Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00188/25.8BEBRG |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 06/05/2025 |
| Tribunal: | TAF de Braga |
| Relator: | ANA PATROCÍNIO |
| Descritores: | PENHORA; CANCELAMENTO DO REGISTO; ACTO DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL; |
| Sumário: | I - A reclamação judicial de acto praticado na execução fiscal constitui uma verdadeira acção impugnatória incidental da execução fiscal, formulada no curso de execução pendente, tendo por objecto determinado acto que nela foi praticado pelo órgão da execução fiscal e por finalidade a apreciação da validade desse acto. II - Esse processo de reclamação previsto no artigo 276.º e seguintes do CPPT visa a apreciação da legalidade de actuação do órgão da execução fiscal à luz da fundamentação do acto que ele praticou. III - Tal controlo judicial tem de ser feito pelo tribunal no contexto do pedido e da causa de pedir gizados na petição de reclamação, não podendo o tribunal apreciar se o acto deve ser validado ou censurado à luz de questões que não foram colocadas a esse órgão ou que nunca foram por ele equacionadas e decididas, já que o tribunal não pode substituir-se a tal órgão e sancionar o acto com a argumentação jurídica que julgue mais adequada. IV – Cabe ao órgão da execução fiscal apreciar se a penhora mantém utilidade no processo de execução fiscal, em face de pedido tendo em vista o cancelamento do respectivo registo, com fundamento na extinção desse processo.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório HERANÇA ABERTA EM NOME DE «AA», contribuinte fiscal n.º .........700, representada pela cabeça de casal «BB», interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 01/04/2025, que julgou improcedente a Reclamação do acto do órgão de execução fiscal, contra o requerimento apresentado em 17/10/2024, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.° ...743, onde, em 16/12/2024, foi indeferido pedido de “certidão” para cancelamento da penhora do imóvel inscrito na matriz sob o artigo ...69, fração M, da freguesia ..., concelho .... A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “A - No âmbito das doutas alegações proferidas pelo Tribunal “a quo”, fica claro e óbvio manifesta contradição entre o facto de todos os factos terem sido dados como provados e depois a fundamentação da douta decisão que é manifestamente contraditória com a prova de toda a factualidade alegada nos autos, nomeadamente os pontos dos factos provados, como os das alíneas B), G) H), M) N) B - o Tribunal “a quo” este interpretou a expressão do Administrador de Insolvência, de forma errada e processualmente desajustada, pois o facto de o imóvel pertencer a Terceiro, na ideia do Tribunal “a quo”, era que o mesmo já era de outrem que não a executada, sem que estivesse provada a posse anterior à penhora, então a dedução lógica, plausível e processualmente admissível, atendendo a natureza do processo de Insolvência, seria apreender o imóvel à ordem da massa insolvente e vendê-lo, para pagar as dívidas da Insolvente e assim ressarcir os credores! C - Ora tal não ocorreu, mas sim o contrário...o imóvel continuou a pertencer ao “de cujus” ora Requerentes/recorrentes, sem nunca ter sido apreendido à ordem da massa insolvente! D - Ao se ter avocado o processo de embargos de terceiro ao processo de Insolvência, foi o Administrador de Insolvência, que entendeu não produzir prova desses embargos, ao ter “confessado o seguinte” - “11 Ainda de acordo com este Tribunal, o imóvel aqui em causa” ... não foi apreendido nestes autos de insolvência, dado que o mesmo já se encontrava na esfera de terceiros”, pelo que o mesmo não foi aqui liquidado”; - “12 Pelo Senhor Administrador Judicial, «CC», foi prestada idêntica informação - não houve apreensão do imóvel para a Massa Insolvente da [SCom01...] LDA, uma vez que o mesmo já se encontrava na posse de terceiros”. E - Isto é o Administrador de Insolvência, entendeu por desnecessário a produção prova que estava mencionada nos ditos embargos de terceiros, por ter concluído que o imóvel já estava na posse de terceiro...em data anterior ao registo da penhora, daí não ter apreendido o mesmo à ordem da massa Insolvente! F - Com o devido respeito o Tribunal “a quo” não pode fazer uma leitura literal dos factos ocorridos, nomeadamente a inexistência de uma Sentença, com força de caso julgado que atribua a posse do imóvel em momento anterior ao registo da propriedade, pois a leitura adequada, lógica e coerente dos factos, dados a conhecer, é que tal prova foi dispensada pelo Administrador de Insolvência. G - Aliás, a não ser assim, mal tinha andado o Administrador de Insolvência, que não tinha protegido os interesses dos credores, ao não ter apreendido o imóvel à ordem da massa Insolvente, e o próprio Tribunal de Comércio, onde ocorreu o processo de Insolvência, ao não ter alertado o A.I. para a questão não “esclarecida dos embargos de terceiros” que estava avocado ao processo de Insolvência. I - No âmbito da supramencionada dinâmica processual, assim se percebe a inexistência de uma sentença de embargos de terceiros...e não exatamente o raciocínio contrário produzido pelo Tribunal..., a dedução pouco credível e lógica do Tribunal “a quo”, que de a informação do A.I, era no sentido de informar que “imóvel estava registada em nome de terceiro”...no entanto o que diz o AI, não é isso, é de que NÃO HOUVE APREENSÃO DO IMÓVEL UMA VEZ QUE O MESMO JÁ SE ENCONTRAVA NA POSSE DE TERCEIROS” (ponto 12 dos factos provados-N) J - O “Tribunal a quo” confrontado com a produção de prova, inquirição de testemunha, arrolada pelos requerentes, ora recorrentes, nomeadamente o Administrador de Insolvência, veio em despacho sob a referência 007277721, datado de 7/3/2025, dispensar a inquirição da testemunha, com a alegação de que tal não se afigura útil. L - A inquirição da testemunha arrolada, seria de bastante utilidade, na medida em que só a mesma poderá esclarecer o Tribunal, M - Em face desta afirmação, proferida por um profissional do foro jurídico, não pode o Tribunal “a quo” fazer uma interpretação diferente, querendo significar que o mesmo terá dito que o imóvel estava registado em nome de terceiros...desconsiderando o alcance da expressão dita POSSE DE TERCEIROS e ato continuo a dinâmica processual que existiu...por parte do A.I. N - Refira-se a este propósito o que nos diz o Código Civil, art. 236 sobre o sentido normal da declaração: “A declaração negocial vale o sentido que um declaratório normal, colocado na posição do real declaratório, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele” O - Por fim debruça-se o Tribunal “a quo”, sobre o teor da procuração irrevogável P - Ora mais uma vez o Tribunal “a quo” faz uma interpretação literal do teor da procuração irrevogável, ao invocar, de forma singela, que a dita procuração nada diz sobre a posse do imóvel... Q - Ora como é bem sabido do tipo de procuração outorgada, feita ao abrigo do disposto no artigo 265 n° 3 e art. 1170 n° 2 do CC, isto é no interesse do próprio mandatário e podendo este celebrar negócio consigo mesmo, conforme vem expresso no teor do dito documento, é prática corrente e de alcance comum do comércio imobiliário em geral, de que este documento, é usado como meio para o mandatário “tomar posse e fazer como seu” determinado bem imóvel, que por qualquer motivo, não o fez, por intermédio da outorga da escritura pública de compra e venda na referida data. R - No tocante a esta dinâmica, convirá revisitar o alegado nos ditos embargos de terceiro, doc 7 da reclamação, e que o Tribunal “a quo” desconsiderou, e que quiçá é essencial, para perceber a postura do Administrador de Insolvência. S - Em suma, confrontado todas as provas juntas na petição de Reclamação, não é correto afirmar que aos ora recorrentes não ilidiram, a presunção derivada do registo predial, art. 7 do CRP, bem pelo contrário...tanto assim é que fizeram que o A.I. admitisse como certos e sérios tais argumentos aduzidos nos embargos de terceiro! T - Toda a argumentação aduzida pelo Tribunal “a quo”., está muito “agarrada” à literalidade dos factos, sem ter tido a preocupação de ter uma “visão trezentos e sessenta”/panorâmica sobre a dinâmica processual por um lado e por outro lado, desconsiderou a prova junta à época, as provas juntas ao articulado de embargos de terceiro, e a postura processual do A.I., o que levou a manifestas contradições entre o raciocínio desenvolvido pelo Tribunal “ a quo” e o facto de se ter dado como matéria provada toda a prova junta...nomeadamente os pontos dos factos provados, como os das alienas B), G) H), M) N), muito em concreto o ponto 12 do facto provado N Nestes termos e como nos melhores de direito, A) deverá ser julgado, por procedente, o presente recurso, e em consequência ser a douta sentença revogada, e substituída por douto acórdão, que julgue procedente por provado a Reclamação deduzida, ou se assim não se entender, B) que seja revogado o despacho que indeferiu a inquirição da Testemunha, para produção de prova, com as legais consequências.” **** Não houve contra-alegações. **** O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento. **** Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário). **** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida enferma de contradição entre os factos apurados e a decisão e se existe défice instrutório, por não ter sido realizada a diligência de inquirição de testemunhas, tendo em vista melhor demonstrar o erro em que incorreu o acto reclamado ao indeferir o pedido de “certidão” para cancelamento da penhora do imóvel inscrito na matriz sob o artigo ...69, fração M, da freguesia ..., concelho .... III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “IV.1. Factos provados Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos: A) Em 14/03/2003, no ... Cartório Notarial ..., foi lavrada “Procuração”, por via da qual os gerentes da sociedade“ [SCom01...], LIMITADA”, NIPC ...62, e em sua representação, constituíram seu bastante procurador «AA», NIF ...07, a quem concederam “(...) poderes para em nome da sua representada vender pelo preço de oitenta e cinco mil euros, a quem entender, podendo o mandatário celebrar negócio consigo mesmo, a fracção autónoma designada pela letra “ M ”, destinada a habitação, correspondente ao terceiro andar direito, do prédio urbano sito na Quinta ..., lote duzentos e cinquenta e quatro, freguesia ..., concelho ..., omisso na matriz mas já tendo sido feito o pedido para a sua inscrição no ... Serviço de Finanças ..., em 5 de Fevereiro último, para inscrição daquele imóvel na matriz, descrito na ... Conservatória do Registo Predial ..., sob o número ...57, da referida freguesia ...; outorgar e assinar as respectivas escrituras, para os representar em quaisquer Repartições Públicas, nomeadamente nos Serviços de Finanças e Conservatórias do Registo Predial, onde poderá requerer quaisquer actos de registo, provisórios ou definitivos, seus averbamentos e cancelamentos; podendo requerer, praticar e assinar tudo quanto seja necessário aos indicados fins (...)” - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 23 a 24 de 28/01/2025 19:51:05; B) No instrumento mencionado no ponto A) ficou ainda consignado o seguinte: “Sendo esta procuração conferida no interesse do mandatário é irrevogável (...)” - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 23 a 24 de 28/01/2025 19:51:05; C) Em 12/02/2007, foi instaurado o PEF n.° ...743, contra a executada “[SCom01...] LDA”, NIPC ...62, para cobrança coerciva de IRC do ano de 2000 - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247544) Pág. 4 de 28/01/2025 19:51:05; D) No âmbito do PEF melhor identificado em C), em 17/05/2011, foi efetuada a penhora da fração autónoma designada pela letra M - composta por 3 o andar direito, destinado a habitação (T3) , constituído por 7 divisões, na subcave, um compartimento amplo, destinado a garagem (n°8) , designado por Ml, no sótão, um compartimento amplo, destinado a arrumos, designado por M2 - do prédio urbano sito na Quinta ..., ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito da respetiva matriz pelo artigo ...69, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...57, daquela freguesia (Penhora de imóveis n° ...13, registada sob a ap ...82) - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247544) Pág. 5 de 28/01/2025 19:51:05; Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Págs. 11 a 15 de 28/01/2025 19:51:05; E) O imóvel melhor identificado em D) encontrava-se, à data da penhora, registado a favor da sociedade executada “[SCom01...] LDA” cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Págs. 11 a 13 de 28/01/2025 19:51:05; F) Em 25/07/2011, no Cartório Notarial ..., foi lavrada “Escritura de Compra e Venda”, por via da qual «AA», NIF ...07, “outorgando por si e como procurador da sociedade [SCom01...] LIMITADA (...) vendeu “a si mesmo” o imóvel melhor identificado no ponto D) deste probatório assente - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247544) Pág. 5 de 28/01/2025 19:51:05; Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 18 a 21 de 28/01/2025 19:51:05; G) Em 01/09/2011, «AA», NIF ...07, deduziu incidente de embargos de terceiro, no âmbito do PEF n.° ...743, o que deu origem ao processo n.° 1279/11.8BEBRG, que correu termos no TAF de Braga - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247544) Pág. 5 de 28/01/2025 19:51:05; Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 26 a 34 de 28/01/2025 19:51:05; H) Este processo foi arquivado por inutilidade superveniente da lide, tendo sido avocado ao processo de insolvência da executada - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247544) Pág. 5 de 28/01/2025 19:51:05; I) Em 17/09/2021, ocorreu o falecimento de «AA», NIF ...07 - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247544) Pág. 5 de 28/01/2025 19:51:05; J) Na sequência do falecimento de «AA», NIF ...07, procederam os seus herdeiros ao registo “sem determinação de parte ou direito” da universalidade de direito, na descrição predial n.º ...75, fração M, freguesia ..., da Conservatória do Registo Predial ... (apresentação n.º 5474 de 25/07/2024) Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 11 a 15 a de 28/01/2025 19:51:05; K) Em 17/10/2024, a Reclamante apresentou no Serviço de Finanças requerimento a solicitar "...certidão para cancelamento da penhora, ap ...82 de 2011/05/17, conforme doc em anexo, por extinção da execução." - cf. Petição Inicial (557016) Documentos da PI (007247545) Pág. 1 de 28/01/2025 19:51:06; L) Em 04/12/2024, o Mandatário da Reclamante enviou para o Serviço de Finanças mensagem de correio, na qual exarou: “(...) fazer a junção, da escritura pública de aquisição da fração, bem como procuração irrevogável, "veículo jurídico” que permitiu ao falecido tomar a posse do imóvel, em 2003” - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 16 de 28/01/2025 19:51:05; M) Em 04/12/2024, o Mandatário da Reclamante enviou para o Serviço de Finanças mensagem de correio, na qual exarou: “Entretanto detetamos, por contato com o anterior mandatário do embargante, a existência de uns embargos de terceiro, no Tribunal Fiscal e Administrativo de Braga, cujo teor dos mesmos, foi pedida certidão eletrónica, ao referido Tribunal” - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 25 de 28/01/2025 19:51:05; N) Em 12/12/2024, pela Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... foi elaborada “informação”, em suma, com o seguinte teor: “(...) ANÁLISE DO PEDIDO DOS FACTOS 1. Em 2007-02-12 foi instaurado o PEF ...743 contra a executada [SCom01...] LDA, NIPC ...62; 2. O PEF foi instaurado para cobrança coerciva de IRC do ano de 2000; 3. Decorrido o prazo de 30 (trinta) dias a contar da citação da devedora sem que tenha sido efetuado o pagamento da dívida exequenda, o mesmo prosseguiu a sua tramitação legal, designadamente para efeitos da PENHORA DE BENS e demais diligências prescritas no CPPT; 4. Consequentemente, em 2011-05-17 foi efetuada a penhora do imóvel acima identificado (penhora de imóveis n° ...13, registada sob a ap ...82); 5. Em 2011-06-29 a sociedade executada [SCom01...] LDA foi declarada insolvente (P° ..25/1...TBBCL). 6. O Processo foi encerrado em 2023-09-25, por ter sido realizado o rateio final; 7. Em 2011-07-25, no Cartório Notarial ..., foi lavrada Escritura de Compra e Venda do imóvel em causa, tendo sido inscrito na matriz predial a referida aquisição por «AA», NIF ...07 (falecido em 2021-09-17); 8. Em 2011-09-01, «AA», deduziu Incidente de Embargos de Terceiras (P° ..79/1...BEBRG), no PEF ...743; 9. De acordo com informação prestada pelo TAF de Braga, este processo foi arquivado por inutilidade superveniente da lide, tendo sido avocado ao processo de insolvência da executada; 10. Também pelo Tribunal onde correu a insolvência (P° ..25/1...TBBCL), foi declarada extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, porquanto todas as questões patrimoniais relativas à Massa Insolvente serão discutidas no âmbito da insolvência; 11. Ainda de acordo com este Tribunal, o imóvel aqui em causa “...não foi apreendido nestes autos de insolvência, dado que o mesmo já se encontrava na esfera de terceiros, pelo que o mesmo não foi aqui liquidado.”; 12. Pelo Senhor Administrador Judicial, «CC», foi prestada idêntica informação - não houve apreensão do imóvel para a Massa Insolvente da [SCom01...] LDA, uma vez que o mesmo já se encontrava na posse de terceiros; OUTROS FACTOS 13. Previamente aos factos acima descritos e de acordo com a informação disponível há a considerar o seguinte: 14. Em 2003-03-14, no ... Cartório Notarial ... foi lavrada escritura sob a epígrafe de "Procuração” em que a executada [SCom01...] LDA, constitui seu bastante procurador «AA»; 15. A «AA» foram concedidos poderes para em nome da sua representada vender pelo preço de € 85.000,00, a quem entender, podendo o mandatário celebrar negócio consigo mesmo da fração do prédio controvertido; CONCLUSÃO Atenta a factualidade acima descrita, tendo o Tribunal da Insolvência declarado a não apreensão do imóvel para a Massa Insolvente, e tendo a penhora do imóvel sido registada em data anterior à escritura de aquisição do mesmo por parte de «AA», afigura-se-me, sem necessidade de mais amplas ponderações, que inexiste impedimento legal para a manutenção da penhora. Assim, propõe-se o indeferimento do pedido de cancelamento da penhora do imóvel inscrito na matriz sob o artigo ...69, fração M, da freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória dos Registos Predial, Comercial e Automóveis ..., sob o n° ..57/20020916-M, efetuada no PEF ...743 (penhora de imóveis n° ...13, registada sob a ap ...82, de 201105-17) (...)” - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 97 a 98 de 28/01/2025 19:51:05, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; O) Em 16/12/2024, foi proferido despacho, pelo Diretor de Finanças ..., com o seguinte teor: “Concordo. Proceda-se nos termos propostos” - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 95 de 28/01/2025 19:51:05; P) Através de comunicação eletrónica, datada de 19/01/2025, a Reclamante foi, na pessoa do Mandatário por si constituído, do despacho proferido em 16/12/2024 - cf. Petição Inicial (557016) Petição Inicial (007247543) Pág. 94 de 28/01/2025 19:51:05.” IV. 2. Factos não provados Com interesse para a decisão da causa, inexistem factos não provados. IV. 3. Motivação da decisão sobre a matéria de facto A decisão da matéria de facto provada assentou análise dos elementos documentais especificamente identificados em cada um dos pontos do probatório, constantes dos autos e PEF, que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do Tribunal, em conjugação com a livre apreciação da prova. A restante matéria alegada não foi julgada provada ou não provada por não ter relevância para a decisão da causa ou por não ser susceptível de prova, por constituir, designadamente, considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito.” * 2. O Direito A Recorrente não se conforma com a sentença recorrida que manteve o acto reclamado na ordem jurídica, por considerar verificar-se contradição entre a matéria apurada nos pontos indicados com as alíneas B), G) H), M) N), muito em concreto o ponto 12 do facto provado N), com a fundamentação da decisão. Na petição inicial, já a reclamante encontrava contradição entre a fundamentação do acto reclamado e a matéria factual apurada pelo órgão da execução fiscal, alegando existir, “por conseguinte, uma evidente e flagrante contradição entre as provas dadas por certas pelo Finanças ..., nomeadamente as informações prestadas pelo administrador de Insolvência, a prova documental junta, e depois a peregrina conclusão é de que não é possível cancelar a penhora”. Perante este vício de fundamentação, o tribunal recorrido decidiu o seguinte: “(…) inexiste a apontada “contradição” entre os factos provados tidos em consideração pelo Serviço de Finanças, mormente nos pontos 11. e 12. do despacho reclamado, os documentos juntos (escritura de compra e venda e procuração irrevogável), a informação prestada sobre a existência dos embargos de terceiro e a decisão de indeferimento do pedido de cancelamento da penhora. Outrossim, do já assinalado resulta que o despacho reclamado não comporta qualquer pecha ao acolher o seguinte entendimento: “tendo a penhora do imóvel sido registada em data anterior à escritura de aquisição do mesmo por parte de «AA», afigura-se-me, sem necessidade de mais amplas ponderações, que inexiste impedimento legal para a manutenção da penhora”. Deste modo, conclui-se que o Serviço de Finanças, ao decidir no sentido em que decidiu, não incorreu em erro quanto aos pressupostos de facto e de direito, não tendo violado o disposto no artigo 278.º, n.º 3, al. c), do CPPT, pois a penhora incidiu sobre bens que respondiam pela dívida, atenta a inoponibilidade da venda posterior à penhora em relação à execução. Por outro lado, a fundamentação do despacho reclamado não é “inadmissível", não havendo razões para divergir do entendimento do órgão de execução fiscal, mormente ao abrigo do disposto no artigo 58.º, n.º 1, do Código do Registo Predial, porquanto a dívida à Fazenda Pública existe e não foi extinta. (…)” Desde logo, não conseguimos sindicar estas afirmações de que a dívida existe e não foi extinta, dado que nada consta dos autos a esse respeito. De facto, estando perante caso que a administração tributária analisou como sendo de subida imediata, deveria ter remetido, por via electrónica, a reclamação e o processo executivo que a acompanha, nos termos do artigo 278.º, n.º 5 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPPT). Compulsados os autos, observamos que tal não aconteceu, inviabilizando analisar se o processo de execução fiscal terá sido extinto. Como resulta da decisão da matéria de facto, na sua alínea K), o pedido formulado ao órgão de execução fiscal tem o seguinte teor: vem solicitar certidão para cancelamento da penhora, ap ...82 de 2011/05/17, conforme doc em anexo, por extinção da execução. Portanto, inequivocamente, o fundamento para o pedido é a extinção do processo de execução fiscal em apreço. O órgão de execução fiscal não emitiu a solicitada certidão, com vista à obtenção do cancelamento do registo da penhora, com os fundamentos constantes da alínea N) do probatório – cfr. pontos N) e O) da decisão da matéria de facto. Nesta conformidade, as alegadas contradições a que se refere a Recorrente redundam na fundamentação que sustenta o acto reclamado. Porém, em nenhum momento dessa motivação, o órgão de execução fiscal indica que a execução está pendente ou se refere à razão indicada pela requerente relativa à “extinção da execução”. Com efeito, o artigo 176.º do CPPT menciona as causas de extinção do processo de execução fiscal, não se referindo o acto reclamado a qualquer delas, seja o pagamento, ainda que coercivo no âmbito do processo de insolvência, seja qualquer outra forma prevista na lei, como por exemplo, a prescrição. Não se referindo, igualmente, a qualquer causa de levantamento da penhora seja as previstas no artigo 218.º, no artigo 235.º ou nos artigos 259.º, 260.º ou 261.º, todos do CPPT. A partir do momento em que desconhecemos se o presente processo de execução fiscal foi avocado e se a respectiva dívida foi considerada no processo de insolvência referido na motivação do acto impugnado, bem como ignoramos todo o circunstancialismo que envolveu tais processos e as respectivas vicissitudes, não podemos apreciar a pertinência da fundamentação do acto em crise. Principalmente porque o órgão da execução fiscal não emitiu qualquer pronúncia acerca da invocada extinção da execução, pressuposto basilar do requerimento em apreço. Ora, não podemos perder de vista que, para conhecimento do erro de julgamento, importa ter presente a fundamentação do acto reclamado [cfr. alíneas N) e O) da matéria de facto], pois é relativamente a ela que tem de ser aferida a legalidade do acto praticado pelo órgão de execução fiscal. Salientamos a importância fulcral da fundamentação do acto reclamado, dado que é com base nessa motivação que o tribunal apreciará a legalidade desse acto. O contencioso de estrita legalidade subjacente ao presente meio processual determinará a eventual mera anulação do acto impugnado, daí a relevância de atender aos termos da prolação do mesmo, tale quale foi praticado. A reclamação judicial de acto praticado na execução fiscal constitui uma verdadeira acção impugnatória incidental da execução fiscal, formulada no curso de execução pendente, tendo por objecto determinado acto que nela foi praticado pelo órgão da execução fiscal e por finalidade a apreciação da validade desse acto. Esse processo de reclamação, previsto no artigo 276.º e seguintes do CPPT, visa a apreciação da legalidade de actuação do órgão da execução fiscal à luz da fundamentação do acto que ele praticou. Tal controlo judicial tem de ser feito pelo tribunal no contexto do pedido e da causa de pedir gizados na petição de reclamação, tendo em conta o teor do requerimento apresentado pela Recorrente que lhe subjaz, não podendo o tribunal apreciar se o acto deve ser validado ou censurado à luz de questões que não foram colocadas a esse órgão ou que nunca foram por ele equacionadas e decididas, já que o tribunal não pode substituir-se a tal órgão e sancionar o acto com a argumentação jurídica que julgue mais adequada. Os poderes de cognição do tribunal não podem ir além dos fundamentos (factuais e jurídicos) de que o acto reclamado explicitamente partiu e das questões que nele foram apreciadas e decididas, cabendo-lhe unicamente uma função fiscalizadora da legalidade dos actos praticados pelo órgão administrativo incumbido de tramitar a execução, pelo que, no caso, o tribunal de 1.ª instância só podia aferir da legalidade do acto reclamado à luz da sua motivação factual e jurídica e à luz dos vícios invalidantes que o reclamante lhe imputa – cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 15/03/2017, proferido no âmbito do processo n.º 0135/17. Por isso, estaremos sempre no encalço do teor do acto reclamado, tal como foi praticado, dado que a presente acção visa a sua eliminação da ordem jurídica. É este o objecto da reclamação, devendo compulsar-se a decisão da matéria de facto para detectar o acto que se mostra impugnado [cfr. informação sustentadora do acto na alínea N) do probatório]. Ora, em rigor, não está em causa sindicar a legalidade do acto de penhora do imóvel, mas apenas saber se o órgão de execução fiscal tem condições, actualmente, depois do encerramento do processo de insolvência (por ter sido realizado o rateio final), para emitir a peticionada certidão com vista ao cancelamento do registo da penhora, por, eventualmente, o processo de execução fiscal estar extinto. No fundo, reside dúvida quanto à prossecução da execução fiscal para cobrança desta dívida, vencida antes de declarada a insolvência. Cessado o processo de insolvência, os processos de execução fiscal avocados serão devolvidos no prazo de oito dias ao respectivo órgão da execução fiscal ou ao tribunal tributário, devolução que tem como finalidade a possibilidade de, em caso de o insolvente adquirir bens, prosseguirem os processos para cobrança do que esteja em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contratuais por esta assumidas no âmbito do processo de recuperação e sem prejuízo também da eventual prescrição da dívida exequenda – cfr. artigo 180.º, n.º 4 e n.º 5 do CPPT. Por outro lado, ignoramos se o crédito exequendo logrou pagamento no processo de insolvência ou se, por força deste, designadamente por força de acordo aí obtido, os mesmos não mais podiam ser exigidos à executada. O acto recorrido deveria ter ponderado a verificação de quaisquer destas circunstâncias, por forma a que ficasse claro que o processo de execução fiscal não está extinto, ao contrário do que consta invocado no requerimento da Recorrente. Nada foi equacionado e ponderado quanto à extinção da execução, daí que a Recorrente questione a quem aproveitará o registo da penhora efectuado em 17/05/2011, em face do actual estado dos autos de insolvência, que se mostram encerrados desde 25/09/2023, no âmbito do processo n.º ..25/1...TBBCL, sem que a AT tenha retirado qualquer valia da penhora. Na medida em que no acto reclamado apenas se equacionou a penhora numa perspectiva da sua legalidade à data do seu registo, ou seja, na óptica de a penhora do imóvel ter sido registada em data anterior à escritura de aquisição do mesmo por parte de «AA», concluindo-se inexistir impedimento legal para a manutenção da penhora; tais fundamentos não se mostram consentâneos com o pedido da Recorrente. Na verdade, o requerimento da Recorrente aponta para uma perspectiva de utilidade actual da penhora, dado que se mostra fundado na extinção da execução. Nestes termos, observa-se que a AT não apreciou propriamente o pedido formulado no requerimento pela Recorrente, sendo que o motivo indicado pela AT não é consentâneo com eventual inflexão da prossecução da execução, por extinção, conforme solicitado. O cancelamento da penhora, por força do seu levantamento, neste caso mostra-se associado pela Recorrente a alteração das circunstâncias, motivadas pelo que possa ter sucedido no processo de insolvência e após o seu encerramento, e os seus reflexos no processo de execução fiscal. Não se tratará, rigorosamente, de aferir a legalidade da penhora, mas a sua actual utilidade num processo executivo que poderá, eventualmente, estar findo ou ter condições para estar extinto. Já que o tribunal não pode substituir-se ao órgão da execução fiscal, deverá ser este a efectuar tal análise. Pelo que o acto reclamado, com a presente fundamentação, não poderá manter-se no ordenamento jurídico; ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas no recurso. Importa, por último, realçar que o valor em que a parte decaiu e será condenada nas respectivas custas assenta na base tributável de €548.308,80 (quinhentos e quarenta e oito mil trezentos e oito euros e oitenta cêntimos), valor esse que se apresenta superior a €275.000,00, montante a partir do qual passa a acrescer 1,5 UC, a final, por cada €25.000,00 ou fracção e que importa ponderar à luz do princípio da proporcionalidade aferido ao concreto serviço prestado. Nesta instância, tudo ponderado e perante a possibilidade de graduação casuística e prudencial do montante da taxa de justiça devida a final, não perdendo de vista que deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2.º da CRP, atendendo ainda ao direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20.º igualmente da CRP e as questões colocadas não serem complexas; alcançamos razões válidas e ponderosas para dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP. Na sequência do exposto, deverá a conta de custas a elaborar desconsiderar o remanescente da taxa de justiça. Conclusões/Sumário I - A reclamação judicial de acto praticado na execução fiscal constitui uma verdadeira acção impugnatória incidental da execução fiscal, formulada no curso de execução pendente, tendo por objecto determinado acto que nela foi praticado pelo órgão da execução fiscal e por finalidade a apreciação da validade desse acto. II - Esse processo de reclamação previsto no artigo 276.º e seguintes do CPPT visa a apreciação da legalidade de actuação do órgão da execução fiscal à luz da fundamentação do acto que ele praticou. III - Tal controlo judicial tem de ser feito pelo tribunal no contexto do pedido e da causa de pedir gizados na petição de reclamação, não podendo o tribunal apreciar se o acto deve ser validado ou censurado à luz de questões que não foram colocadas a esse órgão ou que nunca foram por ele equacionadas e decididas, já que o tribunal não pode substituir-se a tal órgão e sancionar o acto com a argumentação jurídica que julgue mais adequada. IV – Cabe ao órgão da execução fiscal apreciar se a penhora mantém utilidade no processo de execução fiscal, em face de pedido tendo em vista o cancelamento do respectivo registo, com fundamento na extinção desse processo. IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a reclamação procedente, anulando o acto reclamado. Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias; devendo a conta de custas a elaborar desconsiderar o remanescente da taxa de justiça. Porto, 05 de Junho de 2025 Ana Patrocínio Maria do Rosário Pais Cláudia Almeida |