Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00355/11.1BECBR |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 12/07/2012 |
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Tribunal: | TCAN |
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Relator: | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
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Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO ARTº 15º DL 503/99 DE 20/11 BOMBEIRO |
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Sumário: | I-No caso concreto a retribuição paga ao trabalhador pela prestação de trabalho extraordinário a favor da entidade patronal não tem a natureza de "suplemento de carácter permanente"; I.1-o que está em causa é o pagamento de horas extraordinárias que não representa retribuição de carácter permanente nem se pode considerar uma “remuneração efectivamente auferida” já que não reveste, pela sua natureza, carácter de regularidade; I.2-o pagamento contínuo ao recorrente de horas extraordinárias não justifica que as mesmas se transformem em “remuneração de carácter permanente, quer para efeitos dos descontos à segurança social quer para efeitos indemnizatórios”; I.3-o trabalho extraordinário é pago para compensar o trabalhador pela penosidade daquele trabalho, pelo prolongamento do seu horário de trabalho, psíquica e fisicamente desgastante para o trabalhador, bem como pela indisponibilidade para estar com a sua família e amigos, I.4-tal não ocorre quando o trabalhador está ausente por força de acidente de trabalho.* *Sumário elaborada pela Relatora. |
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Data de Entrada: | 09/06/2012 |
Recorrente: | Sindicato ... |
Recorrido 1: | Município de Coimbra |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Nega provimento ao recurso |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO O Sindicato …, melhor identificado nos autos, em representação do seu associado VM. …, propôs acção administrativa especial, contra o Município de Coimbra, impugnando a decisão de 16 de Fevereiro de 2011 e o despacho da Directora Municipal de Administração e Finanças, de 30/11/2010 e da Vereadora Municipal, de 17/12/2010, ambos exarados na “Informação” n.º 41848/2010, de 3 de Novembro, pedindo a condenação do Réu no pagamento da quantia que deixou de receber a título de trabalho extraordinário, durante os períodos em que esteve de baixa médica em consequência de acidente de trabalho de que foi vítima. Por decisão proferida pelo TAF de Coimbra foi julgada improcedente a acção e absolvido o Réu, aqui Recorrido, dos pedidos formulados. Desta vem interposto recurso. Em alegação o Recorrente concluiu assim: 1.A questão que se coloca é, assim, de saber se a remuneração que o representado do Recorrente tem recebido a título de horas extraordinárias tem carácter permanente, ou não, e se no período em que o trabalhador esteve incapacitado para o trabalho não podia ter recebido o correspondente trabalho suplementar. 2.O aqui representado pelo Recorrente, exercia e exerce as funções de Subchefe dos Bombeiros Sapadores de Coimbra, e, no dia 14 de Junho do ano de 2008, aquele, foi vítima de um acidente ao serviço, tendo ficado, a partir do dia 17 até ao dia 23 de Junho, do dia 4 de Agosto até ao dia 28 de Agosto e de 27 de Setembro do mesmo ano até ao dia 1 de Fevereiro de 2009, de baixa pelo Seguro. 3.Do referido acidente, resultou para o aqui A., várias lesões, as quais determinaram para o mesmo, um longo período de incapacidade absoluta para o trabalho; 4.Por razões de interesse público e bem assim da natureza do serviço prestado pelos Bombeiros Sapadores de Coimbra, estes efectuam obrigatoriamente trabalho extraordinário; 5.Ou seja, por determinação expressa do Executivo Camarário o aqui representado pelo Recorrente, exerce as suas funções integrado num regime de turnos rotativos e consecutivos de 12 horas de serviço diurno seguidas de 24 horas de descanso, alternado com 12 horas de serviço nocturno seguidas de 48 de descanso; 6.Tal horário, corresponde a um horário de 48 horas semanais e decorre dos Factos confessados na Contestação e Alegações da Ré. 7.Nos termos legais os Bombeiros profissionais da Administração local, estão sujeitos ao limite semanal de 35 horas de trabalho, o que implica que o horário semanal acima referido corresponde a uma prestação de pelo menos, 13 horas suplementares por semana; 8.Porém, desde que o aqui representado se encontra em situação de baixa em resultado de acidente em serviço, o suplemento devido pelo trabalho suplementar inerente ao cumprimento do seu horário de trabalho, o qual é desde sempre e mensalmente pago aos Bombeiros Sapadores, não foi incluído no cálculo da sua remuneração; 9.Ora, do disposto na legislação supra referida no corpo destas alegações, resulta que, tratando-se de acidentes em serviço, a reconstituição da situação que o acidentado teria se o acidente não tivesse ocorrido, tem como elemento fundamental, a remuneração ou salário que ele deveria auferir pelo período diário de trabalho correspondente à sua profissão, uma vez que o acidente o privou de executar todo esse trabalho, que no caso concreto, corresponde a treze horas semanais de trabalho extraordinário obrigatório e ao respectivo suplemento; 10.Nesse sentido, e tendo também em atenção a Contestação apresentada pela Ré, na qual a mesma confessa que, dada a organização dos turnos dos Bombeiros Sapadores de Coimbra, os mesmos implicam sempre a prestação de trabalho extraordinário, o ora A. convoca as lições que constam de forma assaz assertiva na doutrina emanada pelos acórdãos supra enunciados. 11.Isto porque, é patente que, para além de estar em causa o trabalho extraordinário, releva a essencialidade do horário praticado pelo aqui representado e a sua respectiva duração, isto é, na modalidade de turnos, que prevêem 48 horas semanais, o que impõe para o respectivo cumprimento, a prestação de pelo menos, mais de 13 horas semanais por parte do aqui representado, em relação à jornada prevista, de 35 horas semanais; 12.E esse acréscimo horário, mais do que corresponder à prestação de trabalho extraordinário, constitui a própria definição do horário do mesmo, o qual, independentemente de quaisquer circunstâncias variáveis, inerentes à prestação de trabalho em si, não é alterado, antes correspondendo ao horário de trabalho superiormente definido. 13.Pelo que mal andou a autoridade recorrida, ao não pagar ao representado do aqui Recorrente qualquer quantia a título de trabalho extraordinário durante o período em que o aqui representado esteve ausente ao serviço, em regime de faltas por acidente em serviço, tendo dessa forma desrespeitado e infringido o disposto nomeadamente no art. 15º do DL nº 503/99, de 20 de Novembro, bem como a sentença que considerou não haver o vício de violação de lei e erro nos pressupostos de direito apontados. Nestes termos deve o presente recurso jurisdicional ser julgado provado e procedente, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-a por outra decisão que conceda provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, tudo com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA! O recorrido contra-alegou e concluiu assim: 1. A sentença julgou, e bem, improcedentes os pedidos formulados pelo Autor, ora recorrente. 2. A questão sub judice prende-se com a falta de pagamento que o representado do ora Recorrente deixou de auferir a título de trabalho extraordinário, em virtude de acidente de trabalho sofrido. 3. Assim como, a aplicação ou não do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 503/99 de 20 de Novembro – Regime dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Administração Pública. 4. Por força de um acidente de trabalho sofrido no dia 14/7/ 2008, o representado do Recorrente esteve de baixa de 17 a 23/6/ 2008, de 4 a 28/8 e de 27/9 a 1/2/ 2009, daí que não tenha auferido o respectivo valor remuneratório correspondente ao trabalho extraordinário, que também não prestou. 5. Valor, esse, que não lhe era, nem lhe é devido. 6. Segundo o regime dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Administração Pública - DL n.º 503/99, de 20/11, estabelece no art. 15.º que no período de faltas ao serviço, em resultado de acidente, o trabalhador mantém o direito à remuneração incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidem descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição. 7. O representado da requerente não tem direito a auferir o pagamento das horas extraordinárias, pois a prestação deste trabalho reveste carácter excepcional e o seu pagamento visa compensar o trabalhador pelo acréscimo na produtividade do trabalho, sendo que nesta situação há necessidade efectiva de prestação de serviço. 8. Mais, Sobre o pagamento das horas extraordinárias não incide desconto para a caixa Geral de Aposentações (artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 498/72 de 9/12) o que, desde logo, afasta a aplicabilidade do disposto no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 203/99, de 20/11. 9. O trabalho extraordinário é pago para compensar o trabalhador pela penosidade daquele trabalho, pelo prolongamento do seu horário de trabalho, psíquica e fisicamente desgastante para o trabalhador, bem como pela indisponibilidade para estar com a sua família e amigos. 10. Logo, o representado do Recorrente não tem direito a auferir o rendimento por realização de horas extraordinárias, visto que não as prestou, pois estava ausente por força de acidente de trabalho. 11. Face ao exposto, deve manter-se a decisão do tribunal a quo, com todas as consequências legais. Nestes termos e nos melhores de direito, não deverá ser concedido provimento ao presente recurso e consequentemente deve ser mantida a sentença recorrida assim se fazendo JUSTIÇA. O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º nº 1 do CPTA, não emitiu qualquer parecer. Cumpre apreciar e decidir. FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão sob recurso foi fixada a seguinte factualidade: 1. O associado do Autor presta serviço na Companhia de Bombeiros Sapadores de Coimbra (Artigo 1.º da P.I. e fls. 25 do P.A.); 2. Em 14 de Julho de 2008, o associado do Autor foi vítima de um acidente em serviço (artigo 4.º da P.I.); 3. O associado do Autor esteve ausente do serviço, em consequência do acidente sofrido, de 17 a 23 de Junho de 2008, de 4 a 28 de Agosto de 2008, e de 27 de Setembro de 2008 a 1 de Fevereiro de 2009 (Artigo 4.º da P.I. e fls. 25 do P.A.); 4. O associado do Autor exerce as suas funções em regime de turnos rotativos e consecutivos de 12 horas de serviço diurno, seguidas de 24 horas de descanso, alternado com 12 horas de serviço nocturno seguidas de 48 de descanso (artigo 10.º da P.I. e fls. 25 vs do P.A.); 5. Durante o período em que o associado do Autor não exerceu funções por motivo de acidente em serviço, o Réu não lhe processou o pagamento do valor correspondente às horas extraordinárias que prestaria caso tivesse comparecido ao trabalho (artigo 13.º da P.I. e fls 16/17 do P.A.) DE DIREITO É objecto de recurso a decisão do TAF de Coimbra que desatendeu totalmente os pedidos formulados pelo Autor, deles absolvendo o Réu. Sem questionar a factualidade fixada na decisão, o Recorrente insurge-se contra a mesma, assacando-lhe erro de julgamento de direito atinente à interpretação efectuada do disposto no artº 15º do DL nº 503/99, de 20 de Novembro. Avança-se, desde já, que não lhe assiste razão. É este o discurso jurídico fundamentador da sentença: “O regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais verificados ao serviço da Administração Pública, à data da ocorrência na qual o Autor funda a pretensão formulada, encontrava-se fixado pelo Dec.-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, cujo art.º 15.º, sob a epígrafe “Direito à remuneração e outras regalias”, estabelece: “No período de faltas ao serviço, em resultado de acidente, o trabalhador mantém o direito à remuneração, incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidem descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição." O art.º 19.º do referido diploma refere-se, por sua vez, aos demais direitos e regalias, para além da retribuição, consagrando a respectiva manutenção durante o período de incapacidade absoluta para o trabalho, equiparando-a à prestação efectiva de serviço. Estabelecendo os princípios gerais dos salários e da gestão de pessoal da função pública, prevê o Dec.-Lei n.º 184/89, de 2 de Julho, vigente à data do facto determinante da ausência ao serviço do associado do Autor, no n.º 1 do seu art.º 15.º, sob a epígrafe “componentes do sistema retributivo”: “O sistema retributivo da função pública é composto por: a) remuneração base; b) Prestações sociais e subsídio de refeição; c) Suplementos;” Este normativo, definindo “suplementos” estatui, no n.º1 do seu art.º 19.º: Os suplementos são atribuídos em função de particularidades específicas da prestação de trabalho e só podem ser considerados os que se fundamentam em: a) Trabalho extraordinário, nocturno, em dias de descanso semanal ou feriados, em disponibilidade permanente ou outros regimes especiais de prestação de trabalho; b) trabalho prestado em condições de risco, penosidade ou insalubridade; c) Incentivos à fixação em zonas de periferia; d) Trabalho em regime de turnos; e) Falhas; f) Participações em reuniões, comissões ou grupos de trabalho, não acumuláveis com a alínea a). Por outro lado, consagram os n.ºs 1 e 2 do art.º 6.º do Dec.-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro (Estatuto da Aposentação): 1. Para efeitos do presente diploma e salvo disposição especial em contrário, consideram-se remunerações os ordenados, salários, gratificações, emolumentos, o subsídio de férias, o subsídio de Natal e outras retribuições, certas ou acidentais, fixas ou variáveis, correspondentes ao cargo ou cargos exercidos e não isentas de quota nos termos do n.º 2. 2. Estão isentos de quota os abonos provenientes de participações em multas, senhas de presença, prémios por sugestões, trabalho extraordinário, simples inerências e outros análogos, bem como todos os demais que, por força do presente diploma ou de lei especial, não possam igualmente influir, em qualquer medida, na pensão de aposentação. Nestes termos, o trabalhador que sofra um acidente em serviço tem direito a receber durante o período de faltas motivado por esse acidente, a remuneração base, os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respectivo regime de segurança social, e o subsídio de refeição. No caso em apreço, o Autor considera que a entidade demandada, ao recusar ao seu associado o pagamento da verba relativa às horas extraordinárias que receberia mantendo-se ao serviço, viola o disposto no transcrito art. 15°. Não lhe assiste, contudo, razão. Como acima se sublinha, o específico regime de protecção dos trabalhadores da Administração Pública, em caso de acidentes em serviço, consagrando expressamente o direito à percepção da remuneração base, e do subsídio de refeição, exclui de forma clara os suplementos não sujeitos da descontos para a Caixa Geral de Aposentações. Segundo estatui o n.º1 do art.º 23.º do Estatuto do Pessoal dos Bombeiros Profissionais da Administração Pública, os corpos de bombeiros profissionais estão sujeitos ao regime da duração e horário da Administração Pública, com a possibilidade de efectuarem doze horas de trabalho contínuas. Por força do disposto nos art.ºs 7.º e 8.º do Dec.-Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, regime geral da duração de trabalho na função pública encontra-se fixado em trinta e cinco horas semanais, com o limite de sete horas de trabalho diário. De acordo com o regime de turnos constante do probatório supra, o associado do Autor, presta trabalho durante quarenta e oito e trinta e seis horas, em semanas alternadas, ultrapassando o horário semanal previsto para a função pública numa média de catorze horas semanais, igualmente dividas entre o horário diurno e nocturno. É indiscutível, por isso, a natureza permanente das horas de trabalho que o associado do Autor presta em cada turno para além do horário de trabalho legalmente previsto para a função pública, enquanto se mantiver no regime de turnos, que é, afinal indissociável da actividade profissional que exerce. Todavia, tais horas de trabalho – que, muito embora devam ser objecto de compensação adequada, no caso concreto não deveriam, sequer, qualificar-se de “extraordinárias”, em razão da sua regularidade, inerente à duração dos turnos, - não são objecto de descontos para a CGA, conforme resulta dos n.° 1 e 2 do art. 6° do Decreto-Lei n.° 498/72, de 9 de Dezembro, na redacção introduzida pela Lei n.° 30-C/92, de 28 de Dezembro (Estatuto da Aposentação). Assim, e independentemente de se considerar que o pagamento das horas de trabalho prestado para além do legalmente previsto tem a natureza de um "suplemento de carácter permanente", o certo é que sobre tais pagamentos não incidem descontos para o "respectivo regime de segurança social", pelo que, nesta parte, o art. 15° não pode aplicar-se às quantias referentes a pagamento de trabalho extraordinário.” X Como é sabido, o Regime dos Acidentes em Serviço e das Doenças Profissionais no âmbito da Administração Pública (Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro), em vigor à data do acidente sofrido pelo representado do Recorrente, estabelece no seu artigo 15.º, que no período de faltas ao serviço, em resultado de acidente, o trabalhador mantém o direito à remuneração incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidem descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição. Ou seja, as faltas por acidente de trabalho são consideradas como exercício efectivo de funções, não implicando a perda de quaisquer direitos ou regalias, nomeadamente o desconto do tempo de serviço, assim como os restantes suplementos de carácter permanente, segundo o artigo 19.º do já referido diploma.Mais se acrescenta, no artigo 15.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Julho, que estabelece os princípios gerais dos salários e da gestão de pessoal da função pública, assim como o Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro que consagra o Estatuto da Aposentação, nos seu artigo 6.º, nºs 1 e 2, que o trabalhador que sofra um acidente em serviço tem direito a receber durante o período de faltas motivado por esse acidente, a remuneração base, os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respectivo regime de segurança social, e o subsídio de refeição. Aliás, o específico Regime de Protecção dos Trabalhadores da Administração Pública sublinha, de forma clara, que no caso de acidentes em serviço, estão excluídos os suplementos não sujeitos a descontos para a Caixa Geral de Aposentações. Conforme estatui o artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 106/2002, de 13/04, os corpos de bombeiros profissionais estão sujeitos ao regime da duração e horário da Administração Pública, com a possibilidade de se efectuarem 12h de trabalho contínuas. Mais, nos termos do disposto no artigo 24.º, os bombeiros profissionais estão sujeitos ao regime de férias, faltas e licenças da administração pública (veja-se também a este propósito os artigos 1.º, 2.º e 19.º do mesmo diploma). O regime jurídico sobre a duração e horário de trabalho e as suas modalidades, assim como o regime jurídico das faltas na administração pública encontra-se previsto na Lei n.º 59/2008, de 11/09 (Regime do contrato de Trabalho em Funções Públicas e respectivo regulamento, doravante, leia-se RCTFP). Relativamente à prestação de trabalho extraordinário, enuncia o artigo 106.º do RCTFP que deve revestir carácter excepcional, nos casos previstos na lei, tendo o trabalhador direito a um acréscimo de remuneração correspondente a 50% na primeira hora e 75% na segunda hora. O n.º 5 do artigo 73.º da LVCR consagra que a atribuição dos suplementos remuneratórios apenas são devidos enquanto perdurarem as condições que impõem maiores exigências funcionais por parte do trabalhador e desde que o trabalhador se encontre numa situação de prestação efectiva de serviço, o que aqui não sucede. Durante o período de faltas por acidente de trabalho o representado do Recorrente mantém direito à remuneração incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidem descontos para o respectivo regime da segurança social, ou seja, por exemplo, tem direito ao subsídio de turno, pois este reveste natureza normal e regular, inserindo-se na remuneração permanente do trabalhador e tem direito ao subsídio de refeição. Mas, já não tem direito a auferir o pagamento das horas extraordinárias, pois a prestação deste trabalho reveste carácter excepcional e o seu pagamento visa compensar o trabalhador pelo acréscimo da produtividade do trabalho, sendo que nesta situação há necessidade efectiva de prestação de serviço. O trabalho extraordinário é caracterizado pela própria lei, como se viu, como trabalho excepcional e temporário e o suplemento que lhe está adstrito reveste os mesmos requisitos de transitoriedade e excepcionalidade (artºs 160.º do RCTFP e 73.º da LVCR). Ora, sobre o pagamento das horas extraordinárias não incide desconto para a Caixa Geral de Aposentações (artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 498/72 de 9/12) o que, desde logo, afasta a aplicabilidade do disposto no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 203/99, de 20/11. Independentemente da apreciação que possa ser feita em função do carácter permanente ou não das horas extraordinárias, o certo é que sobre o pagamento de tais horas não incidem descontos para o respectivo regime da segurança social, daí que não seja correcto aplicar o disposto no artigo 15.º do supra mencionado Decreto-Lei 503/99 às quantias referentes a pagamento de trabalho extraordinário, que o Recorrente alega estarem em dívida. Neste sentido, cfr. o ac. do TCA Sul, proferido em 17/11/2005, no pr. n.º 1122/05, de cujo sumário ressalta: “1. …. 2. Para efeitos do disposto no artº 15º DL 503/99 de 20.11, a retribuição paga ao trabalhador pela prestação de trabalho extraordinário a favor da entidade patronal não tem a natureza de “suplemento de carácter permanente". Do texto deste acórdão extrai-se ainda: “(…) A realização de trabalho extraordinário, ainda que sendo uma recorrência, independentemente da carreira em que esteja inserido o funcionário em apreço, não significa por isso que possa ser considerado como suplemento de carácter permanente, por legal e objectiva subsunção do facto na estatuição e previsão normativas, para efeitos de incidência de descontos para o respectivo regime de segurança social, conforme sua tipificação. A definição de “trabalho extraordinário” configura um conceito relativo. A qualificação de “extraordinário” convoca implicitamente um raciocínio de conteúdo comparativo entre realidades à partida tidas por diversas, em que uma delas é colocada no patamar do ordinário, comum, vulgar ou de metro padrão para efeitos de confronto com a outra ou outras realidades que, pelas diferenças entre si evidenciadas, permitem a qualificação de “extraordinárias”. Em suma: -o que está em causa é o pagamento de horas extraordinárias que não é, em quaisquer dos regimes, retribuição de carácter permanente nem se pode considerar uma “remuneração efectivamente auferida” já que não reveste, pela sua natureza, carácter de regularidade; -o pagamento contínuo ao recorrente de horas extraordinárias não justifica que as mesmas se transformem em “remuneração de carácter permanente, quer para efeitos dos descontos à segurança social quer para efeitos indemnizatórios”; -o trabalho extraordinário é pago para compensar o trabalhador pela penosidade daquele trabalho, pelo prolongamento do seu horário de trabalho, psíquica e fisicamente desgastante para o trabalhador, bem como pela indisponibilidade para estar com a sua família e amigos; -tal não ocorre quando o trabalhador está ausente por força de acidente de trabalho, -o representado do Recorrente esteve ausente do serviço de 17 a 23 de Junho de 2008, de 4 a 28 de Agosto e de 27 de Setembro a 1 de Fevereiro de 2009, por força de acidente de trabalho sofrido no dia 14 de Julho de 2008; -durante tais lapsos de tempo não tem direito a auferir o rendimento por realização de horas extraordinárias que não prestou. Improcedem, pois, todas as conclusões da alegação. Dito de outro modo, a sentença recorrida, contrariamente ao aventado, subsumiu correctamente o caso concreto ao quadro legal aplicável, razão pela qual terá de ser mantida na ordem jurídica. DECISÃO Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.Sem custas, atenta a isenção do recorrente. Notifique e D.N.. Porto, 07/12/2012 Ass. Fernanda Brandão Ass. João Beato Oliveira Sousa Ass. José Augusto Araújo Veloso |