Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00932/19.2BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/19/2022
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:FACTURAS FALSAS, INDÍCIOS, IVA
Sumário:I - No caso de facturas falsas, compete à Administração Tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação correctiva e, só caso o faça, passa a recair sobre o contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto.

II – Impõe-se, portanto, à Administração Tributária abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto e dos respectivos documentos de suporte, atento o princípio da declaração vigente no nosso direito (artigo 75.º da LGT), só depois passando a competir ao contribuinte o ónus de provar a veracidade do declarado, o que quer dizer que se a Administração Tributária não fizer prova do bem fundado da formação do seu juízo, a questão relativa à legalidade do seu agir terá de ser resolvida contra ela, sem necessidade de ir analisar se a Impugnante logrou ou não provar, em tribunal, a veracidade da declaração.

III - Tal prova não tem de ser directa e dogmática, no sentido de evidente e intocável, antes pode resultar de circunstâncias colaterais e indirectas que, atentas a idoneidade dos respectivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível.

IV – Para que a Administração Tributária obste à dedução de imposto mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. artigo 240.º do Código Civil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende.

V – Não tendo a Administração Tributária durante a inspecção constatado factos ponderosos e objectivos fortemente indiciadores de que as facturas que titulam diversas transacções comerciais são falsas, isto é, apenas servem de instrumento formal para com elas se poder deduzir o imposto nela referido, não cumpriu com o ónus da prova dos pressupostos que lhe é exigido e, por tal razão, não abala a presunção de verdade de que goza a escrita formalmente organizada da impugnante, nem determina a inversão do ónus da prova nos termos do artigo 74.º da LGT.*
* Sumário elaborado pela relatora
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

PJ..., contribuinte fiscal n.º (…), na qualidade de responsável subsidiário por dívidas de IVA da sociedade A..., LDA., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 25/01/2021, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações de IVA, respeitantes a Março e Maio de 2012, no valor de €22.637,28 e de €16.215,66, respectivamente, cujo pagamento lhe foi exigido pela AT em sede de reversão das dívidas exequendas nos processos de execução fiscal n.º 00942014______ e n.º 009432014______________.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:

1. Vem o presente recurso da mui douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou improcedente a impugnação deduzida pelo ora recorrente dos actos de liquidação adicional de IVA efectuados à sociedade A..., LDA., dos períodos de 05/2012 e 03/2012, com os números, respectivamente, ...05, no valor de € 16.215,66, e ...04, no valor de € 22.637,28, consequentes de procedimento de inspecção tributária a coberto da OI201201752, cujo pagamento foi exigido ao recorrente na qualidade de responsável subsidiário, por reversão dos processos de execução fiscal número 00942014______ e 009432014______________.
2. A douta sentença recorrida revela uma incipiente fundamentação da motivação quanto ao julgamento que fez da matéria de facto dada como provada, remetendo genericamente para as regras da experiência comum e para os “os documentos juntos aos autos, incluindo os constantes do procedimento administrativo apenso”, que afirma não terem sido impugnados.
3. Sobre tais documentos, que rigorosamente correspondem tão só ao relatório de inspecção tributária, pronunciou-se o recorrente na petição inicial, refutando os factos e conclusões (porque essencialmente de conclusões se trata) nele vertidas.
4. No processo de impugnação judicial, não obstante a necessidade de impulso processual do contribuinte, a posição das partes surge invertida. Ao tomar imediatamente posição sobre o RIT na petição, fica dispensada, por desnecessária, qualquer impugnação posterior dos factos e conclusões vertidos no relatório e respectivos documentos anexos.
5. E ainda que o relatório de inspecção tributária não seja objecto de impugnação expressa, nem por isso o Tribunal está dispensado de fazer cumprir o princípio da legalidade e do inquisitório. E jamais se podem admitir como factos provados, meros juízos subjectivos ou conclusivos, ou asserções sem sustento probatório.
6. Nos termos do disposto no artigo 76.º da Lei Geral Tributária As informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos, nos termos da lei.
7. Impugnado que foi, o relatório de inspecção tributária junto aos autos faz prova, apenas e tal como enunciado na alínea B) da matéria de facto julgada provada, de que “as correcções propostas pela inspecção tributária tiveram a seguinte fundamentação:”.
8. Apenas fazendo fé quanto aos factos fundamentados e que se baseiem em critérios objectivos, ou seja, aqueles “afirmados como sendo praticados pela Administração Tributária ou com base na percepção dos seus órgãos ou agentes, ou factos determinados a partir dessa percepção com base em critérios objectivos” Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in LGT anotada e comentada, 4ª edição, 2012, em comentário ao artigo 76.º, página 670.
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9. Não existe qualquer presunção de veracidade ou força probatória especial quanto a juízos formulados pela Administração Tributária, factos conclusivos, asserções subjectivas ou proposições lógico-dedutivas, em especial aquelas cujas premissas não se encontrem objectivamente demonstradas nos autos.
10. Porque não pode o RIT, em sede judicial, beneficiar de uma presunção de veracidade cujo reflexo é uma presunção quase absoluta de legalidade do acto tributário impugnado.
11. Ocorre notório erro de julgamento quando o Tribunal, no seu juízo decisório, se fundamenta em meras conclusões, juízos subjectivos, extraídos directa e acriticamente do relatório de inspecção tributária. O que faz recorrendo a transcrições de sumários excertos de meras conclusões vertidas no relatório de inspecção, maxime, páginas 35 a 37 da douta sentença recorrida.
12. O Tribunal a quo incorre ainda em erro de julgamento quando dá como adquiridos factos e conclusões, absorvidos do relatório de inspecção, sobre outras sociedades que não foram objecto do procedimento de inspecção.
13. Sem prejuízo do entendimento sobre a admissibilidade do recurso a informações resultantes de inspecções cruzadas (indícios externos), não está a AT dispensada de documentar os factos que delas extrai, em vista da demonstração das conclusões a que os mesmos conduzem.
14. Elementos probatórios, como documentos e outros anexos, que o relatório de inspecção não contém, que o recorrente ignora e que por isso está impedido de sindicar, refutando as afirmações e conclusões que deles se extrai.
15. Tornando-os insindicáveis e, consequentemente, falhando a fundamentação dos actos tributários de liquidação impugnados e que nesses factos e conclusões se estribam.
16. O ónus de prova indiciária que recai em primeira linha sobre AT não se cumpre se apenas lança mão se meros juízos conclusivos, sem que proceda à análise da materialidade de cada uma das operações comerciais postas em crise, e assim se quanto a cada uma dessas concretas operações não carrear ao procedimento administrativo factos e elementos probatórios que, à luz de um juízo de razoabilidade, sejam aptos a pôr em crise a presunção de veracidade de que goza a escrita do contribuinte.
17. Os indícios externos não contêm elementos probatórios que os suportem e, nessa medida possam ser sindicados pelo sujeito passivo e, em sede judicial, pelo próprio Tribunal.
18. E não existem indícios internos, sérios, credíveis e suficientes, suportados em factos objectivos, de que as operações não se realizaram.
19. Quanto a estes, na sumária apreciação que faz (página 36, in fine) sobre a suficiência de indícios internos da falsidade das operações, a douta sentença recorrida remete, telegraficamente, para três transcrições do RIT.
20. A primeira, de que “A empresa A..., LDA--- não possui meios materiais e humanos para efetuar os transportes constantes nas faturas emitidas para a BB---.”. Trata-se de uma conclusão e não de um facto. E que foi textualmente reproduzida do RIT, acriticamente vazada na douta decisão recorrida, sem cuidar de esclarecer, sindicar ou apreciar se existiam premissas suficientes (e prova destas) que a admitissem como válida, que não existem.
21. Em termos objectivos, o RIT caracteriza a sociedade inspeccionada como dispondo de “instalações de armazenagem e grupagem de mercadorias”, não só em (...), mas também em Strasbourg, França, onde dispõe de um armazém alugado de apoio à sua actividade transfronteiriça de transporte de mercadorias.
22. A quantificação dos meios humanos e dos veículos que, é dito, “possui em média” Vd. Ponto II.C.1. do RIT., além de pouco rigorosa, omite os que possa deter em locação e tem por referência o concreto ano em que decorreu a inspecção e não os anos inspeccionados.
23. E a aferição de tais meios por referência a médias revela deficiência de rigor que prejudica a adesão a conclusões a que falta sustento factual. Ainda assim, se algo se extrai da caracterização feita no RIT sobre a actividade da sociedade, é que a mesma possui meios, humanos e materiais, compatíveis com o longo histórico de mais de 20 anos que leva no sector do transporte de mercadorias.
24. Fundamenta ainda a suficiência de indícios internos pela expressão, que uma vez mais provém textualmente das conclusões do RIT, “Através da simulação de serviços prestados à BB--- e isentos de IVA, e da utilização de facturas falsas emitidas pela BB--- com IVA liquidado, obteve montantes de créditos de IVA….”. Facto absolutamente conclusivo, que não pode constituir premissa e simultaneamente conclusão.
25. A prova indiciária pressupõe um facto, demonstrado através de uma prova directa, ao qual se associa uma regra da ciência, uma máxima da experiência ou uma regra de sentido comum. Este facto indiciante permite a elaboração de um facto consequência em virtude de uma ligação racional e lógica. Num típico raciocínio silogístico jamais se pode partir de uma premissa que é, ao mesmo tempo, a conclusão.
26. Ou seja, para concluir, na asserção acolhida pela douta sentença recorrida que as operações foram simuladas e as facturas são falsas (a falsidade das operações), não se pode partir, como premissa, do facto, indemonstrado, de que houve “simulação de serviços prestados” e “utilização de facturas falsas”.
27. Face à prova produzida, resultante exclusivamente do RIT, não podia a douta sentença recorrida concluir pela insuficiência de inexistência das operações subjacentes. Os quais haveriam de ser sérios, credíveis e suficientes. E não são.
28. Aceitando a AT a liquidação de Aceitando a liquidação de IVA respeitante a uma determinada operação (e recebido o montante do imposto liquidado), não pode depois, para efeitos do exercício do direito à dedução do imposto, entender que a mesma liquidação é inválida, sob pena de violação dos princípios da boa fé e da justiça.
29. A douta sentença recorrida faz uma menos acertada interpretação e aplicação, nomeadamente e sempre com o douto suprimento de V.Exªs,, do disposto nos artigos 5º./2 e 52º., 74º./1, 75º., 76º., 77º./1 e 2, todos da LGT, 226º./2 e 268º./3 da CRP, 100º./1 do CPPT, e 19º./1 e 3 do CIVA.
TERMOS EM QUE deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que, dando provimento à impugnação, anule as liquidações impugnadas.
Assim se espera, confiadamente, na certeza de que Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores, farão a costumada JUSTIÇA.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, ao considerar que a AT actuou legalmente, carreando elementos suficientes para que fosse desconsiderado o IVA deduzido, por se verificarem indícios sérios de “facturação falsa”.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto
Da sentença prolatada em primeira instância consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão a proferir consideram-se provados os seguintes factos [a numeração da paginação referida será efetuada por apelo à paginação eletrónica constante do SITAF salvo expressa menção em sentido contrário]:
A. A Impugnante foi alvo de procedimento inspetivo efetuado a coberto da OI201201752 com referência ao exercício de 2012.
[cfr. emerge do relatório inspetivo integrante do procedimento administrativo inserto nos presentes autos].
B. No âmbito do procedimento inspetivo referido no facto precedente as correções propostas pela Inspeção Tributária tiveram a seguinte fundamentação:
“(…)
4. Análise efetuada à empresa (BB---)
4.1. Dados gerais
A empresa BB---, NIF (…), é uma sociedade por quotas com início em 1999.01.01, com sede em Matosinhos e com a atividade de transportes rodoviários de mercadorias, enquadrada em IRC no regime geral, e em IVA pelo regime normal de periodicidade trimestral.
É composta atualmente pelos sócios gerentes AA..., NIF (...), e MV..., NIF (...), ambos naturais da Roménia. O primeiro tem domicílio fiscal na Rua (…), e encontrava-se coletado em IRS com a atividade de manutenção e reparação de veículos automóveis no regime simplificado, e em IVA no regime especial de isenção, e cessou em 2011.12.31, e o segundo tem domicílio fiscal em (…).
A empresa não procedeu à entrega das declarações modelo 22 de IRC dos exercícios de 2011 (existe uma liquidação oficiosa) e 2012 e a declaração apresentada em 2010 apresenta prejuízo de 15 mil euros.
Não procede ao envio das declarações periódicas de IVA desde 2012, sendo que a declaração do 3ºtrimestre de 2011 foi a única da qual resultou imposto a pagar e que não foi pago, e não procedeu à entrega das declarações anuais (IES) dos exercícios de 2011 e 2012, não procedeu à entrega de qualquer guia de retenção de IRS em 2011 e 2012, nem fez qualquer pagamento por conta de IRC.
Existem 11 processos em execução por falta de entrega de IVA, juros e custas, no valor total da quantia exequenda de 20.255,95€.
Não procedeu à entrega do anexo J respeitante a 2012 e a declaração de 2011 não apresenta quaisquer rendimentos pagos.
Não possui quaisquer imóveis ou veículos registados em seu nome, nem quaisquer pagamentos em 2011 e em 2012. Em anos anteriores (2008, 2009, 2010) foi pago pela empresa o IUC referente aos veículos matrículas (…) (pesado) e (…) (ligeiro). O primeiro encontra-se registado atualmente em nome de LB... e o segundo em nome de JC....
Ambos os sócios gerentes não apresentaram qualquer declaração de rendimentos para os exercícios de 2011 e 2012. Não obstante, o primeiro sócio recebeu da empresa BB--- em 2011 a quantia de 4.872,38€, e o segundo sócio, a quantia de 4.387,38€, como rendimentos da categoria A.
4.2. Análise das relações comerciais da A..., LDA--- com a empresa BB---
4.2.1. Conforme documentos existentes na contabilidade da A..., LDA---, de Abril de 2011 a Maio de 2012 a empresa manteve relações comerciais com a BB---, efetuando serviços de transporte de PT para várias cidades da Roménia e da Alemanha, isentas de IVA ao abrigo da alínea q) do n° 1 ao artº 14° do CIVA.
Os serviços efetuados constam numa série específica (mas sem designação específica) de faturas emitidas para o efeito, e ascendem aos seguintes valores mensais:
Mês / Ano BB--- (PT – UE)
Abr-2011 53.000,00
(…) (…)
Total 476.650,00
Jan-2012 88.250,00
Fev-2012 101.750,00
Mar-2012 88.250,00
Abr-2012 143.450,00
Mai-2012 149.770,00
Total 571.470,00
As faturas emitidas encontram-se em resumo no anexo 2.
4.2.2. Por sua vez, e novamente conforme documentos da contabilidade, a BB--- efetuou serviços de transporte para a A..., LDA---, da Roménia e da Alemanha para PT, com liquidação de IVA, nas importâncias mensais de:
Mês / Ano BB--- (PT – UE)
Abr-2011 39.250,08
(…) (…)
Total 454.630,61
Jan-2012 78.300,00
Fev-2012 107.750,00
Mar-2012 125.400,00
Abr-2012 108.500,00
Mai-2012 72.500,00
Total 492.350,00
As faturas emitidas encontram-se em resumo no anexo 3.
De referir que as faturas da BB--- fazem referência a um reboque, mas nunca à matrícula do trator. As faturas da A..., LDA--- fazem referência a reboques, algumas vezes propriedade da empresa outras não, mas quase nunca ao trator, não tendo sido dado resposta a esta questão quando solicitado ao sujeito passivo.
4.2.3. Tendo em atenção que estes transportes são subcontratados a esta empresa, as mercadorias são entregues em PT após separação e agrupamento por cliente, e os serviços posteriormente faturados a clientes da Alemanha e França (transportadoras), e que a faturação de UE para a PT ascende aos valores abaixo discriminados, perguntou-se ao contribuinte através de notificação (anexo 4) que mereceu resposta (anexo 6), como é recuperada a restante quantia paga pelos transportes efetuados pela BB---:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Verifica-se assim que a faturação emitida pela A..., LDA--- para PT não é suficiente para recuperar os gastos com a subcontratação efetuada à BB--- decorrentes dos transportes da EU para PT.
Mesmo que considerássemos que a faturação emitida de PT para a UE (listagem em anexo 5 de todas as faturas emitidas) também dizia respeito aos serviços subcontratados à BB---, continuávamos a ter diferenças significativas:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

O sujeito passivo vem responder que “(...) A quantia paga por nós aos BB--- é recuperada através de todos os serviços por nós prestados aos n/clientes, na maioria na Alemanha e França (…)”. O que não é verdade conforme constatamos da análise do quadro acima.
4.2.4. Constando na contabilidade diversas faturas emitidas para a BB--- referentes a transportes de PT para a Roménia e Alemanha, solicitou-se ao contribuinte para indicar a que se referem estes transportes, e qual foi o trator que os efetuou.
Em resposta, o contribuinte vem dizer que "(...) a maioria das vendas aos BB--- referem-se ao transporte de contentores vazios, sendo que os mesmos foram transportados pelos n/ tratores e pelos pertencentes aos fretados ou seja subcontratados.” No entanto, não indica a matrícula dos tratores, nem diz que transportes foram efetuados pelos seus tratores e por tratores subcontratados, nem indica a empresa que efetuou os transportes, impossibilitando-nos a verificação que se impunha.
4.2.5. Os serviços de Portugal para a Roménia/Alemanha faturados pela A..., LDA--- à BB--- apresentam valores próximos dos serviços de Roménia/Alemanha para Portugal faturados pela BB--- à A..., LDA---, mas sempre inferiores em cerca de 20%, situação que foi explicada pelo contribuinte pelo facto de estes transportes se referirem a transportes de contentores, que são descarregados na Alemanha e na França. Pergunta-se, se o transporte é feito para Alemanha/França (uma distância menor), porquê valores tão superiores aos geralmente cobrados, e porque não cobra à BB--- o mesmo que esta lhe cobra pelo mesmo transporte.
Apresenta-se a título meramente exemplificativo algumas faturas de Abril de 2012 para efetuar a comparação entre o que a A..., LDA--- cobra à BB--- e o que a BB--- cobra à A..., LDA--- pelo mesmo serviço (ao contrário).
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

O contribuinte vem explicar o seguinte:
- "Que o valor do transporte dos contentores é desde Portugal até Roménia, sendo que o valor é normal".
Sendo assim, também o transporte da Roménia para Portugal deveria ter este valor normal, ou seja, ser igual, pelo que a justificação não tem cabimento.
- “Que a importação tem vários pontos de descarga, o que por si só o torna mais oneroso".
Ora mas sendo a empresa A..., LDA--- que executa as operações de manuseamento (carga e descarga) e não a BB---, porquê pagar-lhe um valor superior? Continua a pergunta em aberto, sem resposta.
4.2.6. Existindo transportes efetuados de Portugal para a Roménia pela empresa, e da Roménia para Portugal pela BB---, pergunta-se se os camiões da A..., LDA--- vinham vazios da Roménia para Portugal e se os camiões da BB--- iam vazios de Portugal para a Roménia. O contribuinte não dá qualquer resposta relativa a este tema, e relativamente à BB--- mostra desconhecimento.
4.3. Análise da contabilidade da BB---
4.3.1. Comportamento fiscal dos sócios da BB--- e da empresa
A BB--- é uma empresa formada por 2 sócios de origem romena, os quais, conforme atrás foi referido, não têm cumprido as suas obrigações fiscais em sede de IRS, nem a empresa em sede de IRC e de IVA.
Não possui quaisquer bens imóveis ou viaturas para o exercício da atividade de transportes rodoviários de mercadorias.
AA... tem domicílio fiscal na Rua (…), e possui uma viatura ligeira de mercadorias Ford Transit, matrícula (…).
Deslocámo-nos ao domicílio fiscal (com a chefe de divisão GG…), que é propriedade de BB..., moradora na Rua (…), onde nos foi dito por outra moradora no mesmo local, de nome CC…, que já lá não morava desde 2010.
Notificada a senhoria através do ofício ...91 de 2013.07.09, respondeu-nos (entrada ...65 de 2013.07.13 em anexo 7) que:
“O Sr. AA... celebrou contrato de arrendamento comigo em 1 de Setembro de 2005, conforme consta em cópia do contrato de arrendamento que envio em anexo. Este senhor ocupou a casa desde essa data até ao fim do mês de Abril de 2010.
Os recibos emitidos ao inquilino já não os tenho, uma vez que já se foi embora há três anos. Informo ainda que este senhor trabalhava como camionista, segundo me disseram, mas não tenho conhecimento do local nem para quem trabalhava.”
Foi ainda notificado o Instituto de Emprego e Formação Profissional através do ofício ...95 de 2013.07.09, tendo sido recebida a seguinte informação (anexo ...):
“AA... recebeu subsídio de desemprego nos períodos compreendidos entre 2009.11.08 a 2010.04.10 e 2010.11.19 a 2011.02.26”.
Trabalhou desde 2001 sucessivamente para as empresas T...--- (2001, 2002, 2004 e 2005), TE--- (2007 e 2008), BB--- (2011) e depois o Fundo de Garantia Social (desemprego em 2008 e 2011) conforme print em anexo 9.
MV... tem domicílio fiscal na Rua (…) e não possui quaisquer bens móveis ou imóveis. Deslocámo-nos ao domicílio fiscal, que é propriedade de AO…, moradora na Rua (…), que nos informou que ocupou a casa até 2009. Notificado através do ofício ...90 de 2013.07.09, respondeu-nos (entrada ...31 de 2013.07.11 em anexo 10) que "O Sr. MV... ocupou a casa entre 1 de Maio de 2001 e Novembro de 2002, que trabalhava para a T...,Lda". Exibiu-nos ainda um contrato de arrendamento entre o senhorio e a T...--- e 4 recibos de renda emitidos para esta empresa.
Do ofício recebido do IEFP nada consta a nível de recebimento de subsídio de desemprego.
Trabalhou desde 2002 para as empresas T...--- (2002) e BB--- (2011), conforme print em anexo 11.
Das diligências efetuadas tudo indica que ambos se tenham ausentado de Portugal em 2011.
4.3.2. Aquisição da sociedade
Em 16 de Julho de 2013 deslocámo-nos a Amarante (com a chefe de divisão GF…) onde reside o anterior sócio da BB---, JC..., NIF (…), telemóvel (…), onde ouvido em auto de declarações em anexo 12, nos declarou o seguinte:
“1. Que possuía uma sociedade por quotas de nome T...,Lda, com sede em (…) com a atividade de transporte rodoviário de mercadorias, com alvará para transportes nacionais de mercadorias, mais propriamente animais vivos, possuindo licenciados os veículos matriculas (…) e (…).
2. Que em inícios de 2011 alienaram as suas quotas, tendo alienado o alvará de transportes rodoviários de mercadorias n° 4165/1999 que abrange apenas o mercado nacional, mas as viaturas ficaram para os sócios, ficando os adquirentes apenas com o alvará. Foi-lhe paga a quantia de 1.500,00€ em dinheiro.
3. Que nunca conheceu os adquirentes das quotas, tendo o negócio sido conduzido por um Sr. DD… que se dizia empregado de escritório, e tendo recebido deste a quantia de 1500 euros à porta do Cartório, quando ia para fazer a escritura. O número de telemóvel deste Sr. DD... é (…). Afirma ainda que teria cerca de 35 anos e estatura média.
4. Mais informou que as suas faturas eram impressas tipograficamente e preenchidas manualmente.”
De referir que o número de telemóvel indicado coincide com o a nós fornecido pelo Sr. DD..., sócio gerente da A..., LDA---.
4.3.3. Elementos recolhidos no TOC
Dirigimo-nos em 16 de Julho de 2013 (com a chefe de divisão GF...) às instalações do TOC da empresa, EE..., NIF (…), que tem o gabinete de contabilidade AG..., Lda, na Rua (…), onde procedemos às seguintes diligências:
ü Recolha de 2 pastas de documentos da BB--- de 2011;
ü Audição em declarações da TOC.
Em auto de declarações (anexo 13) esta declara-nos o seguinte:
“1. Executou a contabilidade de Março a Dezembro de 2011 tendo efetuado contatos apenas com o sócio da empresa T....., AA..., por telefone e por mail. Os documentos eram enviados pelo correio, e não conhece quaisquer instalações a partir das quais a empresa desenvolva a sua atividade. Nunca teve qualquer contato com o outro sócio da empresa. Apesar de várias vezes ter solicitado os documentos em falta a fim de executar a contabilidade, nomeadamente a abertura de uma conta bancária exclusiva da empresa, tal não lhe foi facilitado, pelo que decidiu rescindir o contrato em 21 de Março de 2012 e escusa de assinatura perante a Ordem dos TOC. Desde esta data nunca mais teve contato com a empresa ou com os sócios.
2. Já a documentação de 2012 foi remetida ao cliente mas veio devolvida pelo correio.
3. Quais os bens do ativo imobilizado que possui, nomeadamente camiões e outro equipamento de transporte. Apenas tem conhecimento de um empilhador cujo documento consta na contabilidade, e lembra-se de ter visto o sócio sair de um camião TIR quando combinou encontrar-se com ele para que lhe entregasse os documentos de contabilidade, mas desconhece a propriedade do camião.
4. Quantos funcionários tinha a empresa, quais as funções, e se faziam descontos para a Segurança Social. Eram os dois sócios sendo um deles motorista e relativamente ao outro desconhece as funções que exercia. ”
4.3.4. Análise aos documentos
Os documentos recolhidos perante a TOC referem-se exclusivamente ao exercício de 2011 e compõem-se de:
> Faturas emitidas para a A..., LDA--- e outros clientes, estes representando cerca de 1,5% do total da faturação;
> Faturas dos fornecedores A..., LDA--- (subcontratação), F..., Lda--- (subcontratação), AR...--- (equipamentos e gasóleo), AG..., Lda---. (contabilidade) e AS..., Lda (gasóleo);
> Processamentos de salários, recibos de vencimentos e mais alguns documentos com pequenas despesas.
4.3.4.1. Análise ao fornecedor AR...---
O contribuinte AR..., NIF (…), tem a sua sede na Trv. (….), e encontra-se coletada no 1° SF de Gaia pela atividade de comércio de outros veículos automóveis, CAE 45190, desde 2007.06.11.
Possui em seu nome 7 camiões (no sistema informático), não entregou qualquer declaração periódica de IVA desde Dezembro de 2009 inclusive, não entregou as declarações modelo 22 de IRC de 2009, 2010, 2011 e 2012 nem as respetivas IES, e possui execuções fiscais.
Constavam na contabilidade os seguintes documentos emitidos por esta empresa (anexo 14):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Verificou-se que:
- Não existem na contabilidade quaisquer meios de pagamento para quitar estas faturas.
- Não foi possível qualquer contato telefónico com este contribuinte nem com o sócio.
- Não se vislumbram na IES quaisquer fornecimentos efetuados a esta empresa neste exercício, que lhe permita efetuar tais vendas.
4.3.4.2. Análise ao fornecedor L..., Lda, NIF (…)
Este contribuinte tem a sua sede na Rua (…), e encontra-se coletado no 1º SF de Santa Maria da Feira pela atividade de comércio a retalho de combustíveis, CAE 47300, desde 1965.02.24. Tem cumprido regularmente as suas obrigações fiscais.
Constavam na contabilidade os seguintes documentos emitidos por esta empresa (anexo 15):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Verificou-se que:
- Qualquer das vendas a dinheiro não indica qualquer matrícula de viatura;
- Não é possível entre 15/6 e 16/6 ou entre 8/7 e 9/7 consumir o gasóleo indicado nos documentos, respetivamente de 923,78 litros e de 962,10 litros.
4.3.4.3. Análise ao fornecedor F..., Lda, NIF (…)
Este contribuinte tem a sua sede na Travessa (…), e encontra-se coletado no 2º SF de Gaia pela atividade de Transportes rodoviários de mercadorias, CAE 49410, desde 2008.02.18 (cadastro em anexo 16).
Tem cumprido regularmente as suas obrigações fiscais.
Constavam na contabilidade várias faturas emitidas por em nome desta empresa apresentando-se seguidamente o resumo mensal, em anexo 17 o resumo detalhado, e em anexo 18 as cópias das faturas:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


Ao valor das faturas acresce o respetivo IVA à taxa normal.
Da análise ao sistema informático constatou-se que as declarações periódicas de IVA apresentadas pelo sujeito passivo refletem os seguintes valores (cópias em anexo 19):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Contatada a empresa através do número indicado nas faturas (…) respondeu-nos outra empresa de Leça da Palmeira que nada tinha a ver com esta. Contatada através do número de telefone que consta no cadastro (…) responderam-nos de uma casa particular que nada tinha a ver com a empresa. Foi finalmente obtido contato através da TOC, FF... (…) que nos forneceu o telefone do sócio gerente GG…. (…), tendo sido combinado deslocar-se à Direção de Finanças no dia 30 de Setembro de 2013, mas o mesmo não compareceu.
Foi entretanto solicitado por mail o extrato de conta do cliente BB---, bem como uma fatura a título ilustrativo emitida pela F..., Lda---.
Em resposta (anexo 20) o contribuinte informa-nos que:
“Após consulta de conta corrente com este nome de cliente, não tenho uma única fatura na contabilidade deste cliente. E após contato com a gerência, confirma-se que nunca os T...,Lda foram seus clientes. ”
Da observação de duas faturas que se encontram na contabilidade da BB--- e da enviada pela F..., Lda--- é possível verificar que são totalmente distintas, e que comparando por exemplo a fatura ...04 com a 216 verifica-se que numa delas o valor aparece formatado (4.150,00) e noutra não (4150,00), o que não é possível num programa de faturação, mas é facilmente executado numa folha de cálculo como o Excel, comprovando-se ainda o alinhamento dos dados das faturas em termos de colunas, bem como os diferentes alinhamentos dentro de células, como por exemplo “Requisição”, “Taxa”, “Valor”, encontram-se alinhados à esquerda, já a descrição ou a data aparecem centradas.
Junta-se as 2 faturas da contabilidade da BB--- em anexo 21 e a fatura fornecida pela F..., Lda--- em anexo 22.
De referir ainda que as faturas ...7, ...83 e ...90 se encontram emitidas duas vezes com a mesma numeração e com valores ou designações diferentes. Possivelmente o emitente esqueceu-se de alterar o número na folha de cálculo.
4.3.4.4 Subcontratação e Prestações de Serviços
Da análise das subcontratações efetuadas pela BB--- a título de transportes, e das faturas emitidas também a título de transportes, tendo em conta que não foi possível obter a documentação de 2012, pois os documentos em posse da TOC não apresentavam relevância para a análise, e consequentemente a possível faturação da F..., Lda---, obtêm-se os seguintes resultados comparativos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Donde se comprova claramente em função do atrás descrito que as faturas que titulam quer as aquisições, quer as transmissões, não titulam operações reais.
4.4. Análise aos meios de pagamento
Como o montante faturado da BB--- para a A..., LDA--- é superior ao faturado desta para aquela, os pagamentos são feitos na sua maioria por encontro de contas. O restante é pago por cheques, tendo extraído a título meramente exemplificativo alguns dos cheques supostamente utilizados para pagamento, e que se juntam em anexo 23.
De notar que os cheques são emitidos a favor de “T...,Lda”, e assinados pela gerente HH....
Na sequência da autorização concedida pelo contribuinte para acesso ás contas bancárias, solicitou-se aos Banco 1... fotocópias de frente e verso dos mesmos cheques.
Analisada a resposta (anexo 24) verificou-se o seguinte:
- Que os cheques emitidos não fazem qualquer referência à empresa BB---;
- Que os cheques foram todos levantados ao balcão (alguns deles até indicam as quantidades de notas em que foram recebidos), uns pela mesma gerente HH… (e também cunhada do sócio II....), outros por AC..., esposa do sócio gerente II.....
Concluindo-se assim que a A..., LDA--- depois de emitir os cheques inscreve nos “cepos” a designação da empresa BB---, tentando assim arranjar uma prova de pagamento.
5. Irregularidades na faturação
Conforme se pode visualizar pelo resumo da faturação, apesar de possuir apenas 3 tratores o contribuinte fatura mais que 3 viagens com saída no mesmo dia.
Não obstante a distância percorrida nas diversas viagens efetuadas, muitas delas têm saída num dia e regresso no mesmo, conforme se pode verificar em algumas faturas em anexo 25, extraídas a título meramente exemplificativo, bem como através da listagem da faturação em anexo atrás referido.
6. Derrogação do sigilo bancário
O contribuinte autorizou o acesso às contas bancárias da empresa, conforme documento em anexo 26.
Foram assim notificadas as entidades bancárias para fornecer extratos de conta bem como cópias de diversos documentos, nomeadamente frente e verso de cheques:
Banco 2... São João da Madeira Conta (...)
Banco 1... São João da Madeira Conta (…)
Após consulta dos extratos de conta foram solicitadas cópias de frente e verso de alguns cheques, tendo-se concluído que:
- Os cheques do Banco 1... solicitados, referentes a pagamentos efetuados à BB---, foram, conforme anteriormente referido, levantados ao balcão pela sócia HH… e pela mulher do sócio, AC…;
- Os cheques do Banco 2... foram quase todos emitidos ao portador e levantados ao balcão por HH... (sócia gerente), AC... (esposa do sócio gerente) e JJ..., NIF (…), este com rendimentos recebidos da empresa R..., Lda, de São João da Madeira, NIF (…);
- Conforme dito anteriormente existem um número mínimo de cheques que foram passados à ordem de fornecedores e depositados em conta.
7. Análise da conta devedora da empresa T..., SA, NIF (…)
O saldo da conta fornecedora desta empresa, 2211024 - TE---, apresenta em 2009.11.30 um saldo devedor de 270.365,36€ (extrato em anexo 27). Em 2009.12.31 é feita uma transferência do saldo devedor desta conta para a conta 2783 – Outros Credores - T..., SA, na importância de 235.825,02€.
A conta 22111024 - TE--- (redenominada) não tem movimento em 2010, e em 2011 o saldo devedor evolui para 69.080,68€ (extrato em anexo 28). Em 2012 não apresenta qualquer movimento pelo que mantém o saldo devedor igual, conforme balancete final de 2012 (anexo 29).
A conta 2783 evolui em 2010 para um saldo devedor de 235.674,17€ (anexo 30) em 2011 para 228.490,94€ (anexo 31), agora redenominada “Outros Credores - Passivo não corrente”, e em 2012 não apresenta qualquer movimento permanecendo o saldo idêntico conforme balancete em anexo 32.
Tratando-se de um saldo devedor de uma conta corrente de um fornecedor, que seria obrigatoriamente credor, foi o contribuinte notificado (anexo 4) para:
- Explicar o conteúdo dos movimentos desta conta;
- Caso se trate de uma empresa insolvente ou falida, enviar comprovativos da reclamação dos respetivos créditos.
Em resposta (anexo 6) o contribuinte fornece as seguintes explicações:
- “Os valores constantes no balancete dizem respeito a um adiantamento ao fornecedor TE---”
- "Como entrou em dificuldades económicas (...) tivemos necessidade de adiantarmos o pagamento de salários e custos com a deslocação das viaturas”-,
- "Como prova da documentação de suporte, enviamos relação de movimentos dos quais servem de suporte da saída do dinheiro para a TE---”,
- “De referir que na parte final da laboração da TE---, esta não nos enviou parte da faturação de serviços a nós prestados por motivos que desconhecemos”,
- “Uma vez que tivemos conhecimento de que a empresa TE--- já não dispunha de bens, não reclamámos os créditos como também não criámos imparidades”
- “Sempre reclamámos quer por telefone ou pessoalmente a dívida”.
Primeiro não se entende qual o objetivo de transferir o saldo para uma conta “escondida” quando deveria ter sido para uma conta de Adiantamentos a Fornecedores, e posteriormente redenominá-la eliminando o nome da TE---.
Quanto aos documentos suporte enviados, tais consistem em:
- extrato de conta corrente do fornecedor, de 2008 e 2009;
- lista de cheques passados para adiantamentos de serviços em 2008 e 2009.
Relativamente à listagem de cheques apresentados, em que não é possível verificar quem os levantou, através das cópias de frente e verso enviadas pelo Banco 2... (anexo 33) constatou-se que:
- O cheque ...51 no valor de 20.000,00€ foi levantado ao balcão pelo atrás referido JJ...;
- Os cheques ...15, ...61, ...43, ...52 e ...82, respetivamente nas importâncias de 12 mil euros, 10 mil euros, 59 mil euros, 25 mil euros e 11 mil euros foram levantados ao balcão por AC..., esposa do sócio da A..., LDA---;
- Que AC... foi administradora da empresa TE--- até 2009.
8. Conclusões
A partir do explicado neste relatório é possível estabelecer o seguinte articulado:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

8.1. Da empresa AR...---
A empresa AR...--- é um não declarante em IVA e IRC e não efetuou aquisições que lhe tenham permitido efetuar as vendas à empresa BB---.
Não existe qualquer prova de pagamento das transações.
8.2. Da empresa F..., Lda---
A empresa F..., Lda--- tem cumprido com regularidade as obrigações fiscais e as suas faturas são totalmente diferentes das encontradas na contabilidade da BB---. As faturas constantes na contabilidade da BB--- teriam sido forjadas por estes, não sendo da responsabilidade da F..., Lda---.
8.3. Da empresa BB---
A empresa BB--- é não declarante, não possui instalações nem equipamentos que lhe permitam efetuar os serviços faturados à A..., LDA---.
Forjou ou mandou forjar diversas faturas em nome da F..., Lda--- com vista a diminuir o IVA a entregar resultante da faturação emitida para a A..., LDA---.
Não possui meios humanos, financeiros ou materiais para executar as prestações de serviços à A..., LDA---.
Não existem quaisquer comprovativos do pagamento das faturas à F..., Lda--- ou à AR...---.
Serviu-se de documentos de gasóleo e outras aquisições emitidos pela empresa AR...--- com o intuito de diminuir a entrega de IVA nos cofres do Estado, e assim poder continuar a emitir faturas com IVA para a A..., LDA---.
8.4. Da empresa A..., LDA---
A empresa A..., LDA--- não possui meios materiais e humanos para efetuar os transportes constantes nas faturas emitidas para a BB---.
Os meios de pagamento supostamente utilizados para efetuar pagamentos à BB--- foram levantados por amigos, familiares ou sócios da própria empresa, nada provando tratar-se de pagamentos ao fornecedor BB---.
Através da simulação de serviços prestados à BB--- e isentos de IVA, e da utilização de faturas falsas emitidas pela BB--- com IVA liquidado, obteve montantes de crédito de IVA e solicitou diversos reembolsos no valor global de cerca de 285 mil euros, dos quais lhe foram pagos cerca de 255 mil euros.
Com este comportamento o sujeito passivo assumiu uma conduta ilegítima tipificada no artº 103° do RGIT, que visou a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias.
A fraude fiscal pode ter lugar por:
a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável,
b) Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária;
c) Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.
Tratando-se no caso em apreço de uma celebração de negócio simulado, o contribuinte obteve a vantagem ilegítima do IVA faturado pela empresa BB---, e recebeu reembolsos indevidos na importância do IVA contido nestas faturas que contabilizou na sua contabilidade.
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
(…)
III.2. Em sede de IVA
III.2.1. Exercício de 2011
O sujeito passivo deduziu indevidamente IVA em faturas emitidas pela BB--- que não correspondem a transações reais, por infração ao artº 19° do Código do IVA, nas seguintes importâncias:
(…)
III.2.1. Exercício de 2012
O sujeito passivo deduziu indevidamente IVA em faturas emitidas pela BB--- que não correspondem a transações reais, por infração ao artº 19° do Código do IVA, nas seguintes importâncias:
Mês / Ano BT IVA
Jan-2012 78.300,00 18.009,00
Fev-2012 107.650,00 24.759,50
Mar-2012 125.400,00 28.842,00
Abr-2012 108.500,00 24.995,00
Mai-2012 72.500,00 16.675,00
Total 492.350,00 113.240,50
(…)
IX. DIREITO DE AUDIÇÃO
O contribuinte foi notificado através do ofício ...47 de 2013.10.03, para nos termos do artº 60° da LGT exercer caso quisesse o direito de audição aí previsto. Até à data limite (2013.10.22) o contribuinte não apresentou qualquer documento, pelo que as conclusões do projeto de relatório se convolam em definitivas, elaborando-se o presente relatório final e os documentos de correção, e levantando-se o respetivo auto de notícia.(…)”
[Cfr. relatório inspetivo constante do procedimento administrativo inserto nos presentes autos].
C. Sobre aquela proposta recaiu o seguinte parecer do chefe de equipa:
“Confirmo.
A visita efectuada a esta empresa destinava-se a verificar a conformidade de pedido de reembolso solicitado pela mesma, para o período de Abril de 2012 e com o valor de 30.006,52 €.
No decurso da inspecção e após análise da contabilidade e de terem sido feitas diversas diligências junto de operadores com a mesma relacionados, veio a constatar-se que a empresa contabilizava facturas de aquisições de serviços que não têm correspondência com a realidade e que lhe permitiam ir acumulando crédito de IVA a seu favor, que. Conforme relatado, se considera deduzido de forma indevida. O valor de IVA apurado como tendo sido deduzido de forma indevida é de 104.565.05 € em 2011 e de 113.240.50 € em 2012, valores que agora nos propomos corrigir.
Em sede de IRS veio a demonstrar-se que foram levantados diversos cheques que estavam contabilizados como adiantamentos a empresa fornecedora de serviços da visitada, tendo no entanto os respectivos valores sido canalizados para os sócios da A..., LDA---. Assim sendo, tais valores revestem, nos termos legais, a condição de adiantamentos por conta de lucros pelo que deveriam ter sido tributados em IRS e o valor apurado deveria ter sido depositado nos cofres do Estado, o que não se verificou.
Assim, propõe se a correcção do respectivo imposto não retido e não entregue, com referência ao ano de 2011 e com o valor de 49125,55 €.
Notificado o contribuinte para, se assim o desejasse exercer o direito de audição por um prazo de quinze dias, verifica-se, findo aquele prazo, que tal direito não foi exercido, pelo que são de manter inalterados os valores já antes propostos para correcção. Para conclusão do procedimento, foram elaborados dois DC Únicos para os anos de 2011 e de 2012 e respectivos documentos de correcção de IVA e de IRS (por falta de retenção para o ano de 2011). Foram ainda levantados dois autos de notícia sendo um por contra-ordenação e outro por crime fiscal.
À consideração superior.”
[Cfr. parecer aposto no rosto do relatório inspetivo constante dos autos].
D. As correções propostas foram sancionadas hierarquicamente mediante o seguinte despacho:
“O presente relatório conclui o procedimento de inspeção nos termos do art° 62 ° do RCPIT.
O S.P. não exerceu o direito de audição previsto no art° 60° da LGT e artº 60° do RCPIT, donde, são de manter os valores propostos no projecto de relatório, contendo correções referentes aos anos de 2011 e 2012.
Assim, concordo com as correções técnicas, propostas e descritas no ponto III:
- em sede de IVA: por imposto deduzido indevidamente, com base em faturas que não titulam operações reais ou efetivas.
- em sede de IRS retenções na fonte por adiantamento por conta de lucros referente a importâncias recebidas pelos sócios.
Dê-se sequência aos DCÚnicos, e aos competentes autos de notícia.
Foi ainda analisado o pedido de reembolso de IVA, referente ao período 12.04, que será de deferir, no entanto com a ressalva de que foram apuradas deduções indevidas de imposto.
Foi elaborado a competente informação do pedido de reembolso, à DSReemb./IVA, por transmissão electrónica de dados. (…)”
[Cfr. despacho aposto no rosto do relatório inspetivo constante dos autos].
E. Em razão da decisão constante do facto precedente foram emitidas as seguintes liquidações de IVA:
ü Liquidação de IVA do ano de 2012, mês de março, n.º ...06, no valor de EUR 0,00;
ü Liquidação de IVA do ano de 2012, mês de maio, n.º ...71, no valor de EUR 30.559,42;
[Cfr. registos informáticos das notas de cobrança constante do procedimento administrativo – peça do SITAF n.º ...37].
F. As liquidações referidas no facto precedente deram origem à emissão das seguintes notas de cobrança
ü Respeitante a março de 2012 n.º ...04, no valor de EUR 30.559,42;
ü Respeitante a maio de 2012 n.º ...05, no valor de EUR 18.151,82;
[Cfr. registos informáticos das notas de cobrança constante do procedimento administrativo – peça do SITAF n.º ...37].
G. Em razão da falta de pagamento das notas de cobrança constantes do facto precedente foram instaurados os seguintes processos executivos
ü Processo 00942014______ para cobrança de EUR 30.559,42 e acrescido;
ü Processo 009432014______________ para cobrança de EUR 18.151,82 e acrescido;
[Cfr. registos informáticos das notas de cobrança constante do procedimento administrativo – peça do SITAF n.º ...37].
H. A dívida exequenda remanescente constante dos processos de execução fiscal referidos no facto precedente foi revertida sobre o Impugnante, nos valores de EUR 22.637,28 e EUR 16.215,66, respetivamente
[Cfr. resulta da posição das partes expressa nos articulados, do teor da informação do SF prévia ao envio da reclamação graciosa para decisão e dos montantes em dívida constantes dos registos informáticos das notas de cobrança antes referidos].
I. A Impugnante contabilizou no ano de 2012 as faturas consideradas falsas pela Inspeção Tributária, deduzindo o IVA nelas mencionado.
[Facto incontrovertido e que emerge do relatório inspetivo constante do procedimento administrativo inserto nos presentes autos].
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão.
Motivação da matéria de facto:
No que respeita à fundamentação, a convicção do Tribunal baseou-se essencialmente numa apreciação crítica [artigos 396.° do Código Civil e 607.°, n.º 5 do CPC, ex vi do art.º 2.° do CPPT], e à luz das regras da experiência comum, do exame da globalidade dos documentos juntos aos autos, incluindo os constantes do procedimento administrativo apenso, não impugnados.
No que concerne ao ónus da prova e sua repartição, tal matéria será objeto de desenvolvimento adiante.”

2. O Direito

O Recorrente insurge-se contra a sentença recorrida, alegando erro de julgamento. Nas primeiras conclusões, tece vários considerandos, que se nos afiguram ajustados, acerca da prova em que assentou a decisão sob escrutínio, ou seja, essencialmente na prova documental, consubstanciada no teor do relatório de inspecção tributária (RIT).
De todo o modo, insiste o Recorrente não existir qualquer presunção de veracidade ou força probatória especial quanto a juízos formulados pela Administração Tributária, factos conclusivos, asserções subjectivas ou proposições lógico-dedutivas, em especial aquelas cujas premissas não se encontrem objectivamente demonstradas nos autos.
Na nossa situação, o tribunal recorrido optou por reproduzir parcialmente o teor do RIT na decisão da matéria de facto (cfr. ponto B, de onde decorre que foi elaborado RIT, destacando-se que as correcções propostas pela inspecção tributária tiveram a fundamentação cujo teor se mostra transcrito por extracto), considerando-se tal técnica prática e útil, pois dá a conhecer toda a factualidade que consubstancia a declaração fundamentadora do acto de liquidação impugnado, porquanto é essencial conhecer-se a motivação do acto impugnado, de modo a que este tribunal a possa sindicar e analisar se a Administração Tributária demonstrou os pressupostos que a legitimam a proceder às correcções aqui em causa.
O cerne do recurso interposto passa, assim, por saber se a sentença errou na valoração da matéria de facto e, consequentemente, se errou ao concluir que a Administração Tributária fez prova, como estava onerada, da existência de indícios sérios e sólidos que levassem à conclusão de que as facturas contabilizadas pela devedora originária, de que o Recorrente é responsável subsidiário, não correspondiam a reais operações.
In casu, o teor do relatório de inspecção tributária (lido em articulação com os seus anexos) permite sindicar se a AT reuniu os factos-índice suficientes para efectuar as correcções em causa.
Sustenta o Recorrente ocorrer notório erro de julgamento quando o Tribunal “a quo”, no seu juízo decisório, se fundamenta em meras conclusões, juízos subjectivos, extraídos directa e acriticamente do relatório de inspecção tributária. O que faz recorrendo a transcrições de sumários, excertos de meras conclusões vertidas no relatório de inspecção, maxime, páginas 35 a 37 da sentença recorrida.
O tribunal recorrido transcreveu apenas parcelarmente o RIT, mas tal não significa que o mesmo não deva ser considerado na globalidade, tanto mais que o RIT só poderá ser interpretado de forma cabal se totalmente considerado e em articulação com os seus anexos, bem como com os esclarecimentos que foram prestados na sequência de solicitação em sede inspectiva.
Em rigor, o Recorrente não impugnou propriamente a factualidade dada como provada, mas sim as ilações que o tribunal a quo daí retirou quanto aos indícios de falsidade invocados pela Administração Tributária (que é a matéria que se imporá analisar).
Não se tendo efectuado qualquer alteração à decisão da matéria de facto, mostra-se estabilizado o probatório; vejamos, então, se a factualidade recolhida em sede inspectiva suporta as correcções praticadas e impugnadas e se a subsunção jurídica dos factos foi, ou não, correctamente efectuada.
É sabido que a circunstância de as operações se encontrarem documentadas em factura e recibo e terem sido devidamente inscritas na contabilidade faz presumir a existência da operação; mas, tal presunção deixa de se verificar, nomeadamente, quando a contabilidade ou escrita do contribuinte revelarem indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (artigo 75º, nº 1 da Lei Geral Tributária). Portanto, se a administração tributária recolher indícios fundados de que os documentos de suporte, apesar de formalmente correctos, não reflectem uma verdadeira transacção (seja relativamente aos sujeitos, objecto, datas, valores), cessa a presunção de veracidade das operações constantes de tais documentos.
Por outro lado, é jurisprudência pacífica, reiterada e uniforme, quando a liquidação adicional de IVA tem por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais legitimadores da sua actuação constantes do artigo 82.º, n.º 1 do CIVA, ou seja, assentando o juízo da administração tributária na consideração de que as operações e o valor a que se referem as facturas em causa não correspondem à realidade, terá de demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas facturas foram simuladas.
Feita essa prova, cabe ao contribuinte o ónus da prova de que as operações económicas que estiveram subjacentes à dedução do imposto (artigo 19.º do CIVA), se realizaram efectivamente - neste sentido, entre muitos outros, acórdãos do STA, de 24/4/2002, Recurso nº 102/02; de 23/10/2002, Recurso nº 1152 /02; de 9/10/2002, Recurso nº 871/02; de 20/11/2002, Recurso nº 1483/02; de 30/4/2003, Recurso nº 241/03; de 14/1/2004, Recurso nº 1480/03 e do TCAN, por todos, acórdão de 24/1/2008, Processo 01834/04.
Isto posto, cumpre averiguar se a administração tributária fez prova, como lhe competia, da existência de indícios sérios e objectivos, susceptíveis de permitir a conclusão de que as facturas contabilizadas pela sociedade originária não correspondem a reais operações, e, nessa medida, pela indevida dedução do respectivo IVA.
Todavia, a administração tributária não tem de fazer a prova directa da simulação, isto é, a prova dos pressupostos exigidos pela lei civil para que se verifique a simulação (cf. artigo 240.º do Código Civil), sendo suficiente a prova indirecta a factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova ” (cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Coimbra, 1972, p. 154).
Os indícios são definidos por João de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” - citado por José Luís Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2 edição, p. 311.
Não perdendo de vista o enquadramento jurídico gizado relativamente ao ónus da prova aplicável às correcções em causa e considerando os factos apurados em sede inspectiva (que outros não podem ser relevados), vejamos, insistimos, se resulta dos factos relatados que a administração fiscal fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir que as questionadas facturas não tiveram subjacentes quaisquer operações económicas.
Relembramos que a inspecção em causa foi motivada pelo pedido de reembolso de IVA e que, nestes autos, apenas estão em crise as liquidações referentes a Março e Maio de 2012.
Verificou a inspecção tributária que, a partir de Abril de 2011, a A..., LDA--- (sociedade originária) começou a facturar à T...,Lda. (BB---) transportes internacionais para vários países da União Europeia, como Roménia, Alemanha e França (de facto, a sua actividade reconduzia-se a transportes nacionais e internacionais de mercadorias), que se encontravam isentos de IVA, nos termos do artigo 14.º, n.º 1, alínea q) do CIVA, e a empresa BB--- começou a facturar transportes dos mesmos países para Portugal com sujeição a IVA, permitindo a dedução do IVA pela A..., LDA---. Assim, a inspecção tributária concluiu não só que a A..., LDA--- simulou serviços prestados à BB--- isentos de IVA, como, na qualidade de utilizadora, deduziu IVA em facturas emitidas pela BB---, que não corresponderão a operações comerciais reais, pois também esta não terá prestado serviços de transporte à A..., LDA---.
Intrigou a fiscalização que as viaturas da A..., LDA--- viajem de Portugal para os países referidos e regressem vazias e que as viaturas da BB--- fossem vazias e regressem carregadas de mercadoria. Mas ficou por esclarecer o momento temporal, ou seja, se esta constatação se referia a transportes coevos.
Detectou, desde logo, ainda, a AT que a BB--- era um contribuinte não declarante e que o valor do reembolso do IVA era, em muito, originado pela facturação de serviços pela BB---.
Alega o Recorrente que o ónus de prova indiciária que recai, em primeira linha, sobre AT não se cumpre se apenas lança mão de meros juízos conclusivos, sem que proceda à análise da materialidade de cada uma das operações comerciais postas em crise, e assim se, quanto a cada uma dessas concretas operações, não carrear ao procedimento administrativo factos e elementos probatórios que, à luz de um juízo de razoabilidade, sejam aptos a pôr em crise a presunção de veracidade de que goza a escrita do contribuinte.
Ora, não podemos deixar de recordar constar do RIT que não foram detectadas irregularidades em termos formais na contabilidade da A..., LDA---, designadamente, nos documentos de suporte dos custos.
Alerta o Recorrente que os indícios externos não contêm elementos probatórios que os suportem e, nessa medida, não poderão ser sindicados pelo sujeito passivo e, em sede judicial, pelo próprio Tribunal. E, também, não existem indícios internos, sérios, credíveis e suficientes, suportados em factos objectivos, de que as operações não se realizaram.
Quanto a estes, na apreciação que o tribunal recorrido faz sobre a suficiência de indícios internos da falsidade das operações, a sentença recorrida remete para três transcrições do RIT:
“A empresa A..., LDA--- não possui meios materiais e humanos para efetuar os transportes constantes nas faturas emitidas para a BB---.”.
Trata-se, como alerta o Recorrente, de uma conclusão e não de um facto. Além do mais, o próprio RIT refere-se, de forma pouco precisa, aos meios humanos e aos veículos da sociedade originária. Aí se pode ler que a A..., LDA--- possui, em média, dois condutores, um funcionário para a logística e dois funcionários administrativos. Que possui 3 tractores e 8 galeras e instalações para armazenagem e grupagem das mercadorias.
Assim, as premissas em que assenta a conclusão de falta de meios materiais e humanos para efectuar os transportes poderão não ser pacíficas, espelhando um juízo de valor, sendo que a sentença recorrida deu de barato a conclusão sem apreciar criticamente os factos descritos no RIT a esse propósito.
Em termos objectivos, o RIT caracteriza a sociedade inspeccionada como dispondo de “instalações de armazenagem e grupagem de mercadorias”, não só em (...), mas também em Estrasburgo, França, onde dispõe de um armazém alugado de apoio à sua actividade transfronteiriça de transporte de mercadorias.
Por outro lado, a quantificação dos meios humanos e dos veículos não parece ter sido realizada com rigor, uma vez que está escrito no RIT “possui em média”. Julgamos assistir razão ao Recorrente quando evidencia que a abordagem do RIT omite os veículos que possa, eventualmente, deter em locação e que tem por referência o concreto ano em que decorreu a inspecção (2013) e não os anos inspeccionados (2011 e 2012). Nesta conformidade, apesar das insuficiências factuais, pois o RIT não revela detalhe, nem espelha exaustão nas diligências efectuadas quanto aos meios humanos e materiais, designadamente pela referência a médias, ainda assim, o que se extrai da caracterização feita no RIT sobre a actividade da sociedade, é que a mesma possui meios, humanos e materiais.
A dado momento, o RIT escancara que a A..., LDA--- só possui três tractores, mas que factura mais de três viagens com saída no mesmo dia (para distâncias de longo curso). Contudo, consta da resposta da sociedade originária ao pedido de esclarecimentos da inspecção tributária (cfr. anexo 6 ínsito no processo administrativo incorporado no SITAF) que os transportes são realizados pelos seus tractores e pelos fretados (pelos subcontratados): “(…) A maioria das n/vendas aos BB--- referem-se ao transporte de contentores vazios, sendo que os mesmos foram transportados pelos n/tractores e pelos pertencentes aos fretados ou seja subcontratados. (…)” Mais à frente, na mesma resposta, identificam-se os fretados como sendo “L”, “T” ou “R”, não constando do procedimento inspectivo que se tenham realizado quaisquer diligências junto destes subcontratados para averiguar a veracidade das declarações da A..., LDA---, por via da sua gerência.
A ser verdade que a A..., LDA--- subcontratava serviços de transporte, perde importância a ilação de que não possuía meios humanos e materiais para efectuar os transportes indicados nas facturas emitidas.
Quanto aos meios de pagamento, a AT concluiu nada provar tratar-se de pagamentos ao fornecedor BB---, mas não podemos esquecer que, do procedimento inspectivo, se pode retirar que a A..., LDA--- e a BB---, em grande parte das operações comerciais, entrariam em acerto de contas recíproco, dado que ambos os intervenientes faziam transportes (mútuos), tratando-se de uma linha, constituída por exportações e importações, e que, quando bem estruturada com mercadorias, circularia nos dois sentidos (mas que as exportações são superiores às importações em toda a Europa, como é esclarecido na resposta da A..., LDA--- – cfr. o mencionado anexo 6).
Por fim, a sentença recorrida fundamenta a suficiência de indícios internos pela expressão, que provém textualmente das conclusões do RIT, “Através da simulação de serviços prestados à BB--- e isentos de IVA, e da utilização de facturas falsas emitidas pela BB--- com IVA liquidado, obteve montantes de créditos de IVA (…).”
Trata-se, ostensivamente, de uma conclusão, pelo que não pode constituir premissa (facto) para concluir que a sociedade originária (A..., LDA---) simulou serviços prestados à BB--- isentos de IVA.
Com efeito, como bem alega o Recorrente, para se concluir que as operações foram simuladas e as facturas são falsas, não se pode partir, como premissa, de que houve “simulação de serviços prestados”, na medida em que se mostra indemonstrado qualquer facto nesse sentido.
A prova indiciária pressupõe um facto, demonstrado através de uma prova directa, ao qual se associa uma regra da ciência, uma máxima da experiência ou uma regra de sentido comum. Este facto indiciante permite a elaboração de um facto consequência em virtude de uma ligação racional e lógica. Num típico raciocínio silogístico jamais se pode partir de uma premissa que é, ao mesmo tempo, a conclusão.
Vejamos, agora, a conclusão de que a A..., LDA--- utilizou facturas falsas emitidas pela BB---. Tal ilação assentou nos seguintes indícios:
- A empresa BB--- é não declarante, não possui instalações nem equipamentos que lhe permitam efectuar os serviços facturados à A..., LDA---;
- Forjou ou mandou forjar diversas facturas em nome da F..., Lda--- com vista a diminuir o IVA a entregar resultante da facturação emitida para a A..., LDA---;
- Não possui meios humanos, financeiros ou materiais para executar as prestações de serviços à A..., LDA---;
- Não existem quaisquer comprovativos do pagamento das facturas à F..., Lda--- ou à AR...---;
- Serviu-se de documentos de gasóleo e outras aquisições emitidos pela empresa AR...--- com o intuito de diminuir a entrega de IVA nos cofres do Estado, e assim poder continuar a emitir facturas com IVA para a A..., LDA---.
Recordamos que as liquidações em discussão nos presentes autos são referentes a Março e Maio de 2012, ressaltando, desde logo, do RIT não ter sido possível obter documentação concernente ao ano de 2012 quanto às subcontratações efectuadas pela BB--- a título de transportes; pelo que não relevam quaisquer factos obtidos relativamente ao ano de 2011 no respeitante à F..., Lda---, à AR...--- ou ao fornecedor L..., Lda. Restam, pois, ilações meramente conclusivas no que tange à inexistência de meios humanos, financeiros ou materiais da BB--- para executar as prestações de serviços à A..., LDA---.
O juízo que se faça sobre a falsidade de factura, tendo de assentar em indícios sérios e seguros de que não representam operações reais, não pode basear-se em elementos isolados de prova (salvo se decisivos, que não é o caso), antes devendo ser ponderado o conjunto dos instrumentos de prova dos autos, quer eles respeitem à pessoa do emitente, ao utilizador da factura, ou a terceiros.
Ora, por todos os motivos que fomos deixando expostos, os indícios recolhidos são claramente muito frágeis, nomeadamente, por não estarem assentes em factos simples demonstrados ou por se mostrarem desfasados temporalmente das situações aqui em análise (Março e Maio de 2012).
Aqui chegados, e recuperando tudo aquilo que deixámos dito, é altura de concluirmos que, em nosso entendimento, no caso vertente não se verifica a existência de indícios sérios de que as facturas emitidas à sociedade originária não correspondam a operações reais, nem que as facturas por ela emitidas por serviços prestados à BB--- titulem operações simuladas.
Os elementos nos quais a Administração Tributária se apoiou para fundamentar a desconsideração de tais facturas apresentam-se manifestamente insuficientes e revelam a sobrevalorização de determinados elementos de prova indiciária, que nem se apresentam minimamente decisivos para concluir estar-se perante facturas falsas.
Não olvidamos que os indícios recolhidos devem ser analisados de forma global e integrada. Este tribunal teve necessidade, contudo, de proceder a uma análise individualizada de cada indício autonomizado pela AT, por um lado, porque alguns não são verdadeiros factos (factos-índice) e, por outro lado, porque o Recorrente (retius, a sociedade originária), ainda em sede inspectiva, apontou algumas explicações e esclarecimentos que não foram valorados, nem instruídos pela AT, designadamente, no que tange à alegada subcontratação (que se vislumbra como forma de suprir eventuais insuficiências dos meios humanos e materiais), apontando mesmo, o próprio RIT, para erros nos pressupostos dos factos-índice reunidos pela AT.
Somente após a estabilização e selecção da factualidade será possível verificar quais os factos a considerar, aí sim, de forma integral e articulada.
Realmente, como já ficou claro, algumas insuficiências/anomalias ou irregularidades apontadas foram apresentadas de forma conclusiva ou assentes em juízos de valor; basta pensar na falta de meios materiais e humanos para efectuar os transportes constantes nas facturas. Por outra banda, desconhecem-se as exactas relações comerciais em 2012 da BB--- com os seus fornecedores e/ou subcontratados, pelo que quaisquer ilações retiradas quanto ao ano de 2011 não deixam de configurar meras conjecturas na apreciação de facturas emitidas em 2012, não sendo admissível a extrapolação realizada pela AT.
Este exemplo serve apenas para espelhar a necessidade de uma abordagem prévia individual dos indícios, a fim de autonomizar os que poderão consubstanciar verdadeiros factos-índice. Na medida em que se constatou que todos eles são demasiado frágeis e insubsistentes, também vistos globalmente e no contexto específico da actividade da A..., LDA--- continuamos a concluir que seria imperiosa uma mais profunda e abrangente investigação da parte da AT.
Apesar de a prova que a AT tem que realizar não ter de ser directa e dogmática, no sentido de evidente e intocável, antes pode resultar de circunstâncias colaterais e indirectas que, atentas a idoneidade dos respectivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível; a verdade é que a AT não reuniu factos ponderosos e objectivos fortemente indiciadores de que as facturas em causa são falsas, não sendo suficiente, como vimos, apelando a um critério de bom senso e razoabilidade, suspeitar que estas operações comerciais não poderiam ter ocorrido entre os intervenientes em causa, e que se destinavam a avolumar o reembolso do IVA.
Deste modo, é de concluir que as liquidações de IVA impugnadas padecem de ilegalidade, devendo ser anuladas, tendo incorrido em erro de julgamento a sentença que assim não entendeu.
Urge, por isso, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação judicial procedente, anulando as liquidações impugnadas.

Conclusões/Sumário

I - No caso de facturas falsas, compete à Administração Tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação correctiva e, só caso o faça, passa a recair sobre o contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto.

II – Impõe-se, portanto, à Administração Tributária abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto e dos respectivos documentos de suporte, atento o princípio da declaração vigente no nosso direito (artigo 75.º da LGT), só depois passando a competir ao contribuinte o ónus de provar a veracidade do declarado, o que quer dizer que se a Administração Tributária não fizer prova do bem fundado da formação do seu juízo, a questão relativa à legalidade do seu agir terá de ser resolvida contra ela, sem necessidade de ir analisar se a Impugnante logrou ou não provar, em tribunal, a veracidade da declaração.

III - Tal prova não tem de ser directa e dogmática, no sentido de evidente e intocável, antes pode resultar de circunstâncias colaterais e indirectas que, atentas a idoneidade dos respectivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível.

IV – Para que a Administração Tributária obste à dedução de imposto mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. artigo 240.º do Código Civil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende.

V – Não tendo a Administração Tributária durante a inspecção constatado factos ponderosos e objectivos fortemente indiciadores de que as facturas que titulam diversas transacções comerciais são falsas, isto é, apenas servem de instrumento formal para com elas se poder deduzir o imposto nela referido, não cumpriu com o ónus da prova dos pressupostos que lhe é exigido e, por tal razão, não abala a presunção de verdade de que goza a escrita formalmente organizada da impugnante, nem determina a inversão do ónus da prova nos termos do artigo 74.º da LGT.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação judicial procedente, anulando-se as liquidações impugnadas.

Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias; sendo que, nesta instância, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.

Porto, 19 de Maio de 2022

Ana Patrocínio
Margarida Reis
Cláudia Almeida