Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00490/15.7BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 03/21/2025 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | RICARDO DE OLIVEIRA E SOUSA |
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Descritores: | CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL; ARTIGO 49.º, N.º 2, ALÍNEA A) DO CCP; MENÇÃO “OU EQUIVALENTE”; PRINCÍPIO DA BOA-FÉ E DA CONFIANÇA; |
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Sumário: | I- O artigo 49º, n.º 2, alínea a) do CCP, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, estabelecia expressamente que as especificações técnicas devem ser fixadas por referência a normas nacionais que transponham normas europeias, homologações técnicas europeias, especificações técnicas comuns, normas internacionais ou outros sistemas técnicos de referência estabelecidos pelos organismos europeus de normalização, "devendo cada referência ser acompanhada da menção “ou equivalente”. II- A ratio legis deste preceito é clara e inequívoca: garantir que os procedimentos de contratação pública não sejam restritivos da concorrência, assegurando a todos os operadores económicos a possibilidade de apresentar soluções técnicas equivalentes às expressamente referidas no caderno de encargos. III- Não oferecendo controvérsia que o Caderno de Encargos fazia referência à norma EN 840 e à marca RAL GZ 951/1, contudo, sem mencionar a possibilidade de apresentação de soluções equivalentes, deve entender-se que tal omissão viola o disposto no artigo 49.º, n.º 2, alínea a), do Código dos Contratos Públicos, independentemente do grau de conhecimento ou disseminação destas normas no mercado relevante. IV- Não se pode obter, por via da proteção que é conferida pelos princípios da boa-fé, da justiça e da proteção da confiança, uma solução para uma situação jurídica ilegal.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte - Secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos: * * I – RELATÓRIO 1. [SCom01...], E.E.M [doravante [SCom01...]], Autora nos presentes autos de AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL em que é Ré a AUTORIDADE DE GESTÃO DO PROGRAMA OPERACIONAL TEMÁTICO VALORIZAÇÃO DO TERRITÓRIO [doravante POVT] e Contrainteressados o INSTITUTO FINANCEIRO PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL, I.P. e o MINISTÉRIO DA ECONOMIA, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada pelo T.A.F. do Porto, que julgou a presente ação totalmente improcedente, e, em consequência, absolveu a Ré e os Contrainteressados do pedido. 2. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) A. A sentença recorrida, que absolve o Réu do pedido, resulta de uma errónea interpretação e aplicação i) do artigo 49.º n.º 2 alínea a) do CCP (que conduz depois a um erro de julgamento quanto à apreciação e notação das propostas), na redação anteriormente conferida pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, e ii) do artigo 10.º do CPA. B. Considerou o Tribunal a quo que o artigo 28.º do Caderno de Encargos do Concurso Público em apreço violou o artigo 49.º, n.º 2, al. a) do CCP ao prever que “os contentores devem respeitar a norma EN 840” e que deviam “verificar os requisitos da Marca de Qualidade RAL GZZ 951/1” sem que, contudo, fosse prevista a expressão “ou equivalente”. C. O artigo 49.º do CCP, sob a epígrafe “especificações técnicas”, visa a salvaguarda dos princípios da livre concorrência, da igualdade de tratamento e da transparência no âmbito da contratação pública, pelo que se proíbe que as peças do concurso contenham especificações técnicas com referências a determinado fabricante, processo específico, marca ou patentes e, dessa forma, desfavoreça ou elimine determinados operadores económicos ou determinados produtos . D. A anterior redação do artigo 49.º n.º 2, al. a) consagrava que se deveria prever no caderno de encargos a expressão “ou equivalente” quando eram descritas as especificações técnicas, genéricas ou específicas, o que não sucede neste caso. E. Contudo, não basta, por si só, alegar a ausência da expressão “ou equivalente” para que se possa afirmar a existência da violação do artigo 49.º, n.º 2, al. a) do CCP, sendo necessário demonstrar que a entidade Adjudicante prejudicou e limitou os concorrentes no acesso e avaliação no âmbito do concurso público. F. O normativo comunitário EN 840, definido pela Comissão Europeia, possibilita a clarificação dos potenciais concorrentes no que concerne ao fornecimento de equipamentos e veículos para recolha de resíduos, especificando as dimensões, forma e design que os contentores de resíduos devem apresentar. G. Tal especificação técnica, conhecida pelos proponentes que operam no mercado dos resíduos, não se reporta, em específico, a nenhuma marca, produtor ou patente. H. Esta especificação técnica não é limitativa da livre concorrência e, por conseguinte, violadora do disposto no artigo 49.º, n.º 2, al. a) do CCP só pelo simples facto de não existir a previsão da expressão “ou equivalente”. I. A aposição da expressão “ou equivalente” releva-se, no que a este ponto diz respeito, completamente inócua e desvirtuada de qualquer utilidade, uma vez que está em causa um padrão generalizado e comum para os concorrentes que operam neste mercado. J. A marca de qualidade RAL GZ 951/1 refere-se à qualidade do plástico dos contentores de resíduos e a sua referência no caderno de encargos foi com o intuito de transmitir aos Concorrentes que a entidade adjudicante não se referia a uma marca de qualidade em específico, mas sim, a um conjunto de determinadas características que o plástico dos contentores deveria apresentar. K. O concorrente que apresentou uma proposta com diferente certificação de qualidade de plástico daquela que constava do caderno encargos, não foi excluído, nem isso teve qualquer implicação na avaliação do Concorrente. L. Contrariamente ao que refere a sentença recorrida, a Concorrente n.º 3 ([SCom02...]) não obteve a pontuação de três pontos por não apresentar o certificado RAL GZ 951/1 para os seus contentores, mas antes por não ter apresentado qualquer tipo de certificado, nem da RAL GZ 951/1 nem de qualquer outra marca de qualidade, para alguns dos contentores enunciados na sua proposta. M. Ao decidir que a Concorrente [SCom02...] foi prejudicada em virtude de os seus contentores não apresentarem um certificado RAL GZ 951/1, a sentença proferida pelo tribunal a quo é injusta, faz um interpretação e aplicação errada do artigo 49.º, nº al. a) do CCP e enferma de erro de julgamento quando subsume os factos ao direito, fazendo uma inapropriada valoração dos factos dados como provados na alínea F). N. A proposta que não apresentasse os requisitos (isto é, os certificados EN 840 e RAL GZ 951/1), mas que justificasse, de forma adequada e suficiente, que os equipamentos apresentados satisfariam, de modo equivalente, as exigências definidas no caderno de encargos, não foi, de modo algum, prejudicada. O. Note-se que a Concorrente [SCom03...] e a [SCom04...] apresentaram para todos os seus contentores certificados RAL GZ951/1, tendo o júri do concurso atribuído a ambas as Concorrentes a pontuação de 4 pontos. P. A Concorrente [SCom05...] apresentou para os seus contentores certificados da marca de qualidade TUV GS, tendo o júri do concurso atribuído, igualmente, a pontuação de 4 pontos. Q. A pontuação atribuída à [SCom05...], à [SCom03...] e à [SCom04...] foi igual, não obstante a Concorrente [SCom05...] apresentar um certificado de qualidade diferente daquele que era referido no caderno de encargos. R. Pelo exposto, não obstante a ausência da expressão “ou equivalente” no caderno de encargos - tratando-se de uma questão meramente formal e inapta a, de per si, produzir efeitos negativos na esfera jurídica dos Concorrentes -, certo é que Recorrente não restringiu o acesso de potencias Concorrentes ou prejudicou a avaliação das propostas sujeitas à avaliação do júri. S. Tal como resulta da alínea I) dos factos dados como provados da sentença recorrida, o Tribunal de Contas, em sede de fiscalização prévia, não evidenciou a existência de nenhuma irregularidade no que concerne ao cumprimento do artigo 49.º, n.º 2, al. a) do CCP, porque, efectivamente, a mesma não existe. T. E não se diga que o Tribunal de Contas é alheio a esta fiscalização. Como ensina a doutrina administrativista nesta matéria, em comentário anotado ao novo artigo 49º do CCP “a inclusão no caderno de encargos de menções que contrariem o estabelecido neste preceito constitui um erro que, a não ser corrigido nos termos do artigo 50º, afeta a validade do procedimento, como tem decidido o Tribunal de Contas” . U. A sentença recorrida invoca, erradamente, que a actuação da Recorrida pautou-se pelo estrito cumprimento do princípio da legalidade, prevalecendo este princípio sobre qualquer outro, não podendo um eventual acto ilegal da Administração “transmutar” num acto legal em virtude do princípio da boa fé . V. O princípio da boa fé é assumido como o parâmetro norteador da conduta administrativa e contribui, em todas as suas vertentes, para a densificação do princípio da juridicidade. W. O Tribunal de Contas, com competência para fiscalizar a legalidade e o cabimento orçamental de actos e contratos que geram despesa, ao comunicar de forma clara que um determinado contrato podia ser executado, gerou na Recorrente um sentimento de confiança de que aquele procedimento era conforme à lei. X. Devidamente ponderada e analisada a situação em crise, torna-se inquestionável que a confiança gerada na Recorrente, confortada pela sindicância positiva do Tribunal de Contas ao contrato, foi naturalmente decisiva para a execução do fornecimento e para a contratação da despesa em causa. Y. Assim, ao contrário do entendimento sufragado na sentença recorrida, “deve entender-se que princípios como o da justiça – e da boa-fé - são aplicáveis mesmo no exercício de poderes vinculados, sobrepondo-se a outros deveres legais (cfr. por todos, o ac. do STA, de 25/6/2008, rec. nº 0291/08).” Z. Pelo que, o acto administrativo impugnado viola grosseiramente o artigo 10.º do CPA, sendo em virtude disso, ilegal, tendo como natural cominação a sua anulação. AA. Pelo exposto, deverá ser revogada a sentença recorrida e ser a ação administrativa especial julgada procedente, com todas as consequências legais daí decorrentes (…)”. * 1.ª O presente recurso vem interposto da mui douta Sentença proferida pelo TAF do Porto, em 15.07.2019, que julgou totalmente improcedente a ação administrativa especial, absolvendo a R. e os contrainteressados dos pedidos de declaração de nulidade ou anulação do ato impugnado (decisão da AG/POVT, no âmbito da operação n.º POVT-120660-COES-000043) e de condenação da R. na prática o ato devido, ie. de serem consideradas totalmente elegíveis as despesas corrigidas em 5%, por aquela decisão impugnada; 2.ª Fundamenta a Recorrente as suas alegações de recurso em invocado erro de julgamento de Direito, pelo Tribunal a quo, quanto à interpretação e aplicação do violado art.º 49.º, n.º 2, al. a) do CCP, por entender que, no caso em concreto, a ilegalidade cometida não teve um impacto negativo nas avaliações das concorrentes, sendo a exigência da menção “ou equivalente” daquele normativo “uma questão meramente formal e inapta”; 3.ª Defende ainda a Recorrente que o ato impugnado deveria ter sido anulado, por violação dos princípios da boa-fé e da confiança, previstos no art.º 10.º do CPA - atento o “sentimento de confiança de que aquele procedimento era conforme à Lei.” que derivou da concessão de visto pelo Tribunal de Contas, em sede de fiscalização prévia - devendo tais princípios sobrepor-se ao princípio da legalidade, que pautou a atuação da Recorrida; 4.ª Salvo o devido, não se poderá concordar com tal entendimento, já que resultou provado, cfr. pontos C) e G) da fundamentação de facto da Sentença recorrido, que a Recorrente exigiu, na cláusula 28.ª do Caderno de Encargos do procedimento sub iudice, especificações técnicas a cumprir - de “respeitar a norma EN 840” e “verificar os requisitos da marca de qualidade RAL GZ 951/1” - sem a inclusão da expressão “ou equivalente”, em clara violação do art.º 49.º, n.º 2, al. a) do CCP e do art.º 23.º, n.º 3, al. a) da Diretiva 2004/18/CE; 5.ª Tal exigência legal, como bem fundamenta a Sentença recorrida ““visa a salvaguarda dos princípios da livre concorrência, da igualdade e da não discriminação, como é declarado no seu n.º 1 e a seguir vai ser referido. A inclusão no caderno de encargos de menções que contrariem o estabelecido neste preceito constitui um erro que, a não ser corrigido nos termos do artigo 51.º afeta a validade do procedimento”, concretizando-se que “A elaboração das cláusulas técnicas dos cadernos de encargos, mormente na parte especial, implica, portanto, o recurso a especificações técnicas que, como se referiu, serão cláusulas da execução do contrato. Neste artigo, estabelece-se restrições à inclusão no caderno de encargos de especificações técnicas, proibindo as que, pela sua natureza, possam ter um efeito discriminatório e, portanto, impeditivo do livre acesso aos procedimentos adjudicatórios, prejudicando, consequentemente, a concorrência (…)”, cfr. supra exposto no ponto 12; 6.ª Ao contrário do que a Recorrente quer fazer crer, a verificação de tal violação não se limita à verificação da existência de um impacto negativo na avaliação das propostas apresentadas no âmbito do procedimento contratual sub iudice, bastando que exista, objetivamente, a criação de obstáculos injustificados à abertura dos contratos públicos à concorrência, o que se verifica, desde logo, aquando do lançamento deste procedimento contratual; 7.ª Estando ainda em causa, não só a violação da concorrência dos interessados em concorrer, como também dos próprios fornecedores dos produtos em causa, impedindo-se a realização do mercado único de bens e serviços no espaço europeu, tal como resulta do douto Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 25.10.2018 “Roche Lietuva”, UAB, Proc. N.º C-413/17, supra citado no ponto 16.; 8.ª Por outro lado, a Recorrente pugna com base em entendimentos errados, já que, em primeiro lugar, não é por uma determinada especificação técnica decorrer de um “padrão europeu” que a Entidade Adjudicante fica dispensada de dar cumprimento ao disposto nos mencionados artigos, tal como resulta diretamente da letra da Lei plasmada no art.º 49.º, n.º 2, al. a), que inclui, expressamente, a referência a normas, homologações técnicas ou quaisquer outros referenciais técnicos europeus; 9.ª Por outro lado, ainda que, no caso sub iudice, não ocorresse uma exclusão de propostas, servindo tais especificações técnicas somente como fator de avaliação das mesmas, referente à “Valia técnica dos contentores”, tal não impede que tenha, efetivamente, ocorrido uma restrição à concorrência, tal como ilustra o douto Acórdão do TCAN, de 18.03.2016, Proc. N.º 03536/14.2BEPRT, que decidiu: “Estando vedada legalmente a possibilidade de fixar especificações técnicas que façam referência a um fabricante, tal, necessariamente e por idêntica razão, abrangerá as situações em que as especificações técnicas de um determinado produto são “desdobradas”, em fatores e subfatores a serem apreciados no procedimento, o que se consubstancia numa escolha final meramente “fotográfica””; 10.ª No caso sub iudice, a restrição da concorrência ocorre ao nível do mercado (nacional e comunitário), durante o período de apresentação de propostas, no âmbito dos operadores económicos que operam na área de negócio do “fornecimento de contentores para resíduos urbanos”, já que muitas empresas podem, objetivamente, ter sido dissuadidas de apresentar proposta, por não disporem de tais especificações técnicas, não lhes sendo permitido (porque não previsto no Caderno de Encargos) apresentar soluções que satisfizessem, de modo equivalente, tais exigências; 11.ª Acresce que, mesmo ao nível das concretas propostas que foram apresentadas no procedimento, a exigência daquelas especificações técnicas teve impacto na classificação das propostas e, por consequência, na adjudicação do contrato, já que como resultou provado dos ponto F) da e G) da fundamentação de facto da Sentença recorrida, a concorrente [SCom02...], pese embora apresentasse o preço mais baixo, foi classificada em segundo lugar, sendo referido no Relatório Final que “o júri mantém a apreciação, constante do relatório preliminar, de que não são apresentados os certificados RALGZ951/1 para todos os contentores”; 12.ª Não resultando provado em primeira instância que a entidade adjudicante tenha dado a possibilidade de que as concorrentes pudessem justificar a existência de especificações técnicas equivalentes, ficando, portanto, ao total arbítrio daquela entidade tal apreciação – o que, de resto, não teria qualquer significância, já que é o Caderno de Encargos, que fixa as obrigações contratuais a cumprir, quer pela entidade adjudicante, quer pela adjudicatária, não prevendo o mesmo tal possibilidade; 13.ª Deste modo, verificou-se um notório desrespeito pelas normas nacionais e comunitárias em matéria de contratação pública, pela entidade adjudicante, o que consubstancia uma violação das obrigações a que a Recorrente se vinculou pelo “Contrato de Financiamento no âmbito do Programa Operacional Regional Norte” celebrado em 27.08.2010, mormente pela cláusula 6.ª, al. n), o que provocou a correção financeira em causa, de acordo com a al. v) da referida cláusula 6.ª daquele contrato, cfr. pontos B) e K) da fundamentação de facto da Sentença recorrida, em estrito cumprimento vinculado do princípio da legalidade, cfr. art.ºs 266.º, n.º 1 e 2 da CRP e art.º 3.º do CPA; 14.ª Mais se diga que a tese da Recorrente, relativamente à suposta confiança gerada pela obtenção de visto em sede de fiscalização prévia pelo Tribunal de Contas, antes da auditoria, é completamente infundada, já que aquela bem sabia que as irregularidades poderiam ser detetadas posteriormente, tal como resulta da “adenda” àquele Contrato de Financiamento, motivada pela reprogramação técnica dos programas, mormente do seu ponto 7, cfr. ponto K) da fundamentação de facto da Sentença recorrida; 15.ª Por outro lado, a Recorrente opera uma total confusão entre as competências e o âmbito de atuação das entidades em causa e na errada ideia de que a concessão de visto por aquele Tribunal de Contas importaria a convolação de um ato ilegal (praticado pela Recorrente) num ato legal, o que não é aceitável; 16.ª Ora, o Tribunal de Contas, enquanto Tribunal de competência especializada em matéria financeira, exerce controlo financeiro a vários níveis, constituindo fundamento para a recusa de visto a ilegalidade dos atos que implique nulidade, encargos sem cabimento em verba orçamental própria ou violação direta de normas financeiras e a ilegalidade que altere ou possa alterar o respetivo resultado financeiro; já a AG/POVT (atualmente AG/POSEUR) prossegue atribuições muito específicas confiadas pelo Regulamento Geral do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e do Fundo de Coesão (cfr. al. i) e k) do n.º 1 do art.º 19.º), pelo Regulamento (CE) n.º 1083/2006 (cfr. al. a) e b) do art.º 60.º e n.º 2 do art.º 98.º) e pelo DL. n.º 312/2007, de 17.09 (cfr. al. f) do n.º 1, do art.º 45.º e al. b) do art.º 19.º), no âmbito das quais se contempla a obrigação de a mesma assegurar o cumprimento das normas comunitárias e nacionais aplicáveis em matéria de atribuição de fundos comunitários em matéria de contratação pública; 17.ª Não restam, portanto, dúvidas quanto ao facto de as referidas entidades terem âmbitos de atuação distintos, não podendo a atuação do Tribunal de Contas condicionar a atuação do POVT, isto, sem prejuízo da concessão de visto pelo Tribunal de Contas ser tida em conta pela AG/POVT como um elemento de instrução do procedimento, aquando da análise da legalidade deste, não resultando, porém, de qualquer normativo, a obrigatoriedade de secundar o entendimento desse Tribunal, cfr. entendimento do douto Acórdão do TCA Norte, proc. N.º 2350/11.1BEPRT, de 28.06.2018, supra citado no ponto 52.; 18.ª Pelo que, detetada a ilegalidade supra descrita, em auditoria ao procedimento contratual sub iudice, não restou outra alternativa à AG/POVT, a não ser aplicar a correção financeira, em estrito cumprimento dos normativos supra referidos, “proferido ao abrigo de poderes estrita e legalmente vinculados, isto é, sem qualquer margem de livre apreciação (…)”, nas palavras da Sentença recorrida, a pp. 31; 19.ª Um almejado princípio da confiança que a Recorrente pretende aplicar, infundadamente, à atuação do Tribunal de Contas, jamais poderá colher, já que um ato ilegal não perde os seus vícios, nem com o passar do tempo, nem através da atuação de um outro ente, de outra jurisdição e que afere parâmetros distintos da AG/POVT; 20.ª Pelo contrário, o princípio da legalidade, trave-mestra da atuação da Administração, cfr. art.º 266.º, nºs. 1 e 2 da CRP e art.º 3.º do CPA, ditou que a Recorrida, no exercício de poderes vinculados, aplicasse a correção financeira em causa, em respeito e subordinação à Lei, com o objetivo primordial de prossecução do interesse público. Vide nestes termos o citado Acórdão do TCA Sul, de 18.10.2001, Proc. n.º 01188/98, e ainda o douto Acórdão do TCA Norte, referido na Sentença recorrida, Processo n.º 00203/12.5BECBR, de 23.11.2018 supra citados nos pontos 65. e 66.; 21.ª Nestes termos, conclui-se que a Recorrida pautou a sua atuação com base no estrito cumprimento da legalidade, quer nacional, quer comunitária, sendo o ato administrativo impugnado de aplicação de correção financeira totalmente conforme à Lei e válido, devendo improceder as alegadas violações ao princípio da confiança ou boa-fé, bem sabendo a Recorrente, tal como sempre admitiu que, ao fixar as especificações técnicas sem possibilidade de equivalência, desrespeitou diretamente o CCP, devendo improceder o recurso interposto pela Recorrente e manter-se a Sentença do Tribunal a quo (…)”. * * 5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito vertido no n.º1 do artigo 146.º do C.P.T.A. * 6. Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta. * * * II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR 7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA. 8. No contexto assinalado, a questão essencial a dirimir consiste em determinar se a sentença objeto de recurso enferma de erro de julgamento de direito, por “(…) errónea interpretação e aplicação i) do artigo 49.º n.º 2 alínea a) do CCP (que conduz depois a um erro de julgamento quanto à apreciação e notação das propostas), na redação anteriormente conferida pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, e ii) do artigo 10.º do CPA (…)”. 9. É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar. * * III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 10. O quadro fáctico apurado na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(...) A) A Autora apresentou candidatura ao Programa Operacional Regional do Norte, a qual deu origem à operação NORTE-09-0160-FEDER-000001 “Contentorização da recolha selectiva e indiferenciada”, que mereceu decisão favorável de financiamento da Comissão Diretiva do Programa Operacional Regional [cf. fls. 12 a 21 do processo administrativo] em 15 de Julho de 2010 [cf. cláusula segunda do contrato cuja cópia se encontra em documento n.º 2 da petição inicial a fls. 23-28 dos autos (suporte físico) e formulário a fls. 1-11 do processo administrativo]; B) Com data de 27 de Agosto de 2010, entre o Programa Operacional Regional do Norte e a Autora foi celebrado um escrito designado de “Contrato de Financiamento no âmbito do Programa Operacional Regional do Norte” para a realização da operação com o Código NORTE-03-0360-FEDER-000001, designada por "Contentorização da recolha selectiva e indiferenciada", do qual consta, além do mais, o seguinte [cf. cópia em documento n.º 2 junto com a petição inicial e fls. 12-21 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]: “(…) Cláusula Sexta - (Obrigações do Beneficiário) O Beneficiário obriga-se a: (…) n) cumprir os normativos legais em matéria de contratação pública aplicáveis, evidenciando, claramente, a articulação entre a despesa declarada e o processo de contratação publica respetivo”; o) cumprir os normativos nacionais e comunitários em matéria de ambiente, igualdade de oportunidades, concorrência; (…) v) proceder à restituição dos montantes indevidamente pagos ou não justificados, que sejam objeto de correção financeira decidida pelas autoridades nacionais e comunitárias competentes, de acordo com a notificação formal de constituição de divida que identificará o montante a restituir, o respectivo prazo e a fundamentação da decisão, incluindo a aplicação de juros de mora e de juros compensatórios. (…) 3. O incumprimento das obrigações previstas nos números anteriores determina a suspensão de todos os pagamentos de comparticipação comunitária ao beneficiário no âmbito deste Programa, até à regularização da situação, salvo nos casos em que a eventual fundamentação invocada venha a ser aceite pela Autoridade de Gestão. (…)” C) Nessa sequência, por anúncio de procedimento n.º 4331/2010, publicado no DR II Série, n.º 185, de 22 de Setembro de 2010 e anúncio n.º 2010/S 185-282522, publicado no JOUE, n.º 185/2010, de 23 de Setembro de 2010, a Autora procedeu ao lançamento de um Concurso Público com publicidade internacional, com vista à “contratação do fornecimento de contentores para resíduos urbanos”, sendo o preço base de € 2.000.000,00 [cf. Anúncio em fls. 165-169 do processo administrativo, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]; D) Do programa do procedimento melhor identificado na alínea antecedente, consta, além do mais, o seguinte [cf. fls. 139-156, maxime fls. 150 do processo administrativo]: “(…) artigo 17.º - critério de adjudicação 1- A adjudicação é feita segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, tendo em conta os seguintes factores e respectivos pesos: a) Preço (F1) – 50 % b) Valia Técnica dos contentores (F2) – 30 % c) Prazo de garantia dos equipamentos (F3) – 20 % (…)” E) Do caderno de encargos do procedimento pré-contratual melhor identificado nas alíneas antecedentes, consta além do mais, o seguinte [cf. fls. 118-135, maxime fls. 122 do processo administrativo, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]: “(…) Cláusula 28.ª – Características dos contentores Os contentores devem respeitar a norma EN 840 Os contentores devem verificar os requisitos da marca de qualidade RAL GZ 951/1 O corpo do contentor deve dispor de uma aba que acompanhe a tampa, pelo interior para evitar a entrada de água 4- Os eixos de abertura das tampas deverão ser suficientemente resistentes assim como os seus encaixes, de forma a evitar fraturas ou danos ocasionais (…)” F) Em 3 de Março de 2011, o júri do procedimento de concurso público identificado nas alíneas antecedentes reuniu e elaborou o relatório preliminar de análise de propostas, do qual se destaca, além do mais, o seguinte [cf. fls. 174-186, máxime fls. 178 do processo administrativo]: “(…) Proposta n.º 1 – [SCom05...] (…) Os contentores propostos respeitam a Norma EN 840, requerida no Caderno de Encargos, não apresentando contudo os certificados RAL GZ 951/1. São apresentados certificados emitidos pela TUV. Pontuação da proposta: 4,00 (…) Proposta n.º 3 –[SCom02...] (…) Os contentores propostos respeitam os requisitos da norma EN 840, requerida no caderno de encargos não apresentando contudo os certificados RAL GZ 951/1 para todos os contentores. Pontuação da proposta: 3,00 (…) ” G) Em 26 de Abril de 2011, o júri do procedimento de concurso público reuniu e deliberou elaborar o relatório final, do qual se destaca, além do mais, o seguinte [cf. fls. 187-193 do processo administrativo, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]: “(…) analisada atentamente a exposição do concorrente n.º 3 – [SCom02...], o júri conclui que a argumentação apresentada em nada contraria o apresentado no relatório preliminar quanto à apreciação da proposta do concorrente em causa em relação ao factor “valia técnica dos contentores”, excepto no que se refere à certificação RALGZ951/1 para todos os contentores. Sob este aspeto, o concorrente afirma na sua pronúncia que, contrariamente referido no relatório preliminar, a sua proposta apresenta os certificados RALGZ951/1 para todos os contentores e anexa cópia dos originais e respetivas traduções da documentação comprovativa inserida na proposta. Reanalisada tal documentação o júri mantém a apreciação, constante do relatório preliminar, de que não são apresentados os certificados RALGZ951/1 para todos os contentores, dadas nomeadamente as datas de validade ultrapassadas da documentação apresentada relativa aos contentores de 240L e de 360L. Pelas razões aduzidas não se considera qualquer pertinência na pretensão apresentada na pronúncia do concorrente n.º 3 –[SCom02...] para a alteração da pontuação da sua proposta no factor “valia técnica dos contentores” e consequentemente na sua classificação final Conclusão Considera o júri que, da ponderação das observações efetuadas pelo concorrente n.º 3 –[SCom02...] proferidas ao abrigo do direito de audiência prévia, e pelo acima exposto, é de manter o teor e as conclusões do relatório preliminar, do qual se extrai a seguinte ordenação das propostas:
(…)” H) Em 26 de Abril de 2011, o Conselho de Administração da Autora reuniu e deliberou aprovar a adjudicação do referido fornecimento de contentores para resíduos urbanos à sociedade [SCom03...], S.A., pelo preço de € 1.593.816,50, tendo o respectivo contrato sido celebrado em 18 de Julho de 2011 [cf. contrato em fls. 200-211 do processo administrativo; admissão por acordo]; I) Por ofício de 2 de Setembro de 2011, emitido pela Auditora-Coordenadora da Direcção-Geral do Tribunal de Contas com a referência DECOP/UAT/7285/2011 relativamente ao processo n.º 1244/2011 foi comunicado à Autora o seguinte [cf. cópia em fls. 75 dos autos (suporte físico) e fls. 243 do processo administrativo, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]: “(…) Tendo sido objecto de declaração de conformidade, devidamente homologada pelos Juízes de turno da 1.ª Secção do Tribunal de Contas, em 15 de Setembro de 2011, nos termos do art. 84.º da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto, tenho a honra de enviar a V. Exa. o (s) adjunto (s) processo (s) registado (s) nesta Direcção-Geral sob os números acima indicado (s). São devidos emolumentos nos termos dos art°s. 5.º a 7.º do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas, anexo ao Decreto-Lei n.º 66/96, de 31 de Maio, no montante referido no documento de cobrança que junto se envia. Chama-se a atenção de V. Exa. de que nos termos dos n.ºs 2 e 3 do art. 7.º do referido diploma não poderão ser feitos quaisquer pagamentos dos actos ou contratos objecto de fiscalização prévia sem que se mostrem pagos os correspondentes emolumentos, sendo as autoridades ou funcionários que autorizem os mesmos solidariamente responsáveis pelo pagamentos dos emolumentos em falta (…)” J) Em 11 de Setembro de 2013, na sequência da reprogramação aprovada pela Decisão da Comissão C (2012) 9229 de 10 de Dezembro de 2012, a Comissão Diretiva do POVT reuniu e deliberou aprovar a operacionalização da reprogramação técnica dos Programas Operacionais do QREN, nos termos previstos no artigo 33.º do Regulamento (CE) n.º 1083/2006, tendo a Operação aqui em análise assumido o código POVT-12-0660-FCOES-000043 [cf. decisão da comissão em fls. 76-87 e ata em fls. 111-112 do processo administrativo]: K) Com data de 18 de Novembro de 2013, entre o Réu e a Autora foi celebrada uma “adenda” ao contrato de financiamento melhor identificado em B), da qual consta, além do mais, o seguinte [cf. adenda em fls. 116-117 do processo administrativo]: “ (…) a operação identificada no ponto 1.º foi objeto de transição entre o Programa Operacional Regional do Norte e o Programa Operacional Valorização do Território, na sequência das reprogramações do Programa Operacional Valorização do Território (Decisão 9229, de 10 de Dezembro de 2012) e do Programa Operacional Regional do Norte (Decisão 9000, de 10 de Dezembro de 2012), tendo nesta conformidade a Comissão Diretiva do Programa Operacional Valorização do Território deliberado aprovar a transição da operação (…) a Autoridade de Gestão do Programa Operacional Valorização do Território reserva-se o direito de aplicar à referida operação correções financeiras que decorram de eventuais irregularidades, nos termos das orientações comunitárias e nacionais em vigor (…)” L) No âmbito das linhas de orientação estabelecidas pelo Ministro Coordenador da Comissão Ministerial de Coordenação QREN, detalhadas no documento elaborado pelo IFDR sobre a reprogramação técnica dos PO QREN designado de “Reprogramação dos P0 FEDER e Fundo Coesão- Fundamentos, objetivos e medidas” de 18 de Maio de 2011, é referido que a Autoridade de Gestão deve confirmar se estão reunidas todas as condições de aceitabilidade e de admissibilidade e demais termos previstos nos Regulamentos específicos enquadradores, assim como deve proceder a confirmação e validação da despesa já validada pela AG do PO de origem [cf. fls. 22-61 do processo administrativo]; M) Em 10 de Dezembro de 2013, no âmbito de uma auditoria realizada pela Sociedade de Revisores Oficiais de Contas [SCom07...] a operações cofinanciadas e transitadas de outros Programas Operacionais para o POVT, o Réu comunicou à Autora a seleção de projectos para a verificação da regularidade e legalidade das operações [cf. cópia do contrato com a SROC em documento n.º 1 da contestação e ofício de fls. 247 do processo administrativo]; N) Na sequência da auditoria identificada na alínea antecedente, os serviços do Réu desencadearam o processo de verificação da elegibilidade das despesas no que diz respeito ao cumprimento das regras comunitárias e nacionais de contratação pública relativamente ao Concurso Público com publicidade internacional descrito na alínea C) [cf. relatório de fls. 248 a 363 do processo administrativo]; O) Com data de 19 de Dezembro de 2013, a Comissão Europeia proferiu a decisão C (2013) 9527 final mediante a qual se estabeleceu em anexo as orientações para a determinação das correções financeiras a introduzir nas despesas financiadas pela União em regime de gestão partilhada, para os períodos de programação de 2007-2013 e 20142020, em caso de incumprimento das regras relativas aos contratos públicos [cf. cópia em documento n.º 3 da contestação, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]; P) Com data de 2 de Fevereiro de 2014, os auditores do POVT elaboraram um documento designaram de “Questionário de Auditoria”, no qual concluíram, além do mais, que [cf. fls. 248 a 363, máxime, fls. 339 do processo administrativo, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]: “(…) Parte IV – Conclusões e Recomendações 1. Principais conclusões e recomendações (…) 4. No que respeita ao procedimento de contratação relativo ao fornecimento de contentores para resíduos sólidos adjudicado à [SCom03...], S.A. 4.1. A cláusula 28ª do caderno de encargos prevê que “os contentores devem respeitar a norma EN 840 e que “devem verificar os requisitos da marca de qualidade RAL GZ 951/1”. Considerando que as características dos contentores não apresentam a menção “ou equivalente”, entendemos que tal exigência contraria o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 49º do CCP. Violação dos princípios da igualdade de tratamento da não discriminação e da transparência (não cumprimento da legislação nacional) (de acordo com a tabela pré definida). Assim, em nosso entendimento, a despesa validada e aprovada em decisão de financiamento referente a este contrato, no montante total de 1.155.155,10 euros, não deverá ser considerada elegível para efeitos de financiamento. De acordo com o ponto 6 da tabela COCOF/07/0037/03-PT, entende-se efetuar uma correção financeira sobre o montante da despesa sujeita a cofinanciamento, após correção financeira identificada no ponto 3 anterior (1.155.155,10 euros) (…) Valor de despesa não elegível de 57.757,76 euros, a que corresponde um Fundo de 49.094,09 euros. 4.2. O n.º 3 do artigo 139º do CCP prevê que “para cada fator ou subfator elementar deve ser definida uma escala de pontuação através de uma expressão matemática ou em função de um conjunto ordenado de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos para o aspeto da execução do contrato”. Através da leitura desse artigo entende-se que para propostas com preços diferentes não poderá ser atribuída uma pontuação igual, pelo que no caso em concreto, propostas que apresentem um preço anormalmente baixo não deverão ser classificadas com a mesma pontuação. Considerando que o contrato já foi objeto de correção financeira decorrente do ponto anterior, entende-se não efetuar nova correção. (…)” Q) Por despacho de 27 de Maio de 2014, exarado sobre a informação n.º 380/2014/POVT, a Diretora do POVT aprovou do relatório preliminar identificado na alínea antecedente e a sua remessa para a ora Autora [cf. fls. 364 do processo administrativo]; R) Por ofício de 5 de Junho de 2014, emitido pela Autora com a referência S/450/2014 e dirigido aos Auditores do POVT ora Réu sob o assunto “Auditoria operações transitadas para o POVT - relatório preliminar POVT - 12-0660-fcoes-000043 contentorização de recolha selectiva e indiferenciada exercício do direito de audiência prévia” foi comunicado, além do mais, o seguinte [cf. cópia em fls. 441-445 do processo administrativo]: “(…) A [SCom01...]. EM foi notificada no passado dia 30 para se pronunciar, no prazo de 10 dias, querendo, sobre o Relatório Preliminar de auditoria à operação acima melhor identificada, realizada pela Sociedade de Revisores Oficiais de Contas DFK Associados, SROC, Lda. A [SCom01...] opõe-se aos argumentos de facto e de direito invocados no projeto de decisão de correção financeira, referente ao Contrato para o "Fornecimento de contentores para resíduos urbanos", conforme melhor se comprova nos documentos que ora se anexam em resposta a cada uma das alegadas incorreções". O princípio da proporcionalidade comete à Administração a obrigação de adequar os seus atos aos fins concretos que se visam atingir, adequando as limitações impostas aos direitos e interesses de outras entidades ao necessário e razoável; trata-se, assim, de um princípio que tem subjacente a ideia de limitação do excesso, de modo a que o exercido dos poderes, designadamente discricionários, não ultrapasse o indispensável à realização dos objetivos públicos. Ora, perante tal enquadramento parece-nos mais ajustado, mais equilibrado, que se opte não por uma medida não punitiva, mas mais por uma decisão pedagógica. De facto, não se descortina que interesse superior possa justificar uma sanção económica, quando não se verificou qualquer violação de norma legal, nem dos princípios basilares da contratação pública. Em conclusão, e face ao exposto, a [SCom01...] solicita, respeitosamente a V. Exas., que o projeto de decisão seja alterado, no sentido de se decidir que no presente caso nada há que justifique a correção financeira invocada. (…)” S) Com data de 5 de Agosto de 2014, os auditores do POVT ora Réu elaboraram um documento designado de “Questionário de auditoria – versão final após contraditório”, no âmbito do qual concluíram, além do mais, que [cf. fls. 446 a 663, máxime fls. 644 e 656 do processo administrativo, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido]: “(…) Parte I – Conclusões e recomendações 1. Principais conclusões e Recomendações. (…) 9. A cláusula 28ª do caderno de encargos prevê que “os contentores devem respeitar a norma EN 840 e que “devem verificar os requisitos da marca de qualidade RAL GZ 951/1”. Considerando que as características dos contentores não apresentam a menção “ou equivalente”, entendemos que tal exigência contraria o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 49º do CCP. Assim, em nosso entendimento, a despesa validada e aprovada em decisão de financiamento referente a este contrato, no montante total de 1.155.155,10 euros, não deverá ser considerada elegível para efeitos de financiamento. De acordo com o ponto 6 da tabela COCOF/07/0037/03-PT, entende-se efetuar uma correção financeira de 5% sobre o montante da despesa sujeita a cofinanciamento. De acordo com o ponto 6 da tabela COCOF/07/0037/03-PT, entende-se efetuar uma correção financeira de 5 % sobre o montante da despesa sujeita a co-financiamento, após correcção financeira identificada no ponto 3 anterior (1.155.155,10). (…) Pese embora as alegações apresentadas pelo beneficiário em sede de contraditório, entende-se manter a conclusão, correção e respetiva recomendação. A alínea a) do n.º 2 do artigo 49º do CCP é clara ao estabelecer que “as especificações técnicas devem ser fixadas no caderno de encargos por referência, por ordem de preferência, a normas nacionais que transponham normas europeias, a homologações técnicas europeias, a especificações técnicas comuns, a normas internacionais ou a qualquer outro referencial técnico elaborado pelos organismos europeus de normalização, acompanhadas da menção «ou equivalente» ”. Salienta-se ainda que, tendo sido esclarecida a questão anterior, relativa, ao valor elegível aprovado para os contratos com a designação “Contentores” e “Identificadores eletrónicos” (conclusão anterior) e não sendo aplicável qualquer correção financeira, verifica-se que a despesa total elegível validada do contrato em apreço, é de 1.235.104,33 euros, pelo que é sobre este valor que incidirá a correção financeira de 5%» e «o beneficiário deverá proceder à correção financeira da despesa irregular identificada relativa ao incumprimento da alínea a) do n.º 2 do artigo 49º do CCP no âmbito do procedimento de contratação relativo ao Fornecimento de contentores para resíduos urbanos, adjudicado à [SCom03...], S.A. (…)” T) Por despacho datado de 09 de Outubro de 2014, exarado sobre a informação n.º 779/2014/POVT elaborada, além do mais, para a operação POVT-12-0660-FCOES000043, a Diretora do POVT ora Réu determinou o seguinte [cf. informação e despacho de fls. 665 do processo administrativo]: “(…) Concordo com o proposto. Aprovo os relatórios finais em anexo (…)” U) Por ofício de 13 de Novembro de 2014 subscrito pela Senhora Presidente da Comissão Diretiva do POVT ora Réu e dirigido à Autora sob o assunto “Operação n.º POVT12-0660-FCOES-000043 – “Contentorização da Recolha seletiva e indiferenciada” – Constituição de dívida no âmbito da operação cofinanciada” foi comunicado, além do mais, o seguinte [cf. cópia em fls. 528-536 do SITAF]: “(…) Em cumprimento do disposto no Regulamento (CE) n.º 1083/2006, de 11 de Julho, que estabelece disposições gerais sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu e o Fundo de Coesão e do Regulamento (CE) nº 1828/2006, de 8 de Dezembro, que prevê as normas de execução do Regulamento (CE) nº 1083/2006, vimos por este melo proceder à notificação formal da constituição dessa Entidade como devedora de Fundo de Coesão no montante de 52.491,93 €, apurado no âmbito da aplicação de uma correção financeira, decorrente da Auditoria realizada à presente operação transitada do ON2 (…) Na sequência do relatório final de Auditoria realizada à operação transitada referida em assunto, efetuada pela Sociedade de Revisores Oficiais de Contas DFK Associados, SROC, Lda., e após análise do contraditório, foi determinada pela Autoridade de Gestão do POVT, uma correção financeira de 5% ao Contrato "01. Contentores para Resíduos Urbanos". Tendo em conta que a despesa elegível validada do respetivo contrato é no montante de 1.235.104,33 €, será sobre este montante que incidirá a correção financeira de 5%, resultando numa despesa não elegível de 61.755,22 € correspondente a um montante de Fundo de Coesão de 52.491,93 €, montante este que será constituído como dívida (…)” * * IV- DO MÉRITO DA INSTÂNCIA DE RECURSO 11. A [SCom01...] intentou a presente ação administrativa especial contra o POVT, peticionando o provimento do referido meio processual por forma a ser (i) judicialmente declarada a ilegalidade, por nulidade ou anulabilidade, do ato administrativo que determinou uma correção financeira de 5% sobre o montante contratual validado em 1.235.104,33 €, e da qual resultou um montante em dívida da Autora para com o Fundo de Coesão no valor global de 52.491,9 €. 12. A par desta pretensão impugnatória, a Autora, aqui Recorrente, peticionou também a condenação do Réu “(…) a praticar o ato devido, isto é, considerar como totalmente elegíveis as despesas que viram o seu montante corrigido em 5% (…)”. 13. Substanciou tais pretensões no entendimento de que o ato impugnado padece de ilegalidade material, o que estribou na convicção de que a falta da expressão "ou equivalente" na cláusula 28.ª do caderno de encargos não obstou ao adequado desenvolvimento do procedimento concursal, não tendo suscitado qualquer objeção por parte dos concorrentes, tendo o contrato sido validado pelo Tribunal de Contas, sendo certo que a expressão "ou equivalente" seria despicienda no caso concreto, uma vez que as normas mencionadas [DIN EN 840 e o certificado RAL GZ] constituem standards europeus de acesso universal. 14. Adicionalmente, sustentou que a aplicação retroativa da norma COCOF configura uma violação dos princípios da boa-fé e da tutela da confiança, sobretudo considerando que a referida norma já não era aplicável à data da decisão impugnada, concluindo que a correção financeira aplicada, ainda que fixada em apenas 5%, viola o princípio da proporcionalidade, porquanto uma medida de natureza pedagógica seria mais adequada às circunstâncias do caso. 15. O T.A.F. do Porto, porém, não validou este entendimento, tendo julgado totalmente improcedente a presente ação. 16. Examinando a fundamentação de direito vertida na sentença recorrida, assoma evidente que o juízo de improcedência da presente ação assentou na consideração de que a correção financeira aplicada pelo POVT à [SCom01...]., não padecia de ilegalidade material. 17. Com efeito, o Tribunal considerou que a cláusula 28.ª do Caderno de Encargos violara inequivocamente a alínea a) do n.º 2 do artigo 49.º do Código dos Contratos Públicos, ao não incluir a menção "ou equivalente" após a referência às especificações técnicas [norma EN 840 e requisitos da marca de qualidade RAL GZ 951/1], o que tivera impacto concreto na avaliação das propostas. 18. No que concerne à alegada violação dos princípios da boa-fé e da tutela da confiança, o Tribunal decidiu pela sua inaplicabilidade, por entender que o ato administrativo impugnado fora proferido no âmbito de poderes vinculados, prevalecendo o princípio da legalidade, trave mestra da conduta administrativa, sobre os demais. 19. Ademais, considerou que o visto prévio concedido pelo Tribunal de Contas não constituía impedimento à atuação do POVT no exercício das competências que lhe são legalmente atribuídas em matéria de correções financeiras. 20. Por fim, quanto à base normativa da correção financeira aplicada, o Tribunal entendeu que, mesmo tendo o POVT fundamentado erroneamente a sua decisão na Norma COCOF 07/0037/03-PT, já substituída pela Decisão da Comissão Europeia C [2013] 9527 final, de 19 de dezembro de 2013, a taxa de 5% aplicada correspondia precisamente à percentagem mínima que seria exigível à luz do quadro normativo vigente, não se verificando, por conseguinte, qualquer violação do princípio da proporcionalidade, nem margem legal para a adoção de mera "medida pedagógica" como propugnado pela Autora. 21. A Recorrente dissente do assim decidido, fundamentando o presente recurso no seguinte acervo de fundamentos: 22. Primeiramente, sustenta que o Tribunal a quo errou na interpretação e aplicação do artigo 49.º, n.º 2, alínea a) do Código dos Contratos Públicos, ao considerar que a mera ausência da expressão "ou equivalente" no caderno de encargos constitui violação do referido preceito, quando as especificações técnicas [norma EN 840 e marca RAL GZ 951/1] representam padrões universalmente conhecidos no mercado de contentores de resíduos, sem referência a marcas ou patentes específicas que limitassem a concorrência. 23. Em segundo lugar, argumenta que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que a concorrente [SCom02...] foi prejudicada por não apresentar certificado RAL GZ 951/1, quando, na realidade, a menor pontuação se deveu à ausência de qualquer certificado para alguns contentores, e não por apresentar certificado diferente do solicitado. 24. Adicionalmente, defende que o Tribunal a quo desconsiderou indevidamente a fiscalização prévia do Tribunal de Contas que não evidenciou qualquer irregularidade no procedimento, circunstância que constituiu fonte legítima de confiança para a Recorrente e que, nos termos da doutrina administrativista, deveria ter sido valorada como indício da legalidade do procedimento concursal. 25. Finalmente, a Recorrente defende que o ato administrativo do POVT que determinou a correção financeira de 5% viola o artigo 10.º do Código do Procedimento Administrativo [princípio da boa-fé], pois mesmo no exercício de poderes vinculados, os princípios da justiça e da boa-fé devem sobrepor-se a outros deveres legais quando as circunstâncias assim o justifiquem. 26. Expendidas as reflexões jurídicas pertinentes no quadro argumentativo carreado pela Recorrente aos presentes autos, cumpre, prima facie, antecipar que o presente recurso não merecerá provimento. 27. Na verdade, cabe notar que o artigo 49º, n.º 2, alínea a) do CCP, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, estabelecia expressamente que as especificações técnicas devem ser fixadas por referência a normas nacionais que transponham normas europeias, homologações técnicas europeias, especificações técnicas comuns, normas internacionais ou outros sistemas técnicos de referência estabelecidos pelos organismos europeus de normalização, "devendo cada referência ser acompanhada da menção “ou equivalente”. 28. A ratio legis deste preceito é clara e inequívoca: garantir que os procedimentos de contratação pública não sejam restritivos da concorrência, assegurando a todos os operadores económicos a possibilidade de apresentar soluções técnicas equivalentes às expressamente referidas no caderno de encargos. 29. No caso sub judice, não oferece controvérsia que o artigo 28º do Caderno de Encargos fazia referência à norma EN 840 e à marca RAL GZ 951/1, contudo, sem mencionar a possibilidade de apresentação de soluções equivalentes [cfr. alínea e) do probatório]. 30. Ora, é nosso entendimento que esta omissão viola o disposto no artigo 49.º, n.º 2, alínea a), do Código dos Contratos Públicos, independentemente do grau de conhecimento ou disseminação destas normas no mercado relevante. 31. Neste contexto, é pertinente invocar o Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em 25/10/2018, no processo C-413/17- Roche Lietuva, no qual se assinala que "(…) a regulamentação da União relativa às especificações técnicas reconhece uma ampla margem de apreciação à entidade adjudicante no âmbito da formulação das especificações técnicas de um contrato. Esta margem de apreciação é justificada pelo facto de que são as entidades adjudicantes quem melhor conhece os fornecimentos de que necessita e quem está melhor posicionado para determinar os requisitos que devem estar preenchidos para obter os resultados pretendidos. No entanto, a Diretiva 2014/24 estabelece determinados limites que a entidade adjudicante deve respeitar. Designadamente, exige-se no artigo 42.º, n.º 2, da Diretiva 2014/24 que as especificações técnicas permitam a igualdade de acesso dos operadores económicos ao procedimento de contratação e que não possam criar obstáculos injustificados à abertura dos contratos públicos à concorrência (…)." 32. O princípio da equivalência funcional constitui, neste contexto, um corolário fundamental do princípio da não discriminação, visando impedir que as entidades adjudicantes utilizem especificações técnicas como mecanismo de favorecimento de determinados operadores económicos. 33. A posição defendida pela Recorrente no sentido de que obrigatoriedade da menção "ou equivalente" deve ser interpretada cum grano salis não encontra sustentação na letra da lei, nem na jurisprudência europeia. 34. O legislador europeu e, consequentemente, o legislador nacional optaram deliberadamente por uma formulação imperativa ["devendo cada referência ser acompanhada da menção 'ou equivalente'"], não deixando margem para interpretações casuísticas que poderiam comprometer a segurança jurídica e a previsibilidade das regras concursais. 35. Por sua vez, contrariamente ao alegado pela Recorrente, a universalidade do conhecimento de determinados padrões técnicos não afasta a necessidade da menção "ou equivalente". 36. Em primeiro lugar, porque o conhecimento generalizado de uma norma não significa, necessariamente, a inexistência de soluções técnicas alternativas igualmente adequadas. 37. Em segundo lugar, porque a menção "ou equivalente" desempenha uma função informativa essencial, sinalizando aos potenciais concorrentes que a entidade adjudicante está disposta a considerar soluções alternativas, desde que funcionalmente equivalentes. 38. No caso concreto, a referência à norma EN 840 e à marca RAL GZ 951/1 sem a menção "ou equivalente" poderia, efetivamente, dissuadir potenciais concorrentes que, não dispondo dos certificados específicos mencionados, poderiam, todavia, apresentar soluções técnicas equivalentes. 39. É precisamente esta potencialidade restritiva da concorrência que o legislador pretendeu evitar ao estabelecer a obrigatoriedade da menção "ou equivalente". 40. Por conseguinte, não se divisa a existência de qualquer erro de julgamento de direito no domínio em apreço. 41. Idêntica asserção é atingível no tocante aos demais feixes argumentativos aduzidos pela Recorrente. 42. Na verdade, da análise da factualidade apurada nos autos, mormente das alíneas F) e H), resulta, inequivocamente, que o júri do procedimento concursal efetuou distinções valorativas expressas quanto à conformidade das propostas com as especificações técnicas exigidas no caderno de encargos, mormente no que concerne aos certificados RAL GZ 951/1. 43. Realmente, no que tange à proposta da concorrente [SCom05...] [identificada como Proposta n.º 1], o júri concursal consignou expressamente a ausência de certificados RAL GZ 951/1, substituídos por certificados TUV, atribuindo-lhe, não obstante, a notação de 4,00 pontos. 44. Já quanto à proposta da [SCom02...] [assinalada como Proposta n.º 3], o mesmo júri asseverou a conformidade com a norma EN 840, apontando, todavia, a ausência de certificados RAL GZ 951/1 "para todos os contentores", o que se consubstanciou na atribuição de uma valoração inferior, cifrando-se em 3,00 pontos. 45. Da factualidade ora aduzida, sobressai, insofismável, que o elemento diferenciador entre as classificações atribuídas residiu na falta de apresentação dos certificados RAZ GZ 951/1, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão relativamente à tese da Recorrente quanto à existência de erro de julgamento do Tribunal a quo relativamente ao declarado prejuízo do concorrente [SCom02...]. 46. Por sua vez, saliente-se que a Recorrente não pode obter, por via da proteção que é conferida pelos princípios da boa-fé, da justiça e da proteção da confiança, uma solução para a sua situação jurídica ilegal. 47. Na verdade, a proteção conferida pelos princípios invocados só funciona no contexto da legalidade. 48. Como se referiu anteriormente, a omissão no artigo 28º do CE da possibilidade de apresentação de solução equivalentes configura uma violação do disposto no artigo 49.º, n.º 2, alínea a), do Código dos Contratos Públicos, e, qua tale, uma atuação administrativa ilegal insuscetível de ser acobertada pelos princípios de boa-fé, da justiça e da confiança. 49. Efetivamente, ainda que se considerasse como preenchidos em concreto os requisitos/pressupostos integradores da violação dos princípios invocados pelo Recorrente, em especial o proteção da confiança, o que não se tem como minimamente líquido, sublinhe-se, não é aceitável, nem admissível, que aquele princípio, ou qualquer dos outros por si invocados, crie ou mantenha uma situação contrária à lei somente para tutelar a expectativa que a Recorrente invoca. 50. Ademais, afigura-se juridicamente insubsistente a pretensão de que o visto prévio concedido pelo Tribunal de Contas constitua fundamento bastante para frustrar a competência fiscalizadora de outra entidade com atribuições próprias no domínio do controlo da legalidade da contratação pública, verificando-se, assim, uma clara dissociação subjetiva entre a entidade geradora da alegada confiança e aquela que posteriormente aplicou a correção financeira controvertida. 51. Na verdade, o Tribunal de Contas constitui um órgão de soberania de natureza jurisdicional, incumbindo-lhe a fiscalização da legalidade das despesas públicas e o julgamento das contas que sejam da sua competência [cfr. art.ºs 202º, 209º, n.º 1, al. c) e 214º da Constituição da República Portuguesa]. 52. Já aos Tribunais Administrativos compete deslindar conflitos advenientes de relações jurídicas administrativas, nos termos descritos no art.º 212º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, não se incorporando nessa sede, evidentemente, a apreciação das questões e matérias que são expressamente atribuídas a outras ordens jurisdicionais. 53. Destarte, e não sendo aquele uma instância de recurso deste - entendida como um tribunal hierarquicamente superior aos tribunais administrativas e fiscais com a finalidade de anular, modificar ou substituir as decisão jurisdicionais destes -, deve admitir-se que as instâncias em questão possam emanar juízos decisórios díspares sem que daí advenha qualquer atropelo das regras que presidem ao funcionamento do serviço de justiça português, tanto mais a aposição de um visto pelo Tribunal de Contas não é fundamento que, por si, arrede a ilegalidade do contrato ou que garante a sua legalidade, porquanto aquele visto afere apenas os aspetos financeiros ou apenas se reporta à legalidade financeira. 54. Destarte, não se vislumbra que a atuação da Autoridade de Gestão do POVT, ao aplicar a correção financeira de 5% sobre o montante contratual validado, tenha configurado uma violação do princípio da boa-fé consagrado no artigo 10.º do Código do Procedimento Administrativo, porquanto a mesma se limitou a exercer as suas competências fiscalizadoras face a uma irregularidade objetivamente verificada no procedimento de contratação pública. 55. Deste modo, tendo também sido este o caminho trilhado na sentença recorrida, com maior ou menor variação de fundamentação, impõe-se reconhecer que esta não é merecedora da censura que a Recorrente lhe dirige. 56. Assim deriva, naturalmente, que se impõe negar provimento ao presente recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida. 57. Ao que se proverá em sede de dispositivo. * * * * IV – DISPOSITIVO Nestes termos, acordam em conferência os Juízes da Subsecção de Contratos Públicos da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional e manter a sentença recorrida. Custas pelo Recorrente. Registe e Notifique-se. * * Porto, 21 de março de 2025, Ricardo de Oliveira e Sousa Tiago Afonso Lopes de Miranda Clara Ambrósio |