Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00500/11.7BEVIS |
| Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
| Data do Acordão: | 10/18/2019 |
| Tribunal: | TAF de Viseu |
| Relator: | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
| Descritores: | ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL,ORDEM DOS REVISORES OFICIAIS DE CONTAS,PROCESSO DISCIPLINAR |
| Sumário: | I-Ao Tribunal cabe apenas analisar a existência material dos factos e averiguar se eles constituem infrações disciplinares, não lhe sendo permitido apreciar a medida concreta da pena, salvo em casos de erro grosseiro e manifesto, por esse ser o papel da Administração inserido na chamada discricionariedade técnica ou administrativa; I.1-desde que a medida tomada pela Administração se situe dentro de um círculo de medidas possíveis, e com isto quer-se dizer aquela amplitude de medidas que seriam susceptíveis de se poderem considerar ajustadas à situação, deve considerar-se que a escolhida pela Administração é a que melhor defende o interesse público por essa ser uma tarefa da Administração; I.2-a Administração, na determinação concreta da medida da pena, goza de certa margem de liberdade, movendo-se a coberto de sindicância judicial, salvo se, nessa tarefa utilizou critérios de graduação inadmissíveis ou atingiu resultado grosseiro ou manifestamente inadequado, condicionalismo esse que ora se não verifica. |
| Recorrido 1: | Ordem dos Revisores Oficiais de Contas |
| Recorrido 2: | A. S. A. |
| Votação: | Unanimidade |
| Meio Processual: | Acção Administrativa Especial |
| Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A. S. A., com domicílio na Rua (…), instaurou acção administrativa especial contra a Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, com sede na Rua (…), para impugnação da decisão proferida pelo seu Conselho Disciplinar em 18/07/2011, que lhe aplicou a pena de multa no valor de € 10.000,00 (dez mil euros). Por sentença proferida pelo TAF de Viseu foi julgada procedente a acção e declarado nulo e de nenhum efeito, o acórdão impugnado. Desta vem interposto recurso. Alegando, o Conselho Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (OROC), concluiu: i) Da Inverificação do vício de falta de fundamentação no acórdão disciplinar, no que se refere a: - Elemento subjetivo - Grau de culpa da conduta do arguido 1ª A doutrina de direito penal invocada na sentença que defende devem ser aplicadas ao processo disciplinar as normas do direito criminal comum, exceciona à referida regra, desde logo, no que não seja essencialmente previsto na legislação disciplinar ou desviado pela estrutura especifica do respetivo ilícito, sendo que, a invocada doutrina nem sequer se refere, em nenhum momento, ao elemento subjetivo - a culpa, e, que apesar de transcrita no acórdão invocado na sentença, esta doutrina não se encontra referida ou contemplada na decisão constante do Acórdão do TCA Sul, proc.° 1268/03, de 09-06-2004. 2° O mesmo se diga do, também, invocado na sentença Ac. do TCA Norte, Proc.° 747/15.7BECBR, de 23/09/2016, o qual também não se revisita na tese do tribunal a quo de aplicação da legislação penal na fundamentação exigida especificamente quanto à culpa em processo disciplinar. 3ª Contrariamente ao defendido na sentença recorrida, importa aqui salientar o caráter residual do processo penal relativamente ao processo disciplinar, que resulta expresso no art.º 84.° do Regulamento Disciplinar da OROC, que apenas é aplicável em caso de lacuna, em tudo o que não estiver previsto no referido Regulamento e no Estatuto, a título subsidiário, e, no final da ordem estabelecida, a seguir ao Código de Procedimento Administrativo (CPA); 4ª Sendo que a própria lei das associações públicas profissionais Lei c.° 2/2013 de 10 de janeiro, estabelece no n.° 8.° do art.º 18.° com a epígrafe "poder disciplinar " que "nos casos omissos, são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as normas procedimentais previstas no estatuto disciplinar dos trabalhadores que exercem funções públicas"; que também afasta, assim, a aplicação do direito processual penal. 5ª No caso sub judice, e tendo em consideração a factualidade provada, enunciada de fls. 4 a fls. 20 da sentença em crise, e sobre a qual não existiu qualquer dissenso entre as Partes na ação (como ficou reconhecido na própria sentença), e que nos dispensamos aqui de reproduzir por economia do presente articulado, ficou provado que o ora Recorrido, enquanto Revisor Oficial de Contas, praticou diversas infrações disciplinares por ter incumprido os deveres estabelecidos no n.° 2 e no n.° 4 do art.º 62.° n.° 1 do art.º 64.° do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, dos deveres impostos pelo n.° 1 e 2 do art.º 5.°, pelo art.º 7.° e pelo n.° 5 do art.º 12.° Código de Ética e Deontologia Profissional e no art.º 4.°, S.°, 11.° e 12.° do Regulamento de Formação Profissional dos ROC, e por omissão do cumprimento dos parágrafos 13 e 19 das Normas de Revisão/Auditoria e em concreto nas Directrizes de Revisão/Auditoria 510, 410, 230, todos em vigor à data dos factos. 6ª Acresce que, conforme se apurou no processo disciplinar e, como se refere expressamente no ponto 22 do acórdão disciplinar, O arguido atuou livre e voluntariamente, não podendo desconhecer que a sua conduta era reprovável e punida por lei. 7ª Nos termos do art.º 2.° do Regulamento Disciplinar em vigor à data dos factos, considera-se infração disciplinar a conduta do membro da Ordem que, por ação ou omissão, violar, dolosa ou culposamente, algum dos deveres estabelecidos no respetivo Estatuto ou em outros normativos aplicáveis. 8ª Dados como provados os factos em que assenta o acórdão do Conselho Disciplinar da OROC, integradores das infrações disciplinares e que, repita-se nunca foram postos em causa pelo ora Recorrido, se considera, desde logo demonstrada a culpa do então arguido, lá que se impunha que o mesmo, enquanto Revisor Oficial de Contas, conhecesse as normas profissionais e os deveres que o regem e adotasse os comportamentos devidos para o cumprimento dessas normas. 9ª Não existe, assim, qualquer omissão quanto ao elemento subjetivo — a culpa do ora Recorrido — que resulta, desde logo, claramente da referida menção expressa no acórdão e referida na conclusão 6a do presente articulado, como lhe era imposto pelo normativo supra citado, que prevê que a infração disciplinar possa ser cometida tanto a título de negligencia como de dolo; 10ª Não sendo exigível que o acórdão disciplinar especificasse o grau de culpabilidade do então arguido, por não lhe ser diretamente aplicáveis as regras que regem o direito penal. 11ª Efetivamente, o processo disciplinar constitui uni minus relativamente ao direito penal, não lhe são impostas as regras deste ramo de direito, sem a respetiva adaptação, o foi acolhido pela legislação específica aplicável às Ordens Profissionais e no caso concreto à OROC. 12ª o ora Recorrido um Revisor Oficial de Contas, não podia ignorar os deveres profissionais que sobre ele impendem, pelo que nunca tendo posto em causa os factos provados, assumiu, desde logo, por um lado a culpa do cometimento das infrações disciplinares; 13ª Devendo, considerar-se demonstrada a culpa do ora Recorrido no cometimento das infrações pela prova dos factos integradores das infrações disciplinares, a qual não foi objeto de qualquer dissenso. 14ª È que ao contrário do que defende a sentença em apreciação, a Jurisprudência do STA, proc.° 0658, de 30-05-2013, é clara ao afirmar que Os processos disciplinares não estão sujeitos às férreas exigências de rigor técnico-jurídico dos processos criminais, não só devido à distinta natureza dos interesses em presença, mas também porque seria excessivo impor aos instrutores daqueles processos uma proficiência pensada para a magistratura. 15ª E mais, o Tribunal Central Administrativo Sul, no Acórdão proferido no proc.° n.c. 10383/13, de 10-07-2014, a respeito de uma sanção disciplinar aplicada pela Ordem dos Advogados, vem referir expressamente o seguinte: II. Encontrando-se provados os factos de que o arguido foi acusado e que fundaram a aplicação da pena disciplinar, o que tem por base a prova documental produzida, que não logrou ser posta em causa, seja por que meio for, nem de algum modo abalada a veracidade dos factos em que sustenta a acusação e deliberação punitiva. III. Comprovando-se os factos em que assenta a deliberação punitiva, integradores da infração disciplinar, está igualmente demonstrada a culpa do agente, já que se impunha que o arguido adotasse comportamento diferente, em respeito das normas legais que disciplinam o núcleo dos deveres dos advogados. (sublinhado nosso). 16ª Neste mesmo sentido e, portanto, em tese contrária ao entendimento constante da sentença recorrida, vide, ainda, o que refere o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proc.° n.° 2122/11.3TBPVZ.P1 relativamente a sentença que declarou nula a decisão de autoridade administrativa, por falta de fundamentação referente aos elementos subjetivos das infrações imputadas a decisão da autoridade administrativa: - Na decisão da autoridade administrativa, o elemento subjetivo da conduta pode presumir-se da descrição do elemento objetivo. 17ª Em suma, o acórdão disciplinar em apreciação contém evidenciada a culpa do então arguido, não existido qualquer falta de pronúncia quanto a este elemento. 18ª Contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, o acórdão disciplinar sub judice não padece do vício de falta de fundamentação quanto ao elemento subjetivo - a culpa, por conter todos os fundamentos necessários e não lhe ser imposta outra especificação à luz das normas disciplinares específicas que se lhe aplicam. 19ª Não estando, assim, o acórdão disciplinar ferido de nulidade, não se lhe aplicando as normas de direito penal indicadas na sentença. 20ª Não tendo a questão da nulidade, invocada peio A. na ação e prevista no n.º 2 do art.º 374.° e 410.° do Código de Processo Penal, por alegada falta de pronúncia no acórdão disciplinar quanto à culpa do mesmo, sido julgada corretamente pelo Tribunal a quo. ii) Da Inverificacão do vício de falta de fundamentação no acórdão disciplinar, no que se refere a: - Determinação da medida da pena 21ª Mais incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo quanto à questão da falta de fundamentação da escolha da pena disciplinar e sua concreta medida - iter quantitativo, invocado pelo A. na ação com apelo ao disposto no art.º 71.° do Código Penal, e que determinou a declaração de nulidade igualmente com recurso a normas direito penal . 22ª Tanto o EOROC (artigo 81.°) como o RD (artigo 13.°) graduam da seguinte forma as penas disciplinares (da menos gravosa, para a mais gravosa): advertência, advertência registada; multa de € 1.000 a €10.000; censura; suspensão de 30 dias até cinco anos; expulsão. 23ª Nesta conformidade, a aplicação de uma pena de multa ao ora Recorrente, constitui das penas menos gravosas na escala do EOROC e do RD e, cumpre os princípios de proporcionalidade e justiça exigidos ao uso do poder discricionário da Recorrente. 24ª Tanto mais que, o n.º 5 do art.º 81.° prevê que a violação do n.º 4 do art.º 62.º (ambos do EOROC) tem que ser sancionado com pena não inferior à de multa - i.e. a multa para a violação deste preceito é a menor das sanções a aplicar. 25ª Sendo que, o ora Recorrido violou, para além do citado n.° 4 do art.º 62.° (para o qual se prevê pena não inferior à de multa), ainda o n.° 2 do art.º 62.°, o n.° 1 do art.º 64.° do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, os deveres impostos pelo n.° 1 e 2 do art.º 5.°, pelo art.º 7.° e pelo n.° 5 do art.º 12.° Código de Ética e Deontologia Profissional e no art.º 4.°, 5.°, 11.° e 12.° do Regulamento de Formação Profissional dos ROC, e por omissão do cumprimento dos parágrafos 13 e 19 das Normas de Revisão/Auditoria e em concreto nas Directrizes de Revisão/Auditoria 510, 410, 230, todos em vigor à data dos factos. 26ª o acórdão disciplinar, em conjunto com o relatório, identifica as infrações disciplinares imputadas ao então arguido, os deveres violados e ao abrigo do disposto no artigo 20.° do Regulamento Disciplinar, determina a aplicação de uma única sanção disciplinar. 27ª O artigo 20.° do Regulamento Disciplinar é inspirado no artigo 14.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, referindo Leal Henriques, em anotação a esse artigo que " o preceito consagra o princípio da unidade da infracção disciplinar, pois que " o juízo disciplinar reporta-se à globalidade do comportamento do agente administrativo", fundamentando-se no "respectivo fim de protecção da capacidade funcional Administração o qual impõe a consideração global das diferentes violações de deveres cometidos por um agente administrativo" (L. Vasconcelos Abreu, op. Cit. 45 e 46)" (in "Procedimento Disciplinar", Leal Henriques, 2007, notas ao artigo 14.º. 28º Por outro lado, como refere o relatório do Conselho Disciplinar da Recorrente, a acumulação de infrações constitui uma circunstância agravante [cfr. ponto 23 do relatório disciplinar que assim o refere, remetendo para o artigo 22.°, n ° 1, alínea d) do RD] e o facto de não ter registo de punições disciplinares anteriores e de ter confessado espontaneamente as infrações disciplinares em apreço, constitui uma circunstância atenuante [cfr. ponto 24 do relatório disciplinar do relatório disciplinar que assim o refere, remetendo para o artigo 21.°, n ° 2, alínea c) do RD], e que ficaram, assim, expressas e foram tidas em consideração na concretização da medida da pena. 29ª Sendo que, o Conselho Disciplinar da Recorrente deliberou aplicar ao ora Recorrido, em cúmulo jurídico, a pena única de multa graduada de € 10.000,00 face à natureza, número e gravidade das infrações provadas e considerando e as circunstâncias agravantes e atenuantes (vide ponto 25 do relatório disciplinar). 30ª O facto de a pena mínima aplicável ser a pena de multa não significa que em concreto, perante as circunstâncias da prática da infração, não se pudesse decidir por pena superior, como, por exemplo, a censura ou a suspensão. 31ª O Conselho Disciplinar ponderou a medida da pena a aplicar - a multa e o respetivo montante, à luz do conhecimento que o arguido tinha, ou devia ter, do quadro legal que o impedia de atuar da forma como atuou, i.e. considerou o comportamento do então arguido necessariamente grave face à acumulação de infrações numa função de interesse público, como é a de Revisor Oficial de Contas, e em prol da defesa da dignidade da profissão que lhe competia [cfr. respetivamente art.º 40.° e art.º 5.° alínea b) do EOROC], sendo que não aplicou pena superior à de multa face aos atenuantes (confissão dos factos e não existência de registo disciplinar anterior), como acima ficou plasmado. 32ª Sendo que o acórdão disciplinar se apropriou da proposta constante da parte final do relatório do instrutor do processo, do seu conteúdo e logicamente dos seus fundamentos, constituindo este, nos termos do n.° 1 do artigo 125.° do Código de Procedimento Administrativo em vigor à data dos factos, parte integrante do ato, sendo que este preceito claramente refere que a fundamentação consiste na sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão. 33º Conforme refere a Jurisprudência invocada na sentença recorrida: O Tribunal não se pode substituir à Administração na concretização da medida da sanção disciplinar, o que não impede que lhe seja possível sindicar a legalidade da decisão punitiva, na medida em que esta ofenda critérios Parais de individualização e graduação estabelecidos na lei ou que saia dos limites normativos correspondentes. (vide Ac TCA Norte proc.° 00747/15.7BECEIR, 23-09-2016). 34ª E salientando-se, ainda, o que se refere no Acórdão do TCA Norte, proc.° n.° 00312111.8BEVIS, de 20-11-2014: - A fixação administrativa das penas, dentro dos respetivos escalões. insere-se na denominada atividade discricionária da Administração, sendo por isso insindicável contenciosamente, salvo nos casos de erro grosseiro. - O ato punitivo está fundamentado desde que faz suas as razões do relatório final do instrutor, as quais se mostram aptas a revelar a um destinatário normal a motivação do decidido. - Não compete ao tribunal pronunciar-se sobre a justiça e oportunidade da punição, por competir em exclusivo, a Administração decidir da conveniência em punir ou não punir e medida da pena [Ac. do STA de 24/911991, no rec. N.° 27551]. 35ª É bom de ver que, no caso em apreço, o Conselho Disciplinar da OROC obedeceu aos critérios definidos nas normas disciplinares, não tendo a graduação da sanção disciplinar saído dos limites fixados na lei ou respetiva regulamentação, tendo a mesma sido fixada de acordo com os poderes discricionários, no âmbito do princípio da livre apreciação da prova. 36ª O Conselho Disciplinar da OROC no relatório e acórdão disciplinar deu a conhecer o iter cognoscitivo e valorativo seguido na aplicação ao então arguido da sanção disciplinar menos gravosa permitida na lei (a multa) e mais adequada face à natureza, número, gravidade dos factos e circunstâncias atenuantes e agravantes (multa pelo valor de 10.000,00). 37ª Por fim, dispensando-nos aqui de reproduzir o que demonstrámos no ponto anterior do presente articulado quanto à natureza do processo disciplinar, que afasta a aplicação direta das normas de direito penal e que fundamentaram a posição do Autor da ação e, bem assim, da sentença recorrida que declarou, com base nos artigos 13.° do Código Penal e art.º 379.° do Código de Processo Penal, a nulidade do ato administrativo sub judice, 38ª Por tudo o que ficou exposto, não se verifica o vício de falta de fundamentação na determinação da medida da pena aplicada, por constarem do ato impugnado os elementos essenciais no que respeita à mesma que permitiram ao ora Recorrido conhecer o iter cognoscitivo e valorativo seguido pelo Conselho Disciplinar da OROC, não lhe sendo imposta outra especificação, 39ª Sendo que, não tendo sido ofendidos os critérios gerais de individualização dos factos (tempo, modo e lugar) e de graduação estabelecidos na lei (i.e. não se tendo saído dos limites normativos previstos para a sanção disciplinar), não é legalmente admissível sindicar a legalidade do acórdão disciplinar. 40ª Não estando, assim, o acórdão disciplinar ferido de nulidade, nos termos das normas de direito penal indicadas na sentença, cuja aplicação se refuta. III) Da declaração de Nulidade do acórdão disciplinar 41ª No nosso modesto entender a falta de fundamentação de sanção disciplinar, enquanto ato administrativo, não é suscetível de cominar a nulidade do mesmo, por não constar do elenco do art.º 133.° do antigo CPA, atual art.º 161.° do CPA em vigor. 42ª Caso existisse falta de fundamentação no caso sub judice (o que não se concede) tal vicio determinaria tão só e apenas a anulação do ato impugnado (cfr. art.º 135.° do CPA anterior, atual art.º 163.° do CPA em vigor). 43ª Neste sentido, vide o Ac. do TCA Norte, proc.° 00730110.9BECBR, de 25-05-2012 referente a falta de fundamentação de ato administrativo: IV- Não ocorre violação do art.º 133.°, n.°2, aL d) do CPA dado nem a falta de fundamentação ser suscetível de gerar no caso o desvalor da nulidade, nem se mostra alegado a violação dum qualquer outro direito fundamental por parte do ato impugnado. 44ª Não sendo aplicáveis as normas indicadas na sentença - art.º 13.° do Código Penal e art.º 379.° do Código de Processo Penal, ao caso sub judice, face à autonomia dos processos e respetiva sanções disciplinares face ao direito penal (demonstrada no presente articulado). 45ª Assim sendo, e salvo melhor opinião, tratando-se de um ato administrativo, o acórdão disciplinar sub judice (que não ofende o conteúdo essencial de nenhum direito fundamental) não poderia ter sido declarado nulo por vício de falta de fundamentação, nos termos do Código de Procedimento Administrativo, que assim, constitui um erro de julgamento quanto a matéria de direito. 46ª Inexistindo no Relatório e no Acórdão punitivo qualquer vício que o torne nulo ou anulável, nos termos do Código de Procedimento Administrativo. Termos em que deve o presente recurso merecer provimento, revogando-se a sentença recorrida, a substituir por outra a julgar improcedente a presente ação, e nessa sequência, mantido o acórdão do Conselho Disciplinar da Recorrente que aplicou ao Recorrido uma pena de multa de € 10.000,00. Assim se fazendo JUSTIÇAI O Autor juntou contra-alegações e concluiu: 1. A decisão recorrida, elegeu como questão primeira e central a da apreciação da verificação do respectivo elemento subjectivo na fundamentação decisória disciplinar, constatando que (cfr. texto da sentença - que citamos) «(...) no caso vertente, ocorre unia total ausência fáctica para o preenchimento de qualquer infracção disciplinar, nomeadamente, a violação do disposto nos artigos 62° e 64° do EOROC e dos deveres estabelecidos nos artigos 5°, 7° e 12° do Código de Ética e Deontologia profissional, por absoluta omissão, nos factos provados, quer do elemento subjectivo da infracção, na vertente do dolo ou da negligência, quer do elemento culpa.» 2. Assim, considerando a classificação que doutrinal e jurisprudencialmente vem sendo sufragada na interpretação do art.º 2.° do Regulamento Disciplinar da Ordem dos Revisores de Contas, para que se verifique uma infracção é necessário não só a verificação da violação dos deveres estabelecidos no diploma regulamentar (elemento objectivo) mas também que a violação tenha ocorrido a título de dolo ou mera culpa (elemento subjectivo ou volitivo). 3. Por isso, foi evidente para o Tribunal que no ato impugnando não se consegue descortinar o juízo de censurabilidade que deveria ser perceptível ao destinatário do mesmo ou mesmo ao tribunal da 1.° instância. 4. Por outro lado, o Tribunal considera que existe uma total ausência do grau de censurabilidade imputado ao autor no elemento objetivo e, consequentemente na determinação da pena. Atento que, a administração mesmo no exercício dos seus poderes punitivos, terá sempre que fundamentar a sua tomada de posição, mesmo em espaços discricionários, também estes sindicáveis em tribunal. 5. Em face do que foi exposto a Senhora Juiz decidiu que, com base «nos art.º 13° do Código Penal e 379° do Código Processo Penal, impõe-se concluir que o ato está ferido de nulidade, atenta a absoluta falta de fundamentação no que respeita ao elemento subjectivo da infracção disciplinar, bem como da determinação da medida da pena.», julgando totalmente procedente a ação administrativa. 6. lrresignada a OROC pugna em apelação, a nosso ver sem qualquer razão, pela validade da decisão disciplinar judicialmente coimada de nula. 7. Com efeito, o recorrido, acompanhando na íntegra toda a motivação exposta na sentença recorrida, entende que o processo contém os argumentos que, além de conduzirem ao mesmo sentido interpretativo a que chegou a Senhora Juiz a quo, sempre conduziriam à manutenção da sentença em análise. 8. Efectivamente, e na medida em que se trata de matéria que era de conhecimento oficioso pelo Tribunal de 1.a Instância, cumpre invocar um vício procedimental que inquina de nulidade a decisão disciplinar da OROC, por ofensa, entre outros, ao princípio da imparcialidade da administração, imposto pelo n.°2 do art.º 266° da Constituição da República Portuguesa. 9. É que, socorrendo-nos das ilustres palavras da Senhora juíza a quo este processo enquadra-se no regime do direito sancionatório envolto por garantias acrescidas. 10. Ora, compulsando a matéria de facto dada como provada na sentença a quo, designadamente a constante das alíneas L) e M), verifica-se que o Sr. Instrutor designado para o apuramento dos factos objecto do procedimento disciplinar instaurado ao recorrido, integrou cumulativamente, na qualidade de vogal, o órgão deliberativo que, em 18 de julho de 2011, aplicou a sanção disciplinar, subscrevendo-a. 11. Ao que acresce que, como a própria recorrente assume no art.º 48° das suas alegações recursivas, "o acórdão disciplinar se apropriou da proposta constante da parte final do relatório do instrutor do processo, do seu conteúdo e logicamente dos seus fundamentos... fazendo parte integrante do acto." 12. Assim, do processo administrativo dado como assente em 1ª instância, resulta indubitavelmente que o instrutor designado e que assina o relatório disciplinar com a proposta de sanção (o Dr. Manuel de Oliveira Lima), ocupou posteriormente o lugar de vogal no Conselho Disciplinar, tendo também subscrito a deliberação deste órgão colegial que aderiu e avocou na íntegra todos os fundamentos constantes do relatório e proposta da autoria do citado instrutor (cfr. art.º 49° e 50° das alegações da recorrente). 13. Porém, acompanhando de perto a Jurisprudência do Tribunal Central Administrativo do Norte no Acórdão prolatado em 07 de Abril de 2017, no processo n.° 02615/13.8BEPRT (Dr. Frederico Macedo Branco) consultável em www.dgsi.pt, que com a devida vénia ao seu Relator se transcreve o sumário, diremos que: 1 - O Tribunal se não pode substituir à Administração na concretização da medida da sanção disciplinar, o que não impede que lhe seja possível sindicar a legalidade da decisão punitiva, na medida em que esta ofenda critérios gerais de individualização e graduação estabelecidos na lei ou que saia dos limites normativos correspondentes. 2 - No âmbito da Ordem dos Oficiais de Contas, o facto do instrutor de Processo Disciplinar ter assento no órgão disciplinar decisor certamente que tem a prerrogativa de influenciar a decisão final a proferir, sendo que, na prática tem, por assim dizer, voto de qualidade, perante a eventual divisão dos restantes quatro membros, desempatando a decisão. Em bom rigor o instrutor vota a sua própria proposta. É incongruente que o instrutor disciplinar, ao mesmo tempo que dirige o procedimento, analisa as provas e elabora o relatório final, no âmbito do qual propõe a aplicação de pena disciplinar, participe ainda na deliberação final que aplica definitivamente a pena. 3 - Definindo expressamente o Art.º 84° do Regulamento Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas que é subsidiariamente aplicável, designadamente, o Código Penal e o Código de Processo Penal, ao não ser respeitada a separação entre a entidade que acusa e a entidade que decide, mostra-se violado o princípio da imparcialidade previsto no artigo 266.°, n.° 2 da CRP. 14. Com efeito, ainda de braço dado com a motivação deste Douto aresto, «o n.° 10 do artigo 32.° da CRP assegura expressamente que em todos os processos sancionatórios, "são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa", pelo que a questão colocada não é despiciente, pois que o referido normativo constitucional equipara as garantias de qualquer processo sancionatório ao do processo criminal. Como refere Eduardo Correia, "(...) na medida em que as penas disciplinares são um mal infligido a um agente, devem (...) em tudo quanto não esteja expressamente regulado, aplicar-se os princípios que garantem e defendem o indivíduo contra todo o poder punitivo (...)". Também, José Beleza dos Santos sustenta, citado no acórdão do TOAS n° 03645/08, de 02-10-2008, que "(...) As sanções disciplinares têm fins idênticos aos das penas crimes; são, por isso, verdadeiras penas: como elas reprovam e procuram prevenir faltas idênticas por parte de quem quer que seja obrigado a deveres disciplinares e essencialmente daquele que os violou. (...) aquelas sanções têm essencialmente em vista o interesse da função que defendem, e a sua atuação repressiva e preventiva condicionada pelo interesse dessa função, por aquilo que mais convenha ao seu desempenho atual ou futuro. (...) No que não seja essencialmente previsto na legislação disciplinar ou desviado pela estrutura específica do respetivo ilícito, há que aplicar a este e seus efeitos as normas do direito criminal comum. (...)" - José Beleza dos Santos, Ensaio sobre a introdução ao direito criminal, Atlântida Editora/968, págs.113 e 116.» 15. In casu, a verificada ofensa ao princípio constitucional da imparcialidade da administração - concretizada no facto de o "orgão instrutor e acusador" tomar lugar no "órgão decisor" - comprime de forma intolerável as garantias de defesa constitucionalmente consagradas ao recorrido no art.º 20°, e no n.° 10 do art.º 32°, ambos da Constituição da República Portuguesa, e acarreta a comissão do vício de nulidade prevista nas alíneas d) e l) do n.° 2 do art.º 161° do CPA, cujos efeitos e regime se encontram previstos no n.° 1 e n.° 2 do art.º 162° do mesmo diploma, pelo que a decisão punitiva da OROC (aliás já declarada nula pela sentença a quo) será sempre, e segundo qualquer prisma, nula e de nenhum efeito. Sem prescindir 16. O art.º 2.° do Regulamento Disciplinar da OROC, sob a epígrafe Infracção disciplinar, dispõe que "Considera-se infracção disciplinar a conduta do membro da Ordem que, por acção ou omissão, violar, dolosa ou culposamente, algum dos deveres estabelecidos no respectivo Estatuto ou em outros normativos aplicáveis, bem como os decorrentes das suas funções" - sublinhado nosso. 17. Da mesma forma, o art.º 12.° do Regulamento de Formação Profissional dos ROC, sob a epígrafe responsabilidade disciplinar, dispõe que "comete infracção disciplinar o revisor oficial de contas que, por acção ou omissão, violar dolosa ou culposamente algum dos deveres estabelecidos nos n.° 1 a 4 do artigo anterior"- sublinhado nosso. 18. Sendo que, também o art.º 80° do Estatuto da Ordem dos ROC (DL 487/99) contém norma de conteúdo impositivo idêntico. 19. Ou seja, mesmo considerando unicamente para as normas internas da OROC, só estamos perante a comissão de uma infracção disciplinar no caso de nos depararmos com a prática de um acervo de factos tipicamente previstos no "catálogo" disciplinar, e aos quais esteve subjacente uma atuação dolosa ou negligente do agente. 20. Assim, ao contrário do que alega a recorrente, é o próprio Regime Jurídico Disciplinar da OROC que apela à noção de culpa, a qual deverá, necessariamente, ser densificada, na sua tarefa aplicativa, com os conceitos que emanam do Código Penal e do Código do Processo Penal. 21. Por isso, não se aceita, como a recorrente parece (diga-se, contraditoriamente - ver art.º 10° e art.º 16° das alegações recursivas, em clara oposição) defender, que ao processo disciplinar apenas seja de aplicar subsidiariamente a fundamentação prevista no CPA para os actos administrativos, olvidando as garantias que a todos são reconhecidas, mormente no que respeita ao Direito de cariz punitivo. 22. Logo, bem andou a sentença a quo, cuja inicial preocupação passou por esclarecer qual o regime aplicável, e, posteriormente, aferir se o mesmo foi observado na decisão administrativa impugnada. 23. E bem, concluiu dever aplicar-se subsidiariamente os pressupostos lógicos do processo penal e direito penal, tal como já professava a doutrina de Eduardo Correia e José Beleza dos Santos citando o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 23 de setembro de 2016, processo n.° 747/15.7BECBR, consultável em www.dgsi.pt. 24. No mesmo sentido, diremos nós, concorrem os pareceres da Procuradoria Geral da República referentes às relações entre o Direito Penal e o Direito Disciplinar, que se citam:" ambos são direito sancionatório mas distinguem-se pela natureza das suas sanções e pelo fins que cada um prossegue. (...) O que não esteja claramente previsto na estrutura disciplinar deve aplicar-se subsidiariamente as normas do direito penal nomeadamente os princípios gerais." Parecer da PGR P00002385, parecer n.° P001602003. 25. Sendo que, o apelo a este regime, como não poderia deixar de ser por se tratar de matéria sancionatória, já se encontrava previsto nos regulamentos da OROC: o princípio geral e básico do Direito Penal, subsidiariamente aplicável, como se disse, contido no art.º 13° do Código Penal determina que é nula a pena sem culpa (nulla poena sine culpa). 26. Com efeito, tal como ficou claramente exarado na douta sentença a quo, cujo trecho se transcreveu supra, em lado algum da decisão disciplinar da OROC se faz qualquer referência, por breve que seja, à existência de dolo ou negligência por parte do autor na prática dos factos que lhe são imputados. 27. E muito menos se expõe a caracterização e definição do respectivo grau de censurabilidade (negligência ou dolo) da conduta em causa, pois (cfr. Art.º 40° do C. P.) em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. 28. Diga-se, neste particular, que é com clara intenção obnubilante que a recorrente omite nas suas alegações o disposto no art.º 17° do Regulamento Disciplinar da OROC, onde se estabelece que, no concernente à Graduação das sanções, estas deverão atender «aos antecedentes profissionais e disciplinares do arguido, ao grau de culpabilidade, à gravidade e às consequências da infração, à situação económica do arguido e a todas as demais circunstâncias agravantes ou atenuantes.» 29. Ou seja, não só a decisão punitiva da OROC ofende os princípios da Lei Geral que lhe seriam impostergavelmente aplicáveis, como viola frontalmente os próprios comandos internos de conformação e validação do procedimento disciplinar, já que no texto da mesma se verifica a total ausência de considerações mínimas a este nível atinentes. 30. Assim, não se compreende como é que a recorrente pretende justificar a validade da aplicação da concreta medida disciplinar, se nem sequer se encontra presente da decisão administrativa a que título (dolo ou negligência) foi a alegada infracção cometida. 31. E, da decisão declarada nula, não há como perceber se este princípio fundamental presidiu à determinação da multa aplicável ou se, pelo contrário, a mesma se baseou no puro arbítrio do instrutor, uma vez que também não explicitou na sua decisão os critérios que presidiram à determinação da pena, momento elementar e fulcral que permite sindicar este momento em Tribunal. 32. Aliás, a própria sentença a quo resolve esta mesma questão, afirmando que há uma "omissão completa de fundamentação não permitindo conhecer, desta forma sindicar, os argumentos aduzidos, uma vez que não existem." 33. Assim, impunha-se à decisão contida no acórdão disciplinar pronunciar-se acerca da culpa do autor. 34. Também aqui concordamos com a sentença da 1.ª instância que cristalinamente explana esta situação coimando com a nulidade a decisão por total ausência de fundamentação. 35. Em abono das considerações que antecedem, e título exemplificativo citamos excertos do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.° 165/17.2 BCLSB, cuja relatora frisa a doutrina avançada supra: "(...) a medida concreta da pena disciplinar aplicada pela Administração apenas é contenciosamente sindicável quanto a aspectos vinculados, em casos de desrespeito dos princípios reguladores da atividade administrativa - principio da proporcionalidade." 36. E do acórdão prolatado no proc. n.° 00691/10.4BECBR Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 22 de novembro de 2012: (…) Em sede de penas disciplinares o princípio da proporcionalidade postula a adequação da pena imposta à gravidade dos factos apurados, de molde a que a medida punitiva a aplicar seja aquela que, sendo idónea aos fins a atingir, se apresente como a menos gravosa para o arguido. 37. Ora, no caso sub iudice, o acórdão da OROC não fundamenta como determinou a escolha daquela pena disciplinar e o porquê aquele valor em concreto. 38. Assim, labora a recorrente em erro de raciocínio crasso e palmar quando, nas alegações de recurso correspondentes ao artigo 17.°, que se passa a citar, defende que: (...) dados como provados os factos em que assenta o acórdão, se considera desde logo demonstrada a culpa do então arguido já que se impunha ao mesmo conhecer as normas profissionais e os deveres que o regem. 39. É, por conseguinte, notório o vício em que incorre este raciocínio, já que no Direito Disciplinar Português não existe qualquer presunção de culpa do arguido, mas sim, e muito pelo contrário, a presunção de inocência deste até prova dos elementos objectivos e subjectivos fundamentantes da punição. 40. Tem, pois, que ser a entidade administrativa a carrear para o processo os factos e a subsunção destes ao direito para determinar como agiu o arguido, porque agiu desta forma ou poderia ter agido o arguido de outra forma. 41. No caso vertente a moldura abstratamente aplicável variava entre os €1.000,00 e os €10.000,00, no caso da decisão pela pena de multa, e caberia à entidade administrativa determinar em concreto o montante a aplicar em função dos factos que o instrutor do processo tinha o dever de carrear e analisar nos autos. 42. Conclui-se, portanto, que o "due process" de determinação da pena e do apuramento da sua medida ficou ausente de todo o iter argumentativo expendido na decisão da Administração, traduzindo-se a aplicação de pena de multa ao autor no valor de €10.000,00, correspondente ao montante máximo aplicável - cfr. Art.º 13°, al. c), do RDOROC, numa medida punitiva ilegal, chocante e absurda. 43. Senão vejamos, (i) o arguido reconhece os factos em apreciação, justificando-os, e esta atitude em confronto dos factos funciona nos termos e para os efeitos do Regulamento n.° 80/2010, Regulamento Disciplinar da OROC, (ii) como uma circunstância atenuante. 44. Com efeito, na sua contestação escrita, o autor, admitindo os factos, apresentou em sua defesa circunstâncias dirimentes da culpa, como sejam o seu mau estado de saúde e o excesso de trabalho com que se confrontava na altura. 45. Contudo, também aqui não conseguimos saber se foram tais circunstâncias valoradas como atenuantes, e, neste caso, em que sede/grau de culpa seriam os mesmos de enquadrar. 46. A decisão administrativa citou en passent estes argumentos da defesa, e, não obstante, votou-os a total desconsideração, uma vez que nem concluiu pela imputação ao autor de qualquer tipo de culpa, nem os valorou como atenuação no cometimento dos factos, o que redundou na prática da nulidade prevista no n.° 2 do art.º 374° e 410°, ambos do C. P. Penal. 47. Nas suas alegações, a Ré, para colocar em causa e ferir a sentença a quo, chama à colação no artigo 25.° das alegações de recurso o acórdão do TCA Sul proferido no processo n.° 10383/13, de 10/07/2014 que diz respeito a uma sanção disciplinar da ordem dos advogados.... 48. Contudo, a recorrente extrapola totalmente do conteúdo a que se reporta tal decisão desse alto Tribunal, descontextualizando a citação do mesmo. 49. Na verdade, grande parte da motivação de tal acórdão reporta-se claramente à apreciação da medida da pena e do grau de culpa do agente, ao invés do que a ré quer fazer crer com as suas afirmações. Senão vejamos com a seguinte citação extraída do acórdão: (...) além disso, foram consideradas para efeitos de apreciação da medida da pena circunstâncias relativas quer ao concreto grau de culpa, quer antecedentes agravantes. (...) 50. Visto o que antecede, e como bem concluiu a sentença a quo, "(....) tão pouco ficando expressas as razões que a levaram a optar pelo limite máximo da pena de multa, que não um qualquer valor, incorrendo assim a decisão impugnada em omissão de fundamentação." 51. Efectivamente, olvidou a decisão administrativa impugnada, quanto a este aspecto, a aplicação dos mais elementares critérios legais da escolha da pena (art.º 70° do C. Penal), da determinação da medida da pena (art.º 71° do C.P.), e da pena conjunta aplicável ao concurso de infracções (art.ºs 77° e 78° do C.P.) na decisão com que coimou o autor. 52. Na medida em que o art.º 70° do C.P. elege como critério da escolha da pena a melhor prossecução das finalidades da punição, na aplicação deste preceito importa, naturalmente, ter em atenção o disposto no art.º 40° do mesmo C.P. 53. Assim sendo, a culpa e seu respectivo grau não são realidades a ponderar apenas e especificamente na tarefa de escolher o tipo de pena, antes têm o seu campo de incidência privilegiado na escolha e quantificação da sua medida concreta. 54. Daí que importe ver se a opção pela pena de multa se mostra necessária, adequada e proporcionada, ao serviço dos objectivos da prevenção geral e especial. 55. É, por conseguinte, ocioso e descabido afirmar-se, como pretende a recorrente, que a decisão administrativa se encontra fundamentada pelo cumprimento dos preceitos previstos no n.° 1 do art.º 125° do CPA, pois estes não são, nem de perto como se viu já, os aplicáveis ao caso sub iudice. 56. Bem como se nos afigura (com o devido respeito) total estultícia defender a aplicação do regime da anulabilidade dos actos administrativos previsto no actual art.º 163° do CPA, ao caso vertente, porquanto nos encontramos no âmbito do Direito Disciplinar e sancionatório, e não no seio do Direito Administrativo strictu sensu. Termos em que, em face do exposto e do mais que por certo não deixará de ser suprido, deve o recurso da OROC ser julgado improcedente, confirmando-se a Sentença recorrida, com o que este Tribunal fará JUSTIÇA. O Conselho Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (OROC), notificado das contra-alegações do Recorrido, veio pronunciar-se sobre a matéria da ampliação do recurso, finalizando nestes termos: I- Da ampliação do recurso 1) Tendo a presente ação sido julgada totalmente procedente e, consequentemente, declarado nulo e de nenhum efeito, o impugnado acórdão do Conselho Disciplinar da OROC proferido em 18/07/2011, com custas pela Ré (aqui Recorrente) e não tendo a parte vencedora na ação, decaído em nenhum dos vícios por si alegados, o novo vício, invocado apenas nas contra-alegações de Recurso pelo Recorrido (não alegado na ação), não é passível de ser objeto de apreciação no âmbito do presente recurso, não devendo ser admitida a ampliação do recurso ou considerado como recurso subordinado, nos termos do art.º 633.° e do art.º 636.° do CPC; 2) Tem sido pacificamente entendido pela Jurisprudência que a ampliação do recurso ou recurso subordinado implica necessariamente a sucumbência na causa por parte do Recorrido - o que, como vimos, não se verificou no caso concreto. 3) não tendo o Recorrido arguido a nulidade da sentença ou impugnado a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, também não é possível a ampliação do âmbito do recurso, por aplicação o n.° 2 do art.º 636.° do CPC. 4) Sendo que, o Recorrido só poderia invocar um novo vício do ato administrativo nas contra-alegações de recurso se não lhe fosse exigível o conhecimento do mesmo no momento da apresentação da Petição Inicial, por ser superveniente - o que como é bom de ver não se verifica no caso sub judice; 5) Constituindo, ainda, entendimento dos Tribunais que o vício gerador de mera anulabilidade (como seria o caso do novo vicio invocado nas contra-alegações de recurso peio Recorrido) só pode ser arguido no prazo previsto na lei, peio que não o sendo, o Recorrido perde o direito de o arguir. 6) Acresce que, é completamente irrelevante para apreciação do âmbito presente recurso se o alegado novo vício era de conhecimento oficioso pelo Tribunal de lª instância, como refere o Recorrido. 7) Saliente-se que, o que importa é que o referido vício não foi alegado na ação, nem encontrou o Tribunal a giro motivo para exercer a sua apreciação oficiosa, pelo que não existiu pronúncia sobre o mesmo na sentença; 8) IV- Em sede de recurso jurisdicional não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado no seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se. (sublinhado nosso)... (cfr. Ac. do TCA Sul, proc.° 5786/09, de 3 de fevereiro, sumário). 9) Ora, como o objetivo do recurso jurisdicional é modificação da decisão impugnada, não tendo esta conhecido de determinada questão por não ter sido oportunamente alegada, não pode a recorrente vir agora suscitá-la perante o tribunal superior, porque o objecto do recurso são os vícios da sentença e não os vícios que o recorrente imputa ao ato impugnado. (cfr. Ac. do TCA Sul, proc.° 5786/09, de 3 de fevereiro, último parágrafo do ponto 3.) II -Da matéria objeto da ampliação do recurso 10) Conforme se refere no Ao. do STA de 10.01.2008, Proc.° 0410107, apenas da conjugação de uma norma legal - constante dos estatutos que proíba expressamente que o vogal do órgão disciplinar vote na respetiva deliberação quando tenha tido intervenção nesse processo como instrutor, com a norma constitucional - do princípio da imparcialidade, poderá resultar a nulidade dessa deliberação por violação de lei. 11) Efetivamente, o douto acórdão do STA refere que " o princípio constitucional da imparcialidade na atuação administrativa aplica-se erga omnes, mas a sua eventual violação deverá repousar na afronta de outros preceitos normativos, que não o invocado n.° 4 do art.º 24.° do EOE, desde logo o art.º 266.° n.° 2 da CRP, também considerado na sentença, conjugadamente com aqueloutro"; 12) Não resulta do estatuto da OROC, que a intervenção do Instrutor do processo disciplinar na subscrição do acórdão punitivo, seja um impedimento ou uma incompatibilidade, estabelecendo-se expressamente que o mesmo vote o acórdão punitivo (n° 4 e 8 do art.º 63.° do EOROC), Acresce que, 13) Os Estatutos e a Regulamentação Disciplinar e de Controlo de Qualidade dos membros da OROC estabelecem regras próprias que salvaguardam o Principio da Imparcialidade (n.° 2 do art.º 266° da CRP); sendo que a deliberação punitiva em crise e os demais atos praticados com vista à mesma observaram essas regras; nomeadamente, 14) o processo em apreço foi instruído, no âmbito de concurso público para controlo da qualidade do trabalho dos ROC pela Comissão de Controlo de Qualidade da OROC, que submeteu o relatório onde detetou incumprimento das normas técnicas da profissão de ROC, e o submeteu ao Conselho Diretivo, que por sua vez, por considerar existir responsabilidade disciplinar solicitou ao Conselho Disciplinar a abertura de um processo, que resultou no Relatório do Instrutor designado obrigatoriamente de entre os membros deste Órgão Disciplinar e, que submetido à livre apreciação do Conselho Disciplinar foi emitido um acórdão votado por unanimidade (incluindo pelo Instrutor como resulta do Regulamento Disciplinar); 15) o art.º 63 n° 4 e 8 e o art.º 35° do RD e o art.º 83° n° 2 do EOROC estabelecem expressamente que o Instrutor seja um membro do Conselho Disciplinar e que este vote na deliberação punitiva; 16) o Conselho Disciplinar tem autonomia decisória, podendo a deliberação não coincidir com a sanção proposta peio Instrutor, que não subordina a decisão punitiva; não se vislumbrando perante a evidência e a gravidade das infrações disciplinares cometidas pelo Recorrido que a decisão pudesse ser não coincidir com a presente, ainda que o Vogal Instrutor não tivesse votado; 17) podendo, inclusivamente, considerar-se que a punição disciplinar é determinada por órgão diverso e independente - Conselho Disciplinar; do Instrutor - Entidade nomeada por aquele. 18) a posição individual do Instrutor na OROC de 115 não tem qualquer expressividade face à decisão coletiva; nem se exige unanimidade no RD para a deliberação punitiva; 19) o art.º 32.° da CRP sob a epígrafe "garantias do processo criminal" só se aplica ao processo criminal - o direito penal prescreve as sanções mais gravosas da nossa ordem jurídica, pelo que há uma necessidade acrescida de consagrar direitos e garantias, sendo o direito disciplinar um minus face ao direito penal, afasta o Princípio do Acusatório do processo disciplinar. Ainda que se admita, o que não se concede, a aplicação do n.° 10 do art.º 32.° da CRP ao processo disciplinar, este impõe que nos processos sancionatórios seja assegurado ao arguido os direitos de defesa e de audiência e, sendo que esses direitos não foram postos em causa pela atuação da Ré (Recorrente), nem impugnados pelo A. (Recorrido) no processo em apreço; 20) não se aplicam, no caso em apreço, os impedimentos previstos nomeadamente no art. 40.° do CPP, porquanto a remissão da ai. e) do art.º 48.° do CPP não pode ser aplicada "tout court" para estes artigos específicos, sendo necessário aplicar esta remissão com as necessárias adaptações. Tendo em conta a especificidade do processo disciplinar, designadamente, a não existência de uma estrutura acusatória, pois como acima ficou demonstrado, o EOROC e o RD não fazerem separação de poderes entre o instrutor e o decisor, sendo que neste processo disciplinar (por natureza uno), a decisão não constitui uma fase diferente, como acontece no processo penal; 21) não tendo o processo disciplinar da OROC uma estrutura acusatória, não existe violação do princípio da independência e da isenção da deliberação punitiva, nos termos do art.º 32.° da CRP; 22) o processo de controlo de qualidade da OROC constitui, de acordo com o entendimento pacifico da jurisprudência administrativa, fase de instrução do processo disciplinar, pelo que, não existe nulidade da presente deliberação punitiva pelo facto da instrução ter sido conduzida por órgãos distintos e por membros diferentes dos que deliberaram a decisão punitiva, ainda que se entenda, sem conceder, que o instrutor enquanto vogal do conselho Disciplinar não pudesse votar a deliberação punitiva; 23) pelo acima exposto, não ocorreu a apontada violação do princípio da imparcialidade previsto no n° 2 do art.º 266.° da CRP ou de qualquer outro principio constitucional; 24) inexistindo no Processo Disciplinar, no Relatório e no Acórdão punitivo qualquer vício de facto ou de direito que o torne nulo ou anulável, nos termos do Código de Procedimento Administrativo; Termos em que, Não deve ser admitida a propugnada pelo Recorrido ampliação do objeto do recurso ou a admissão de recurso subordinado, decorrente da invocação de novo vício nas contra-alegações de recurso. E, a titulo subsidiário, no caso de assim não se entender, o que apenas por mera cautela de patrocínio se coloca como hipótese, mas sem conceder, Deve ser julgado totalmente improcedente o novo vício alegado nas contra-alegações de Recurso e confirmar-se, não só quanto à matéria aqui tratada, como também, quanto à demais matéria constante do Recurso Jurisdicional, a decisão punitiva do Conselho Disciplinar, esse Tribunal fará Justiça O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos contidos no artº 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer. Cumpre apreciar e decidir. FUNDAMENTOSDE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: A) Ao longo do ano de 2010, a Comissão do Controlo de Qualidade da Ré procedeu à execução do controlo de qualidade, designado de “horizontal e vertical”, ao trabalho levado a cabo pelo Autor, cujos procedimentos e conclusões constam do Relatório de Conclusões e de Recomendações (cfr. fls. 3 e ss. do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzido); B) A 05/01/2011, a indicada Comissão do Controlo de Qualidade, após ter examinado o indicado relatório, produzido no processo que correu termos sob o nº 71/10, concluiu o seguinte: “Controlo horizontal: - Existem algumas observações de relevância, designadamente o incumprimento do definido no Regulamento de Formação Profissional quanto à participação em ações de formação. Controlo vertical: - O parecer emitido pelo ROC não está adequadamente suportado pelo trabalho efetuado e não reflete as conclusões extraídas, não tendo sido cumpridas as DRA 410, 500 e 510.” (cfr. idem); C) O referido processo nº 71/10 foi remetido pela Comissão do Controlo de Qualidade para o Conselho Disciplinar da Ré, por entender que devia ser objeto de procedimento disciplinar (cfr. fls. 2 do PA); D) A 25/01/2011, o Conselho Disciplinar da Ré deliberou o seguinte: “Apreciadas as conclusões dos processos de controlo referenciados, foi deliberado abrir os seguintes processos disciplinares: (…) c) Com o nº 3/2011, o relativo ao ROC A. S. A. (participado), sendo nomeado instrutor o Dr. M. L.. Participante: o Conselho Diretivo.” (cfr. idem); E) A 31/01/2011, a deliberação indicada em D) foi comunicada ao Autor (cfr. PA); F) A 26/01/2011, a Ré emitiu um certificado do registo disciplinar relativamente ao Autor, do qual consta o seguinte: “Para os efeitos previstos no nº 1 do artigo 44.º do Regulamento Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, certifica-se que no registo disciplinar do Revisor Oficial de Contas A. S. A., inscrito nesta Ordem em 17/01/2001 sob o nº 1097 nada consta.” (cfr. fls. 129 do PA); G) A 01/03/2011, e no âmbito do processo disciplinar nº 3/2011, foram tomadas declarações ao Autor, tendo sido lavrado o respetivo auto, do qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) Questionado sobre as conclusões do controlo de qualidade no âmbito do processo nº 71/10 da CCQ, no qual são apontadas diversas anomalias no que respeita a Provas de Revisão, Controlo Interno, Saldos de Abertura e Formação, declarou o seguinte: - Quanto à formação declarou que efetivamente esteve em falta no passado mas que para 2011 inclusive se propõe participar em ações de formação e superar no triénio os créditos mínimos fixados pelo regulamento; - Quanto ao controlo interno declarou que os contactos regulares que tinha com a empresa e com os seus responsáveis constatou objetivamente que ela tinha um controlo interno adequado, do qual teve comprovação através de um levantamento exaustivo que havia realizado em 2008, reconhecendo, contudo que no ano de 2009 não procedeu à sua realização, por entender que não tinha havido alterações aos procedimentos de controlo que haviam sido objeto da sua apreciação no ano de 2008; - Quanto à prova de revisão, declarou que na altura em que foi efetuado o controlo de qualidade, por razões de saúde não apresentou documentos comprovativos dos trabalhos realizados nas áreas de Existências e de Seguros, apesar de eles terem sido realizados, reconhecendo contudo que essa omissão só a ele é imputada; - Quanto aos saldos de abertura, declarou que desconhece as razões de observação feita pelo controlo de qualidade, uma vez que a empresa Cavipor foi sujeita a revisão por ele próprio, desde 2005/2009 inclusive. Declarou por fim que não obstante as lacunas assinaladas pelo controlo de qualidade, o trabalho de revisão legal de contas efetivamente realizado proporcionou-lhe a convicção de que a informação financeira objeto de certificação legal das contas se encontrava corretamente preparada, reconhecendo que no dossier de trabalho existe falta de evidência do trabalho por si realizado. (…)” (cfr. fls. 134 e ss. do PA); H) A 10/03/2011, o instrutor nomeado elaborou nota de culpa, na qual se pode ler, designadamente, o seguinte: “(…) Artigo primeiro. O arguido A. S. A. foi objeto de controlo de qualidade, o qual incidiu sobre a revisão/auditoria da empresa C. – V. de P., S.A., relativo ao exercício de 2009, do qual o arguido é Revisor Oficial de Contas e Fiscal Único. Artigo segundo. Conforme consta do processo N.º 71/10, instruído pela Comissão do Controle de Qualidade, as conclusões do controlo de qualidade revelam várias deficiências no trabalho realizado pelo arguido, que se enunciam nos artigos seguintes. Artigo terceiro. Emitiu a certificação legal das contas do exercício de 2009, da sociedade C. – V. de P., S.A., mas no dossier de trabalho não existe prova da revisão nem papéis de trabalho que assegurem terem sido executados adequados procedimentos de revisão/auditoria nas áreas de Existências, Especialização de Exercícios, Vendas e Prestação de Serviços, Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias-Primas Consumidas, Fornecimentos e Serviços Externos, Custos com o Pessoal, Custos e Proveitos Extraordinários, Transações e Saldos entre Entidades Relacionadas, Impostos (IRS, IVA e Segurança Social) e ainda Seguros, violando, com essa omissão, o disposto no parágrafo 19 das Normas Técnicas de Revisão/Auditoria e em concreto o estabelecido na Diretriz de Revisão/Auditoria 510 (Prova de Revisão) e na Diretriz de Revisão /Auditoria 230 (Papéis de Trabalho). Artigo quarto. Não cumpriu o procedimento de avaliar o controlo interno, violando com essa omissão o que se encontra estabelecido no parágrafo 13 das Normas Técnicas de Revisão/Auditoria e na Diretriz de Revisão/Auditoria 410 (Controlo Interno). Artigo quinto. Não cumpriu o dever de participar nas ações de formação contínua, nos anos de 2009 e 2010, contrariando com essas omissões o que estabelece o n.º 2 do artigo 62.º do Estatuto da OROC e os artigos 5.º e 12.º do Regulamento de Formação da OROC. Artigo sexto. O arguido contra A. S. A. (ROC n.º 1097) praticou, em acumulação, três infrações, pois na revisão legal das contas da sociedade C. – V. de P., S.A., relativa a 2009, não cumpriu os procedimentos que exigem a elaboração de papéis de trabalho e provas de revisão/auditoria, nos termos prescritos no parágrafo 19 das Normas Técnicas de Revisão/Auditoria, bem como nas Diretrizes de Revisão /Auditoria 230 e 510, não procedeu à avaliação do controlo interno em conformidade com o estabelecido no parágrafo 13 das Normas Técnicas de Revisão/Auditoria e na Diretriz de Revisão/Auditoria 410 e, por fim, não participou em ações de formação contínua, nos anos de 2009 e 2010, nos termos prescritos no artigo 62.º, n.º 2 do Estatuto da OROC e nos artigos 5.º e 12.º do Regulamento de Formação da OROC. Artigo sétimo. O arguido atuou livre e voluntariamente, não podendo desconhecer que a sua conduta era reprovável e punida por lei. Artigo oitavo. Os comportamentos referidos nos artigos terceiro a quinto desta Nota de Culpa constituem infrações disciplinares nos termos do artigo 80.º do Estatuto da OROC, do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar e do artigo 16.º do Código de Ética e Deontologia Profissional, mas a censurar com uma única pena disciplinar, nos termos da norma constante do n.º 1 do artigo 20.º do Regulamento Disciplinar, podendo dar lugar à aplicação de pena não superior à de suspensão de 30 dias até 5 anos, nos termos da alínea e) do artigo 13.º do Regulamento Disciplinar e em conformidade com o disposto na alínea e) do N.º 1 do Estatuto da OROC. Artigo nono. A favor do arguido milita o facto de ele ter confessado espontaneamente as infrações de que é acusado, facto que constitui circunstância atenuante nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 21.º do Regulamento Disciplinar. Assinala-se que no registo disciplinar do arguido nada consta. Artigo décimo. A acumulação de infrações praticadas pelo arguido constitui circunstância agravante, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 1 e no n.º 3 do artigo 22.º do Regulamento Disciplinar. Nos termos do artigo 57.º do Regulamento Disciplinar, fixo o prazo de vinte dias para o arguido A. S. A. deduzir a sua defesa, podendo, dentro deste prazo, examinar o processo, apresentar rol de testemunhas, juntar documentos e requerer diligências úteis, sob cominação de a falta de resposta dentro do prazo marcado valer como efetiva audiência do arguido para todos os efeitos legais.” (cfr. fls. 137 e ss. do PA); I) A nota de culpa transcrita em H) foi comunicada ao Autor a 10/03/2011 (cfr. fls. 136 do PA); J) A 08/04/2011, o Autor enviou à Ré a sua defesa, por carta registada, na qual se pode ler, designadamente, o seguinte: “(…) A) DRA 410 – Controlo Interno: Dado tratar-se duma PME entende-se que os testes substantivos eram preferíveis aos testes de conformidade. Todavia testou-se o Controlo Interno e não se apuraram motivos para se auditar diferentemente, pois no ano anterior foi feito um levantamento exaustivo de todo o sistema. Assim, evidenciaram-se os trabalhos de Controlo Interno tendo silenciado mas conclusões por área de trabalho por não se terem considerado relevantes. Refira-se que não houve alterações das circunstâncias do exercício de 2008 para 2009, mantendo-se em funções a mesma administração, bem como os quadros relevantes da empresa. B) DRA 510 – Prova de Revisão/Auditoria: Relativamente a esta DRA o facto do trabalho desenvolvido não estar evidenciado deve-se a: 1) Inventário. A sociedade adota sistema de inventário permanente, e dado o facto da atividade da empresa ser a compra, venda e produção de vinhos, submetida a forte atividade de controlo por parte das entidades oficiais, nomeadamente pela efetivação de varejos periódicos e sistemáticos, nada se tendo apurado que colocasse em causa os registos da empresa, entendeu-se assim que os valores eram confiáveis, pois o último varejo ocorreu em 18-11-2009, nada resultando de falhas materialmente relevantes, como se comprova por fotocópias de tal documento que anexa (Doc. 01); 2) Contagem. Em função do exposto no ponto anterior, e dado o varejo efetuado pela entidade competente e a proximidade da data deste, próxima do fim de ano, entendeu não se justificar qualquer trabalho adicional. 3) Valorização da produção. A empresa efetuou um teste entre a quantidade de uvas entradas e o vinho produzido, conduzindo a rácios próximos do habitual para o setor, que é de 750 kgs de uvas/550 litros de vinho, de que se anexa fotocópia de mapa discriminativo (Doc. 02). 4) Margem. Relativamente à margem bruta, dado que a empresa dispõe dum bom sistema de inventário permanente corroborei a mesma. 5) Especialização do Exercício. Para além dos valores serem abaixo do nível de materialidade (especialização de férias, subsídio de férias e juros) entendi que a evidência não era elemento crucial neste âmbito dado o facto de não ter havido alterações significativas em tais valores do exercício anterior para 2009. 6) Prova nas áreas de FSE, Impostos e Custos com Pessoal. Dado que todos os movimentos passam pela contra bancária, quer por efeito das reconciliações, quer por efeito das circularizações efetuadas e ainda por passarem pelas contas de terceiros, foram detalhadamente verificados, tendo entendido não evidenciar os testes ao FSE, Impostos e Custo com Pessoal. 7) Seguros. Verifique mais tarde, pois tinha a certeza que tinha tratado em pormenor esta área, que existia em meu poder, não só comprovativos da existência de seguros em todos os ramos aplicáveis à atividade da empresa, mas também mapas resumo em Excel das coberturas e condições, que estavam arquivado no Dossier corrente do ano anterior e que se permite juntar fotocópias (Doc.03). C) DRA 230 – Papéis de trabalho: Relativamente a esta DRA o facto do trabalho desenvolvido não estar disponível na sua totalidade e devidamente organizado, é uma situação que o Revisor Oficial de Contas reconhece ter falhado e sem se pretender desculpar, apenas se permite adiantar que tal falha resulta, essencialmente duma situação de falta de saúde complicada, que o atingiu numa fase mais crítica, durante um período decisivo para a organização dos respetivos dossiers e papéis de trabalho. D) Participação em ações de formação: Efetivamente o signatário não teve oportunidade de participar nas ações de formação desejadas, tendo até cancelado algumas já depois de inscrito, devido ao problema de saúde que o afetou e nalgumas situações por manifesta falta de disponibilidade de tempo. No entanto, sempre fiz questão de recuperar tal situação, tanto assim que os objetivos, para além da sua retroatividade a 2009, que condicionou desde logo a situação, abrange um triénio que se completa até finais de 2011, pelo que no corrente ano, irei frequentar o máximo de ações de formação que a minha atividade profissional me permitir (uma delas já objetivada) estando inscrito já em várias, entre as quais as ISAS, como comprovo através das faturas já emitidas, que anexo (Doc. 04), comprometendo-me não só a cumprir, mas até a superar os créditos mínimos previstos no respetivo regulamento para todo o triénio, gerando assim uma dinâmica que irá ser prosseguida futuramente, de modo que nunca mais se coloque esta questão. Permito-me referir, em minha defesa, um problema de saúde que me atingiu e que foi muito condicionador da atividade em tal período e que já está, felizmente, ultrapassado, pelo que não descortino razões para que não possa vir a otimizar a atividade, em todos os aspetos considerados importantes. Quero igualmente salientar ainda, em minha defesa, o facto de já ter alargado o quadro de pessoal com a contratação dum técnico, tal como foi referido pelo controlador, e ainda ter renunciado a funções de revisão em 4 entidades, ficando apenas com responsabilidades de auditoria a 5 entidades (3 delas de escala muitíssimo reduzida), criando assim condições para poder operar em condições excelentes, de modo a ultrapassar esta situação que, sinceramente, muito me penaliza e entristece, pois por questão de formação e carácter, sempre privilegiei o brio e zelo profissional e a qualidade dos trabalhos que desenvolvo em todas as áreas de atividade. Em face do exposto, solicito a V. Exas. a v/ especial para tudo o exposto, reconhecendo que apesar do trabalho efetuado não ter ficado devidamente documentado e organizado, tenho a certeza absoluta que emiti o Parecer – com uma reserva por desacordo – com base em trabalho devidamente efetuado e que o teor do mesmo exprime uma opinião, que foi devidamente alicerçada e a mesma foi apropriada em face da realidade conhecida e do acompanhamento efetuado da empresa analisada. Finalmente, e dada a importância deste assunto solicito a V. Exas. que sejam recolhidos depoimentos das testemunhas que vou indicar, que poderão atestar, não só da minha idoneidade, mas especialmente sobre o brio e zelo profissional que sempre tenho privilegiado em todos os meus trabalhos relacionados com as várias áreas de atividade que desenvolvo há mais de duas décadas. (…)” (cfr. fls. 140 e ss. do PA); K) Arrolou o Autor 4 testemunhas designadas de “abonatórias”, que prestaram os seus depoimentos por escrito quanto à competência técnica e idoneidade daquele e quanto ao problema de saúde que o afetou nos anos de 2009 e 2010 (cfr. fls. 187 e ss. do PA); L) A 30/06/2011, o instrutor do processo elaborou relatório final, no qual se pode ler, designadamente, o seguinte: “(…) IV – Factos Provado. 8. Das averiguações efetuadas e da documentação constante do processo resultam provados os seguintes factos imputáveis ao arguido A. S. A.: (a) Emitiu a certificação legal das contas do exercício de 2009, da sociedade C. – V. de P., S.A., mas no dossier de trabalho não existe prova da revisão nem papéis de trabalho que assegurem terem sido executados adequados procedimentos de revisão/auditoria nas áreas de Existências, Especialização de Exercícios, Vendas e Prestação de Serviços, Custo de Mercadorias Vendidas e Matérias-Primas Consumidas, Fornecimentos e Serviços Externos, Custos com o Pessoal, Custos e Proveitos Extraordinários, Transações e Saldos entre Entidades Relacionadas, Impostos (IRS, IVA e Segurança Social) e ainda Seguros, violando, com essa omissão, o disposto no parágrafo 19 das Normas Técnicas de Revisão/Auditoria e em concreto o estabelecido na Diretriz de Revisão/Auditoria 510 (Prova de Revisão) e na Diretriz de Revisão/Auditoria 230 (Papéis de Trabalho; (b) Não cumpriu o procedimento de avaliar o controlo interno, violando com essa omissão o que se encontra estabelecido no parágrafo 13 das Normas Técnicas de Revisão/Auditoria e na Diretriz de Revisão/Auditoria 410 (Controlo Interno); Não cumpriu o dever de participar nas ações de formação contínua, nos anos de 2009 e 2010, contrariando com essas omissões o que estabelece o nº 2 do artigo 62º do Estatuto da OROC e os artigos 4º, 5º, 11º e 12º do Regulamento de Formação Profissional dos ROC. V – Apreciação. 9. Na sua defesa, tanto na audição como na resposta à acusação, o arguido nada de relevante acrescenta que possa levar a modificar as conclusões expressas pelo controlo de qualidade e, consequentemente, o teor da acusação, como a seguir veremos. 10. Os argumentos invocados pelo arguido na resposta à Nota de Culpa (parágrafo 6 do presente relatório) são coerentes com os comentários por ele formulados à conclusões do controlo de qualidade, como se constata pelas seguintes passagens retiradas do respetivo relatório, «Capítulo D – Comentários do ROC Responsável»: - Existe falta de provas que evidenciem a totalidade do trabalho efetuado; - No que concerne à evidência dos trabalhos efetuados, existe efetivamente falta de elementos e documentos que permitam suportar devidamente o parecer emitido; - No que se refere às conclusões, o trabalho não foi devidamente completado; 11. Na sua defesa (Parágrafo 6 do presente relatório) tenta uma justificação, sem sentido, quando enuncia alguns procedimentos realizados por terceiros, sem qualquer intervenção sua, tanto na execução como na supervisão dos procedimentos por eles executados. A este propósito, assinalam-se as seguintes passagens: A propósito do inventário, refere ter sido o controlo físico (varejo) realizado por entidades oficiais em 18/11/2009; A propósito da valorização da produção, refere ter sido a empresa quem realizou os testes de valorização da produção. 12. Sobre o não cumprimento do procedimento de avaliação do controlo interno, alega o arguido ter ele aplicado procedimentos alternativos, mas do dossier de trabalho nada consta que demonstre ser essa a opção mais adequada, nem se encontra evidência da execução desse procedimento alternativo. Aliás, de em 2008 foi feita avaliação do controlo interno, como afirma o arguido, estranha-se que tenha concluído pela desnecessidade da sua avaliação/atualização em 2009. 13. No que respeita à não participação em ações de formação em cada um dos anos de 2009 e 2010, o arguido reconhece a sua falta, mas propõe-se participar em 2011, com o objetivo de, diz ele, alcançar e até ultrapassar o número mínimo de horas previsto no respetivo regulamento para o triénio 2009/2011. 14. Importa apreciar a tentativa do arguido em justificar as anomalias apuradas pelo controlo de qualidade, inserindo-as essencialmente em circunstâncias atinentes a problemas de saúde, assim como à ocupação intensa noutras atividades (Liquidatário Judicial). 15. Ora nem um caso nem o outro podem ser acolhidos como justificação para a preterição de procedimento de Revisão/Auditoria, à luz do superior interesse público inerente à atividade de revisão legal de contas. Com efeito, o arguido tinha ao seu alcance os meios de suprir as limitações que alega ter sentido, dependendo apenas dele e só dele acioná-los: no caso de doença, sempre poderia acionar o mecanismo da substituição, fazendo entrar o ROC suplente; no caso de sobreocupação com outras atividades caber-lhe-ia ter um adequado planeamento de trabalhos e dispor de recursos humanos adequados ao nível de atividade em que ele, por sua própria e exclusiva vontade, se envolveu. 16. Note-se que a tentativa do arguido em trazer à sua defesa a prova testemunhal ficou gorada, quanto aos factos, pois ele próprio desistiu de as chamar ao processo sobre a factualidade objeto do presente processo. 17. Apesar disso e pese embora o Regulamento Disciplinar não prever a audição de testemunhas sobre matérias que extravasam os factos enunciados na acusação, entendemos, por razões de garantia plena de defesa, dar provimento à pretensão do arguido nos termos enunciados no parágrafo 7 do presente relatório. Todas elas responderam por escrito às matérias colocadas, embora fora do prazo que lhe foi fixado. 18. O depoimento das quatro testemunhas, tanto no que concerne à opinião positiva sobre a competência técnica e idoneidade do arguido, como no que respeita ao seu estado de saúde, não retiram censurabilidade aos factos objeto da acusação. Na verdade, em momento algum a acusação aborda aspetos de competência e idoneidade do arguido; quanto ao estado de saúde, reafirmamos aqui o que acabamos de dizer no precedente parágrafo 15. 19. De tudo o exposto, resultam provadas as infrações praticadas pelo arguido A. S. A., constituídas pelas omissões do cumprimento das Normas de Revisão/Auditoria enumeradas nas alíneas a), b) e c) do parágrafo 8 do presente relatório. Tais omissões constituem violação das disposições constantes nos n.ºs 2 e 4 do artigo 62º e no nº 1 do artigo 64º do Estatuto da OROC e dos deveres impostos pelo artigo 5º, nº 1 e 2, pelo artigo 7º e pelo artigo 12º, nº 5, todos do Código de Ética e Deontologia Profissional, bem como pelos artigos 4º, 5º, 11º e 12º do Regulamento de Formação Profissional dos ROC. 20. Deve assinalar-se que, apesar de tudo, a vontade manifestada pelo arguido em melhorar a sua prática profissional futura, o que revela consciência da gravidade das anomalias praticadas. Por um lado, como referiu na sua defesa, pelo reforço do quadro de pessoal com a admissão de um novo técnico; por outro lado, afirmou ter renunciado às funções de revisão em 4 entidades, ficando apenas com responsabilidades de revisão em 5 entidades (3 delas, diz, de reduzida dimensão); por fim, expressou a intenção de participar, de forma intensa, em ações de formação. Assinala-se que no «Controlo de Atividade» da OROC ele ainda tem na sua carteira 8 entidades e não 5. 21. Constata-se que o arguido não dispõe de uma estrutura profissional adequada à dimensão dos compromissos assumidos (número de clientes), como ele próprio reconhece, circunstância que lhe permite retirar benefícios económicos ilegítimos. Entendemos que este comportamento é merecedor de censura, devendo, por isso, merecer atenta ponderação ma determinação da pena a aplicar. 22. O arguido atuou livre e voluntariamente, não podendo desconhecer que a sua conduta era reprovável e punível por lei. 23. As infrações praticadas pelo arguido são de natureza diferenciada, configurando, por isso, cumulação de infrações. A acumulação de infrações constitui circunstância agravante, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 22º do Regulamento Disciplinar. 24. O arguido beneficia, por outro lado, da circunstância atenuante prevista na alínea c) do nº 2 do artigo 21º do Regulamento Disciplinar, ou seja, a confissão espontânea das infrações. Assinala-se que no registo disciplinar do arguido nada consta. VI – Proposta. 25. Face à natureza, número e gravidade das infrações provadas e considerando as circunstâncias agravantes e as circunstâncias atenuantes, propõe-se que, nos termos do artigo 20º do Regulamento Disciplinar, ao arguido A. S. A., Revisor Oficial de Contas nº 1097, seja aplicada em cúmulo jurídico a pena única de multa, graduada em 10.000 euros, prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 81º do Estatuto da OROC e na alínea c) do artigo 13º do Regulamento Disciplinar, por incumprimento dos deveres prescritos no nº 2 e no nº 4 do artigo 62º e nº 1 do artigo 64º do Estatuto da OROC e dos deveres impostos pelo artigo 5º, nºs 1 e 2, pelo artigo 7º e pelo artigo 12º, nº 5, todos do Código de Ética e Deontologia Profissional, bem como pelos artigos 4º, 5º, 11º e 12º do Regulamento de Formação Profissional dos ROC.” (cfr. fls. 207 e ss. do PA); M) A 18/07/2011, e no âmbito do processo disciplinar nº 3/2011, o Conselho Disciplinar da Ré proferiu acórdão no qual determinou a aplicação ao Autor a pena de multa, graduada em 10.000 euros, nos termos das disposições conjugadas constantes da alínea c) do nº 1 do artigo 81º do Estatuto da OROC, da alínea c) do artigo 13º e do nº 1 do artigo 20º, ambos do Regulamento Disciplinar, por violação dos deveres prescritos nos nºs 2 e 4 do artigo 62º e no nº 1 do artigo 64º, ambos do Estatuto da OROC e dos deveres estabelecidos nos nºs 1 e 2 do artigo 5º, no artigo 7º e no nº 5 do artigo 12º, todos do Código de Ética e Deontologia Profissional, bem como nos artigos 4º, 5º, 11º e 12º do Regulamento Profissional dos ROC (cfr. fls. 219 do PA); N) A 19/07/2011, por carta registada e com aviso de receção, a Ré remeteu ao Autor cópia dos referidos relatório final e acórdão do Conselho Disciplinar (cfr. fls. 220 e ss. do PA); O) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 19/10/2011 (cfr. fls. 1 e ss. dos presentes autos). DE DIREITO Está posta em crise a decisão que ostenta este discurso fundamentador: Atendendo ao objeto da lide, definido pela causa de pedir e pelo pedido formulado, desde logo verifica o Tribunal que a matéria em dissenso se prende com a fundamentação da decisão impugnada, no que respeita ao parâmetro da culpa do Autor na prática das infrações que lhe são imputadas. Na ótica do Autor, a decisão impugnada, e que lhe aplicou a pena de multa de € 10.000,00, está ferida de nulidade porquanto não se pronunciou quanto à parte da culpa, assim violando o princípio geral do direito sancionatório que se consubstancia no nulla poena sine culpa, conforme plasmado no artigo 13º do Código Penal. Alega, especificamente, que em momento algum o acórdão proferido pelo Conselho Deontológico da Ré emite qualquer referência à existência de dolo ou de mera culpa na atuação que lhe é imputada, ou muito menos quanto ao respetivo grau de censurabilidade das condutas em causa. Invoca ainda que a pena de multa que lhe foi aplicada se traduz na sanção pecuniária correspondente ao montante máximo aplicável, sem que tivesse procedido a Ré à emissão de um juízo de censurabilidade quanto à atuação do Autor, motivo pelo qual incorre a decisão impugnada em vício de falta de fundamentação da escolha da pena e da sua concreta medida, no que toca ao seu iter quantitativo, ou seja, não procedeu o acórdão à explanação do critério que presidiu à escolha da pena, nem à indicação dos motivos da escolha de uma em detrimento de outras penas disponíveis, que poderiam igualmente cumprir com os fins a que se destinam. Argui, por fim, que tampouco se pronunciou o acórdão recorrido sobre as circunstâncias que militam a favor ou contra o Autor, e que a pena que lhe foi aplicada sempre se mostraria excessiva, atenta a factualidade demonstrada, assim ofendendo os princípios da legalidade, justiça e proporcionalidade. Já na tese propugnada pela Ré, não tem qualquer fundamento a arguida nulidade, por supostamente existir uma “punição sem culpa”, uma vez que no acórdão recorrido se pode ler, expressamente, no seu parágrafo 22, o seguinte: “o arguido atuou livre e voluntariamente, não podendo desconhecer que a sua conduta era reprovável e punida por lei”, o que, no seu entendimento, como é lugar-comum na jurisprudência e advém do constante no nº 3 do artigo 17º do Código Penal (doravante abreviadamente CP) demonstra a existência de dolo na atuação do Autor. Já quanto à alegada falta de fundamentação, começa por arguir que, nos termos do previsto no nº 5 do artigo 81º do Estatuto da OROC (doravante abreviadamente OROC), a violação do disposto no nº 4 do artigo 62º do mesmo normativo implica uma sanção não inferior à pena de multa. Mais especifica que as exigências de fundamentação a aplicar à decisão impugnada são aquelas previstas no artigo 125º do Código do Procedimento Administrativo (doravante abreviadamente CPA), estando a Administração dotada de poderes discricionários na determinação da medida da pena, alegando ainda que tomou a decisão em devida consideração as circunstâncias atenuantes e agravantes. Para uma conveniente apreciação da presente lide, impõe-se a elaboração do enquadramento legal aplicável. Assim, Estabelecia o artigo 62º do EOROC (na redação em vigor à data, aprovada pelo Decreto-Lei nº 185/2009, de 12 de agosto), na secção atinente aos deveres, em geral, dos ROC, o seguinte: “1 - Os membros da Ordem devem contribuir para o prestígio da profissão, desempenhando com zelo e competência as suas funções, evitando qualquer actuação contrária à dignidade das mesmas. 2 - Com vista à actualização permanente dos seus conhecimentos, os revisores oficiais de contas devem frequentar cursos de formação profissional a promover pela Ordem ou por esta reconhecidos, nos termos a fixar no regulamento de formação. 3 – (…). 4 - Os revisores oficiais de contas devem organizar, relativamente ao exercício de cada uma das funções de interesse público, um processo instruído de acordo com as normas de auditoria em vigor, designadamente com a evidência do trabalho efectuado e com a fundamentação das conclusões relevantes em que se basearam para formular a sua opinião profissional, por forma a emitir a certificação legal das contas, o parecer ou o relatório de auditoria e, bem assim, com documentação de todos os riscos importantes que possam comprometer a sua independência e as medidas de protecção aplicadas para limitar esses riscos. 5 – (…).” Já o artigo 64º do mesmo diploma legal, no seu nº 1, estabelecia que “Constitui dever dos membros da Ordem observar as normas, avisos e determinações dela emanados.” Quanto à matéria respeitante ao poder disciplinar, o artigo 80º dispunha que “Comete infracção disciplinar o membro da Ordem que, por acção ou omissão, violar, dolosa ou culposamente, algum dos deveres estabelecidos no presente diploma ou em outros normativos aplicáveis, bem como os decorrentes das suas funções” (sublinhado nosso). As penas disciplinares vinham especificadas no respetivo artigo 81º, que rezava o seguinte: “1 - As penas disciplinares são: a) Advertência; b) Advertência registada; c) Multa de (euro) 1000 a (euro) 10 000; d) Censura; e) Suspensão de 30 dias até 5 anos; f) Expulsão. 2 - Às penas de advertência registada, de censura e de multa pode ser atribuído o efeito de inibição, até cinco anos, para o exercício de funções nos órgãos da Ordem, no júri de exame, na comissão de estágio e na comissão de inscrição, determinando a suspensão sempre essa inibição por um período duplo do da suspensão. 3 - A violação do disposto no artigo 67.º dá lugar à aplicação de pena não superior à de multa. 4 - Os factos praticados com ofensa do regime previsto no artigo 79.º serão punidos com multa de duas a cinco vezes o montante das importâncias recebidas pelas funções ilegalmente desempenhadas. 5 - São punidos com pena não inferior à de multa os factos que envolverem a violação do disposto no n.º 4 do artigo 62.º, no n.º 3 do artigo 68.º-A e nos artigos 76.º, 77.º e 78.º 6 - A multa a aplicar pela violação do disposto no n.º 4 do artigo 62.º tem em conta o benefício económico indevidamente auferido. 7 - Aos factos que importarem a violação do artigo 73.º será aplicada a pena de suspensão por um ano e em caso de reincidência a pena aplicável será a de expulsão. (…)” Por outra banda, cumpre atender ao Código de Ética e Deontologia Profissional, aprovado pela Assembleia Geral do Réu a 22/11/2001 e publicado no Diário da República, III Série, nº 297, de 26 de dezembro de 2001. De acordo com o seu artigo 5º, nºs 1 e 2, “1 – O revisor oficial de contas deve adoptar, em todas as circunstâncias, um comportamento competente e de elevado profissionalismo, conhecendo as normas legais e técnicas aplicáveis e promovendo o aperfeiçoamento dos seus conhecimentos técnicos e métodos de trabalho. 2 – Deve, designadamente, o seu trabalho e o dos seus colaboradores ser planeado, executado, revisto e documentado, por forma a constituir fundamentação adequada e suficiente dos relatórios, certificações e pareceres emitidos.” O seu artigo 7º, sob a epígrafe “Legalidade”, estabelece o seguinte: “O revisor oficial de contas deve exercer a sua atividade dentro dos limites dos poderes que lhe sejam atribuídos, em conformidade com a lei, as normas técnicas de revisão/auditoria às contas e os princípios, regulamentos, normas e orientações de carácter profissional emitidos pela Ordem, de modo a alcançar os fins visados na legislação em vigor.” Já a norma constante do nº 5 do artigo 12º dispõe que: “O revisor oficial de contas deve dar cumprimento oportuno às normas, determinações e avisos emanados da Ordem ou outros constantes do estatuto profissional.” Por fim, a ação disciplinar da Ré vem regulada no designado Regulamento Disciplinar da OROC, Regulamento nº 80/2010 (publicado do Diário da República, 2ª Séria, nº 27, de 09/02/2010). O conceito de infração disciplinar é tratado logo no seu artigo 2º, que preceitua o seguinte: “Considera-se infracção disciplinar a conduta do membro da Ordem que, por acção ou omissão, violar, dolosa ou culposamente, algum dos deveres estabelecidos no respectivo Estatuto ou em outros normativos aplicáveis, bem como os decorrentes das suas funções.” A escala das penas disciplinares aplicáveis vem estabelecida no artigo 13º deste regulamento, nos seguintes moldes: “As penas disciplinares são as seguintes: a) Advertência; b) Advertência registada; c) Multa de 1.000 a 10.000 euros; d) Censura; e) Suspensão de 30 dias até cinco anos; f) Expulsão.” Com pertinência ainda para a presente lide, reza o artigo 21º, sob a epígrafe “Circunstâncias atenuantes”, que: “1 — São atenuantes todos os factos ou circunstâncias atinentes ao agente ou à infracção de que resulte diminuição da responsabilidade do arguido. 2 — São circunstâncias atenuantes especiais: a) A prestação de mais de dois anos de serviço com exemplar comportamento; b) A reparação espontânea do mal causado; c) A confissão espontânea da infracção; d) A provocação.” Já as circunstâncias agravantes são tratadas no artigo 22º deste normativo, nos seguintes moldes: “1 — São circunstâncias agravantes da infracção disciplinar: a) A vontade determinada de, pela conduta seguida, produzir resultados prejudiciais ao serviço público ou ao interesse geral, independentemente destes se verificarem; b) A premeditação; c) O conluio com outros indivíduos para a prática da infracção; d) A acumulação de infracções; e) A reincidência. 2 — A premeditação consiste no desígnio, formado 24 horas antes, pelo menos, da prática da infracção. 3 — A acumulação dá -se quando duas ou mais infracções são cometidas na mesma ocasião ou quando uma é cometida antes de ter sido punida a anterior por decisão irrecorrível. 4 — A reincidência dá -se quando a infracção é cometida antes de passado um ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena imposta por virtude de infracção anterior, que consista na violação do mesmo tipo de deveres ou dever idêntico.” Por outro lado, prevê o presente regulamento a possibilidade de suspensão das penas, de acordo com o seu artigo 24º: “1 — As penas disciplinares das alíneas a) a d) do artigo 13.º podem ser suspensas ponderados o grau de culpabilidade e o comportamento do arguido, bem como as circunstâncias da infracção. 2 — O tempo de suspensão das penas não será inferior a 1 ano nem superior a 3, contando-se estes prazos desde a data da notificação ao arguido da respectiva decisão. 3 — A suspensão caducará se o revisor oficial de contas vier a ser, no seu decurso, condenado novamente em virtude de processo disciplinar.” Finalmente, o artigo 84º deste diploma legal rege a questão das disposições subsidiárias, nos seguintes termos: “Em tudo o que não estiver previsto no presente Regulamento são aplicáveis, subsidiariamente e pela mencionada ordem, os princípios consignados nos: a) Estatuto da Ordem e nos respectivos Regulamentos; b) Código do Procedimento Administrativo; c) Código Penal; d) Código de Processo Penal.” Completado o enquadramento jurídico aplicável aos presentes autos, cumpre então proceder à subsunção dos factos ao direito. Não foi impugnada pelo Autor, antes a confessando, a factualidade atinente à efetiva prática das infrações pelas quais foi sancionado, concretamente, a sua não participação em ações de formação em cada um dos anos de 2009 e de 2010, bem como as deficiências na realização da revisão legal das contas da entidade “C., C. V. de P., S.A.”. Ou seja, não é colocada em causa a existência do elemento objetivo da prática das referidas infrações. Assim, a apreciação do mérito da lide prende-se antes e apenas com a verificação do respetivo elemento subjetivo, ou seja, a culpa revelada pelo Autor na prática das infrações. Na verdade, e como advém do artigo 2º do Regulamento Disciplinar, para que se possa afirmar a verificação de uma infração disciplinar exige-se não só a violação dos deveres estabelecidos para os ROC’s no Estatuto ou noutras normas aplicáveis mas também que tal violação tenha ocorrido a título de dolo ou mera culpa. Já Marcello Caetano (em Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, 1977, 3ª Reimpressão, Almedina, Coimbra, pág. 310 e ss.) distinguia, no respeitante às infrações disciplinares praticadas pelos agentes administrativos, no facto, consubstanciado numa ação ou omissão, o que fosse a materialidade da conduta da sua voluntariedade. Nas suas palavras, que ora se transcrevem, “Materialmente o facto pode consistir em acção ou em omissão expressas na conduta, isto é, traduzindo um comportamento contrário àquele que o cumprimento do dever impunha: o funcionário agiu de maneira diferente daquela que devia ou não agiu quando devia ter agido. De qualquer modo tem de haver uma conduta, não bastando o simples propósito formado na mente mas não traduzido em comportamento externo. (…) Quanto à voluntariedade, há que atender à distinção clássica entre culpa e dolo ou intenção. O agente tem culpa quando, estando consciente e possuindo liberdade moral para se conduzir, haja deixado de cumprir um dever ainda que por simples distração, inconsideração, leviandade, falta de conhecimento das normas aplicáveis… A intenção pressupõe uma conduta adotada no desígnio de produzir determinado resultado, em si mesmo ilegal ou danoso. E quando tal desígnio é formado no espírito do agente e mantido vinte e quatro horas, pelo menos, antes da prática do facto diz-se que houve premeditação. A infração disciplinar existe independentemente do resultado perturbador do serviço e, portanto, basta à sua produção que o agente tenha procedido consciente e livremente ao praticar a acção ou cometer a omissão; é suficiente a mera culpa, sem necessidade de intenção. Quando se prove que houve da parte do agente vontade determinada de, pela conduta seguida, produzir resultados prejudiciais ao serviço público, ao interesse geral ou a terceiros, quer estes se verifiquem quer não, a responsabilidade do agente é agravada e o mesmo sucede havendo premeditação. Só nos casos em que a própria natureza da infração o exija ou a lei prescreva é que a intenção constitui elemento essencial do facto. (…)” Se bem que a doutrina ora citada tenha como fito a análise das infrações disciplinares numa relação de emprego público, o certo é que, considerando as normas e os princípios gerais aplicáveis bem como a relação estabelecida entre certas categorias profissionais e as respetivas ordens, ordens estas investidas de poder disciplinar sobre tais profissionais, é evidente o paralelismo que pode e deve ser estabelecido. Efetivamente, e de acordo com o previsto no artigo 2º do Regulamento Disciplinar, que explicita o conceito de infração disciplinar, aí se pode encontrar também a referida dualidade, sempre sendo exigida a verificação do referido elemento subjetivo, ou da voluntariedade. Do cotejo do probatório coligido, especificamente dos seus pontos L) e M), resulta que a única menção feita, ao longo do relatório final que serviu de fundamentação ao acórdão impugnado, quanto a este elemento subjetivo é a seguinte: “o arguido atuou livre e voluntariamente, não podendo desconhecer que a sua conduta era reprovável e punida por lei”. Cabe, então, questionar: é tal menção suficiente para que se possa afirmar a verificação, por parte do órgão decisor, do indicado elemento volitivo? Afigura-se a este Tribunal impor-se uma resposta negativa. Na verdade, não basta à Administração que, aquando do exercício do seu poder disciplinar, afirme que se verificou a violação de um dever (elemento objetivo), sendo ainda necessário que o administrado esteja consciente dos elementos objetivos que compõem o tipo-de-ilícito em causa e, ainda assim, agir (elemento subjetivo), sendo essa forma de atuar culposa (rectius, censurável) porque o agente atuou de determinada forma, quando podia e devia ter agido de modo diverso. Ora, no caso vertente, ocorre uma total ausência fáctica para o preenchimento de qualquer infração disciplinar, nomeadamente, a violação do disposto nos artigos 62º e 64º do EOROC e dos deveres estabelecidos nos artigos 5º, 7º e 12º do Código de Ética e Deontologia Profissional, por absoluta omissão, nos factos provados, quer do elemento subjetivo da infração, na vertente do dolo ou da negligência, quer do elemento culpa. Não basta, para o efeito, uma afirmação vaga e genérica de que o arguido agiu voluntariamente e que não podia desconhecer que a sua conduta era reprovável e punível por lei, antes se exigindo a concreta valoração subjetiva, e do respetivo grau de censurabilidade, de tal conduta. Por outro lado, com a leitura de tal afirmação vaga e genérica, não logra o seu destinatário, ou o Tribunal aquando da sindicância judicial do ato impugnado, compreender se a imputação subjetiva é feita a título de dolo, ou seja, se revelou o Autor uma especial intenção de, com a sua conduta, lesar os interesses acautelados pelos respetivos deveres violados, ou se revelou mera culpa, negligência, por ter agido de forma leviana ou em inconsideração pelas normas violadas. Não basta, assim, afirmar a voluntariedade na atuação, exigindo-se também que, alicerçando-se em factos dados como provados para o efeito, se teça de forma fundamentada um juízo de censurabilidade, de valoração ética da conduta, porquanto inexiste, no presente caso, uma qualquer presunção de culpa, verificado que fosse o elemento objetivo. É, assim, a decisão impugnada omissa no que ao elemento volitivo diz respeito, omissão essa geradora da sua nulidade, de acordo com o disposto no artigo 13º do Código Penal. Inerentemente a tal omissão, é também a decisão impugnada omissa no que respeita ao grau de censurabilidade da conduta do Autor. Na verdade, não assiste qualquer razão ao Réu quando afirma que a citada expressão é o padrão comum usado para exprimir o dolo, já que da mesma não se logra interpretar uma qualquer imputação de verdadeira intenção ou de mera distração ou leviandade do Autor. Verifica-se, assim, uma total ausência de fundamentação quanto ao grau de censurabilidade imputado ao Autor no elemento objetivo verificado (e que não é posto em causa) e, consequentemente, na determinação da medida da pena. Sendo verdade que goza a Administração, no exercício dos seus poderes punitivos, de certa margem de liberdade na determinação da medida concreta da pena, matéria esta que não será judicialmente sindicável, sempre será de se lhe impor o deveres de fundamentação e de aplicação dos normativos em vigor, que obrigam toda a Administração, com o exercício daquele poder discricionário, sendo que a atuação desta será, nessa matéria, efetivamente sindicável. Sublinhe-se que, no exercício do poder punitivo, exige-se à Administração não só que apure da factualidade pertinente que componha a infração, mas também que avalie a gravidade e as consequências desta, o grau de culpa do agente, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e ainda aos antecedentes profissionais e disciplinares. Como advém do disposto no artigo 2º do Regulamento Disciplinar, a possibilidade da aplicação da pena de multa dependerá de uma imputação da infração ao agente a título de negligência ou dolo. Assim, e para que possa verificar-se tal imputação volitiva e intelectual ao agente, caberia ao Réu alegar e provar os factos individuais e concretos nos quais se baseia, para concluir por um certo grau de culpabilidade. Ora, no caso presente, e perscrutado todo o relatório final constante dos autos, que serviu de fundamento à decisão punitiva, não logra o destinatário médio alcançar em que factos específicos se alicerçou o Réu para imputar ao Autor a prática da infração (que este não impugna), a título de dolo ou de mera negligência. Efetivamente, e apesar de ter o Réu tomado em devida consideração as circunstâncias atenuantes e agravantes verificadas (especificamente, não ter registo de punições anteriores, e, por outro lado, verificarem-se plúrimas infrações) não ressuma do referido relatório o iter cognoscitivo e valorativo percorrido pela Administração e no qual se baseou para concluir por um qualquer elemento volitivo do Autor, nem em que grau, tampouco ficando expressas as razões que a levaram a optar pelo limite máximo da pena de multa, que não um qualquer outro valor, incorrendo assim a decisão impugnada em omissão de fundamentação. Apesar de não conter o Regulamento Disciplinar norma expressa quanto ao desvalor de que é ferida a decisão disciplinar que incorre em absoluta omissão de fundamentação quanto um dos elementos essenciais da infração disciplinar, a culpa, entende este Tribunal na esteira aliás do que vem sendo defendido pela jurisprudência dos tribunais superiores, que se deve lançar mão das disposições constantes no Código Penal. Neste sentido, e a título meramente exemplificativo, pode ler-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, de 23/09/2016, P. 747/15.7BECBR, disponível em www.dgsi.pt, o qual refere: “(…) Lê-se no Acórdão nº 12868/03 do TCA-Sul de 09/06/2004: Diz-nos Eduardo Correia: “(...) na medida em que as penas disciplinares são um mal infligido a um agente, devem (...) em tudo quanto não esteja expressamente regulado, aplicar-se os princípios que garantem e defendem o indivíduo contra todo o poder punitivo (...)” (Eduardo Correia, Direito Criminal, I, Almedina, 1971, pág. 37.). Por seu turno, José Beleza dos Santos sustenta que: “(…) As sanções disciplinares têm fins idênticos aos das penas crimes; são, por isso, verdadeiras penas: como elas reprovam e procuram prevenir faltas idênticas por parte de quem quer que seja obrigado a deveres disciplinares e essencialmente daquele que os violou. (...) aquelas sanções têm essencialmente em vista o interesse da função que defendem, e a sua atuação repressiva e preventiva é condicionada pelo interesse dessa função, por aquilo que mais convenha ao seu desempenho atual ou futuro (...). No que não seja essencialmente previsto na legislação disciplinar ou desviado pela estrutura específica do respetivo ilícito, há que aplicar a este e seus efeitos as normas do direito criminal comum. (...)” (José Beleza dos Santos, Ensaio sobre a introdução ao direito criminal, Atlântida Editora SARL/1968, págs.113 e 116.).‖ Face ao que vem dito, e nos termos do disposto nos artigos 13º do Código Penal e 379º do Código de Processo Penal, impõe-se concluir que está o ato impugnado ferido de nulidade, atenta a absoluta falta de fundamentação no que respeita ao elemento subjetivo da infração disciplinar, bem como da determinação da medida da pena, o que desde já se declara. * Atenta a resposta que foi dada aos indicados vícios, e ao facto de ter o Autor formulado o último pedido a título meramente subsidiário, fica o seu conhecimento prejudicado, de acordo com o constante no nº 1 do artigo 95º do CPTA. X Vejamos:Da questão da ampliação do recurso - O aqui Recorrido, embora não requerendo a ampliação do objecto do recurso, veio, nas contra-alegações, invocar um alegado novo vício da decisão disciplinar da OROC, que no seu entender inquina de nulidade aquele acto administrativo, por ofensa ao Princípio da Imparcialidade imposto pelo art.º 266°/2 da Constituição da República Portuguesa (CRP), justificando que se trata de matéria que era de conhecimento oficioso pelo Tribunal de Instância. Ora, o art.º 636°/1 do CPC sob a epígrafe Ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, aplicável ex vi art.º 1° do CPTA, estabelece que o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que este o requeira na respectiva alegação. E o n° 2 do mesmo preceito prevê que pode, ainda, o recorrido, na respectiva alegação, e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas. Por seu turno, o art.º 633° do CPC sob a epígrafe Recurso Independente e recurso subordinado estabelece que se ambas as partes ficarem vencidas, cada uma delas pode recorrer na parte que lhe seja desfavorável. Voltando ao caso concreto, temos que a sentença recorrida julgou a acção totalmente procedente e declarou nulo e de nenhum efeito, o impugnado acórdão do Conselho Disciplinar da OROC proferido em 18/07/2011, com custas pela Ré (aqui Recorrente). Acresce que, o então Autor, ora Recorrido, não suscitou na acção (nomeadamente na Petição Inicial, já que não apresentou alegações finais) o invocado agora nas contra-alegações de recurso - vício de violação do Princípio da Imparcialidade do acórdão disciplinar da ora Recorrente. Assim, sendo o ora Recorrido, então Autor, parte vencedora na acção e não tendo decaído em nenhum dos vícios por si alegados, não podia recorrer da sentença, nos termos do citado artigo 633°. E, bem assim, não podia ter ampliado o âmbito do recurso interposto pela Recorrente, porquanto não tendo alegado na acção este vício, que agora invoca nas contra-alegações de recurso, não decaiu quanto a este, nem quanto a nenhum fundamento nos termos do art.º 636°/1 do CPC; e, não tendo o Recorrido arguido a nulidade da sentença ou impugnado a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, também não podia o recurso considerar-se ampliado por aplicação do art.º 636°/2 do CPC. Acresce que, contrariamente ao referido pelo Recorrido, é completamente irrelevante para apreciação do âmbito do presente recurso se o alegado novo vício era de conhecimento oficioso pelo Tribunal de 1ª instância. É que, o que importa é que o referido vício não foi alegado na acção, nem encontrou o Tribunal a quo motivo para exercer sobre ele a sua apreciação oficiosa, pelo que não existiu pronúncia sobre o mesmo na sentença, sendo, ainda, evidente que o alegado vício não tem carácter superveniente. (Os recursos jurisdicionais visam a reapreciação de decisões de tribunais de grau hierárquico inferior, tendo em vista a sua alteração ou anulação por erro de facto ou de direito das mesmas, não sendo admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso - Acórdão do STA, de 26/09/2012, proc. 0708/12. Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado - Acórdão do STA, de 13/11/2013, proc. 01460/13. Em sede de recurso jurisdicional não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado no seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se - Acórdão do TCA Sul, proc.° 5786/09, de 3 de fevereiro.) |