Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 02727/08.0BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 01/30/2025 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | PAULO MOURA |
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Descritores: | CRIAÇÃO LÍQUIDA DE EMPREGO; CUSTOS COM SEGUROS DE DOENÇA; PRESTAÇÕES ACESSÓRIAS CONCEDIDAS A EMPRESAS AGRUPADAS; TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA TIDAS COM VIATURAS LIGEIRAS; |
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Sumário: | I - Relativamente à criação líquida de emprego, o benefício fiscal atribuído aos empregadores, estabelece um montante máximo da majoração anual e não um montante máximo de encargos mensais. II - Os custos suportados com os seguros de doença dos familiares dos trabalhadores, embora, em abstrato, possam ser dedutíveis não relevarem, em concreto, para a determinação da matéria tributável em IRC, por não satisfazem em concreto, os requisitos conjugados do art.º 23.º e das alíneas a) e b) do nº 4 do artigo 40.º do CIRC. III – Prestações acessórias concedidas a empresas agrupadas, que passam a integrar o capital social da empresa financiada, não se podem enquadrar no regime de preços de transferência. IV – Os juros de mora, relativos aos créditos reclamados judicialmente, integram o valor do pedido, pelo que o respetivo montante é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável, em caso de incobrabilidade de tais créditos. V – As custas judiciais pagas nos processos em que ocorreu desistência do processo, não compreendem o valor da ação, pelo que não se podem considerar um proveito não alcançado, por isso não podem ser objeto de dedução à matéria tributável. VI – Estão sujeitas a tributação autónoma os encargos ou as despesas tidas com viaturas ligeiras, relativas a juros de ALD, portagens e estacionamentos. |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso da AT. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: A FAZENDA PÚBLICA interpõe recurso da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por [SCom01...], S.A., contra a liquidação de IRC do ano de 2006. Por sua vez, a Impugnante, [SCom01...], S.A., também interpôs recurso da sentença, na parte em que decaiu. A recorrente FAZENDA PÚBLICA, entende que a sentença incorreu em erro de julgamento de direito, tendo formulado as seguintes conclusões: A. A Fazenda Pública recorre da sentença proferida em 28.04.2016 pelo Douto Tribunal a quo, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada contra a liquidação oficiosa de IRC lançada pela Administração Tributária à sociedade impugnante, relativa ao ano fiscal de 2006, por força de correções feitas em sede inspetiva ao lucro tributável, entre as quais a que incidiu sobre o montante deduzido ao lucro tributável com base no benefício fiscal com a criação de empregos para jovens previsto no art. 17° do Estatuto de Benefícios Fiscais (EBF), na redação aplicável para os anos em que se constituiu o direito ao benefício, 2001 e 2002, dada pelo DL n° 198/2001, de 03.07. B. A Fazenda Pública, respeitosamente, entende, salvo o devido respeito e sem embargo de melhor opinião, que a douta sentença sob recurso incorreu em erro de julgamento de Direito, por errónea interpretação e aplicação do disposto no art. 17° do EBF, na redação aplicável, quando decide que “o limite do montante de 14 vezes o salário mínimo nacional reporta-se aos encargos mensais suportados com os trabalhadores que cumpram os requisitos enunciados no nº 1 e não à majoração propriamente dita”. C. Entende a Fazenda Pública, em síntese, que a própria majoração em 50% dos encargos mensais correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contratos sem termo com idade não superior a 30 anos está abrangida pelo limite previsto no n° 2 do art. 17° do EBF, na redação aplicável. D. A letra do n° 2 do art. 17° do EBF não distingue que os encargos mensais submetidos ao limite aí previsto sejam apenas os encargos em singelo, anteriores à majoração, pois refere, no seu primeiro período, que os efeitos do disposto no n° 1, no que concerne aos encargos mensais, estão sujeitos ao montante máximo de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado. E. A interpretação que melhor atende à finalidade extrafiscal que o art. 17° do EBF visa é aquela preconizada pela Fazenda Pública, porque, como se demonstrou no desenvolvimento destas alegações, exemplificando, a interpretação da impugnante beneficia os postos de trabalho que geram encargos de base mensal progressivamente mais elevada, não sendo credível que a intenção do legislador tenha sido favorecer os postos de trabalho cuja remuneração mensal se situe num patamar elevado, porque não é esse o escalão em que a criação de postos de trabalho para jovens ocorre. F. Como é público e notório, a criação de postos de trabalho cuja remuneração mensal se situe num patamar elevado não é nem nunca foi a típica do mercado de trabalho de jovens até 30 anos em busca do primeiro emprego ou desempregados de longa duração, nem atende à estrutura do universo empresarial português, composto na sua grande maioria por unidades de pequena dimensão e reduzida capacidade financeira. G. A intenção legislativa subjacente à limitação quantitativa constante do n° 2 do art. 17° do EBF, na redação aplicável, é a de evitar uma dedução que exorbite a teleologia desse artigo, limitando gradualmente a possibilidade de dedução à medida que as remunerações pagas sejam mais elevadas, excluindo o benefício quando atingido certo montante. H. A interpretação no sentido de que o benefício fiscal previsto na norma do n° 1, considerando todo o teor dessa norma, se deve submeter ao limite fixado no n° 2, tem um mínimo de correspondência verbal na letra daquela norma, pelo que um hipotético pensamento legislativo desse tipo não pode deixar de ser considerado pelo intérprete da lei como o que efetivamente corresponde à mens legislatoris, em face da norma do n° 2 do art. 9° do Código Civil. I. Por isso, no pressuposto de que o legislador do DL n° 198/01 soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, se pretendesse consagrar a definição de um limite máximo para os encargos mensais prévio à majoração dos custos em 50%, decerto não teria inserido o período “[p]ara efeitos do disposto no número anterior”, que condiciona a aplicação da norma do nº 2 do art. 17º do EBF na redação que lhe deu, porquanto só na ausência dessa frase se poderia defender, a partir de um hipotético texto assim composto, que o seu pensamento tinha sido o de definir um limite máximo prévio à majoração. J. Que a teleologia do art. 17º do EBF é, inegavelmente, o incentivo à criação de emprego para jovens à procura do primeiro emprego, com maior dificuldade na inserção no mercado de trabalho, declara o Relatório do Grupo de Trabalho criado por despacho de 01.05.2005 do Ministro de Estado e das Finanças para a Reavaliação dos Benefícios Fiscais, publicado no nº 198 dos Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, que, a pág. 198, K. que sublinha a prossecução dos esforços já iniciados para reduzirem os custos não salariais sobre as remunerações menos elevadas, em ordem a diminuir o seu custo orçamental e induzir o emprego dos trabalhadores que delas têm maior necessidade, e que observa que a alteração introduzida pela Lei nº 32-B/2002, de 30.12, limitou o montante máximo da majoração dos encargos que, mantendo como referência o valor equivalente a 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, passou a ser medido anualmente e não mensalmente, como até então. L. É nesta parte, de medição anual e não mensal do montante máximo da majoração dos encargos e, portanto, do benefício fiscal, que a redação do art. 17º do EBF dada pelo nº 1 do art. 38º da L. nº 32-B/2002, se mostra inovadora, sendo essa redação interpretativa por natureza na parte em que se suscitaram dúvidas sobre o sentido da redação anterior antiga, e a nova lei veio eleger um dos sentidos que já poderia ser colhido daquela segundo os cânones interpretativos. M. Acompanhando Batista Machado, in Introdução do Direito e ao Discurso Legitimador, pág. 246, as leis interpretativas caracterizam-se por “consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar”, não sendo por isso suscetível de violar quaisquer expectativas seguras e legitimamente fundadas dos interessados: estes podiam contar que a solução fixada pela lei nova interpretativa, visto corresponder a um dos vários sentidos atribuídos já pela doutrina e pela jurisprudência. N. As razões literais, sistemáticas e teleológicas que se apontaram, acentuadas pela redação dada pelo nº 1 do art. 38º da L. nº 32-B/2002, concorrem para a conclusão de que o nº 2 do art. 17º do EBF, na redação dada pelo DL nº 198/2001, define um limite máximo à majoração dos custos em 50%, para efeitos fiscais, prevista no nº 1 do mesmo artigo. Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, e, consequentemente, decidida a improcedência da impugnação. A [SCom01...], S.A., contra-alegou, tendo concluído da forma que segue: 1. O presente recurso vem interposto pela Fazenda Pública da parte da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida pela Impugnante contra a liquidação de IRC que lhe foi dirigida, com respeito ao exercício de 2006. 2. Entende a Recorrida que o Tribunal fez, em relação à correcção realizada ao nível do beneficio fiscal dirigido à criação líquida de postos de trabalho, com base nos encargos Incorridos em 2001 e 2002, uma correcta interpretação, literal, teleológica e sistemática, da norma do artigo 17º do EBF. 3. Com efeito, se o n.º 2 do artigo 17º diz, literalmente, que, para efeitos da majoração prevista, o montante máximo dos encargos mensais é o equivalente a 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, então outra interpretação se não pode fazer do que a seguinte: quando os encargos mensais forem inferiores àquele padrão, majoram-se em 50% na sua totalidade; se os mesmos forem em montante igual ao do padrão, majoram-se em 50% igualmente na sua totalidade; caso sejam apurados em montante superior ao padrão, é sobre este último valor que incide a majoração. Foi exactamente com respeito por esta interpretação que a [SCom01...] actuou na situação decidenda. 4. O labor interpretativo da Recorrida não tem qualquer apoio no texto da lei, pelo que, desde logo, viola a directriz fundamental da interpretação das normas jurídicas estabelecida no n.º 2 do artigo 9º do Código Civil. 5. Atendendo também à teleologia que enforma o artigo 17º, deve ser sublinhado que a intenção subjacente à limitação quantitativa constante do seu n.º 2 é a de evitar um "excesso de dedução", tendo em mente os salários mais elevados, que ficam assim limitados, na possibilidade de dedução que conferem, pelo rendimento padrão. Se os encargos mensais não forem superiores ao padrão, há uma correspondência directa entre o valor desses encargos e o valor da majoração; se os encargos mensais forem superiores ao rendimento padrão, o valor da majoração fica por ele limitado. 6. Existem, por fim, razões de índole sistemática que reforçam a invalidade da decisão. Desde logo, a lógica seguida pelo Tribunal consubstancia, na prática, a caracterização deste beneficio como uma isenção, quando, na verdade, o mesmo é uma dedução acrescida (cfr. o n.º 2 do artigo 2º do EBF). 7. Do que vem de ser dito é, pois, forçoso concluir que a sentença recorrida fez uma qualificação correcta das normas legais supra mencionadas, devendo, nesta medida, ser mantida na ordem jurídica. A [SCom01...], S.A., no seu recurso, formula nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: 1. O presente recurso vem interposto da parte da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela [SCom01...], S.A. contra a liquidação de IRC que lhe foi dirigida, com respeito ao exercício de 2006. 2. Tendo por base a fundamentação da decisão recorrida, defende a Recorrente que a Sentença está ferida de anulabilidade. Esta resulta, de um deficiente julgamento quanto à matéria de direito mobilizada. 3. Entende a Recorrente que o Tribunal fez, em relação à correcção realizada ao nível da desconsideração fiscal do custo relativo a prémios de seguro de doença, uma interpretação e aplicação inidóneas do Direito consequentemente aplicável. 4. A norma do artigo 40.° do Código do IRC, que tem por epígrafe «Realizações de utilidade social» não tem em vista a finalidade principal ou essencial de uma norma de cariz fundamentalmente tributário - a obtenção de receitas -, mas antes objectivos de natureza económica e, acima de tudo, social: na verdade, a norma do artigo acabado de citar corresponde a um verdadeiro incentivo fiscal para a promoção de finalidades sociais, como o são, inegavelmente, as finalidades de protecção na doença e acidentes pessoais dos trabalhadores e dos respectivos agregados familiares (elementos sob a sua dependência). 5. De facto, uma interpretação da norma citada conforme com os deveres sociais e constitucionais do Estado, tem necessariamente que compreender a dedutibilidade, ainda que com limites, de custos incorridos com esses objectivos. 6. É, desde logo e necessariamente, segundo o n.º 2 do dispositivo em análise, o caso das despesas efectuadas com e o propósito de seguros de saúde de doença contratados a favor dos trabalhadores. 7. Neste caso, para que a dedutibilidade fiscal seja permitida, os requisitos exigidos são, não só os previstos naquele n.º 2 - isto é, que os custos com os seguros não ultrapassem 15% do total das despesas com pessoal e que o beneficio seja estabelecido para a generalidade dos colaboradores da empresa mas também o que resulta da alínea b) do n.º 4: “[o]s benefícios devem ser estabelecidos segundo um critério objectivo e idêntico para todos os trabalhadores ainda que não pertencentes à mesma classe profissional (...)" (sublinhado nosso). 8. Uma leitura do requisito "estabelecidos segundo um critério objectivo e idêntico" compatível com o racional da norma relativa a este tipo de realizações de natureza social apenas permite a conclusão de acordo com a qual a dedutibilidade dos custos suportados com um determinado seguro de saúde só é permitida quando esse seguro abrange a generalidade dos trabalhadores, não sendo, porém, obrigatório que essa abrangência se verifique de forma exactamente igualitária. 9. O facto de os benefícios resultantes de um contrato de seguro deverem ser estabelecidos para todos os trabalhadores de acordo com "um critério objectivo e idêntico" não implica que todos ales devam estar sujeitos ao mesmo regime concreto, sem a mínima variação entre as particulares condições que conformam esse regime. 10. Com efeito, caso a identidade a que a norma se refere devesse ser entendida como sinónimo de igualitarismo, como entende o Tribunal Administrativo e Fiscal, nenhum sentido teria a necessidade legal de um critério "objectivo” para a atribuição dos benefícios - na verdade, todos os trabalhadores teriam então de estar submetidos ao mesmo exacto regime. 11. A lei não afasta, pois, as situações (de longe, aliás, as mais frequentes) em que existe uma "estratificação" dos benefícios, desde que - repita-se - a mesma se faça de acordo com a referida objectividade. 12. Serão "critérios objectivos", designadamente: a existência de um patamar mínimo de cobertura que não seja artificial e que preveja condições minimamente aceitáveis; a não aplicação das coberturas mais vantajosas a uma clara minoria de colaboradores (administração ou pouco mais); a não dependência da inserção de um colaborador num ou noutro patamar de cobertura do facto de ale fazer parte de uma ou de outra classe profissional; a existência de critérios de proporcionalidade, como por exempla o nível remuneratório. 13. Na situação em análise, é precisamente isso que ocorre: existem várias apólices de seguro, e o acesso àquelas que prevêem condições mais favoráveis não abrange apenas um grupo reduzido de colaboradores, mas sim uma proporção bastante considerável dos trabalhadores da Impugnante. 14. Por outro lado, e este é necessariamente um erro em que incorre a Sentença recorrida, o critério objectivo que determinou a concessão de um ou outro nível de coberturas não se ficou a dever à classe profissional dos segurados, mas ao seu nível salarial. Não é, pois, verdade, que que exista uma clara diferenciação, nem entre os órgãos sociais e os restantes trabalhadores, nem entre trabalhadores de uma determinada categoria profissional e trabalhadores de uma categoria profissional diferente. 15. Também as despesas, suportadas pela Impugnante com a parte dos seguros de saúde contratados relativa aos cônjuges e filhos dos seus colaboradores não poderão deixar de ser consideradas um custo fiscalmente dedutível, desta feita por pura aplicação do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC. 16. Conforme, de resto, resulta claro da factualidade usada pelo Órgão decisor na sua fundamentação - muito embora a não enuncie no capítulo que destina à factualidade provada (vício já acima invocado) -, no caso em apreço, a Impugnante suportou os encargos em causa por motivos intrinsecamente empresariais, sentindo-os, portanto, como o cumprimento, não só de um ímpeto de cariz social e comunitário, mas também de um interesse próprio. 17. Os pagamentos aos familiares dos trabalhadores são, assim, causa societatis, e, nessa medida, indispensáveis nos termos do artigo 23.º do Código do IRC. 18. A dedutibilidade fiscal destes encargos, designadamente os suportados com os prémios de seguros de doença relativos aos familiares dos trabalhadores, foi já confirmada em diversas decisões do Centro de Arbitragem Administrativas, bastando, para o efeito, aqui referir, por todos, a proferida no âmbito do Processo n.º 4/2012 T, cuja consulta está disponível em www.caad.m.pt. 19. A análise da questão em apreciação - a questão de saber se a dedutibilidade fiscal dos custos relativos a contratos de seguros de doença abrange ou pode abranger, para além dos trabalhadores, os seus familiares - à luz da norma do artigo 40.º do Código do IRC permite igualmente que se lhe responda positivamente. Na verdade, não estando expressamente prevista nesta disposição legal a referência aos familiares dos trabalhadores, é também um facto incontroverso que a sua inclusão não é excluída. 20. Em matéria de preços de Transferência, a Fundamentação utilizada pela sentença demonstra, não já um conhecimento insuficiente de todo o quadro legal relativo aos meios pelos quais os sócios podem dotar as sociedades anónimas de capitais próprios - vício que é imputável à Fundamentação utilizada pela AT -, mas uma compreensão insuportável do direito mobilizável, em particular, do regime dos preços de transferência como mecanismo de regulação das actividades desenvolvidas entre entidades relacionas num ambiente necessariamente concorrencial. 21. Para que pudéssemos considerar, relativamente às operações em causa, uma eventual violação do principio de plena concorrência -independentemente de quais as implicações que o sentido dessa consideração poderia acarretar no plano jurídico-fiscal-, seria naturalmente necessário, desde logo, que a Recorrente não tivesse actuado no quadro da realização voluntária de prestações com um vinculo duradouro, a titulo complementar aos (para além dos) meios de financiamento previstos nos artigos 287° (prestações acessórias) e 243° e ss. (suprimentos não remunerados) do CSC - ou porque tal possibilidade lhe estivesse absolutamente vedada ou porque não tivesse sido essa a sua vontade. 22. Mas não é este o racional cognitivo subjacente à decisão recorrida: ao contrário do que defende a AT - para quem terão sido inobservados os requisitos formais e/ou materiais impostos pelo CSC às prestações acessórias e suprimentos não remunerados -, a Sentença contra a qual se recorre admite terem sido realizadas, no caso concreto, "prestações ou pagamentos de capitais próprios, atribuídos a titulo facultativo, sem dependência de previsão ou atribuição estatutária". 23. Ao dizê-lo, o Tribunal corrobora a tese - defendida pela Recorrente - de acordo com a qual, não sendo possível limitar os meios de dotação de capitais próprios às figuras das prestações acessórias e suprimentos não remunerados, não é manifestamente útil a invocação - preconizada pela AT - da inobservância daqueles requisitos formais e/ou materiais impostos pelo CSC, e, mais ainda, atesta o princípio segundo o qual - mais uma vez, ao contrário do que vimos ser o entendimento da AT - não é aceitável que, independentemente da qualificação jurídica que se atribua à dotação de capital efectuada pelo sócio, se lhe imponha um juízo de necessidade financeira da sociedade do qual se faça depender a obrigatoriedade ou não da sua remuneração. 24. Ora, ao admitir, quanta a este aspecto particular, que não existe qualquer razão para tratar as prestações complementares facultativas aludidas de modo diverso das prestações acessórias ou dos suprimentos, o Juiz da causa tinha a obrigação de reconhecer que, face à lei comercial, as mesmas podem não ser remuneradas: a ausência de uma obrigatoriedade estatutária não afecta a possibilidade de elas poderem vir a ser realizadas pelos sócios com causa na relação jurídica-societária existente. 25. Conforme se demonstrou, as operações em crise nos autos não são subsumíveis ao princípio de plena concorrência do artigo 58° do Código do IRC, nos termos pretendidos pela AT e agora aceites pelo Tribunal, uma vez que não é possível estabelecer uma fiel comparação entre as condições praticadas nas mesmas e aquelas que subjazem a uma operação entre empresas independentes - as características económicas das situações são completamente distintas. 26. Do artigo 58.° do Código do IRC e da Portaria n.º 1446-C/2001 resulta que a forma mais directa e adequada de verificar a paridade dos termos e condições praticados entre empresas relacionadas com aqueles que são acordados no mercado consiste, quer na comparação entre a preço debitado numa transacção vinculada e o preço facturado por uma entidade independente numa transacção de idêntica natureza - sempre que seja possível estabelecer um nexo de comparabilidade suficiente entre a transacção vinculada e outras substancialmente idênticas realizadas em situação de ausência de relações especiais -, quer na comparação entre o preço debitado numa transacção vinculada e o preço debitado em transacções vinculadas comparáveis - sempre que, pelo contrário, não seja possível estabelecer uma comparabilidade adequada entre a operação vinculada e outras substancialmente idênticas em situação de ausência de relações especiais. 27. Neste último caso, a inexistência de comparáveis adequados no universo das operações ditas "não vinculadas" determina o recurso a um método de determinação do preço de plena concorrência baseado, não no estabelecimento de nexos de comparabilidade com transacções realizadas por entidades independentes, mas antes no estabelecimento de relações de comparabilidade com transacções realizadas entre entidades relacionadas. 28. Para além de a factualidade em análise não consentir, de modo algum, a aplicação de qualquer mecanismo que implique a comparação dos termos e condições contratados, aceites e praticados pela Recorrente e a [SCom02...] com os termos e condições contratados, aceites e praticados entre entidades independentes, por inexistir sequer um módico de comparabilidade entre a situação concreta e qualquer operação em que intervenham entidades independentes (justamente porque aquela situação pressupõe, por definição, uma relação causa societatis apenas verificada entre entidades em situação de relações especiais), a verdade é que, no caso dos autos, é ainda mais acentuado o - digamos assim - "grau de incomparabilidade". 29. É, pois, totalmente inidóneo como critério de comparação para apuramento do preço de plena concorrência aplicável, mesmo que assim se entenda, às operações em análise. 30. Ao decidir nos termos em que o fez, a Sentença de que se recorre incorre num vício de violação do disposto no artigo 58° do Código do IRC. 31. No que diz respeito à correcção relativa ao custo fiscal consubstanciado no valor que decorre da desistência e da incobrabilidade de créditos reclamados judicialmente, não poderia o Tribunal a quo deixar de atender ao facto de os juros de mora estarem, sem duvida nenhuma, contidos na previsão do n.º 2 do artigo 66° da Lei n.º 60-A/2005, podendo, nessa medida, ser deduzidos ao lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC, sem necessidade de, como propugna a decisão de que se recorre, terem sido previamente registados como proveitos. 32. Aliás, outra interpretação não seria consentânea com a reconhecida e muito publicitada ratio legis da norma: o estímulo, pela via da concessão de um benefício fiscal, à desistência das acções judiciais. A legislação referida cria uma situação de excepção, de vantagem, consubstanciada na possibilidade de poderem deduzir os juros moratórios, quaisquer que sejam, cujo pagamento solicitam. 33. Quanto às custas judiciais, também elas podem ser objecto de dedução, nos termos gerais, na medida em que, com a desistência dos pedidos e com a consequente impossibilidade de a Impugnante cobrar os montantes incorridos aos clientes cuja conduta faltosa originou a proposição das acções, verificou-se também a impossibilidade de registar um proveito no mesmo valor das quantias cobradas. Defender o contrário é, assim, ignorar a lógica sistemática do regime do IRC vertido no respectivo código, o que se imputa à sentença de que se recorre, que a este particular aspecto da argumentação nem sequer se logrou pronunciar. 34. Sobre a correcção ao nível da tributação autónoma das despesas referentes a juros de ALD, portagens e estacionamentos, a sentença recorrida apenas se limitou a constatar que o tipo de encargos em causa - Juros de ALD, Portagens e Estacionamento - a própria Impugnante não refuta que estão relacionados com veículos ligeiros de passageiros. Assim sendo, caiem dentro da previsão do artigo 81°, n° 3 e 5 do C1RC (...) e como tal sujeitas a tributação autónoma. 35. Ao tributar 5% das despesas com reintegrações, rendas ou alugueres, seguros, despesas com manutenção e reparação, combustíveis e impostos incidentes sobre a utilização de viaturas ligeiras de passageiros, o legislador pretende tributar o uso privado das mesmas. Uso privado esse que se presume e que se quantifica com base naquela percentagem forfetária de 5% sabre o valor da despesa em causa. 36. No entanto, o mesmo legislador teve o cuidado de afastar da incidência deste dispositivo aquelas situações em que esta tributação forfetária se revelaria injusta e desadequada, nomeadamente quando se trata de utilização de viaturas alugadas pelo sujeito passivo para a sua actividade e afectas à exploração do serviço público de transportes, e, bem assim, aquelas situações em que o uso privado das viaturas já é tributado na esfera do trabalhador, configurando uma remuneração em espécie, como é o caso das viaturas relativamente às quais haja sido celebrado o acordo previsto n° 8) da alínea b) do n° 3 do artigo 2° do Código do IRS. 37. Esta técnica de quantificação da intensidade de uso privado com base numa percentagem forfetária surge assim como o menor dos males, ainda que constitua sempre uma entorse ao princípio da tributação do rendimento real. 38. No entanto, esta presunção é evitável e desnecessária no que respeita às despesas com portagens e estacionamento, visto que o controlo da afectação destas despesas, de ocorrência pontual e localizada no tempo e comprovável documentalmente, se afigura muito facilitado e 100% fiável. 39. Também os juros decorrentes de contratos de ALD das viaturas ligeiras de passageiros detidas pela Impugnante não são passiveis de tributação autónoma. 40. É que na raiz da opção polo financiamento da aquisição de quaisquer viaturas por parte das empresas em lugar da sua aquisição com fundos próprios, estão, sobretudo, motivos que são comuns a qualquer outro financiamento. Deste modo, será indiferente, para uma empresa que queira adquirir uma frota de viaturas, contrair um empréstimo de longo prazo sem utilização específica ou celebrar contratos de ALD, se chegar à conclusão que os encargos que lhes estão associados são idênticos. Tal como deverá ser indiferente, para efeitos fiscais, que uma determinada empresa obtenha um empréstimo junto de um banco de um milhão de euros para adquirir uma frota de automóveis a um juro de 5% ao ano ou que celebre contratos de ALD no valor de um milhão de euros relativamente a idêntico número de viaturas, a taxa de 5% ao ano. 41. A aceitar-se a sujeição dos encargos de ALD à tributação autónoma em questão estar-se-ia a estabelecer, no plano tributário, uma distinção infundada entre os sujeitos passivos de IRC, consoante o seu nível de endividamento, o que atentaria contra os princípios da tributação do rendimento real, da igualdade e da capacidade contributiva. 42. Do que vem de ser dito é, pois, forçoso concluir que a sentença recorrida fez uma qualificação errónea dos supra referidos encargos para efeitos de IRC, devendo, nesta medida, ser anulada. TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, POR PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE A ANULAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA NA PARTE DE QUE ORA SE RECORRE. A FAZENDA PÚBLICA não contra-alegou. O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso da Fazenda Pública ser julgado improcedente. No que concerne ao recurso da Impugnante o Ministério Público entende que também não assiste razão à Recorrente. Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais). ** Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir. As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber, em relação ao recurso da Fazenda Pública, se a sentença aplicou devidamente o disposto no n.º 2 do artigo 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, no que concerne à majoração de 50%, para efeitos de criação líquida de emprego. Relativamente ao recurso da Impugnante, as questões a decidir reportam-se em saber: (1) se não deviam ter sido desconsiderados os custo com os prémios de seguro de saúde e de doença relativos a familiares dos trabalhadores; (2) se, em relação às designadas prestações acessórias, deve ser aplicado o regime dos preços de transferência e se violam ou não o princípio da coocorrência plena do artigo 58.º do CIRC; (3) se os juros de mora dos créditos incobráveis, assim como o montante das custas judiciais, podem ser deduzidos ao lucro tributável, sem necessidade de terem sido previamente registados os proveitos; (4) se deve haver tributação autónoma incidente sobre as despesas tidas com as viaturas ligeiras, em relação aos gastos com portagens e com estacionamentos, assim como, quanto aos juros com ALD. ** Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte: III – Dos factos Factos provados 1) Através de deliberação de 14/09/2007, foi a sociedade [SCom03...], S.A. incorporada por fusão na [SCom04...], S.A. adotando esta última a firma [SCom01...], S.A., ora Impugnante - cfr. doc. de fls. 183 a 194 do suporte físico do processo; 2) A Impugnante tem como objeto social a implementação, operação, exploração e oferta de redes e prestação de serviços de comunicações eletrónicas, bem como de quaisquer recursos conexos e, ainda, o fornecimento e comercialização de produtos e equipamentos de comunicações eletrónicas - cfr. doc. de fls. 183 a 194 do suporte físico do processo; 3) Com base na ordem de serviço n.º OI20....81, de 07/02/2008, foi determinada a realização de uma ação de inspeção externa polivalente à Impugnante (que à data ainda tinha a designação de [SCom03...], S.A.), sobre o exercício de 2006, a qual teve início em 10/03/2008 - cfr. relatório de inspeção tributária a fls. 203 e 204 do suporte físico do processo; 4) Em 08/08/2008 foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária, do qual consta, além do mais, o seguinte: “III – Descrição dos factos e fundamentos das correções à matéria tributável e ao imposto encontrado diretamente em falta III.1 Correções à Matéria Coletável – IRC III.1.1 Seguros de Doença Durante o exercício económico de 2006, a [SCom03...] celebrou com a Companhia de Seguros [SCom05...], S.A. seis apólices de seguro, do ramo ‘Multicare Empresas’ (seguro de doença): · Apólice n.º ...43 · Apólice n.º ...69 · Apólice n.º ...80 · Apólice n.º ...81 · Apólice n.º ...31 · Apólice n.º ...42 (...) Pela análise às condições particulares das apólices supra mencionadas verificamos que estas contêm condições diferentes para os respetivos titulares dos seguros. A título exemplificativo, ao comparar a apólice n.º ...69 com a apólice n.º ...80 verificamos que na primeira estão abrangidos, enquanto beneficiários, os cônjuges e os respetivos filhos dos colaboradores da [SCom03...], contrariamente à segunda em que só são beneficiários os colaboradores da [SCom03...]. Vejamos, no quadro seguinte, a comparação entre as diferentes apólices, relativamente ao tipo de pessoas seguras, em que se pode verificar o número de trabalhadores seguros por apólice e o número de cônjuges e de filhos que estão seguros em cada apólice, se for caso disso:
Neste quadro resumo conseguimos depreender que as apólices n.º ...43, n.º ...69 e n.º ...81, além dos trabalhadores da [SCom03...] também incluem como pessoas seguras os cônjuges e filhos dos trabalhadores. Enquanto as apólices n.º ...80, n.º ...31 e n.º ...42 apenas incluem como pessoas seguras os próprios trabalhadores. Por outro lado, relativamente ao valor dos prémios de cada uma das apólices de seguro, também se verificam diferenças significativas. Em termos comparativos por apólice vejamos o quadro seguinte:
As apólices n.º ...43, n.º ...69 e n.º ...42 têm um prémio comercial anual por pessoa segura muito superior às restantes apólices. No entanto, a apólice n.º ...81, apesar de ter um prémio comercial igual à apólice n.º ...80, abrange, além do trabalhador da [SCom03...], os cônjuges e os filhos, o que se traduz numa diferença económica substancial. (...) Dispõe o n.° 4 do art.° 23.° do Código do IRC que ‘exceto quando estejam abrangidos pelo disposto no artigo 40.º, não são aceites como custos os prémios de seguros de doença (...) que não sejam considerados rendimentos de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.° 3 do artigo 2.° do Código do IRS’. Refira-se que, no caso concreto, para efeitos de processamento de vencimentos e consequente tributação em sede de IRS, os custos associados a estes seguros não foram considerados rendimento de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS. (...) Como tal, para serem aceites como custo, os prémios dos referidos seguros de doença deverão cumprir os requisitos descritos no art.º 40.º do Código do IRC. (...) No n.º 2 do referido art.º 40.º encontra-se prevista uma exceção relativamente a seguros de doença, mas essa exceção é circunscrita exclusivamente aos trabalhadores da empresa: ‘São igualmente considerados custos ou perdas do exercício, até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao exercício, os suportados com contratos de seguros de doença (...) a favor dos trabalhadores da empresa’. Face ao exposto, os gastos suportados com o pagamento do prémio das apólices de seguros de saúde, na parte em que são beneficiários os familiares dos trabalhadores, no montante de 261.058,80 EURO, não estando abrangidos pelo disposto no art.º 40.º do Código do IRC, não são aceites como custos ou perdas do exercício, por força do disposto no referido n.º 4 do art.º 23.º do Código do IRC. Acresce à limitação anteriormente referida, para além de outras limitações contempladas no art.º 40.º e que não estão agora a ser analisadas, a constante da alínea b) do n.º 4 do citado normativo: ‘Os benefícios devem ser estabelecidos segundo um critério objetivo e idêntico para todos os trabalhadores ainda que não pertencentes à mesma classe profissional, salvo em cumprimento de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho’. No entanto, constata-se que os benefícios (e consequentemente os prémios comerciais) relativos a cada uma das apólices são bem distintos: 1. Os trabalhadores segurados pelas apólices n.º ...43, ...69 e ...81 beneficiam de seguro de doença que abrange os próprios trabalhadores, bem como os respetivos cônjuges e filhos. Contudo, os trabalhadores abrangidos pelas apólices n.º ...80, ...31 e ...42 não vêem os elementos do seu agregado familiar beneficiados pelo seguro suportado pela [SCom03...]; 2. As apólices garantem aos seus segurados níveis de cobertura significativamente diferentes, conforme ilustram os seguintes quadros comparativos: a. Valores seguros anuais, por pessoa beneficiário:
Nesta análise é possível verificar que os valores seguros anuais por beneficiário são muito distintos entre apólices. As apólices n.º ...80 e ...81 possuem valores seguros anuais inferiores às restantes apólices. b. Limites anuais de despesa, por beneficiário
c. Percentagens de comparticipação no regime de prestações por reembolso
3. Tal como anteriormente referido, e em consequência das diferenças ao nível de coberturas, o prémio comercial anual por beneficiário (suportado pela empresa) é significativamente inferior nas apólices ...31, ...80 e ...81 em relação às restantes apólices (por exemplo, o prémio por titular é de 118,40 EURO na primeira apólice e de 967,30 EURO na apólice ...42). Como tal, verifica-se que a [SCom03...] contratou seis apólices de seguro de doença distintas, das quais resultam benefícios bastante diferenciados para os seus trabalhadores. (...) Portanto, conclui-se que os benefícios não foram ‘(...) estabelecidos segundo um critério objetivo e idêntico para todos os trabalhadores (...)’, contrariando o disposto na alínea b) do n.º 4 do art.º 40.º do Código do IRC. Face ao exposto, para além dos gastos suportados com o pagamento do prémio das apólices de seguros de doença na parte em que são beneficiários os familiares dos trabalhadores, conforme foi anteriormente demonstrado, também a parte do custo relativo aos trabalhadores no montante de 292.759,43 EURO não está abrangida pelo disposto no art.º 40.º do Código do IRC, por não cumprir o requisito previsto na al. b) do n.º 4 do mesmo artigo, e logo não são aceites como custos ou perdas do exercício, por força do disposto no referido n.º 4 do art.º 23.º do Código do IRC. (...) III.1.2 Benefícios Fiscais – Incentivos à criação de emprego O sujeito passivo deduziu ao lucro tributável, a título de benefício fiscal referente à Criação Líquida de Postos de Trabalho, previsto no anterior artigo 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, atual artigo 19.º do EBF (campo 234 do Quadro 07 da Declaração Modelo 22), o montante de 1.935.979,79 EURO, tal como a seguir se discrimina:
(...) Da análise da listagem referente à criação líquida de postos de trabalho apresentada pelo sujeito passivo, constata-se que este majorou a totalidade dos encargos efetivamente suportados em 50%, desde que os mesmos encargos, antes de serem majorados, não excedessem o limite de 14 vezes o salário mínimo nacional. Nos casos em que aqueles excedem o limite, o sujeito passivo aplicou uma majoração de 50% ao referido limite. Em qualquer dos casos, o benefício fiscal calculado pelo sujeito passivo corresponde ao montante da majoração apurada. No entanto, conforme foi anteriormente exposto, o sujeito passivo deveria aplicar a majoração de 50% sobre os encargos suportados e comparar esse montante com o limite de 14 vezes o salário mínimo nacional, daí podendo resultar que: a) Caso os encargos mensais apurados nos termos do n.º 1 (encargos contabilísticos mais deduções ao quadro 07, ou seja, 150% dos encargos suportados) não excedam o limite supra referido, o benefício fiscal a deduzir ao lucro tributável corresponde à diferença entre os encargos majorados e os encargos suportados, que não é mais do que a majoração aplicada; b) Caso os encargos mensais apurados nos termos do n.º 1 do artigo 17.º do EBF (encargos contabilísticos mais deduções ao quadro 07, ou seja, 150% dos encargos suportados) excedam o limite supra referido, o benefício fiscal a deduzir ao lucro tributável corresponde à diferença entre o referido limite e os encargos suportados. Relativamente à hipótese b) poderá ocorrer que os encargos registados na contabilidade excedam o limite, sendo que nesse caso o benefício fiscal será nulo, visto que a diferença apurada apresenta um valor negativo. (...) Consequentemente, face ao procedimento de cálculo do benefício fiscal adotado pelo sujeito passivo, verifica-se que este considerou como custo um valor superior ao limite previsto na lei. (...) III.1.4 Preços de Transferência – Prestações Acessórias à [SCom02...] A. Descrição da Operação A.1. Decomposição da origem do saldo e da sua natureza Em 31 de Dezembro de 2006, a contabilidade da [SCom03...] evidenciava um saldo no valor de 136.527.500,77 EURO, resultante de vários créditos concedidos sob a forma de Prestações Acessórias à sua entidade participada [SCom02...], conforme se pode constatar pelo quadro seguinte:
Ao nível contabilístico a [SCom03...] contabilizou as prestações acessórias na conta ‘41500200 - Prestações Acessórias’ e a [SCom02...], por sua vez, considerou-as numa conta de capital próprio. A.2 Apresentação das entidades (...) c) Relação societária entre a [SCom03...] e a [SCom02...] O capital social da [SCom02...], totalmente subscrito e realizado, é de 50.000 EURO, representado por 50.000 ações com o valor nominal de 1 Euro cada uma, sendo a totalidade deste capital detida pela [SCom03...], S.A. Daqui resulta que a [SCom03...] detém 100% do capital da [SCom02...]. d) Condições de realização das operações Tal como referido no ponto A.1., nas datas e pelos montantes aí referenciados, a [SCom03...] concedeu fundos sob a forma de Prestações Acessórias, no montante total de 17.200.000,00 EURO, à sua entidade participada [SCom02...], para além dos que já concedera em 2004 e 2005. Estes fundos cedidos a título de Prestações Acessórias não foram remunerados. Já a nota 40 do Anexo ao Balanço e à Demonstração de Resultados (ABDR) de 2004 (exercício em que se iniciou a cedência de fundos), de 2005 e de 2006 da [SCom02...] referia que ‘De acordo com os estatutos da Empresa, as prestações acessórias seguem o regime fixado na Lei para as prestações suplementares de capital, quanto ao regime de obrigação e restituição’. No entanto, pela análise dos estatutos da Empresa, constata-se que nada é referido em relação às prestações acessórias. De acordo com informações anteriormente prestadas pelo Sujeito Passivo, a decisão de efetuar Prestações Acessórias não foi objeto de qualquer ata do Conselho de Administração. Estas Prestações Acessórias não foram efetuadas através de contrato, tendo o Sujeito Passivo utilizado em cada uma das datas supra referidas uma carta a comunicar a intenção de realizar a entrega de Prestações Acessórias. Na referida carta pode-se ler: ‘Estas prestações têm carácter voluntário e são de natureza gratuita, devendo integrar o capital próprio da sociedade. Mais se comunica que as Prestações Acessórias deverão seguir o regime das prestações suplementares no que diz respeito à sua restituição’. (...) A.5. As Prestações Acessórias e os Preços de Transferência A.5.1. Do enquadramento legal das Prestações Acessórias Enquadramento destas operações face ao disposto no artigo 58.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) De acordo com o número 1 do artigo 58.º do CIRC ‘(...) nas operações financeiras efetuadas entre um sujeito passivo e uma qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis’. As operações em análise (cedência de fundos sob a forma de prestações acessórias) consubstanciam operações financeiras praticadas por entidades relacionadas, pelo que as condições praticadas deverão estar em conformidade com o Princípio de Plena Concorrência descrito no parágrafo anterior. A [SCom03...], S.A. e a [SCom02...], S.A. encontram-se numa situação de relação especial uma vez que a primeira tem o poder de exercer, de forma direta, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, que se considera verificado designadamente: a) Entre uma entidade e os titulares do respetivo capital, (...) que detenha diretamente uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto (vide alínea a) do número 4 do artigo 58.º do CIRC); ou b) Quando as empresas se encontrem em relação de domínio, nos termos em que esta é definida nos diplomas que estatuem a obrigação de elaborar demonstrações financeiras consolidadas (vide artigo 1.º do DL 238/95 e alínea f) do número 4 do artigo 58.º do CIRC). Conforme referido na alínea c) do ponto A.2 do ponto III.1.4 do presente relatório, a [SCom03...], S.A. detém 100% do capital social da [SCom02...], S.A., pelo que se conclui pela existência de relações especiais entre ambas as entidades, nos termos do n.º 4 do art.º 58.º do CIRC. (...) Face ao exposto, poderemos concluir que os fundos cedidos a título de Prestações Acessórias pela [SCom03...] à [SCom02...] poderiam ter sido obtidos, por esta última, junto de entidades terceiras independentes, com a consequente existência de remuneração sob a forma de juros. Assim concluímos que a empresa violou o Princípio de Plena Concorrência previsto no n.º 1 do art.º 58.º do CIRC. Procedamos, então, à análise das condições que seriam praticadas caso esta operação tivesse sido realizada por entidades independentes. A.9. Escolha do método De acordo com o n.º 2 do artigo 58.º do CIRC “o sujeito passivo deve adotar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos suscetíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efetua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais (...)”. No mesmo sentido estipula o n.º 1 do artigo 4.º da Portaria 1446-C/2001 que “O sujeito passivo deve adotar, para determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método mais apropriado a cada operação ou série de operações (...)”. O n.º 2 do citado normativo “Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é suscetível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas (...)”. O n.º 3 do artigo 58.º do CIRC identifica os métodos que podem ser utilizados na determinação do preço de transferência, a saber: 1. Método do Preço Comparável de Mercado; 2. Método do Preço de Revenda Minorado; 3. Método do Custo Majorado; 4. Método do Fracionamento do Lucro; 5. Método da Margem Líquida da Operação. O método do Preço Comparável de Mercado compara o preço pago por bens, direitos ou serviços transferidos numa operação vinculada com o preço pago por bens, direitos ou serviços transferidos numa operação comparável não vinculada. Este método pode ser utilizado designadamente quando o Sujeito Passivo em análise realiza uma operação da mesma natureza, que tenha por objeto um serviço idêntico, com uma entidade independente (ver alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º da referida Portaria). O método do Preço Comparável de Mercado assume-se como o método mais adequado a aplicar. A sua preferência em relação aos demais métodos advém do facto de constituir a forma mais direta de determinar se as condições acordadas entre entidades relacionadas são condições de Plena Concorrência. Assim, uma vez que se encontram reunidas condições de aplicação deste método às operações de financiamento em análise, encontra-se perfeitamente justificada a escolha deste método em detrimento dos demais. (...) A.10. Pesquisa de Comparáveis Conforme vimos no ponto anterior o Método do Preço Comparável de Mercado pode ser utilizado comparando as condições ocorridas numa operação vinculada com as condições praticadas numa operação realizada com uma entidade independente. De acordo com o n.° 3 do artigo 4.° da Portaria ‘Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são suscetíveis de afetar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efetuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas’. Assim, fomos analisar as operações efetuadas pela [SCom03...], S.A., com vista à sua utilização como operações comparáveis, tendo sido identificadas as operações adiante discriminadas:
Para efeitos de comparação entre as operações financeiras vinculadas e as operações financeiras realizadas entre entidades independentes, ter-se-á de considerar os seguintes fatores de comparabilidade: 1. A natureza das operações; 2. Moeda utilizada nas operações; 3. Notação de risco da entidade mutuária; 4. Prazo de reembolso; 5. Existência de garantias. Atendendo a estes fatores de comparabilidade, poderemos utilizar comparáveis internos para aferir das condições de Plena Concorrência. As operações financeiras passivas de médio e longo prazo realizadas pela [SCom03...], S.A. parece-nos verificar todos os requisitos de comparabilidade, assim: 1. Quanto à natureza das operações, quer as operações vinculadas (ver ponto A.1 do presente relatório) quer as operações não vinculadas tratam-se de operações de crédito. 2. A moeda utilizada quer nas operações vinculadas quer nas não vinculadas é a mesma, ou seja, o Euro. 3. Quanto à notação de risco da entidade mutuária e atendendo designadamente ao disposto no parágrafo 7.13 do Relatório da OCDE de 1995, parece-nos que será suscetível de utilizar os empréstimos contraídos pela [SCom03...], S.A. 4. Quanto ao Prazo de Reembolso é de salientar que todas as operações se referem a empréstimos de médio e longo prazo. 5. Quanto à existência de garantias ou colaterais, cumpre-nos referir que contrariamente ao que acontece com as Prestações Acessórias, tal como podemos constatar pelo ANEXO IV (1 Folha) ao presente relatório, nas operações tomadas como comparáveis existe garantia. A inexistência de garantias em operações financeiras vinculadas provoca um aumento da taxa de juro praticada em montante correspondente a essa grandeza. Assim, esta situação foi superada pela introdução de um ajustamento correspondente à garantia. (...) Na esteira do preconizado no parágrafo 1.45 do Relatório da OCDE de 1995, a fixação dos preços de transferência não é uma ciência exata pelo que a aplicação do método mais adequado conduz a um intervalo de valores (intervalo de plena concorrência), todos eles com uma fiabilidade mais ou menos equivalente. No mesmo sentido dispõe o número 5 do artigo 4.º da Portaria. Assim, qualquer valor que se encontre no intervalo de Plena Concorrência poderá ser considerado conforme ao Princípio de Plena Concorrência, mas na medida em que for possível distinguir os diferentes tipos do intervalo, o ajustamento deve ser operado utilizando o ponto de intervalo que melhor reflita os factos e as circunstâncias da operação vinculada em apreço (Cfr. parágrafo 1.48 do Relatório da OCDE de 1995). A.11 Determinação do preço que seria praticado entre entidades independentes Para efeitos de determinação do preço que seria praticado entre entidades independentes, consideramos a mediana do intervalo de Plena Concorrência, ou seja 3,36%. Após ter sido determinado, de acordo com o exposto, o preço que seria praticado entre entidades independentes, procedeu-se ao apuramento dos juros no montante de 4.801.649,42 EURO, da forma que consta do Anexo V (1 folha) à presente informação. A.12 Do Ajustamento correlativo De acordo com o n.º 11 do artigo 58.º do CIRC ‘Quando a Direção-Geral dos Impostos proceda a correções necessárias para a determinação do lucro tributável por virtude de relações especiais com outro sujeito passivo do IRC ou do IRS, na determinação do lucro tributável deste último devem ser efetuados os ajustamentos adequados que sejam reflexo das correções feitas na determinação do lucro tributável do primeiro’. (...) Em face do exposto, (...) a DGCI encontra-se obrigada a proceder ao ajustamento correlativo na esfera da [SCom02...], no entanto, esse ajustamento apenas deverá ser realizado no prazo de 180 dias a contar da data do conhecimento, ou da data em que for possível obter o conhecimento, do trânsito da decisão, quer administrativa quer judicial das correções positivas efetuadas ao lucro tributável da [SCom03...]. (...) III.1.5 Dedução indevida ao Quadro 07 da Declaração Modelo 22 - Desistência das Pendências Judiciais Enquadramento da situação na [SCom03...] Da análise efetuada à Declaração Modelo 22 e informações fornecidas pelo Sujeito Passivo, verificamos que foi deduzido no Campo 237 do Quadro 07 da Modelo 22 do ano de 2006 o valor de 5.639.383,28 Euro relativos a Juros de Mora e a Custas Judiciais, ao abrigo do Artigo 66º - Incentivo à extinção da instância, da Lei 60-A/2005 de 30 de Dezembro de 2005 (Orçamento de Estado para 2006), no âmbito dos incentivos excecionais para o descongestionamento das pendências judiciais. De acordo com os dados recolhidos junto do sujeito passivo, aquele valor corresponde à soma de juros de mora (5.528.263,06 Euro), pedidos nas ações cíveis declarativas e executivas propostas contra os seus clientes com dívidas em atraso, e do valor das Custas Judiciais (111.120,22 Euro), conforme o quadro resumo abaixo:
No que respeita ao registo contabilístico destes valores constatou-se o seguinte: O Capital em dívida de clientes foi registado na respetiva conta corrente, por contrapartida da conta de proveitos, em vários exercícios económicos, de acordo com as faturas emitidas. Ou seja, foi relevado na contabilidade da [SCom03...] um proveito que, por não ter sido pago pelo cliente, foi alvo de uma ação judicial cível. Conforme é referido pelo sujeito passivo, no fax datado de 07/07/2008, ‘o capital em dívida incluído no valor das ações objeto da desistência, já tinha sido considerado custo fiscal em exercícios anteriores com a constituição das respetivas provisões fiscais (toda a dívida objeto de desistência se encontrava em mora há mais de 24 meses). A desistência não teve portanto impacto no apuramento do resultado fiscal do ano’. O valor dos juros de mora são valores reclamados pela [SCom03...] aos seus clientes em sede das ações cíveis objeto de desistência e ‘foram calculados de acordo com as regras legais em vigor na data da entrada das respetivas ações e não se encontram registados na contabilidade nem foram debitados aos clientes’. No entanto, o Sujeito Passivo deduziu o valor de Juros de Mora no Campo 237 do Quadro 07 da Modelo 22 do ano de 2006 alegando que o fez ‘conforme decorre do disposto no n.º 2 do artigo 66.º da lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro’. No que respeita ao valor das custas judiciais, foi contabilizado numa conta de custos ‘no exercício em que ocorreu o respetivo pagamento não tendo sido debitados aos clientes’. No entanto, estes custos foram ainda deduzidos pelo sujeito passivo no Campo 237 do Quadro 07 da Modelo 22 do ano de 2006, alegando que o fez ‘conforme decorre do disposto no n.º 2 do artigo 66.º da lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro’. (...) Desta forma o incentivo à extinção da instância, em termos de IRC consiste no seguinte: · Possibilidade de considerar como custo fiscal as dívidas de clientes que, por força da desistência, se tornem incobráveis. Para ser considerado custo fiscal não fica dependente dos resultados de um dos processos do Artigo 39.º do Código do IRC, ou seja, não é necessário que o crédito incobrável resulte de processo especial de recuperação de empresa e proteção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência; Por outro lado, para que se considere o valor dos pedidos como encargos fiscalmente dedutíveis é necessário que se cumpram os seguintes requisitos, cumulativamente: · Ocorra a extinção da instância nas ações cíveis declarativas e executivas que tenham sido propostas até 30 de Setembro de 2005, em razão de desistência do pedido, de confissão, de transação ou de compromisso arbitral; · As desistências tenham ocorrido até 31 de Dezembro de 2006; · As ações sobre os créditos não correspondam a entidades entre as quais existam relações especiais, nos termos definidos no n.º 4 do artigo 58.º do CIRC; · O valor da dívida esteja inscrito na contabilidade e tenha sido considerado o respetivo proveito. Neste sentido, são considerados como custos fiscais os valores dos créditos devidamente registados na contabilidade. Ou seja, o referido incentivo fiscal é aplicável aos créditos que se encontrem contabilizados e que por via da desistência do pedido sejam objeto de anulação. No caso em análise, não foi cumprido o estipulado na alínea d) anterior relativamente aos valores juros de mora e às custas judiciais: · O valor dos juros de mora não foi debitado aos clientes e por conseguinte não foi contabilizado como proveito contabilístico nem fiscal não podendo agora ser fiscalmente dedutível. · As custas judiciais também não foram debitadas aos clientes nem foram contabilizadas como proveitos contabilísticos nem fiscais, não podendo agora ser fiscalmente dedutíveis. Aliás, estas custas já foram relevadas na contabilidade no momento em que ocorreram, tendo sido consideradas fiscalmente dedutíveis no respetivo exercício em que foram registadas. Desta forma, não podem ser deduzidas novamente, pois, caso acontecesse, estaria a ser duplicada a sua dedutibilidade fiscal. (...) III.2 Imposto em falta III.2.1 Imposto Sobre o Rendimento III.2.1.1 Tributações Autónomas (...) De acordo com os elementos incluídos pelo sujeito passivo no dossier fiscal, bem como pelos recolhidos na ação inspetiva, verificou-se que o contribuinte considerou como encargos relacionados com viaturas ligeiras os constantes das seguintes contas de custo respeitantes a: · Reintegrações; · Combustíveis; · conservações e reparações; · seguros; · rent-a-car; · imposto sobre veículos; · AOV (Aluguer Operacional de Viaturas) e; · ALD (Aluguer de Longa Duração). (...) Verificou-se, no entanto, que o sujeito passivo não considerou como elegíveis para efeitos de tributação autónoma as seguintes contas de custos relativas a veículos ligeiros de passageiros ou mistos:
Apesar de os referidos encargos não estarem explicitamente previstos no referido n.º 5 do art.º 81.º como ‘encargos relacionados com viaturas ligeiras’, estão sujeitos a tributação autónoma por força do n.º 3 do mesmo artigo, visto que estamos perante encargos dedutíveis relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas. Veja-se a este propósito a posição expressa por Joaquim Fernando da Cunha Guimarães relativamente ao n.º 4 (atual n.º 5) do art.° 81.º: ‘(...) contêm a palavra ‘nomeadamente’ (ou designadamente ou exemplificadamente) pelo que não houve a preocupação do legislador em elencar todos os encargos, daí que se devam incluir outros não aí mencionados (v.g. portagens, encargos com estacionamento, aluguer de garagens)’. Relativamente aos encargos com ALD, o mesmo autor afirma ‘Relativamente aos juros (...) incluídos na renda também incide a referida tributação autónoma (...)’” (cfr. doc. de fls. 196 a 272 do suporte físico do processo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). 5) Em resultado da referida ação inspetiva, foram efetuadas, entre outras, as seguintes correções aritméticas ao IRC da Impugnante do exercício de 2006:
- cfr. doc. de fls. 196 a 272 do suporte físico do processo; 6) A Impugnante foi notificada do teor do Relatório de Inspeção Tributária pelo ofício n.º ...74, de 26/08/2008 - cfr. doc. de fls. 195 do suporte físico do processo; 7) Com base nas correções propostas no Relatório a que alude o ponto 4), foi efetuada a liquidação adicional n.º ...39, de 03/09/2008, relativa a IRC e juros compensatórios no montante de € 540.370,15, o qual, feito o acerto com a liquidação anterior relativa ao mesmo exercício (n.º ...03), resultou o valor a pagar de € 201.878,21, com data limite de pagamento em 22/10/2008 - cfr. docs. de fls. 181 e 182 do suporte físico do processo; 8) Em 13/11/2008 o Serviço de Finanças ... instaurou o processo executivo n.º ...46 para cobrança da dívida referida no ponto antecedente, encontrando-se o mesmo suspenso por prestação de garantia - cfr. doc. de fls. 101 e informação de fls. 211 e 212 do processo administrativo apenso; Mais se provou que: 9) Para efeitos da sua inserção nas apólices de seguros de doença contratadas pela Impugnante, os trabalhadores são agrupados em níveis funcionais; 10) A [SCom03...], S.A. (ora Impugnante) adquiriu à [SCom06...] as ações da [SCom07...], S.A., ficando a deter 100% do capital desta sociedade, cujo nome foi posteriormente alterado para [SCom02...], S.A. (doravante, [SCom02...]); 11) No dia 13/02/2004 a [SCom07...], S.A. (futura [SCom02...]) assinou com a [SCom03...], S.A. um contrato (“asset transfer agreement”) pelo qual aquela adquiriu as torres de telecomunicações (2152 sites) que pertenciam a esta última sociedade, tendo o valor do negócio ascendido a cerca de € 147.000.000,00 - cfr. doc. de fls. 350 a 401 do suporte físico do processo; 12) Na mesma data, em 13/02/2004, a [SCom07...], S.A. assinou com a [SCom03...], S.A. um contrato de prestação de serviços (“master service agreement”) associado à utilização, gestão e manutenção dos sites transferidos, válido por três anos e renovável por duas vezes, por igual período - cfr. doc. de fls. 402 a 438 do suporte físico do processo; 13) A realização de cada uma das prestações acessórias pela [SCom03...], S.A. à sua participada [SCom02...] foi acompanhada de uma carta com o seguinte teor: “Exmo. Senhor, Vem-se por este meio comunicar a V. Exa. que esta sociedade pretende realizar a entrega de prestações acessórias no montante de (...) a favor dessa sociedade. Estas prestações têm um caráter voluntário e são de natureza gratuita, devendo integrar o capital próprio da sociedade. Mais se comunica que as prestações acessórias deverão seguir o regime das prestações suplementares no que diz respeito à sua restituição. Pela [SCom03...], S.A.” - cfr. docs. de fls. 443 a 456 do suporte físico do processo; 14) A presente impugnação deu entrada em juízo no dia 15/12/2008 - cfr. data do fax indicada na petição inicial a fls. 1 do suporte físico do processo. * Factos não provados Não há factos que cumpra julgar não provados com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito. * Motivação A convicção do Tribunal baseou-se no exame das informações e dos documentos que constam dos autos e do processo administrativo apenso, nos termos expressamente referidos no final de cada facto, bem como nos depoimentos prestados pelas testemunhas «AA», «BB», «CC» e «DD». O facto vertido no ponto 9) resultou do depoimento de «AA», que à data dos factos exercia funções na Companhia de Seguros [SCom08...], a qual, por sua vez, trabalhava diretamente com o grupo « X ». A testemunha explicou, de forma séria, clara e objetiva, qual a motivação da realização de seguros de saúde pela Impugnante, bem como as suas características essenciais e respetivas vantagens. Mais referiu que a inserção dos trabalhadores nas diferentes apólices contratadas é feita de acordo com critérios objetivos, que são normais e perfeitamente regulamentados, não havendo discriminações entre colaboradores. No entanto, quanto a esta matéria a testemunha apenas esclareceu que tal inserção se faz por referência aos níveis funcionais dos trabalhadores, sem todavia concretizar o funcionamento de tal critério e sem caracterizar com mais detalhe os referidos grupos funcionais. Acresce que, quando inquirida sobre a justificação para as diferenças existentes nas apólices, reconheceu que poderia haver situações de exceção ao nível dos quadros superiores da empresa, aos quais seria possível, por exemplo, optar por abdicar do seguro de saúde para poderem beneficiar de outras vantagens em seguros de vida com mais cobertura. Quanto aos factos indicados nos pontos 10), 11) e 12), o Tribunal formou a sua convicção com base no conteúdo do relatório de inspeção tributária e nos documentos mencionados no final de cada facto, conjugados com os depoimentos de «BB» e de «CC». Com efeito, na matéria relacionada com a operação de realização de prestações acessórias, em 2006, pela [SCom03...], S.A. (agora a Impugnante) à [SCom02...], ambas as testemunhas revelaram um conhecimento direto e objetivo dos factos alegados, atentas as funções por si desempenhadas na área financeira junto das empresas do grupo « X ». Descreveram, assim, de modo sério e assertivo, quer o negócio de transferência de ativos (torres de telecomunicações) da [SCom03...], S.A. para a [SCom02...] (mostrando-se tais depoimentos em conformidade com o teor do relatório da ação inspetiva nessa matéria), quer os motivos subjacentes à realização de prestações acessórias, não remuneradas, como forma de dotar esta última sociedade dos meios financeiros necessários ao pagamento da contrapartida por aquela transmissão. No que respeita, em particular, à possibilidade de a [SCom02...] ter procurado financiar-se junto de entidades terceiras como alternativa à realização das prestações acessórias, ambas as testemunhas foram confrontadas com o Anexo V do relatório de inspeção tributária (de fls. 284 do suporte físico do processo) e explicaram que aquela sociedade teria grandes dificuldades em obter financiamento externo, adiantando para tal algumas razões como o facto de ser uma entidade nova, com capital social mínimo e sem ativos que pudessem suportar os encargos financeiros daí decorrentes, bem como o facto de não possuir bens que pudessem garantir o empréstimo ou a existência de limitações ao endividamento adicional por parte da [SCom02...]. Nesta sequência, a testemunha «CC» afirmou também que os empréstimos concedidos pelo BEI (Banco Europeu de Investimento) não seriam comparáveis aos empréstimos de que eventualmente poderia beneficiar a [SCom02...], atendendo à diferente natureza dos empréstimos. A testemunha «DD», inspetor tributário que elaborou o relatório da ação inspetiva dos presentes autos, prestou um depoimento sólido e seguro, confirmando, no essencial, o teor daquele relatório na parte relativa aos pressupostos e métodos adotados pela Administração Fiscal nas correções efetuadas em sede de preços de transferência, pelo que o seu depoimento apenas nessa medida foi valorado. Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados em virtude de constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito e não terem relevância para a decisão da causa. ** Apreciação jurídica dos recursos. Em primeiro lugar analisaremos o recurso apresentado pela Fazenda Pública, que se refere somente ao enquadramento do benefício fiscal de criação líquida de emprego. Segundo a Fazenda Pública, a sentença incorreu em erro de julgamento de Direito, por errónea interpretação e aplicação do disposto no art. 17.º do EBF, na redação aplicável, quando decide que “o limite do montante de 14 vezes o salário mínimo nacional reporta-se aos encargos mensais suportados com os trabalhadores que cumpram os requisitos enunciados no n.º 1 e não à majoração propriamente dita”. Entende a Fazenda Pública, em síntese, que a própria majoração em 50% dos encargos mensais correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contratos sem termo, com idade não superior a 30 anos, está abrangida pelo limite previsto no n.º 2 do art. 17.º do EBF, na redação aplicável à data dos factos. A situação em apreço, já foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Administrativo, bem como por este Tribunal Central Administrativo Norte em diversos Acórdãos, com cujo teor concordamos, por isso aderimos a essa jurisprudência, que devidamente adaptada, aqui damos por reproduzida. Assim, no Acórdão deste TCA Norte proferido em 27 de maio de 2021, no processo n.º 700/09.0BEPRT, decidiu-se, o seguinte: «A Lei n.º 72/98, de 3 de novembro, introduziu no EBF o artigo 48.º-A, com a seguinte redação «Criação de empregos para jovens 1 - Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%. 2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o ordenado mínimo nacional. 3 – A majoração referida no n.º 1 terá lugar num período de cinco anos a contar do início de vigência do contrato de trabalho». Com a renumeração operada pela Lei n.º 198/2001, de 3 de julho, este artigo passou a ser o artigo 17.º do EBF. Posteriormente, a Lei do Orçamento do Estado para 2003, procedeu a uma alteração do n.º 2 do artigo 17.º do EBF, o qual passou a dispor que «Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado». Porque esta nova redação se apresenta menos favorável do que a redação anterior, importa ter presente o artigo 10.º do EBF (atual artigo 11.º) que estabelece «As normas que alterem benefícios fiscais convencionais, condicionados ou temporários, não são aplicáveis aos contribuintes que já aproveitem do direito ao benefício fiscal respectivo, em tudo que os prejudique, salvo quando a lei dispuser em contrário». Assim, a nova redação só era aplicável relativamente aos encargos com a criação liquida de postos de trabalho ocorrida a partir de 2003. A questão que se coloca consiste, assim, unicamente, em determinar se, relativamente à majoração dos encargos suportados em 2006 com a criação liquida de postos de trabalho em 2001 e 2002, o limite de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado previsto no referido preceito legal se aplica aos encargos mensais correspondentes à criação líquida de emprego ou se aplica aos encargos mensais depois de acrescidos da majoração de 50%, como alega a Recorrente, Fazenda Pública. Sobre esta questão, pronunciou-se já o Supremo Tribunal Administrativo, uniforme e reiteradamente nos Acórdãos de 16/05/2012, lavrado in Rec. n.º 0283/12, (aliás no qual se fundamentou, e bem, a sentença a quo), de 17/02/2016, lavrado in Rec. nº 0974/15, de 31/03/2016, lavrado in Rec.nº 0569/14 e de 21/06/2017, lavrado in Rec. nº 0519/16, todos disponíveis em www.dgsi.pt.. Assim, por adesão in totum à sua fundamentação, transcrevemos o vertido no aresto de 17/02/2016, lavrado in Rec. nº 0974/15,:«(…)Lido atentamente o preceito legal em crise, antes e depois da alteração legislativa que ao mesmo foi introduzida, podemos surpreender com meridiana clareza que enquanto na redacção aplicável ao caso concreto dos autos se estabelecia um montante máximo do benefício por referência aos encargos mensais efectivamente ocasionados pelo novo posto de trabalho, já na nova redacção tal montante máximo do benefício era estabelecido por referência à própria majoração considerada anualmente. Assim, facilmente se percebe que a interpretação que a Fazenda Pública faz do preceito em análise não encontra apoio no próprio texto da Lei, violando, por consequência, as regras estabelecidas no artigo 9º, nº 2, do Código Civil. Na verdade, o limite imposto ao benefício na redacção que agora nos interessa, reporta-se unicamente ao valor dos encargos mensais e não ao valor dos encargos mensais acrescidos da majoração de 50%, nada na lei permite uma tal interpretação. Ou seja, o nº 1 do artigo 17º esclarece que o valor dos encargos é levado a custo em valor correspondente a 150%, ou seja, o encargo real efectivamente suportado pela entidade patronal é acrescido de metade, e o nº 2, que a consideração de tais encargos deve respeitar o tecto máximo mensal de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, isto é, o valor máximo a considerar para estes efeitos seria sempre o do valor mensal correspondente a 14 vezes o salário mínimo mensal mais elevado, acrescido de metade desse mesmo valor. Com a alteração introduzida pelo Orçamento de Estado de 2003 é que o legislador impôs de forma expressa um limite à própria majoração, condicionando-a a um período anual e já não mensal, portanto, diferentemente do que anteriormente acontecia. De resto, esta foi já a interpretação que este Supremo Tribunal deu a este preceito legal no acórdão datado de 16/05/2012, processo n.º 0283/12, tendo-se aí referido: “A redacção da norma à data dos factos (nº 1), conforme a recorrida também refere nas suas alegações, é muito clara ao referir que “os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho … são levados a custo em valor correspondente a 150%”, acrescentando o nº 2 que “o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional”. Quer isto dizer que, este benefício fiscal atribuído aos empregadores corresponde no máximo a 14 vezes o salário mínimo nacional, acrescido de 50% desse valor, isto é, acima desses valores já não haverá tal benefício e abaixo deles, haverá uma majoração de 50%. A interpretação da recorrente só tem fundamento com a nova redacção em vigor a partir de 2002, já que, aí sim, se estabelece um montante máximo da majoração anual e não um montante máximo de encargos mensais. Neste caso, o montante máximo a deduzir como custo fiscal tem como limite o montante equivalente a 14 vezes o salário mínimo nacional.” (realce nosso)». Face ao exposto, carece de razão a Fazenda Pública, pelo que se julga improcedente seu recurso. * Passemos agora à análise do recurso apresentado pela Impugnante. * Alega a Impugnante, ora Recorrente, que deviam ter sido admitidos os custos com os seguros de doença ou seguros de saúde, referindo que o Tribunal menciona haver diferenciação de trabalhadores abrangidos pelas apólices, por isso devem enquadrar-se no n.º 2 do artigo 40.º do CIRC e devem ser considerados como um custo fiscal. A sentença recorrida considerou não estar verificado um critério objetivo e idêntico para todos os trabalhadores em relação aos seguros em apreço. Apreciando. Está em causa a interpretação e aplicação da admissibilidade de encargos com seguros de doença ou se se quiser seguros de saúde, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, mas desde que verificados os requisitos estabelecidos no artigo 40.º do Código do IRC. Nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: Alínea d) encargos de natureza administrativa, tais como remunerações, ajudas de custo, pensões ou complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social. Esta alínea deve, ainda, ser conjugada com o disposto no n.º 4 do mesmo preceito, nos termos do qual: «exceto quando estejam abrangidos pelo disposto no artigo 40.º, não são aceites como custos os prémios de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como as importâncias despendidas com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares de segurança social que não sejam considerados rendimentos de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2 º do Código do IRS». Por sua vez, o art.º 40.º, n.º 2, do Código do IRC dispõe que: «são igualmente considerados custos ou perdas do exercício, até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao exercício, os suportados com contratos de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como com contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social, que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, benefícios de saúde pós-emprego, invalidez ou sobrevivência a favor dos trabalhadores da empresa». Os requisitos cujo preenchimento é necessário para a aplicação do normativo acima citado, no que respeita aos encargos com seguros de doença, vêm descritos no n.º 4 do art.º 40.º do Código do IRC, nos seguintes termos: «Aplica-se o disposto nos nos. 2 e 3 desde que se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições (…): a) os benefícios devem ser estabelecidos para a generalidade dos trabalhadores permanentes da empresa ou no âmbito de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho para as classes profissionais onde os trabalhadores se inserem; b) os benefícios devem ser estabelecidos segundo um critério objetivo e idêntico para todos os trabalhadores ainda que não pertencentes à mesma classe profissional, salvo em cumprimento de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho; c) sem prejuízo do disposto no n.º 6, a totalidade dos prémios e contribuições previstos nos n.os 2 e 3 deste artigo em conjunto com os rendimentos da categoria A isentos nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais não devem exceder, anualmente, os limites naqueles estabelecidos ao caso aplicáveis, não sendo o excedente considerado custo do exercício; (…) f) a gestão e disposição das importâncias despendidas não pertençam à própria empresa, os contratos de seguros sejam celebrados com empresas de seguros que possuam sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em território português, ou com empresas de seguros que estejam autorizadas a operar neste território em livre prestação de serviços, e os fundos de pensões ou equiparáveis sejam constituídos de acordo com a legislação nacional ou geridos por instituições de realização de planos de pensões profissionais às quais seja aplicável a Diretiva n.º 2003/41/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de junho, que estejam autorizadas a aceitar contribuições para planos de pensões de empresas situadas em território português; g) não sejam considerados rendimentos do trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS». Sobre questão, já se pronunciou este TCA Norte, nos Acórdãos n.º 2303/11.0BEPRT de 11/03/2021, n.º 579/06.3BEPRT de 29/04/2021 e n.º 2113/08.1BEPRT, de 17/02/2022, em que então em questão aos mesmos sujeitos processuais, aqui em causa, pese embora sejam diferentes os anos do imposto. Por semelhança ao caso sub judice e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (cfr. artigo 8.º n.º 3 do Código Civil), acolhemos a argumentação jurídica aduzida no acórdão n.º 2303/11.0BEPRT desta Secção, uma vez, que não ocorre justificação para dessa jurisprudência nos afastarmos, passaremos a transcrever, a fundamentação de tal aresto, aderindo a todo o seu discurso fundamentador com as adaptações indispensáveis à situação jurídica em análise. Nele constando que: «(…) Como não o fez, o julgamento de jure que se impõe é a de que os custos em causa, embora em abstracto dedutíveis, não satisfazem, em concreto, os requisitos das alíneas a) e b) do nº 4 do artigo 40º do CIRC (numeração imediatamente anterior a 2009). Porém, tratando-se de um direito do sujeito passivo, incumbe a este alegar, no processo tributário, os factos concretos de que decorre que a atribuição de tais seguros obedeceu aos requisitos do nº 4 do mesmo artigo, designadamente os das alíneas a) – universalidade do seguro ou cumprimento de instrumento de regulamentação colectiva do trabalho – e b) – atribuição dos benefícios segundo um critério objectivo e idêntico para todos os trabalhadores ou em cumprimento de instrumento de regulamentação colectiva do trabalho.(…)” A sentença recorrida, nos presentes autos, após fazer uma interpretação dos art.º 40.º e 23.º do CIRC concluiu que: “(…) Enfim, às despesas suportadas pela sociedade impugnante com o pagamento das apólices de seguro dos familiares dos seus trabalhadores não poderá ser reconhecido o carácter de realização de utilidade social, pelo que, nessa consonância, estes encargos não são fiscalmente dedutíveis nos termos do artigo 40.º, n.º 2, do Código do IRC [ex vi artigo 23.º, n.º 4] [neste sentido, vejam-se o acórdão do TCA-Sul, de 25 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 05073/11, as sentenças proferidas por este Tribunal, em 29 de Setembro de 2013, no processo n.º 815/10.1BEPRT, em 11 de Abril de 2016, no processo n.º 3156/06.0BEPRT [transitada em julgado] e, em 28 de Abril de 2016, no processo n.º 2727/08.0BEPRT; vide ainda a decisão do Centro de Arbitragem Administrativa, de 22 de Outubro de 2013, proferida no processo n.º 69/2013-T, acessível em https://caad.org.pt] Acresce que, conforme já se teve oportunidade de adiantar, independentemente dos factos instrumentais especificamente relevados no probatório dos presentes autos [Pontos N) e O) dos factos provados], a verdade é que, depois de fundadamente indiciada a dispensabilidade de tais custos por parte dos serviços de inspecção tributária, jamais a impugnante logrou fazer prova da genérica alegação segundo a qual as referidas despesas terão sido causa societatis e, por isso, indispensáveis à obtenção de proveitos ou manutenção da sua fonte produtora [artigo 23.º, n.º 1, do Código do IRC]. (…)». Na situação em apreço nestes autos, conforme dado por assente no ponto 4) do probatório, durante o exercício de 2006, foram celebrados seis contrato de seguro, cujas apólices estabeleciam condições diferentes para os trabalhadores, algumas abrangendo cônjuges e filhos e outras não abrangendo estes familiares, para além de se verificarem diferenças significativas nos prémios de cada apólice. Por sua vez, no ponto 9) da matéria de facto, foi dado por assente, que para efeitos de celebração dos contratos de seguro de doença, os trabalhadores eram agrupados por níveis funcionais. Resulta da motivação vertida na sentença (vide pág. 42) sobre este facto 9), que não foi possível apurar-se qual o critério que presidiu à distinção entre os níveis funcionais dos trabalhadores, nem se percebeu ao certo o que eram esses níveis funcionais. Ou seja, não se percebem os motivos da distinção entre uns e outros trabalhadores, pelo que não se deteta um critério objetivo e idêntico para todos os trabalhadores com o intuito de celebração desses contratos de seguro, pelo que não se mostra preenchido o pressuposto estabelecido na alínea b) do n.º 4 do artigo 40.º do Código do IRC. Tanto mais, que não consta da matéria de facto qualquer justificação objetiva ou constante de qualquer acordo de contratação coletiva. Nem essa justificação objetiva é agora trazida em sede de recurso. Desta forma, pode concluir-se que, os custos suportados com os seguros de doença dos familiares dos trabalhadores, embora em abstrato possam ser dedutíveis não relevarem, em concreto, para a determinação da matéria tributável em IRC, por não satisfazem em concreto, os requisitos conjugados do art.º 23.º e das alíneas a) e b) do nº 4 do artigo 40.º do CIRC. Face ao exposto, improcede o recurso quanto a este segmento. * De seguida, alega a Recorrente, que a sentença errou na análise da situação relativa aos preços de transferência, uma vez que não está em causa a violação do princípio da plena concorrência, tanto mais que a Impugnante não atuou fora do quadro da realização voluntária de prestações com um vinculo duradouro, a titulo complementar aos (para além dos) meios de financiamento previstos nos artigos 287.º (prestações acessórias) e 243.º e ss. (suprimentos não remunerados) do CSC - ou porque tal possibilidade lhe estivesse absolutamente vedada ou porque não tivesse sido essa a sua vontade. Mais refere a Recorrente que não existe qualquer razão para tratar as prestações complementares facultativas aludidas de modo diverso das prestações acessórias ou dos suprimentos, o Juiz da causa tinha a obrigação de reconhecer que, face à lei comercial, as mesmas podem não ser remuneradas: a ausência de uma obrigatoriedade estatutária não afeta a possibilidade de elas poderem vir a ser realizadas pelos sócios com causa na relação jurídica-societária existente. Diz, ainda, a recorrente que as operações em causa não são subsumíveis ao princípio de plena concorrência do artigo 58.º do Código do IRC, uma vez que não é possível estabelecer uma fiel comparação entre as condições praticadas nas mesmas e aquelas que subjazem a uma operação entre empresas independentes - as características económicas das situações são completamente distintas. Relativamente a matéria idêntica àquela que está ora em apreciação, já se pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte no Acórdão proferido em 13/05/2021, no processo n.º 1719/08.3BEPRT, assim como no Acórdão tirado no processo n.º 02897/09.0BEPRT, em 26/10/2023 (disponível em www.dgsi.pt), tendo ambos concluído da mesma forma, ou seja, que as prestações acessórias, não se podem enquadrar no regime dos preços de transferência. Transcrevemos do Acórdão n.º 02897/09.0BEPRT, a seguinte passagem: «Julgamos que todo o arrazoado da sentença, tal como o discurso fundamentador do RIT, transcrito a propósito do facto provado 21-A, laboram num pressuposto de facto que não só não está demonstrado como é desmentido pelos factos julgados provados, quer no procedimento quer no processo tributário, a saber, o de que se tratou de financiamentos, no sentido de empréstimos não remunerados, isto é, sem juros. E com efeito, a tratar-se de um financiamento gratuito nesse sentido, não teríamos a menor dúvida de que haveria um preço de mercado – a saber, uma taxa de juro a ficcionar para efeitos fiscais, nos termos do artigo 58º do CIRC. Contudo, o que o RIT relata e corresponde aos factos provados na sentença recorrida – máxime ao teor da discriminação dos factos 12, 16 e 17 – é uma prestação pecuniária sem retorno directo, destinada a integrar o a conta do capital próprio, portanto, os activos da beneficiária. Efectivamente ficou provado que as prestações em causa se referem a “fundos concedidos” pela impugnante às agrupadas (corpo do artigo 12); que a Impugnante, em carta enviada às beneficiárias, lhes comunicou que se tratava de prestações voluntárias e de natureza gratuita, devendo integrar o capital próprio da sociedade (artigo 17); e que as prestações foram contabilizadas na conta do activo imobilizado, “prestações acessórias” pela Impugnante e na conta de capital próprio pela beneficiária. Note-se: se se tratasse de um empréstimo não remunerado, isto é, sem juros, mas ainda assim de um empréstimo, os fundos concedidos passariam a ser passivo das beneficiárias e activo da SGPS, na conta de empréstimos a terceiros, (conta 2…). Mas não foi o caso: o prestador, ao dar indicação de que os fundos concedidos fossem contabilizados como capital próprio, ficando, assim, as quantias prestadas a integrar como activo a situação líquida da participada, manifestou claramente a vontade de fazer não um empréstimo, mas uma prestação pecuniária sem retorno. É certo que na carta acima referida a Impugnante, além de designar os fundos como “prestações acessórias” – que não são, pois ocorrem fora ou independentemente dos pressupostos preconizados no artigo 287º do Código das Sociedade Comerciais (CSC) – manda que a restituição das mesmas deverá seguir o regime das prestações suplementares – que também não são, pois ocorrem fora ou independentemente do preconizado no artigo 210º e sgs do mesmo diploma – no que diz respeito à sua restituição. Porém, a escolha convencional de tal regime de restituição só contribui para o negócio se afastar ainda mais de um mútuo gratuito: “Artigo 213.º (Restituição das prestações suplementares) 1 - As prestações suplementares só podem ser restituídas aos sócios desde que a situação líquida não fique inferior à soma do capital e da reserva legal e o respectivo sócio já tenha liberado a sua quota. 2 - A restituição das prestações suplementares depende de deliberação dos sócios. 3 - As prestações suplementares não podem ser restituídas depois de declarada a falência da sociedade. 4 - A restituição das prestações suplementares deve respeitar a igualdade entre os sócios que as tenham efectuado, sem prejuízo do disposto no n.º 1 deste artigo. 5 - Para o cálculo do montante da obrigação vigente de efectuar prestações suplementares não serão computadas as prestações restituídas. Como se vê, não se trata aqui da regular restituição do objecto de um mútuo, ao cabo de um prazo convencionado, mas da restituição de prestações suplementares do capital, exigidas aos sócios, sujeita a múltiplas e incertas condicionantes no seu se, no seu quando e no seu como e sempre sem qualquer remuneração. Importa ter presente que nos termos do artigo 21º nº 2 do CSC – “É proibida toda a estipulação pela qual deva algum sócio receber juros ou outra importância certa em retribuição do seu capital ou indústria.” Por sua vez, a contabilização destas prestações, pela Impugnante, na conta do activo 41.. do POC (investimentos financeiros), pode corresponder à expectativa da participação nos lucros da participada e ou de a prestação vir a integrar, nessa medida, a participação da Impugnante no capital da participada, o que é um activo transaccionável, mas de modo algum legitima a conclusão de que se tratou, afinal, uma operação de financiamento subsumível ao conceito de mútuo gratuito. Enfim a Impugnante, em termos de facto, “injectou”, enquanto sócia, dinheiro nas suas participadas, sem qualquer direito a reavê-lo e sem cobrar qualquer preço, sem qualquer contrapartida que não a expectativa dos dividendos que pudessem vir a resultar, mediatamente, da sua participação no capital social da agrupada, tendo esta lucros, além de uma eventual mais valia em futura venda da ou de uma sua parte no capital da mesma. Assim sendo as prestações em causa são, pela sua intrínseca natureza, logicamente insusceptíveis de ter réplica entre empresas não especialmente relacionadas, não têm correspondência possível no mercado, pelo que lhes não é aplicável o disposto no nº 1 do artigo 58º do CIRC. Mesmo que se entendesse aplicável tal regime, sempre nos depararíamos com a evidência de que o método escolhido para determinar o preço de transferência – uma taxa de juro de um empréstimo – nada tem a ver com a realidade do negócio que se provou e muito menos é susceptível de se aplicar a uma supostamente equivalente operação entre empresas não especialmente relacionadas. Pelo exposto, julgamos que a resposta à presente questão é positiva, devendo o recurso e a impugnação proceder também na correspondente parte, isto é, indo as liquidações impugnadas anuladas também na parte em que relevam da tributação, como recurso ao artigo 58º do CIRC, das prestações a que se refere o artigo 12 da discriminação dos factos provados.». Na situação dos presentes autos, verificamos também existir uma carta, em tudo idêntica, à referida no transcrito Acórdão (bem como no outro processo acima assinalado). Carta essa, aliás mencionada no Relatório de Inspeção, bem como transcrita no ponto 13) da matéria de facto, que refere: «Vem-se por este meio comunicar a V. Exa. que esta sociedade pretende realizar a entrega de prestações acessórias no montante de (…) a favor dessa sociedade. Estas prestações têm um caráter voluntário e são de natureza gratuita, devendo integrar o capital próprio da sociedade. Mais se comunica que as prestações acessórias deverão seguir o regime das prestações suplementares no que diz respeito à sua restituição. Pela [SCom03...], S.A.». Portanto, a situação em apreço, é idêntica à tratada naqueles dois citados acórdãos, pelo que a Administração Fiscal não tinha que acrescentar à matéria tributável da Impugnante do exercício de 2006 o valor total de € 4.801.649,42, por não estar em causa uma situação de preços de transferência. Face ao exposto, procede o recurso da Impugnante, na parte ora em análise. * Invoca a Recorrente que o custo fiscal não admitido em relação ao valor que decorre da desistência e da incobrabilidade de créditos reclamados judicialmente, não poderia o Tribunal a quo deixar de atender ao facto de os juros de mora estarem, sem duvida nenhuma, contidos na previsão do n.º 2 do artigo 66° da Lei n.º 60-A/2005, podendo, nessa medida, ser deduzidos ao lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC, sem necessidade de, como propugna a decisão de que se recorre, terem sido previamente registados como proveitos. Alega a Recorrente que, quanto às custas judiciais, também elas podem ser objeto de dedução, nos termos gerais, na medida em que, com a desistência dos pedidos e com a consequente impossibilidade de a Impugnante cobrar os montantes incorridos aos clientes cuja conduta faltosa originou a proposição das ações, verificou-se também a impossibilidade de registar um proveito no mesmo valor das quantias cobradas. Defender o contrário é, assim, ignorar a lógica sistemática do regime do IRC vertido no respetivo código, o que se imputa à sentença de que se recorre, que a este particular aspeto da argumentação nem sequer se logrou pronunciar. Relativamente às questões em apreço já se pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte no Acórdão proferido em 27 de maio de 2021, no processo n.º 700/09.0BEPRT, com cujo teor concordamos, e, com as devidas adaptações aqui acolhemos. Assim, neste Acórdão, decidiu-se o seguinte: «Dispõe o artigo 66º, nºs 1 e 2 da Lei 60-A/2005 que: “1 - Nas acções cíveis declarativas e executivas que tenham sido propostas até 30 de Setembro de 2005, ou que resultem da apresentação à distribuição de providências de injunção requeridas até à mesma data, e venham a terminar por extinção da instância em razão de desistência do pedido, de confissão, de transacção ou de compromisso arbitral apresentados até 31 de Dezembro de 2006, há dispensa do pagamento das custas judiciais que normalmente seriam devidas por autores, réus ou terceiros intervenientes, não havendo lugar à restituição do que já tiver sido pago nem, salvo motivo justificado, à elaboração da respectiva conta. 2 - Quando a extinção da instância prevista no número anterior se funde em desistência do pedido, o valor deste é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS que aufiram rendimentos da categoria B e possuam contabilidade organizada.” Nos termos do actual artigo 296º do Código de Processo Civil (anterior art. 305º), a toda a causa deve ser atribuída um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica do pedido. Preceitua o artigo 297º do CPC (anterior art. 306º) que se pela acção se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa e se na mesma acção se cumular vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles, contudo, se forem pedidos juros já vencidos e os que se vencerem na pendência da causa, na fixação do valor apenas se atenderá para o efeito o dos interesses já vencidos. Ressalta, assim, manifesto que os juros de mora já vencidos integram o valor do pedido. Ora, lido preceituado nos nºs 1 e 2 do artigo 66º da Lei 60-A/2005, cremos poder afirmar que ocorrendo a extinção da instância com fundamento na desistência do pedido, a parte adquire sem mais, o direito a deduzir o montante correspondente ao valor do pedido (capital e juros de mora vencidos à data da propositura da acção) ao lucro tributável, uma vez que que nenhuma outra exigência se encontra plasmado no referido normativo que limite o direito à dedução do valor do pedido ao lucro tributável. Porém, em sintonia com a AT e fazendo apelo ao vertido no Acórdão do STA de 25.01.2006, proferido in rec. 0830/05, entendeu o tribunal a quo que, para além da extinção da instância com fundamento na desistência do pedido, se mostrava “exigível que os montantes em causa tenham sido inscritos como proveitos (com respectiva provisão) se relevado contabilisticamente à altura em que foi proposta a acção ou posteriormente no momento da respectiva percepção”, vindo a concluir que, apesar dos juros de mora integrarem o conceito de valor do pedido, uma vez que no caso vertente não foram registados como proveitos, também não podem ser registados, posteriormente, como custo. Todavia, não pode este tribunal acompanhar a solução preconizada pelo tribunal a quo, pois que, para além de contrariar a letra da lei, olvida in totum a natureza excepcional do incentivo concedido pelos nºs 1 e 2 do artigo 66º da Lei 60-A/2005, de 30/12, para o descongestionamento das pendências judiciais. Salvo sempre o devido respeito por diverso entendimento, lido o aresto invocado em abono do decidido, nada aponta que lhe possa aproveitar, nele se não descortinando a menor alusão a um incentivo excepcional e transitório, pois, como ali se esclarece, a questão a resolver naqueles autos era a de saber “se os juros de mora peticionados em acções propostas em tribunal devem ser incluídas ou não na rubrica proveitos, relativamente ao exercício em que a acção foi proposta ou se, pelo contrario, podem ser incluídos no exercício em que tais juros de mora vierem a ser percebidos “, face aos rigores impostos pelo princípio da especialização dos exercícios. Ora, como é sabido, o texto da lei constitui o ponto de partida do processo hermenêutico e também um seu limite, na medida em que não é possível considerar aqueles sentidos que não tenham nas palavras da lei qualquer apoio, «um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (Cfr. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, págs. 182 e 188/189.) (cfr. art. 9.º, n.º 2, do Código Civil (CC)), sendo que in casu aquela não sustenta o decidido. Se o legislador tivesse querido que para efeitos de determinação da matéria tributável em sede de IRC, apenas fosse dedutível o valor do pedido desde que este se mostrasse registado como proveito e provisionado, por certo, tê-lo-ia dito de forma inequívoca. Ora, ao ter escolhido uma fórmula da qual não resulta, ainda que minimamente, essa exigência, havemos de concluir que não a quis erigir como requisito para a dedução do valor do pedido (cfr. art. 9.º, n.º 3, do Código Civil), mas tão somente condicionou tal incentivo à extinção da instância, com fundamento na desistência do pedido, pelo que não podia, assim, a AT fazer depender a dedutibilidade dos custos em apreço de quaisquer requisitos adicionais àqueles que a lei estabelece. Acresce que não podemos deixar de ter presente as especiais circunstâncias em que a lei foi elaborada, as condições específicas do tempo em que foi aplicada e os evidentes objectivos do legislador, pelo que a não ser, assim, considerado, o efeito útil dos incentivos previstos seria porventura mais exíguo, uma vez que deixaria de contemplar situações em que, como a dos autos, os sujeitos passivos não tivessem provisionado os valor dos juros de mora peticionados em acções judiciais pendentes. Já no que concerne à correcção no segmento que se reporta a custas judiciais, e tendo presente o supra expostos relativamente à determinação do valor da acção, permitimo-nos adiantar que não assiste razão à Recorrente, porquanto as custas judiciais não integram o valor do pedido, e como tal o respectivo valor nunca seria dedutível ao lucro tributável, nos termos dos nº1 e 2 do art.66º da Lei nº 60-A/2006, de 30 de Dezembro.». Acrescentemos, quanto a este último aspeto que as custas judiciais não são proveito, uma vez que a parte vencedora seria reembolsado no que pagou, pelo que existiria uma soma nula, logo não haveria um proveito. No que concerne ao presente processo, a Inspeção Tributária mencionou no Relatório (transcrito na sentença, para esta situação a pág. 32), o valor total de pendências judiciais em que ocorreu desistência dos processos, o capital em dívida pelos clientes, os juros de mora previstos, o montante das custas judiciais e o valor total pedido em Tribunal. Portanto, a Inspeção Tributária verificou o valor dos juros de mora previstos, só não os admitindo por não estarem registados na contabilidade como créditos não cobrados. Ora, em acrescento ao que já acima ficou referido, pode dizer-se, por um lado, que a possibilidade de desistência das ações, só surge com a Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro, portanto já no fim do período económico; e, por outro lado, atenta a pendência das ações, eventual possibilidade de transação, mostrava-se prudente não ter contabilizado os juros, pois, conforme é sabido pelos profissionais do foro, prescindir de juros pode ser determinante para se chegar a um acordo. Assim, caso houvesse contabilização dos juros e depois existisse acordo, com os juros prescindidos, não seria a melhor forma de tratar contabilisticamente o assunto. Em face do exposto, julga-se procedente o recurso da Impugnante na parte referente à correção da matéria tributável relativamente à dedução dos juros de mora que decorrem da desistência e da incobrabilidade de créditos reclamados judicialmente. Julga-se improcedente a parte do recurso da Impugnante na parte respeitante à dedução das custas judiciais. * Invoca, ainda, a empresa Recorrente que, em relação à tributação autónoma referente a juros de ALD, portagens e estacionamentos, a sentença limitou-se a constatar o tipo de encargos em questão, que a própria Impugnante não refuta terem existido, mas que entende não poderem ser tributados por não se conterem na previsão legal do artigo 81.º, nos. 3 e 5 do Código do IRC. A sentença recorrida considerou que, não obstante as referidas despesas não estarem taxativamente previstas no régie legal aplicável, a norma procede a uma enumeração exemplificativa, onde os encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros em apreço se enquadram, por isso sujeitas a tributação autónoma. Comecemos por analisar a situação relativa aos juros com ALD. Ora, para o efeito, dispunha o artigo 81.º, nos seus números 3 e 5, do Código do IRC, na redação em vigor à data dos factos tributários, que: «3 - São tributados autonomamente, à taxa de 5%, os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e os relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, motos ou motociclos, efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjectivamente e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola”. (…) 5 - Consideram-se encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, as reintegrações, rendas ou alugueres, seguros, despesas com manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização.». Em relação à tributação autónoma efetuada sobre os juros do ALD, acolhemos a argumentação jurídica aduzida no acórdão n.º 2303/11.0BEPRT, proferido em 11/03/2021, por este TCA Norte, uma vez, que não ocorre justificação para dessa jurisprudência nos afastarmos, pelo que passaremos a transcrever, a fundamentação de tal aresto, aderindo a todo o seu discurso fundamentador com as adaptações indispensáveis à situação jurídica em análise. Desta forma, consta do mencionado Acórdão, o seguinte discurso: «(…) A recorrente sustenta que só devem ser tributadas as despesas realmente não incorridas para os fins da empresa, o que decorre, até, da natureza forfetária da tributação. Porém, o desígnio legislativo desta anomalia que sempre é tributar uma despesa num imposto sobre o rendimento, e, ainda mais, uma despesa aceite como custo, reside precisamente numa deliberada cegueira do Legislador relativamente ao fim concreto e real de cada despesa, de modo a que todas sejam tributadas, dissuadindo, assim, o excesso de custos formalmente imputados aos fins da empresa mas susceptíveis de aproveitamento individual ou também individual. Portanto são irrelevantes os fins concretos (da empresa ou, na realidade, particulares) das despesas desconsideradas pela Impugnante mas consideradas pela AT para tributação autónoma, desde que abrangidas pelos nºs 3 e 5 do artigo 81º (Actual 88º) do CIRC. Admitimos a natureza exemplificativa do nº 5 do artigo 81º (actual 88º) do CIRC, porém, com as cautelas metodológicas recomendadas pelo princípio da legalidade em direito fiscal, analisado, aqui, na necessidade da previsão em lei, das realidades objecto da incidência tributária (cf. artigos 8º nº 1 da LGT e 103º nº 2 da Constituição). Tomados de tais cautelas, julgamos que, se é certo que as menções expressas no citada normativo não esgotam as espécies de objectos de despesa tributáveis, também o é que, em homenagem ao princípio da legalidade na determinação da incidência dos impostos, as outras realidades assimiláveis ao nº 3 do artigo 81º mediante a exemplificação do nº 5 hão-de ser apenas aquelas que tiverem a mesma ou análoga natureza, no sentido de relevarem de uma relação com o veículo, ao menos, análoga à que ocorre nas despesas expressamente enunciadas no nº 5. Nesta ordem de pensamento, o pagamento dos juros de um ALD haverá de ser tributado. Com efeito, tratando-se do cumprimento em ultimo termo, de uma obrigação acessória da renda de um contrato aluguer, esse, expressamente previsto no nº 5, a sua natureza não é diversa, não há uma diferença de essências entre este pagamento e o do aluguer, ou, se há, trata-se, ainda assim, de uma natureza análoga à do da dívida da renda do aluguer. Não se diga, com a Recorrente, que assim se está a discriminar negativamente, para efeitos tributários, as sociedades mais endividadas relativamente às menos endividadas. De modo nenhum: se são as sociedades mais endividadas que mais sofrem as consequências negativas fiscais da tributação autónoma dos juros de ALD de veículos, então não se está a tratar desigualmente situações iguais, mas sim tratar desigualmente o que é desigual, aliás, segundo essa desigualdade, o que já é um modo de realizar a igualdade tributária.». Desta forma, acolhendo a jurisprudência deste TCA Norte, temos de concluir que os juros com ALD preenchem o conceito legal de encargo relacionado com viaturas ligeiras, pelo que devem ser objeto de tributação autónoma em sede de IRC. No que concerne às despesas com portagens e estacionamentos, atento o recente Acórdão de Uniformização de jurisprudência proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, aderimos ao mesmo, por também concordarmos com o seu teor. Trata-se do Acórdão do STA n.º 10/2024, proferido em 23 de maio de 2024 e publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 131, de 9 de julho de 2024, que fixou a seguinte jurisprudência: «os encargos incorridos pela ora Rcte. com taxas de portagens e taxas ou preços de estacionamento são de qualificar como “relacionadas com” as viaturas ligeiras de passageiros em causa, no sentido e para os efeitos da tributação autónoma prevista nas disposições conjugadas do n.º 3, alíneas a) a c), e do n.º 5, ambos do artigo 88.º do CIRC, na redação do artigo 2.º (Alteração ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas) da Lei n.º 82-C/2014, de 31 de Dezembro». Para melhor apreensão deste aresto, transcreve-se a seguinte passagem: «5 — Consideram-se encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, depreciações, rendas ou alugueres, seguros, manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização. Da leitura atenta destas duas normas ressalta à evidência que a norma ínsita no n.º 3 estabelece o regime regra, trata-se de uma norma de incidência tributária, que determina, no essencial, que são tributados autonomamente os encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, efetuados ou suportados por sujeitos passivos que exerçam, a título principal, atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola. Trata-se não só de encargos efetivamente suportados, mas, além disso, que tenham uma relação com viaturas ligeiras de passageiros. Bastando que tenham essa dupla natureza para que possam ser reconduzidos à norma. Determinar se um encargo está ou não relacionado com uma viatura ligeira é, tão-somente uma questão de interpretação da norma, de mera incidência, pelo que a discussão assentará unicamente na existência ou não de um nexo desse encargo com a viatura e, nunca, se o encargo tem ou não a ver com a atividade de natureza comercial, industrial, ou agrícola do sujeito passivo. Não se concebendo o afastamento de qualquer encargo, designadamente por ter uma relação comprovada com a atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, pois o legislador pretendeu abranger todos os encargos que tenham um nexo com a viatura ligeira. Desconsiderando o propósito desses encargos, como aliás acontece com a viatura relativamente à qual, por ser ligeira, é difícil determinar se o uso é pessoal ou profissional e, por consequência, está sempre sujeita, independentemente do uso que tenha, a tributação autónoma. O espírito é, portanto, precisamente o mesmo e abranger não só as viaturas ligeiras, mas todos os encargos com elas relacionados. Não havendo espaço para, com base numa pretensa presunção, se afastar a incidência sobre essas despesas, ainda que supostamente estejam relacionadas com a atividade empresarial; sendo, portanto, essa eventual relação irrelevante no âmbito da tributação autónoma. Sobre esta questão já se pronunciou este Supremo tribunal no sentido de que as disposições legais que estabelecem a tributação autónoma objeto dos n.os 3 e …do artigo 88.º do Código do IRC constituem normas de incidência tributária que não consagram qualquer presunção que seja passível de prova em contrário, cf. acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 24.03.2021, proferido no recurso n.º 021/20.7BALSB. O nexo dos gastos com taxas de portagem e o preço pago pelo estacionamento com as viaturas ligeiras é linear no entender deste Tribunal e, portanto, claramente subsumível ao n.º 3 do artigo sob análise. Jamais podendo ser retirado do facto de o n.º 5 incluir exemplos de outros encargos que se consideram relacionados com viatura ligeiras, numa abordagem clarificadora e coadjuvante, que essa enumeração é taxativa, e, portanto, que visa excluir outros encargos que não os aí referidos. O uso do advérbio nomeadamente atesta isso mesmo. Como, aliás, ocorre noutros artigos do CIRC, designadamente no artigo 23.º que tem uma ligação estreita com o artigo 88.º, na medida em que é com base nele que é dada relevância fiscal aos encargos suportados pelos sujeitos passivos de IRC. Ora, a técnica legislativa no referido artigo 23.º é precisamente a mesma, sendo também usado o advérbio nomeadamente. Também aí, a enumeração dos gastos é meramente exemplificativa e não taxativa, como exige o contexto da atividade empresarial onde, tendo em contas as diferenças entre as diversas atividades seria, até por uma questão de praticabilidade, impossível identificar todos os encargos relevantes. No âmbito das tributações autónomas esta abertura do tipo justifica-se não só pelas mesmas razões de praticabilidade, mas também por razões de combate ao abuso — ideia muito presente na implementação das tributações autónomas. Se a lista fosse fechada, facilmente se criaria espaço para múltiplas despesas que, apesar de terem um nexo óbvio com as viaturas, por não estarem expressamente previstas, frustrariam a intenção do legislador ao criar a tributação autónoma, pois cairiam numa situação de não incidência. A própria doutrina tem admitido de forma mais ou menos pacífica que, não obstante se verificar um domínio da tipicidade nas matérias fiscais, esta não é necessariamente fechada, especialmente nas situações mais propensas ao abuso. Pode ser aventado ainda, que ao contrário do decidido no acórdão fundamento, os encargos enunciados no n.º 5 são os que assumem um carácter obrigatório para que possa ocorrer o uso do veículo por parte do contribuinte, quer os inerentes à sua disponibilidade, depreciações, rendas ou alugueres e impostos incidentes sobre a sua posse, quer os inerentes à sua utilização, seguros, manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua utilização. Ou seja, como já foi afirmado, desta enumeração não resulta, não pode resultar, uma compressão do âmbito de abrangência da norma do n.º 3, uma vez que o legislador aí se referiu a encargos como sinónimo de custos, despesas, ou gastos, tanto mais que na norma do n.º 5 apenas são referidos os encargos com as viaturas ligeiras de passageiros que assumem o carácter de indispensabilidade tributária ou material para que a viatura possa ser utilizada com carácter de normalidade pelo contribuinte, tendo, por isso, uma enumeração meramente exemplificativa. Todos os outros encargos que ocorram por força da utilização da viatura e que sejam de natureza não indispensável ou resultem de uma opção do utilizador, resultante da sua liberdade de escolha, encontram-se abrangidos pelo disposto no n.º 3. Aliás não faria sentido que os encargos obrigatórios que permitem a circulação da viatura na via pública, como p.ex. os seguros, combustíveis e impostos, estejam abrangidos pela norma de incidência e as taxas de portagem e a taxa e o preço do estacionamento, que resultam de uma opção do utilizador, não estejam. Igualmente, o argumento de que os encargos previstos no n.º 5 encontram a sua justificação para efeitos de tributação autónoma por se reportarem difusamente à utilização do veículo, quer quanto ao tempo quer quanto ao modo, em comparação com as taxas de portagem e a taxa ou o preço pago pelo estacionamento que estariam directamente relacionadas com utilizações concretas e determinadas, situadas e situáveis no tempo, de determinado veículo, não aporta uma mais valia à discussão da questão, uma vez que, também nestes casos, apesar de se poder identificar em concreto uma deslocação no âmbito profissional, não é certo que tais custos não possam, ainda assim, abranger simultaneamente utilizações de diferente natureza. Esta interpretação contraria, até, a razão de ser da própria existência do instituto da tributação autónoma que tem ínsita a ideia de desmotivar uma prática que, para além de afetar a igualdade na repartição de encargos públicos, poderá envolver situações de menor transparência fiscal, e é explicada por uma intenção legislativa de estimular as empresas a reduzirem tanto quanto possível as despesas que afetem negativamente a receita fiscal. O legislador tem em vista desincentivar a realização de certas despesas, admitindo a dedutibilidade do custo, mas reduzindo a vantagem fiscal por via da tributação autónoma, assim se compreendendo que a tributação incida não sobre a percepção de um rendimento mas sobre a realização de despesas, cf. acórdão anteriormente citado. Podemos, assim, concluir que a melhor interpretação das normas em apreço é aquela que foi feita na decisão recorrida ao incluir no âmbito da sua previsão os gastos com taxas de portagem e do preço pago pelo estacionamento dos veículos ligeiros de passageiros.». Termos em que, improcede, igualmente, nesta parte, o recuso deduzido pela Impugnante. * Face ao exposto, verifica-se que apenas o recurso da Impugnante é julgado parcialmente procedente, na parte relativa aos preços de transferência ou prestações acessórias e na parte referente à correção da matéria tributável, relativamente à dedução dos juros de mora que decorrem da desistência e da incobrabilidade de créditos reclamados judicialmente. * No concerne às custas, atenta a improcedência do recurso da Fazenda Pública, ficam as custas do seu recurso a seu cargo. Relativamente ao recurso da Impugnante, considerando o seu provimento parcial, com a revogação parcial da sentença e ao facto de a Recorrida Fazenda Pública não ter contra-alegado, são as custas fixadas pelo decaimento, sem prejuízo de não ser devida taxa de justiça nesta instância de recurso, pela Recorrida Fazenda Pública, por não ter contra-alegado – vide artigos 527.º, nos. 1 e 2 e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil. * Considerando que o valor da presente Impugnação é de € 2.994.160,44 (dois milhões novecentos e noventa e quatro mil cento e sessenta euros e quarenta e quatro cêntimos), cumpre apreciar a possibilidade de dispensa do remanescente da taxa de justiça. Tem sido entendido pela jurisprudência que a complexidade da causa ou a conduta das partes constituem fatores que devem ser atendidos para a dispensa do remanescente da taxa de justiça, mas outros fatores também podem ser relevantes para o efeito, em função do princípio da proporcionalidade, designadamente a natureza e a atividade exercida pelos sujeitos processuais, o valor dos interesses económicos em discussão ou os resultados obtidos. Veja-se, por exemplo, o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 06/05/2016, proferido no proc. n.º 03192/11.0BEPRT, cujo sumário é: I – O artigo 6º n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais concede ao juiz, oficiosamente ou a instâncias tempestiva das partes, um poder/dever de dispensar, nas causas de valor superior a 275.000,00€, o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final, em função da apreciação casuística da especificidade da situação em causa, atendendo, designadamente, à complexidade da causa e à conduta processual das partes, ou seja à falta de especial complexidade da mesma e ao comportamento processual positivo das partes, de recíproca correcção, cooperação e de boa-fé. II – Dessa forma permite-se ao juiz adequar o valor da taxa de justiça aos custos que, em concreto, o processo consumiu ao sistema de administração de justiça, em ordem à salvaguarda, entre outros valores, dos da proporcionalidade e da justiça distributiva na responsabilização/pagamento das custas processuais. Relativamente a este aspeto cumpre referir que a conduta das partes não foi belicosa, que muito embora o processo ofereça alguma complexidade, não se revela manifestamente superior àquela que ocorre em situações similares a esta, para além de que não houve lugar a especiais ou demoradas diligências, assim como pela salvaguarda do princípio da proporcionalidade, deve ser dispensado o remanescente da taxa de justiça. ** Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário: I - Relativamente à criação líquida de emprego, o benefício fiscal atribuído aos empregadores, estabelece um montante máximo da majoração anual e não um montante máximo de encargos mensais. II - Os custos suportados com os seguros de doença dos familiares dos trabalhadores, embora, em abstrato, possam ser dedutíveis não relevarem, em concreto, para a determinação da matéria tributável em IRC, por não satisfazem em concreto, os requisitos conjugados do art.º 23.º e das alíneas a) e b) do nº 4 do artigo 40.º do CIRC. III – Prestações acessórias concedidas a empresas agrupadas, que passam a integrar o capital social da empresa financiada, não se podem enquadrar no regime de preços de transferência. IV – Os juros de mora, relativos aos créditos reclamados judicialmente, integram o valor do pedido, pelo que o respetivo montante é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável, em caso de incobrabilidade de tais créditos. V – As custas judiciais pagas nos processos em que ocorreu desistência do processo, não compreendem o valor da ação, pelo que não se podem considerar um proveito não alcançado, por isso não podem ser objeto de dedução à matéria tributável. VI – Estão sujeitas a tributação autónoma os encargos ou as despesas tidas com viaturas ligeiras, relativas a juros de ALD, portagens e estacionamentos. * * Decisão Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Subsecção Tributária Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em: 1) julgar improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública; 2) julgar parcialmente procedente o recurso deduzido pela Impugnante, na parte relativa aos preços de transferência ou prestações acessórias e na parte referente à correção da matéria tributável, relativamente à dedução dos juros de mora que decorrem da desistência e da incobrabilidade de créditos reclamados judicialmente, revogando-se a sentença nessa parte; e julgar improcedendo, no demais, o recurso da Impugnante. * * Custas a cargo da Recorrente Fazenda Pública, quanto ao seu recurso; e custas pelo decaimento, na 1.ª e na 2.ª instância, em relação ao recuso da Impugnante, não sendo devida taxa de justiça nesta instância de recurso pela recorrida Fazenda Pública, por não ter contra-alegado. Decaimento, que se fixa em 70% para a Fazenda Pública e em 30% para a Impugnante. * * Porto, 30 de janeiro de 2025. Paulo Moura Cristina da Nova Graça Martins – em substituição |