Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01002/07.1BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/07/2017
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Joaquim Cruzeiro
Descritores:EMBARGO DE OBRA EM ESPAÇO FLORESTAL E EM ÁREA REN
Sumário:De acordo com Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril (entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 254/2009, de 29 de Abril, que aprovou o Código Florestal), carecem de licença camarária as acções de aterro e escavação que levem à alteração do relevo natural e do solo arável. Esta necessidade, no caso dos autos, decorre ainda do diploma que regula a área REN (Decreto-lei n.º 93/90, de 19 de Março), e do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:JJQS
Recorrido 1:Município de Póvoa de Lanhoso
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu no sentido de ser confirmada a sentença recorrida.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1 – RELATÓRIO
JJQS vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 12 de Maio de 2016, que julgou improcedente a acção interposta contra o Município de Póvoa de Lanhoso e onde era requerido que fosse proferida sentença que:
““a) Condene o R. a reconhecer que o A. é dono e legítimo proprietário do prédio identificado no art.º 1.º desta petição;
b) Anule o ato impugnado com fundamento na invocada invalidade: atentas a normas violadas e acima referidas e por o mesmo se encontrar ferido do vício de forma e de violação de lei;
c) Condene o Réu à adopção dos actos e operações necessárias para reconstituir a situação que existiria se o ato impugnado não tivesse sido praticado, explicitando, se for o caso, as vinculações a observar pela Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, nomeadamente, que seja condenado a levantar o embargo decretado.
d) Condene o R. a pagar ao A., pelos danos patrimoniais causados, quantia que será liquidada em execução de sentença.
e) Condene o R. em custas procuradoria e tudo o mais legal. […]”

Em alegações o recorrente concluiu assim:
a) Em 4 de Maio de 2007 o Município da Póvoa de Lanhoso embargou, por intermédio de um fiscal do Município, as obras que estavam a ser levadas a efeito em parte de prédio do recorrente denominado BA, no lugar de SM, da freguesia de C..., do concelho da Póvoa de Lanhoso, inscrito na matriz rústica da citada freguesia sob o artº 5… e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 44….
b) Na verdade, nessa data, o Autor decidiu levar a efeito obras de preparação do terreno em patamares (socalcos) em parte do prédio atrás referido, no sentido de diminuir a erosão do terreno e tornar o mesmo apto a ser replantado de pinheiros.
c) O prédio acima referido foi classificado como estando situado em cerca de 50% na Reserva Ecológica Nacional e os restantes 50% em Zona Florestal.
d) Os trabalhos, aquando do embargo, estavam a ser executados na parte do prédio classificada como Zona Florestal, mais concretamente na zona de pedreira.
e) O embargo foi efetuado pelo Vereador do Pelouro da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, Eng. AAlv..., com o fundamento de que os trabalhos estavam a ser levados a cabo sem a respetiva licença ou autorização e que estavam a ser levados a efeito em zona classificada como “Reserva Florestal” e “Reserva Ecológica Nacional”.
f) Tendo tal município, em 21 de Maio de 2007, a coberto do ofício nº 225/DJ/07-SSD, em cumprimento de despacho do mesmo vereador, comunicado à CCDR – Norte que o Recorrente procedeu à terraplanagem e remodelação de terrenos classificados como Reserva Ecológica Nacional
g) Tendo comunicado a tal entidade que “esta situação não é da competência da Câmara Municipal mas da Comissão de Coordenação da Região Norte”.
h) A Comissão de Coordenação da Região Norte, face a tal comunicação, instaurou o processo de contraordenação nº F3425/2007 tendo, em 4 de Dezembro de 2007, sido aplicada ao recorrente uma admoestação, prevista no artº 50º do Regime Geral das Contraordenações e condenando o mesmo nas custas processuais de € 30,00 (trinta euros) - Doc. 2).
i) Conforme se verifica da decisão em tal processo de contraordenação no mesmo foi provado o seguinte:
j) “1 – O arguido procedeu à terraplanagem e remodelação de terrenos;
k) 2 – Estes terrenos estão classificados como Reserva Ecológica Nacional;
l) 3 – O arguido destruiu o coberto vegetal ali existente numa área de cerca de 3000m criando patamares com a largura em média de 6m e criou taludes, nos referidos patamares, de 2 metros de altura;
m) 4 – O arguido estava convicto de que não praticava nenhum ilícito porquanto seguia as boas práticas agrícolas, tentando evitar a erosão do terreno;
n) 5 – O arguido estava convencido que as ações que realizava não afetavam áreas classificadas como REN”.
o) Da leitura dos factos dados como apurados no processo de contraordenação e da comunicação do Município da Póvoa de Lanhoso à CCDRN – Norte resulta claro que, à data em que foi feito o embargo, já tinham decorrido as obras na área classificada como REN, uma vez que a expressão “procedeu à terraplanagem e remodelação de terrenos classificados como Reserva Ecológica Nacional” não permite, em termos de português, uma outra interpretação.
p) Conforme se resulta do artº 102 do Dec. Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, com a redação à data do Dec. Lei nº 177/2001, de 4 de Junho, o presidente da Câmara Municipal é competente para embargar obras de urbanização, de edificação ou de demolição, bem como quaisquer trabalhos de remodelação de terrenos, quando estejam a ser executadas, quando violados os normativos referidos nas alíneas a), b) e c) do referido diploma.
q) Desde logo resulta claro da lei que a competência para decretar tal embargo era do presidente da Câmara Municipal.
r) A competência, nos termos do artº 29º do CPA, com a redação à data, “é definada por lei ou por regulamento e é irrenunciável e inalienável, sem prejuízo quanto à delegação de poderes e à substituição”.
s) Estipulando o nº 1 do artº 35º do CPA, com a redação à data, que “os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um ato de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique atos administrativos sobre a mesma matéria.
t) Estipulando o artº 41º do mesmo diploma que “nos casos de ausência, falta ou impedimento do titular do cargo, a sua substituição cabe ao substituto designado por lei.
u) Ora, como é bom de ver, o nº 1 do artº 102 do Dec. Lei 555/99, de 16/12, não permite a delegação de poderes para o embargo e, no despacho remetido, em algum ponto é dito que a pessoa que decretou o embargo o fez em substituição da pessoa com competência para tal, daí que tal embargo seja nulo, por usurpação de poderes, conforme determina a alínea a) do nº 2 do artº 133 do Código de Procedimento Administrativo em vigor à data dos factos.
v) Mas, mesmo que assim se não entenda, sempre o embargo é anulável na medida em que abarcou toda a obra, mesmo aquela já concluída, quando, conforme última parte do nº 1 do artº 102 do RJEU, o presidente da câmara é competente para embargar ….. quaisquer trabalhos de remodelação de terrenos quando estejam a ser executados.
w) Ora, à data do embargo, já poucos eram os trabalhos a executar na medida em que, conforme se verifica do auto de contraordenação da CCDRN e da própria comunicação do Município da Póvoa de Lanhoso àquela entidade, o Recorrente “procedeu à terraplanagem e remodelação de terrenos classificados como Reserva Ecológica Nacional”.
x) Ou seja, é o próprio município da Póvoa de Lanhoso a admitir que as obras na área da reserva agrícola nacional já tinham terminado pois, de outro modo, teria comunicado que o Recorrente estava a proceder à terraplanagem e remodelação de terrenos classificados como Reserva Agrícola Nacional.
y) Contrariamente ao decidido na sentença sob recurso a obra, para esse efeito, não é única, na medida em que, conforme se verifica do nº 1 do artº 106 do RJEU, com a redação à data, o presidente da Câmara pode igualmente, ordenar a demolição total ou parcial da obra ou a reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes do início das obras ou trabalhos, fixando um prazo para o efeito.
z) Estipulando o nº 2 do mesmo artigo que a demolição pode ser evitada se a obra for suscetível de ser licenciada ou for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correção ou alteração.
aa) Ou seja, a lei prevê dois remédios distintos para a obra que não esteja licenciada:
bb) 1 – O embargo para a obra que esteja a ser executada;
cc) 2 - A demolição ou legalização de obras já concluídas, quando, neste último caso, as mesmas possam suscetíveis de ser licenciadas.
dd) - Daí que, contrariamente ao decidido na decisão recorrida, o embargo não podia abranger os trabalhos já terminados, mas apenas aqueles que estavam a ser executados e os que faltavam executar para a conclusão dos trabalhos.
ee) Por outro lado, contrariamente ao que foi decidido na decisão sob recurso, a alínea a) do artº 1º do Dec. Lei 139/89, de 28 de Abril, apenas prevê a obrigatoriedade de licença das câmaras municipais nos casos em que as ações de destruição do revestimento vegetal não tenham fins agrícolas, o que não era o caso da obra que o Recorrente estava a levar a efeito, que estava a seguir as boas práticas agrícolas, daí que tal obra não estivesse sujeita a licenciamento municipal.
ff) Aliás, conforme foi alegado no nº 11 da petição e não contestado, o único coberto vegetal que existiu e que era composto de pinheiros, fruto dos seis incêndios que grassaram no prédio, alguns dos quais provocados pelas queimas na antiga lixeira do Município da Póvoa de Lanhoso, ardeu nesses incêndios.
gg) O coberto vegetal que existia à data do embargo era mato, silvas e urze, espécies vegetais que voltam a rebentar, independentemente do número de incêndios que suportem.
hh) Conforme também resulta da alínea m) do artº 2º do RJEU nos termos do qual “trabalhos de remodelação de terrenos são as operações urbanísticas não compreendidas nas alíneas anteriores que impliquem a destruição do coberto vegetal, a alteração do relevo natural e das camadas do solo arável ou o derrube de árvores de grande porte ou em maciço para fins não agrícolas, pecuários, florestais ou mineiros”.
ii) Ou seja, as obras que o Recorrente estava a levar a efeito em prédio que lhe pertence, com fins exclusivamente agrícolas, não careciam de qualquer licença do município da Póvoa de Lanhoso.
jj) Relativamente aos socalcos construídos e que estavam em construção, que visavam evitar a erosão dos terrenos, importa trazer à colação a norma de artº 6-A do RJEU, aditado ao diploma em data posterior à data em que se deram os factos, nos termos da qual são obras de escassa relevância urbanística a edificação de muros de vedação até 1,8 m de altura que não confrontem com a via pública e de muros de suporte de terras até uma altura de 2m ou que não alterem significativamente a topografia dos terrenos existentes.
kk) Ainda relativamente aos mesmos socalcos chamamos a atenção para todos os socalcos construídos na zona demarcada do Douro, que tiveram como finalidade a conquista de terrenos agrícolas à montanha, o combate à erosão dos citados terrenos e que hoje, tal paisagem de socalcos e vinhateira, está classificada como património da humanidade.

O Recorrido, notificado para o efeito, não contra-alegou.

O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, emitiu parecer nos termos que aqui se dão por reproduzidos, pronunciando-se no sentido de ser confirmada a sentença recorrida.

No presente processo foi prolatada decisão em 14 de Maio de 2012. Em sede de recurso, por decisão deste Tribunal datada de 3 de Maio de 2013, foi decidido não conhecer do mesmo e proceder à sua convolação em reclamação para a conferência a conhecer no Tribunal Administrativo e Fiscal recorrido.

Por decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 13 de Fevereiro de 2014, foi decidido dar provimento à reclamação apresentada, revogar a decisão proferida e reabrir um período de produção de prova.

As questões suscitadas e a decidir resumem-se em determinar:

— se ocorre erro de julgamento, quando se decidiu que não ocorrem os vícios invocados ao acto impugnado.

2– FUNDAMENTAÇÃO

2.1 – DE FACTO

Na decisão sob recurso ficou assente o seguinte quadro factual:

1. A favor do Autor encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Póvoa de Lanhoso sob o n.º 44… a aquisição do prédio rustico denominado BA, prédio rústico de pinheiros e mato, com a área de 17.500 m2, inscrito na matriz predial da freguesia de C..., concelho de Póvoa de Lanhoso, sob o artigo 5... – cfr. doc. 5 e ss. do processo físico.
2. O Autor marido adquiriu o referido prédio por escritura de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de V…, exarada de fls. 90 verso a fls. 92 + relação do livro de escrituras diversas n.º A-30. - cfr. doc. de fls. 37 e ss. do processo físico.
3. Em 4 de maio de 2007, a Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, por intermédio de um seu funcionário, procedeu ao embargo de “obras de terraplanagem e remodelação de terrenos em zona de reserva florestal e reserva ecológica nacional, regulado em PDM deste Município que JJQS […] estava levando a efeito Terraplanagem e remodelação de terrenos, porquanto verifiquei que as obras estava a ser levadas a efeito sem a respectiva licença ou autorização desta Câmara Municipal. […] declara-se que o estado actual dos trabalhos é o seguinte: A obra encontra-se em grande parte da sua extensão em socalcos com uma altura de certa de 80 cm a 1,50m”– cfr. fls. 9 e 9 verso do Processo administrativo.
4. Do embargo referido no ponto anterior foi em 4.5.2007 lavrado auto e tiradas as fotografias, cujos teor aqui se dão por reproduzidos. – cfr. docs. de fls. 9 e ss. do pa apenso aos autos.
5. A suspensão dos trabalhos e o auto de embargo foram notificados ao A. em 4.5.2007, tendo este assinado o auto de embargo referido no ponto anterior. – cfr. doc. de fls. 9 e ss. do pa apenso aos autos.
6. O fiscal municipal elaborou Participação da qual consta “que no dia 04/05/2007 por motivos de serviço me desloquei ao local abaixo identificado; verifiquei pessoalmente que JJQS […] na qualidade de dono de obra procedia à execução dos trabalhos de construção civil a seguir enumerados: Está a proceder a terraplanagem em terras classificadas como Reserva Florestal e Reserva Ecológica Nacional na propriedade rustica sita em SM – C.... […]” . cfr. doc. de fls 10 do pa apenso aos autos
7. Em 4.5.2007 o Vereador emitiu, sob a Participação referida no ponto anterior o seguinte despacho: “Embargo a obra, face ao conteúdo desta participação/comunicação, pelo que, com as formalidades legais, notifique-se e lavre o auto de embargo” – cfr. doc de fls. 10 verso do pa apenso aos autos.
8. Por carta datada de 7.5.2007, cujo aviso de receção foi assinado em 08 de Maio de 2007, o Autor foi notificado de que por despacho de 4.5.2007 do Vereador do Pelouro foram embargados os trabalhos de terraplanagem e remodelação de terrenos, com fundamento no início dos trabalhos de terraplanagem, sem possuir qualquer tipo de licença ou autorização desta autarquia, mais se informando que “Nos termos do n.º 5 do art. 102.º do DL 555/99 de 16/12, informa-se que o embargo incide sobre toda a obra iniciada, com obrigação de suspensão dos trabalhos até que seja determinado o levantamento do embargo (n.º 1 do art. 103.º do mesmo diploma legal” – cfr. fls. 13 e 14 do pa apenso aos autos.
9. Por requerimento datado de 10 de maio de 2007, o Autor solicitou junto do Réu que, além do mais, lhe fosse indicada qual a legislação que sustentava tal embargo. - cfr. fls. 17 do Processo administrativo.
10. Em resposta àquele pedido de informação, o Réu remeteu ao Autor o ofício n.º 315/DJ/2007- SSD, datado de 6 de julho de 2007, do qual se extrai, por relevante, o seguinte: “ter procedido à terraplanagem de terrenos classificados em PDM como Reserva Florestal e Reserva Ecológica Nacional, violando as normas contidas no artigo 4.º n.º 1 do Decreto-Lei 180/2006 que estabelece as ações proibidas no regime da reserva ecológica, bem como o artigo 4.º n.º 1 e n.º 2 alínea b) do Decreto-Lei 555/99 de 16 de dezembro com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 177/2001 de 04 de junho que determina a necessidade de obtenção de licença administrativa a emitir pela Câmara Municipal para trabalhos de remodelação de terrenos […]” – cfr. fls. 58, 59 e 60 do Processo administrativo.
11. O Autor não estava munido de licença camarária para a execução dos trabalhos que executou.
– facto não controvertido.
12. O terreno do Autor encontra-se inserido em espaço florestal e, parcialmente, condicionado como zona de Reserva Ecológica Nacional, nos termos do levantamento topográfico junto a fls. 747 do processo físico. – facto resultante da conjugação da prova pericial produzida, com o teor dos documentos de fls. 713 e ss. e 747 do processo físico.
13. Em Maio de 2007 o A. levou a efeito no prédio referido em 1. obras de terraplanagem, movimentações de terras, aterro, remodelação de terreno e criação de socalcos, com vista à plantação de pinheiros e amendoeiras.
14. As obras referidas no ponto anterior iniciaram-se na zona norte do terreno, em espaço integrado em REN, e prosseguiram até ao espaço florestal a nascente/sul.
15. No dia e hora do embargo os trabalhos estavam em fase terminal e a ser realizados no limite da zona de proteção da pedreira, a cerca de 10 metros do limite do terreno do A., em zona integrada em espaço florestal e não condicionada por REN.
16. Aquando do embargo já se encontravam executados cerca de 6 socalcos com 100 metros de comprimento e 4 metros de largura, alguns dos quais implantados em parte do terreno condicionado por REN.
17. Na parte nascente do prédio referido em 1. o A. tinha plantada uma vinha.
18. O prédio do Autor não está incluído no P.D.M. como sítio arqueológico, nem o “Castro de C...” consta do mesmo Regulamento [P.D.M.] – facto resultante da prova pericial produzida.

III.2. Factos não provados

Dos factos com interesse para a decisão da causa não se provaram os que constam dos pontos acima expostos, designadamente os seguintes:
1. Há mais de 20, 30 ou 50 anos, o A., por si e seus antepossuidores, tem vindo a fruir do prédio referido em 1., dele retirando utilidades e proveitos, e pagando impostos, roçando o mato, erguendo paredes, plantando, pastado o gado e colhendo frutos.
2. Tudo feito à vista de toda a gente e sem oposição.
3. Aquando do embargo o R., através da sua funcionária MGSP, indicou ao A. que não poderia executar trabalhos no terreno, incluindo na zona da vinha.
4. Em consequência do embargo, o A. abandonou e deixou de cultivar a vinha.´
5. O Município da Povoa de Lanhoso não embargou obras idênticas às do A. que os vizinhos dos prédios confinantes levaram a cabo nos seus terrenos.

3 – DE DIREITO
Cumpre apreciar as questões suscitadas pela ora Recorrente, o que deverá ser efectuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito, pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redacção conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.

I- O recorrente, depois de elencar alguma matéria de facto nas conclusões b) a p) vem, nas conclusões r) a v), sustentar que ocorre vício de incompetência para prolatar o acto impugnado por parte do Vereador da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso. O embargo de obras será da competência do Presidente da Câmara Municipal.
Estamos perante uma questão nova que não foi invocada na primeira instância, nem foi, por esta razão, apreciada nessa sede.
Os recursos, nos termos do artigo 627º do CPC, são meios de impugnações judiciais e não meios de julgamento de questões novas. Ou seja, é função do recurso no nosso sistema jurídico, a reapreciação da decisão recorrida e não proceder a um novo julgamento da causa pelo que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que não hajam sido formulados. Salvaguarda-se, naturalmente, a possibilidade de apreciação da matéria de conhecimento oficioso.
Como se refere no Acórdão do STJ proc. n.º 09P0308, de 25-03-2009:
I - É regra geral do regime dos recursos que estes não podem ter como objecto a decisão de questões novas, que não tenham sido especificamente tratadas na decisão de que se recorre, mas apenas a reapreciação, em outro grau, de questões decididas pela instância inferior. A reapreciação constitui um julgamento parcelar sobre a validade dos fundamentos da decisão recorrida, como remédio contra erros de julgamento, e não um julgamento sobre matéria nova que não tenha sido objecto da decisão de que se recorre.
II - O objecto e o conteúdo material da decisão recorrida constituem, por isso, o círculo que define também, como limite maior, o objecto de recurso e, consequentemente, os limites e o âmbito da intervenção e do julgamento (os poderes de cognição) do tribunal de recurso.
III - No recurso não podem, pois, ser suscitadas questões novas que não tenham sido submetidas e constituído objecto específico da decisão do tribunal a quo; pela mesma razão, também o tribunal ad quem não pode assumir competência para se pronunciar ex novo sobre matéria que não tenha sido objecto da decisão recorrida.
Ou, como se refere em recente Acórdão o mesmo Tribunal proc. n.º 1866/11.4TTPRT.P1.S1, de 24-02-2015:

1. Com excepção das questões de conhecimento oficioso, os recursos destinam-se a reapreciar as decisões tomadas pelos tribunais de inferior hierarquia e não a decidir questões novas que perante eles não foram equacionadas.

No caso em apreço o recorrente não invocou na primeira instância a questão da incompetência do autor do acto pelo que não é uma questão que se possa agora apreciar neste Tribunal.

Vem, no entanto, o recorrente referir que o acto será nulo porque teria sido prolatado por quem não tinha competência para o efeito, ou seja, estaria viciado por usurpação de poderes.

O vício de usurpação de poderes consiste na prática” por um órgão administrativo de um acto incluído nas atribuições do poder legislativo, do poder moderador ou do poder judicial, e portante excluído das atribuições do poder executivo” (Curso de Direito Administrativo, vol. II, Diogo Freitas do Amaral, 2011, 2ª edição, pág. 423).
Ou seja, a usurpação de poderes manifesta-se pela prática pela Administração de um acto que decide uma questão do âmbito do poder legislativo, moderador ou judicial. Dito de outro modo, quando se pratica um acto que é da competência dos outros poderes do Estado.
Ver, neste sentido, Acórdão deste Tribunal n.º 00217/08.0BEVIS, de 03-05-2012, quando refere:

I- A usurpação de poderes consiste na prática por um órgão da Administração de ato que decide uma questão que é da competência dos outros poderes do Estado (legislativo, moderador e/ou judicial).

O recorrente vem sustentar que ocorre vício de usurpação de poderes uma vez que o Vereador da Câmara Municipal praticou um acto da competência do Presidente da mesma Câmara Municipal.

O Presidente da Câmara Municipal e o Vereador da Câmara estão integrados na mesma pessoa colectiva de direito público, o Município. Estão ambos integrados no poder Administrativo do Estado. Ou seja, um acto praticado por um Vereador que se encontre no âmbito dos poderes do Presidente da Câmara Municipal não é um acto que seja praticado por um qualquer órgão ligado ao poder legislativo, ao poder moderador ou do poder judicial. É um acto praticado dentro do mesmo poder do Estado, o poder Administrativo, pelo que um acto praticado nestes termos nunca pode ser considerado que esteja viciado por usurpação de poderes.

Não vemos, assim, manifestamente, que ocorra qualquer vício de usurpação de poderes nem a factualidade invocada se enquadra minimamente nos pressupostos deste vício.

Pelo exposto não podem proceder estas conclusões do recorrente, uma vez que em sede de recurso não podem ser conhecidas questões novas que não sejam de conhecimento oficioso, o que não é o caso dos autos.

II- Vem o recorrente sustentar, nas suas conclusões w) a ee) que a obra não poderia ser embargada, sendo assim o despacho anulável, uma vez que as obras que se encontravam em área REN já se encontravam executadas. O embargo só pode afectar obras quando estas estejam a decorrer. Aliás, refere esta mesma questão nas conclusões p) e q). Fundamenta o seu raciocínio no facto de o embargo aplicar-se às obras que estão a ser executadas, conforme refere o artigo 102º do RJEU, e a demolição às obras já concluídas (artigo 106º).

Analisada a matéria de facto dada como provada verifica-se que o recorrente encontrava-se, à data do embargo, a executar determinados trabalhos de movimentação de terras, remodelação de terrenos e criação de socalcos, num terreno que é proprietário, mas sem licença camarária para a execução de tais obras.

Este terreno do Autor encontra-se inserido em espaço florestal e, parcialmente, condicionado como zona de Reserva Ecológica Nacional.

As obras que o recorrente se encontrava a executar iniciaram-se na zona norte do terreno, no espaço integrado em REN, e prosseguiram até ao espaço florestal a nascente/sul.
Quando do embargo estavam a ser executadas nesta parte.
Não é pelo facto de as obras terem eventualmente terminado na zona integrada na área REN e agora estarem a ser executadas em espaço florestal que a obra não podia ser embargada. As obras encontravam-se a ser desenvolvidas num único terreno propriedade do recorrente, que por acaso abrange duas classificações. Não estamos perante duas obras mas sim perante uma obra realizada numa só propriedade. Não se vê, assim, como não poderia ter sido embargada toda a obra, se não estamos perante duas realidades diferentes, nem aliás, o recorrente vem sustentar que tenham ocorrido obras diferentes no terreno em causa.
Como muito bem se refere na decisão recorrida, “com efeito, pese embora o A. parecer ter a pretensão de que estando no dia e hora do embargo as máquinas apenas a trabalhar em espaço florestal, estando já concluídos os trabalhos que decorreram na parte do prédio correspondente a REN, então o embargo não poderia ter como fundamento a circunstancia de em espaço REN aquele tipo de trabalho não poder ter lugar. Esquece-se o A., todavia, que a obra era e é única. Com efeito, pese embora os trabalhos terem sido iniciados na parte do terreno correspondente a REN e estando à data do embargo já na parte do terreno correspondente a espaço florestal, tratava-se de uma obra única que passava pela criação de socalcos/patamares numa área do prédio que em termos de qualificação e classificação se divide em dois espaços (florestal e REN).
Não se pode cindir a obra para efeitos de abrangência do embargo. O embargo, traduzindo-se na paralisação de obra, e sem que do mesmo decorra ser parcial, abrange a totalidade da obra e não apenas os trabalhos que no dia e hora em que o embargo ocorreu estavam a ser concretamente executados. O que se pretende é suspender a totalidade dos trabalhos que estavam a ser realizados na globalidade da área intervencionada e essa área, no caso dos autos, não correspondia apenas a espaço florestal mas também ao espaço classificado como REN e que já em dias anteriores tinha sido o alvo dos trabalhos de remodelação e criação de socalcos.
Entender o oposto – ou seja que o embargo apenas poderia incidir, e consequentemente, fundar-se, nos trabalhos ocorridos no espaço florestal e que eram os que estavam a ser executados na hora do embargo - seria permitir que o A. pudesse continuar os trabalhos na restante área, incluindo no espaço REN.
Daqui resulta que, efetivamente, o embargo se traduziu na paralisação dos trabalhos em todo o espaço do prédio do A. que foi intervencionado durante aquelas obras de remodelação de terreno e criação de socalcos, ou seja, quer o espaço florestal, quer o espaço classificado como REN”.
Assim sendo, pelo exposto, conclui-se que também não procedem estas conclusões do recorrente

III- Nas suas conclusões ff) a ll) vem o recorrente sustentar que as obras em causa não careciam de licença. A obra tinha fins agrícolas.

Relativamente aos socalcos, os mesmos pretendiam evitar a erosa agrícola e são obras de escassa relevância urbanística.

Na decisão recorrida refere-se quanto a este aspecto:

Ora, quanto aos trabalhos executados em espaço florestal resulta das normas transcritas supra, constantes do P.D.M. aplicável, que as zonas florestais destinam-se à produção de material lenhoso, resinas e outros produtos florestais e ainda à prática da pastorícia, podendo as mesmas ser alvo de edificação no que se refere à construção de habitação, desde que o terreno possua uma área mínima de 5000 m2 e acesso a partir de caminho público, sendo o índice de utilização máximo de 0,05 e o número de pisos igual ou inferior a dois, instalações de apoio à atividade florestal, equipamentos de interesse municipal e indústrias relacionadas com a atividade florestal.

Além disso, no mesmo diploma são inseridas normas que regulamentam as ações de florestação ou reflorestação, sendo que a intervenção em solos da REN, deve obrigatoriamente fazer-se sem recursos a espécies florestais de rápido crescimento, nomeadamente o eucalipto e em solos não incluídos na REN poderá fazer-se com espécies florestais de rápido crescimento, desde que em conformidade com o disposto no n.º 1.º da Portaria n.º 528/89, de 11 de julho.
Mais resulta do Decreto-Lei n.º 139/1989, de 28 de Abril, que carecem de licença das Câmaras Municipais, as ações de destruição do revestimento vegetal que não tenham fins agrícolas e as acções de aterro ou escavação que conduzam à alteração do relevo natural e das camadas do solo arável.
Por um lado, a plantação de amendoeira, não se tratando esta de espécie florestal mas antes de espécie arbórea agrícola, não poderá ser considerada uma ação de florestação, afastando-se pois do destino a que estes espaços devem ser afetos - produção de material lenhoso, resinas e outros produtos florestais e prática da pastorícia – nos termos do RPDM.
Por outro lado, ainda que se considerasse a amendoeira uma espécie florestal e quanto à plantação de pinheiro, importa notar que as obras do A. implicaram a destruição do revestimento vegetal existente, bem como uma intervenção mecânica que movimentou as camadas superficiais do solo designadamente aterro, de modo a prepará-lo para a plantação de árvores. Estas ações são obrigatoriamente licenciadas pela Câmara Municipal, nos termos do artigo 1.º, nº 1, als. a) e b) do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril.
Daí que porque os trabalhos executados pelo A. no espaço florestal não constituíram uma ação de florestação permitida e porque a considerarem-se uma ação de florestação careciam de prévia licença camarária de que o A. não dispunha, naturalmente que o embargo que sobre as mesmas incidiu não padece de qualquer ilegalidade.
E quanto aos trabalhos realizados na área do terreno integrada em REN, cabe realçar que as limitações são ainda mais marcantes e exigentes para que se possa encetar qualquer alteração ao terreno em causa.
Com efeito, o artigo 4.º do Decreto-lei 93/99, de 19 de Março [que regula o espaço REN], supra transcrito, dispõe que são proibidas as ações de iniciativa pública ou privada que se traduzam em operações de loteamento, obras de urbanização, construção e ou ampliação, obras hidráulicas, vias de comunicação, aterros, escavações e destruição do coberto vegetal.
Ora, o Autor levou a cabo atividades de aterro e destruição do coberto vegetal, actividades essas que são proibidas na área inserida em espaço REN.
E nem se pode dizer que as mesmas tenham cabimento nas exceções previstas nos demais artigos supra transcritos [cfr. artigo 4.º, n.ºs 2 e 3 e 6.º], pelo que, na parte em que estejam enquadradas em zona REN são ilegais e não poderiam prosseguir, tendo o embargo sido legalmente praticado, por devido.

Tendo em atenção a data dos factos aplica-se ao caso dos autos Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril (este diploma veio a ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 254/2009, de 29 de Abril que aprovou o Código Florestal) que no seu artigo 1º refere que carecem de licença das câmaras municipais:
a) as acções que destruição do revestimento vegetal que não tenham fins agrícolas e
b) as acções de aterro e escavação que conduzam à alteração do relevo natural e das camadas do solo arável.
Este diploma que procura proteger o relevo natural e o revestimento vegetal do solo, refere expressamente que carecem de licença camarária as acções de aterro e escavação que levem à alteração do relevo natural e do solo arável. Como se vê da matéria de facto dada como provada, o recorrente encontrava-se a no terreno em causa nos autos a proceder a obras de terraplanagem, movimentações de terras, aterro, remodelação de terreno e criação de socalcos, com vista à plantação de pinheiros e amendoeiras. Ou seja, encontrava-se não só a fazer terraplanagens e remodelação do terreno como estava a proceder à criação de socalcos. Aliás, quando do embargo já se encontravam executados cerca de 6 socalcos com 100 metros de comprimento e 4 metros de largura. Esta actividade conduz necessariamente à alteração do relevo natural e das camadas do solo arável, pelo que tais trabalhos sempre necessitavam de licença camarária, nos termos do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril.
Por seu lado verifica-se ainda que o terreno em causa também se encontra parcialmente integrado em área REN.
À data da prolação do acto impugnado encontrava-se em vigor o Decreto-lei 93/90, de 19 de Março, que regulava o espaço REN (decreto este revogado pelo Decreto-Lei n.º 166/2008, de 22 de Agosto), sendo, assim, este o diploma aplicado ao caso dos autos.
Refere o artigo 4.º, sob a epígrafe, regime, que:

1 - Nas áreas incluídas na REN são proibidas as acções de iniciativa pública ou privada que se traduzam em operações de loteamento, obras de urbanização, construção e ou ampliação, obras hidráulicas, vias de comunicação, aterros, escavações e destruição do coberto vegetal…

Por seu lado, menciona o artigo 11º deste diploma que a fiscalização do seu cumprimento compete, entre outras entidades, aos municípios.
O artigo 14º n.º 1, por seu lado, refere que à Direcção-Geral do Ordenamento do Território, às comissões de coordenação regional, aos municípios…. compete embargar e demolir as obras, bem como fazer cessar outras acções realizadas em violação ao disposto no presente diploma.
Ou seja, mesmo o diploma que regulamenta a área REN atribui aos municípios competência para fiscalizar entre outras actividades as escavações, aterros e destruição do coberto vegetal.
Assim sendo não se vê como pode o recorrente sustentar que as obras que estava a realizar, não necessitariam de licença municipal, quando essa licença está perfeitamente prevista no Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, estando o embargo das obras em causa previsto também no diploma que regula a área REN.
É de acrescentar ainda que os trabalhos desenvolvidos pelo recorrente também se integram nos termos do artigo 4º, n.º 2 alínea b) do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho, em vigor à data dos factos, quando refere que estão sujeitos a licença administrativa, as obras de urbanização e os trabalhos de remodelação de terrenos em área não abrangida por operação de loteamento, que é o caso dos autos.
O artigo 2º alínea l), artigo este do qual constam as definições integrar o referido diploma legal, refere que os trabalhos de remodelação de terrenos, são as “ operações urbanísticas não compreendidas nas alíneas anteriores que impliquem a destruição do revestimento vegetal, a alteração do relevo natural e das camadas de solo arável ou o derrube de árvores de alto porte ou em maciço para fins não exclusivamente agrícolas, pecuários florestais ou mineiros”.
Como se vê da matéria de facto dada como provada o recorrente encontrava-se a construir socalcos no terreno, e já se encontravam executados cerca de 6 socalcos com 100 metros de comprimento e 4 metros de largura (e de cerca de dois metros de altura como consta do processo contra-ordenacional), alguns dos quais implantados em parte do terreno condicionado por REN. A construção de socalcos pode ter como finalidade evitar a erosão do terreno e/ou torná-lo mais acessível aos trabalhos agrícolas, mas a sua construção não pode deixar de ser considerada uma obra, para os efeitos do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro.
Por seu lado as obras em causa, até pela sua dimensão, não podem ser consideradas, como refere o recorrente, como de escassa relevância urbanística e por isso isentas de licença Municipal.
Na verdade refere o artigo 6º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, com a redacção ada pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho, que, podem ser dispensados de licença ou autorização mediante previsão em regulamento municipal, as obras de edificação ou demolição que, pela sua natureza, dimensão ou localização tenham escassa relevância urbanística.
Assim sendo, para que determinas obras se possam considerar de escassa relevância urbanística tinham as mesmas que se encontrar definidas em regulamento municipal. Ora, não vem alegado, nem se verifica dos autos, que, nesta data, o Município recorrido dispusesse de regulamentação nesta área.
Por seu lado é de referir que as obras em causa sempre estariam sujeitas ao procedimento de comunicação prévia, regulado nos artºs 34º a 36º do D.L. nº 555/99, de 16 de Dezembro, o que se verifica não ter acontecido.
O recorrente na sua conclusão JJ) vem invocar determinadas características definidoras sobre o que se deve entender por obras de escassa relevância urbanística. No entanto esta definição é retirada de diplomas que entraram em vigor em data posterior à vigência dos factos sendo, assim, tal questão irrelevante para analisar da validade do acto impugnado. Na verdade, de acordo com o princípio tempus regit actum a legalidade do acto administrativo afere-se pela realidade fáctica existente no momento da sua prática e pelo quadro normativo então em vigor.
De todo o exposto, verificando-se que o recorrente necessitava quer pela aplicação do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, quer pelo diploma que regula a área REN (Decreto-lei 93/90, de 19 de Março), que ainda através pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, de licença camarária para proceder às obras de terraplanagem, movimentações de terras, aterro, remodelação de terreno e criação de socalcos, não podem proceder também estas suas conclusões, não merecendo a decisão recorrida a censura que lhe vem assacada que, assim, se confirma.

3 – DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente
Notifique.

Porto, 7 de Abril de 2017
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco