Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02062/15.7BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/19/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:ACIDENTE EM AUTOESTRADA- CANÍDEO- CULPA “IN VIGILANDO”- DANO DA PRIVAÇÃO DO USO.
Sumário:I- Nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 24/2007, em caso de acidente rodoviário em autoestrada, em razão de (i) objetos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem, (ii) atravessamento de animais ou (iii) líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança pertence à concessionária.

II- Para a ilisão da presunção legal mista de culpa e ilicitude, por acidente em autoestrada decorrente do atravessamento de um cão, não basta à concessionária a prova genérica do cumprimento das obrigações do contrato de concessão, nem do bom estado das redes de proteção. A prova da concessionária terá que consistir na demonstração, em concreto, das circunstâncias que levaram ao atravessamento do animal.

III- Provado que o canídeo que se circulava na autoestrada era propriedade do 2.º Réu e que no prédio deste existia uma abertura que permitia ao canídeo sair facilmente para o exterior, mas não tendo a concessionário logrado demonstrar as concretas circunstâncias em que o cão entrou na autoestrada, a mesmo não ilidiu a presunção de culpa e de ilicitude que a onera.

IV- A privação do uso de um veículo sinistrado constitui, de per se, um dano patrimonial indemnizável, por essa privação de uso consubstanciar uma ofensa ao direito de propriedade sobre o veículo e caber ao proprietário deste, no exercício do seu direito de propriedade, optar por usar ou não o veículo, pelo que esse direito indemnizatório apenas está dependente da alegação e prova do número de dias de privação do uso da viatura em consequência do acidente, não dependendo da alegação e prova de que dessa privação emergiram concretos e específicos prejuízos para o lesado.
(Sumário elaborado pela relatora – art.º 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Recorrente:COMPANHIA DE SEGUROS (...)
Recorrido 1:A. e Outros
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1.RELATÓRIO

1.1.COMPANHIA DE SEGUROS (...), S.A., propôs a presente ação administrativa contra a BRISA CONCESSÃO RODOVIÁRIA, S.A. e A., figurando como interveniente principal a COMPANHIA DE SEGUROS 2, S.A., tendo em vista obter a condenação solidária dos Réus a pagar à Autora a quantia de € 5.467,68, acrescida dos juros de mora vincendos, calculados dia a dia, à taxa de juros legal de 4%s, sobre o referido montante de € 5.467,68, desde a propositura da presente ação até integral e efetivo pagamento, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual dos réus.
Para tanto, alega, em síntese, que no exercício da sua atividade celebrou com J., contrato de seguro automóvel, pelo qual assegurou a cobertura de danos próprios sofridos no veículo ligeiro de passageiros, marca volvo, matrícula XX-XX-XX, emergentes de choque, colisão, capotamento, incêndio, raio, explosão, furto ou roubo, conforme consta de documento n.º1 que junta;
Refere que no dia 27/03/2014, pelas 00:30 h, quando o veículo seguro na Autora e conduzido por J., circulava na A4, no sentido Porto-Amarante, a 100/110 Km/hora, ao chegar ao Km 42,525, o seu condutor apercebeu-se da presença de um animal de raça canina, de grande porte, na sua faixa de rodagem, que saltou da berma do lado direito, atento o seu sentido de marcha, em direção ao separador central, completamente desorientado, pelo que, embora tenha tentado, não conseguiu evitar o embate frontal no referido animal e o seu atropelamento;
O referido animal possuía um chip que o permitiu identificar como propriedade do 2.º Réu;
Em consequência do referido embate resultaram danos diversos no veículo, cuja reparação foi orçamentada em € 4.653,48, que a A. pagou à oficina que procedeu à reparação;
A autora pagou ainda ao seu segurado a quantia de €450,00 a título de paralisação do veículo, para além de ter despendido a quantia de € 364,20 na regularização do sinistro.
Entende que o acidente se ficou a dever a culpa dos Réus;
Quanto à 1.ª Ré, o contrato de concessão impõe-lhe a obrigação de assegurar a comodidade e segurança do trânsito naquela autoestrada, para além de ser aplicável ao sinistro o disposto no art.º 12. Da Lei 24/07 , de 18/07, que prevê uma inversão do ónus da prova da culpa pela verificação de acidentes como o ocorrido, incumbindo á concessionária o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança;
Quanto ao 2.º Réu, sendo o mesmo proprietário do animal de raça canina, o mesmo é responsável nos termos do art.º 493.º, n.º 1 do C.C., na medida em que, estando o animal à sua guarda, sobre este recaía o especial dever de vigilância do mesmo, que foi violado;
Conclui que os Réus são solidariamente responsáveis pelos danos sofridos, que totalizam o valor de € 5.467,68, a que acrescem juros e que, se encontra em dívida, pese embora os tenha interpelado para pagamento.
1.2. Citada, a 1.ª Ré contestou, defendendo-se por impugnação e deduziu incidente de intervenção acessória provocada da Companhia de Seguros Fidelidade.
1.3. Citado, o 2.º Réu contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.
Na defesa por exceção alegou a incompetência em razão da matéria do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel para conhecer da presente ação, atento o disposto no n.º1 do art.º 4.º do ETAF.
Na defesa por impugnação, pugnou pela improcedência da ação e pela sua absolvição do pedido, sustentando, em resumo, que a presente ação não tem qualquer fundamento.
1.4. Por despacho de 18/02/2016, foi admitida a intervenção principal provocada da COMPANHIA DE SEGUROS 2, S.A. e ordenada a sua citação.
1.5. A interveniente contestou, alegando, em síntese, que o contrato de seguro celebrado com a 1.ª Ré, vigora com uma franquia de € 750,00 por sinistro, aderindo, quanto ao mais, à contestação apresentada pela 1.ª Ré Brisa.
1.6. Em 02/03/2017 elaborou-se o despacho saneador, no qual se julgou improcedente a exceção da incompetência material do TAF de Penafiel, fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova, e admitiram-se os róis de testemunhas.
1.7. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento.
1.8. Em 24/03/2020 o TAF de Penafiel proferiu sentença cujo segmento decisório é do seguinte teor:
«Pelas razões e fundamentos expostos:
Julga-se improcedente a presente ação relativamente à 1.ª ré e à interveniente, condenando-se a autora nas custas processuais respetivas;
Julga-se parcialmente procedente a presente ação relativamente ao 2.º réu, condenando-se o mesmo a pagar à autora € 4653,48, acrescido de juros de mora, cabendo à autora o pagamento de 1/5 das respetivas custas e ao 2.º réu o pagamento de 4/5.
Registe e notifique.

1.9. Inconformada com a decisão proferida pelo TAF de Penafiel, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões
:
«I. A Recorrente “COMPANHIA DE SEGUROS (...), S.A.” intentou o presente recurso por não concordar com o teor da sentença recorrida, uma vez que a mesma, salvo o devido respeito, não consubstancia a rigorosa aplicação do direito, razão pela qual não concorda com as conclusões retiradas e a decisão proferida, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que faça uma correcta aplicação do direito.
II. Na modesta opinião da Recorrente, a sentença recorrida enferma de um erro ao considerar que a Ré “Brisa Concessão Rodoviária, S.A.” ilidiu a presunção que sobre si recai por força do disposto no artigo 12.º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 24/2007, de l8 de Julho.
III. Por outro lado, a sentença recorrida também enferma de um erro ao não condenar os Réus no reembolso à Recorrente da quantia de € 450,00, referentes à indemnização por privação do uso.
IV. Conforme fundamentação da motivação da sentença recorrida, “a questão é decidir é a de saber se estão reunidos os pressupostos da responsabilidade civil para que a autor possa ser ressarcido, pelos réus, dos danos sofridos na sequência de um embate do veículo segurado com um canídeo na auto estrada de que a 1.ª ré é concessionária”.
V. E, considerou o Tribunal a quo que, quanto a cada um dos réus, ter-se-ia que verificar os seguintes pressupostos: facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade.
VI. Ora, conforme resulta da matéria de fado dada como provada, no que à Recorrida “Brisa” diz respeito, está preenchido o pressuposto legal quanto ao facto, tendo o Tribunal a quo também concluído nesse sentido, dado que “não existiu da parte da 1.ª ré qualquer comportamento no sentido de prevenir o condutor do veículo seguro para a existência do cão que acabou por embater no veículo em causa ou Impedir o embate”.
VII. No que concerne à questão da ilicitude e da culpa, também outra conclusão não poderia resultar que não seja a da sua verificação, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 12.º da Lei n.º 24/2007, de 18 de Julho.
VIII. Face à matéria de facto dada como provada, resultou “provado que o acidente teve como causa o atravessamento de um cão na faixa de rodagem em que seguia o veículo automóvel segurado”, sendo certo que, atento o aludido normativo, caberia à Ré concessionária ilidir a presunção de incumprimento que sobre si recaía,
IX. O Tribunal a quo considerou que a Recorrida concessionária logrou ilidir a presunção que sobre si recaia, na medida em que foi possível imputar a responsabilidade ao Recorrido António M., o que não se pode aceitar.
X. O Recorrido A. é responsável pela produção do acidente, por violação dos deveres de vigilância do canídeo envolvido no acidente, que sobre si impendia, nos termos do artigo 493.º do Código Civil,
XI. Não resultou na matéria de facto dada como provada que o mesmo terá tido alguma influência ou responsabilização na introdução do animal na autoestrada em causa nos presentes autos, pelo que não se poderá aceitar a conclusão de que a responsabilização de um inviabiliza a responsabilização de outro.
XII. No que concerne à introdução do animal na autoestrada apenas se poderá considerar como responsável a Recorrida “Brisa”, pois, era a esta que incumbia prevenir que o mesmo se tivesse introduzido.
XIII. Assim, atente-se no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, de 14 de Setembro de 2018, no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 3 de Maio de 2007.
XIV. É evidente que a Recorrida “Brisa” não logrou, e atento a matéria de facto dada como provada, ilidir a presunção que sobre si recaía.
XV. É à Recorrida “Brisa” que incumbia impedir a introdução e atravessamento do animal na autoestrada em causa, pelo que, não obstante se considerar que existiu responsabilidade do Recorrido A., também terá que se considerar que a Recorrida “Brisa” é responsável na medida em que não impediu o atravessamento do aludido animal na via.
XVI. E não logrou provar que tal atravessamento se deveu a um acto de terceiro.
XVII. Nessa medida, é forçoso concluir que a Recorrida Brisa não logrou ilidir a presunção que sobre si recaia, pelo que a Recorrida “Brisa” e o Recorrido A. são ambos responsáveis, solidariamente, pela produção do acidente, a primeira por violação do cumprimento das obrigações de segurança e o segundo por violação do dever de vigilância do animal.
XVIII. Entendeu o Tribunal que “resulta dos factos provados que o veículo terá estado imobilizado entre 28.03.2014 (dota em que foi efectuado a peritagem) e 08.04.2014 (49 dia útil após ter sido dada ordem para fazer a reparação), ou seja, 12 dias. Não resulta nem da alegação da autora nem da prova apresentada qual o benefício que o proprietário retirava do veículo. Não se sabe, portanto, se existe dano de privação ou não. Como refere o acórdão de 22.09.2017, Proc. 00106/15.18EVIS «A privação do uso é dano indemnizável se a viatura era usada nas deslocações pessoais e profissionais do lesado.»
XIX. Salvo entendimento em contrário, não pode a Recorrente concordar com tal decisão.
XX. Atente-se nos factos provados 18), 19) e 20), para se ter concluir precisamente pelo contrário, dado que o veículo seguro na Recorrente esteve sem poder circular pelo período de um mês, pelo que a Recorrente, conforme decorre da petição inicial e do documento n.º 11 junto com o aludido articulado, indemnizou o segurado no montante de C 450,00 pela privação do uso do aludido veiculo.
XXI. Nos termos do artigo 136.º do Regime do Contrato de Seguro, a Recorrente ficou sub-rogada nos montantes pagos e em todos os direitos da sua Segurada contra as Recorridas.
XXII. Atente-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, em 6 de Novembro de 2012, e no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Junho de 2004.
XXIII. O Segundo viu-se privado do uso do seu veículo pelo período de um mês, como resulta da matéria de facto dada como provada, pelo que a Recorrente indemnizou o mesmo pelo privação do uso do veiculo, na medida em que este dano é autónomo e indemnizável per si.
XXIV. E, estando a mesma sub-rogada nos direitos do seu segurado, devem os Recorridos ser condenados no pagamento do aludido valor, atento a responsabilidade solidária de ambos para a produção do acidente em causa nos presentes autos.
XXV. É forçoso concluir que a produção do acidente se deve aos Recorridos “Brisa” e A., por violação do cumprimento dos deveres de segurança e por violação dos deveres de vigilância, respectivamente, e que o dano da privação do uso do veículo é indemnizável per si, pelo que devem os Recorridos ser condenados no pagamento do aludido valor, devendo a sentença ser substituída por outra que condene a Recorrida “Brisa” e o Recorrido A. no pagamento do valor global de € 5.103,48.
Termos em que o presente recurso deve merecer provimento com todas as consequências legais.»
1.10. A 1.ª Ré Brisa- Concessão Rodoviária, S.A., contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões:

«A. A decisão proferida pelo tribunal “a quo” fez a correta subsunção dos factos ao direito e decidiu em conformidade.
B. A recorrida não pode ser condenada pela prática de qualquer ato ilícito ou pela omissão de qualquer dever suscetível de causar os alegados danos peticionados pela recorrente.
C. Outra não poderia ter sido a decisão, porquanto no processo n.º 1190/16.6BEPNF que correu os seus termos no tribunal “a quo”, foi a recorrida absolvida do pedido, formulado pelo aqui recorrido.
D. A douta sentença proferida nos presentes autos, condenou o recorrido, e bem, à semelhança do que já havia sido o seu entendimento no âmbito do processo n.º 1190/16.6BEPNF em que o recorrido interpôs ação contra a aqui recorrida (respeitando a exceção do caso julgado por efeito positivo decorrente da sentença proferida no referido processo [1190/16.6BEPNF].
E. A recorrida ilidiu a presunção que sobre si recai por força do disposto no artigo 12.º n.º 1 alínea b) da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho. E tal está devidamente fundamentado na douta sentença.
F. A recorrida demonstrou que o facto causador do acidente não lhe pode ser imputável por ser de imputar a um terceiro, in casu ao recorrido, que contribuiu, ainda que de forma negligente, para o surgimento do animal na via.
G. O artigo 493.º do CC prevê uma presunção de culpa que pende sobre os proprietários dos animais e o recorrido era o proprietário do animal no qual a viatura embateu quando circulava na autoestrada concessionada pela recorrida.
H. Também o artigo 502.º do CC estabelece uma responsabilidade pelo risco a cargo dos proprietários dos animais.
I. Ora, demonstrado que o recorrido era proprietário do animal envolvido no acidente na A4, com a viatura (XX-XX-XX) cabe-lhe responder pelos riscos associados.
J. A recorrida demonstrou que, por força do artigo 493.º, n.º 1 do CC o acidente é imputado ao recorrido, devendo considerar-se, por isso mesmo, ilidida a presunção que sobre si recai por força do disposto no artigo 12.º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho.
K. Relativamente à indemnização da quantia de €450,00, a título de privação do uso, andou bem o tribunal “a quo” na decisão tomada, devidamente fundamentada. No que diz respeito à recorrida, tendo ficado demonstrado que, por força do artigo 493.º, n.º 1 do CC a responsabilidade pelo acidente deverá ser imputada ao recorrido, devendo considerar-se, por isso mesmo, ilidida a presunção que recai sobre si, por força do disposto no artigo 12.º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, cai por terra este pedido quanto à recorrida.
L. A recorrida enquanto concessionária demonstrou que tomou todas as medidas ao seu alcance relativamente à matéria de segurança dos veículos que circulam na autoestrada.
M. Foi provado que não havia nenhum defeito nas vedações.
N. Apesar de não ter sido apurado o sítio por onde entrou o animal, a verdade é que tal não era exigível à recorrida. Só após a constatação objetiva da presença do animal e de algum defeito na vedação é que se poderia presumir a violação culposa de um dever de segurança no tráfego por parte da recorrida, o que não se verificou no caso sub judice.
O. O dever da recorrida de manter as vias concessionadas em boas condições de operacionalidade e de segurança é uma obrigação de meios e não de resultado, sendo que “Não lhe é exigível que tenha de assegurar, segundo a segundo, centímetro a centímetro, que em toda e qualquer auto-estrada não exista um obstáculo que possa pôr em perigo, de algum modo, a circulação dos veículos”Vide Ac. do Trib. da Rel. do Porto (Proc. 9720068), de 26.06.97.
P. A recorrida, como se demonstrou, assegurou que a autoestrada se encontrava em perfeitas condições de circulação e que não existia nenhum defeito nas vedações que possibilitassem a entrada do animal.
Q. Efetuou todos os patrulhamentos a que se encontra obrigada.
R. Tendo cumprido todas as obrigações a que se encontra vinculada não pode ser responsável pela ocorrência do sinistro.
S. Acresce, que a inversão do ónus da prova prevista no artigo 12.º da Lei 24/2007, apenas respeita à demonstração do “cumprimento das obrigações de segurança”, em nada afetando a análise da verificação dos demais requisitos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos. Não se trata aqui de qualquer previsão de uma qualquer responsabilidade pelo risco.
T. O próprio artigo 483.º n.º 2 do Código Civil afirma a necessidade de previsão legal expressa para a responsabilização objetiva (pelo risco independentemente de culpa), em resultado de determinado facto.
U. A mera existência de danos no veículo acidentado, só por si, não basta para que se encontre demonstrado o nexo de causalidade adequada entre a ação/omissão de uma qualquer putativa conduta por parte da recorrida e a verificação de tais danos.
V. Nem a recorrente demonstrou, igualmente, a existência de qualquer nexo de causalidade entre o suposto incumprimento dos deveres por parte da requerida e a verificação desses danos.
Nestes termos, nos melhores de Direito, e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, afigura-se que bem andou o tribunal “a quo” em julgar a ação improcedente relativamente à recorrida Brisa Concessão Rodoviária, S.A., devendo, por conseguinte, ser negado provimento à apelação, como é de inteira JUSTIÇA!»

1.11. A interveniente Companhia de Seguros 2, S.A. contra-alegou, mas não concluiu.

1.12. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público, não emitiu parecer.

1.13. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.

2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.

Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

2.2. Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem e que importa resolver, passam por saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento sobre a matéria de direito decorrente de:

a- ter considerado que a Ré Brisa- Concessão Rodoviária, SA, ilidiu a presunção que sobre si impendia por força do disposto no artigo 12.º, n.º1, al. b) da Lei n.º 24/07, de 18/07;
b- não ter condenado os Réus no reembolso à apelante da quantia de €450,00 referentes à indemnização pela privação do uso do veículo que satisfez ao seu segurado.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO

3.1. A 1.ª Instância deu como provados, com interesse para a decisão da causa, os seguintes factos:

«1) A autora celebrou com J. um contrato de seguro do ramo automóvel, titulado pela apólice n.º 2868535, nos termos da qual assegurou a cobertura de danos próprios sofridos no veículo ligeiro de passageiros, marca Volvo, de matrícula XX-XX-XX, emergentes de choque, colisão, capotamento;
Doc. 1 junto com a p.i.
2) No dia 27.03.2014, cerca das 00.30h, o veículo referido circulava na A4, no sentido Porto-Amarante, conduzido por J.;
Docs. 2 e 3 juntos com a p.i.
Depoimento de J.
3) O veículo circulava na hemi-faixa da direita atento o seu sentido de marcha;
Docs. 2 e 3 juntos com a p.i. Depoimento de J.
4) Ao acercar-se do Km 42,525, o condutor apercebeu-se da presença de um animal de raça canina, de grande porte, que saindo da berma à direita ficou parado na sua faixa de rodagem;
Depoimento de J.
5) Ao aperceber-se da presença e trajetória do animal, o condutor tentou evitar o embate, desviando-se;
Depoimento de J.
6) Mas, não consegui evitar o embate frontal e lateral à direita no referido animal;
Depoimento de J.
7) Do embate resultaram danos na parte da frente, lado direito, e lateral direita do veículo: para-choques e parte de baixo, bomba de água, portal do lado direito;
Docs. 2 e 3 juntos com a p.i.; doc. 3 junto com a contestação da 1.ª ré Depoimento de J. e A.
8) Apurou-se que o animal possuía um chip de identificação com o número 620098100649282 (B204276);
Doc. 3 junto com a p.i.; doc. 3 junto com a contestação da 1.ª Ré
9) E que, apesar de registado em nome de J., era propriedade do 2.º réu;
Doc. 4 junto com a p.i.
Declarações de parte
10) No local do sinistro, a estrada configura o final de uma reta, início de uma curva à esquerda, atento o sentido de marcha do veículo;
Doc. 3 junto com a p.i.
11) Tem dois sentidos de trânsito, encontrando-se dividida em quatro hemi-faixas de rodagem, duas em cada um dos sentidos, Porto-Amarante e Amarante-Porto, separadas por um separador central;
Doc. 3 junto com a p.i.
12) Era de noite e no local em apreço não existia iluminação artificial;
Doc. 3 junto com a p.i.
Depoimento de J. e R.
13) Após o acidente descrito, a GNR deslocou-se ao local, tendo elaborado a respetiva participação de acidente de viação, tendo constatado a existência do animal morto na via, bem como de danos no veículo segurado (na frente lado direito e na lateral direita);
Doc. 3 junto com a p.i.
Depoimento de J. e R.
14) Também se deslocou ao local um funcionário da ré;
Docs. 2 a 4 juntos com a contestação da 1.ª ré
Depoimento de J. e L.
15) O proprietário do veículo participou à autora o acidente em causa;
Doc. 2 junto com a p.i.
16) A autora solicitou a realização de uma perícia ao veículo, que teve lugar a 28.03.2014 tendo a sua reparação sido orçamentada em € 4653,48;
Doc. 4 junto com a p.i.
Depoimento de A.
17) Pela reparação do veículo automóvel, a autora pagou à oficina que procedeu à sua reparação, Auto (...), S.A., a quantia de € 4653,48;
Doc. 5 junto com a p.i.
18) A reparação foi determinada a 01.04.2014, necessitando de 4 dias úteis para ser efetuada;
Depoimento de A.
19) Durante cerca de um mês, enquanto procediam à peritagem e à reparação, o veículo ficou impossibilitado de circular;
Depoimento de J.
20) A autora pagou ao segurado a quantia de € 450,00, a título de regularização de indemnização;
Doc. 6 junto com a p.i.
21) A autora pagou pela realização da peritagem ao veículo a quantia de global de € 364,20;
Docs. 7 a 11 juntos com a p.i. Depoimento de A.
22) A 1.ª ré e a interveniente celebraram um contrato de seguro, nos termos do qual esta se comprometeu a pagar o montante relativo a indemnizações que aquela tivesse que pagar no âmbito da responsabilidade civil extracontratual na sua qualidade de concessionária da A4, tendo uma franquia de € 750,00 por sinistro;
Doc. 1 junto com a contestação da 1.ª ré
23) A autoestrada em causa é, constantemente, patrulhada pela 1.ª ré, bem como pela GNR;
Depoimento de R. e A.
24) A 1.ª ré tem organizados serviços de patrulha por turnos garantindo a circulação constante de uma viatura sobre a via;
Depoimento de R., L. e A.
25) Por volta das 22:50 passou uma viatura no local do acidente, tendo passado outra pelas 23:40-23:45;
Docs. 4, a 6 juntos com a contestação da 1.ª ré
Depoimento de R. e A.
26) A autoestrada encontra-se vedada de acordo com o modelo aprovado pelo concedente;
Depoimento de M.
27) As vedações da autoestrada são vistoriadas trimestralmente, tendo a última antes do acidente sido em fevereiro de 2014;
Depoimento de M.
28) No local do acidente a vedação tem 1,10m de altura e duas fiadas de arame farpado, uma em cima e outra rente ao chão, sendo a vedação metálica e de rede progressiva, com malha em baixo de dimensão inferior;
Depoimento de M.
29) O funcionário que de deslocou ao local foi verificar a vedação numa extensão de 150 m para cada lado do local do acidente;
Depoimento de R. e A.
30) No dia seguinte a equipa de obra civil deslocou-se ao local para verificar também a vedação tendo percorrido 500 m para cada lado;
Depoimento de M. e J.
31) O cão atropelado, propriedade do 2.º réu, foi criado numa serralharia que possuía e que acabou por vender, e encontrava-se na casa deste desde janeiro de 2014;
Declarações de parte; depoimento de J.
32) Era um pastor alemão com 60 a 70 Kgs;
Declarações de parte; depoimento de J.
33) O cão encontrava-se solto;
Declarações de parte; depoimento de J. e C.
34) Numa propriedade com cerca de 11 mil m2;
Planta junta na audiência; Fotografias juntas na audiência
Declarações de parte; depoimento de J. e J.
35) A qual estava vedada com vedação com uma altura de cerca de 2 metros;
Fotografias juntas na audiência
Declarações de parte; depoimento de J., J. e C.
36) A vedação é em ferro com cerca 5 mm de grossura;
Fotografias juntas na audiência
Declarações de parte; depoimento de J. e J.
37) Cerca de 60 % da vedação assenta num muro de pedra com cerca de 1 metro de altura;
Fotografias juntas na audiência
Declarações de parte; depoimento de J. e J.
38) A entrada da propriedade tem um portão, que é aberto à mão, e que tem, de cada lado, muro sem a referida vedação;
Fotografias juntas na audiência
Declarações de parte; depoimento de J. e J.
39) O terreno junto ao muro que ladeia o portão de entrada da propriedade tem mais cerca de 50 cms de altura face à restante parte do terreno;
Fotografia 1 junta na audiência
40) A casa fica a 2 ou 3 Kms da autoestrada;
Declarações de parte; depoimento de J.
41) O 2.º réu detetou o desaparecimento do cão cerca de uma semana antes do acidente, tendo procurado o mesmo sem sucesso.
Declarações de parte; depoimento de J. e C.

IV.1.2 – Factos não provados
Inexistem factos com interesse para a decisão da causa, que importe dar como não provados.»
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III. B. DE DIREITO

3.2. Vem o presente recurso de apelação interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo que absolveu a 1.ª Ré dos pedidos formulados pela Autora, ora apelante, e condenou o 2.º Réu a pagar à autora o montante que satisfez ao seu segurado a título de reparação pelos danos sofridos no respetivo veículo em consequência do embate contra um canídeo em plena A4, absolvendo-o do demais peticionado, designadamente, dos montantes relativos ao dano da privação de uso do veículo que satisfez ao seu segurado.

A apelante não se conforma com a decisão recorrida, advogando que a mesma enferma de erro de julgamento ao considerar que a Ré “Brisa Concessão Rodoviária, S.A.” ilidiu a presunção de culpa que sobre si recaía por força do disposto no artigo 12.º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 24/2007, de l8 de Julho, responsabilizando apenas o apenas o 2.ª Réu, com fundamento em culpa in vigilando, nos termos do n.º1 do artigo 493.º do C.Civil e, bem assim, por ter considerar que a mesma também errou ao não condenar os Réus no pagamento da quantia peticionada referente à indemnização por privação do uso do veículo.

Pese embora inicie as suas conclusões de recurso a afirmar que apenas a 1.ª Ré deve ser responsabilizada pela verificação do acidente, finaliza as mesmas conclusões a sustentar que « é forçoso concluir que a produção do acidente se deve aos Recorridos “Brisa” e A., por violação do cumprimento dos deveres de segurança e por violação dos deveres de vigilância, respetivamente, e que o dano da privação do uso do veículo é indemnizável per si, pelo que devem os Recorridos ser condenados no pagamento do aludido valor, devendo a sentença ser substituída por outra que condene a Recorrida “Brisa” e o Recorrido A. no pagamento do valor global de € 5.103,48».
Vejamos.

3.3.A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas, no domínio dos atos de gestão pública, rege-se, no caso, pelo disposto na Lei n.º 67/2007, de 31/12, que aprovou o regime da responsabilidade extracontratual e demais entidades públicas, porquanto este diploma encontrava-se em vigor, em 01 de junho de 2014, data em que ocorreu o acidente sobre que versam os presentes autos.

Nos termos do n.º 5 do art.º 1.º da Lei n.º 67/2007 “As disposições que, na presente lei, regulam a responsabilidade das pessoas coletivas de direito público, bem como dos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por danos decorrentes do exercício da função administrativa, são também aplicáveis à responsabilidade civil de pessoas coletivas de direito privado e respetivos trabalhadores, titulares de órgãos sociais, representantes legais ou auxiliares, por ações ou omissões que adotem no exercício de prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo.

No caso em juízo, esse concreto acidente, deu-se quando o veículo propriedade do segurado da a autora e por si conduzido, no dia 27/03/2014, pelas 00:30 h, ao circular na A4, no sentido Porto-Amarante, a 100/110 Km/hora, ao chegar ao Km 42,525, embora se tivesse apercebido da presença de um animal de raça canina, de grande porte, na sua faixa de rodagem, que saltou da berma do lado direito, atento o seu sentido de marcha, em direção ao separador central, completamente desorientado, e tivesse tentado, não conseguiu evitar o embate frontal com o referido animal e o seu atropelamento, acidente de que em consequência resultaram danos na viatura e danos decorrentes da privação de uso, que a autora adiantou ao seu segurado e de que ora pretende ser reembolsada pelos Réus, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual decorrente da violação dos deveres de vigilância da autoestrada que impendem sobre a concessionária e do dever de vigilância sobre cão que impende sobre o 2.º Ré, enquanto seu proprietário.

Como é entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência administrativa, este tipo de responsabilidade corresponde, no essencial, ao conceito civilístico de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, que tem consagração legal no art.º 483º, n.º 1 do CC, pelo que são pressupostos da mesma a verificação dos seguintes requisitos legais cumulativos: a) a verificação do “facto”, enquanto comportamento ativo ou omissivo voluntário do agente, no sentido de ser controlado ou suscetível de ser controlável pela vontade deste; b) a “ilicitude” desse comportamento ativo ou omissivo do agente, traduzida na circunstância deste violar direitos de terceiros ou disposições legais destinadas a proteger interesses alheios; c) “culposo”, por se afirmar um nexo de imputação entre esse comportamento ilícito, ativo ou omissivo, e a vontade do agente, que o torna merecedor de um juízo de censura ético-jurídica, por essa sua conduta se mostrar desconforme com a diligência que teria tido um homem médio ou um funcionário ou agente típico que se encontrasse nas concretas circunstâncias em que o concreto agente se encontrava quando agiu ou quando omitiu a sua obrigação de agir, não obstante esse dever de ação lhe fosse legalmente imposto; d) a existência de “dano”, isto é a lesão de ordem patrimonial ou moral na esfera jurídica do demandante; e e) a afirmação de um nexo de causalidade adequado entre a conduta ativa ou omissiva do agente e o dano que se verificou ( cfr. Acs. STA de 10/10/2000, Proc. 40576 e de 12/12/2000, Proc. 1226/02, in base de dados da DGSI ).

De particular, na responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas entidades públicas, há a considerar que o art.º 9º da citada Lei n.º 67/2007, estabelece, em sede de ilicitude julgarem-se ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objetivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos (n.º 1), bem como quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no n.º 3 do art. 7º (n.º 2).

Com efeito, deste dispositivo legal resulta que em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, consagra-se um conceito amplo de ilicitude (bem mais amplo do que resulta do n.º 1 do art.º 483º do CC), na medida que para efeitos desta específica responsabilidade é ilícito o ato que viole normas legais sejam constitucionais ou infraconstitucionais, incluindo, regulamentares ou princípios gerais aplicáveis, bem como aquele que viole as regras de ordem técnica e de previdência comum.

Neste sentido já se pronunciava Marcelo Caetano no âmbito da vigência do anterior DL n.º 48.051, ao ponderar que “É necessário, em primeiro lugar, que tenha sido praticado um ato jurídico, nomeadamente um ato administrativo, como um facto material, simples conduta despida do caráter de ato jurídico. O ato jurídico provem por via de regra de um órgão que exprime a vontade imputável à pessoa coletiva de que é elemento essencial. O facto material é normalmente obra dos agentes que executam ordens ou fazem trabalhos ao serviço da Administração. O art.º 6º do DL 48054 contém, para os efeitos de que trata o diploma, uma noção de ilicitude. Quanto aos atos jurídicos, incluindo, portanto, os atos administrativos, consideram-se ilícitos os que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis: quer dizer, a ilicitude coincide com a ilegalidade do ato e apura-se nos termos gerais em que se analisam os respetivos vícios. Quanto aos factos materiais, por isso mesmo que correspondem tantas vezes ao desempenho de funções técnicas, que escapam às malhas da ilegalidade estrita e se exercem de acordo com as regras de certa ciência ou arte, dispõe a lei que serão ilícitos, não apenas quando infrinjam as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis, mas ainda quando violem as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração” ( cfr. Marcelo Caetano, “Manual de Direito Administrativo”, 10ª ed., volo. II, pág. 1125).

No que respeita ao requisito da culpa, é entendimento pacífico que “agir com culpa significa atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo” (cfr. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, 6ª ed., Almedina, pág. 531.).

Na senda deste conceito de culpa e concretizando-o para efeitos de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, estabelece o art.º 10º da Lei n.º 67/2007, que a culpa dos titulares de órgãos, funcionários e agentes deve ser apreciada pela diligência e aptidão que seja razoável exigir em função das circunstâncias ao agente zeloso e cumpridor (n.º 1) e que sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos ilícitos (n.º 2) e que para além dos demais casos previstos na lei, também se presume a culpa leve, por aplicação dos princípios gerais da responsabilidade civil, sempre que tenha havido incumprimento dos deveres de vigilância (n.º 3).

Destarte, resulta deste preceito não só que para efeitos de culpa, a aferição desta deverá ser feita, como sucede na responsabilidade civil extracontratual em geral, de acordo com as concretas circunstâncias especificas do caso concreto em que o agente deixou de atuar, apesar de sobre si impender um dever legal de atuação, ou em que atuou, e tendo em consideração o grau de diligência de um funcionário diligente, zeloso e cumpridor, mas também que em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas é aplicável a presunção de culpa prevista no art.º 493º, n.º 1 do CC, o que desde sempre constituiu entendimento reiterado e pacífico ao nível da jurisprudência administrativa.

Ou seja, sempre que seja intentada ação de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos contra o Estado ou demais entidades públicas, em que o demandante pretenda ser ressarcido por danos patrimoniais e/ou morais provocados por coisa móvel ou imóvel em poder do Estado ou daquelas entidades públicas, com o dever de as vigiar, e com fundamento no incumprimento desse dever, sempre se entendeu ser aplicável a presunção de culpa do n.º 1 do art.º 493º do C.Civil, presumindo-se a culpa do Estado ou dos entes públicos in vigilando sobre essas coisas quando estas provoquem danos a terceiros, o que agora é reafirmado no art.º 10º, n.º 3 da Lei n.º 67/2007, de 31/12, onde inclusivamente se presume que essa culpa é leve ( cfr. Ac. STA. de 09/02/2012, Proc. 035/12; 25/10/2000, Proc. 37510; TCAN de 09/09/2016, Proc. 00507/09.4; 17/11/2017, Proc. 01652/12.4BEBRG, in base de dados da DGSI).

Neste sentido, pronuncia-se Fernandes Cadilha ao ponderar que “o n.º 3 do art.º 10º prevê igualmente uma presunção de culpa leve no caso de incumprimento de deveres de vigilância. A admissibilidade da presunção por aplicação dos princípios gerais da responsabilidade civil” (cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas Anotado”, Coimbra Editora, pág. 103.).

Decorre do que se vem dizendo ser absolutamente pacífico que em todas as ações de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos intentadas contra o Estado ou as demais entidades públicas por atos de gestão pública, em que o demandante pretenda ser indemnizado por danos patrimoniais e/ou não patrimoniais com fundamento em culpa in vigilando, este apenas tem o ónus da alegação e da prova dos factos base da presunção decorrentes do n.º 1 do art.º 493º do CC, para que um vez provados esses factos base da presunção se presuma a culpa do demandado.

Esses factos base da presunção de culpa resumem-se à alegação e prova pelo demandante que: a) o demandado tem em seu poder coisa móvel ou imóvel, com a obrigação de a vigiar; e b) que essa coisa móvel ou imóvel lhe provocou, em consequência direta e necessária de determinado evento em que esteve envolvida, designadamente, queda total ou parcial daquela, estragos.

Em conformidade com o disposto no art.º 350º, n.º 2 do CC, a presunção de culpa a que nos vimos referindo é uma presunção iuris tantum e, por isso, em princípio, ilidível mediante contraprova.

No entanto, impõe-se realçar que conforme resulta da parte final do n.º 1 do art.º 493º do CC, para que o Estado ou as demais entidades públicas demandadas possam validamente ilidir essa presunção de culpa e assim possam furtar-se ao dever indemnizatório que o demandante delas reclama, não se basta a lei com uma mera contraprova, mas antes exige que aleguem e provem factos concretos de onde se extraia que nenhuma culpa houve da sua parte no evento ilícito e presuntivamente culposo e danoso ou que os danos sofridos pelo demandante se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse qualquer culpa sua.

Destarte, a elisão da presunção iuris tantum de culpa que se encontra prevista no n.º 1 do art. 493º do CC, só é feita com a prova do contrário, não se bastando, por isso, a lei com a mera contraprova, ou com a prova de que os danos sofridos pelo demandante se teriam na mesma produzido ainda que o demandado não tivesse agido com nenhuma culpa (Ac. STA de 09/02/2005, Proc. 1758/03, in base de dados da DGSI).

Neste sentido lê-se no aresto do STJ. de 09/07/2009, Proc. 01103/08, in base de dados da DGSI que “a inversão desse ónus aplica-se, por exemplo, àqueles que têm o dever de vigiar coisa móvel ou imóvel em seu poder pois que eles responderão pelos danos que essa coisa provocar, salvo se provarem que nenhuma culpa tiveram ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa da sua parte (art. 493º/1 do CC). (…). O que quer dizer que caberá ao ente público possuidor da coisa demonstrar que empregou todas as providências ao seu alcance para evitar o evento danoso e que este só ocorreu por motivos que lhe escaparam e que não podia controlar – isto é, que o mesmo se deveu a caso fortuito ou de força maior – e, por conseguinte, que ele se teria verificado ainda que não houvesse culpa sua - a este propósito o Ac. STA de 16/03/2004, Proc. 40/04. Nestes casos, ao lesado incumbirá provar apenas a chamada base da presunção entendida como o facto conhecido donde se parte para afirmar o facto desconhecido (arts. 349º e 350ª do CC). Trata-se, porém, de uma presunção que admite prova destinada a contrariar o facto presumido e, consequentemente, que admite a demonstração de que o direito reclamado não existe (presunção iuris tantum – vd. acórdão do STA de 26/03/2009, Proc. 1094/08) (…). Decorre da citada presunção que quem tem o dever de vigiar a coisa que provocou os danos responde por eles, salvo se provar que não teve culpa na sua produção ou que eles se teriam produzido independentemente de culpa sua.

Quanto ao nexo de causalidade a jurisprudência do STA tem considerado que à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas se aplica o artigo 563º do CC.

3.4.No caso, considerando que estamos perante um acidente de viação ocorrido numa via classificada como autoestrada, provocado pelo atravessamento de animais, há que convocar o regime plasmado na Lei 24/2007, que conforme previsto no seu art.º 1.º « define direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como autoestradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares e estabelece, nomeadamente, as condições de segurança, informação e comodidade exigíveis, sem prejuízo de regimes mais favoráveis aos utentes estabelecidos ou a estabelecer».

No art.º 12.º da referida Lei prescreve-se que:
«1 - Nas autoestradas, com ou sem obras em curso, e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respetiva causa diga respeito a:
a) Objetos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem;
b) Atravessamento de animais;
c) Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, a confirmação das causas do acidente é obrigatoriamente verificada no local por autoridade policial competente, sem prejuízo do rápido restabelecimento das condições de circulação em segurança.
3 - São excluídos do número anterior os casos de força maior, que diretamente afetem as atividades da concessão e não imputáveis ao concessionário, resultantes de:
a) Condições climatéricas manifestamente excecionais, designadamente graves inundações, ciclones ou sismos;
b) Cataclismo, epidemia, radiações atómicas, fogo ou raio;
c) Tumulto, subversão, atos de terrorismo, rebelião ou guerra».

Resulta deste preceito legal que, em caso de acidente rodoviário em autoestradas, em razão de (i) objetos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem, (ii) atravessamento de animais ou (iii) líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança pertence à concessionária. Subjacente ao ónus da prova do cumprimento das obrigações a cargo da concessionária, está a circunstância de apenas esta deter os conhecimentos e os meios técnicos e humanos aptos à prossecução dos deveres e obrigações que lhe são impostas, sendo a única que pode, de facto, controlar e atenuar as fontes de perigo, cabendo-lhe, por isso, o ónus de provar que cumpriu todos os deveres e procedimentos fulcrais para garantir a circulação normal e segura na via concessionada. Desta previsão legal resulta que a concessionária de uma autoestrada em que se verifique um sinistro rodoviário causado por objetos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem, atravessamento de animais e líquidos na via, neste último caso quando não resultantes de condições climatéricas anormais, está onerada com uma presunção de incumprimento das obrigações de segurança que lhe cabe observar. Este artigo veio pôr fim à polémica doutrinal e jurisprudencial que previamente à publicação da Lei 24/2007, existia sobre a natureza da responsabilidade civil dos concessionários de autoestradas. Existiam, então, três teses, a saber: (1) Uma que considerava que a responsabilidade da concessionária, era contratual, colocando-a na veste de devedor da prestação de serviço proporcionado ao utente (com velocidade legal e segurança), fazendo impender sobre si a presunção de culpa do art.º 799.º, n.º 1, do Código Civil; outra que sustentava ser tal responsabilidade civil extracontratual, o que implicava caber ao lesado a prova da culpa do autor da lesão; uma terceira, que considerava que a responsabilização da concessionária assentava no facto de ter à sua guarda coisa imóvel, o que, ainda aí, remeteria para a sua culpa presumida, por ser aplicável a regra do art.º 493.º, n.º 1, do Código, entendendo-se que esta norma estabelece uma inversão do ónus de prova quanto ao requisito culpa, competindo, por isso, à concessionária provar que agiu sem culpa. Esta discussão ficou de algum modo desvalorizada pela publicação da Lei n.º 24/2007 de 18/7, na medida em que este diploma legal definiu os direitos dos utentes das vias rodoviárias classificadas como autoestradas concessionadas.

3.5. Assente nas mencionadas premissas, revertendo ao caso dos autos, a 1ª Instância considerou, quanto à 1.ª Ré, que por força do disposto no artigo 1.º, n.º 5 da Lei 67/2007, de 31/12, a mesma está submetida às normas aplicáveis à responsabilidade civil das entidades públicas, dependendo a sua responsabilidade da verificação dos mesmos pressupostos que se encontram previstos no artigo 483.º Código Civil. Quanto aos pressupostos da culpa e da ilicitude, tomou em consideração o regime da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, concretamente, o art.º 12.º , e entendendo estarem verificados os elementos que permitem acionar o referido artigo 12.º da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, depois de esclarecer que não é à autora que cabe alegar ou provar a ilicitude e a culpa da atuação da ré, mas antes a esta última que cabe ilidir a presunção que sobre si recai, conclui que a 1.ª ré conseguiu ilidir a presunção de incumprimento do artigo 12.º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho. Apoiou-se, para o efeito, em jurisprudência que cita, de acordo com a qual uma das formas de ilidir essa presunção é a prova de que é imputável a um terceiro o facto danoso que se produziu de uma forma incontrolável pela concessionária. E ponderando, que o 2.º réu é o proprietário do cão, que o mesmo se encontrava na sua propriedade, que existe uma parte da propriedade do mesmo que não está vedada, que permitia que o animal facilmente saísse para o exterior, saltando do terreno para o muro junto ao portão e deste para o exterior, e que aquele, em sede de contestação, não alegou factos bastantes que permitissem ilidir a presunção de culpa in vigilando que sobre si impendia por força do artigo 493.º, n.º 1 do CC, concluiu pela responsabilidade do 2.º réu pelos danos sofridos, provocados pela colisão entre o veículo do segurado da autora/apelante e o cão deste, e que essa situação de culpa in vigilando do 2.º réu afasta a presunção que recai sobre a 1.ª ré, sendo, portanto, de julgar improcedente a ação relativamente a esta e à interveniente.

Quanto aos danos peticionados, absolveu as Rés do pedido de pagamento da quantia avançada pelo apelante ao seu segurado a título de privação do uso de veículo, por, na linha de jurisprudência que cita, pese embora se tenha provado que o veículo terá estado imobilizado entre 28.03.2014 (data em que foi efetuada a peritagem) e 08.04.2014 (4º dia útil após ter sido dada ordem para fazer a reparação), ou seja, 12 dias, não resulta quer da alegação da autora, quer da prova apresentada qual o benefício que o proprietário retirava do veículo, pelo que, assim, fica-se sem saber se houve ou não dano de privação ou não.

3.6.Observe-se desde já que, considerando os factos que foram dados como provados e que não vêm impugnados por nenhuma das partes, o quadro legal aplicável e o sentido da jurisprudência, que pode considerar-se firme e consolidada dos tribunais superiores, designadamente, dos que integram a jurisdição administrativa e fiscal, e, adiante-se, também o entendimento que temos professado em alguns acórdãos que relatamos, a sentença proferida pelo Tribunal a quo embora tenha procedido a uma cuidada análise dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual das concessionárias, designadamente, do regime instituído pela Lei n.º 24/2007, decidiu erradamente quanto considerou que a 1.ª Ré viu afastada a presunção de culpa e de ilicitude que sobre si impendia por força do art.º 12.º da Lei n.º 24/2007 na medida em que em que foi possível imputar a responsabilidade do acidente ao 2.º Réu M., por aquele não ter logrado afastar a sua culpa in vigilando.

3.7. Note-se que o 2.º Réu não interpôs recurso da sentença recorrida.
A autora começa por suscitar o erro de julgamento em que incorreu a 1.ª Instância ao decidir absolver a 1.ª Ré dos pedidos formulados, por considerar que aquela conseguiu afastar a presunção de culpa e de ilicitude constante da al. b), n.º1 do artigo 12.º da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho que sobre si impendia.

A elisão da presunção legal mista de culpa e ilicitude, por acidente em autoestradas decorrentes do atravessamento de um animal, como se verificou no caso, incumbe às concessionárias. Isso mesmo é preconizado por abundante, sólida e reiterada jurisprudência (vide, entre outros, o Ac. do STJ de 09.09.2008, proc. n.º 08P1856, in www.dgsi.pt). Porém, não se olvida que a densidade do ónus probatório da concessionária variará em função das causas do acidente.

No que respeita ao atravessamento de animais, quer a jurisprudência, quer a doutrina têm reconhecido um grau de exigência elevado às concessionárias para o afastamento da presunção, não bastando a prova genérica do cumprimento das obrigações do contrato de concessão nem do bom estado das redes de proteção. A prova da concessionária terá que consistir na demonstração, em concreto, das circunstâncias que levaram ao atravessamento do animal. Recorrendo às acutilantes palavras do Supremo Tribunal de Justiça, em cuja posição nos revemos integralmente: “Para afastar a presunção de incumprimento que sobre si impende, deveria pois a R. provar, em concreto, que o canídeo surgiu de forma incontrolável para si ou foi colocado na autoestrada, negligente ou intencionalmente, por outrem. Isto é, sempre que há um acidente devido a um cão (ou outro animal) que se introduziu numa autoestrada, presume-se o incumprimento da concessionária. Esta só afastará essa presunção se demonstrar que a intromissão do animal na via, não lhe é, de todo, imputável, sendo atribuível a outrem. Ou, como se refere no acórdão de 22-6-2004, “terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que lhe não deixou realizar o cumprimento”.

Afigura-se-nos ser esta posição a mais equilibrada e justa, já que, de contrário, considerando-se suficiente a prova genérica de que a concessionária de autoestrada cumpriu as obrigações decorrentes do contrato de concessão, acabaria por se colocar nos ombros do lesado a produção de uma prova que se revelaria de todo difícil, ou até impossível, de fazer. Nos acidentes com animais (ou com outros objetos) em autoestradas, reafirma-se, quem mais facilmente pode provar a proveniência do animal (ou objetos) é a concessionária. Só ela tem, pode ou deve ter, os meios idóneos à monitorização do tráfego, da circulação viária e da segurança, meios que lhe devem permitir detetar a introdução na via de animais ou de objetos nocivos à circulação automóvel. O utilizador da via depara-se com a óbvia e notória dificuldade natural em recolher meios ou elementos de prova. Não pode, como é notório, permanecer na autoestrada com vista a determinar a causa da introdução do animal aí, nem sequer tem, normalmente, equipamentos técnicos de recolha de prova.

No caso embora a 1.ª R., tenha efetuado a demonstração genérica de ter cumprido as suas obrigações de vigilância e de conservação das redes laterais da via, a verdade é que não conseguiu impedir que o cão do 2.º Réu tivesse entrado na autoestrada que lhe estava concessionada. O facto de se ter provado que o cão que se circulava na A4 no momento em que por ali passava o veículo segurado na Autora, pertencia ao 2.º Réu, e que aquele tinha no seu prédio uma abertura que permitia que o cão facilmente saísse para o exterior, com o que violou o seu dever de vigilância sobre o referido animal, pelo que não logrou ilidir a presunção de culpa do n.º1 do art.º 493.º do CC, não é causal do acidente verificado na A4.

Na verdade, uma coisa é a omissão do dever de cuidado por parte do 2.º Réu e outra coisa é a omissão do dever de cuidado por parte da concessionária em relação à autoestrada. Caso o acidente se tivesse verificado numa via pública aberta ao trânsito situada em frente ou nas imediações do local onde o animal era guardado e de onde se escapuliu e em que não houvesse qualquer dever de vigilância que impusesse à autoridade pública responsável pela estrada onde esse acidente veio a eclodir, a responsabilidade de impedir que pela mesma deambulassem animais, sem dúvida alguma que, nessa particular situação, o incumprimento do dever de vigilância do proprietário do canídeo seria causal do acidente.

No entanto, não é essa a situação sobre que versam os presentes autos, em que o acidente se veio a dar numa autoestrada concessionada em que sobre a concessionária impendem especiais e específicos deveres de vigilância. E foi o incumprimento, melhor dizendo, o não afastamento da presunção de ilicitude e de culpa por parte daquela, em como cumpriu esses deveres de vigilância, que foi causal do acidente. Na verdade, independentemente, do proprietário do canídeo ter cumprido, no caso incumprido o dever de vigilância sobre o canídeo, este escapuliu-se do local onde se encontrava e logrou introduzir-se na autoestrada concessionada à Brisa, sem que esta tivesse demonstrado que cumpriu cabalmente o dever de vigilância que sobre si impendia em relação à autoestrada, que a obrigava a mantê-la livre e desimpedida de todo e qualquer animal, fosse selvagem, doméstico, propriedade ou não de terceiro e independentemente desse terceiro ter ou não cumprido os deveres de vigilância sobre o animal doméstico, in casu, um canídeo, sua propriedade.

Em síntese, o acidente sobre que versam os autos contrariamente àquela que é a posição a 1.ª Instância não eclodiu por via do proprietário do canídeo ter incumprido o seu dever de vigilância mas porque a concessionária não cuidou em demonstrar em como tivesse cumprido o seu dever afastando assim a presunção de ilicitude e culpa que sobre ela recaía e foi esse presuntivo incumprimento que foi o causal do acidente, independentemente do proprietário do canídeo ter ou não cumprido com o seu. Isto é, ainda que o proprietário do canídeo não tivesse cumprido com o seu dever de vigilância, que não cumpriu, o acidente que se veio a verificar traduzido na colisão entre o veículo automóvel do segurado da apelante e o canídeo em plena autoestrada, não se teria verificado, caso a Brisa tivesse cumprido com o seu dever de vigilância presuntivamente incumprido.

De resto, porque assim é, no caso nem sequer ocorre qualquer situação de concausalidade entre o incumprimento do dever de vigilância por parte do dono do canídeo e o incumprimento do dever de vigilância por parte da concessionária Brisa para a eclosão do acidente mas antes, conforme aqui se reafirma, o que há é uma causa única para o eclodir do concreto acidente sobre que versam os presentes autos, que se traduz na circunstância da Concessionária presuntivamente não ter cumprido com o seu dever de vigilância sobre a autoestrada. Porque assim é, podia-se, inclusivamente, questionar da bondade da decisão condenatória do proprietário do cão em pagar os créditos reclamados nos autos pela autora.

No entanto, porque este não impugnou essa sua condenação, sequer em sede de recurso essa condenação não vem questionada por quem quer que seja, pretendendo unicamente a apelante obter também a condenação da concessionaria Brisa, estando, por isso, a sentença sob sindicância quanto à condenação do proprietário do veículo transitada em julgado essa condenação encontra-se subtraída ao âmbito de cognição do Tribunal ad quem a quem resta verificar se ao não ter condenado a apelada Brisa, a sentença recorrida incorreu ou não no erro de direito que a apelante lhe imputa.

Ora, conforme resulta de tudo quanto se vem dizendo, essa resposta não pode deixar de ser positiva uma vez que esta não logrou ilidir a presunção de ilicitude e de culpa, ou seja, a presunção de incumprimento do dever de vigilância que sobre si recai em relação à autoestrada e que foi causal do acidente, pelo que nos termos do artigo 483.º do C.Civil terá de ser condenada solidariamente com o proprietário do canídeo ( condenação esta subtraída ao âmbito de cognição deste TCAN e transitada em julgado), pelos danos patrimoniais que emergiram em consequência direta e necessária da colisão entre veículo segurado e canídeo.

Neste sentido, veja-se o Acórdão proferido pelo STJ de 09.09.2008, proc. n.º 08P1856, no qual se obtempera que, para além do caso de força maior, “apenas a demonstração em concreto das circunstâncias que levaram a intromissão do animal na via é que poderão conduzir a um juízo conclusivo de que ela não deixou de realizar o cumprimento das suas obrigações. Só assim estabelecerá “positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que lhe não deixou realizar o cumprimento”. Em sentido idêntico, veja-se o Ac. do STJ de 06.09.2008, proc. n.º 08A2094, mas também o Ac. do STJ de 14.03.2013, proc. n.º 201/06.8TBFAL.E1S1; acórdãos deste TCAN, de 04.12.2015, proc. n.º0037/13.9BEPRT; de 30.11.2017, proc.00951/14.5BEBRG
Pelo exposto, impõe-se julgar procedente o assacado erro de julgamento e revogar a decisão recorrida na parte impugnada.

b.2. Da absolvição do pedido de pagamento dos danos decorrentes da privação de uso de veículo.

No presente recurso não se questiona a quantia já fixada no montante de €4653,48 relativa aos danos sofridos pela viatura, mas apenas a peticionada em relação ao dano da privação de uso de veículo, que não foi reconhecido pela sentença sob sindicância mas em relação ao qual a apelante imputa erro de direito.

Na sentença recorrida pode ler-se a seguinte fundamentação para a decisão de absolvição da condenação dos réus do pagamento da quantia peticionada pela apelante, a título de indemnização pelos danos sofridos pelo seu segurado decorrentes da privação de uso de veículo e que consideramos oportuno transcrever:
«A autora peticiona ainda o montante de € 450,00 entregues ao segurado, se bem se percebe pela alegada privação do veículo.
Quanto à privação do veículo, o acórdão da Relação de Coimbra de 10.09.2013, Proc. 438/11.8TBTND.C1, cujo sumário se transcreve, refere que:
1. Na reparação do dano consistente na privação do uso do veículo por parte do lesado, em consequência de um sinistro rodoviário, podem equacionar-se duas distintas situações:
- uma delas em que se apura a concreta existência de despesas feitas pelo lesado em consequência dessa privação, como será por exemplo o caso mais comum em que o lesado se socorre do aluguer de veículo de substituição, contratando esse aluguer junto de empresas do ramo;
- uma outra situação em que não se apuram gastos alguns mas apenas que o lesado utilizava o veículo nas suas deslocações habituais (para fins profissionais ou de lazer) e que não lhe foi facultada pelo lesante viatura de substituição, tendo o mesmo ficado, por isso, impedido de fazer essas deslocações ou tendo o mesmo continuado a fazê-las socorrendo-se para o efeito de veículos de terceiros familiares e amigos que, a título de favor, lhe cederam por empréstimo tais veículos.
2. Na primeira das apontadas situações, o lesado tem direito à reparação integral dos gastos/custos que teve por via da dita privação.
3. Já na segunda, a medida da indemnização terá que ser encontrada com recurso à equidade, pois que deve concluir-se pela existência de um dano que se traduziu na impossibilidade do lesado o utilizar nas suas deslocações diárias, profissionais e de lazer, havendo que encontrar em termos quantitativos um valor que se mostre adequado a indemnizar o lesado pela paralisação diária de um veículo que satisfaz as suas necessidades básicas diárias.
4. A apreciação dos danos de natureza não patrimonial tendo de assentar na respectiva gravidade, deve medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias concretas) e, para serem merecedores da tutela do direito, devem ser de tal modo graves que justifiquem a concessão da indemnização pecuniária ao lesado.
Resulta dos factos provados que o veículo terá estado imobilizado entre 28.03.2014 (data em que foi efetuada a peritagem) e 08.04.2014 (4º dia útil após ter sido dada ordem para fazer a reparação), ou seja, 12 dias. Não resulta nem da alegação da autora nem da prova apresentada qual o benefício que o proprietário retirava do veículo. Não se sabe, portanto, se existe dano de privação ou não.
Como refere o acórdão de 22.09.2017, Proc. 00106/15.1BEVIS «A privação do uso é dano indemnizável se a viatura era usada nas deslocações pessoais e profissionais do lesado.»

Ora, nada disso resulta da alegação nem dos factos provados.»

A apelante não se conforma com esta decisão, e ao invés, sustenta que lhe assiste o direito a ser reembolsada dos montantes que despendeu a esse título.

Vejamos.
Precise-se que a indemnização pelo denominado dano da privação do uso de viatura não tem merecido tratamento uniforme na doutrina e na jurisprudência, surpreendendo-se uma clivagem entre aqueles que defendem que este dano pode assumir natureza de dano patrimonial ou não patrimonial, conforme se projete numa ou noutra das esferas jurídicas do lesado (cfr.Acs. do TRG de 27/10/2016, Proc. 224/14.3T8FAF.G1; RC. de 06/02/2018, Proc. 189/16.7T8CDN.C1, in base de dados).

Acresce que mesmo entre aqueles que reconhecem a natureza de dano patrimonial ao dano da privação de uso assiste-se a novo dissenso.
Na verdade, entre aqueles que aceitam a natureza patrimonial deste concreto dano, assiste-se a uma corrente que defende para que exista direito à indemnização pelo dano da privação do uso da viatura sinistrada, não basta a alegação e prova da privação do uso desta, mas é ainda necessária a prova específica de que dessa privação do uso resultou um autónomo ou específico dano patrimonial para o lesado - trata-se do entendimento doutrinário e jurisprudencial tradicional que assenta este entendimento no comando do art.º 562º do CC, sustentando que ao dever de indemnização não basta que o evento seja suscetível de, em abstrato, produzir danos ao lesado, mas é necessária a prova dos concretos e específicos danos sofridos.

Já outra corrente considera que embora a privação do uso de um veículo sinistrado constitua um dano patrimonial indemnizável, por se tratar de uma ofensa ao direito de propriedade sobre aquele, propugna que à indemnização desse dano pela privação do uso não chega a alegação e prova da privação, mostrando-se ainda necessário que o autor alegue e prove que pretendia usar a coisa, ou seja, que dela pretendia retirar as utilidades (ou algumas delas) que esta normalmente lhe proporcionaria se não estivesse dela privado pela atuação ilícita do lesante (Neste sentido, Acs. STJ. de 18/11/2008, Proc. 08B2732, RP de 03/05/2011, Proc. 2618/08.6TBOVR.P1, in base de dados da DGSI ).

No entanto, uma última corrente que, cremos, ser atualmente maioritária e à qual aderimos, sustenta que a privação do uso de um veículo sinistrado constitui um dano patrimonial indemnizável por se tratar de uma ofensa ao direito de propriedade e caber ao seu proprietário optar livremente utilizá-lo ou não (art. 1305º do CC), uma vez que esse direito de dispor e de usar do veículo é inerente ao direito de propriedade detido pelo proprietário sobre a viatura sinistrada e, inclusivamente, é-lhe assegurado e reconhecido pelo art.º 62º da CRP, devendo a privação desse uso ser economicamente valorizável, se necessário, com recurso à equidade.

Nesta perspetiva, que é a nossa, “o simples uso constitui uma vantagem suscetível de avaliação pecuniária, pelo que a sua privação constitui naturalmente um dano” (cfr. Menezes Leitão, “Direito das Obrigações”, vol. I, 4ª ed., Almedina, pág. 317; No mesmo sentido Abrantes Geraldes, “Temas de Responsabilidade Civil – Indemnização do Dano da Privação do Uso”, 2ª ed., Almedina), de natureza patrimonial, indemnizável, ou dito por outras palavras, o proprietário privado por um terceiro do uso de uma coisa tem, por esse simples facto e independentemente da prova cabal da perda de rendimentos que com ela obteria, direito a ser indemnizado por essa privação, indemnização essa a suportar por quem leva a cabo a privação em causa e ao lesar, assim, o direito de propriedade sobre a coisa, retirando-lhe a livre disponibilidade sobre a mesma.

Conforme se pondera no aresto do STJ. de 09/03/2010, “quando a privação do uso recaia sobre um automóvel, bastará que resulte dos autos que o seu proprietário o usaria normalmente (o que na generalidade das situações concretas constituirá um facto notório ou poderá resultar de presunções naturais a retirar da factualidade provada) para que possa exigir-se ao lesante uma indemnização a esse título, que corresponderá, regra geral, ao custo do aluguer de uma viatura de idênticas características, mesmo que o lesado não tenha recorrido ao aluguer de um veículo de substituição, uma vez que bem pode acontecer que não tenha disponibilidades económicas para isso, sem que tal signifique que não sofreu danos ou prejuízos pela privação do seu veículo. Não necessita, por isso, de provar direta e concretamente prejuízos efetivos, como, por exemplo, que deixou de fazer esta ou aquela viagem de negócios ou de lazer, que teve de utilizar outros meios de transporte (táxi, transportes públicos, etc.) com o custo correspondente. Tudo isso estará abrangido pela privação do uso do veículo a ressarcir nos termos referidos ou, em última análise, se necessário, segundo critérios de equidade, sem prejuízo de se poder, evidentemente, alegar e provar outros danos emergentes ou lucros cessantes” (Neste sentido Acs. STJ. de 28/09/2011, Proc. 2511/07.8TACSC.L2.S2; 06/05/2008, Proc. 08A1279; RL. de 21/05/2009, Proc. 1252/08.3TBFUN.L1; 20/12/2017, Proc. 1817/16.0T8LSB.L1-2, in base de dados da DGSI).

Deste modo, estando apurado, no caso, que a autora solicitou a realização de uma perícia ao veículo, que teve lugar no dia 28.03.2014 (ponto 16), que a reparação foi determinada a 01.04.2014, necessitando de 4 dias úteis para ser efetuada (ponto 18) e que durante cerca de um mês, enquanto procediam à peritagem e à reparação, o veículo ficou impossibilitado de circular (ponto 19) impende sobre o apelado/2.º Réu a obrigação de indemnizar pelo dano da privação do uso desse veículo durante o período que decorreu entre o dia 28.03.2014 ( data em que foi efetuada a peritagem) e o dia 08.04.2014 ( 4.º dia útil após ter sido dada ordem para fazer a reparação), ou seja, 12 dias.

A propósito do quantum indemnizatório diário devido ao apelante pela privação do uso do veículo do seu segurado, que aquela lhe satisfez, Menezes Leitão preconiza que essa quantia indemnizatória pode ter como referencial o valor locativo do veículo ( cfr. ob. cit).

No entanto, a indemnização pela indisponibilidade do veículo não deverá ser pautada, em termos estritos e exatos, pelo preço de aluguer praticado pelas empresas de aluguer de veículos automóveis para uma viatura da mesma classe da acidentada, dado que nesse preço/dia de aluguer estão necessariamente contempladas as despesas de exploração da empresa de aluguer e o lucro do empresário.

Segundo Paulo Mota Pinto “…o dano da privação do uso deverá ser quantificado em valor que pode ser obtido de uma das duas formas: ou (como de “cima para baixo”) a partir dos custos de um aluguer durante o lapso de tempo em causa, “mas depurados” (…), excluído o lucro do locador e custos gerais como os gastos com a manutenção da frota, as provisões para períodos de paragem dos veículos, as amortizações, etc.”, concretizando que “no direito alemão os valores constantes das referidas tabelas rondam cerca de um terço dos custos do aluguer normalmente praticados; ou (como “de baixo para cima”), designadamente, a partir dos custos de capital imobilizado necessário para obter a disponibilidade de um bem, como aquele durante o período de tempo necessário (por ex. os custo necessários para constituir uma reserva de um bem, como o que está em causa)”- (cfr. Paulo Mota Pinto, “Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo”, vol. I, Almedina, pág. 592.)

Já segundo Maria da Graça Trigo, “…o valor locativo há-se servir como teto máximo para efeitos indemnizatórios”; “Até esse montante, o juiz deverá encontrar um valor equitativo ad hoc” ( cfr. Maria da Graça Trigo, “Responsabilidade Civil – Temas Especiais”, Almedina, 2015, pág. 64.).

Cientes que a indemnização diária pela privação do uso da viatura deverá ser fixado por recurso à equidade (n.º 3 do art. 566º do CC), tendo por referência o valor locativo cobrado pelas empresas de rent a car para uma viatura de características iguais/semelhantes às da viatura do segurado do apelante, deduzidos dos valores corretivos, com vista a subtrair-se os custos de exploração da empresa de aluguer e o lucro desta, no caso, atendendo à importância reclamada, ou seja, 450,00€ pela privação do uso do veículo, durante, pelo menos, 12 dias, e dos preços que são cobrados pela empresas de rent a car, que, como é do conhecimento geral da vida, sendo, por isso um facto, um facto notório, a quantia de 37,50€ dia para um veiculo com as característica do veículo sinistrado, da marca Volvo, não é desajustada.

Aliás, não é despiciendo considerar que se trata do montante que foi antecipado pela apelante ao seu segurado e que sendo a apelante uma seguradora, a mesma está bem ciente da adequação dos montantes a pagar a esse titulo em face das regras de mercado, pelo que, também por esse prisma se impõe considerar o montante peticionado a esse título, não pode deixar de ser considerado equilibrado.

Aqui chegados não se deixar de concordar com a apelante quando pretende que o dano pela privação do uso da sua viatura lhe seja reembolsado, montante este que como referido ascende a 450,00.

Esta quantia de 450,00€ acresce à quantia de € 4653,48 já arbitrada, perfazendo a quantia global de 5.103,48, a que acrescem de juros de mora.

Por via do decidido em definitivo pela 1.ª Instância a obrigação de pagar a referida quantia …acrescida de juros, impende sobre o Réu A. enquanto proprietário do canídeo, solidariamente com a apelada Brisa e a respetiva seguradora Companhia de Seguros 2, S.A, esta por via do contrato de seguro celebrado, e uma vez descontada a quantia de 750,00, sobre o capital ora arbitrado, a título de franquia.
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IV-DECISÃO

Nestes termos,
acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso e, nessa conformidade:
a- revogam a decisão recorrida na parte em que absolveu o 1.º Réu dos pedidos formulados na ação;
b- em substituição, condenam o 1.º Réu a pagar à autora a quantia total de € 5.103,48, acrescida de juros de mora.
c- quanto ao mais, mantêm o decidido, incluindo a condenação do 2.º Réu, a qual se encontra transitada em julgado.
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Custas pela apelante.
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Notifique.
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Porto,19 de fevereiro de 2021.

Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro