCom01...]; vii. O valor do capital da [SCom03...] mais os resultados foram acrescidos ao valor pela qual a [SCom04...] Limited está registada na [SCom01...]; viii. A perda registada pela [SCom01...] é uma perda potencial, uma vez que poderá vir a ocorrer quando os ativos e negócio da [SCom03...] saírem definitivamente do grupo e não no momento em que os ativos são transferidos da [SCom03...] para a [SCom04...] Limited. Assim, sendo com esta operação a [SCom01...] não sofreu qualquer perda uma vez que o seu património manteve-se inalterado. Pelo que não será de aceitar o invocado pelo contribuinte no direito de audição. […]” – cfr. relatório de inspeção, de fls. 1 a 26 do processo administrativo; 18. Em 17.10.2011, foi proferido despacho concordante com o teor do relatório de inspeção – cfr. despacho a fls. 1 do processo administrativo; 19. Na sequência das mencionadas correções, a Administração Tributária emitiu em nome da Impugnante a liquidação n.º ...97, referente a IRC do exercício de 2007 e respetivos juros compensatórios e moratórios, no valor global de € 70.605,11, com base na qual e efetuando o estorno do valor apurado na liquidação anterior determinou o valor total a pagar de € 472.244,45 – cfr. demonstrações de liquidação e de acerto de contas, de fls. 52 a 54 do processo de reclamação graciosa; 20. Em 20.03.2012, a Impugnante apresentou reclamação graciosa, formulando os seguintes pedidos: “[…] deve a presente reclamação graciosa ser julgada procedente […] e, consequentemente: (i) anulada a liquidação adicional de IRC relativa ao período de tributação de 2007, identificada com o n.º ...97, no montante de € 70.605,11, que originou um total a pagar de € 472.244,45 conforme Demonstração de acerto de contas n.º ...18, […] com as demais consequências legais; (ii) corrigida a matéria tributável […], reconhecendo a dedutibilidade integral da menos-valia realizada com a liquidação da [SCom03...], senão nesta sede, no âmbito de revisão oficiosa por iniciativa da AT, nos termos do artigo 78.º, n.º 1 e 2 da LGT; (iii) fixada indemnização legal pela prestação de garantia indevida nos termos do artigo 171.º do CPPT e do artigo 53.º da LGT” – cfr. comprovativo de entrega e petição, de fls. 2 a 51 do processo de reclamação graciosa; 21. A Administração Tributária não proferiu decisão sobre os pedidos mencionados no ponto anterior; 22. No âmbito do processo de execução fiscal n.º ...49, instaurado no Serviço de Finanças ..., a Impugnante prestou garantia bancária, datada de 27.01.2012, no valor de € 593.591,56 – cfr. documento de garantia bancária, a fls. 64/65 do sitaf. * Não se deram como provados ou não provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa. Os factos enunciados nos pontos 1, 3, 4, 6 a 10, 13 e 14 foram dados como provados por acordo, atenta a posição coincidente assumida pelas partes na presente causa. Deu-se como provado o facto constante do ponto 5, alegado pela Impugnante, por ser coerente com o facto dado como provado sob o ponto 6 e atendendo a que o mesmo não foi contestado pela Fazenda Pública. O facto enunciado no ponto 11 foi dado como provado por referência ao teor da factualidade dada como provada sob os pontos 8 e 9. Quanto ao facto constante do ponto 21, foi dado como provado por referência à integralidade do processo administrativo e atendendo a que o mesmo não foi contestado pela Fazenda Pública. Os restantes factos foram dados como provados com base na análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, incluindo no processo administrativo e no processo de reclamação graciosa apensos aos autos físicos, conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.» 2.2. De direito A Recorrente AT inconformada com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Aveiro, que julgando totalmente procedente a impugnação judicial deduzida pela Recorrida, determinou:” a) anulação da liquidação adicional de IRC do exercício de 2007 e respetivos juros compensatórios e moratórios; b) a anulação da autoliquidação de IRC do exercício de 2007 e a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a substituí-la por outra liquidação que inclua a dedutibilidade integral da menos-valia realizada com a partilha da sociedade [SCom03...] Limited, no valor de € 3.333.391,00; c) a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento à Impugnante da indemnização pela prestação da garantia bancária, sendo esta no montante dos custos efetivamente suportados pela Impugnante com essa prestação, mas tendo como limite máximo o resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios legalmente prevista.”, dela veio interpor o presente recurso. In casu, decorre do teor do relatório de inspeção que a Administração Tributária fundamentou as correções subjacentes ao acto de liquidação adicional no entendimento de que as operações praticadas não geraram qualquer alteração do património líquido da Impugnante. Concretizam os serviços de inspeção que a Impugnante detinha a totalidade do capital social das duas sociedades e que a transmissão da atividade e dos ativos da [SCom03...] Limited ([SCom03...] de ora em diante) para a [SCom04...] Limited ([SCom04...] de ora em diante) se realizou pelo respetivo valor contabilístico, o qual foi acrescido ao valor pela qual a [SCom04...] está registada na Recorrida [SCom01...]. Assim, no entendimento dos serviços, esta operação gerou na esfera da [SCom01...] uma menos-valia meramente potencial, que será efetivamente realizada apenas quando aqueles activos saírem definitivamente da esfera de domínio da Recorrida, pelo que, à luz do disposto no artigo 24.º n.º 1 alínea b) do Código do IRC (redacção em vigor em 2007, sendo que sempre que não seja feita qualquer menção será essa a redação e numeração em referência), o respetivo valor não concorre para o apuramento da matéria tributável. O tribunal a quo, considerando que in casu não estamos perante uma menos-valia meramente potencial, afirmando que ocorreu efectivamente uma diminuição do valor da participação financeira em consequência da dissolução e partilha da sociedade participada inerentes à extinção de partes sociais, detidas há mais de três anos, conclui que a situação é subsumível ao preceituado no artigo 75.º n.º 2 alínea b) do Código do IRC, avocando o erro na qualificação jurídica do facto tributário pela AT. Prosseguindo conheceu da dedutibilidade integral ou limitada em 50% da menos-valia realizada, reconduzido a mesma a sua integralidade, afastando aplicabilidade à situação do artigo 42º, n.º 3 do CIRC. Vejamos então do ataque preconizado pela Recorrente AT, com enfoque inicial para o erro de julgamento de facto. 2.2.1. Erro de julgamento de facto Argumenta a Recorrente que o facto provado sob o item 13. do acervo probatório fixado, atento o enquadramento e itinerário seguido pelo Tribunal a quo, “foi o principal fundamento de facto para a decisão de anulação da liquidação de IRC impugnada, assim como da anulação da autoliquidação” [conclusão c)], e como tal vem atacar a sua fixação. Atentemos ao conteúdo do item 13.: “No exercício de 2007, a Impugnante deduziu à matéria tributável de IRC o valor de € 1.666.695,37, correspondente a 50% da menos-valia que apurou com referência à dissolução e partilha da sociedade [SCom03...] Limited”. Sendo que, em sede de motivação, aí se esgrima que o mesmo foi dado por provado por acordo, atenta a posição coincidente assumida pelas partes na causa. Contra argumenta AT que “do processo administrativo (PA) oportunamente remetido pela Fazenda Pública, assim como da petição de impugnação, extrai-se outro fundamento de facto para a autoliquidação e, consequentemente, para a primeira liquidação de imposto” pois que de facto “a liquidação corrigida teve a sua génese na transmissão dos activos e negócio da sociedade [SCom03...] Limited ([SCom03...]) para a esfera da sociedade [SCom04...] Limited ([SCom04...]), empresas ambas detidas pela recorrida.” [conclusões d) e e)]. Em suma, lidas as alegações e a posição da recorrente ali expressa, se bem as interpretamos a posição ali elegida, a alteração preconizada situa-se no campo da concretização de qual o facto considerado pela recorrida ao ter reconduzido à sua contabilidade a dedução à matéria tributável em sede de IRC, a saber o valor de €1,666,695,37 correspondente a 50% da menos valia que apurou, se o fez com fundamento na «dissolução e partilha» da [SCom03...] ou, como avoca AT, com fundamento em «transmissão da actividade e dos activos» da [SCom03...], pretendendo a recorrente assim reconduzir a dedução operada pela recorrida em sede de autoliquidação ao artigo 42º e 43º do CIRC. Vejamos, se perante as posições das partes, petição inicial e RIT, se a fixação operada pelo tribunal a quo padece de tal pecha. E, desde logo se diga que falece o argumento esgrimido pela recorrente, de que essa é a posição preconizada pela recorrida na sua petição inicial nos pontos 8º, 9º, 39º, 41º, 42º e 55º, porquanto o ali expresso foi vertido pelo Tribunal a quo nos itens 8. e 9. da matéria de facto fixada, dando-se aí nota da transmissão operada em 30.04.2007 de que a sociedade [SCom03...] detida então na totalidade pela impugnante, transmitiu a totalidade dos seus activos e actividade para a sociedade [SCom04...], aí se aludindo ao montante, correspondente ao valor do capital próprio da [SCom03...] e que o mesmo assumiu a forma de empréstimo, a amortizar após 20.12.2007. Pelo que por aqui não surte qualquer efeito a indignação da AT, pois que ao probatório cumpre reconduzir os factos, questão distinta, que colide com a subsunção jurídica dos mesmos contende com um eventual erro de julgamento de direito. Mais acresce, que perscrutada a petição, dela consta efectivamente que a “liquidação adicional resultou do facto de a Administração Tributária (de ora em diante "AT") ter desconsiderado a menos-valia fiscal de € 1.666.695,37, inscrita no quadro 07 da declaração modelo 22 relativa ao período de tributação de 2007” [artigo 8º] e de que “A qual acresceu, nos termos da referida liquidação, ao lucro tributável do período em causa.” [artigo 9º] para depois de sintetizar o objecto e dimensão económica da Recorrida, da nota da aquisição e dissolução e partilha da [SCom03...], mormente o seu artigo 50º em que expressamente dá nota de que “Assim, relativamente ao período de tributação de 2007, a [SCom01...] apurou, nos termos conjugados dos artigos 75º e 42º do CIRC (correspondentes aos artigos 81. ° e 45. ° na redacção hoje em vigor), uma menos-valia fiscal de € 3.333.391,02, dos quais deduziu fiscalmente € 1.666.695,00.” e de que “Esta menos-valia resultou da diferença negativa entre o valor de aquisição da participação na [SCom03...] (de € 3.683.730,00) e o valor distribuído à sócia [SCom01...], após a liquidação da mesma (€ 350.339,00).” [artigo 51º]. Por outro lado, consta do RIT, em sede de descrição dos factos que “1. Da análise do quadro 07 da modelo 22 do exercício de 2007 verificou-se que a empresa deduziu 50% da menos valia resultantes da dissolução da [SCom03...] Limited, doravante designada por [SCom03...], no valor de 1.666.695,37 € e acresceu uma menos valia contabilística no valor de 450.460,22 € […] (...)”. Ora, da confrontação da posição relevada em sede de petição pela recorrida e da constatação factual relevada em sede de RIT, o relevado sob o item 13. do probatório pelo Tribunal a quo, não nos merece qualquer reparo, até porque foi precisamente a não aceitação daquela autoliquidação, mormente da dedução operada àquele título em sede de menos-valia à matéria tributável e o seu enquadramento jurídico fiscal que determinou a liquidação adicional de não aceitação daquela dedução. Acresce ainda, que reconduzir a dedução operada pela recorrida em sede de autoliquidação ao artigo 42º e 43º do CIRC e/ou artigo 75º do mesmo diploma , este último isoladamente ou em conjugado com aqueles outros, é claramente matéria de direito não reconduzível ao acervo factual. Pelo exposto, improcede a pretensão da recorrente de imputação de erro de julgamento de facto à sentença recorrida [conclusões a) a j) das alegações de recurso], não logrando por esta via alteração do probatório o qual se dá por cristalizado. 2.2.2. Erro de julgamento de direito Cristalizada que se mostra a factualidade de facto, manifesta é a sucumbência do erro de julgamento de direito porquanto o mesmo assenta o seu discurso na afirmação constante da conclusão k) de que “sendo diversa a fundamentação de facto para a liquidação inicial de imposto, tal como para as correcções fiscais, resulta clara a legalidade da liquidação impugnada, que foi erradamente anulada na sentença sob recurso”, diversa fundamentação essa de facto que não logrou, perante a improcedência do recurso dirigido ao julgamento de facto, supra determinada. Ainda assim, e para aquilatar da existência de um ataque merecedor de apreciação por este Tribunal ad quem, atentas as imposições e limitação próprias do regime adstrito aos recursos jurisdicionais, atentemos ao discurso fundamentador da sentença sob recurso: «Questão diferente é a de saber se os fundamentos expressos pela Administração Tributária correspondem à realidade e se, correspondendo, traduzem uma adequada subsunção ao quadro legal aplicável em sede de IRC, o que se reconduz à apreciação do invocado erro sobre os pressupostos de direito, por desconsideração do valor deduzido à matéria tributável a título de menos-valia. Sobre este aspeto, sustenta a Impugnante que adquiriu a [SCom03...] Limited, sociedade residente no Reino Unido, pelo valor de € 3.683.730,28, pelo que a posterior operação de liquidação dessa sociedade, e consequente transmissão do seu património, que se reconduzia ao crédito sobre a [SCom04...] Limited, no montante de € 350.339,00, gerou uma menos-valia efetiva, e não meramente potencial, de € 3.333.391,02. Sublinha que a Administração Tributária não colocou em causa o mencionado valor de aquisição, nem alegou ou demonstrou que o valor de € 350.339,00 não corresponde ao valor real do património partilhado. Acrescenta que não ocorreu qualquer operação de reestruturação subsumível a um regime de neutralidade fiscal, porquanto, com a transmissão de ativos da [SCom03...] Limited para a [SCom04...] Limited não recebeu qualquer participação adicional no capital desta sociedade, a qual continua valorizada pelo seu valor inicial de aquisição. Assim, no seu entendimento, a dissolução e partilha daquela sociedade gerou a perda definitiva do valor de aquisição da respetiva participação, ou seja, esse valor não pode ser considerado numa posterior alienação da participação social que detém na [SCom04...] Limited. Conclui que, também neste enquadramento, não ocorreu uma menos-valia potencial, mas sim uma menos-valia realizada. A Fazenda Pública contrapõe que, com a dissolução da [SCom03...] Limited, a Impugnante não sofreu qualquer perda imediata, realizada, visto que, por força dessa operação, apenas ocorreu a transferência do crédito detido por aquela sociedade sobre a [SCom04...] Limited, ambas detidas a 100% pela Impugnante. Considera, assim, que a perda só será realizada quando aquele ativo sair definitivamente da esfera do grupo controlado pela Impugnante. Apreciando: Como se dispõe no artigo 17.º n.º 1 do Código do IRC, o lucro tributável das pessoas coletivas “é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado”. De acordo com o disposto no artigo 20.º n.º 1 do mesmo Código, constituem proveitos ou ganhos resultantes “de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória”, designadamente de “[m]ais-valias realizadas” (alínea f)). Por seu lado, o artigo 23.º n.º 1 do Código do IRC (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03.07) estabelece que são “custos ou perdas [aceites fiscalmente] os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”. Trata-se de uma norma geral que consagra a dedutibilidade, para efeitos fiscais, dos custos e das perdas registados contabilisticamente, mas sujeitando-a a determinados requisitos: a sua existência e comprovação e a sua indispensabilidade. Reunidos estes requisitos, o direito à dedução só poderá ser afastado por força de outra disposição legal. A indispensabilidade prende-se com a ligação dos custos ou perdas à atividade desenvolvida, ou seja, à existência de uma relação causal e justificada com a atividade produtiva da empresa e, portanto, à potencialidade de gerarem um incremento dos ganhos. Neste sentido, apenas serão excluídos do direito à dedução os custos ou perdas não correlacionados com a atividade da empresa, ou sem interesse económico para aquela, mormente os assumidos para a prossecução de interesses alheios, ou aqueles que se revelem excessivos ou desadequados às exigências e capacidades da empresa. Num esforço de densificação do conceito de indispensabilidade, o legislador consagrou nas várias alíneas do preceito uma enumeração, meramente exemplificativa, de custos ou perdas que podem considerar-se dedutíveis na determinação da matéria tributável, entre os quais as “[m]enos-valias realizadas” (alínea l). No entanto, deve entender-se que esta menção a menos-valias realizadas não confere, só por si, o direito à dedução do respetivo valor à matéria tributável, ficando, como acontece com todos os demais custos ou perdas enumerados na mesma norma, sujeitos ao escrutínio da norma geral contida no corpo do n.º 1 do preceito (ou seja, à comprovação da sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora). Importa sublinhar que os gastos incorridos na prossecução do escopo societário situam-se na margem de atuação do empresário, não cabendo à Administração tecer juízos de discricionariedade técnica. Ou seja, o risco próprio da atividade empresarial abarca eventuais más decisões de gestão, as quais, desde que respeitem os limites estabelecidos nas leis societária e tributária, não podem servir de base a qualquer penalização ou juízo sobre o seu mérito para efeitos de tributação. Com efeito, deve atender-se ao princípio da não ingerência da Administração Tributária na liberdade de gestão empresarial – corolário do princípio da liberdade de iniciativa privada, consagrado no artigo 61.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa –, em função do qual não pode a Administração, através de juízos críticos a posteriori, censurar o mérito das decisões empresariais, designadamente desconsiderando os custos ou perdas suportados no âmbito de operações económicas ou financeiras, mesmo no caso de as mesmas se revelarem infrutíferas (neste sentido, pode ler-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 24.09.2014 no processo n.º 0779/12). Nesta perspetiva, todos os custos ou perdas incorridos no exercício da atividade e relacionados com os fins prosseguidos pela empresa deverão, em princípio, ser aceites como dedutíveis, sendo exceção apenas os expressamente previstos na lei, mormente no artigo 42.º do Código do IRC. Quanto às variações patrimoniais positivas, estabelece o artigo 21.º n.º 1 do Código do IRC (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12.11) que “[c]oncorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais positivas não refletidas no resultado líquido do exercício, exceto: [… a]s mais-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade, incluindo as reservas de reavaliação legalmente autorizadas” (alínea b)). Paralelamente, quanto às variações patrimoniais negativas, dispõe o artigo 24.º n.º 1 do mesmo Código (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03.07) que “[n]as mesmas condições referidas para os custos ou perdas, concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não refletidas no resultado líquido do exercício, exceto [… a]s menos-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade” (alínea b)). Encontramos as definições de mais-valias e menos-valias no artigo 43.º n.º 1 do Código do IRC (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03.07): “Consideram-se mais-valias ou menos-valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas relativamente a elementos do ativo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, e, bem assim, os derivados de sinistros ou os resultantes da afetação permanente daqueles elementos a fins alheios à atividade exercida”. Note-se que estas definições se reportam a mais-valias ou menos-valias realizadas (por contraposição a mais-valias ou menos-valias latentes). Assim, desde que respeitem os mencionados requisitos estabelecidos no corpo do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, as perdas efetivamente sofridas relativamente a elementos do ativo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, concorrem negativamente para a formação do lucro tributável do respetivo exercício. Todavia, como se aflorou, existem limitações à norma geral de dedutibilidade consagrada no artigo 23.º n.º 1, entre as quais as resultantes da norma excecional contida no artigo 42.º n.º 3 do Código do IRC (na redação dada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30.12), na qual se estabelece que “[a] diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor”. Este preceito integra uma medida anti-abuso, com objetivo de evitar a manipulação do resultado fiscal, estabelecendo uma exclusão parcial do direito à dedução, correspondente a metade do valor das menos-valias realizadas, em três tipos de situações: a) diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital; b) outras perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio; c) outras variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio. No que respeita à tributação dos rendimentos gerados pela partilha de uma sociedade, estabelece o artigo 75.º n.º 1 do Código do IRC (na redação dada pelo Decreto-lei n.º 198/2001, de 03.07) que “[é] englobado para efeitos de tributação dos sócios, no exercício em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do preço de aquisição das correspondentes partes sociais”, acrescentando-se no n.º 2 alínea b) do mesmo artigo que, nesse englobamento, a diferença, “quando negativa, é considerada como menos-valia, sendo dedutível apenas quando as partes sociais tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução”. Este preceito consagra igualmente uma norma excecional, estabelecendo o regime de dedutibilidade da perda apurada pelo sócio na partilha da sociedade participada (diferença, negativa, entre o valor recebido e o valor pelo qual foram adquiridas as partes sociais), impondo o crivo temporal de três anos de detenção da participação social, mas sem se pronunciar sobre o grau dessa dedutibilidade. No caso em apreço, atenta a matéria de facto provada, verifica-se que, no ano de 1999, a Impugnante adquiriu a totalidade do capital social da sociedade, sedeada no Reino Unido, [SCom03...] Limited pelo valor de € 3.683.730,28, tendo esta, no decurso do ano de 2007, transmitido a totalidade da sua atividade e dos seus ativos para a sociedade, também sedeada no Reino Unido e integralmente detida pela Impugnante, [SCom04...] Limited pelo respetivo valor contabilístico, que ascendia a € 350.339,26. Por acordo entre as sociedades, esse valor foi considerado um empréstimo concedido pela [SCom03...] Limited à [SCom04...] Limited, a amortizar após 20.12.2007. Posteriormente, mas ainda no decurso do ano de 2007, a [SCom03...] Limited veio a ser dissolvida e partilhada, recebendo a Impugnante a integralidade do seu ativo que, à data correspondia ao mencionado crédito sobre a [SCom04...] Limited. Com referência a esta operação, a Impugnante apurou uma menos-valia de € 3.333.391,00 e, na declaração de rendimentos que apresentou, deduziu metade desse valor à matéria tributável de IRC do exercício de 2007. Na decisão de proceder a correções à matéria tributável de IRC do exercício de 2007, a Administração Tributária não questiona a correção dos mencionados valores de aquisição e de transmissão dos ativos da [SCom03...] Limited, limitando-se a sustentar que, com a dissolução e partilha desta sociedade, não ocorreu qualquer perda efetiva, mas meramente potencial, que será realizada apenas quando aqueles ativos saírem definitivamente da esfera de domínio da Impugnante. Partindo deste entendimento, a Administração, sem apelar à aplicação das normas contidas no artigo 75.º, subsume a situação à norma enunciada no artigo 24.º n.º 1 alínea b) do Código do IRC e, como tal, conclui que o valor da menos-valia não concorre para o apuramento da matéria tributável. A decisão da questão centra-se, portanto, no mérito desta qualificação jurídica, sendo, para tanto, determinante enquadrar a situação como menos-valia latente ou como menos-valia emergente da partilha da sociedade participada, na medida em que o apuramento da matéria tributável em sede de IRC é significativamente distinta para os dois casos. Ora, sendo matéria de facto assente que ocorreu a dissolução e partilha da sociedade [SCom03...] Limited, cujo capital social era integralmente detido pela Impugnante, e que o respetivo ativo partilhado era constituído unicamente pelo crédito sobre a sociedade [SCom04...] Limited, a solução da questão deve encontrar-se no regime de tributação da partilha daquela sociedade, porquanto é este o facto com relevância tributária na esfera da Impugnante. Com efeito, ao contrário da posição assumida pela Administração, ocorreu efetivamente uma diminuição do valor de participação financeira em consequência da dissolução e partilha da sociedade participada, pelo que estão em causa menos-valias efetivamente realizadas, inerentes à extinção de partes sociais, detidas há mais de três anos, e, como tal, a situação é subsumível ao preceituado no artigo 75.º n.º 2 alínea b) do Código do IRC. A posição da Administração assenta, assim, num erro de qualificação jurídica do facto tributário, ficando, portanto, inquinado todo o raciocínio subjacente às correções que conduziram à liquidação adicional de IRC. Assim sendo, é forçoso concluir-se pela procedência desta específica pretensão anulatória formulada pela Impugnante. Apreciada esta questão, é pertinente prosseguir para a apreciação do pedido de anulação da autoliquidação referente também a IRC do exercício de 2007, à qual a Impugnante imputa igualmente o vício de erro sobre os pressupostos de direito, e de substituição por outra liquidação que reconheça a dedutibilidade integral da menos-valia realizada, no valor de € 3.333.391,00. A este propósito, a Impugnante alega que, da interpretação conjugada do disposto nos artigos 75.º n.ºs 1 e 2, 42.º n.º 3 e 43.º do Código do IRC (na redação em vigor à época) devem extrair-se as seguintes conclusões: 1) a diferença negativa entre o valor atribuído aos sócios em sede de partilha e o valor de aquisição das participações sociais qualifica-se como menos-valia; 2) essa menos-valia não resulta da transmissão onerosa de partes sociais, mas antes da liquidação de uma sociedade, ou seja, do desaparecimento de um ativo, estando sujeita a regras de determinação e a um regime de tributação próprios, o qual não comporta qualquer norma específica que limite a respetiva dedutibilidade; 3) assim, as menos-valias resultantes da partilha não estão sujeitas à limitação do direito à dedução, prevista no artigo 42.º n.º 3. Com base nesta interpretação, sustenta que a Administração Tributária deveria ter corrigido a liquidação de IRC do exercício de 2007, considerando a dedução da totalidade do valor da menos-valia realizada, no montante de € 3.333.391,02, em vez de desconsiderar o valor que deduziu no ato de autoliquidação, correspondente a metade daquele montante. Considera, em suma, que tem direito à dedução, a título de menos-valia, não apenas do valor de € 1.666.695,00, mas sim de € 3.333.391,00. Apreciando: Como alega a Impugnante, a decisão desta questão assenta na interpretação conjugada das disposições contidas nos artigos 23.º, 42.º e 75.º do Código do IRC, nas redações já explicitadas na apreciação da questão anterior. Em concreto, a decisão passa por saber se normas excecionais contidas nos artigos 42.º n.º 3 e 75.º n.º 2 alínea b), que se opõem à norma geral contida no artigo 23.º, se excluem mutuamente, entre si, ou são cumuláveis. Importa começar por clarificar que a primeira parte do artigo 42.º n.º 3, por se referir às menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, é incontestavelmente estranha a qualquer pretensão de regulação das perdas apuradas na dissolução e partilha de sociedades, pois, neste contexto, inexiste qualquer transmissão onerosa. Mas a segunda parte do preceito, por se referir a outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital, aparenta comportar as perdas, mormente as menos-valias, apuradas na dissolução e partilha de sociedades. Com efeito, numa análise perfunctória, o elemento literal desta parte da norma parece suportar o entendimento segundo o qual os âmbitos de previsão normativa dos preceitos contidos nos artigos 75.º n.º 2 alínea b) e artigo 42.º n.º 3 não são mutuamente exclusivos, nem incompatíveis, no sentido em que, enquanto o primeiro consagra um requisito para a dedutibilidade, o segundo estabelece, para as perdas dedutíveis, a medida dessa dedutibilidade. No entanto, tal interpretação é abalada ainda no plano dos elementos literais das normas se se atender a que o legislador, ao contrário do que consagrou no artigo 42.º n.º 3, deixando expresso que as perdas aí especificadas “concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor”, estabeleceu no artigo 75.º n.º 2 alínea b) que a perda “é considerada como menos-valia, sendo dedutível”. Ora, se o legislador pretendesse que as menos-valias da partilha concorressem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor, tê-lo-ia dito, ou seja, teria dito que as menos-valias da partilha são apenas parcialmente dedutíveis. Por outro lado, não se pode perder de vista que a norma contida no artigo 42.º n.º 3 do Código do IRC tem natureza excecional, pelo que deve ser objeto de uma interpretação restritiva conforme à Constituição e, em concreto, à exigência de tributação das empresas essencialmente pelo rendimento real, consagrada no artigo 104.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa. Assim, e recordando que a norma contida no artigo 42.º n.º 3 impõe a indedutibilidade de metade do valor das perdas reais e efetivas, deve restringir-se o campo de aplicação da mesma, arredando a sua aplicação a perdas, como as resultantes da partilha de sociedades, que, inequivocamente, já tenham um regime específico e tendencialmente completo de dedutibilidade, como é o caso da norma contida no artigo 75.º n.º 2 alínea b) do Código do IRC. Neste enquadramento, a aplicação do regime do artigo 42.º n.º 3 às menos-valias resultantes da partilha de sociedades só se compreenderia se o legislador expressamente remetesse para o mesmo, o que não fez. Conclui-se, assim, que o artigo 42.º n.º 3 é inaplicável em conjugação com o artigo 75.º do Código do IRC. Sufragando este entendimento, pode ler-se, entre outros, o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 17.02.2016 no processo n.º 01401/14: “I - O art. 81.º [correspondente ao anterior artigo 75.º], n.º 2, alínea b), do CIRC, não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas. II - Dado o regime especial assim fixado e na ausência de remissão para o regime de limitação da dedutibilidade então fixado pelo n.º 3 do art. 45.º [correspondente ao anterior artigo 42.º] do CIRC, este não é aplicável àquela situação.” Em suma, o artigo 75.º n.º 2 alínea b) não se limita a qualificar como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais, pois define também o respetivo regime de tributação, especifica e autonomamente aplicável à dissolução e partilha de sociedades, circunstância que afasta a aplicação do disposto no artigo 45.º n.º 3, que se enquadra no regime fiscal previsto para as mais-valias e menos-valias realizadas. Assim, a menos-valia apurada com a dissolução e partilha da sociedade participada gera na esfera da sociedade dominante o direito a deduzir à matéria tributável de IRC a integralidade desse valor, desde que as respetivas partes sociais tenham permanecido na sua titularidade durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução. Aqui chegados, importa enfatizar que, no caso em apreço, não foi alegado ou provado, sequer indiciariamente, qualquer caráter abusivo da operação de partilha ou dos valores subjacentes ao apuramento da menos-valia. Acresce que, ainda que fosse invocado tal caráter abusivo, um consequente juízo de indedutibilidade da menos-valia sempre careceria de norma anti-abuso específica, que veio a ser introduzida no ordenamento jurídico apenas com a redação dada ao artigo 81.º do Código do IRC pela Lei n.º 2/2014, de 16.01, passando a conter, no seu n.º 6, uma presunção de existência desse carácter abusivo “[s]empre que, num dos quatro períodos de tributação posteriores à liquidação de uma sociedade, a atividade prosseguida por esta passe a ser exercida por qualquer sócio da sociedade liquidada, ou por pessoa ou entidade que com aquele ou com esta se encontre numa situação de relações especiais” (caso em que “deve ser adicionado ao lucro tributável do referido sócio, nesse período de tributação, o valor da menos-valia que tiver sido deduzida nos termos da alínea b) do n.º 2, majorado em 15%”). Ou seja, com a reforma do IRC de 2014, pretendeu o legislador impedir a dedutibilidade da menos-valia resultante da partilha quando ocorre uma mera alteração da forma de detenção da empresa, continuando a atividade económica a ser exercida, diretamente, por um dos sócios ou, indiretamente, através de uma entidade que se encontre em situação de relações especiais. Como se referiu, à data dos factos inexistia qualquer específica norma anti-abuso com idêntico conteúdo. Retomando o caso dos autos, recorde-se que a Impugnante peticiona a anulação, para além do ato de liquidação adicional (questão já apreciada), também da prévia autoliquidação, de modo a que seja considerada a dedutibilidade da totalidade da perda apurada na partilha, pedido este que formulara também mediante pedido de revisão perante a entidade administrativa. Ora, estando em causa a dissolução e partilha de uma sociedade, cujo capital é detido pela Impugnante em 100% há mais de três anos, a situação é plenamente subsumível à norma contida no artigo 75.º n.º 2 alínea b) do Código, a qual, como se explicitou, estabelece especifica e autonomamente o respetivo regime de tributação. Nestes termos, impõe-se que este Tribunal determine a anulação da autoliquidação referente a IRC do exercício de 2007, com fundamento em erro nos pressupostos de direito, e a sua substituição por liquidação que considere a dedução da integralidade do valor da menos-valia apurada com a partilha da sociedade participada, que ascende a € 3.333.391,00.» (fim de transcrição) Vejamos então, com olhos no discurso fundamentador da decisão, do ataque preconizado pela Recorrente AT. Contrapõe a recorrente AT, para além de sustentar que a autoliquidação teve como fundamento o facto de ter ocorrido a transmissão do negócio e dos activos entre as duas sociedades detidas pela recorrida o que, desde já se diga, não têm respaldo no acervo factual (decorrente da cristalização da matéria de facto assente pelo Tribunal a quo), de que “em sede de mais ou menos valias, a recorrida [SCom01...] não teve nem um ganho nem uma perda, posto que, verificando-se a transmissão de todo o negócio da [SCom03...] para a [SCom04...], quando aquela [SCom03...] foi dissolvida já todos seus activos, assim como o seu negócio e, consequentemente, o seu valor intrínseco, estavam incorporados e consolidados na dita [SCom04...], assim se mantendo integralmente o que fora transmitido no seio da [SCom01...]” pelo que se impunha que se considerasse que “(...) não ocorreu qualquer menos valia realizada, seja por via da anterior transmissão do negócio e dos activos, seja pela posterior dissolução de sociedade, porque a [SCom01...], aqui recorrida, tinha e continuou a deter todo o valor anteriormente directa e indirectamente associado à actividade antes desenvolvida pela sociedade dissolvida”. Para prosseguindo apelar ao 11.º, n.º 3, da LGT (“Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários”), para concluir que “a menos valia, apurada contabilisticamente, apenas pode ser considerada latente ou potencial, não concorrendo por isso para o apuramento da matéria tributável do período em causa, nos termos do artigo 24.º n.º 1 b) do CIRC, só podendo ser realizada quando, e se, o negócio e activos transmitidos entre as sociedades detidas pela recorrida vierem a sair da sua esfera de influência”. Ora, aquela norma do artigo 11º, n.º3 da LGT contém uma regra interpretativa que tem sido utilizada pelos Tribunais Superiores para, quando ocorrer dúvida fundada sobre se uma norma fiscal recorre (i) a um conceito civilístico, ou a um conceito próprio de outro ramo do direito, ou (ii) a um conceito económico, ou a um conceito específico do direito fiscal, dar relevância a este último (v. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 12 de março de 2003, processo n.º 01721/02; de 28 de maio de 2003, processo n.º 01968/02; de 24 de março de 2010, processo n.º 01241/09; de 23 de janeiro de 2013, processo n.º 01061/11). Todavia, este princípio interpretativo não permite à AT ignorar ou re-caracterizar as transações dos sujeitos passivos. Se AT, considerava estar perante uma prática abusiva que lhe permitia emitir liquidação, poderia ter lançado mão da cláusula geral anti-abuso prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, que lhe permite “desconsiderar os efeitos fiscais resultantes de operações sem fundamento económico, artificialmente construídas com propósitos essenciais de elisão fiscal”, observado o procedimento estatuído no artigo 63.º do CPPT (cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo n.º 2925/04.5BELSB, de 30 de setembro de 2020). Aliás, este instrumento já tem sido utilizado pela AT para desconsiderar menos-valia (vide acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 27 de outubro de 2022, processo n.º 2557/08.9BCLSB). Mas, no caso sub judice, a AT não recorreu ao artigo 38.º, n.º 2, da LGT. A AT emitiu a sua liquidação reconduzindo a situação ao artigo 24º, n.º 1 alínea b) do CIRC, como disso dá nota na sua contestação (vide artigo 32º da contestação junta aos autos pelo Representante da Fazenda Pública e conclusão o) das alegações de recurso), com fundamento na verificação de uma menos-valia potencial, que determina em si a impossibilidade da impugnante deduzir o respectivo valor ao seu resultado tributável, à luz daquela norma. Ora, não tendo sido abalada a subsunção jurídica dos factos e o discurso em que assenta o Tribunal a quo de que in casu não estamos perante um menos-valia latente ou potencial, falece a posição da AT. Mais se diga, que resultando dos autos que a dissolução e partilha da sociedade [SCom03...] comporta um custo fiscal, e estando verificadas as condições de dedutibilidade previstas no artigo 75º do CIRC, a solução preconizada na sentença sob recurso que assenta na consideração da admissibilidade da dedução integral da menos-valia de € 3.333.391,00, afasta ainda a tese da menos-valia só poder concorrer para a formação do lucro tributável do exercício do ano de 2007 por metade do seu valor, atento o disposto no n.º 3 do artigo 42.° do CIRC. Aliás, a tese inserta na sentença sob recurso de que o artigo 75º, n. º2 alínea c) do CIRC em contraposição com o artigo 42º, nº3 do CIRC prevê um regime especial e, este outro, um regime geral, traduz a mais recente jurisprudência do STA na qual se propugna que “o artigo 42°, n° 3 do CIRC prevê três situações distintas. A primeira reporta-se à diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital. A segunda, conexa com outras perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio. E a terceira relativa a variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio. 3.2.11. Donde, como igualmente se salientou com aprumo no julgado que se sindica, devendo presumir-se que «o legislador se soube expressar adequadamente e que não confundiu conceitos (artigo 9°, n° 3, do CC)», há que concluir que o legislador distinguiu, e quis mesmo distinguir «as situações aplicáveis a “mais e menos valias”, resultantes de transmissões onerosas, de “outras perdas” relativas ao capital próprio e de outras variações patrimoniais negativas do capital próprio». 3.2.12. Assim sendo, admitindo a Recorrente que a situação não constitui uma situação de custo fiscal resultante do apuramento de menos valias resultantes da alienação onerosa de partes de capital, antes, que resulta de uma diminuição do valor de participação financeira em consequência da liquidação e partilha em processo de insolvência, então a situação não pode deixar de se entender como subsumível ao preceituado no artigo 75.º, n.º 2 alínea b) do CRC, no qual o legislador previu especialmente a possibilidade de existência de perdas de valor das participações financeira em processos de liquidação, enquadrando-as fiscalmente, e admitindo que a diferença negativa, “menos-valia", é totalmente dedutível. Ou seja, o legislador consagrou para estas situações um regime especial que, por deter essa natureza, tem, necessariamente, que prevalecer sobre o regime geral consagrado no artigo 42.º, n.º 3 do CIRC.” [in acórdão do STA de 16.02.2022, proferido no âmbito do processo n.º 194/15.0BEAVR, vide ainda, no mesmo sentido, acórdão do STA de 17.02.2016, proferido no processo n.º 1401/14 e acórdão de 14.10.2020, proferido no processo 1055/18.7BEBRG] Assim, a nosso ver, bem andou a sentença recorrida, ao considerar que nada obsta a que a menos-valia apurada nos termos do artigo 75. °, n.º 2, alínea b), do CIRC, concorra integralmente para a formação do lucro tributável do ano de 2007. Em conclusão, por não serem de acolher as razões de facto e de direito invocadas pela recorrente, improcede o recurso e confirmar-se-á, a final, a douta sentença recorrida. 2.3. Conclusões I. O disposto do artigo 24º n. º1, alínea b) do CIRC só é aplicável às situações de menos-valia potenciais ou latentes por contraposição as menos-valia ou mais-valia realizadas (artigo 43º n.º 1 do CIRC, actual 46º). II. O artigo 75º, n.º 2, alínea b), do CIRC (actual artigo 81º, n. º2 al. b)), não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas. III. Dado o regime especial assim fixado e na ausência de remissão para o regime de limitação da dedutibilidade então fixado pelo n.º 3 do artigo 42.º do CIRC (actual artigo 45º, n.º3), este não é aplicável àquela situação. 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso. Custas a cargo da Recorrente. Porto, 10 de abril de 2025 Irene Isabel das Neves Jorge Costa Celeste Oliveira |