Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00354/12.6BEBRG |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 10/30/2020 |
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Tribunal: | TAF de Braga |
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Relator: | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
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Descritores: | ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL/ARTIGO 30°, Nº 1, ALÍNEA C), DO REGULAMENTO DOS SISTEMAS PÚBLICOS E PREDIAIS DE DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA E DE DRENAGEM DE ÁGUAS RESIDUAIS DOS CONCELHOS DE GUIMARÃES E VIZELA/INSTALAÇÃO DOS RAMAIS DE LIGAÇÃO AOS CONSUMIDORES, UTENTES DAS FREGUESIAS DE SERZEDELO E GUARDIZELA/COBRANÇA DOS RESPECTIVOS MONTANTES. |
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Recorrente: | Município de (...) e Outro |
Recorrido 1: | V.-EMPRESA DE ÁGUAS E SANEAMENTO DE (...), E.I.M.S.A. |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Especial para Impugnação de Normas (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO ACOP-ASSOCIAÇÃO DE CONSUMIDORES DE PORTUGAL instaurou acção administrativa especial contra V.-EMPRESA DE ÁGUAS E SANEAMENTO DE (...), E.I.M.S.A. (posteriormente foram admitidos, como intervenientes, os Municípios de Guimarães e Vizela), todos melhor identificados nos autos, pedindo que se seja declarada a ilegalidade do art° 30°, nº 1, alínea c), do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais dos concelhos de Guimarães e Vizela - publicado no DR. 170, de 04/9/2007, habilitado pelo D.L. nº 207/94, de 06/8, entretanto revogado pelo D.L. n° 194/2009, e pelo Decreto Regulamentar nº 23/95, de 23/8, por violação do disposto nos artºs 282º e segs. do Dec. Reg. 23/95, de 23/8, e que a V. seja condenada, para além do mais, a abster-se de cobrar as quantias exigidas para a instalação dos ramais de ligação aos consumidores/utentes das Freguesias de Serzedelo e Guardizela; a restituir a cada um desses consumidores/utentes dessas freguesias, individualmente considerados os montantes cobrados ou a cobrar e a interromper, de imediato, o pedido/aceitação de pagamento parcelar, ora em curso, relativamente a esses mesmos consumidores/utentes. Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi julgada parcialmente procedente a acção e: -condenada a Ré V. a abster-se de proceder à cobrança de quantias relativas à instalação/ligação aos respectivos ramais de ligação aos consumidores das Freguesias de Airão (S. João Batista), Figueiredo, Leitões e Oleiros; -condenada a Ré V. na restituição das quantias cobradas a esse título aos consumidores das Freguesias de Airão (S. João Batista), Figueiredo, Leitões e Oleiros; -considerados improcedentes os demais pedidos formulados. Desta vêm interpostos recursos: Alegando, a Ré V. concluiu: 1º Foi fixada na matéria de facto um ofício do extinto IRAR- Instituto Regulador de Águas e Resíduos, com o nº 000575/2007, de 7 de Fevereiro de 2007, que a Autora juntou com a sua acção, e que versa sobre uma situação particular, a reclamação à facturação de ramais de ligação na freguesia da Marinha das Ondas (Figueira da Foz), e não foi considerado o parecer que a Ré juntou aos autos com a sua contestação da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, I.P. actualmente com a designação de ERSAR, emitido em 2011-05-20, sobre o assunto “tarifas de ramal de ligação”, de carácter geral e abstracto, o qual contém o entendimento actual e perfilhado pela entidade reguladora do sector sobre a matéria em causa nesta acção. 2º Dada a relevância deste parecer devia o mesmo fazer parte da factualidade fixada na sentença recorrida, sendo certo que é sobre a matéria de facto considerada provada que é formulado o juízo de direito. Impõe-se, assim, o aditamento de um novo facto, que passaria a ter o nº 6, com o seguinte conteúdo: “Pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, I.P. actualmente com a designação de ERSAR, foi emitido em 2011-05-20, um parecer sobre o assunto “tarifas de ramal de ligação”, do qual designadamente consta que a responsabilidade pelo pagamento dos custos de construção dos ramais de ligação é dos respectivos utilizadores e a legitimidade das entidades gestoras repercutirem esses custos através de tarifas especificas aplicadas por ocasião da construção dos ramais de ligação – conforme documento de fls. e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.” 3º Por outro lado, e, com todo o respeito, a sentença padece das nulidades estatuídas no art. 668º, nº1, al.s b) e c) do C.P.C. ex vi art. 1º do CPTA, porque não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão e porque os fundamentos da sentença estão em oposição com a decisão. 4º Na sentença recorrida o Meritíssimo Juiz considerou que o art. 30º nº 1 al. c) do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais (…) de Guimarães e Vizela não é ilegal, ao prever que o custeamento de tal operação (construção do ramal de ligação) deve ser suportado pelo respectivo utente, no entanto, tal custeamento não poderá ser feito cobrando directamente dos utentes as quantias, conforme vem sucedendo, e condenou a V. a abster-se de proceder à cobrança das quantias relativas à instalação/ligação aos respectivos ramais de ligação aos consumidores das freguesias de Airão (S. João Batista), Figueiredo, Leitões e Oleiros, e ainda a restituir-lhes as quantias já cobradas a esse título. 5º Esta norma regulamentar prevê a responsabilidade do utilizador pagar o respectivo ramal de ligação e a faculdade da V. lhe exigir tal pagamento e é ao abrigo desta e doutras normas, legais e regulamentares, que a V. vem cobrando dos utilizadores os custos da construção dos respectivos ramais de ligação. 6º Ora, se a norma do art. 30º do Regulamento não é ilegal fica-se sem saber, porque a sentença não o diz, porque razão a Ré V. não pode fazer a cobrança da forma como vem fazendo e qual a disposição legal que está a infringir ao actuar da forma como actua. 7º Não basta dizer-se que a V. não pode cobrar directamente dos utentes as quantias correspondentes aos ramais domiciliários, é necessário que se fundamente de facto e de direito as razões porque o não pode fazer. 8º Se uma das normas regulamentares ao abrigo da qual a Ré vem sustentando a cobrança de ramais domiciliários não é considerada ilegal, nem outras o foram, qual é então a norma jurídica que está a violar para não poder proceder à cobrança da forma como vem fazendo? A sentença recorrida não o diz. 9º Ora, para a Ré ser condenada a abster-se de proceder à cobrança das quantias relativas à instalação/ligação aos respectivos ramais de ligação e condenada a restituir as quantias já cobradas a esse título aos consumidores das freguesias de Airão (S. João Batista), Figueiredo, Leitões e Oleiros, é porque o Sr. Juiz considera a sua actuação ilegal, e se é ilegal é porque está a infringir normas legais, no entanto, a sentença recorrida não diz quais, sendo totalmente omissa quanto a isso, ou seja, não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão, o que constitui nulidade nos termos do art. 668º nº 1 al. b) do C.P.C. ex vi art. 1º do CPTA. 10º Acresce que os fundamentos da sentença estão em manifesta oposição com a decisão, na medida em que toda a fundamentação da sentença conduzia a uma decisão diversa da que foi proferida. 11º Com efeito, se atentarmos ao conteúdo da sentença recorrida verificamos que a mesma é praticamente uma reprodução do parecer do Ministério Público que considera que a acção devia ser julgada improcedente, mas apesar de a argumentação ser a mesma a decisão é oposta. 12º Ora, toda a argumentação desenvolvida ao longo da sentença aponta claramente no sentido de que cabe aos utilizadores pagarem os custos de construção dos ramais de ligação e que a cobrança desses custos pela entidade gestora é legítima, legal e justa, mas a decisão foi em sentido oposto e condenou a Ré V. a abster-se de cobrar tais quantias e ainda a condenou a reembolsar os consumidores das freguesias aqui representados pela Autora. 13º A sentença recorrida corporiza assim um vício lógico de raciocínio pois as suas premissas de facto e de direito impunham uma decisão e acabou por extrair outra oposta. 14º Como tem sido entendimento da nossa jurisprudência, uma sentença é nula “quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, isto é, quando os fundamentos invocados devessem, logicamente, conduzir a uma decisão diferente da que a sentença ou acórdão expressa (A. dos Reis, C.P.C. Anotado, 5º- 141: A. Varela, Manuel 1ª Edição, pág. 671). 15º A sentença recorrida padece assim da nulidade prevista no art. 668º nº 1 al. c) do C.P.C. ex vi art. 1º do C.P.T.A., dado que os seus fundamentos estão em manifesta oposição com a decisão. 16º A sentença recorrida enferma ainda de erro de julgamento. 17º É hoje entendimento generalizado quer da doutrina, quer da jurisprudência, que a responsabilidade pelo pagamento dos custos de construção dos ramais domiciliários é dos respectivos utilizadores e que as entidades gestoras dos sistemas públicos de água e saneamento têm a faculdade de lhes exigir tais custos não obstante os mesmos integrarem, com a sua construção, a rede do serviço público respectivo. 18º Neste sentido decidiram já tribunais judiciais, conforme sentenças que foram juntas aos autos pela Ré na sua contestação, e recentemente também o Tribunal Central Administrativo do Norte, no seu acórdão de 22.02.2013, proc. nº 180/08.7BEBRG, disponível in www.dgsi.pt. 19º De facto, face ao quadro legal actual este é o entendimento certo e correcto, já não sendo válida a interpretação à contrario sensu do art. 283º do Decreto Regulamentar nº 23/95, de 23/08. 20º A questão que se pode colocar é a de saber de que forma os custos com a construção dos ramais de ligação podem ou devem ser repercutidos nos utilizadores: se de forma individualizada, ou seja, através de tarifas especificas aplicadas por ocasião da construção dos ramais de ligação, ou antes de forma difusa como mais um encargo a recuperar através das tarifas aplicadas mensalmente aos utilizadores do serviço (tal como a construção e manutenção das redes). 21º A existência de tarifas específicas de ramal constitui uma prática frequente dos municípios portugueses, embora a Entidade Reguladora se incline para considerar preferível a aplicação dos custos de forma difusa, ou seja, diluindo-os mensalmente com a respectiva factura, aos utilizadores do serviço, melhor dizendo, diluindo o preço do ramal ou no preço da água ou criando uma tarifa especifica a ser paga mensalmente pelos utilizadores. 22º No entanto, a cobrança de forma individualizada, ou seja, através de tarifas específicas aplicadas por ocasião da construção dos ramais de ligação, é uma prática legal e válida face ao quadro legal existente, como é considerado pela entidade reguladora e consta do seu parecer junto aos autos, sendo certo que, como a própria refere, existem apenas princípios gerais nesta matéria deixando-se ao critério das entidades gestoras a aprovação dos respectivos tarifários. 23º Este é o procedimento praticado pela Ré V., que se limitou a seguir a prática que vinha sendo aplicada pelos antigos SMAS - Serviços Municipalizados de Água e Saneamento da Câmara Municipal de Guimarães. 24º A opção pela forma individualizada permite a cobrança do custo do ramal no momento da sua entrada em serviço e de uma só vez, sendo dada a possibilidade ao utente de fazer um acordo de pagamento em prestações mensais sem juros e comprovada que seja, pelos serviços de acção social da Câmara Municipal, a incapacidade do utente fazer face aos custos associados à ligação aos sistemas públicos de abastecimento de água e drenagem de águas residuais, o mesmo poderá beneficiar de um subsídio previsto no Regulamento de Apoio a Estratos Sociais Desfavorecidos, ao passo que se a opção fosse o modo difuso, a totalidade dos utentes pagaria todos os meses e durante a vigência do contrato, junto com a sua conta de água, um montante para compensar este custo. 25º Ora, a alteração agora do modo de repercussão do custo da execução de ramais de ligação, no contexto actual e atentas as opções tarifárias assumidas no decorrer dos mais de cem anos de serviço público de abastecimento de água e 50 anos do serviço público de saneamento, criaria uma enorme injustiça na repartição dos custos do serviço, onerando todos aqueles que durante todo este tempo pagaram os seus ramais e veriam agora a sua factura agravada para pagamento dos ramais dos outros. 26º O Meritíssimo Juiz parece partilhar do entendimento da Ré, uma vez que na sentença refere na pág. 10/16, o seguinte: “A questão é a de saber como é que esses custos se devem repercutir nos beneficiários/utilizadores. Ora, efectivamente, revendo a nossa posição anterior sobre a matéria, a solução passará, não pela cobrança nos termos aqui discutidos nos autos, mas antes pela repercussão das quantias de forma individualizada, através de uma tarifa específica por ocasião da construção do ramal pois que a forma difusa de repercutir esse preço/custo da construção do ramal de ligação geraria situações de desigualdade e de desproporcionalidade em relação a alguns ou de utilizadores pois que o custo de instalação de ramal de ligação é relativa, dependendo essencialmente da extensão do mesmo”. 27º Contudo, ao finalizar a fundamentação da sentença já refere que tal custeamento não poderá ser feito cobrando directamente dos utentes as quantias, conforme vem sucedendo, o que, com todo o respeito, é uma contradição. Impõe-se assim que se pergunte: Como deve então ser feita esta cobrança? 28º O Sr. Juiz parece querer dizer que só o poderá ser sob a forma de taxa ou de tarifa, apesar de não termos a certeza se é isto que quer dizer. 29º Mas permitam-nos a pergunta: o que interessa se o pedido de pagamento do custo do ramal é feito aos utentes em forma de taxa, tarifa ou preço? Não é o nome dado à forma de cobrança que altera a sua essência. 30º Aliás, conforme decorre do art. 24º al. g) dos Estatutos da V., anexos à escritura pública da sua transformação em sociedade comercial anónima (doc. nº2 da contestação), pelos municípios de Guimarães e Vizela foram delegados poderes ao conselho de administração da V. para “cobrar tarifas e preços pelos serviços e bens prestados no exercício da sua actividade e pela realização, manutenção, reforço e utilização de infra-estruturas, incluindo os ramais de ligação da rede pública aos prédios particulares”. 31º A Ré V. tem vindo a cobrar o preço do ramal, e no caso do saneamento, acrescido da tarifa de ligação. Não se vislumbra assim porque razão não o possa continuar a fazer. 32º Acresce que a decisão de mandar devolver o dinheiro (milhares de euros) aos utentes das freguesias aqui representados pela Autora, que pagaram e bem o preço dos seus ramais ou que se encontram a pagá-los em prestações mensais, tal como o fazem tantos outros utentes de outras freguesias, não se afigura justa, nem razoável, depois de na mesma sentença se ter considerado que efectivamente cabe ao utente pagar o seu ramal domiciliário, nem se avaliou o impacto que tal decisão tem para a Ré V., afectando de forma drástica e violenta o equilíbrio económico-financeiro da empresa e o interesse público subjacente à prossecução destes serviços essenciais. 33º Assim, a sentença recorrida, ao decidir da forma como decidiu, enferma de manifesto e ostensivo erro de julgamento. Termos em que, com o suprimento, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença recorrida, com todas as legais consequências. O Município de Vizela também alegou, concluindo: 1.ª: No entender do Recorrente, a decisão recorrida padece de vícios manifestos que atingem a sua validade e, por outro lado, a mesma deverá ser revogada quanto ao sentido preconizado a respeito do fundo da questão ou objecto da causa, afigurando-se a norma em crise perfeitamente legal, admissível e generalizadamente aceite e reconhecida. 2.ª: A sentença recorrida padece, desde logo, de uma contradição insanável ao nível da sua própria fundamentação, porquanto resulta demonstrado que, se a lei remete para os respectivos regulamentos municipais ou intermunicipais a determinação exclusiva das regras respeitantes à liquidação e cobrança das taxas locais, e se a sentença recorrida considera que não é ilegal o Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais em causa, o qual justamente estabelece a cobrança do tributo associado à instalação do ramal ou ramais domiciliários do prédio e ao valor da tarifa de ligação, a qual é liquidada directamente aos respectivos utentes, então existe contradição entre os fundamentos da decisão (maxime a conformidade legal do regulamento) e o resultado a que a mesma chega (impossibilidade de cobrança directa do tributo aos respectivos utentes). 3.ª: A oposição dos fundamentos com a própria decisão é ainda mais evidente quando se constata que, não obstante o julgamento de conformidade legal do regulamento aqui em causa, o juiz decidiu condenar a Ré V. não apenas a abster-se de continuar a cobrar as quantias em questão – quando tal cobrança foi julgada legal de acordo com a anterior fundamentação expendida – mas também – pasme-se! – a restituir as quantias cobradas a esse título aos respectivos destinatários, como se tal cobrança fosse, afinal, ilegal. 4.ª: Mais: o sentido da decisão recorrida – assim como da própria petição inicial – parece inspirar-se e repousar num parecer junto pela Autora subscrito pelo Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR), quando, em Maio de 2011, a agora designada Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), que veio substituir aquele Instituto, proferiu parecer contrário àquele desconsiderado pelo tribunal “a quo”, concluindo que “não se vê como ilegítimas as várias tarifas que visem repercutir custos, de forma individualizada, com a prestação destes serviços (seja a instalação de ramais, a verificação extraordinária de contadores, ou outros”. 5.ª: Nesta conformidade, a decisão recorrida padece de manifesta contradição ou oposição dos seus fundamentos com o seu resultado, pelo facto de considerar não ser ilegal o Regulamento em causa, condenando, mais à frente, a Ré V. a abster-se de o executar e a devolver as quantias anteriormente cobradas ao abrigo do mesmo como se essa cobrança decorrente da execução do regulamento fosse ilegal e merecesse por conseguinte a reposição do status quo ante. 6.ª: Assim, Senhores Juízes Desembargadores, afigura-se nula a sentença proferida pelo tribunal “a quo” por manifesta oposição ou contradição entre os seus fundamentos e a decisão, sendo, por conseguinte aplicável o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil. 7.ª: O Recorrente considera igualmente que in casu se impunha a pronúncia do Meritíssimo Senhor Juiz “a quo” a propósito do parecer da ERSAR de 2011, sendo este posterior ao parecer do IRAR de 2007 que a sentença expressamente contemplou e cujo sentido aquele veio agora contrariar, implicando assim a revogação deste último. 8.ª: Do mesmo modo, verifica-se falta de fundamentação a respeito da afirmação com a qual, afinal, se bastou o Meritíssimo Senhor Juiz para proferir a decisão condenatória da Ré V., dizendo apenas que “tal custeamento [dos ramais de ligação e da tarifa de ligação à rede] não poderá ser feito cobrando directamente dos utentes as quantias, conforme vem sucedendo”. 9.ª: Nada mais é dito, quer na parte anterior quer na parte subsequente da decisão, em abono da afirmação citada, nenhum fundamento de natureza jurídica ou de facto sendo apontado concretamente no sentido da mesma afirmação. 10.ª: Deste modo, afigura-se igualmente nula a sentença proferida pelo tribunal “a quo”, porquanto, a) além de se não pronunciar sobre o parecer da ERSAR oposto e revogatório do anterior parecer do IRAR no qual a decisão se baseou, b) a mesma não contém qualquer fundamentação relativamente à decisão de proibição de cobrança directa dos tributos em questão, sendo assim aplicável o disposto nas alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC. 11.ª: Por outro lado, a sentença recorrida “arrogou-se” o poder não só de relevar as formas de cobrança das taxas em questão como, inclusivamente, de eleger uma delas como a única permitida, proibindo em concreto a cobrança “directa” de tais tributos aos respectivos destinatários, tendo assim excedido os seus poderes de pronúncia, porquanto lhe não competia intervir numa matéria da competência exclusiva e discricionária da Administração, neste caso, da empresa intermunicipal encarregue do exercício dos poderes de cobrança dos tributos em questão. 12.ª: Destarte, verifica-se que a decisão “a quo” padece do vício de excesso de pronúncia, ferindo-a com a sanção da nulidade consubstanciada na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, não apenas porque se ocupou de questões que não foram levantadas pelas partes, não integraram o pedido formulado pela Autora na petição inicial e não eram do conhecimento oficioso, como também porque ao fazê-lo “invadiu” a esfera de competências administrativas discricionárias e conheceu, por isso, de questões de que não podia tomar conhecimento: cfr., por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Novembro de 2005, no processo n.º 05S2137, Relator: Sousa Peixoto. 13.ª: Sem prescindir do exposto e atendendo ao regime constante do n.º 1 do artigo 149.º do CPTA, o Recorrente propõe-se explanar e sustentar o entendimento de que o recurso interposto merece integral provimento e, em consequência, a presente acção deve ser julgada totalmente improcedente, isto porque se verifica a inteira conformidade da norma do regulamento em crise com o ordenamento jurídico, sendo perfeitamente legítima – e legitimada – a cobrança aos respectivos destinatários do “custo do ramal ou ramais domiciliários” e do “valor da tarifa de ligação” conforme o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 30.º do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais em apreço. 14.ª: Assim é que, ao nível jurídico-constitucional, o artigo 241.º da Constituição Portuguesa institui o poder regulamentar próprio das autarquias locais, sendo que, tendo em conta a situação em apreço, as leis habilitantes não apenas permitem a cobrança dos tributos em questão mas igualmente remetem para o respectivo regulamento local a determinação do regime de cobrança dos mesmos, sendo este imputável ao exercício do poder discricionário das autarquias locais. 15.ª: As várias leis habilitantes do Regulamento em causa – Lei das Finanças Locais, Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, Regime Jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos e Regulamento Geral dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais – permitem retirar um conjunto de conclusões favoráveis à posição sufrada pelo Recorrente: a) Por um lado, afigura-se assente que a instalação dos sistemas prediais de abastecimento de água e drenagem de águas residuais é da responsabilidade e custeio exclusivo do respectivo proprietário; b) Por outro lado, é igualmente certo que a ligação dos sistemas prediais à rede pública de distribuição e de drenagem é realizada através dos respectivos ramais de ligação, os quais integram ou são componentes desta última, razão pela qual apenas a entidade gestora detém competências para o seu manuseamento, instalação, modificação, substituição, renovação, conservação ou suspensão; c) Dado que os ramais de ligação integram a infra-estrutura pública de distribuição de água e drenagem de águas residuais, permitindo a ligação dos sistemas prediais à rede, o custeio da sua instalação e da sua modificação, ambas promovidas a pedido do particular pela entidade gestora, corre por conta daquele, correspondendo afinal à contrapartida atribuída à entidade gestora pela disponibilidade do sistema público e pela ligação à rede dos sistemas prediais; d) Por fim, assinala-se que o montante exigível aos particulares pela instalação do ramal de ligação e pelo estabelecimento da respectiva ligação deve corresponder economicamente ao custo da respectiva infra-estrutura pública, ou pelo menos não deve ser inferior a este último. 16.ª: Existem igualmente manifestações transversais na doutrina e junto dos próprios intervenientes do sector que, também elas, são cabalmente abonatórias da posição sustentada pelos Réus, como sejam, desde logo, a posição pública oficial da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, a posição sustentada em parecer pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, sendo igualmente a orientação generalizadamente preconizada pela maioria dos municípios portugueses. 17.ª: Mais decisivamente, e embora não prescindindo dos fundamentos de natureza constitucional, legal e doutrinal, deve sublinhar-se que o entendimento subscrito pelo Recorrente ao longo do articulado corresponde àquela que tem sido a orientação da nossa jurisprudência. 18.ª: Desde logo, foi desta opinião o Senhor Juiz do Tribunal Judicial de Guimarães, o qual, no processo n.º 5228/05.4TBGMR, que correu termos pelo 5.º Juízo Cível, concluiu ser devida pelos munícipes ou utentes o custo da execução dos ramais de ligação e julgou legítima tal cobrança por parte da V.. 19.ª: Mais recentemente, a matéria foi revisitada e aprofundada no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 22 de Fevereiro de 2013, no processo n.º 00180/08.7BEBRG (Relatora: Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão), no qual se pode ler: “Consagra-se, desta forma, que os proprietários, usufrutuários, ou aqueles que estão na legal administração dos prédios, têm de proceder ao pagamento dos preços decorrentes da instalação dos respectivos ramais de saneamento”, pelo que “tem a Recorrente [no caso a concessionária Águas de Barcelos, S.A.] legitimidade para proceder à cobrança de todos os encargos decorrentes da instalação dos ramais de saneamento, em observância do disposto no Contrato de Concessão, nomeadamente Cláusula 34.ª, bem como das disposições Regulamentares e respectivos tarifários ou preçários (...) 20.ª: Em conclusão, atesta-se que recebe entre nós expressa habilitação constitucional e legal, posição concordante na doutrina e junto das entidades públicas competentes neste domínio, incluindo a própria entidade reguladora, tendo sido igualmente acolhida recentemente pela nossa jurisprudência, a cobrança aos utentes dos ramais de ligação dos sistemas prediais à rede pública de distribuição de água e drenagem de águas residuais, pelo que, nesta conformidade, deverá a presente acção ser julgada, conforme se espera, integralmente improcedente, procedendo in totum por seu turno o recurso aqui interposto. Nestes termos e nos demais de direito que suprirão, deverá julgar-se integralmente procedente o recurso interposto e, consequentemente, ser revogada a decisão do tribunal “a quo” e substituída por outra que julgue improcedente a presente acção, com as demais consequências legais. Não foram juntas contra-alegações. O MP não emitiu parecer. Cumpre apreciar e decidir. FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1. A Autora é uma associação de consumidores de âmbito nacional e interesse genérico, tendo como escopo a promoção dos interesses e a protecção dos seus direitos; 2. A Ré é a empresa responsável exploração e gestão dos serviços públicos municipais de abastecimento de água e de saneamento, actuando no âmbito geográfico dos Municípios de Guimarães e Vizela; 3. A Ré dirigiu a consumidores/utentes, representados pela aqui A., as comunicações constantes dos documentos juntos aos autos com a p.i. e que aqui se dão por integralmente reproduzidos, nos termos que se transcrevem infra: “(...) Deve, ainda, em consonância com o disposto nos artigos 30.º, alínea c) e 37.º do Regulamento dos sistemas públicos e prediais de distribuição de água e de drenagem de águas residuais, nos concelhos de Guimarães e Vizela, proceder, no prazo de 15 dias, a contar da data do aviso de recepção, à liquidação da importância supra aludida e aí devidamente justificada, bem como, à apresentação da caderneta predial ou documento equivalente, referente ao prédio em questão, para efeitos de determinação e cobrança da respectiva tarifa de ligação de saneamento.” “(…) Na sequência da conclusão das infra-estruturas de saneamento que irão servir o prédio, em tópico identificado, de que V. Exª é proprietário, somos a informar que deve, no prazo de 30 dias, instalar os respectivos sistemas prediais, nos termos da legislação em vigor. (…)” Cumpre, ainda, informar que o serviço público de recolha de águas residuais está sujeito a contrato, nos termos do art.º 18º do Decreto-Lei 207/94, que vigora a partir do momento em que entra em funcionamento o ramal de ligação de saneamento, pelo que deverá V. Exª formalizar o referido contrato, sob pena de incorrer em contra-ordenação pela utilização indevida do sistema, contra-ordenação essa prevista e punida por Lei. (...)” 4. A Ré tem insistido na exigência das quantias em questão, quer com ameaça de cobrança coerciva quer com recurso ao pagamento de forma faseada; 5. Pelo IRAR – Instituto Regulador de Águas e Resíduos foi elaborado ofício, com o n.º IRAR/O-000575/2007, de 7 de Fevereiro, do qual consta o seguinte entendimento: “A anterior Lei das Finanças Locais (Lei 42/98, de 6 de Agosto, ora revogada pela Lei nº 2/2007, de 15 de Janeiro) permitiu expressamente que os custos com os ramais de ligação que servem os utilizadores do serviço de distribuição de água e de saneamento de águas residuais fossem individualizadamente repercutidos nos respectivos beneficiámos. O nº 2 do artigo 20º cominava que «os municípios podem ainda cobrar tarifas por instalação, substituição ou renovação dos ramais domiciliários de ligação aos sistemas públicos de distribuição de água e de drenagem de águas residuais». O anterior diploma legal, a Lei nº 1/87, de 6 de Janeiro, determinava, no âmbito da norma relativa às tarifas para os serviços de abastecimento de água, recolha, depósito e tratamento de lixos, bem como ligação, conservação e tratamento de esgotos, que as tarifas a fixar pelos municípios não deveriam ser inferiores aos respectivos encargos previsionais de exploração e de administração, acrescidos do montante necessário à reintegração dos equipamentos – vide artigo 12.º Tal não colidiria, segundo se nos afigura, com a possibilidade de os municípios criarem tarifas que repercutissem individualizadamente, e não de forma solidários custos com os ramais de ligação. Porém, o Decreto-Regulamentar nº 23/95, de 23 de Agosto, parece ter espelhado, entretanto, uma orientação diferente. Este diploma caracteriza os ramais como parte integrante da rede pública de drenagem (artigos 282.° e seguintes), competindo, pois, à entidade gestora a respectiva instalação, conservação, substituição e renovação – este continua a ser o regime vigente. Porém, o pagamento dos ramais só estava previsto para o caso de o proprietário ou usufrutuário requerer para o ramal de ligação do sistema predial modificações, devidamente justificadas, às especificações estabelecidas pela entidade gestora. Tal redacção parece legitimar, em face da excepcionalidade da norma, a aplicação de um argumento a contrario sensu, mediante o qual a regra geral consistiria na não repercussão tarifária, de forma individualizada, dos custos com os ramais de ligação (...) ” DE DIREITO Está posta em causa a decisão que ostenta este discurso fundamentador: Conforme se adiantou acima, a Autora (A.) pede que se seja declarada a ilegalidade do art° 30°, nº 1, alínea c), do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais dos concelhos dos concelhos de Guimarães e Vizela - publicado no DR. 170, de 04/9/2007, habilitado pelo D.L. nº 207/94, de 06/8, entretanto revogado pelo D.L. n° 194/2009, e pelo Decreto Regulamentar nº 23/95, de 23/8. Alega a A. a violação do disposto nos artº 282º e segs do Dec. Reg. n° 23/95, de 23/8, e pede que a V. seja condenada, para além do mais, a abster-se de cobrar as quantias exigidas para a instalação dos ramais de ligação aos consumidores/utentes das freguesias de Airão (S. João Batista), Figueiredo, Leitões e Oleiros; a restituir a cada um desses consumidores/utentes dessas freguesias, individualmente considerados os montantes cobrados ou a cobrar e a interromper, de imediato, o pedido/aceitação de pagamento parcelar, ora em curso, relativamente a esses mesmos consumidores/utentes. Segundo a A., a V. tem procedido à cobrança dos ramais de ligação à rede pública de água e saneamento nas freguesias de Airão, Figueiredo, Leitões e Oleiros exigindo o pagamento pela construção de infra-estruturas públicas quer de abastecimento público de água quer de saneamento (drenagem de águas residuais), impondo que os proprietários dos prédios realizem a instalação dos respectivos sistemas prediais de abastecimento de água e de saneamento de acordo com as disposições técnicas previstas no Decreto Regulamentar nº 23/95, de 23/8, e demais legislação aplicável, bem como a celebração de um contrato com a V. para recolha de águas residuais nos termos do art° 63° do D.L. nº 194/2009, de 20/8, e que o procedimento de cobrança dos ramais por parte da V. é de todo contrário às normas constantes de legislação específica referentes aos sistemas públicos e prediais de distribuição de água e de drenagem de águas residuais. Como prestadora de um serviço público essencial tem praticado actos atentatórios dos direitos dos consumidores, violando os princípios da boa-fé e da prossecução do interesse público. E fundamenta a peticionada declaração de ilegalidade com a seguinte argumentação: se os ramais de ligação fazem parte integrante da rede pública de distribuição e de drenagem de águas residuais e são da única e exclusiva responsabilidade da entidade gestora, a quem cabe a responsabilidade pela conservação e substituição dos ramais de ligação, sendo a propriedade dos bens que se encontram afectos à concessão pertença da entidade gestora, e não dos particulares, então não tem razão de ser que aos consumidores utentes sejam exigidas quantia pela instalação de ligações cuja propriedade é da entidade gestora. Sustenta ainda a falta de fundamento legal para a obrigatoriedade de o consumidor/utente de celebrar contrato com a entidade gestora para recolha de águas residuais. Ora bem: A questão que ora nos ocupa, impõe, essencial e primeiramente, escrutinar a legalidade da alínea c) do nº 1 do art.º 30º do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais dos concelhos de Guimarães e Vizela (publicado em Diário da República, 2ª Série, n.º 170, de 4 de Setembro de 2007). Vejamos, pois. No essencial, diz o Regulamento em questão o seguinte: Artigo 10.º - Obrigatoriedade de ligação dos sistemas: “1. Dentro da área abrangida, ou que venha a sê-lo, pelas redes de distribuição de água e ou drenagem de água residuais, é obrigatória a ligação a estas de todos os prédios urbanos, nos termos da lei e do presente Regulamento, designadamente nas condições previstas no artigo 30.º. 2. A instalação dos sistemas prediais é da responsabilidade dos proprietários ou usufrutuários das edificações. 3. Para prédios situados fora das áreas abrangidas pelas redes públicas, a V. fixará as condições em que poderá ser estabelecida a ligação, tendo em consideração os aspectos técnicos e financeiros.” (…) Artigo 28.º - Deveres da V.: “1. A V., enquanto responsável pela concepção, gestão e manutenção das redes públicas, deve cumprir as prescrições legais gerais a esta respeitantes, de onde se ressaltam os seguintes deveres: (...) h) Promover a instalação, substituição ou renovação dos ramais de ligação aos sistemas; (...)” Artigo 30.º - Obrigatoriedade de ligação à rede geral: “1. Dentro da área abrangida, ou que venha a sê-lo, pelas redes de distribuição de água e ou de drenagem de águas residuais os proprietários, usufrutuários ou superficiários são obrigados a promover a ligação dos respectivos prédios: a) Instalando, de sua conta, sistemas prediais com os acessórios e equipamentos necessários à utilização da água e drenagem das águas residuais; b) Solicitando a ligação desses sistemas, às redes públicas, depois de aprovada nos termos do presente Regulamento e demais legislação aplicável; c) Pagando o custo do ramal ou ramais domiciliários do prédio, que a V. executar, e o valor da tarifa de ligação, no caso da ligação às redes de drenagem de águas residuais. (...) 4. As intimações aos titulares referidos no n.º 1 para cumprimento das disposições dos números anteriores serão feitas pela V. nos termos legais, devendo os destinatários cumprir as obrigações constantes das alíneas a), b) e c) do n.º 1, num prazo nunca superior a 30 dias. 5. Terminado o prazo fixado na intimação e em caso de incumprimento, será aplicada a partir da data limite definida na intimação a tarifa de ligação de saneamento. (...)” (negrito, itálico e sublinhado é e será sempre de nossa autoria) Artigo 37.º - Responsabilidade e condições de instalação: “1. Compete exclusivamente à V. estabelecer as canalizações exteriores, que ficam a constituir propriedade sua. 2. Pelo estabelecimento dos ramais de ligação será cobrada, aos interessados, a importância do respectivo valor definido no anexo IV, acrescido dos respectivos valores de ligação. 3. Nas ruas ou zonas onde venham a estabelecer-se as redes de distribuição de água e ou redes de drenagem de águas residuais, a V. instalará simultaneamente os ramais de ligação aos prédios existentes, cobrando dos respectivos proprietários, usufrutuários ou superficiários as importâncias devidas nos termos definidos neste Regulamento, sendo o valor do ramal de ligação correspondente ao ramal tipo até 6 metros e as associações respectivas. 4. Quando condições económicas de exploração o permitam e os interessados assim o requeiram, poderá ser aceite o pagamento das despesas inerentes em prestações mensais, nos termos que forem definidos pela V..” A Autora alega desconformidade do disposto neste Regulamento, em especial na alínea c) do nº 1 do art.º 30º com o que vem prescrito em diplomas de protecção ao consumidor e, em especial no disposto no Decreto-Lei n.º 207/94, de 6 de Agosto e no Decreto Regulamentar n.º 23/95, de 23 de Agosto. Em especial, vejamos o que nos diz o Decreto Regulamentar n.º 23/95, de 23 de Agosto, que aprovou o Regulamento Geral dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais: Artigo 32.º - Ligação à rede pública “1 – Os ramais de ligação asseguram o abastecimento predial de água, desde a rede pública até ao limite da propriedade a servir, em boas condições de caudal e pressão. (…)” Artigo 282.º - Responsabilidade de instalação: “Os ramais de ligação devem considerar-se tecnicamente como partes integrantes das redes públicas de distribuição e de drenagem, competindo à entidade gestora promover a sua instalação.”. Artigo 283.º - Condições de instalação: “Se o proprietário ou usufrutuário requerer para o ramal de ligação do sistema predial à rede pública, modificações, devidamente justificadas, às especificações estabelecidas pela entidade gestora, nomeadamente do traçado ou do diâmetro, compatíveis com as condições de exploração e manutenção do sistema público, esta entidade pode dar-lhe satisfação desde que aquele tome a seu cargo o acréscimo nas respectivas despesas, se o houver.”. Efectivamente, a Ré tem a proceder à instalação (a “promover a instalação”, como diz o preceito contido no art.º 282º do DR nº 23/95) dos ditos ramais de ligação à rede pública, uma vez que, do ponto de vista técnico, os mesmos fazem dela parte. Mas está obrigada a custear tais ramais de ligação? A questão é a de saber como é que esses custos se devem repercutir nos beneficiários/utilizadores. Ora, efectivamente, revendo a nossa posição anterior sobre a matéria, a solução passará, não pela cobrança nos termos aqui discutidos nos autos, mas antes pela repercussão das quantias de forma individualizada, através de uma tarifa específica por ocasião da construção do ramal pois que a forma difusa de repercutir esse preço/custo da construção do ramal de ligação geraria situações de desigualdade e de desproporcionalidade em relação a alguns utilizadores pois que o custo de instalação de ramal de ligação é relativo, dependendo essencialmente da extensão do mesmo. Note-se que, nos termos do artº 82° da Lei nº58/2005, de 29/12 (vulgo Lei da Água), em obediência ao princípio do utilizador-pagador, o regime de tarifas a praticar pelos serviços públicos de águas deve assegurar a recuperação dos custos tidos pela entidade gestora com a construção, manutenção, reparação, renovação, substituição e operação das infra-estruturas e equipamentos necessários à prestação dos serviços. Considerada a densificação constitucional do conceito de autonomia local (are 237° da CRP), muito particularmente no domínio financeiro (are 240°), e tido em conta o poder regulamentar próprio que é constitucionalmente reconhecido às autarquias locais (artº 240°), impõe-se a conclusão de que a CRP não proíbe que as autarquias criem, elas mesmas, sob a forma de regulamento local, as taxas devidas pela utilização dos seus serviços, taxas que, segundo o nº 3, in fine, do artº 240°, fazem parte até do grupo de receitas obrigatórias dessas pessoas colectivas públicas territoriais. O artº 16° da Lei nº 2/2007, de 15/01 (Lei das Finanças Locais) estabelece o direito de os municípios, no exercício das actividades de abastecimento público de água e saneamento de águas residuais, podem cobrar preços e outros instrumentos de remuneração, nos termos do tarifário aprovado, quer pelos serviços prestados, quer pelos bens fornecidos, os quais não devem ser inferiores aos custos directa ou indirectamente suportados com a prestação desses serviços e com o fornecimento desses bens, o ramal de ligação consiste na ligação física das redes prediais à rede pública que no caso do abastecimento de água corresponde à tubagem compreendida entre o limite da propriedade e o sistema público de distribuição e no caso do saneamento de águas residuais ao troço de canalização desde o colector de águas residuais implantado no arruamento até à câmara de ramal de ligação (artº 146º do Decreto Regulamentar nº 23/95, de 23/8). Ora: A prestação de serviços públicos pode efectuar-se em contrapartida de preços ou taxas. Num ou noutro caso as normas regulamentares que fixam a referida contraprestação e regem a sua aplicação denominam-se tarifas expressão que muitas vezes se utiliza para designar os próprios preços ou taxas que são objecto do aludido regulamento (Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, p.59). A tarifa, no campo das finanças locais, não se delineia como uma figura tributária em absoluto nova, ou seja, como uma espécie de tertium genus entre a taxa e o imposto. Ela, de facto, e sob todos os aspectos, apresenta-se como uma simples taxa, embora taxa sui generis, cuja especial configuração lhe advém apenas da particular natureza dos serviços a que se encontra ligada. Nas taxas (ou preço), o fundamento do tributo é a prestação da actividade pública, a utilização do domínio e a remoção do limite jurídico, e, por isso, estas realidades e a taxa que lhes corresponde encontram-se entre si ligadas por um nexo sinalagmático, em termos de uma se apresentar como contraprestação da outra. O preço/custo da construção do ramal de ligação, devendo ser suportado pelo utilizador do serviço público, deve ser repercutido de forma individualizada através de uma tarifa específica por ocasião da construção do ramal ou de forma difusa através de tarifas periódicas aplicadas aos utilizadores do serviço. No entender da A., numa interpretação a contrario sensu dos artº 282° e 283º do Decreto Regulamentar na 23/95, os custos dos ramais devem ser suportados pela entidade gestora por ser a proprietária da rede pública de distribuição e de drenagem de águas residuais e a única responsável pela conservação e substituição dos ramais de ligação e, por isso, a cobrança do preço pela execução do ramal de ligação aos aludidos consumidores/utentes é ilegal. Neste ponto concreto, no entanto, tendo em conta o modo como a A. configura a causa de pedir e os pedidos, está em causa a interpretação e aplicação de disposições que se situam no campo da actividade tributária tem por objecto um acto tributário com o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria fiscal. A questão da legalidade da cobrança de um preço pela instalação de um ramal de ligação passa pela aferição da legalidade e bondade de interpretação e aplicação de normas de direito fiscal com atinência ao exercício da função tributária da Administração, já que o que materialmente está em causa prende-se com o assegurar, através da cobrança daquele preço/tarifa, do pagamento dos encargos tidos pela V. com a construção, manutenção, reparação, renovação, substituição e operação das infra-estruturas e equipamentos necessários à prestação dos serviços de fornecimento de água e drenagem e tratamento de águas residuais. Nesse ponto, portanto, o objecto do litígio reconduz-se pois a apurar se são legalmente devidos e exigíveis dos munícipes das freguesias referenciadas as quantias facturadas enquanto valores respeitantes a parcela reportada à recuperação do valor pago pela V. com aqueles encargos legais. O que está efectivamente em causa e é pedido prende-se unicamente com o não pagamento dum preço/custo relativo à instalação de ramais de ligação, pelo que a causa de pedir e o pedido se enquadram no domínio de uma relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições que se situam no campo da actividade tributária (a questão da legalidade da ulterior repercussão dos custos sobre a forma de tarifa ou taxa já transcende, não só o objecto dos presentes autos como a competência deste Tribunal Administrativo de Círculo). Regressando ao que é (e pode ser) objecto dos nossos autos: Conclui-se que o regime instituído pelo D.L. nº 194/2009 revela esses outros encargos com o ramal de ligação, com evidente expressão económica, que não se reconduzem ao mero custo do fornecimento da água. Estabelece, designadamente, que cabe à entidade gestora dos sistemas públicos, nomeadamente aos municípios, providenciar pela elaboração dos estudos e projectos dos sistemas públicos; promover o estabelecimento e manter em bom estado de funcionamento e conservação os sistemas públicos de distribuição de água e de drenagem e desembaraço final de águas residuais e de lamas; submeter os componentes dos sistemas de distribuição de água e de drenagem de águas residuais, antes de entrarem em serviço, a ensaios que assegurem a perfeição do trabalho executado; garantir que a água distribuída para consumo doméstico, em qualquer momento, possua as características que a definam como água potável e, ainda, promover a instalação, substituição ou renovação dos ramais de ligação. Tais encargos, sendo necessários para a prestação dos serviços em causa, para a garantia da sua continuidade e qualidade, são diversos do mero valor, v.g., da água fornecida, e devem ser suportados pelo utilizador/beneficiário desses serviços. Também em consequência do que dispõe o artº 2°, nº 2 e 4, do D.L. n° 379/93, de 5/11, o interesse público sobrepõe-se, naturalmente, ao interesse de cada particular e que, em consequência, seja obrigatória para qualquer pessoa singular ou colectiva, a ligação ao sistema público de distribuição de água para consumo. E são ponderosas razões de interesse público e de sustentabilidade da exploração dos sistemas de distribuição de água que justificam a opção de fazer repercutir sobre o consumidor os custos que, à partida, deveriam ser suportados pela entidade gestora desses serviços. A opção legislativa, numa óptica de justa repartição dos encargos foi, como se referiu, a de a entidade gestora, para além de todos os custos associados à instalação geral de todo o sistema público de distribuição de água e drenagem de águas residuais, apenas suportar os custos da substituição e da renovação dos ramais de ligação, suportando o beneficiário do serviço os custos da execução do ramal, bem como da instalação e conservação dos (seus) sistemas prediais. Assim sendo, ao contrário do que sustenta a Autora (e, mais uma vez, revendo a nossa anterior posição), afigura-se-nos que o preceito contido na alínea c) do nº 1 do art.º 30º do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais (…) de Guimarães e Vizela não é ilegal, ao prever que o custeamento de tal operação deve ser suportado pelo respectivo utente. No entanto, tal custeamento não poderá ser feito cobrando directamente dos utentes as quantias, conforme vem sucedendo. Assim sendo, cumpre declarar improcedente o pedido formulado pela Autora, no sentido de ser declarado ilegal o preceito constante da alínea c) do nº 1 do art.º 30º do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais (…) de Guimarães e Vizela, mas declarar procedentes os pedidos formulados no sentido da abstenção de cobrança “directa” (a questão da ulterior repercussão dos custos sobre a forma de tarifa ou taxa já transcende, não só o objecto dos presentes autos como a competência deste Tribunal Administrativo de Círculo) das quantias cobradas pela ligação aos ramais de ligação e devolução das quantias até agora indevidamente cobradas, acrescidas dos respectivos juros de mora (em relação à requerida sanção pecuniária compulsória entende-se a mesma como desnecessária, por ora, uma vez que nada aponta para o incumprimento da Ré com o determinado). No demais, terão de se considerar improcedentes os demais pedidos, mormente o de condenação em indemnização por danos não patrimoniais. Desde logo, nesta parte, note-se, não foram alegados, sequer, pela Autora, factos susceptíveis de preencher os requisitos para accionar a Ré com base no mecanismo da responsabilidade civil (cfr. requisitos constantes do art.º 483º do Código Civil), nomeadamente, ao nível dos danos concretos e no respectivo nexo causal entre os mesmos e o facto ilícito. Nos termos acima, julgar-se-á, infra, parcialmente procedente a presente acção. X Discordam desta decisão a Ré V. e o Município de Vizela.É univocamente entendido pela doutrina e pela jurisprudência e tem assento na lei adjectiva que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente, da respectiva motivação, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não for tratada, com ressalva óbvia dos casos que impõem o seu conhecimento oficioso. Analisadas as conclusões das Partes constata-se que vêm suscitar as questões de nulidade da sentença e de erro de julgamento de direito. Sucede que esta temática já foi por nós enfrentada no acórdão de 29/11/2019, proferido no âmbito do processo nº 678/10.7BEBRG, transitado em julgado, razão pela qual aqui o damos por reproduzido para todos os legais efeitos; razões de celeridade e economia processuais também o impõem. Assim: (….) Das nulidades - Como já assinalámos supra, os Recorrentes invocam a falta de fundamentação do acórdão, a contradição entre os fundamentos e a respectiva decisão e, ainda, o excesso de pronúncia. Vejamos: Segundo o artigo 615º do NCPC (artº 668º do CPC de 1961), sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”,
III-Um dos elementos estruturantes da sentença é a fundamentação. Esta tem duas funções: uma função endoprocessual e uma função extraprocessual. A função endoprocessual é aquela que desenvolve a motivação da sentença, entendido como requisito técnico da pronúncia jurisdicional, no interior do processo; a função extraprocessual da motivação está ligada com a natureza garantista da absoluta generalidade e na consequente impossibilidade de a entender como derrogável ad libitum pelo legislador ordinário (e muito menos como derrogável ad libitum pelo juiz ou pelas partes. IV-A nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando haja ausência absoluta de motivação, ou seja, total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que a decisão assenta. (…)”. e c) só ocorre nulidade quando falte a fundamentação (de facto/de direito devidamente especificada) ou quando a fundamentação da decisão aponta num sentido e a decisão em si siga caminho oposto, isto é, as situações em que os fundamentos indicados pelo juiz deveriam conduzir logicamente a um resultado oposto ao que se contém na sentença ou agora, também quando a decisão seja ininteligível por alguma ambiguidade. * Custas pela Autora e, nesta sede, sem custas, atenta a ausência de contra-alegações.* Notifique e DN.* Porto, 30/10/2020Fernanda Brandão Hélder Vieira Helena Canelas |