Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
R STAR , Ldª e ROCHINHA , Ldª, com os demais sinais dos autos, recorrem da decisão proferida pelo Mmº Juiz do TAF de Viseu a fls. 957/961, proferida no âmbito de reclamações que ambas deduziram contra actos praticados pelo órgão da execução fiscal no processo executivo pendente no Serviço de Fianças da Feira contra a sociedade Transdesa, Ldª, decisão que determinou a extinção da instância (por litispendência) relativamente à reclamação deduzida pela primeira sociedade e que negou provimento à reclamação deduzida pela segunda.
As alegações dos recursos mostram-se rematadas com o seguinte quadro conclusivo:
Quanto ao recurso da R STAR, Ldª
DA LITISPENDÊNCIA
1. Só a identidade total ou parcial inclusiva de objectos do processo (causas de pedir) determina a verificação da litispendência; a identidade não inclusiva ou prejudicial apenas poderá levar, tão só, à suspensão da instância por determinação do juiz – art. 279° C.P.Civ.
2. No requerimento apresentado no Proc. nº 550/06.5BEVIS - e que, para os devidos efeitos, aqui se dá por reproduzido - a recorrente RSTAR arguiu a falta de citação: a causa de pedir é a decisão da Fazenda plasmada no ofício nº 1764 de 23-02-2006 e que indeferiu o pedido de declaração de falta de citação operada no processo de execução fiscal Proc. Exec. Fiscal nº 0094200501007025.
3. Nos presentes autos a recorrente RSTAR pede que, concedendo-se provimento à reclamação apresentada, se anulem todos os actos subsequentes:
a) ao despacho que ordenou o prosseguimento da execução contra a recorrente pelo valor penhorado, designadamente, o datado de 22.07.2005 e constante de fls. 88 do proc. executivo;
b) ao despacho que ordenou a citação da recorrente pelo valor do crédito penhorado, designadamente, o constante de fls. 95 do proc. executivo;
c) ao despacho que ordenou a penhora dos créditos de bens de que a recorrente é titular, nomeadamente, dos créditos de que a mesma é titular perante os seus clientes, designada mente, o datado de 02.02.2006 e 03.02.2006 e constantes de fls. 231 e 236 do proc. executivo;
d) ao despacho datado de 13.02.2006 que indeferiu o pedido de cancelamento das penhoras de crédito.
4. Aliás, e como vem entendendo a jurisprudência, “São distintas as situações em que ocorre no processo de execução fiscal falta de citação e nulidade de citação.
5. Sendo os actos distintos, praticados em circunstâncias de tempo diferentes e com pedidos diferentes, conquanto semelhantes, não ocorre, decisivamente, a invoca da litispendência.
6. No caso dos demais despachos objecto de impugnação nos presentes autos não se verifica uma identidade ou, quanto muito, verificar-se-á apenas uma identidade parcial em relação à decisão objecto de impugnação no Proc. 550/06.5BEVIS - a decisão da Fazenda plasmada no ofício nº 1764 de 23-02-2006 - como antecedente prejudicial para a apreciação dos demais.
7. A relação de prejudicialidade atribui ao tribunal, mesmo o de recurso, o poder de suspender a instância na causa dependente (art. 279° nº 1 C.P.C.) - Teixeira de Sousa, As Partes..., § 19°-3-c), suspensão que durará até ao trânsito da decisão final do inventário.
QUANTO AO DEMAIS
8. Nos termos do disposto na alínea e) do artigo 224º do Código do Processo e do Procedimento Tributário, a recorrente RSTAR não reconheceu a dívida e provou a inexistência de quaisquer débitos à empresa Transdesa Ldª;
9. E, assim sendo, como é, dever-se-ia, tão somente, dar cumprimento ao disposto no art. 858° do CPC.
10. A recorrente RSTAR não foi notificada de qualquer outra diligência ou obrigação, relacionada com qualquer outro penhor ou reversão: ou seja, não foi notificada de qualquer despacho que haja recaído sobre o requerimento por si apresentado, o que criou nela a convicção de convencimento da Direcção Geral dos Impostos, quanto à matéria alegada.
11. Nos termos do disposto no artigo 191° do CPPT, a instauração de processos de valor superior a 250 unidades de conta, têm que ser citados ao devedor: a reversão, porque não se trata do devedor originário, mas sim de um seu substituto, por maioria de razões, deve seguir a via da citação.
12. Também nos termos do disposto no artigo 224 do CPPT, a penhora de créditos será feita por meio de auto, o que não aconteceu no caso presente.
13. Daquele auto, nos termos da alínea a) do nº 1 daquele artigo, deve haver a informação inequívoca da posição do pretenso devedor, perante o crédito a penhorar, bem como a informação se o crédito, a existir, é líquido e vencido.
14. A recorrente RSTAR, demonstrou quando notificada que não tinha qualquer crédito sobre a Transdesa, pelo que não lhe podem ser assacadas ou revertidos quaisquer processos de execução fiscal daquela empresa.
15. Os despachos proferidos nos autos - e que aqui se dão por reproduzidos - são, por isso, ilegais como ilegais e inadmissíveis são as penhoras realizadas – nº 3 do art. 278° do CPPT.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS
16. Nos termos do art. 55° da LGT “A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”.
17. Ora, “Concluída a instrução... os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta” - trata-se de formalidade absolutamente essencial.
18. No âmbito do processo da formação da decisão administrativa em causa não foi a recorrente RSTAR notificada que o seu requerimento havia sido indeferido.
19. A não audiência da reclamante antes da decisão constitui nulidade insuprível por violação do direito de audiência, violando-se uma formalidade absolutamente essencial imposta pelo art. 267°, n° 4, da Const. da Rep. Port.
20. A nulidade cometida, inquina a própria decisão, que, assim, ficou a sofrer da nulidade prevista na al. d) do nº 1 do art. 668° CPC, aplicável ao caso.
21. Refira-se, para terminar e por mera cautela caso se alegue nesse sentido, que o art. 416° CPP está ferido de inconstitucionalidade material, por violação do disposto naqueles nºs 1 e 5 do art. 32° da CRP, na interpretação - adoptada no caso vertente - que permite o visto e emissão de pareceres sem conceder ao interessado o direito de se sobre ele se pronunciar seguidamente.
DA INSUFICIENTE FUNDAMENTAÇÃO
22. O acto sub-judice, ao afectar os direitos em que o ora recorrente RSTAR estava legitimamente investido carecia de fundamentação.
23. A fls. 888 a autoridade limita-se a exarar despacho datado de 22.07.205 a considerar que a Requerente não havia comprovado a existência do crédito e que deveria prosseguir a execução contra esta.
24. Nos requerimentos efectuados pela reclamante a fls. esta alegou, muito mais, do que simplesmente “que não era titular de qualquer débito”, designadamente, que a notificação efectuada a fls. 87 não tinha qualquer sentido sendo, além do mais, nula.
25. Não é, contudo, pela autoridade fiscal tomada posição concreta sobre os factos alegados pela recorrente, o que determina a existência de um vício de forma, a implicar a anulabilidade do acto – arts. 268/3 da CRP.
Quanto ao recurso da ROCHINHA, Ldª
DA FALTA DE CITAÇÃO
26. Como resulta «ex-abundanti» dos autos – e nem sequer a Fazenda coloca em causa – a recorrente ROCHINHA não foi citada da instauração de qualquer outro processo de execução - designadamente aquele outro processo nº 0094 200 50100 7025 – mas apenas do processo nº 0094 200 40101 7250.
27. Esta falta de citação é tão evidente que o órgão de execução fiscal, através de uma notificação enviada à ROCHINHA pretende efectuar uma rectificação da citação enviada pelo ofício nº 5807, de 2005-0-25 (...) informando que por simples erro de escrita foi indicado o processo de execução fiscal 0094200401017250 quando se pretendia indicar o processo de execução fiscal nº 0094200501007025 - cfr doc. nº 3 junto com a PI.
28. Contudo, os motivos desta pretensa rectificação não colhem: não houve lapso de escrita, mas indicação errada e errada na essência a contribuinte de uma outra lide fiscal, perante a qual esta não tinha de ter preocupações de defesa.
29. Suscitar a atenção do executado para outro processo em que tudo é diferente daquele para que se quer chamar, é sem dúvida um caso de falta de citação.
30. E tendo sido este o motivo da reclamação, primeiro acto havido pela parte na lide em aberto, à contribuinte não pode, desde logo e com este fundamento, deixar de lhe ser conferido mérito, fazendo vencimento de causa.
ART. 224º, Nº 1. AL. E)
31. Nos termos do disposto na alínea e) do nº 1 artigo 224° CPPT, a recorrente ROCHINHA não reconheceu a dívida e provou a inexistência de quaisquer débitos à empresa Transdesa-Transportes de Carga e Materiais Ldª - cfr. doc. 1 e 2 juntos à P.I.
32. E, assim sendo, como é, dever-se-ia, tão somente, dar cumprimento ao disposto no art. 858.° do CPC.
33. A recorrente ROCHINHA não foi notificada de qualquer outra diligência ou obrigação, relacionada com qualquer outro penhor ou reversão: ou seja, não foi notificada de qualquer despacho que haja recaído sobre o requerimento por si apresentado, o que criou nela a convicção de convencimento da Direcção Geral dos Impostos, quanto à matéria alegada.
34. Os despachos proferidos nos autos - e que aqui se dão por reproduzidos - são, por isso ilegais como ilegais e inadmissíveis são as penhoras realizadas – nº 3 do art. 278° do CPPT.
VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DA AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS
35. Dá-se aqui, por brevidade de exposição, tudo quanto a esta questão se alegou supra em relação à recorrente RSTAR.
36. Também em relação à recorrente ROCHINHA, no âmbito do processo da formação da decisão administrativa que foi objecto de reclamação, não foi esta notificada que o seu requerimento havia sido indeferido.
37. A não audiência da recorrente ROCHINHA antes da decisão constitui nulidade insuprível por violação do direito de audiência - trata-se de uma formalidade absolutamente essencial imposta pelo art. 267°, nº 4, da Const. da Rep. Portuguesa.
DA INSUFICIENTE FUNDAMENTAÇÃO
38. Também aqui, por brevidade de exposição, tudo quanto a esta questão se alegou supra em relação à recorrente RSTAR.
39. A fls. a autoridade limita-se a exarar despacho datado de 22.07.05 a considerar que a recorrente ROCHINHA não havia comprovado a existência do crédito e que deveria prosseguir a execução contra esta, sem invocar, de forma concreta, quais as razões que lhe permitem concluir nesse sentido.
40. A decisão ora impugnada violou as disposições legais supra citadas.
Termos em que, revogando-se a decisão proferida, farão V. Exas. a habitual JUSTIÇA.
* * * A recorrida não apresentou contra-alegações.
O Ministério Público emitiu o douto parecer que consta de fls. 1031/1033 e onde, em suma, defende o seguinte:
- relativamente ao recurso da R STAR, a sentença recorrida deve ser anulada e ordenada a remessa dos autos ao Tribunal recorrido para que aí se proceda à recolha dos elementos necessários ao perfeito conhecimento da questão da litispendência, elementos que não se encontram fixados na decisão e não constam dos autos;
- relativamente ao recurso da ROCHINHA, deve ser mantida a sentença recorrida, já que esta não é passível de censura.
Com dispensa dos legais vistos (art. 707º nº 2 do CPC), cumpre decidir.
* * * Na sentença recorrida julgou-se provada a seguinte matéria de facto:
1. Foi instaurado, em 14-04-2005, no Serviço de Finanças de Feira 1, contra a TRANSDESA , LDª, o processo de execução fiscal 0094200501007025, tendo por base dívida referente a IVA de vários períodos do ano de 2004, no montante total de € 3.281.914,38 - cfr. fls. 4 a 8, que aqui dou por reproduzidas, o mesmo se dizendo das demais infra referidas;
2. Porque chegou “ao conhecimento deste Serviço de Finanças…que o executado será titular de créditos, de que são devedores as sociedades ROCHINHA Ldª…”, por despacho datado de 01-06-2005, foi determinada imediata penhora dos referidos créditos – cfr. fls. 29;
3. Do despacho acabado de aludir foi a Reclamante ROCHINHA notificada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 224º do CPPT e 856º do CPC, na pessoa de Maria Elisa , tendo respondido através de requerimento datado de 16-06-2005, o seguinte: “...não nos é possível dar resposta à mesma em virtude de estar a decorrer uma auditoria com vista ao apuramento do montante da eventual dívida existente” - vide docs. de fols. 36, 37, 56 e 881 a 815. A este propósito não esqueço o alegado na Reclamação nos artigos 4 a 6, vide fols. 765 e doc. de fols. 735, mas este documento não está datado; por outro lado, não consta do processo executivo, ao contrário do já aludido a fls. 56. Por outro lado, como conciliar as duas posições expressas nos dois documentos. Estava a fazer o apuramento ou não havia dívidas. Pelo que já se referiu cumpre entender como consolidado o facto referido no doc. de fol. 56;
4. O Órgão de Execução fiscal através de carta registada com AR, datada de 25-07-2005, remetido para a sede da Reclamante ROCHINHA, assinado por “Paulino” em 26-07-2005, citou-a nos termos do artigo 224º e al. a) do art. 233º do CPPT. Para além do mais aí se referiu que “... decorrido que vai o prazo de 30 dias sem que tenham sido trazidos aos autos quaisquer elementos nem tenha sido efectuado à ordem do processo de execução fiscal quaisquer depósitos relativamente aos créditos penhorados, fica por este meio citada para proceder ao pagamento da dívida…” - vide fols. 97.Referiu-se no despacho de fols. 750 que o “Paulino” era trabalhado da Reclamante e, por essa razão, se encontraria na sede da mesma, local para onde foi remetida a citação. Sobre estes factos a Reclamante nada esclareceu limitando-se a referir que “um tal Paulo” que não representa a sociedade nem, tão pouco, tem alguma ligação à mesma. O local para onde foi remetida a citação era, nada mais nada menos, que a sede comum da originária devedora, da ora Reclamante e também da Reclamante R STAR. Sobre esta e outras relações entre as três sociedades vejam-se os documentos constantes de fols. 781, 782, informação de fols. 811 a 815 e 820 a 822. A conjugação da notificação e citação aludidas nesta e anterior alínea facilmente poderiam e deveriam levar a ora Reclamante a desfazer o equívoco que apresentou. Mais claramente se percebe a aludida facilidade se atentarmos no facto de ela ser executada apenas no processo em causa nestes autos, ou seja, os autos de execução 0094200501007025, vide a propósito despacho de fols. 760;
5. A Administração Fiscal emitiu certidão de notificação, datada de 08-02-2006, realizada na pessoa do sócio gerente da Reclamante ROCHINHA, Sr. Augusto “...notificação da rectificação operada na citação enviada pelo oficio n° 5807, de 2005-07-25, recebida pela sociedade em 2005-07-26, informando-o que por simples erro de escrita fora indicado o processo de execução fiscal nº 0094200401017250, quando se pretendia indicar o processo de execução fiscal nº 0094200501007025” - cfr. doc. de fols. 710;
6. A Reclamante, alegando que só no dia 14-02-2006 tomou conhecimento da citação referida em 3.1.4. veio, em 22-02-2006, perante o Exmº. Chefe do Serviço de Finanças de Feira1, arguir a nulidade da mesma por desrespeito das disposições legais aplicáveis; que só a partir de 08-02-2006 se começou a aperceber que algo não estaria correcto; alegou também os requisitos a que deve obedecer a citação dos responsáveis revertidos; haverá sempre nulidade insanável do título executivo por falta de requisitos essenciais previstos no artigo 165°, nº 1 al. b) do CPPT – cfr. fols. 695 a 732;
7. A presente Reclamação foi apresentada em 23-02-2006 – cfr. carimbo aposto na respectiva Petição Inicial, vide fls. 718;
8. Na Reclamação que originou os presentes autos disse-se, para além do mais, "que a manutenção da penhora sobre os créditos perante os seus clientes coloca em causa a viabilidade da empresa, porquanto esta fica sem meios para fazer face aos compromissos perante fornecedores, trabalhadores e o próprio Estado" - vide artigos 77º e78º a fols. 731;
9. A Entidade Reclamada pronunciou-se, em 24-02-2006, sobre a reclamação referida em 6. “indeferindo as pretensões manifestadas pela sujeito passivo” - vide fols. 718 a 732;
10. Na sequência de solicitações oriundas deste processo, o Serviço de Fianças da Feira1, remeteu a estes autos ofício datado de 18-12-2006 a informar “... O Processo de execução fiscal nº 009420040107250, se encontra findo desde 2006-10-10, por pagamento” – cfr. documento de fols. 938.
Constatando-se que a sentença recorrida não contém qualquer decisão atinente à materialidade fáctica subjacente ao julgamento que efectuou sobre a questão da litispendência, materialidade que se consegue, porém, descortinar da consulta dos autos (pese embora, e como realça o MºPº junto deste Tribunal, a respectiva consulta e análise se encontre bastante dificultada por virtude da sua paginação em duplicado, por vezes em triplicado, e da deficiente junção sequencial dos despachos e documentos), importa aditar ao probatório a seguinte matéria de facto, a qual, por se reportar a questão de conhecimento oficioso (litispendência), pode e deve também ser oficiosamente adquirida e fixada pelo Tribunal.
Termos em que, ao abrigo do disposto no artigo 712º nº 1 do CPC, se acorda em julgar ainda como provada a seguinte matéria de facto:
11. No dia 20 de Fevereiro de 2006, a R STAR fez juntar a esta execução fiscal nº 0094200501007025 o requerimento que se encontra documentado a fls. 581/ (Vol II), dirigido ao Chefe da Repartição de Finanças da Feira 1, para arguir perante ele a falta ou nulidade da sua citação e a falta de requisitos essenciais do título executivo, nos termos e com os fundamentos que aí deixou descritos e que aqui se têm por reproduzidos;
12. No dia seguinte, 21/02/2006, fez juntar à execução a reclamação que se encontra documentada a fls. 649/664 (Vol. III), dirigido ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, com vista a reclamar de vários actos praticados na execução (nos termos e com os fundamentos que aí se encontram descritos e que se dão por reproduzidos) e que eram os seguintes:
a) despachos que ordenaram o prosseguimento da execução contra a reclamante pelo valor penhorado, designadamente, o datado de 22.07.2005 e constante de fls. 88;
b) despacho que ordenou a sua citação pelo valor do crédito penhorado, designada mente o constante de fls. 95;
c) despachos que ordenaram a penhora dos créditos de bens de que ela é titular, nomeadamente, dos créditos de que é titular perante os seus clientes, designadamente, o datado de 02.02.2006 e 03.02.2006 e constantes de fls. 231 e 236;
d) despacho datado de 13.02.2006 que indeferiu o pedido de cancelamento das penhoras de crédito;
terminando por pedir ao tribunal a «anulação de todos os actos subsequentes ao despacho que ordenou o prosseguimento da execução contra a reclamante bem como a penhora dos créditos de bens de que a ora reclamante é titular, nomeadamente, dos créditos de que a mesma é titular perante os seus clientes, assim como dar-se provimento ao pedido de cancelamento das penhoras de crédito e revogar-se o despacho datado de 13.02.2006».
13. Esta reclamação deu origem à sentença que constitui o objecto do presente recurso – cfr. fls. 957/961;
14. O requerimento referido em supra 11 foi indeferido por despacho de Chefe da Repartição de Finanças proferido em 23/02/2006, na consideração de que não colhia a argumentação da falta de citação invocada pela R STAR nem ficara demonstrado que ela não chegara a ter conhecimento do acto – cfr. despacho que consta de fls. 716 e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
15. Desse despacho de indeferimento foi deduzida reclamação para o TAF de Viseu ao abrigo do disposto nos arts. 276º/278º do CPPT, que aí deu origem ao Processo Nº 550/06.5 BEVIS e onde foi lavrada decisão judicial de procedência da reclamação – cfr. fls. 789/800;
16. A Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional dessa decisão para o TCAN, e este, por acórdão proferido em 18/01/2007, concedeu-lhe provimento e revogou a decisão recorrida na consideração de que o despacho proferido pelo Chefe dão Serviço de Finanças, que indeferira a arguida nulidade de citação, não padecia de ilegalidade - fls. 1034 e segs.
* * * Tal como resulta do quadro supra exposto, a decisão recorrida foi proferida no âmbito de reclamações deduzidas ao abrigo do disposto nos arts. 276º/278º do CPPT contra actos praticados pelo órgão da execução fiscal no processo executivo nº 0094200501007025 pendente no Serviço de Fianças da Feira contra a sociedade “Transdesa-Transportes de Carga e Materiais, Ldª”, decisão que determinou a extinção da instância (por litispendência) relativamente à reclamação apresentada pela sociedade R STAR Ldª e que negou provimento à reclamação apresentada pela sociedade ROCHINHA , Ldª.
Posto que ambas as Reclamantes se insurgem contra a decisão, e que importa conhecer de ambos os recursos, começaremos pela análise do julgamento efectuado na reclamação deduzida pela R STAR e que se restringe à questão de saber se ocorre ou não a julgada excepção dilatória da litispendência.
Segundo a decisão recorrida – a qual não continha, como acima vimos, qualquer decisão atinente à materialidade fáctica subjacente ao julgamento que oficiosamente levou a cabo sobre esta questão – verificar-se-ia uma situação de litispendência entre o Processo Judicial de Reclamação nº 886/06.5.BEVIS e o Processo Judicial de Reclamação nº 550/06.5.BEVIS «considerando o que se pede, o processo executivo a que respeita e tudo o mais», pois que «facilmente se reconhecem os requisitos previstos no art. 498º do CPC.».
Ora, se o Mmº Juiz “a quo” tivesse tido o cuidado de colher e fixar a matéria de facto relevante para a decisão desta questão, certamente não teria incorrido no erro em que incorreu ao julgar verificada a mencionada excepção. Com efeito, e tal como resulta da materialidade fáctica que acima deixámos aditada ao probatório, enquanto o acto que constitui o objecto do Proc. nº 550/06.5.BEVIS é o despacho proferido em 23/02/06 pelo Chefe do Serviço de Finanças, que consta de fls. 716, e que indeferiu o requerimento que a R STAR apresentara três dias antes a arguir a nulidade da sua citação (cfr. pontos 11, 14 e 15 do probatório), já o objecto deste Proc. nº 886/06.5.BEVIS são vários actos anteriores àquele despacho (note-se que a presente reclamação judicial foi apresentada em 21/02/06, isto é, antes de ter sido proferida o despacho que veio a ser objecto do Processo de Reclamação nº 550/06.5.BEVIS) e que a Reclamante identifica do seguinte modo:
a) despachos que ordenaram o prosseguimento da execução contra si pelo valor penhorado, designadamente, o datado de 22.07.2005 e constante de fls. 88;
b) despacho que ordenou a sua citação pelo valor do crédito penhorado, designadamente o constante de fls. 95;
c) despachos que ordenaram a penhora dos créditos de bens de que ela é titular, nomeadamente, dos créditos de que é titular perante os seus clientes, designadamente, o datado de 02.02.2006 e 03.02.2006 e constantes de fls. 231 e 236;
d) despacho datado de 13.02.2006 que indeferiu o pedido de cancelamento das penhoras de crédito.
Ora, sabido que a litispendência vem definida no artigo 497º nº 1 do CPC e consiste na repetição de uma causa, estando a anterior ainda pendente, tendo por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou reproduzir uma decisão anterior; E que o artigo 498º nº 1 do mesmo Código diz que a causa se repete quando, simultaneamente, se verifique a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, esclarecendo os números seguintes quando ocorre tal identidade (há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica; há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico; e há identidade da causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico), logo se percebe que, no caso vertente, não se verifica essa tríplice identidade.
Com efeito, embora exista entre os dois processos uma identidade de sujeitos (pela qualidade jurídica em que ambos intervêm (a exequente e a credora/ executada R STAR), já não existe identidade de pedido e de causa de pedir, visto que têm por objecto actos distintos, causas de pedir não coincidentes e pedidos diferentes.
Não se pode esquecer que a causa de pedir na reclamação de actos praticados pelo órgão da execução fiscal consiste nos vícios concretos imputados pelo reclamante ao acto impugnado, pelo que só poderá haver identidade de causa de pedir, para efeitos de litispendência, quando é o mesmo o acto reclamado e se lhe imputa o mesmo vício já arguido em reclamação anteriormente interposta. O que não é o caso.
A Requerente fundou a reclamação que deu origem aos presentes autos (Proc. nº 886/06.5 BEVIS) em várias ilegalidades que teriam sido cometidas nos despachos que determinaram que ela procedesse, na execução contra a “Transdesa,” ao depósito de créditos de que seria titular sobre esta; no despacho que determinou que, na falta desse depósito, a execução prosseguisse contra ela pelo valor do crédito penhorado (ao abrigo do disposto no art. 224º do CPPT); no despacho que ordenou a penhora dos seus bens (créditos) para o pagamento da dívida ora em execução contra ela, e no despacho que indeferiu o pedido de cancelamento das penhoras de crédito.
E fundou a reclamação que deu origem ao Proc. nº 550/06.5.BEVIS na ilegalidade do despacho que desatendeu a arguição da falta ou nulidade da sua citação para a execução, por virtude de não se ter considerado que ocorrera, no acto de citação, erro na identificação do processo executivo, que a citação não fora recepcionada pelo seu gerente mas por um terceiro, que o acto de citação não vinha acompanhado de cópia do título executivo nem dos elementos indicados nos arts. 23º nº 4 e 22º nº 4 da LGT, que faltavam requisitos essenciais ao título executivo.
Logo, por aí, pois, se concluiria pela inexistência da predita excepção dilatória.
Razão por que não pode manter-se a sentença recorrida na parte que extinguiu a instância da Reclamação deduzida pela R STAR.
Assim sendo, e por consequência, impõe-se passar ao conhecimento, por substituição, do mérito da reclamação judicial deduzida perante o Tribunal “a quo”, apreciando os vícios aí imputados aos actos reclamados, em harmonia com o preceituado no art. 753º do CPC, posto que o seu conhecimento foi omitido na sentença por força da solução dada ao litígio, isto é, por ter ficado prejudicado pela julgada procedência da mencionada excepção dilatória. Esclareça-se que, por virtude a Recorrente ter, desde logo, produzido neste recurso alegações sobre as (omitidas) questões de mérito que se colocavam na reclamação judicial, sustentando a sua procedência, se torna inútil dar cumprimento ao disposto no nº 2 do art. 753º do CPC, passando-se, por via disso, ao imediato conhecimento dessas questões e que se traduzem em saber se os actos impugnados padecem das ilegalidades que a Reclamante lhes imputa.
Todavia, porque a sentença recorrida não fixou a materialidade necessária para o efeito, impõe-se proferir a respectiva decisão sobre a matéria de facto relevante, colhida dos elementos que constam do presente processo executivo.
Termos em que se acorda em julgar como provados os seguintes factos relevantes para a apreciação da reclamação deduzida pela R STAR Petróleos, Ldª:
17. Em 14/04/05 foi instaurado no Serviço de Finanças de Feira 1 o presente processo de execução fiscal 0094200501007025 contra a sociedade TRANSDESA , LDª, com vista à cobrança coerciva de dívidas de IVA no montante total de € 3.281.914,38 - cfr. fls. 4 e segs;
18. Em 1/06/05 o órgão da execução fiscal determinou a penhora de créditos da executada, designadamente da devedora R STAR , Ldª, e nessa sequência foi esta notificada nos termos que constam do ofício junto a fls. 34, lavrado em 1/06/05, do seguinte teor:
«Processo de Execução Fiscal nº 0094200501007025
Fica V. Exa. por este meio notificada de que, nos termos do disposto no art. 224º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e no art. 856º do Código de Processo Civil (CPC), por meu despacho de hoje, exarado no processo de execução fiscal supra identificado, ficam penhorados todos os créditos existentes nesta data a favor de TRANSDESA , Ldª, NIPC nº , com sede em S. Bento, freguesia de S. João de Vêr, concelho de S. Maria da Feira, incluindo, designadamente, os créditos titulados por facturas em recepção e conferência (ou seja, facturas recebidas ou não, que estão por lançar na conta corrente respectiva, por não terem chegado à empresa até essa data ou não terem sido conferidas) e, bem assim, os créditos que ainda não tenham sido objecto de facturação, embora já se encontrem constituídos.
Assim, no reconhecimento dos créditos eventualmente existentes, deverá V. Exa. ter em consideração que genericamente é suficiente, para que o crédito se considere constituído, que na compra de bens, ocorra a transferência para o comprador dos riscos e vantagens significativos da posse dos bens e, nas aquisições de serviços, que a prestação dos mesmos já se tenha iniciado, dependendo a extensão do respectivo reconhecimento apenas da correspondente percentagem de acabamento.
Mais fica notificado, para no prazo de 10 dias, declarar quais os créditos existentes nesta data e que foram objecto de penhora, a respectiva data de vencimento, quais as garantias que os acompanham e quaisquer outras circunstâncias que interessem à execução; se negar a existência da obrigação de pagamento dos ditos créditos, no todo ou em parte, será o crédito considerado litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, será posto à venda por três quartas partes do seu valor; se nada disser, entender-se-á que reconhece a obrigação (cfr. arts 224º do CPPT e 856º do CPC).
Os créditos penhorados devem ser depositados nos cofres do Estado, em qualquer Tesouraria de Finanças, à ordem do processo de execução fiscal acima indicado, com a menção expressa da identificação do executado, no prazo de 30 dias a contar da penhora, se outro mais longo não existir para o seu vencimento (cfr. alínea b) do nº1 do art. 224º do CPPT), seguindo, em anexo, exemplar da guia de depósito modelo 80119A.
De notar que, findo aquele prazo, caso não efectue as entregas, será essa entidade executada no próprio processo pelas importâncias não depositadas, nos termos das alíneas b) do nº 1 do art. 224º e a) do art. 233º do CPPT, não se exonerando da obrigação pagando directamente ao credor.
Mais notifico V. Exa. de que fica nomeado fiel depositário dos créditos penhorados. No caso de nesta data se verificar a inexistência de qualquer crédito nas condições anteriores, deverá no mesmo prazo de 10 dias, comunicar tal facto a este Serviço de Finanças, enviando cópia da respectiva conta corrente, para melhor prova.»;
19. A sociedade R STAR foi notificada desse ofício e respondeu com a carta que se encontra documentada a fls. 53, do seguinte teor:
«A Signatária não procedeu à penhora ordenada, nem ao depósito de qualquer quantia nos cofres do Estado da Tesouraria das Finanças, à ordem do processo supra identificado, em virtude de, nesta data, a sociedade TRANSDESA , LDª, contribuinte nº (…), não tem qualquer crédito sobre a sociedade R STAR , Ldª, titulado por facturas ou facturas que estejam por lançar na conta-corrente da signatária.
Mais se informa que a Executada Transdesa- , Ldª, não é detentora de qualquer crédito sobre a signatária que se encontre constituído e que ainda não tenha sido objecto de facturação.
Assim e para prova do supra exposto, a signatária junta cópia da respectiva conta corrente.»;
20. Anexou a essa carta a conta-corrente que constitui o documento de fls. 55/82;
21. Em 23/06/05 o órgão da execução fiscal proferiu despacho a sustentar que a conta-corrente enviada pela R STAR não era suficiente para provar que o crédito não existia, e determinando que se lhe solicitasse a junção aos autos, no prazo de 10 dias, de prova de que os débitos se encontravam pagos, através da junção de «cópias dos cheques ou outros meios de pagamento constantes daquele extracto, que totalizam (dois milhões setecentos e cinquenta e um mil setecentos e trinta euros e sessenta e cinco cêntimos.) 2.751.730,65 €, bem como extractos bancários comprovativos da efectivação daqueles pagamentos.» - cfr. fls. 84;
22. A sociedade R STAR foi notificada desse despacho e nada disse no assinalado prazo – cfr. fls. 87;
23. Em face disso, o órgão de execução fiscal determinou que em virtude de a R STAR não haver comprovado a não existência do crédito sobre a sociedade executada, a execução prosseguia contra ela pelo valor do crédito penhorado que importa em 2.751.730,65 € - cfr. fls. 88;
24. Por carta registada com A/R assinado em 13/08/05, a R STAR foi citada nos seguintes termos (cfr. fls. 95):
«1 - Foi essa sociedade, nos termos do artigo 224° do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigo 856° do Código do Processo Civil, em 2005/06/01, notificada da penhora de todos os créditos existentes à data de 2005/06/01, que essa sociedade era devedora à empresa TRANDESA-, Ldª - NIPC 504 (…)
2 - Por requerimento de 2005.06.15, veio essa sociedade R STAR Petróleos, Ldª, alegar que nessa data nada devia à TRANDESA-, Ldª, juntando cópia da respectiva conta corrente.
3 - Considerando que tal documento não era suficiente para provar que o referido crédito não existe é novamente notificada em 2005.07.25 a R STAR , Ldª, para em 10 dias, juntar prova de que os débitos se encontravam pagos, nomeadamente através de cópia dos cheques ou outro meio de pagamento, constantes daquele extracto, no montante de 2.751.730,65 €.
4 - Decorrido que vai o prazo de 10 dias sem que tenham sido trazidos aos autos quaisquer elementos, nem tenha sido efectuado à ordem do processo de execução fiscal quaisquer depósitos relativamente aos créditos penhorados, fica por este meio citada, para proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescido, no prazo de 30 dias a contar da data da assinatura do aviso de recepção desta citação, na importância de 2.751.730,65 €.
No mesmo prazo, poderá querendo, requerer a dação em pagamento nos termos do artigo 201° do CPPT, ou então deduzir oposição com base nos fundamentos previstos no artigo 204° do mesmo Código.
Decorrido aquele prazo sem que o pagamento da divida exequenda e acrescido se mostre efectuado e caso não exista nos termos do C.P.P.T., motivo para suspender a execução, a mesma prosseguirá a tramitação legal, designadamente com a penhora de bens e demais diligências prescritas no Código de Procedimento e de Processo Tributário.» - cfr. fls. 95;
25. Em 26/08/05, a R STAR apresentou o requerimento que se encontra a fls. 105/108, onde nega mais uma vez a existência de qualquer crédito da TRANSDESA sobre si, defende que tendo negado a existência do crédito este tem de ser considerado litigioso e adjudicado ou transmitido como tal em face do disposto no art. 856º do CPC, e junta, em nome do princípio da boa-fé e cooperação processual, vários recibos para demonstrar que todos os créditos da TRANSDESA se encontram já liquidados, pelo que nada tem a pagar nesta execução;
26. Em 19/08/05 o órgão da execução fiscal proferiu o despacho que consta de fls. 97, a determinar a penhora de um outro crédito da executada TRANSDESA sobre a R STAR, no montante de 1.634.864,69 €, crédito este que se teria constituído após a penhora do crédito acima assinalado de 2.751.730,65 € - cfr. fls. 97 e 98;
27. A R STAR foi notificada dessa penhora, efectuada em termos semelhantes à referida em supra 19., por carta registada com A.R assinado em 24/08/05, e em 1/09/05 apresentou resposta a negar também esse crédito, e a afirmar que, por força disso, não podia proceder ao depósito de qualquer quantia à ordem das execuções instauradas contra a TRANSDESA – cfr. fls. 98 e 121;
28. Em face da reiterada negação pela R STAR dos assinalados créditos, o órgão da execução fiscal solicitou ao Director de Finanças de Aveiro que o informasse sobre as medidas que devia adoptar, dando-lhe conta de todo o historial da situação – cfr. fls. 141;
29. A DFA informou o órgão da execução fiscal que em face dos elementos colhidos pelos Serviços da Inspecção Tributária esses créditos ainda existiriam à data em que foi determinada a penhora, pelo que em 2/02/06 esse órgão determinou a penhora de bens pertencentes à R STAR suficientes para o pagamento do montante desse crédito, o que, por sua vez, foi efectivado através da penhora de créditos de empresas devedoras à R STAR indicadas na relação que consta de fls. 236 - cfr. fls. 152/153, fls. 236 e 231, e fls. 236 e segs.;
30. Em 9/02/06 a R STAR dirigiu ao órgão da execução fiscal o requerimento que se encontra junto a fls. 342/344, onde, reiterando a inexistência dos créditos sobre a TRANSDESA e invocando o regime legal previsto no art. 856º e o prejuízo que a penhora dos seus bens (créditos) lhe está a causar, requer que seja ordenado o cancelamento da penhora dos seus bens e que seja feita uma imediata comunicação desse cancelamento a todos os seus clientes que tenham sido objecto de penhora de créditos à ordem desta execução fiscal;
31. Esse requerimento mereceu o seguinte despacho, proferido em 13/02/06 pelo órgão da execução fiscal:
«Tendo por base o requerimento apresentado em 2006-02-09 pela sociedade comercial R STAR , LDA, contribuinte (…), cumpre decidir sobre as pretensões por ela formuladas.
Assim, considerando a informação prestada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Aveiro, incorporada nos presentes autos de fls. 152 a 223, pode-se concluir, face ao extracto do programa de gestão comercial de 2005-06-03 da sociedade Transdesa-, Ldª, a existência de um crédito a seu favor de € 2.751.730,65. Tendo por base o mesmo extracto, conclui-se ainda que não se encontram registados os recibos nºs 218 a 223, que segundo a requerente demonstrariam que o crédito se encontrava pago, sendo certo que o extracto é de data posterior à emissão dos recibos, que são de 2005-05-31, e de data posterior à penhora que ocorreu em 2005-06-01. A informação da Inspecção Tributária verifica ainda que as datas em que foram emitidos os cheques que supostamente teriam servido para liquidar a dívida de € 2.751.730,65 não coincidem com a data do recibo, verificando igualmente que à data em que os cheques foram emitidos não havia saldo disponível nessa conta bancária para os mesmos serem descontados e foram efectuadas transferências da conta à ordem para a conta a prazo o que demonstra a intenção por parte da requerente de que os cheques não fossem descontados, sendo certo igualmente que, contra o procedimento habitualmente verificado entre as duas empresas, a data da emissão dos cheques não coincide nem se aproxima com a data do seu desconto.
Desta forma, resulta claro que a requerente era devedora à sociedade comercial TRANSDESA , Ldª de créditos no montante de € 2.751.730,65, à data em que foi efectuada a sua penhora (2005-06-01).
Nestes termos, por se encontrar demonstrada a existência do crédito à data da penhora e uma vez que o mesmo não foi depositado nos cofres do Estado, dentro do prazo legal, indefiro as pretensões do sujeito passivo.».
32. A sociedade R STAR foi notificada desse despacho em 15/02/06 – cfr. fls. 394 – e em 21/02/06 a fez juntar à execução a reclamação de fls. 649/664 dirigida ao T.A.F. de Viseu, com vista a reclamar dos actos do órgão de execução fiscal que ordenaram o prosseguimento da execução contra si pelo valor penhorado, designadamente o constante de fls. 88 (que é o supra referenciado sob o ponto 24.); que ordenaram a sua citação pelo valor do crédito penhorado, designadamente o de fls. 95; que ordenaram a penhora dos seus bens, nomeadamente dos créditos de que é titular perante os seus clientes, e do despacho de indeferimento proferido em 13.02.2006 (referido no ponto anterior), tudo com vista à respectiva anulação. A questão nuclear que a R STAR coloca ao Tribunal na sua reclamação judicial, e cujo conhecimento se nos impõe pelas razões que acima deixámos enunciadas, traduz-se em saber se, face ao circunstancialismo processual provado, os despachos proferidos pelo órgão de execução que determinaram o prosseguimento de execução contra si pelo valor do crédito penhorado e o acto de indeferimento da sua pretensão anulatória desses despachos, são ilegais por violação do disposto no art. 224º do CPPT e 856º do CPC, por virtude de ela nunca ter reconhecido esse crédito, pelo que este só poderia ser considerado como crédito litigioso e como tal posto à venda, sendo ilegal o prosseguimento da execução contra si pelo valor desse crédito.
Vejamos.
O artigo 224º do CPPT, que rege as formalidades da penhora de créditos, reza assim:
1 - A penhora de créditos será feita por meio de auto, nomeando-se depositário o devedor ou o seu legítimo representante, e com observância das seguintes regras:
a) Do auto constará se o devedor reconhece a obrigação, a data em que se vence, as garantias que a acompanham e quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução;
b) O devedor, se reconhecer a obrigação imediata de pagar ou não houver prazo para o pagamento, depositará o crédito em operações de tesouraria, à ordem do órgão da execução fiscal, no prazo de 30 dias a contar da penhora, e, se o não fizer, será executado pela importância respectiva, no próprio processo;
c) Se reconhecer a obrigação de pagar, mas tiver a seu favor prazo de pagamento, aguardar-se-á o seu termo, observando-se seguidamente o disposto na alínea anterior;
d) O devedor será advertido na notificação de que não se exonera pagando directamente ao credor;
e) Se negar a obrigação, no todo ou em parte, será o crédito considerado litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, será posto à venda por três quartas partes do seu valor.
2 - No caso de litigiosidade do crédito penhorado, pode também a Fazenda Pública promover a acção declaratória, suspendendo-se entretanto a execução se o executado não possuir outros bens penhoráveis.
Por seu turno, o Código Processo Civil, cujas disposições são subsidiariamente aplicáveis ao processo de execução fiscal, por força do disposto no art. 2º al. e) do CPPT, contém as seguintes disposições relevantes (na redacção introduzida pelo Dec.Lei nº 38/2003, de 8 de Março):
ARTIGO 856º
Como se faz a penhora de créditos
1 - A penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução.
2 - Cumpre ao devedor declarar se o crédito existe, quais as garantias que o acompanham, em que data se vence e quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução. Não podendo ser feitas no acto da notificação, serão as declarações prestadas, por meio de termo ou de simples requerimento, no prazo de 10 dias, prorrogável com fundamento justificado.
3 - Se o devedor nada disser, entende-se que ele reconhece a existência da obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora.
4 - Se faltar conscientemente à verdade, o devedor incorre na responsabilidade do litigante de má fé.
5 -O exequente, o executado e os credores reclamantes podem requerer ao juiz a prática, ou a autorização para a prática, dos actos que se afigurem indispensáveis à conservação do direito de crédito penhorado.
6 - Se o crédito estiver garantido por penhor, faz-se apreensão do objecto deste, aplicando-se as disposições relativas à penhora de coisas móveis, ou faz-se a transferência do direito para a execução; se estiver garantido por hipoteca, faz-se no registo o averbamento da penhora.
ARTIGO 858º
Termos a seguir quando o devedor negue a existência do crédito
1 - Se o devedor contestar a existência do crédito, são notificados o exequente e o executado para se pronunciarem, no prazo de 10 dias, devendo o exequente declarar se mantém a penhora ou desiste dela.
2 - Se o exequente mantiver a penhora, o crédito passa a considerar-se litigioso e como tal será adjudicado ou transmitido.
Destes preceitos resulta claramente que cabe ao devedor declarar se o crédito existe, quais as garantias que o acompanham, a data em que se vence, etc.., e que na falta dessa declaração se entende que o devedor reconhece a existência da obrigação nos termos estabelecidos na nomeação do crédito à penhora. Porém, se ele negar a existência do crédito e a exequente mantiver a penhora, o crédito passa a considerar-se litigioso e como tal será adjudicado ou transmitido.
O que significa que a lei comete ao devedor do crédito penhorado (devedor do executado) o ónus de declarar se o crédito existe ou não, sob pena de, nada dizendo, o mesmo se haver por reconhecido nos termos em que era indicado à penhora, ficando assim imediatamente assente no processo executivo e podendo ser como tal adjudicado ou vendido nos termos do art. 860º nº 2 do CPC (Cfr. Lebre de Freitas, A Acção Executiva, à luz do código revisto, 7.ª edição, pág. 203).
Ou seja, o devedor do crédito penhorado apenas tem o ónus de confirmar ou negar a existência do crédito, fazendo a lei corresponder ao incumprimento desse ónus o seguinte efeito cominatório:
· se confirma, expressa ou tacitamente (pelo silêncio), a existência do crédito, deve colocar o respectivo montante à ordem da execução, sob pena de vir a ser forçado a esse cumprimento através do direccionamento da execução contra ele;
· se nega a existência do crédito e a exequente mantém a penhora, o crédito passa a ser considerado como litigioso e como tal será posto à venda por três quartas partes do seu valor (ou, em alternativa, a Fazenda Pública promove a competente acção declaratória para reconhecimento desse crédito, caso em que se suspende entretanto a execução sobre esse bem até que seja proferida decisão sobre o litígio).
Em suma, o terceiro devedor do crédito não tem que provar a inexistência do crédito perante a exequente, não tem que demonstrar a veracidade dessa sua declaração, cabendo-lhe apenas o ónus de confirmar ou negar a existência do crédito. Quem tem o ónus de provar a existência do crédito é a exequente (no caso, a Fazenda Pública) na competente acção declaratória, sob pena de, face à mera declaração de inexistência do crédito pelo terceiro devedor ver esse crédito ser posto à venda como crédito litigioso por três quartas partes do seu valor. É esta a solução que inequivocamente resulta da disciplina normativa da penhora de créditos.
Todavia, no caso vertente, a exequente violou grosseiramente este regime legal.
Com efeito, apesar de a R STAR ter oportunamente negado a existência do crédito (cfr. ponto 19º e 20º do probatório) e ter posteriormente reiterado essa declaração, a exequente, munida da autoridade que lhe confere o facto de ser simultaneamente o órgão de execução fiscal, considerou, unilateralmente, que esse crédito existia e dirigiu a execução contra ela para cobrar o respectivo montante, quando apenas podia considerar o crédito como litigioso ou interpor contra ela a competente acção declaratória para reconhecimento do crédito. Pior ainda, quando confrontado com a ilegalidade cometida - invocada pela Reclamante no requerimento em que solicitou a anulação desses actos processuais – o órgão da execução indefere essa pretensão com o argumento de que existiam elementos, colhidos pelos Serviços de Inspecção Tributária, que lhe permitiam concluir pela subsistência do crédito (ponto 34º do probatório), como se fosse a ele que competisse declarar como definitivamente certa e assente a existência do crédito nomeado à penhora, e quando não podia ignorar que assistia razão à requerente face ao regime legal que esta lhe evidenciava e que, aliás, se encontrava muito bem explicado no ofício que o próprio Serviço de Finanças endereçara à requerente para notificação do crédito – cfr. o ponto 19º do probatório.
Neste contexto, não sofre dúvidas que assiste total razão à Reclamante, não podendo subsistir o supra citado acto de indeferimento da sua pretensão anulatória, o que importa a respectiva anulação e a invalidação de todos os actos impugnados, devendo, em substituição, ser determinado pelo órgão da execução fiscal o cumprimento do disposto no art. 224º nº 1 alínea e) do CPPT ou o nº 2 desse preceito legal.
Recurso da ROCHINHA, Ldª.
Tal como resulta do teor das conclusões 31ª a 34ª da respectiva alegação de recurso, a recorrente continua a defender questão idêntica à suscitada pela R STAR e que acabámos de analisar, isto é, que, em conformidade com o que resulta dos documentos que juntou à Reclamação, não reconheceu a dívida à TRANSDESA, pelo que se devia ter considerado o crédito penhorado como litigioso, assim pretendendo fundamentar a ilegalidade do acto que determinou o prosseguimento da execução contra si e do acto da sua citação para essa execução, bem como evidenciar a violação, pela sentença recorrida, do disposto no art. 858º do CPC e no art. 224º do CPPT.
Vejamos.
Na reclamação judicial que deduziu perante o Tribunal “a quo”, a Reclamante alegara, efectivamente, nos artigos 4º a 15º, que declarara perante o órgão da execução fiscal que a sociedade TRANSDESA não era titular de qualquer crédito perante si, demonstrando e justificando inexistência de qualquer saldo. E pretende provar essa materialidade através da cópia de dois requerimentos que teria juntado à execução e que designou como doc. 1 e doc. 2 – cfr. fls. 735 e 736.
Da leitura desses documentos, resulta, porém, que eles se dirigiam, não a este processo de execução fiscal nº 0094 200 50100 7025, mas ao processo de execução fiscal nº 0094 200 50100 9222, processo onde terão, naturalmente, sido incorporados.
Daí se compreenda que na presente execução exista apenas a declaração de fls. 56, onde a ROCHINHA, depois de identificar devidamente este processo e o nº do ofício que efectivou a sua notificação da penhora do crédito, faz a seguinte afirmação: «Em referência ao vosso ofício nº 4341, não nos é possível dar resposta à mesma em virtude de estar a decorrer uma auditoria com vista ao apuramento do montante da eventual dívida existente» - matéria que foi vertida no ponto 3 do probatório.
Pelo que bem andou o Mmº Juiz “a quo” ao dar como não provada essa pretensa materialidade com base nos apontados documentos.
Assim sendo, e resultando dos autos que ela não apresentou qualquer outra declaração para além dessa que consta de fls. 56 e que é a referida no ponto 3 do probatório, não pode pretender que o órgão da execução considere esse crédito como expressamente negado e, por isso, litigioso ao abrigo do regime previsto nos arts. 856º e segs. do CPC e do art. 224º do CPPT.
O órgão da execução fiscal considerou que «decorrido que vai o prazo de 30 dias sem que tenham sido trazidos aos autos quaisquer elementos nem tenham sido efectuado à ordem do processo de execução fiscal quaisquer depósitos relativamente aos créditos penhorados» se impunha a citação da ora Reclamante para proceder ao pagamento da dívida exequenda pelo montante do crédito (2.589.540,16 €), sob pena de a execução prosseguir com a penhora dos seus bens, o que se encontra em harmonia com o regime legal previsto no Código de Procedimento e Processo Tributário e no Código de Processo Civil.
Razão por que se julga que o acto que determinou o prosseguimento da execução contra si e a sua sequente citação para essa execução, não merece censura, assim improcedendo as conclusões 31 a 34 da alegação de recurso.
Por outro lado, e ao contrário do que é sustentado pela Reclamante, esses actos não padecem de falta ou insuficiente fundamentação.
Sendo actos processuais, porque praticados no âmbito de um processo judicial como é a execução fiscal, a respectiva fundamentação está sujeita, não às regras da fundamentação dos actos administrativos praticados no âmbito de procedimentos administrativos e tributários como sustenta a Recorrente e se mostra acolhido pela sentença, mas às regras da fundamentação enunciadas no art. 158º nº 1 do Código de Processo Civil, segundo o qual «As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas».
Com efeito, e em princípio, as decisões proferidas no âmbito de um processo judicial devem ser justificadas, não só para convencer os interessados mas também para lhes facilitar a via de recurso. Há, porém, decisões que se justificam por si mesmas, de tão evidente que é a sua razão. Estão nesta categoria as decisões que ordenam a prática de actos processuais impostos pela lei, como é, a nosso ver, o caso do despacho que, na falta de declaração de inexistência do crédito pelo titular do crédito penhorado, determina que a execução prossiga contra ele pelo valor do crédito penhorado, tal como o impõe o Código de Processo Civil e o Código de Procedimento e de Processo Tributário. É por isso que o art. 158º nº 1 do CPC faz depender a essencialidade da fundamentação à existência de pedido controvertido ou à existência de dúvidas suscitadas, situações que, no caso, não ocorriam, pois que na altura em que foi determinado prosseguimento da execução contra a ROCHINA não se encontrava deduzido qualquer pedido ou suscitada qualquer dúvida que impusessem ao órgão decisor uma fundamentação mais aprofundada das razões que o levavam a cumprir o estatuído nos arts. 224º do CPPT e no art. 856º do CPC. Aliás, da fundamentação aduzida percebe-se perfeitamente quais foram os motivos que determinaram o prosseguimento da execução contra esta credora e a sua consequente citação, traduzidos no facto de esta não ter trazido aos autos quaisquer elementos sobre a existência ou inexistência do crédito nem ter efectuado, no prazo de 30 dias, qualquer depósito relativamente ao crédito penhorado. O que, conjugado com os apontados preceitos legais, configura fundamentação suficiente, assim improcedendo a questão colocada nas conclusões 38 a 40 da alegação de recurso.
Relativamente à questão da violação do princípio da audiência dos interessados, invocada pela Reclamante com fundamento na falta da sua audição no procedimento que conduziu aos despachos reclamados, a sentença recorrida julgou improcedente o vício com o argumento de que nos procedimentos vinculados era desnecessário o exercício do direito de audição, já que não se pode prever decisão diversa da efectivamente tomada.
Insistindo a Recorrente na verificação do vício com a mesma argumentação, invocando o disposto no art. 55º da LGT e no art. 267º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, e imputando à sentença erro de julgamento na sua decisão, cumpre analisar a questão. E avançando se dirá que não lhe assiste razão, embora por razão diversa daquela que consta da sentença recorrida.
É que, mais uma vez, cumpre ter presente que o processo de execução fiscal é um processo judicial e não um procedimento tributário, pelo que, independentemente da função administrativa conferida ao chefe da repartição de finanças no processo executivo, o certo é que estamos no seio de um processo judicial executivo, sujeito às regras processuais previstas no CPPT e no CPC, que não está submetido aos princípios que o art. 55º da LGT prevê para a actuação da AT nos procedimentos tributários, nem ao princípio da participação garantido pelo art. 267º da Constituição da República Portuguesa e consagrado no art. 60º da LGT, princípio que visa concretizar o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões tributárias que lhes dizem respeito.
Com efeito, o preceito que regula o direito de audição que assiste aos contribuintes interessados de serem ouvidos num determinado procedimento antes de ser proferida a decisão (com vista a garantir a real observância dos princípios do contraditório, da participação e da transparência procedimental) pressupõe, obviamente, que se esteja perante um procedimento tributário. Aliás, a leitura do art. 60º da LGT revela-nos que o direito de audição aí previsto depende mesmo de um procedimento dirigido à declaração de direitos tributários, não se aplicando quando o pedido dirigido à AT não tiver aptidão para iniciar esse tipo de procedimento.
Ora, vistas as regras processuais estabelecidas para o processo de execução no CPPT e no CPC, constata-se que nenhuma impõe a prévia audição do titular do crédito penhorado antes de se determinar o prosseguimento da execução contra si por falta de negação do crédito no prazo assinalado. Verificados que estejam os condicionalismos legais que autorizam o prosseguimento da execução contra o terceiro devedor do crédito, impõe-se ao órgão decisor a consequente decisão, sem necessidade de previamente facultar àquele um projecto da decisão ou de ouvi-lo sobre a matéria. E arguida ou colocada perante ele alguma nulidade processual ou questão incidental, compete-lhe proferir decisão em harmonia com as regras processuais estabelecidas nesses Códigos e que não contemplam a necessidade de obter a colaboração do interessado na formação da decisão.
Razão por que não procede a questão enunciada nas conclusões 35 a 37 da alegação de recurso.
Finalmente, resta analisar a questão colocada nas conclusões 26 a 30 da alegação de recurso, e que se traduz no erro de julgamento que vem imputado à sentença recorrida por não ter dado por verificada a argumentada falta de citação desta sociedade para a execução que contra si prosseguiu pelo montante do crédito penhorado.
Segundo a Recorrente, essa citação não ocorreu porque a que lhe foi efectuada reportava-se a um outro processo executivo instaurado contra a TRANSDESA, entretanto extinto por pagamento, como a própria Fazenda Pública reconhece e resulta dos factos assentes na decisão recorrida.
Na verdade, encontra-se provado que no acto de citação da Recorrente para a presente execução, efectuado por carta registada com A/R assinado em 26/07/05, foi indicado que o processo a que se reportava a citação era a execução nº 0094 200 401 017 250 quando a presente execução tem o nº 0094 200 501 007 025. E igualmente se encontra provado que aquela execução nº 0094 200 401 017 250 existia, figurando também nela como executada a sociedade TRANSDESA.
Ou seja, porque na citação efectuada à ROCHINHA se indicou que ela era citada para, no processo executivo nº 0094 200 401 017 250, “proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescido, no prazo de 30 dias a contar da data da assinatura do aviso de recepção desta citação, na importância de 2.751.730,65 €” ou de “no mesmo prazo, requerer a dação em pagamento nos termos do artigo 201º do CPPT ou então deduzir oposição com base nos fundamentos previstos no artigo 204º do Código de Procedimento e de Processo Tributário” sob pena de “a mesma prosseguir a tramitação legal, designadamente com a penhora de bens…”, terá de considerar-se que ela foi (por erro que não lhe é imputável) citada para uma execução diferente da devida. E isso significa, necessariamente, que esse acto - reportado a uma outra execução pendente contra a mesma sociedade credora da ROCHINHA - não tem a virtualidade de a chamar para o pagamento desse crédito na presente execução fiscal.
Tendo a citação sido feita para essa outra e distinta execução, tal implica, logicamente, que a citação não ocorreu na presente execução, sendo essa falta susceptível de prejudicar a defesa da Recorrente, já que com a citação é dada a faculdade de, no prazo de 30 dias, a citada efectuar o pagamento da dívida, requerer a dação em pagamento ou deduzir oposição, faculdades que a Recorrente não pôde exercitar neste processo, tendo-o visto avançar para a penhora dos seus bens sem ter oportunidade de utilizar aqueles meios de defesa.
O que consubstancia a nulidade insanável prevista no art. 165º nº 1, al. a), do CPPT para o processo de execução fiscal (“falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado”), a qual pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final e tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que dela dependam absolutamente (nºs 2 e 4 do citado preceito legal).
É certo que meses mais tarde, quando o Serviço de Finanças se apercebe do erro (por virtude de o gerente da ROCHINHA ter solicitado informação certificada sobre a extinção daquela outra execução por pagamento da dívida exequenda) opta por levar oficiosamente a cabo, em 8/02/06, uma notificação à ROCHINHA, advertindo-a da «rectificação operada na citação enviada pelo ofício nº 5807, de 25-07-2005, recebida pela sociedade em 26-07-2005, informando-o que por simples erro de escrita foi indicado o processo de execução fiscal nº 0094200401017250, quando se pretendia indicar o processo de execução fiscal nº 0094200501007025».
Ora, visto que por erro imputável ao Serviço de Finanças, a ora Recorrente nunca foi citada para esta execução, não pode considerar-se suprida tão grave omissão, essa nulidade insanável, com uma notificação efectuada cerca de 7 meses depois a “rectificar” a identificação do processo executivo para o qual a parte se devia considerar citada.
E não se diga, como se diz na sentença recorrida, que o vício não procede porque a Reclamante poderia ter desfeito o equívoco em face da anterior notificação que recebera da penhora do crédito à ordem desta execução fiscal. Ao efectuar a citação, o funcionário tem o dever de identificar o processo a que se reporta o acto, não cabendo à pessoa citada o dever de ir indagar se porventura não estará a ser chamada para outro processo que não aquele que é indicado no acto de citação! A parte não tem a obrigação de adivinhar ou diligenciar por resolver os imbróglios provocados pelos erros dos serviços que promovem o processo executivo, não podendo ser prejudicada pelos seus erros e omissões, em harmonia com o preceituado no art. 161º nº 6 do CPC.
Por outro lado, porque a situação descrita consubstancia, como vimos, uma nulidade insanável, não é à parte que incumbe o ónus de aperceber-se da irregularidade cometida e de diligenciar pelo seu oportuno suprimento, pois que a sua arguição não está, sequer, sujeita a prazo, podendo ser conhecida, mesmo oficiosamente, até ao trânsito em julgado da decisão (ou, até, depois de findar a execução, nos termos previstos no art. 257º nº 1 do CPPT e art. 909º nº 1 al. b) do CPC). Razão por que a Recorrente não pode ser penalizada pelo facto de não ter logo diligenciado por perceber e desfazer a confusão criada pelo Serviço de Finanças na identificação do processo para o qual a citou.
Pelo que fica exposto, impõe-se declarar a nulidade insanável do presente processo executivo por falta de citação da sociedade ROCHINHA, anular todos os actos subsequentes à citação descrita no ponto 4º do probatório e que desta dependam (como é o caso da penhora dos bens dessa sociedade) e mandar repetir a sua citação para prosseguimento desta execução contra ela.
O recurso terá, pois, provimento por virtude da procedência da questão enunciada nas conclusões 35 a 37. * * * Nos termos expostos, acordam os juízes da secção de contencioso tributário deste tribunal em:
conceder provimento ao recurso interposto pela sociedade R STAR , Ldª, revogar a sentença recorrida e, em substituição, julgar procedente a Reclamação, com a consequente anulação dos actos reclamados, os quais devem ser substituídos por acto do órgão da execução fiscal que determine o cumprimento do disposto no art. 224º nº 1 alínea e) do CPPT relativamente ao crédito de que a recorrente é titular perante a sociedade executada “TRANSDESA”;
conceder provimento ao recurso interposto pela sociedade ROCHINHA -, Ldª, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a Reclamação com fundamento na nulidade insanável por falta de citação desta sociedade para a presente execução, com a consequente anulação de todos os actos subsequentes à citação descrita no ponto 4º do probatório e dos que dela dependam absolutamente, devendo o órgão da execução mandar repetir a sua citação para prosseguimento desta execução contra ela.
Sem custas.
Porto, 10 de Maio de 2007
Dulce Manuel Neto
Aníbal Ferraz
Francisco Rothes |