Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01089/15.3BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/21/2016
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:João Beato Oliveira Sousa
Descritores:DOENÇA PROFISSIONAL
Sumário:1 – Nos termos do Artigo 26º do DL 503/99, de 20/11, o diagnóstico e a caracterização como doença profissional e, se for caso disso, a atribuição da incapacidade temporária ou a proposta do grau de incapacidade permanente são da responsabilidade dos serviços médicos do Centro Nacional de Protecção contra os Riscos Profissionais.
2 - Não existe a similitude jurídica invocada pelo Recorrente com a actividade das companhias seguradoras em Direito do Trabalho, que são entidades privadas de índole lucrativa, embora obviamente sujeitas a regulamentação enxameada de normas de interesse público estritamente vinculativas.
3 - No caso, a prerrogativa de avaliação do ISS tem que ser reconhecida pelo menos quanto ao estabelecimento de uma bitola mínima quanto ao grau de dependência da doença profissional relativamente à actividade profissional do trabalhador, para integração do conceito de “consequência necessária e directa da actividade exercida pelo trabalhador e não representem normal desgaste do organismo”.
4 - Por outro lado, a concentração num serviço central – o CNPRP – do diagnóstico e caracterização da doença profissional tem a vantagem de fomentar uma mais perfeita uniformização de procedimentos e critérios, a bem do acesso tendencialmente igualitário de todos os trabalhadores aos benefícios do sistema, em contraponto com a álea que provavelmente existiria se o serviço fosse disseminado por uma enorme diversidade de peritos, juntas médicas ou estabelecimentos de saúde. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:ALN
Recorrido 1:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial Urgente - DL n.º 503/99 - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
ALN veio interpor recurso da sentença pela qual o TAF de AVEIRO julgou improcedente a presente acção administrativa especial, com tramitação urgente nos termos do disposto no artigo 48º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 Novembro, contra INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP, em que peticiona a anulação do acto do Director do Departamento de Protecção contra os Riscos Profissionais, de 12/11/2014, que indefere a pretensão do A. a ver considerada uma patologia que o afecta como doença profissional contraída ao serviço do Município de Aveiro.
Em alegações o Recorrente formulou as seguintes conclusões:

Em conclusão:

a) Pese embora o tempo decorrido entre a agudização da doença exibida pelo recorrente e o fim das funções no serviço camarário em causa, a doença surge, comprovadamente, durante o desempenho das peculiares funções que no dito serviço desempenhou;

b) Os médicos pneumologistas que trataram o autor diagnosticaram-lhe a doença de que ainda hoje padece, admitindo sempre a sua radicação na actividade profissional que o autor exerceu ao serviço do Município de Aveiro;

c) Dos documentos remetidos aos autos pelo Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E./Aveiro decorre que o recorrente foi registado no serviço de urgência por causa de doença no dia 16/10/1997, que no dia 12/9/1999, deu entrada nas urgências por causa de doença constando diagnóstico “asma”, que no dia 8/12/1999, deu novamente entrada nas urgências por causa de doença, tendo realizado exame médico ao tórax, que no dia 12/5/2000, deu mais uma vez entrada na urgência do supra nomeado hospital por causa de doença;

d) Decorrendo dos restantes documentos enviados pelo Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E./Aveiro, que os médicos do Serviço de Pneumologia deste hospital fazem remontar e ligar a doença do recorrente que vinham tratando, àquela que por várias vezes o arrastou até às urgências do mesmo hospital;

e) De onde a situação em apreço, a requerer justiça, é subsumível ao disposto no artigo 25º, do DL nº 503/99, de 20/11;

f) Ainda que tal não se entenda, sempre o douto aresto recorrido padecerá de interpretação desconforme da lei pelas razões que se passam a enunciar;

g) Assim, aduz ainda o douto aresto recorrido que, em relação ao erro na apreciação da etiologia da doença de que o recorrente entendia padecer o acto impugnado, o poder de sindicar do Tribunal estava limitado ao caso de erro grosseiro ou palmar, daqui partindo para a suficiência da fundamentação clínica dos médicos da entidade demandada a qual, necessariamente, tem o valor que têm os pareceres dos serviços clínicos das seguradoras que se opõem à existência de nexo indicador de acidente de trabalho ou doença profissional;

h) Ao ter este entendimento o Tribunal recorrido sentiu-se (indevidamente no entender do recorrente), liberto de conduzir ou conformar o processo no sentido de sindicar qual o caminho correcto, ordenando, no exercício dos poderes de investigação, uma peritagem legal, para a resposta correcta e equitativa;

i) Se a lei quer facultar aos administrados o direito a uma tutela jurisdicional efectiva, então tal tutela não pode sofrer qualquer diminuição em relação àquela que, por exemplo, os tribunais do trabalho fornecem aos trabalhadores, sinistrados ou desvalorizados por doença profissional.

j) Aliás, quanto a estes tribunais está, legal e processualmente, prevista a intervenção de perícias dos serviços de medicina legal as quais podem corroborar, ou não, os pareceres e informações dos serviços clínicos dos demandados, nomeadamente seguradoras;

j) No que respeita a esta vertente do aresto recorrido, afirma o recorrente, com todo o respeito, que configura deficiente interpretação e aplicação do princípio da tutela jurisdicional efectiva constante do artigo 2º do CPTA;

l) Em suma, o douto aresto recorrido faz incorrecta interpretação e aplicação das normas do artigo 25º, do DL nº 503/99, de 20/6, sempre dos artigos 2º do CPTA e 411º do CPC.

Termos em que deverá o presente recurso merecer provimento, revogando-se a douta sentença recorrida, cumprindo-se desta forma a lei e fazendo-se Justiça.


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Contra-alegando o Recorrido formulou, por seu turno, as seguintes conclusões:

A - O Tribunal a quo proferiu a douta sentença no sentido de julgar totalmente improcedente a acção administrativa, absolvendo o ora recorrido do pedido.

B - Sucede que, o ora recorrente considera que a douta sentença, ao decidir pela absolvição do pedido, faz incorrecta interpretação do artigo 25.º, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

C - Não lhe assistindo contudo razão, na medida em que tanto o ora recorrido como o Tribunal a quo limitaram-se a cumprir, em estrita obediência ao princípio da legalidade, e no exercício de poderes vinculados, com o estipulado no regime jurídico estipulado no referido diploma legal.

D - Ora o Recorrente deixou de estar exposto ao risco (alcatrão) desde 2000.

E - O Tribunal a quo ao decidir como decidiu, teve presente a prova testemunhal, os resultados dos exames clínicos (prova documental), e o facto de não ter provado existir nexo de causalidade entre a doença que diz padecer e a sua actividade profissional como cantoneiro.

F - Acresce ainda referir que, o ora Recorrido intervém no processo, mas com uma função essencialmente consultora. Os seus serviços médicos têm apenas como responsabilidade o diagnóstico e a caracterização como doença profissional, mas se for reconhecido grau de incapacidade permanente, um facto que tem de ser confirmado pela Caixa Geral de Aposentações que também é a entidade responsável pelo pagamento de eventuais prestações no âmbito da reparação (n.º 4 do artigo 34.º).

G - Pelo que, bem andou o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, absolvendo o ora Recorrido do pedido.

Termos em que deverá ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a sentença ora recorrida, pois, só assim se fará a costumada,


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O Ministério Público emitiu o douto parecer a fls. 235 e ss do processo físico no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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O Recorrente respondeu ao parecer do MP conforme fls. 241 e ss.

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QUESTÕES A RESOLVER

Os erros de julgamento em matéria de direito imputados ao Tribunal “a quo”, dentro dos limites racionais das conclusões do Recorrente.

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FACTOS

Consta da sentença:

«II. FACTUALIDADE ASSENTE

A). Em 27.07.2011, foi subscrita “participação obrigatória”, pelo Dr. RS, referente ao A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “Doença Profissional (diagnóstico ou suspeita fundamentada): Asma profissional por exposição aos fumos e vapores de alcatrão (…)”. – cfr fls. 1 do processo administrativo;

B). Em 10.11.2011, foi emitido “parecer clínico”, subscrito pelo Dr. RS, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) O trabalhador em causa esteve a aplicar alcatrão durante +- 20 anos, tendo iniciado sintomatologia compatível com asma profissional alguns meses após o início da actividade. Foi (…) e é seguido em pneumologia que tem relatório anexo. (…)” - cfr. fls. 3 do processo administrativo;

C). Em 11.11.2011, a Câmara Municipal de Aveiro emitiu “declaração”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

Ingressou na Câmara Municipal de Aveiro (CMA) como eventual a 02/05/1983, com a categoria de Ajudante de Jardins, tendo ficado desligado a partir de 01/12/1983. A 02/11/1987 reinicia funções na categoria de Servente, tendo exercido, no seu percurso profissional na CMA, as seguintes funções:

- na categoria de Cantoneiro de Vias Municipais a 18/05/1992, as funções inerentes ao conteúdo funcional inserto (…);

- na categoria de Cantoneiro de Limpeza a 20/09/2000, as funções inerentes ao conteúdo funcional (…) até 31/05/2001, data a partir da qual iniciou funções no Sector de Bugas (Bicicletas de Utilização Gratuita de Aveiro);

- na categoria de Vigilante de Parques e Jardins a 01/10/2008, exercendo as funções de vigilante/ porteiro nas instalações dos Armazéns Gerais da Câmara Municipal de Aveiro. (…)” - cfr. fls. 5 do processo administrativo;


*

D). O teor do documento intitulado de “Protecção na doença profissional | Certificação de Incapacidades”, que se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

[imagem omissa]

(…)” - cfr. fls. 7 do processo administrativo;


*

E). Pelo ofício n.º 9758/UCR, de 10.04.2012, sob o “Assunto: Notificação da decisão | Doença profissional – Pneumologia”, cujo teor aqui se dá por reproduzido, o A. foi notificado “(…) de que o requerimento relativo a pensão por incapacidade permanente para o trabalho será indeferido se, no prazo de 10 dias úteis a contar da data de recepção deste ofício, não der entrada nestes serviços, resposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar ao indeferimento, juntando meios de prova se for caso disso.

Os fundamentos para o indeferimento são os a seguir indicados:

Não estar afectado por doença caracterizada como doença profissional ou não ter estado exposto ao risco pela natureza da indústria, actividade ou condições, ambiente e técnicas do trabalho habitual (…). (…)” - cfr. fls. 8 do processo administrativo;

F). O A. endereçou ao Centro Nacional de Protecção Contra os Riscos Profissionais, requerimento, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. fls. 9 do processo administrativo;

G). Pelo ofício n.º 16902/UCR, de 29.06.2012, sob o “Assunto: Resposta à sua carta”, cujo teor aqui se dá por reproduzido, o A. foi notificado que “(…) informa-se que a sua doença foi avaliada a partir da observação médica e dos elementos constantes no seu processo nomeadamente a sua história clínica e profissional. Ainda assim, o perito médico considerou que a sua doença não é de origem profissional.

A carta que nos enviou bem como as declarações apresentadas não acrescentam novos dados clínicos ao seu processo pelo que a mesma foi dada como não procedente. (…)” - cfr. fls. 10 do processo administrativo;

H). Em 27.11.2013, foi subscrita “participação obrigatória” pela Dr.ª CV, referente ao A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “Doença Profissional (diagnóstico ou suspeita fundamentada): Asma ocupacional evoluída para Doença Pulmonar obstrutiva crónica grave (DPOC Grave) e silicose;

Riscos a que está sujeito ou produtos com que trabalha: Doença crónica respiratória profissional por exposição a fumos e vapores de alcatrão;

Outras observações consideradas úteis: agravamento funcional ventilatório grave nos últimos 6 meses (…)”. – cfr fls. 11 do processo administrativo;

I). Com data de 22.01.2014, o A. subscreveu requerimento de “Protecção na Doença Profissional | Pensão por Incapacidade Permanente para o Trabalho” – cfr. fls. 12 do processo administrativo;

J). Com data de 22.01.2014, o A. subscreveu o documento “Dados de Saúde | Anexo”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual constam, além do mais, os seguintes “dados clínicos”: “(…)

[imagem omissa]

(…)”. – cfr. fls. 13 do processo administrativo;

K). Pelo ofício n.º 7475/2014, de 11.03.2014, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o A. foi convocado para avaliação médica. – cfr. fls. 14 do processo administrativo;

L). O teor do documento intitulado de “Protecção na doença profissional | Certificação de Incapacidades”, que se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

[imagem omissa]

(…)” - cfr. fls. 15 do processo administrativo;

M). Pelo ofício n.º 16968/NCR, de 14.07.2014, sob o “Assunto: Notificação da decisão | Doença profissional – Patologia Respiratória”, cujo teor aqui se dá por reproduzido, o A. foi notificado “(…) de que o requerimento relativo a pensão por incapacidade permanente para o trabalho será indeferido se, no prazo de 10 dias úteis a contar da data de recepção deste ofício, não der entrada nestes serviços, resposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar ao indeferimento, juntando meios de prova se for caso disso.

Os fundamentos para o indeferimento são os a seguir indicados:

Não estar afectado por doença caracterizada como doença profissional ou não ter estado exposto ao risco pela natureza da indústria, actividade ou condições, ambiente e técnicas do trabalho habitual (…). (…)” - cfr. fls. 16 do processo administrativo;

N). O A. endereçou ao Centro Nacional de Protecção Contra os Riscos Profissionais, um requerimento com documentos, cujo teor, e dos respectivos documentos, se dá por integralmente reproduzido. - cfr. fls. 9 do processo administrativo;

O). Pelo ofício n.º 29419/NCR, de 12.11.2014, sob o “Assunto: Processo de doença Profissional de ALN - Resposta à sua carta”, cujo teor aqui se dá por reproduzido, o A. foi notificado que “(…) informa-se que a doença do beneficiário em apreço foi avaliada a partir da observação médica e dos elementos constantes no seu processo. Para que uma doença seja considerada como sendo de origem profissional é imprescindível o estabelecimento do nexo de causalidade entre a doença invocada e a exposição a um determinado tipo de risco. Tendo em consideração que o beneficiário se encontra afastado da exposição ao risco não foi possível confirmar o nexo de causalidade entre risco profissional e a sua doença.

A carta que V.Exa. nos enviou não apresenta novos dados clínicos ao processo em referência. Caso o beneficiário pretenda contestar a decisão tomada, deverão ser remetidos novos exames clínicos que justifiquem a pretensão de V.Exas. (…)” - cfr. fls. 18 do processo administrativo e fls. 16 dos autos – suporte físico (acto impugnado);

P). Em 14.11.2011, o Dr. J. Pinto Mendes, elaborou e subscreveu “relatório médico” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

[imagem omissa]

(…)” – cfr. fls. do «envelope» anexo ao processo administrativo;

Q). Em 13.12.2011, o A. realizou “provas funcionais respiratórias” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…) Espirometria

Teór Obs1 %Téor Obs2 %Obs2/Teór

FVC…..[1] 4.30 4.01 93.3 4.00 92.8

FEV1…[1] 3.46 2.80 81.1 3.26 94.3

(…)

FEV1%FVC…..[%] 69.79 81.52

(…)”- cfr. fls. do «envelope» anexo ao processo administrativo;


*

R). Em 13.12.2011, o A. realizou “RX Digital do Tórax” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) No radiograma digital efectuado na incidência de face, observa-se tórax de normal amplitude e simetria.

As regiões hilo-basais são proeminentes, em provável relação com as estruturas broncovasculares locais. Não são aparentes outras imagens parenquimatosas valorizáveis.

As hemicúpulas diafragmáticas são regulares, observando-se discreta obliteração dos fundos de saco costofrénicos, que se admite de natureza residual.

A silhueta cardiovascular tem normal aspecto radiológico. (…)”. - cfr. fls. do «envelope» anexo ao processo administrativo;

S). Em 23.11.2012, a Dr.ª CV subscreveu “relatório médico”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) Portanto, trata-se de uma doença pulmonar obstrutiva crónica de provável etiologia profissional – silicose, com repercussão na qualidade da sua vida diária. (…)” – cfr. fls. 19 e 20 dos autos (suporte físico);


*

T). Em 29.10.2013, o A. realizou «provas funcionais respiratórias» cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

[imagem omissa]*

U). Em 23.11.2012, a Dr.ª CV subscreveu “relatório médico”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

(…)

(…)” - cfr. fls. do «envelope» anexo ao processo administrativo;

V). O teor dos registos constantes do «Diário Clínico – Consulta Externa» do A., na especialidade de pneumologia, com o Dr. GT, que se dá por integralmente reproduzido, com consulta em 03.07.2012; e, com a Dr.ª CV, que se dá, igualmente, por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, que uma primeira consulta do A. em 06.09.2012 e, última em 30.10.2013. - cfr. fls. 118 e 119 dos autos (suporte físico) e fls. do «envelope» anexo ao processo administrativo;

W). Em 24.03.2014, o A. realizou “provas funcionais respiratórias” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…) Espirometria

(…)” - cfr. fls. do «envelope» anexo ao processo administrativo;

X). Em 05.03.2014, o A. dirigiu-se à urgência «medicina», conforme «diário clínico» cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 29 e 30 dos autos (suporte físico);

Y). Em 10.07.2015, o A. realizou “provas funcionais respiratórias” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

(…)” - cfr. fls. 32 dos autos (suporte físico);

Z). O teor dos registos constantes do «Diário Clínico – Consulta Externa» do A., na especialidade de pneumologia, com a Dr.ª CV, que se dão por integralmente reproduzidos e dos quais constam, além do mais, consultas em 09.07.2014, 17.02.2015 e 12.10.2015. - cfr. fls. 31, 33 e 34 dos autos (suporte físico);

AA). O teor dos registos clínicos em «Urgência» referentes ao A., que aqui se dão por integralmente reproduzidos e dos qual consta, além do mais, tratarem-se de “urgência geral”, “urgência ortopedia” e “urgência medicina”, datando o primeiro de 16.10.1997 e que, das demais relevam: em 12.09.1999, diagnóstico “asma”; em 08.12.1999, realizado um “torax” e, por fim, em 07.05.2012, que refere “dor torácica com irradiação dorsal”. – cfr. fls. 96 a 108 dos autos (suporte físico);

AB). O A., de 1987 e até ao ano de 2000, exerceu funções na manutenção e construção de vias municipais. – cfr. depoimento de AS, AM, ML, RF;

AC). Na actividade de manutenção e construção de vias municipais, o A. esteve exposto e inalou fumos/ vapores de alcatrão e sarisca. - cfr. depoimento de AS, AM, ML, RF;

AD). Em 1997 deixou de ser usado alcatrão e passou-se a utilizar betuminoso. - cfr. depoimento de RF;

AE). O A. não sofre de silicose, nem de DOPC grave. - cfr. depoimento da Dr.ª AC;

AF). A A. sofre de asma. - cfr. depoimento da Dr.ª AC;

AG). A inalação de fumos de alcatrão não está descrita na literatura clínica como potenciador de asma agravada no local de trabalho. - cfr. depoimento da Dr.ª AC;

Factos não provados:

Não se provou a inexistência de máscaras e óculos de protecção na execução do trabalho em causa.

O A. sofre de asma profissional.


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DIREITO

Alega o Recorrente que “o douto aresto recorrido faz incorrecta interpretação e aplicação das normas do artigo 25º, do DL nº 503/99, de 20/6, sempre dos artigos 2º do CPTA e 411º do CPC.” Indague-se.

Artigo 25º do DL 503/99, de 20/11

Não são impugnados os factos assentes nem os pressupostos de facto básicos que sustentam a decisão recorrida: Toda a evolução profissional e funcional do Autor; que este sofre de asma; que não sofre de silicose nem de DPOC (doença pulmonar obstrutiva crónica); que não sofre de doença incluída na lista de doenças profissionais aplicável, constante do Decreto Regulamentar 76/2007, de 17 de Julho.

Como o Autor refere de forma cristalina “o núcleo da acção é o de dar resposta à questão sobre a existência, ou não, de nexo de causalidade entre a doença pulmonar do autor e o exercício da actividade profissional de 1987 a 2000, ao serviço do Município de Aveiro”. E continua a ser esse o núcleo do presente recurso, dirigido contra a decisão judicial que respondeu àquela questão pela negativa.

Visto mais de perto, o Autor invoca, como se vê em 33º da petição inicial, que a Administração fez, no caso, uma “errada avaliação dos pressupostos de facto” ao negar a existência de uma conexão entre a doença de que sofre (asma) e a sua actividade profissional, violando assim a disposição do DL 503/99 em epígrafe, que se transcreve:

«Artigo 25.º

Doença profissional

São doenças profissionais as constantes da lista de doenças profissionais publicada no Diário da República e as lesões, perturbações funcionais ou doenças não incluídas na referida lista, desde que sejam consequência necessária e directa da actividade exercida pelo trabalhador e não representem normal desgaste do organismo.»

Começando pela análise da norma, vê-se que tem previsão heterogénea, numa primeira parte de natureza taxativa e estritamente vinculativa (a lista de doenças profissionais) e numa segunda parte, quanto às doenças não incluídas naquela lista, constituída por um conceito indeterminado complexo.

Está em causa apenas o 2º segmento daquela previsão normativa.

O TAF qualifica como imputação de “erro sobre os pressupostos de facto” a impugnação pelo Autor do modo como a Administração, valorou os factos disponíveis à luz desse segmento normativo indeterminado, que aplicou. Entende este TCAN que a situação se enquadra melhor como erro nos pressupostos de direito, ou violação de lei, mas o certo é que essa diferente perspectiva dogmática não provocou, no caso, qualquer distorção significativa na fundamentação da decisão recorrida e, portanto, não se perde mais tempo com o assunto.

Como se disse o Autor sustenta a tese da existência de nexo causal relevante, para efeitos daquele segmento normativo, entre a sua actividade profissional, “particularmente naqueles 13 anos no Serviço de Construção e Manutenção de Vias Municipais” e a doença pulmonar que veio a contrair. Alega, em suma, que padece de “asma profissional”. Para tanto invoca a factualidade constante de A), B), H), J), P), S), T), V), X), AB) e AC) da sentença.

Em contrário, lê-se na sentença:

«Ora, no tocante ao invocado erro nos pressupostos de facto, na sua apreciação o Tribunal está limitado pela aferição da existência, ou não, de erro grosseiro, pois que, nestas situações, está em causa a discricionariedade técnica da Administração, in casu, balizada por conceitos cientifico-médicos que extravasam a ciência jurídica. (…)

Posto isto, a verdade é que da concatenação da prova documental reunida com os esclarecimentos resultantes do depoimento da Dr.ª AC, o Tribunal não vislumbra qualquer erro na valoração da situação clínica do A.. É que, tendo a referida testemunha mencionado, designadamente, que um resultado de «FEV1» próximo de 80% era quase normal e, analisando os resultados dos diversos exames / provas funcionais respiratórias efectuados pelo A. - mesmo tendo em conta que, em 2013, o A. apresentou nessa componente um valor bastante inferior - a verdade é que, à data de apreciação da situação clínica do A., e também posteriormente, o resultado de tal componente «FEV1» era próximo ou superior ao indicado valor referência [cfr. pontos Q), T), W) e Y) do probatório]. (…)

«…importa aferir se a doença de que padece - asma, com agravamento no local de trabalho – pode ser qualificada, em face do citado normativo, como doença profissional.

Com efeito, para que ocorra tal qualificação é necessário que se verifique um nexo causal entre a doença e a actividade profissional, isto é, que seja “…consequência necessária e directa da actividade exercida pelo trabalhador”.

Tal necessita, pois, de comprovação documental e científica que, no caso em apreço, não existe.

De facto, resulta do probatório que a participação de doença profissional que originou o acto impugnado foi feita em 2013 [cfr. ponto L) do probatório], e, nessa data, nas anteriores e nas subsequentes avaliações físicas efectuadas ao A., não há qualquer registo/ elemento de diagnóstico que comprove o nexo causal entre a doença e a actividade profissional alegada “de risco”.

Releve-se, para o efeito, que (i) o A. deixou de exercer tal actividade profissional em 2000, que (ii) em 1997 deixou de ser usado alcatrão e passou a utilizar-se betuminoso e, note-se, que (iii) o primeiro registo de recurso do A. à urgência hospitalar data de 1997, sendo certo que o A. iniciou o exercício desta actividade em 1987 [cfr. pontos AA) a AD) do probatório].

Sendo assim, tendo presente, por um lado, os resultados dos exames/avaliações clínicas efectuadas ao A. e a valoração clínica que dos mesmos foi feita, por outro, o limite de sindicância a que o Tribunal está adstrito na valoração do erro nos pressupostos de facto, o Tribunal, não vislumbra qualquer erro de pressupostos de facto que permita concluir por uma errada subsunção jurídica do normativo em causa.

Destarte, considerando as razões de facto e de direito expendidas, o Tribunal julga inexistir violação, por erro nos pressupostos de facto ou de direito, do disposto no artigo 25º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.»

Ora, esta fundamentação está bem estribada nos factos assentes, sendo certo que todos os indícios e suspeitas de que o Autor poderia estar afectado por doença pulmonar de origem profissional, embora impressivos e escudados em opiniões clínicas respeitáveis, acabaram por não se confirmar perante a avaliação clínica efectuada pela CNPRP, segundo os padrões técnicos utilizados no exercício das suas competências.

O Recorrente, porém, entende que o Tribunal não deveria satisfazer-se com a inexistência de erro grosseiro, e que seria preciso algo mais para lhe permitir sufragar a suficiência (e, subentende-se, justeza) da fundamentação clínica do acto, argumentando que a mesma “tem o valor que têm os pareceres dos serviços clínicos das seguradoras que se opõem à existência de nexo indicador de acidentes de trabalho ou doença profissional”.

Este argumento merece ponderação.

Dispõe-se no DL 503/99, de 20/11:

«Artigo 1.º

Objecto

O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais ocorridos ao serviço de entidades empregadoras públicas.

(…)

Artigo 26º (Qualificação da doença profissional)

1 - O diagnóstico e a caracterização como doença profissional e, se for caso disso, a atribuição da incapacidade temporária ou a proposta do grau de incapacidade permanente são da responsabilidade dos serviços médicos do Centro Nacional de Protecção contra os Riscos Profissionais, adiante designado por Centro Nacional.

2 - A confirmação e graduação da incapacidade permanente são da competência da junta médica prevista na alínea b) do n.º1 do artigo 38.º»

Não existe a similitude jurídica invocada pelo Autor com a actividade das companhias seguradoras em Direito do Trabalho, que são entidades privadas de índole lucrativa, embora obviamente sujeitas a regulamentação enxameada de normas de interesse público estritamente vinculativas.

O Instituto da Segurança Social, I. P. (ISS), onde se integra o CNPRP, é um instituto público de regime especial, nos termos da lei, integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio, que prossegue atribuições do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social (MSESS), sob superintendência e tutela do respetivo ministro.

Ora, o Estado supostamente não prossegue interesses particulares, mas sim o interessa geral de todos os cidadãos e este interesse geral, dependendo das atribuições e tarefas dos seus órgãos, pode exigir o reconhecimento de domínios significativos de discricionariedade técnica, que a fiscalização judicial deve respeitar.

Como referem M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha (Comentário ao CPTA, 3 ed., 469) “o alargamento dos poderes de pronúncia do juiz administrativo, decorrente da possibilidade de emitir pronúncias de condenação dirigidas às autoridades administrativas, não veio alterar o perfil de controlo da legalidade dos actos da Administração pelos tribunais administrativos, que continua a reger-se pelo princípio da separação de poderes (cfr. artigo 3º nº1 CPTA)”. E seguidamente, concordando com Vieira de Andrade (A Justiça Administrativa Lições): “Quando esteja em causa o exercício de um poder discricionário (entendido num sentido amplo como abrangendo a margem de livre apreciação, o preenchimento de conceitos indeterminados e a prerrogativa de avaliação), o juiz não pode, pois, substituir-se à Administração na determinação do sentido concreto da decisão a adoptar, devendo limitar-se a uma condenação genérica ou directiva”.

No caso, a prerrogativa de avaliação do ISS tem que ser reconhecida pelo menos quanto ao estabelecimento de uma bitola mínima quanto ao grau de dependência da doença profissional relativamente à actividade profissional do trabalhador, para integração do conceito de “consequência necessária e directa da actividade exercida pelo trabalhador e não representem normal desgaste do organismo”.

Na verdade, se essa bitola fosse demasiado generosa, reconhecendo-se como doença profissional qualquer patologia minimamente influenciada ou agravada pela actividade profissional, rapidamente se chegaria à ruptura financeira do sistema da Segurança Social e ficaria inviabilizada a sua missão de acorrer aos casos verdadeiramente carentes de apoio que ocorressem futuramente.

Pelo contrário, se essa bitola fosse demasiado elevada, seguramente não cumpriria a missão para a qual o instituto foi configurado.

Por outro lado, a concentração num serviço central – o CNPRP – do diagnóstico e caracterização da doença profissional terá a vantagem de fomentar uma mais perfeita uniformização de procedimentos e critérios, a bem do acesso tendencialmente igualitário de todos os trabalhadores aos benefícios do sistema, em contraponto com a álea que provavelmente existiria se o serviço fosse disseminado por uma enorme diversidade de peritos, juntas médicas ou estabelecimentos de saúde.

Seja como for e secundando a sentença, não se vislumbra que o acto impugnado se encontre viciado por qualquer erro, seja nos pressupostos de facto, seja de direito.

Mais, afigura-se injusta a ideia de que o TAF terá subestimado o princípio da tutela jurisdicional efectiva, furtando-se indevidamente, na opinião do Recorrente, a ordenar oficiosamente uma perícia dos serviços de medicina legal, ao abrigo do artigo 411º do CPC.

Na verdade, não obstante ter reconhecido à Administração um certo grau de liberdade de valoração dos factos para efeito de aplicação do conceito indeterminado em que se resolve a 2ª parte do DL 503/99, o TAF não se eximiu de assentar toda a documentação clínica relevante, mesmo a desfavorável à posição da Administração, nem de ponderar criticamente todos esses factos potencialmente conflituantes. Assim, foi certamente por convicção e não por laxismo que se absteve de ordenar essa diligência probatória, a qual, de resto, o Autor não requereu.

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Pelo exposto improcedem as conclusões do Recorrente e confirma-se a sentença.
Porto, 21 de Outubro de 2016
Ass.: João Beato
Ass.: Helder Vieira
Ass.: Joaquim Cruzeiro