Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 02066/11.9BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 10/27/2021 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Rosário Pais |
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Descritores: | AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL; INIMPUGNABILIDADE; LESIVIDADE; PROVA DO PREÇO EFETIVO |
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Sumário: | I - Tanto o ato de determinação do valor patrimonial tributário definitivo de imóvel como o ato de indeferimento do pedido formulado em procedimento tributário que o alienante do imóvel, enquanto sujeito passivo de IRC, tenha instaurado para prova do preço efetivo da transmissão por virtude de o valor de venda declarado ser inferior ao valor patrimonial tributário fixado (artigos 58.º-A e 129.º do CIRC, a que correspondem os atuais artigos 64.º e 139.º), afetam, de forma atual e imediata, os direitos e interesses legalmente protegidos desse sujeito passivo, e, por isso, há que assegurar-lhe a tutela judicial efetiva em relação a estes dois atos (pese embora a lei apenas considere aquele primeiro como “destacável” para efeitos contenciosos), com a possibilidade da sua impugnação contenciosa autónoma e imediata, subtraída ao regime regra da impugnação unitária. II – Pelo que a este sujeito passivo de imposto sobre o rendimento assistem os seguintes meios contenciosos: (i) impugnação judicial do ato que fixou o valor patrimonial tributário do imóvel; (ii) ação administrativa especial para sindicar a legalidade do ato final do procedimento tributário que instaurou com vista à prova do preço efetivo da transmissão; (iii) impugnação judicial do ato de liquidação de IRC que vier a resultar da aplicação do disposto no artigo 58.º-A do CIRC, ou, se não houver lugar a liquidação de imposto, do ato de correção ao lucro tributável efetuada ao abrigo do mesmo preceito legal, sendo de notar que nesta impugnação pode ainda invocar qualquer ilegalidade ou erro praticado no procedimento destinado à prova do preço efetivo, bem como recorrer a qualquer meio de prova adequado à demonstração do preço efetivamente praticado |
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Recorrente: | B.,SA |
Recorrido 1: | Ministério das Finanças |
Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. B., S.A., devidamente identificado nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 06.11.2014, que julgou procedente a exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato e, em consequência absolveu da instância o Réu Ministério das Finanças, no âmbito da ação administrativa especial deduzida contra a decisão que indeferiu o pedido de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentado ao abrigo do artigo 139.º do CIRC, respeitante à alienação, em 23.12.2010, do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 498 da freguesia e (...), concelho de (...).. 1.2. O Reclamante B., S.A. concluiu as suas alegações de recurso nos seguintes termos: «1.ª A douta decisão recorrida julgou procedente a exceção de inimpugnabilidade do ato invocada pela Entidade Demandada, absolvendo-a da instância consubstanciada na ação administrativa especial deduzida pelo ora Recorrente contra o despacho, por delegação, do Chefe do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão (SACR), da Direção de Finanças do Porto, Exmo. Senhor Dr. C., datado de 23.03.2011, exarado na Informação n.º 14/2011 daquele SACR da Direção de Finanças do Porto, notificado através do Ofício n.º 18512/0208, datado de 23.03.2011, o qual determinou o indeferimento do requerimento de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentado pelo ora Autor, em 23.12.2010, nos termos do disposto no artigo 139.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (Código do IRC), com referência à alienação do prédio urbano sito na freguesia de (...), concelho de (...), inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 498. 2.ª Não pode, todavia, proceder o entendimento da decisão recorrida; 3.ª Com efeito, e desde logo, o Tribunal recorrido entendeu que a decisão que pôs termo ao procedimento de prova do preço efetivo desencadeado pelo Recorrente é um ato interlocutório do procedimento que, como tal, só seria impugnável assumindo a natureza de ato destacável e/ou lesivo, nos termos do disposto no artigo 54.º do CPPT; 4.ª Contudo, e contrariamente ao que se aduz na decisão recorrida, o despacho que indeferiu o pedido de prova do preço efetivo sub judice é um ato final do procedimento e, deste modo, suscetível de impugnação contenciosa imediata conforme resulta do artigo 60.º do CPPT, respeitante à definitividade dos atos praticados pela autoridade fiscal competente; 5.ª Não sendo um ato interlocutório, é inaplicável, assim, o disposto no artigo 54.º do CPPT, o qual estabelece as condições de impugnabilidade de tais atos; 6.ª De facto, o ato sub judice consiste na decisão final de um procedimento regulado no artigo 139.º do Código do IRC e que visa a demonstração de que o preço efetivamente praticado na transmissão de imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação de imposto municipal sobre a transmissão onerosa de imóveis (IMT), assumindo natureza autónoma do procedimento de liquidação, sendo assim evidente o erro de julgamento em que a decisão recorrida incorreu ao qualificar a decisão sub judice como um ato interlocutório; 7.ª Acresce que, a circunstância de, em consequência da decisão que for proferida no âmbito do procedimento de prova do preço efetivo previsto no artigo 139.º do Código do IRC, poder vir a ser emitido um ato tributário de liquidação de imposto, não significa que aquela decisão não seja uma decisão final no procedimento; 8.ª Com efeito, não só o próprio órgão decisor do procedimento de prova do preço efetivo qualificou o ato sub judice como uma decisão final do procedimento, ao estabelecer a sua recorribilidade hierárquica, como da legislação contenciosa tributária, designadamente do artigo 62.º do CPPT, resulta a manifesta autonomia entre o procedimento de prova do preço efetivo e o procedimento de liquidação, sem que ambas as decisões deixem de ser consideradas finais em cada um dos procedimentos; 9.ª Assim, uma vez evidenciado que a decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo sub judice não constitui um ato interlocutório, mas um ato final do procedimento, não subsiste qualquer dúvida quanto à sua impugnabilidade contenciosa imediata, nos termos do artigo 60.º do CPPT, bem como quanto à inaplicabilidade do artigo 54.º do CPPT e, por conseguinte, quanto à improcedência da exceção invocada; 10.ª Razão pela qual, se conclui que, ao considerar que o ato sub judice era um ato interlocutório, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, impondo-se a sua anulação; 11.ª Sem prejuízo do exposto, e ainda que se considerasse que a decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo era um ato interlocutório, o que apenas por dever de patrocínio se admite, sem conceder, sempre se dirá, ainda assim, que a decisão recorrida padece de erro ao qualificar tal ato como ato não destacável e assim insuscetível de impugnação autónoma; 12.ª Com efeito, incorre em erro o Tribunal a quo neste ponto, uma vez que a admissibilidade legal de impugnação direta do ato em causa, enquanto ato destacável, encontra-se prevista no artigo 86.º, n.º 1, da LGT, quando aí se refere que “a avaliação directa é susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa”; 13.ª Uma vez que os atos de avaliação direta, atos preparatórios no procedimento tributário de liquidação de imposto, são atos paradigma cuja destacabilidade é incontroversa, sem margem para dúvidas que o ato em apreço no caso dos autos consubstancia um ato de avaliação direta, razão pela qual a respetiva destacabilidade e impugnabilidade autónoma são igualmente inequívocas; 14.ª Resulta por demais notório que o passo intermédio que aqui está em causa na determinação dos rendimentos tributáveis em IRC não é uma operação de mero cálculo matemático e, por outro lado, que aquele passo intermédio também não constitui um dos casos estritamente tipificados de avaliação através de métodos indiciários em que, por impossibilidade de avaliação direta, se procura atingir não o valor real dos rendimentos mas o valor mais aproximado possível do real; 15.ª Na verdade, a determinação da matéria tributável de IRC, tal como prevista nos artigos 64.º e 139.º do Código do IRC, corresponde a uma avaliação direta da matéria tributável, razão pela qual os vícios do procedimento de avaliação e do ato tributário de avaliação direta carecem de ser impugnados por via contenciosa, sob pena de não poder ser posteriormente atacável a matéria tributável fixada, quer nas situações em que haja liquidação de imposto, quer quando a não haja; 16.ª Neste sentido, identifica-se um erro de julgamento de direito na decisão recorrida ao concluir pela inimpugnabilidade autónoma do ato com base na circunstância da inimpugnabilidade ser a regra e não se descortinar uma exceção, quando bastaria recorrer ao disposto no artigo 86.º, n.º 1, da LGT; 17.ª Assim, tratando-se da avaliação direta de rendimento em IRC impõe-se, no caso vertente, a impugnação contenciosa autónoma sob pena de impossibilidade ulterior de sustentar que a matéria tributável a considerar é outra que não a determinada; 18.ª Com efeito, a disposição legal referida – artigo 86.º, n.º 1, da LGT – impõe a impugnação contenciosa direta dos atos de avaliação direta uma vez que se tratam de atos materialmente definitivos que constituem pressupostos necessários e prejudiciais dos atos tributários em sentido estrito; 19.ª Em face de todo o exposto, resultando por demais demonstrada a natureza de ato destacável do ato impugnado nos autos, consubstanciando aquele um ato de avaliação direta do rendimento para efeitos de tributação em sede de IRC, cuja impugnabilidade contenciosa autónoma se encontra expressamente prevista na lei – artigo 86.º, n.º 1, da LGT –, não pode deixar de concluir-se pela existência de erro de julgamento da decisão recorrida neste segmento, impondo-se a respetiva revogação; 20.ª Sem prejuízo do exposto, e ainda que não procedesse o que acima se aduziu, o que apenas se admite por dever de patrocínio, sem conceder, sempre se dirá que, contrariamente ao que resulta da decisão recorrida, o ato sub judice é um ato lesivo dos direitos do contribuinte e suscetível de imediata impugnação contenciosa; 21.ª Com efeito, importa referir que a menção ao artigo 139.º, n.º 7, do Código do IRC não permite sustentar, de longe, a alegada falta de lesividade do ato; 22.ª De facto, a circunstância de, como decorre daquela norma, a impugnação judicial da liquidação de imposto emitida na sequência de correções efetuadas nos termos do artigo 64.º do Código do IRC, ou das correções ao lucro tributável efetuadas ao abrigo do mesmo preceito, depender de prévia apresentação do pedido de prova do preço efetivo em nada contribui para a conclusão do Tribunal recorrido de que o mesmo não constitui um ato lesivo; 23.ª Assim, uma vez que a impugnabilidade contenciosa imediata do ato depende, apenas, da lesão de direitos do contribuinte, conclui-se de forma inequívoca pela improcedência do entendimento do Tribunal recorrido suportado na redação daquela norma; 24.ª Acresce que, contrariamente ao que resulta da decisão recorrida, não é verdade que a decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo não afete os direitos ou interesses do Recorrente; 25.ª Efetivamente, a imediata lesividade do ato decorre da circunstância de a decisão que negar provimento ao pedido de prova do preço efetivo fazer cristalizar na ordem jurídica que o preço praticado pelo Recorrente na transmissão de determinado imóvel não foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação de IMT e, consequentemente, determinar o acréscimo, para efeitos de apuramento do lucro tributável ou do prejuízo para efeitos fiscais, do montante correspondente à diferença entre o valor constante do contrato de transmissão do imóvel e o valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação de IMT; 26.ª Para além de todo o acima exposto, e a evidenciar ainda a lesividade imediata da decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo e, como tal, a sua impugnabilidade direta, está a circunstância de, quando confrontado com aquela decisão, o contribuinte desconhecer, em regra, se haverá, ou não, a emissão de uma liquidação de imposto ou, sequer, se apurará lucro tributável no exercício em questão; 27.ª A possível ocorrência de tal situação é, pois, quanto basta para que a decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo tenha natureza de ato lesivo; 28.ª Com efeito, é evidente que, em caso de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo, e mesmo sabendo que será realizado um acréscimo para efeitos de apuramento do lucro tributável ou do prejuízo para efeitos fiscais na sua declaração periódica de rendimentos modelo 22, o contribuinte não tem forma de saber, em regra, se haverá liquidação de imposto que possa, posteriormente, vir a contestar; 29.ª Trata-se de situação que não sucede, designadamente, ao nível do procedimento de revisão da matéria coletável por métodos indiretos, em que, uma vez notificado da decisão do pedido de revisão da matéria coletável, o contribuinte sabe, de imediato, se apura matéria coletável e imposto, caso em que poderá impugnará o ato de liquidação que vier a ser emitido, ou se, ao invés, apura prejuízo para efeitos fiscais ou matéria coletável nula, caso em que impugnará a própria decisão de avaliação indireta (cf. o n.º 3 do artigo 86.º da LGT); 30.ª Atendendo a que este conhecimento antecipado sobre qual o ato a contestar pode não ocorrer aquando da notificação da decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo, impõe-se, por forma a garantir o direito à tutela judicial efetiva dos direitos dos cidadãos através da impugnação contenciosa de atos administrativos lesivos (cf. artigos 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa), o reconhecimento da imediata lesividade da decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo e, por conseguinte, da sua impugnabilidade direta; 31.ª Com efeito, a interpretação do disposto no artigo 139.º do Código do IRC, no sentido de que a decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo não constitui um ato lesivo dos direitos do contribuinte e impugnável contenciosamente, é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP, o que se invoca para todos os efeitos legais; 32.ª Por fim, cumpre mencionar ainda que, no caso sub judice, está-se perante uma decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo que não conhece do mérito do pedido e que se suportou exclusivamente na falta de apresentação dos documentos de autorização do levantamento do sigilo bancário dos administradores do Recorrente, o que evidencia mais a lesividade, particularmente quando se perspetiva que dali resultou a emissão de uma liquidação de imposto; 33.ª Acresce que, considerar, como fez o Tribunal recorrido, que a apreciação da legalidade da decisão se fará em sede de impugnação judicial da liquidação de imposto que for emitida encaminha para o domínio do contencioso de anulação – como é o contencioso tributário – a apreciação da legalidade de uma decisão administrativa, sem que o Tribunal tributário possa substituir-se à administração tributária, o que, à luz do direito à tutela judicial efetiva, não constituirá a solução que melhor se compagina com os direitos e interesses do contribuinte; 34.ª Em face do exposto, resulta evidente a lesividade do ato e a sua imediata impugnabilidade, pelo que improcede o exposto na decisão recorrida a este respeito, devendo a mesma ser revogada e a exceção invocada pela Fazenda Pública ser julgada improcedente; 35.ª Sendo o presente recurso julgado procedente, como entende o Recorrente, e considerando esse Ilustre Tribunal que, para além da revogação da decisão recorrida, nada obsta à apreciação das questões que ficaram prejudicadas pela solução dada ao litígio, sempre se impõe no caso sub judice que os autos baixem à 1.ª instância para a fixação da matéria de facto na decisão recorrida; 36.ª Isto porque, com efeito, a inexistência de matéria de facto dada como provada na douta decisão recorrida é impeditiva para a prolação de decisão sobre as questões que ficaram prejudicadas aquando da solução dada ao litígio pelo Tribunal a quo, quais sejam: a inconstitucionalidade do n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC e a violação do disposto no artigo 63.º-B da LGT; 37.ª Assim, impõe-se a esse Ilustre Tribunal, por força do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alíneas c) e d), do CPC, aplicável por via dos artigos 140.º e seguintes do CPTA, aplicáveis ex vi artigo 97.º, n.º 2, do CPPT, que ordene a baixa dos autos ao Tribunal recorrido, por impossibilidade de o Tribunal ad quem julgar em substituição, uma vez que o pedido e a causa de pedir formulados pela ora Recorrente impunham o conhecimento de matéria de facto, que se revela inexistente na sentença proferida, caso esse Ilustre Tribunal não disponha dos elementos probatórios que permitam a reapreciação da matéria de facto; 38.ª É que, desaparecida a questão prejudicial acima mencionada, decorrente da sua pronúncia em sentido diferente da do Tribunal recorrido quanto à existência de inimpugnabilidade do ato, e atenta a insuficiência da matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo quanto aos factos relativos às questões cujo conhecimento agora importa, impõe-se, nos termos dos citados preceitos legais, a remessa dos autos para a primeira instância, para prolação de nova decisão, com preliminar fixação, motivação e fundamentação da matéria de facto; 39.ª Admitindo que esse Ilustre Tribunal entende, ao invés, que do processo constam todos os elementos necessários à prolação de nova decisão sobre a matéria de facto, como prevê o artigo 662.º, n.º 1 do CPC, aplicável por via dos artigos 140.º e seguintes do CPTA, aplicáveis ex vi artigo 97.º, n.º 2, do CPPT, ainda assim, deverá ser fixada a matéria de facto, tendo em consideração a inexistência de matéria de facto dada como provada na decisão recorrida; 40.ª Efetivamente, não havendo sido fixados factos, estes deverão ser dados como provados com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos: 41.ª Em face do supra exposto, os referidos factos devem, para todos os efeitos, ser relevados como factos provados na decisão sub judice, atenta a manifesta relevância dos mesmos para a boa decisão da causa; a. O Recorrente é uma instituição de crédito que, no âmbito da sua atividade comercial, se dedica ao comércio bancário, nomeadamente à concessão de crédito; b. Nesse contexto, perante a incapacidade de um cliente para solver dívidas provenientes do crédito contratado, o Recorrente adquiriu o prédio urbano sito na freguesia de (...), concelho de (...), inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 498; c. Por escritura pública, outorgada em 23.12.2010, o Recorrente alienou o prédio urbano identificado supra pelo valor de € 220.000,00 (cf. cópias da escritura pública de compra e venda e dos documentos comprovativos do recebimento do preço declarado juntas no procedimento de prova do preço efetivo que integra o processo administrativo instrutor); d. Em 28.02.2011, foi o Recorrente notificado do Valor Patrimonial Tributário (VPT) do prédio urbano identificado supra, determinado nos termos do artigo 38.º e seguintes do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), fixado em € 775.550,00 (cf. cópias juntas ao requerimento apresentado e que integram o processo administrativo instrutor); e. Uma vez que o imóvel em causa foi efetivamente alienado por valor inferior ao VPT fixado, o Recorrente apresentou, em 04.03.2011, requerimento com vista à comprovação do preço efetivo da respetiva transmissão, nos termos do disposto no artigo 139.º do Código do IRC, por forma a afastar a aplicabilidade do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do mesmo diploma legal; f. Para esse efeito, o Recorrente juntou ao mencionado requerimento a cópia da escritura pública de compra e venda, cópia dos cheques e comprovativo de transferência bancária, através dos quais se comprova o valor total do preço recebido, bem como a declaração de autorização de acesso à sua informação bancária (cf. respetivas cópias juntas ao requerimento apresentado nos termos do disposto no art. 139.º do Código do IRC e que integram o processo administrativo instrutor); g. Em 11.03.2011, o Recorrente foi notificado, através do Ofício n.º 15329/0208, de 09.03.2011, para, no prazo de 15 dias, proceder à junção dos documentos de autorização de acesso à informação bancária respeitantes aos seus administradores, sob pena “(…) do pedido ser liminarmente rejeitado (…) por falta de requisitos legais.” (cf. referido Ofício que integra o processo administrativo instrutor); h. Em 17.03.2011, o Recorrente apresentou requerimento de resposta àquele Oficio, no qual, entre vários fundamentos, invocou que o entendimento de que a norma contida no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, como vem sendo aplicada pela administração tributária, isto é, no sentido da perentória necessidade de autorização de acesso à informação bancária dos administradores ou gerentes dos contribuintes requerentes, sob pena de indeferimento liminar do pedido de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis por falta de observância de requisitos legais, constitui manifesta violação de princípios estruturantes da nossa ordem jurídica, designadamente, do direito à reserva da intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do da proporcionalidade, previsto no artigos 18.º, n.º 2, e 266.º daquela Lei Fundamental (cf. requerimento apresentado em 17.03.2011 que integra o processo administrativo instrutor); i. Não tendo o Recorrente procedido à junção dos aludidos documentos, viria, por fim, a ser notificado da decisão final de indeferimento do requerimento de prova do preço efetivo da transmissão do imóvel acima mencionado, proferido pelo Exmo. Senhor Chefe do SACR da Direcção de Finanças do Porto e notificada através do Ofício n.º 18512/0208, datado de 23.03.2011 (cf. cópias juntas ao requerimento apresentado e que integram o processo administrativo instrutor); j. Tal decisão foi proferida, exclusivamente, com fundamento na violação do disposto no artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, nomeadamente, na falta de apresentação dos documentos de autorização do levantamento do sigilo bancário dos administradores do Autor (cf. cópias juntas ao requerimento apresentado e que integram o processo administrativo instrutor); k. Com efeito, refere-se naquela decisão que, não tendo o Recorrente, então Requerente, procedido à apresentação daqueles elementos, “(…) o pedido deverá ser indeferido, por falta de requisitos legais” (cf. página 3 do doc. n.º 2); 42.ª De igual modo, e para os devidos efeitos, dá-se como impugnada a matéria de facto não provada na parte em que se consideraram implicitamente como não provados os factos acima indicados na conclusão 41.ª; 43.ª Pelo que, em suma, deverão ser relevados como factos provados todos os supra evidenciados e, em conformidade com o exposto, ser proferida uma nova decisão que julgue a ação administrativa especial deduzida pelo Recorrente integralmente procedente; 44.ª Tendo presente a factualidade acima indicada, resulta evidente que a norma constante do n.º 6, do artigo 139.º do Código do IRC, tal como foi aplicada ao caso vertente pela administração tributária, e nessa sequência a decisão sub judice, incorrem em manifesta violação de alguns dos mais basilares princípios consagrados na CRP, tais como os princípios da reserva à intimidade da vida privada, do Estado de Direito, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, da proporcionalidade e da tributação do rendimento real, vertidos, respetivamente, nos artigos 26.º, n.º 1, 2.º, 20.º, n.º 1 e 4, 17.º, 286.º, n.º 4 e 104.º, n.º 2, daquele diploma; 45.ª A questão de inconstitucionalidade vem colocar-se com referência ao n.º 6 do atual artigo 139.º do Código do IRC, na redação dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, segundo o qual, nas situações em que o sujeito passivo faça uso do procedimento em questão, a administração tributária pode aceder à informação bancária do requerente e dos respetivos administradores ou gerentes referente ao exercício em que ocorreu a transmissão e ao exercício anterior, devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização, o que configura, na verdade, uma imposição legal, manifestamente inaceitável em face dos mais básicos princípios constitucionalmente consagrados; 46.ª Na verdade, trata-se aquele de um regime especial de derrogação do sigilo bancário consagrado pelo legislador tributário com o intuito de exigir ao sujeito passivo a prévia apresentação das autorizações, que se pretendem totalmente voluntárias, de acesso à sua informação bancária e à dos seus administradores, elevando-se, desse modo, a apresentação daquelas autorizações a verdadeira condição sine qua non formal do deferimento do requerimento de prova de preço apresentado nos termos e de acordo com os requisitos fixados nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 139.º do Código do IRC, isto é, determinando-se que, não se verificando a obtenção e apresentação daquelas autorizações, o sujeito passivo fica impossibilitado de recorrer ao procedimento previsto no artigo 139.º do Código do IRC com vista a afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 47.ª Em face de todo o exposto, facilmente se depreende que a norma em causa e a decisão em crise, ao proceder à sua interpretação e aplicação com o sentido a que acima se fez referência, incorrem em manifesta violação dos princípios constitucionais basilares, designadamente do princípio da reserva à intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º, n.º1, da CRP, do princípio do Estado de Direito, previsto no artigo 2.º da CRP do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto nos artigos 20.º, n.º 1, e n.º 4, e 268.º, n.º 4, todos da CRP do princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real, previsto no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e do princípio da igualdade tributária, previsto nos artigos 104.º, n.º 1 e n.º 2 e no artigo 13.º, todos da CRP; 48.ª No que concerne à violação dos enunciados princípios cumpre referir que a sua análise não poderá deixar de acompanhar a jurisprudência fixada pelo TC no acórdão n.º 442/2007, no âmbito do qual, aquele Tribunal se pronunciou relativamente a um pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade, apresentado por Sua Excelência o Presidente da República em 30.07.2007, que teve por objeto as normas constantes dos artigos 2.º e 3.º do Decreto n.º 139/X da Assembleia da República, de 5.07.2007, nas quais se previa a possibilidade de derrogação do sigilo bancário no âmbito de processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial, normas que aquele Tribunal considerou que violam os princípios constitucionais previstos nos aludidos artigos 2.º, 20.º, n.º 1, 26.º, n.º 1 e 2 e 286.º, n.º 4, todos da CRP; 49.ª A violação dos princípios sob apreciação consubstancia-se, desde logo, na circunstância de o eventual acesso à informação bancária do sujeito passivo e dos seus administradores, como condição do deferimento do requerimento apresentado nos termos do artigo 139.º do Código do IRC, determinar o alargamento do núcleo de pessoas que tomam conhecimento de informações protegidas, relativas ao sujeito passivo, sem que este último tenha à sua disposição qualquer garantia de defesa ou alternativa que não seja a de autorizar o levantamento do sigilo bancário, consubstanciando-se na violação do princípio da reserva à intimidade da vida privada e designadamente à esfera privada de ordem económica, também merecedora de tutela nos termos do disposto no artigo 26.º, n.º 1, da CRP; 50.ª Aquilo que o n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, expressamente determina é, apenas e só, que sem a obtenção e apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário – ou seja, sem que o seu direito e o de terceiros à reserva da intimidade da vida privada seja violado - o sujeito passivo não possa, na prática, afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 51.ª Acresce que, com a “imposição” daquela renúncia voluntária ao sigilo bancário pretendeu pretendeu-se contornar a obrigação, que a lei e os princípios gerais previstos nesta matéria impõem, de garantir ao sujeito passivo e administradores não só a pronúncia prévia sobre os fundamentos de eventual levantamento do sigilo bancário mas, também, a possibilidade de aqueles sujeitarem a sindicância judicial o acesso à informação bancária; 52.ª Pelo que, uma vez que não se vislumbra qualquer justificação para a consagração, no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, de um regime legal com tais implicações na esfera de direitos do sujeito passivo e de terceiros, nada justifica, também e neste caso, a sobreposição dos referidos objetivos de combate à fraude e evasão fiscal e do próprio direito do Estado de cobrar impostos ao direito à reserva da intimidade da vida privada consignado no artigo 26.º da CRP; 53.ª Mas, para além da violação do referido princípio/direito uma outra ocorre em consequência da concretização do comando ínsito naquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, qual seja a violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva; 54.ª Na verdade, o sujeito passivo depara-se, perante aquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, com uma situação em que ou autoriza a derrogação do seu sigilo bancário e obtém de terceiros as autorizações relativas a essa derrogação ou se vê irremediavelmente privado de afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 55.ª Verifica-se, pois, um efetivo condicionamento do exercício daquele direito e das legítimas expectativas do sujeito passivo de comprovar, perante a administração tributária, ao abrigo do expediente previsto no artigo 139.º do Código do IRC, tendo em vista a sua tributação pelo lucro real, que o preço efetivamente praticado na alienação de um determinado imóvel foi inferior ao VPT que serviu de base à liquidação do IMT entretanto liquidado; 56.ª Mas, mais do que isso, o referido n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, faz igualmente precludir, se atendermos ao que determina o n.º 7, da mesma norma, a própria possibilidade de impugnar judicialmente a liquidação de imposto, ou, se a este não houver lugar, as correções ao lucro tributável efetuadas por efeitos da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC, já que caso o sujeito passivo não recorra ao mecanismo previsto naquele artigo 139.º do Código do IRC, já não poderá impugnar a liquidação de imposto ou as correções ao lucro tributável realizadas pela administração tributária como consequência da aplicação da regra vertida no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 57.ª Para além das violações acima aludidas, a norma prevista no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC e a sua aplicação nos termos em que o fez a decisão sub judice, incorre, igualmente e ainda tendo por referência o direito fundamental de reserva à intimidade da vida privada, na violação do princípio da proporcionalidade; 58.ª Desde logo, no que se refere às mencionadas vertentes da adequação e da necessidade porquanto, embora se reconheça que o eventual controlo e acesso à informação bancária do sujeito passivo poderá, em face do objetivo mediato de combate à evasão e à fraude fiscal que presidiu à consagração do regime legal previsto no artigo 139.º, justificar aquele acesso, já nada poderá justificar que o mesmo se concretize da forma leviana que resulta da aplicação do n.º 6, daquele preceito, verificando-se assim uma manifesta desadequação dos meios em face dos fins a atingir; 59.ª Isto porque, a derrogação do sigilo bancário prevista naquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, pressupõe que o sujeito passivo voluntariamente renuncie ao carácter sigiloso da sua informação bancária e que providencie por essa renúncia de um terceiro, sob pena de não poder lançar mão do expediente legal que lhe permite afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 60.ª E tal renúncia ocorrerá, nos termos previstos no citado preceito, sem que expressamente se preveja, tal como se impunha, o dever da administração tributária de justificar e fundamentar as razões do acesso à informação bancária, pelo contrário, exige-se ao contribuinte a apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário, sob pena de o requerimento de prova do preço efetivo apresentado nos termos dos n.ºs 1, 2 e 3, do artigo 139.º do Código do IRC ser liminarmente indeferido; 61.ª Também na sua vertente mais estrita ocorre a violação do princípio da proporcionalidade; 62.ª Com efeito, também a circunstância de se exigir ao sujeito passivo que apresente, para efeitos da utilização do expediente previsto no artigo 139.º do Código do IRC, as autorizações de levantamento do sigilo bancário relativo a terceiros, quais sejam, os seus administradores, não configura, tal como impõe, por seu lado, o n.º 2 do artigo 18.º da CRP, uma medida necessária para “(…) salvaguardar outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos (…)”; 63.ª Efetivamente, o direito de cobrar impostos e os especiais objetivos de combate à fraude e à evasão fiscal que a consagração de uma norma do tipo da prevista naquele n.º 6, do artigo 139.º, do Código do IRC pretendem assegurar não podem em circunstância alguma, sobrepor-se aos direitos acima referidos, congregados no direito à confidencialidade das suas informações bancárias, pelo menos da forma como essa sobreposição vem consagrada na referida norma, sob pena de manifesta violação do princípio da proporcionalidade, constante do artigo 18.º, n.º 1, da CRP; 64.ª Nessa medida e em face de todo o exposto, deve a decisão sub judice ser anulada, também com fundamento na violação daquela norma; 65.ª Por fim, e ainda ao nível da violação dos princípios constitucionais, considera o Recorrente que a interpretação que do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC faz a administração tributária no caso vertente ofende outros dois princípios, quais sejam, o da tributação das empresas pelo rendimento real vertido no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e o da igualdade contributiva consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP; 66.ª Efetivamente, a ratio legis daquele artigo 64.º,do Código do IRC, enquanto norma antiabuso, é a de corrigir o rendimento declarado pelo sujeito passivo, quando ocorra um eventual afastamento de um padrão de normalidade – dos designados “valores normais de mercado” – mediante o recurso a um rendimento presumido, obtido em função e na sequência do valor patrimonial tributário definitivo determinado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, com referência ao imóvel em causa; 67.ª No entanto, a presunção, quer do rendimento, quer do próprio valor de alienação do imóvel a considerar para efeitos de determinação do rendimento tributável em IRC, apenas poderá ser admissível se consubstanciar uma presunção relativa, ou seja in casu, se for, na prática, possível efetuar a demonstração do valor real e efetivo da transmissão, pelo que, não o sendo, ocorre, no entendimento do Recorrente e salvo melhor opinião, uma manifesta violação do princípio constitucional da tributação pelo rendimento real previsto no artigo 104.º, n.º 3, da CRP; 68.ª Sucede que, à luz da redação do mencionado anterior artigo 129.º, n.º 6, atual 139.º, do Código do IRC dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e ora aplicada pela administração tributária, o legislador tributário veio tornar, na prática, inilidível a presunção de rendimento consagrada no artigo 64.º, enformando aquela norma, no entendimento do Recorrente, da inconstitucionalidade que originariamente havia sido apontada ao acima aludido anteprojeto; 69.ª Efetivamente, insista-se, caso o artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC seja interpretado no sentido de se entender que os mencionados documentos de autorização constituem um requisito indispensável à própria apreciação do requerimento de demonstração do preço efetivo, então tal exigência traduzir-se-á numa prova impossível e, por conseguinte, na inilidibilidade da presunção de rendimento; 70.ª Pelo que, em suma, o artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, quando interpretado e aplicado da forma em que o fez a administração tributária no caso vertente, ou seja, no sentido de que a autorização de derrogação do sigilo bancário dos administradores ou gerentes constitui um requisito imprescindível ao afastamento da presunção de rendimento prevista no artigo 64.º do Código do IRC, padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da tributação pelo rendimento real consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e do princípio da igualdade contributiva, previsto, entre outros, nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP; 71.ª Caso não se entenda verificadas as enunciadas inconstitucionalidades, o que apenas por cautela de patrocínio se concebe, sem conceder, ainda assim o ato em crise infringiu o disposto no artigo 63.º-B, da LGT; 72.ª Efetivamente, o n.º 6, do artigo 139.º do Código do IRC, quer numa interpretação meramente literal, quer de acordo com a interpretação e aplicação que do mesmo faz a administração tributária no âmbito da decisão sub judice, não colhe enquadramento nos princípios gerais que, relativamente à possibilidade de derrogação do sigilo bancário em matéria tributária, foram expressamente fixados pelo legislador ordinário no artigo 63.º-B, da LGT; 73.ª Com efeito, e conforme referido supra, o acesso às informações ou documentos bancários de familiar ou terceiro, exige sempre uma recusa de exibição ou autorização para a sua consulta e, perante esta, um ato decisório por parte da administração tributária a autorizar o levantamento do sigilo bancário, mediante audição prévia daqueles; 74.ª Não tendo a administração tributária desencadeado o procedimento previsto no artigo 63.º-B da LGT, por forma a garantir o acesso aos documentos e informações bancárias de terceiros, não pode o procedimento desencadeado ao abrigo do disposto no artigo 139.ºdo Código do IRC ser indeferido; 75.ª Assim, demonstrada a suficiência e a adequação do regime legal previsto no artigo 63.º-B da LGT, no que concerne à regulamentação do acesso a informações bancárias de terceiros, fica igualmente demonstrada, também por esse motivo, a ilegalidade do disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC e, nessa medida, da decisão sub judice, em virtude de ambos se encontrarem em violação daquela primeira norma; 76.ª Sem prejuízo de todo o acima exposto e numa tentativa, que o Recorrente crê que vã, de se interpretar o disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC em conformidade com todos os princípios e normas acima invocado, a única exegese possível do preceito só seria a de se aceitar a eventual exigibilidade da autorização para levantamento do sigilo bancário após a verificação, por parte da administração tributária, da existência de fundamentos concretos que justificassem a análise da informação bancária, sendo certo que, no caso dos terceiros, o facto de a administração tributária não proceder ao cumprimento do formalismo previsto do artigo 63.º-B da LGT para o levantamento do sigilo bancário nunca poderia ter como consequência o indeferimento do procedimento ao abrigo do artigo 139.º do Código do IRC; 77.ª Pelo que a administração tributária, ao exigir a apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário noutros termos que não os expostos – e que consubstanciam, insista-se, a única interpretação daquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, suscetível de não violar os princípios consignados na CRP e no artigo 63.º-B da LGT – faz inquinar de manifesta ilegalidade a decisão sub judice; 78.ª Sendo anulada, nos termos acima peticionados, a decisão em crise, importa, agora, demonstrar que o requerimento de prova de preço efetivo apresentado pelo Recorrente deverá ser, nos termos do disposto no artigo 139.º do Código do IRC, imediatamente deferido; 79.ª Com efeito, o Recorrente procedeu, em cumprimento do prazo previsto no atual artigo 139.º, n.º 3, do Código do IRC, à apresentação do requerimento com vista à prova do preço efetivo da transmissão em causa e juntou a cópia da escritura pública do contrato de compra e venda referente à alienação em questão e as cópias dos documentos comprovativos do recebimento do preço declarado, bem como a declaração de autorização de acesso à sua informação bancária; 80.ª Daqueles documentos resulta inequivocamente demonstrado e sem ser necessária a produção de qualquer prova adicional que aquele foi o preço pelo qual o Recorrente transmitiu os imóveis em questão; 81.ª Razão pela qual deve o requerimento de prova de preço efetivo em questão ser deferido para efeitos da validação dos montantes declarados pelo Recorrente, com referência à transmissão dos imóveis em causa na declaração modelo 22 referente ao exercício de 2009 e para efeitos da relevação do correto valor de alienação dos imóveis na determinação do lucro tributável do exercício. Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da decisão recorrida e, nessa medida, a anulação do ato em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!». 1.3. O Recorrido não apresentou contra-alegações. 1.4. Os autos foram com vista ao Ministério Público junto deste Tribunal. ** Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.** 2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se ocorre o invocado erro de julgamento que determinou a absolvição da instância por verificação da exceção de inimpugnabilidade autónoma do ato impugnado. 3. FUNDAMENTAÇÃO O despacho saneador/sentença objeto do presente recurso não selecionou qualquer matéria de facto e, porque o conhecimento da questão acima discriminada também não carece de tal seleção, passamos a transcrever o teor da decisão recorrida: «Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 89.º do CPTA e dos artigos 278.º, n.º 1, alínea e), e 576.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, a inimpugnabilidade do acto obsta ao prosseguimento do processo, conduzindo à absolvição da instância. Conforme resulta do disposto no artigo 51.º do CPTA, o conceito de acto contenciosamente impugnável pressupõe, para além da existência de um acto administrativo – ou seja, uma decisão de órgão da Administração que, ao abrigo de normas de direito público, vise produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta (artigo 120.º do Código do Procedimento Administrativo) -, a produção de efeitos externos, independentemente de se tratar de um acto propulsor do procedimento, uma decisão intermédia ou o acto final do procedimento, eficácia essa que é aferida em função do caso concreto. Vejamos. Sob a epígrafe “Correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis”, dispõe o artigo 64.º do CIRC, nos seus n.ºs 1 e 2 o seguinte: “1 — Os alienantes e adquirentes de direitos reais sobre bens imóveis devem adoptar, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, valores normais de mercado que não podem ser inferiores aos valores patrimoniais tributários definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto. 2 — Sempre que, nas transmissões onerosas previstas no número anterior, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinação do lucro tributável.” No entanto, nos termos do n.º 1 do artigo 139.º do mesmo Código, “O disposto no n.º 2 do artigo 64.º não é aplicável se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis.” Assim, no n.º 2 do artigo 64.º estabelece-se uma presunção a qual é susceptível de ser ilidida pelo sujeito passivo nos termos do disposto no artigo 139.º. Tal prova, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, “deve ser efectuada em procedimento instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente”, procedimento esse que se rege pelo disposto nos artigos 91.º e 92.º da Lei Geral Tributária, com as necessárias adaptações, sendo igualmente aplicável o disposto no n.º 4 do artigo 86.º da mesma lei – cfr. n.º 5. Tal significa – conforme já decidiu o Tribunal Central Administrativo Norte, no acórdão de 29.05.2014 proferido no processo n.º 01270/11.4BEPRT em termos com os quais se concorda pelo que se remete para a respectiva fundamentação – “que a lei equipara este procedimento ao pedido de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos, permitindo que na impugnação do acto tributário de liquidação (ou do acto de correcção do lucro tributável de que não resulta liquidação) sejam discutidas, não só as ilegalidades desse acto, como também todas as ilegalidades verificadas ao longo do procedimento do art. 129.º do CIRC, cerceando apenas essa possibilidade relativamente ao valor que tenha sido encontrado por acordo entre os peritos, tudo como decorre do princípio da impugnação unitária (O princípio da impugnação unitária, consagrado no art. 54.º do CPPT, significa que não são susceptíveis de impugnação contenciosa os actos interlocutórios do procedimento, a menos que exista disposição expressa em contrário ou que sejam actos imediatamente lesivos, sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final (geralmente, da liquidação) qualquer ilegalidade anteriormente cometida. (…).” No mesmo sentido, importa também considerar o disposto no n.º 7 do artigo 139.º, nos termos do qual “A impugnação judicial da liquidação do imposto que resultar de correcções efectuadas por aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º, ou, se não houver lugar a liquidação, das correcções ao lucro tributável ao abrigo do mesmo preceito, depende de prévia apresentação do pedido previsto no n.º 3, não havendo lugar a reclamação graciosa.” Ou seja, como também se escreve naquele acórdão, “o procedimento previsto no n.º 3 do art. 129.º do CIRC, que visa a demonstração pelo sujeito passivo de que o preço efectivamente praticado foi inferior ao VPT, constitui uma condição de procedibilidade da impugnação quando nesta se pretenda discutir o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis.” Por conseguinte, as ilegalidades do procedimento em só podem ser invocadas na impugnação judicial do acto de liquidação ou, não havendo lugar à liquidação, na impugnação do acto de correcção do lucro tributável, pelo que não podia a impugnante impugnar autonomamente a decisão da Administração Tributária que é objecto dos presentes autos. Atento o exposto, procede a excepção invocada, pelo que se absolve o réu da instância.». Sobre questão idêntica à colocada no presente recurso já se pronunciou este TCAN no acórdão de 27.10.2016, rec. 00735/12.5BEPRT, disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/3dbae5b8a58cd1658025808b0034fedf?OpenDocument, a cuja fundamentação integralmente aderimos e, por economia de meios, aqui passamos a reproduzir: «A questão colocada no recurso interposto pela Autora é a de saber se a decisão errou ao julgar que o acto que constitui o objecto da acção é insusceptível de impugnação contenciosa autónoma. Na decisão recorrida entendeu-se ser aqui de aplicar o Princípio da impugnação unitária em face da remissão feita pelo n.º 5 do artigo 139.º do CIRC para o n.º 4 do artigo 86.º da LGT que dispõe que “na impugnação do acto tributário de liquidação em que a matéria tributável tenha sido determinada com base em avaliação indirecta, pode ser invocada qualquer ilegalidade desta, salvo quando a liquidação tiver por base o acordo obtido no processo de revisão da matéria tributável regulado no presente capítulo”. Nessa sequência, o tribunal recorrido deu razão à Entidade Demandada, reconhecendo não caber no caso, como invocou na sua contestação, impugnação autónoma da decisão de indeferimento que recaiu sobre o pedido, apresentado pela aqui Autora, de prova do preço efectivo na transmissão de imóveis ao abrigo do artigo 139.º do CIRC. É contra esta decisão que a Autora, ora Recorrente, se insurge, advogando que nela se incorreu em erro de julgamento, nomeadamente, por desacertada interpretação do direito aplicável, na medida em que o acto de indeferimento em crise não pode deixar de qualificar-se como um acto lesivo dos seus direitos e interesses legítimos e, nessa medida, susceptível de reacção judicial autónoma. Sobre situação idêntica, decidiu já o STA, no seu Acórdão de 03/12/2014, proferido no âmbito do processo n.º 0881/12, que, pela sua pertinência e por facilidade, iremos reproduzir parcialmente, pois inexistem razões para nos afastarmos do aí decidido, tanto mais que já seguimos essa jurisprudência no Acórdão deste tribunal, de 26/02/2015, proferido no âmbito do processo n.º 01271/11.2BEPRT: “(…) Em causa está o pedido formulado pela Autora, ora Recorrente, de anulação do acto administrativo (em matéria tributária) de indeferimento de um recurso hierárquico, por si interposto, da decisão que recaiu sobre pedido de prova de preço efectivo na transmissão de imóvel. (…), de acordo com a decisão recorrida, «não havendo disposição legal expressa que estabeleça a impugnação de acto integrante do procedimento em causa - designadamente o acto de indeferimento de recurso hierárquico interposto da decisão proferida no âmbito do mesmo procedimento - o mesmo não consubstancia um acto destacável, não sendo, por isso, susceptível de impugnação contenciosa autónoma», considerando, ademais, que “a aplicabilidade do disposto no nº 4 do artigo 86º da LGT ao procedimento em causa (cfr. nº 5 do artigo 129º do CIRC) vem, aliás, reforçar esta mesma conclusão ao dispor que na impugnação do acto de liquidação pode ser invocada qualquer ilegalidade do procedimento que lhe esteve subjacente, o que nos leva a concluir que foi intenção do legislador manter, na matéria a que respeita os autos, o princípio geral da impugnação unitária.». Conclui-se, assim, na decisão recorrida, que se está «perante um acto interlocutório que não é imediatamente lesivo dos direitos do contribuinte nem pode ser impugnado autonomamente em virtude de inexistir disposição expressa nesse sentido, pelo que se trata de acto inimpugnável.». (…) Como se sabe, a determinação do valor patrimonial tributário dos imóveis, que é obtida através da fórmula prevista no artigo 38º e seguintes do Código do IMI, e que procura uma aproximação aos valores de mercado com vista a proporcionar maior equidade na tributação do património, tem importantes consequências a nível fiscal, designadamente a nível de tributação do rendimento, particularmente quando o valor de transacção do imóvel diverge do seu valor patrimonial tributário (VPT). Na verdade, pese embora não haja reflexos quando o valor efectivo da transmissão é maior que o valor patrimonial tributário (dado que é o valor efectivo da transmissão a base fiscal para o IMT, o IRS, e o IRC – cfr. arts. 12º do CIMT, 31º-A do CIRS e 58º-A do CIRC), já assim não acontece quando o valor efectivo da transmissão é inferior ao que posteriormente vier a ser fixado como VPT, com a agravante de que este valor patrimonial tributário definitivo pode ser apenas conhecido e/ou fixado num exercício fiscal diferente daquele em que a transmissão ocorreu. E essas consequências afectam tanto o alienante do bem como o seu adquirente, pois para além das consequências imediatas em sede de IMT e IMI, obrigam a ajustamentos fiscais no âmbito dos impostos sobre o rendimento das pessoas colectivas. Na verdade, o artigo 58º-A do CIRC (a que corresponde o actual artigo 64º após a republicação do Código operada pelo Dec. Lei nº 159/2009, de 13.07) dispõe do seguinte modo: 1 - Os alienantes e adquirentes de direitos reais sobre bens imóveis devem adoptar, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, valores normais de mercado que não poderão ser inferiores aos valores patrimoniais tributários definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto. 2 - Sempre que, nas transmissões onerosas previstas no número anterior, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinação do lucro tributável. 3 - Para aplicação do disposto no número anterior: a) O sujeito passivo alienante deve efectuar uma correcção, na declaração de rendimentos do exercício a que é imputável o proveito obtido com a operação de transmissão, correspondente à diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel e o valor constante do contrato; (nosso sublinhado) b) O sujeito passivo adquirente, desde que registe contabilisticamente o imóvel pelo seu valor patrimonial tributário definitivo, deve tomar tal valor para a base de cálculo das reintegrações e para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao mesmo imóvel. 4 - Se o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel não estiver determinado até ao final do prazo estabelecido para a entrega da declaração do exercício a que respeita a transmissão, os sujeitos passivos devem entregar a declaração de substituição durante o mês de Janeiro do ano seguinte àquele em que os valores patrimoniais tributários se tornaram definitivos. (nosso sublinhado) 5 - Relativamente ao adquirente, o disposto no número anterior não é aplicável quando se trate de correcção ao valor das reintegrações do imóvel, caso em que as relativas a exercícios anteriores serão consideradas como custo do exercício em que o valor patrimonial tributário se tornar definitivo. 6 - O disposto no presente artigo não afasta a possibilidade de a Direcção-Geral dos Impostos proceder, nos termos previstos na lei, a correcções ao lucro tributável sempre que disponha de elementos que comprovem que o preço efectivamente praticado na transmissão foi superior ao valor considerado. Donde resulta que a norma estabelece, como princípio base, que os vendedores e compradores de direitos reais de imóveis devem adoptar, nas suas transacções, valores de mercado que não poderão ser inferiores aos VPT definitivos que serviram de base à liquidação de IMT. Pelo que sempre que se verifiquem desvios negativos entre o valor declarado pelas partes e o respectivo valor patrimonial definitivo, será este o valor relevante para efeitos de determinação do lucro tributável. Por conseguinte, para determinação do lucro tributável referente às transacções de imóveis em sede de IRC, prevalece o VPT fixado para efeitos de IMT sobre o preço declarado da transacção, sempre que o primeiro seja superior ao segundo. A aplicação desta regra implicará, assim, em termos de imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas, e de forma necessária, a obrigação para o vendedor de efectuar uma correcção relativamente à declaração fiscal de rendimentos do exercício a que é imputável o proveito obtido com a transmissão (correcção correspondente à diferença entre o valor declarado e o VPT fixado), o que, na prática, envolve uma nova e imediata obrigação tributária de natureza contabilística e declarativa, e implicará, em princípio, uma mediata obrigação tributária de pagar mais imposto; por outro lado, para o comprador, as implicações traduzem-se no facto de ele poder considerar para efeitos fiscais o VPT fixado, o que, na prática, implicará um aumento das amortizações fiscais e um aumento da base fiscal do imóvel na sua futura venda. Em suma, a aplicação deste regime obriga os sujeitos passivos de IRC ao cumprimento (actual) de obrigações de natureza contabilística e declarativa, para além da eventual (futura) obrigação de entrega de imposto. Tratando-se, porém, de um preceito com a natureza de norma especial anti-abuso, que visa corrigir, para efeitos de determinação do lucro tributável, os valores de venda/aquisição dos imóveis, ela só pode operar na sequência de um procedimento legal tributário que possibilite a demonstração, perante a administração tributária, que os valores das transacções praticados foram efectivamente inferiores aos valores patrimoniais tributários respectivos. Razão por que foi instituída a possibilidade de os sujeitos passivos exibirem elementos de prova que comprovem que o valor declarado e registado na contabilidade é o verdadeiro preço de compra (no caso do comprador) e o verdadeiro preço de venda (no caso do alienante), em conformidade com o disposto no art. 129º do CIRC (a que corresponde o actual art. 139º após a republicação do CIRC operada pelo DL nº 159/2009), que reza assim: 1 - O disposto no n.º 2 do artigo 58º-A não é aplicável se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis. 2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o sujeito passivo pode, designadamente, demonstrar que os custos de construção foram inferiores aos fixados na portaria a que se refere o nº 3 do artigo 62º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, caso em que ao montante dos custos de construção deverão acrescer os demais indicadores objectivos previstos no referido Código para determinação do valor patrimonial tributário. 3 - A prova referida no nº 1 deve ser efectuada em procedimento instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente e apresentado em Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreram as transmissões, caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado, ou nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornou definitiva, nos restantes casos. 4 - O pedido referido no número anterior tem efeito suspensivo da liquidação, na parte correspondente ao valor do ajustamento previsto no nº 2 do artigo 58º-A, a qual, no caso de indeferimento total ou parcial do pedido, será da competência da Direcção-Geral dos Impostos. 5 - O procedimento previsto no nº 3 rege-se pelo disposto nos artigos 91º e 92º da Lei Geral Tributária, com as necessárias adaptações, sendo igualmente aplicável o disposto no nº 4 do artigo 86º da mesma lei. 6 - Em caso de apresentação do pedido de demonstração previsto no presente artigo, a administração fiscal pode aceder à informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes referente ao exercício em que ocorreu a transmissão e ao exercício anterior, devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização. (Redacção dada pelo art. 52º da Lei nº 53-A/2006 de 29/12). 7 - A impugnação judicial da liquidação do imposto que resultar de correcções efectuadas por aplicação do disposto no nº 2 do artigo 58º-A, ou, se não houver lugar a liquidação, das correcções ao lucro tributável ao abrigo do mesmo preceito, depende de prévia apresentação do pedido previsto no nº 3, não havendo lugar a reclamação graciosa (Redacção dada pelo art. 52º da Lei nº 53-A/2006 de 29/12). 8 - A impugnação do acto de fixação do valor patrimonial tributário, prevista no artigo 77º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e no artigo 134º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, não tem efeito suspensivo quanto à liquidação do IRC nem suspende o prazo para dedução do pedido de demonstração previsto no presente artigo. A lei criou, assim, um procedimento tributário em ordem a permitir ao sujeito passivo de IRC demonstrar que o preço efectivamente praticado é inferior ao VPT fixado e, assim, afastar a presunção resultante do referido artigo 58º-A do CIRC, procedimento que é instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente e apresentado no mês de Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreu a transmissão (caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado) ou nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornou definitiva (nos restantes casos) e que se rege «pelo disposto nos artigos 91º e 92º da Lei Geral Tributária, com as necessárias adaptações, sendo igualmente aplicável o disposto no nº 4 do artigo 86º da mesma lei» (nº 5 do art. 129º). Equiparou-se, assim, este procedimento àquele outro previsto nos artigos 91º e 92º da LGT (pedido de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos), constituindo tal procedimento uma condição necessária à abertura da via contenciosa (nº 7 do art. 129º). Ou seja, o procedimento que visa a demonstração, pelo sujeito passivo, de que o preço efectivamente praticado foi inferior ao VPT definitivamente fixado, constitui uma condição de procedibilidade da impugnação judicial quando nesta se pretenda discutir o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis. Posto isto, a questão que se coloca é a de saber se o sujeito passivo (no caso, o vendedor) pode ou não sindicar judicialmente, de forma imediata e autónoma, a decisão que lhe indefere o pedido de prova do preço efectivo no procedimento que instaurou para o efeito, ou se, pelo contrário, só pode atacar a legalidade dessa decisão na impugnação que deduza contra o acto tributário final – isto é, na impugnação do acto de liquidação de imposto que resultar das correcções efectuadas por aplicação do nº 2 do art. 58º-A, ou, se não houver lugar a liquidação de imposto, do acto de correcção ao lucro tributável efectuada ao abrigo do mesmo preceito legal. (…) Estabelece o artigo 54º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) que «1- Salvo quando forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente, não são susceptíveis de impugnação contenciosa os actos interlocutórios do procedimento, sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida.». Tal preceito consagra o denominado princípio da impugnação unitária, segundo o qual só é possível, em princípio, impugnar o acto final do procedimento, e não já os actos interlocutórios ou procedimentais, dado que só o acto final atinge ou lesa, imediatamente, a esfera jurídica do contribuinte, fixando a posição da administração tributária perante este e definido os seus direitos e obrigações. E dele resulta, ainda, que no contencioso tributário, ao contrário do que acontece actualmente no contencioso administrativo, o critério da impugnabilidade dos actos é o da sua lesividade imediata, ou seja, é a lesividade objectiva, imediata, actual, e não a lesividade meramente potencial. Na verdade, enquanto a partir da entrada em vigor do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e da opção legislativa materializada no nº 1 do seu artigo 51º, a lesividade imediata do acto administrativo deixou de constituir atributo da sua impugnabilidade, pois que deixou de se exigir que o acto tenha sido praticado no termo de uma sequência procedimental, passando essa impugnabilidade a depender somente da externalidade do acto, ou seja, da susceptibilidade de produzir efeitos jurídicos que se projectem para fora do procedimento onde o acto se insere (lesividade potencial), já no âmbito do contencioso tributário a impugnabilidade do acto continua a depender da sua lesividade imediata e actual, da produção de efeitos negativos imediatos na esfera jurídica do contribuinte, pela violação dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos. E porque é a esta luz que deve ser visto o princípio da impugnação unitária, inviabilizador da impugnabilidade dos actos procedimentais, compreende-se que ele só deva ceder naqueles casos em que (i) o legislador consagrou norma expressa em sentido contrário, ou naqueles casos em que (ii) se verifica a lesividade imediata do acto e em que, por isso, se torna imprescindível assegurar a tutela judicial efectiva em relação a esse tipo de acto, sendo que o conceito engloba apenas as situações de lesão imediata e actual, estando excluídas da garantia os actos cuja lesividade seja apenas potencial. Deste modo, e concluindo, os actos interlocutórios do procedimento tributário, sendo meramente instrumentais ou preparatórios da decisão final, ainda que ilegais, não são, em princípio, lesivos dos interesses do contribuinte, pois a sua situação tributária não fica com eles definida ou resolvida. Razão por que a sua ilegalidade só pode ser suscitada aquando da eventual impugnação deduzida contra o acto final lesivo. A menos que se trate (ii) de actos procedimentais cujo escrutínio judicial imediato e autónomo se encontre expressamente previsto na lei (os chamados “actos destacáveis”), que na falta de impugnação imediata se consolidam na ordem jurídica, ficando precludido o direito ou a faculdade processual de posteriormente discutir a sua legalidade e afastada a possibilidade de impugnar, com base na sua ilegalidade, a liquidação que desse acto partiu, ou (ii) de actos que, embora inseridos no procedimento e anteriores à decisão final, sejam imediatamente lesivos, abrindo-se então a possibilidade da sua impugnação imediata, sem prejuízo de a sua ilegalidade poder ainda ser suscitada na impugnação que venha a ser deduzida contra o acto final, pois que do art. 54º do CPPT não decorre a preclusão desse direito para os actos não destacáveis, e tal dimanar, similarmente, da regra contida no nº 3 do art. 51º do CPTA, de aplicação supletiva ao contencioso tributário. Em suma, havendo um acto imediatamente lesivo dos direitos do contribuinte, ainda que esse acto esteja inserido num dado procedimento e seja antecedente de uma decisão final, ele tem a faculdade de o impugnar autónoma e imediatamente, não ficando, todavia, limitado o seu direito de impugnar a decisão final. (…) Todavia, não se tratando de um acto previsto na lei como um acto destacável, a sua impugnabilidade contenciosa directa, imediata e autónoma, dependerá da sua qualificação como acto imediatamente lesivo. À primeira vista, essa decisão parece não constituir um acto imediatamente lesivo, por aparentemente não ser susceptível de provocar, por si, efeitos jurídicos negativos imediatos na esfera jurídica do sujeito passivo alienante do imóvel, a qual só seria atingida com o acto final de liquidação do imposto sobre o rendimento ou com o acto de correcção do lucro tributável no caso de não haver lugar a liquidação de imposto. Pelo que se compreende que, numa primeira leitura, se tenda a sustentar a posição sufragada na decisão recorrida. Importa, contudo, recordar o que acima deixámos referido no que toca às consequências fiscais da determinação do valor patrimonial tributário a nível de tributação do rendimento quando o valor de transacção do imóvel é inferior ao VPT definitivo. É que, nessa situação, nasce imediatamente para o vendedor a obrigação fiscal de efectuar a correcção dos rendimentos do exercício a que é imputável o proveito obtido com a transmissão (correcção correspondente à diferença entre o valor declarado e o VPT fixado), o que, na prática, envolve não só uma nova e actual obrigação contabilística como, também, uma nova e imediata obrigação declarativa, de apresentação de declaração Modelo 22 de substituição, independentemente de se vir ou não a constituir uma futura obrigação tributária de pagar mais imposto. E a falta de apresentação dessa declaração fiscal – que, no caso vertente, teria de ser feita logo no mês de Janeiro do ano seguinte àquele em que o VPT se tornou definitivo, caso não fosse instaurado o procedimento para prova do preço efectivo da transmissão, já que este tem efeito suspensivo sobre o procedimento para a liquidação do imposto na parte correspondente ao valor do ajustamento – acarreta mesmo a instauração de procedimento contra-ordenacional, com todos os efeitos nefastos daí decorrentes. Quer isto dizer que não só o acto de determinação do VPT definitivo do imóvel (que a lei considera destacável para efeitos contenciosos) como, também, o acto de indeferimento do pedido de prova do preço efectivo da transmissão desse imóvel, afectam, de forma actual e imediata, os direitos e interesses legalmente protegidos do sujeito passivo de imposto sobre o rendimento, e, por isso, torna-se imprescindível assegurar-lhe a tutela judicial efectiva em relação a este tipo de actos, com a possibilidade de impugnação autónoma e imediata, subtraída ao regime regra da impugnação unitária. Por conseguinte, é de considerar que ao sujeito passivo vendedor de imóvel assistem os seguintes meios contenciosos: (i) impugnação judicial do acto que fixou o valor patrimonial tributário do imóvel; (ii) acção administrativa especial para sindicar a legalidade do acto final do procedimento que instaurou com vista à prova do preço efectivo da transmissão; (iii) impugnação judicial do acto de liquidação de IRC que vier a resultar da aplicação do disposto no art. 58º-A do CIRC, sendo de notar que nela pode invocar qualquer ilegalidade ou erro praticado na liquidação ou no procedimento destinado à prova do preço efectivo, bem como recorrer a qualquer meio de prova adequado à demonstração do preço efectivamente praticado. (…)” O exposto é suficiente para decidir que a decisão recorrida não pode manter-se. Aceitando-se e concluindo-se, pois, pela sindicabilidade directa e autónoma do acto impugnado e, consequentemente, pela inerente impugnabilidade, verifica-se, assim, o alegado erro de julgamento na sentença recorrida, a clamar pela respectiva revogação e pela consequente baixa dos autos à instância a quo, para prossecução dos autos, se a tanto nada mais obstar – cfr. artigo 149.º, n.º 4 do CPTA.». No mesmo sentido, os acórdãos do TCAN de 29.05.2014, rec. 01270/11.4BEPRT e de 26-02-2015, rec. 01271/11.2BEPRT, disponíveis em www.dgsi.pt. Inexistindo qualquer razão válida para divergir do assim decidido, com base, aliás, em douta jurisprudência do STA, concluímos como no citado aresto. 4. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso interposto pela Autora, revogar a decisão recorrida, determinando-se a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, para prosseguimento da ação, se a tal nada mais obstar. Custas a cargo do Recorrido, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do CPC. Porto, 27.10.2021 Maria do Rosário Pais Tiago Afonso Lopes de Miranda Cristina da Nova |