Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:16088/24.6BELSB
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/10/2025
Tribunal:TAF do Porto
Relator:RICARDO DE OLIVEIRA E SOUSA
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL;
CADUCIDADE;
Sumário:
I – Nos termos do artigo 101.º, os processos de contencioso pré-contratual devem ser intentados no prazo de um mês, sendo aplicável à contagem do prazo o disposto no n.º 3 do artigo 58.º, 59.º e 60.º todos do CPTA.

II- Na contagem deste prazo é também aplicável a normação contida no artigo 58.º, n.º 2 do CPTA, por força do n.º 4 do artigo 97.º do CPTA.

III- Após a entrada em vigor da redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 214/G/2015, de 02.10, o artigo 58.º, n.º 2 do C.P.T.A. deve ser interpretado no sentido de que o mesmo estabelece que o prazo impugnatório se conta de modo contínuo, sem qualquer suspensão durante o período de férias, sendo que o prazo que termine em dia em que os tribunais estejam encerrados ou haja tolerância de ponto é, entretanto, prolongado para o primeiro dia útil seguinte.

IV- Apresentando-se distintivo que as Autoras tiveram conhecimento da decisão impugnatória no dia 03.07.2024, impõe-se concluir que o esgotamento do prazo de 1 mês previsto no artigo 101.º do CPTA ocorreu em 03.08.2024, portanto, no decurso do período de férias judiciais de verão.

V- Nos termos do expendido em III), o referido prazo transmitiu-se para o primeiro dia útil após férias judiciais, ou seja, para o dia 02.09.2024.

VI - Pelo que, na data em que a presente ação foi proposta, em 20.08.2024, ainda não se esgotado o prazo previsto no artigo 101.º do C.P.T.A..*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte - Secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos:
* *

I – RELATÓRIO

1. [SCom01...], S.A, e [SCom02...], Autoras nos presentes autos de CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL em que é Entidade Demandada a AGÊNCIA PARA O INVESTIMENTO E COMÉRCIO EXTERNO DE PORTUGAL, E.P.E., vêm intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão judicial do T.A.F. do Porto, editada em 30.09.2024, que rejeitou “(…) liminarmente a presente petição, incluindo aqui o pedido relativo à adopção de medidas provisórias, porquanto este, enquanto incidente nos autos, depende da subsistência da pretensão principal (…)”.

2. Alegando, as Recorrentes formularam as seguintes conclusões: “(…)

A. O presente recurso versa sobre a decisão proferida pelo Tribunal a quo e que rejeitou liminarmente a Petição apresentada, por entender verificada a exceção de caducidade do direito de ação, considerando intempestiva a entrada da ação em juízo.

B. Salvo o devido respeito, que é muito, decidindo como decidiu, a sentença em corre em manifesto erro na aplicação do direito ao caso concreto e por estar em clara contradição com a Jurisprudência unânime e consensual na matéria.

C. Entendeu o Tribunal a quo que uma vez que as Recorrente tiveram conhecimento da decisão final de adjudicação no dia 03/07/2024, o prazo de 1 mês previsto no artigo 101.º do CPTA, contado nos moldes definidos pelo Ac. citado na sentença, terminaria no dia 03/08/2024, considerando a ação intempestiva, porém, erradamente.

D. Não assiste razão ao Tribunal recorrido – o prazo apenas terminaria no dia 01/09/2024, que uma vez que se tratava de um domingo, transferia-se para o dia 02/09/2024.

E. E, devido a esse facto, a Petição foi apresentada em juízo tempestivamente, motivo pelo qual não poderia a mesma ser liminarmente rejeitada conforme sucedeu.

F. A decisão recorrida violou os art.ºs 101º, 97º, n.º 1, al. c) e 58º, n.º 2 do CPTA ao julgar intempestiva, pois não teve em conta que o termo do prazo de impugnação (previsto na primeira dessas disposições legais) que ocorrer em período de férias judiciais, se transfere para o primeiro dia útil seguinte.

G. A questão a decidir assentará na correta interpretação do mencionado artigo 279º do Código Civil, mormente da sua alínea e), aplicável diretamente por imposição do disposto no nº 2 do artigo 58º do CPTA.

H. Pese embora o Tribunal não faça referência expressa a esta norma, nem a forma como levianamente calculou o prazo,

I. O busílis da questão assenta na aplicabilidade a este prazo do disposto na al. e), do artigo 279.º do Código Civil e do disposto no artigo 58.º, n.º 2 do CPTA.

J. Não é controvertido, como refere a sentença recorrida, que este prazo não se considera um prazo processual, outrossim um prazo substantivo.

K. Mas, igualmente, não é controvertido o facto de se aplicar o disposto no artigo 279.º do CC ao contencioso pré-contratual.

L. Tal disposição sempre seria aplicável por estar em causa, não um prazo processual, mas um prazo substantivo, visto ser um prazo de caducidade anterior à pendência da relação processual.

M. O disposto no mencionado artigo 279.º CC é expressa e diretamente aplicável por força do disposto no n.º 2 do artigo 58.º do CPTA, o qual manda aplicar a disposição em causa a todas as contagens de prazos relativas à impugnação de atos administrativos, o que se trata no presente caso da impugnação do ato de adjudicação.

N. De fazer notar ainda, com relevância para a verificação do termo do prazo, que o próprio n.º 2 do artigo 58.º exceciona, quanto à aplicação do artigo 279.º do CC, a aplicação do mencionado n.º 4 do artigo 59.º, a qual terá sempre lugar desde que se verifiquem os requisitos da sua aplicação – o que não se aplica ao caso destes autos.

O. Estabelece a alínea e) do artigo 279.º do CC que “O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo.”.

P. O prazo aqui em apreço terminava precisamente em período de férias judiciais.

Q. Decorre do artigo 28.º da LOSJ, que são férias judiciais de 16 de julho a 31 de agosto.

R. No presente ano, não houve nenhuma lei especial que tenha derrogado ou alterado tal entendimento, motivo pelo foram ferias judiciais no período de 16 de julho a 31 de agosto.

S. Ou seja, o prazo para apresentar a presente ação terminava durante as férias judiciais.

T. O primeiro dia útil, como se referiu, seria 02 de setembro de 2024, uma vez que o dia 01/09 foi Domingo.

U. O termo do prazo ocorreria em plenas férias judiciais, ou seja, em 03/08/2024, pelo que automaticamente a presente ação poderia ser apresentada até 02/09/2024, inclusive.

V. Ao ter apresentado a presente Petição ainda no decurso das férias judiciais, significa que a presente Petição foi apresentada clara e indiscutivelmente dentro do prazo, tempestivamente.

W. A jurisprudência dos Tribunais Superiores é unânime e consensual quanto a esta matéria e a aplicabilidade do artigo 279.º aos prazos de contencioso pré-contratual.

X. Do art.º 101º do CPTA não resulta uma regra relativa à contagem desse prazo, motivo pelo qual deve considerar-se aplicável (ex vi art.º 97º, n.º 1, al. c) do CPTA) o disposto no n.º 2 do art.º 58º do CPTA nos termos do qual “sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando os prazos terminarem em férias judiciais ou em dia em que os tribunais estiverem encerrados, para o 1.º dia útil seguinte”.

Y. Precisamente no mesmo sentido entendem Mário Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2017, 4.ª edição, pág. 810

Z. A jurisprudência também, cfr. Acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo a 17/01/2019, Acórdão de 16/04/2020 do TCA Sul e o Acórdão de 04/11/2020 do TCA Norte.

AA. Resulta ainda claro dos sumários dos acórdãos de 16/04/2020 do TCA Sul e de 04/11/2020 do TCA Norte a afirmação, necessária para a decisão de fundo em causa, de que o artigo 279º do Código Civil é aplicável integralmente e sem exceção (mesmo da sua alínea e)) ao contencioso pré-contratual, nomeadamente para efeitos da contagem de prazo para interposição de ação.

BB. O próprio STA foi afirmativo, no âmbito do primeiro Acórdão citado, quanto ao regime das intimações, também processo urgente, que se deve aplicar, por razões de unidade do sistema, o disposto na mencionada alínea e), sem que exista qualquer especificidade legal no que respeita aos processos urgentes que permita afastar tal preceito, dada a sua natureza legal de prazo substantivo.

CC. Urge citar ainda, um Ac. mais recente, in casu, do TCA Sul, proferido a 18/10/2021, no âmbito precisamente da mesma legislação, relatado por Catarina Vasconcelos, no proc. 286/20.4BECTB, que sumariou “I - Terminando, o prazo para intentar processo do contencioso pré-contratual a que se referem os art.ºs 100º e segs. do CPTA, no período de férias judiciais, o seu termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, nos termos dos art.ºs 101º, 97º, n.º 1, al. c) e 58º, n.º 2 do CPTA. II – Este regime legal não viola o direito comunitário em matéria de contratação pública.”

DD. Por tudo quanto refletido, e na medida em que a presente ação foi intentada ainda durante as férias judiciais, e antes do dia 02 de setembro de 2024 (prazo limite para a sua interposição), deve a mesma ser considerada tempestiva, sendo assim admitida pelo Tribunal a quo.

EE. Desta forma, e sem mais delongas, deve o presente recurso ser considerado totalmente procedente e, em consequência, ser a decisão recorrida revogada por incorrer em manifesto erro de direito ao julgar verificada a exceção de caducidade do direito de ação e, em consequência, substituída por outra que admita liminarmente a Petição e ordene que o processo siga os seus normais termos

Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser declarado totalmente procedente e, consequentemente, deverá a sentença recorrida ser revogada por incorrer em manifesto erro de direito ao julgar verificada a exceção de caducidade do direito de ação e, em consequência, substituída por outra que admita liminarmente a Petição e ordene que o processo siga os seus normais termos (…)”.


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3. Notificada que foi para o efeito, a Recorrida apresentou contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)
I. Não se conformando com o teor do despacho liminar/sentença prolatado nos presentes autos, datado de 30.09.2024, os Autores, aqui Recorrentes, interpuseram, no passado dia 21.10.2024, um recurso de apelação que tinha como objeto a referida sentença, a qual rejeitou liminarmente a petição inicial apresentada pelos Recorrentes, em virtude da verificação da caducidade do direito de ação;

II. Por sua vez, os Recorrentes, nas suas alegações de recurso, pugnaram pela tempestividade da ação por estes intentada, apoiando-se no entendimento de que, para aferir da tempestividade da ação, seria necessário ter em conta que o último dia para apresentar a petição inicial em juízo terminava em período de férias e, nessa medida, entenderam os Recorrentes que se tal prazo se transferia para o primeiro dia útil seguinte;

III. Tal lógica decorria do facto de os Recorrentes entenderem que seria aplicável o n.º 2 do artigo 58.º do CPTA, o qual, por sua vez, remetia para a alínea e) do artigo 279.º do CC;

IV. Como tal, consideraram os Recorrentes que o prazo para intentar a ação de contencioso pré-contratual ora em crise terminaria a 02.09.2024;

V. Concluíram os Recorrentes que a sentença recorrida violava o disposto na alínea e) do artigo 279.º CC, n.º 2 do artigo 58.º CPTA e, em consequência, o disposto no artigo 101.º, alínea k) do n.º 4 do artigo 89.º e alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º, todos do CPTA;

VI. Não obstante o expendido pelo Recorrentes nas suas alegações de recurso, tal como abaixo se demonstrará, deverá o presente recurso de apelação ser julgado totalmente improcedente e por não provado, em virtude de a fundamentação dos Recorrentes assentar numa interpretação contra legem das disposições normativas invocadas, pelo que deverá a sentença recorrida ser mantida na ordem jurídica;

VII. Como já se adiantou supra, o entendimento dos Recorrentes convoca uma interpretação manifestamente contrária ao que resulta daqueles preceitos, efetivamente, aplicáveis, como é o caso do artigo 101.º e da alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º do CPTA;

VIII. Compulsado o teor dos preceitos vindos de aludir, em momento algum, tais disposições normativas remetem para o n.º 2 do artigo 58.º do CPTA e, consequentemente, para o artigo 279.º do CC ou insinuam que naquelas situações em que o prazo para a propositura da ação termina num dia de férias judiciais se deve transferir para o primeiro dia útil imediatamente seguinte;

IX. Tais preceitos determinam, efetivamente, as regras da contagem do prazo para a propositura da ação de contencioso pré-contratual, no entanto, não mencionam qualquer regra excecional para as situações em que o termo do prazo se verifica no decorrer das férias judiciais;

X. Antes abordam situações de (i) justo impedimento (n.º 3 do artigo 58.º do CPTA), (ii) suspensão por impugnação administrativa (artigo 59.º do CPTA) e (iii) notificações deficientes (artigo 60.º do CPTA) – que consubstanciam desvios às regras gerais da contagem dos prazos e que, por via do artigo 101.º do CPTA, são aplicáveis ao contencioso pré-contratual;

XI. A verdade é que, atendendo às circunstâncias do caso em concreto, não estão verificadas as condições necessárias para produzirem efeitos as disposições aplicáveis ao contencioso pré-contratual que contêm desvio às regras de contagem dos prazos, razão pela qual bem andou a sentença recorrida ao concluir pela intempestividade da presente ação;

XII. Para além disso, os Recorrentes tentaram defender, nas suas alegações de recurso, a aplicabilidade do n.º 2 do artigo 58.º do CPTA por força da remissão prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º do CPTA;

XIII. Ora, a norma vinda de aludir remete para os capítulos II e III do título II – que correspondem aos artigos 50.º a 96.º do CPTA – a regulação de aspetos do contencioso pré-contratual que não estejam regulados no capítulo I do título III – portanto, nos artigos 98.º a 103.º-B do CPTA;

XIV. Resulta claro, da nossa melhor Doutrina, que as remissões operadas pelo n.º 1 do artigo 97.º pautam-se pela sua supletividade e dizem respeito à matéria relativa à marcha do processo;

XV. No que concerne com a matéria controvertida nos presentes autos, em primeiro lugar, importa, uma vez mais, remeter para o que resulta da literalidade do n.º 1 do artigo 97.º do CPTA, o qual determina que os artigos 50.º a 96.º do CPTA apenas são aplicáveis nas situações em que os artigos 96.º a 103.º-B do CPTA não são suficientes por não regularem certas matérias;

XVI. No caso vertente, tal como já se demonstrou supra, a matéria relativa ao modo de contagem dos prazos não carece de regulação supletiva, porquanto o próprio artigo 101.º do CPTA remete, de forma expressa, para os preceitos aplicáveis – n.º 3 do artigo 58.º, artigo 59.º e artigo 60.º do CPTA;

XVII. Mais a mais, para além do caráter supletivo do preceito vindo de aludir, outra característica do n.º 1 do artigo 97.º do CPTA é a sua aplicabilidade a disposições relativas à tramitação do processo de contencioso pré-contratual, não visando regular as matérias que precedem a entrada em juízo da ação de contencioso pré-contratual;

XVIII. Pelo que as remissões operadas pelo n.º 1 do artigo 97.º CPTA não têm como finalidade regular questões que não concernem com a própria tramitação processual da ação de contencioso pré-contratual, como é o caso do prazo para a propositura da ação, mas sim regular as matérias subsequentes ao início do processo judicial;

XIX. Como é evidente, o modo de contagem do prazo para a propositura da ação de contencioso pré-contratual não diz respeito a um aspeto da tramitação processual, tendo esta realidade sido, inclusivamente, reconhecida pelos Recorrentes no artigo 22.º das suas alegações de recurso;

XX. Isto posto, tendo os Recorrentes sido notificados do ato de adjudicação no dia 03.07.2024, o prazo para apresentar em juízo a sua impugnação terminaria a 03.08.2024, prazo após o qual caducaria o direito de ação dos Recorrentes, pelo que tendo os Recorrentes apresentado a sua petição inicial a 20.08.2024, esta é intempestiva;

XXI. Deste modo, não se verificando a carência de regulação do modo da contagem do prazo para a propositura da ação ou da marcha do processo nos artigos 100.º a 103.º-B do CPTA – particularmente aplicáveis ao contencioso pré-contratual – e não remetendo o artigo 101.º do CPTA para o disposto no n.º 2 do artigo 58.º do mesmo diploma legal;

XXII. Não existem razões que levem a crer que esta norma é aplicável ao contencioso pré-contratual, seja por via do artigo 101.º do CPTA, seja por via da alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º do CPTA, pelo que deverá o presente recurso de apelação ser julgado totalmente improcedente por não provado e, nessa medida, manter-se em vigor na ordem jurídica a sentença recorrida (…)”.


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4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

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5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito vertido no n.º 1 do artigo 146.º do C.P.T.A.

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6. Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR

7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

8. Neste pressuposto, a questão essencial a determinar é a de saber se a decisão judicial recorrida, ao rejeitar liminarmente a presente ação de contencioso pré-contratual, incorreu em erro de julgamento de direito, por ofensa da normação contida nos artigos 101.º, 97º, n.º 1, al. c) e 58.º, n.º 2 do CPTA e 279.º, alínea e) do Código Civil.
9. É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.


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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
10. O Tribunal a quo não fixou factos, em face do que aqui se impõe estabelecer a matéria de facto, rectius, ocorrências processuais, mais relevante à decisão a proferir:
A. Em 20.08.2024, as Autoras intentaram a presente ação no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [cfr. fls. 1 e seguintes do SITAF];
B. Nela demandaram a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, E.P.E. [idem];
C. E formularam o seguinte petitório: “(…)
Nestes termos e nos demais de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, deve a presente ação ser julgada totalmente procedente, por provada, e em consequência:
a) ser declarada legal a atuação da Autora na Decisão de Adjudicação relativo ao Processo de Aquisição de Serviços de Fiscalização e Gestão da Qualidade, Segurança e Ambiente das Empreitadas de Construção e de Desmontagem/Demolição do Pavilhão de Portugal na Expo 2025 Osaka Kansai,e, em consequência, ser apreciada a proposta das concorrentes (Autora e Contrainteressada) com referência aos documentos apresentados e, em consequência, ser determinada a exclusão da proposta da Contrainteressada nos termos da Proposta do Procedimento, mantendo-se como proposta única a apresentada pela aqui Autora a proposta economicamente mais vantajosa, com a consequente adjudicação do procedimento concursal à aqui Autora.
b) Adicionalmente, e em qualquer caso, serem adotadas as medidas provisórias que se consideram adequadas, entre as quais suspensão imediata do procedimento e dos seus efeitos e impedimento à execução do contrato objeto dos autos.” [idem].
D. Por sentença datada de 22.08.2024, o T.A.C. de Lisboa declarou-se incompetente em razão do território para conhecer do pedido, tendo os presentes autos sido remetidos ao Juízo de Contratos Público do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto para distribuição [idem];
E. Em 30.09.204, o T.A.F. do Porto promanou decisão judicial a rejeitar “(…) liminarmente a presente petição, incluindo aqui o pedido relativo à adopção de medidas provisórias, porquanto este, enquanto incidente nos autos, depende da subsistência da pretensão principal (…)” [idem];
F. Sobre esta decisão judicial sobreveio, em 21.10.2024, o presente recurso jurisdicional [idem].
G. As Autoras foram notificadas da decisão de adjudicação do procedimento concursal visado nos autos no dia 03 de julho de 2024, não tendo reclamado da mesma [por admissão].
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IV- DO MÉRITO DA INSTÂNCIA DE RECURSO

11. Vem interposto recurso jurisdicional da decisão judicial emanada pelo T.A.F. do Porto que rejeitou liminarmente a presente ação de contencioso pré-contratual.

12. A decisão que a 1.ª Instância proferiu a este respeito tem o seguinte teor, que consideramos útil transcrever para a melhor compreensão da questão prévia acima elencada e que ora nos cumpre decidir: “(…)

Em sede de apreciação liminar, cumpre ao juiz verificar se existe uma situação manifesta de ausência de pressupostos processuais, como se extrai do artigo 102º n.s 2 e 3 do CPTA.
Ora, no âmbito da análise da regularidade formal dos autos em sede liminar, apenas perante uma situação clara ou evidente é possível rejeitar liminarmente a petição inicial com o fundamento referido. Isto significa que, para que a petição inicial seja rejeitada liminarmente, deve decorrer de modo imediato da leitura da petição inicial e dos documentos nela juntos a conclusão de que se verifica uma situação de manifesta de ausência de pressupostos processuais
In casu, resulta evidente ao Tribunal que a presente lide é intempestiva.
Com efeito, no contencioso administrativo, a caducidade do direito de ação configura uma excepção dilatória prevista no artigo 89º n.4 alínea k) do CPTA, designada como “Intempestividade da prática de ato processual”, a qual se julga verificada quando a competente acção não é instaurada dentro do prazo previsto na lei para o efeito.
De acordo com o disposto no artigo 101º do CPTA “Os processos do contencioso pré-contratual devem ser intentados no prazo de um mês, por qualquer pessoa ou entidade com legitimidade nos termos gerais, sendo aplicável à contagem do prazo o disposto no n.º 3 do artigo 58.º e nos artigos 59.º e 60.º.”
No que respeita ao momento em que se inicia a contagem do prazo para propositura da acção, cumpre atentar no disposto nos artigos 59º e 60º, por remissão do artigo 102º n.1, todos do CPTA. Destes normativos, resulta que o prazo para instaurar a acção inicia a sua contagem a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento.
Por outro lado, a respeito da data em que o interessado se considera notificado, importa atentar no regime específico previsto no CCP. Nos termos do mencionado Código, as notificações aí previstas e as comunicações efectuadas entre as entidades adjudicantes e os concorrentes devem ser realizadas através de meios electrónicos conforme dispõem os artigos 467º e 468º do CCP.
Sendo as comunicações e notificações realizadas através de meios electrónicos, estas consideram-se feitas na data da respectiva expedição, quando efectuadas através de correio electrónico ou de outro meio de transmissão escrita e electrónica de dados (cfr. artigo 469º do CCP).
Acerca das regras de contagem do prazo de um mês, o Tribunal Central Administrativo Sul, pronunciou-se nos seguintes termos: “(…) I. Prevendo o artigo 101.º do CPTA que os processos de contencioso pré-contratual devem ser intentados no prazo de um mês, sendo aplicáveis à contagem do prazo o disposto nos artigos 58.º, n.º 3, 59.º e 60.º, do CPTA, está em causa um prazo de caducidade e não um prazo processual, pelo que não há a possibilidade de praticar o ato nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo de instauração da ação, mediante o pagamento de multa, nos termos do regime previsto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 139.º do CPC.
II. O artigo 101.º do CPTA não estipula, em particular, quaisquer regras da contagem desse prazo, mas não existe qualquer lacuna, por o artigo 101.º do CPTA ser uma norma remissiva, prevendo a regulação dessa matéria através da remissão para o regime estabelecido nos artigos 58.º, n.º 3, 59.º e 60.º, do CPTA, aplicando-se à ação de contencioso pré-contratual as regras que em matéria de contagem do prazo se apliquem à ação administrativa de impugnação de atos administrativos.
III. Embora a norma do artigo 101.º do CPTA não preveja a remissão para o artigo 58.º, n.º 2 do citado Código, não se vislumbra qualquer razão para que a mesma não seja aplicável, por aplicação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º do CPTA.
IV. Aplicando-se o artigo 58.º, n.º 2 e, por via dele, o artigo 279.º do CC, às ações de contencioso pré-contratual têm aplicação as regras de contagem do prazo de instauração da ação que aí se estipulem.
V. Referindo-se o disposto no artigo 101.º do CPTA ao prazo de “um mês”, deve considerar-se o conceito do que seja um mês, como correspondendo ao mesmo dia do mês seguinte, independentemente de esse mês ter 28, 29, 30 ou 31 dias.
VI. Por isso, a regra da 2.ª parte da alínea c) do artigo 279.º do CC, que prevê que se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês.
VII. Quanto aos prazos estipulados em meses – um mês o prazo previsto no artigo 101.º do CPTA, mas o entendimento é transponível para o prazo de três meses, previsto no artigo 58.º, n.º 1, b) do CPTA, do mesmo modo que já o era para o prazo de dois meses, previsto no artigo 28.º, n.º 1, a) da LPTA – tal prazo há-de findar no mesmo dia do mês em causa.
VIII. O prazo de um mês previsto no artigo 101.º do CPTA, por via da aplicação do artigos 58.º, n.º 2 e 59.º, n.º 3, do CPTA, conta-se nos termos do artigo 279.º, c) do CC, nos termos do qual o prazo termina às 24 horas do dia que corresponda a essa data, dentro do respetivo mês, não havendo que preceder esta regra da antecedente, prevista na alínea b) do artigo 279.º do CC, de modo a que, sendo de um mês o prazo para a instauração da ação e sendo a parte notificada no dia 07 de certo mês, o prazo termina no dia 07 do mês seguinte.
IX. As ações de contencioso pré-contratual devem ser instauradas no prazo de um mês, nos termos do disposto no artigo 101.º do CPTA, segundo as regras de contagem do prazo previstas no artigo 58.º, n.º 2 do CPTA e do artigo 279.º, c) do CC, a qual dispensa a aplicação do disposto no artigo 279.º, b) do CC, porquanto na contagem do prazo a regra aplicável da alínea c) já tem ínsito o que se estabelece naquela alínea b). (…)” – vd. Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 885/19.7BEALM, com data de 16.04.2020.
Feito, pois, o enquadramento legal, importa apreciar a questão.
Para efeito de admissão, ou rejeição, liminar, o Tribunal deve considerar o que alegado pelo autor em sede de petição inicial, designadamente para aferir se existe, ou não, uma situação de manifesta falta de preenchimento de pressupostos processuais.
No caso concreto, consta do artigo 2º da petição inicial que a decisão de adjudicação impugnada foi proferida no dia 26.06.2024 e notificada aos concorrentes no dia 03.07.2024, mais tendo afirmado através de requerimento de 16.09.2024 (cfr. fls. 147 dos autos «SITAF») que o acto ora impugnado não foi objecto de qualquer reclamação ou recurso junto da entidade adjudicante.
Assim, atento o facto de as AA. reconhecerem, no respetivo articulado inicial, que foram notificadas da decisão de adjudicação (acto impugnado) no dia 03.07.2024 e, uma vez que a petição inicial relativa à presente acção foi apresentada em juízo, via «SITAF», no dia 20.08.2024 (cfr. fls. 1 dos autos «SITAF»), o Tribunal conclui, evidentemente, pela verificação da a caducidade do direito de acção, pois que, à luz do quadro normativo supra exposto, o termo final do referido prazo ocorreu no dia 03.08.2024.
Não obstante o que se deixa dito e em aplicação do princípio do pro actione, mesmo considerando outra perspectiva e atendendo agora ao teor do documento constante de fls. 148 dos autos «SITAF» – apresentado pelas AA. a instâncias do Tribunal – donde se extrai que a notificação da decisão de adjudicação foi lida no dia 17.07.2024, igualmente se conclui pela ocorrência da caducidade do direito de ação.
É que, as AA. afirmaram nos autos que não deduziram qualquer reclamação ou recurso junto da entidade adjudicante relativamente ao acto impugnado; pelo que, ainda que se considerasse aquela data - 17-07-2024 - como sendo o momento relevante a partir do qual se iniciaria a contagem do prazo para instaurar a competente acção, a verdade é que, tendo por base o disposto na alínea c) do art.º 279.º do Código Civil, sempre se mostraria caducado o direito de acção, porquanto, tal prazo terminaria no dia 17.08.2024, o qual por corresponder a um sábado transitaria para o primeiro dia útil seguinte, isto é, 19.08.2024.
Assim, tendo a presente acção sido instaurada no dia 20.08.2024, o Tribunal conclui, também nesta hipótese, pela caducidade do direito de acção à luz do prazo estatuído no artigo 101º do CPTA (…)”.

13. As Recorrentes insurgem-se contra o assim decidido, por manterem a firme convicção de que “(…) do art.º 101º do CPTA não resulta uma regra relativa à contagem desse prazo, motivo pelo qual deve considerar-se aplicável (ex vi art.º 97º, n.º 1, al. c) do CPTA) o disposto no n.º 2 do art.º 58º do CPTA nos termos do qual “sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando os prazos terminarem em férias judiciais ou em dia em que os tribunais estiverem encerrados, para o 1.º dia útil seguinte”.

14. Em tais termos, defendem que “(…) na medida em que a presente ação foi intentada ainda durante as férias judiciais, e antes do dia 02 de setembro de 2024 (prazo limite para a sua interposição), deve a mesma ser considerada tempestiva, sendo assim admitida pelo Tribunal a quo (…)”.

15. Do que se vem de expor resulta absolutamente cristalino que o nó górdio da questão recursiva está, essencialmente, em determinar se, terminando o prazo para intentar processo do contencioso pré-contratual a que se referem os art.ºs 100º e segs. do CPTA, no período de férias judiciais, o seu termo transfere-se [ou não] para o primeiro dia útil seguinte.

16. Ora, sob a questão decidenda configurada nos termos e com o alcance supra exposto, pronunciou-se já a subsecção de Contratos Públicos do Tribunal Central Administrativo Norte, por acórdão datado de 22 de novembro de 2024, no âmbito do processo n.º 1853/24.2BEPRT.

17. Por concordarmos com o aí decidido, e com o arrazoado jurídico que sustenta o sentido dessa decisão judicial, limitar-nos-emos a reproduzir grande parte da fundamentação jurídica do mesmo, procedendo às devidas e necessárias adaptações ao caso dos autos.

18. Efetivamente, vertida a solução a que aderimos num texto jurídico que merece a nossa inteira concordância, não se justifica o esforço de elaboração de um novo nesta matéria, porventura, menos conciso molde textual.

19. Acompanhemos, por isso, as partes mais significativas da argumentação expendida no mencionado aresto: “(…)

15. Vejamos, sublinhando, desde já, que, nos termos do artigo 101.º, os processos de contencioso pré-contratual devem ser intentados no prazo de um mês, sendo aplicável à contagem do prazo o disposto no n.º 3 do artigo 58.º, 59.º e 60.º todos do CPTA.
16. Na contagem deste prazo é também aplicável a normação contida no artigo 58.º, n.º 2 do C.P.T.A., por força da alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º do C.P.T.A.
17. Assim também entendeu o Tribunal Central Administrativo Sul, no aresto de 17.11.2019, tirado no processo n.º 1593/18.1BELSB, disponível in www.dgsi.pt, cuja linha jurisprudencial aqui acompanhamos.
18. Dispõe o artigo 58.º do [novo] C.P.T.A., sob a epígrafe “Prazos”, que:
“1 - Salvo disposição em contrário, a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de:
(…)
b) Três meses, nos restantes casos.
2 – Sem prejuízo do disposto no nº. 4 do artigo 59º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279º do Código Civil. (…)” [destaque nosso].
19. Na interpretação desta normação, deve-se convocar necessariamente os contributos doutrinais e jurisprudenciais emanados a seu propósito.
20. Assim, impera ressaltar o afirmado por J. C. Vieira de Andrade [in A Justiça Administrativa, Lições, 14.ª edição, Almedina, pág. 261] o "prazo de impugnação de atos administrativos, depois de ter sido contado, entre 2002 e 2015, nos termos do Código do Processo Civil, volta a contar-se, como era tradicional, nos termos do Código Civil (artigo 58.°, nº. 2, do CPTA). Voltou a ser, por isso, um prazo contínuo que não se suspende em sábados, domingos e feriados, nem sequer em férias judiciais.".
21. De igual modo, cabe destacar o pensamento de Mário Aroso de Almeida “(…) "a revisão de 2015 afastou a regra do anterior artigo 58.°, nº 3, segundo a qual o prazo de impugnação de três meses se contava de acordo com o disposto no artigo 144.° do CPC, suspendendo-se durante as férias judiciais. Na verdade, ao estabelecer que os prazos estabelecidos no nº1 se contam nos termos do artigo 279° do Código Civil, o novo n° 2 do artigo 58.° assume que eles se contam de modo contínuo, sem suspensão durante as férias judiciais. O prazo que termine em dia em que os tribunais estejam encerrados ou haja tolerância de ponto é, entretanto, prolongado para o primeiro dia útil seguinte" [in Manual de Processo Administrativo 2ª edição, Almedina, 2016, pág.299] [destaque nosso].
22. De resto, é precisamente neste sentido e com a fundamentação aduzida pela doutrina acabada de transcrever, que se tem vindo a direcionar, de forma pacífica e uniforme, a jurisprudência dos tribunais superiores [vide, entre outros, os acórdãos do S.T.A., de 17.01.2019, proferido no processo n.º 09/18.8BEAVR; do T.C.A SUL, de 06.01.2017, proferido no processo n.º 1642/16.8BELSB; e de 04.05.2018, tirado no processo nº. 1114/16.0BELSB, todos acessíveis em www.dgsi.pt].
23. Reiterando esta linha doutrinal e jurisprudencial, tem-se, portanto, por assente que a normação contida no artigo 58.º, n.º 2 do C.P.T.A. deve ser interpretada no sentido de que a mesma estabelece que o prazo impugnatório se conta de modo contínuo, sem qualquer suspensão durante o período de férias, sendo que o prazo que termine em dia em que os tribunais estejam encerrados ou haja tolerância de ponto é, entretanto, prolongado para o primeiro dia útil seguinte (…)”.

20. Examinando o aresto parcialmente transcrito, verifica-se, sem qualquer margem para dúvida, que a mesmo versa sobre a problemática trazida a juízo.

21. Não se vislumbra, nem descortina, qualquer argumento de natureza jurídica ou prática para inverter a direção seguida no referido processo, assomando a mesma, a nosso ver, como a mais concordante e consentânea com o bloco legal aplicável ao caso versado nos autos, tanto mais que a mesma recolheu já a intervenção do presente Tribunal Coletivo.

22. Conclui-se, portanto, que, na contagem do prazo de um mês previsto no artigo 101.º do CPTA é aplicável, para além do disposto no n.º 3 do artigo 58.º, 59.º e 60.º todos do CPTA, também a normação contida no artigo 58.º, n.º 2 do C.P.T.A., devendo esta última normação ser interpretada no sentido de que a mesma estabelece que o prazo impugnatório se conta de modo contínuo, sem qualquer suspensão durante o período de férias, sendo que o prazo que termine em dia em que os tribunais estejam encerrados ou haja tolerância de ponto é, entretanto, prolongado para o primeiro dia útil seguinte.

23. No caso sujeito, cabe notar que as Autoras tiveram conhecimento de decisão adjudicatória impugnada no dia 03 de julho de 2024, não tendo reclamado da mesma.

24. Isso significa que a partir de então [03.07.2024] iniciou-se o prazo para a utilização do meio processual impugnatório, in casu, a ação administrativa de contencioso pré-contratual, cuja instauração está sujeita ao prazo de um mês, nos termos do artigo 101.º do C.P.T.A, que terminou no dia 03.08.2024, portanto, no decurso do período de férias judiciais de verão.

25. Nos termos do que vem supra expender, o referido prazo transmitiu-se para o primeiro dia útil após férias judiciais, ou seja, para o dia 02.09.2024.

26. Pelo que, na data em que a presente ação foi proposta, em 20.08.2024, ainda não se esgotado o prazo previsto no artigo 101.º do C.P.T.A.

27. Assim deriva, naturalmente, que mal andou o Tribunal a quo, que ao decidir como decidiu, interpretou mal e violou o disposto o bloco legal aplicável.

28. Concludentemente, impõe-se conceder provimento integral ao presente recurso jurisdicional, revogar a decisão judicial recorrida e determinar a baixa dos autos à 1.ª instância, para que aí prossigam os seus ulteriores trâmites processuais se nada mais obstar.

29. Assim se decidirá.


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V – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os Juízes da Subsecção de Contratos Públicos da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da CRP, em CONCEDER PROVIMENTO ao recurso jurisdicional “sub judice”, e, em consequência, revogar a decisão judicial recorrida e determinar a baixa dos mesmos para prosseguimento dos respetivos trâmites, se nada mais a tal obstar.

Custas pela Recorrida.

Registe e Notifique-se.


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Porto, 10 de janeiro de 2025


Ricardo de Oliveira e Sousa

Tiago Afonso Lopes de Miranda

Clara Ambrósio