Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00831/15.7BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:09/23/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:PEDIDO DE CERTIDÃO; INFORMAÇÃO PROCEDIMENTO;
CORREIO ELECTRÓNICO; ASSINATURA; N.ºS 1 E 2, DO ARTIGO 26º DECRETO-LEI N.º135/99, DE 22.04; N.º 3 DO ARTIGO 26º DECRETO-LEI N.º135/99, DE 22.04; ARTIGO 74º DO CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE 1991; ARTIGO 13º DA LEI DE ACESSO AOS DOCUMENTOS DA ADMINISTRATIVOS (LEI N.° 65/93, DE 26.08); ARTIGO 10º DA LEI DE ACESSO AOS DOCUMENTOS DA ADMINISTRATIVOS.
Sumário:A correspondência por correio electrónico é equiparada, como regra, à correspondência em papel, face ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 26º Decreto-Lei n.º135/99, de 22.04.
2. Esta regra, porém, comporta uma ressalva, quando é exigível a assinatura, caso em que é exigida a autenticação do documento electrónico nos termos definidos por diploma regulamentador, face ao disposto no n.º 3 do artigo 26º Decreto-Lei n.º135/99, de 22.04.
3. O pedido de emissão de certidão no âmbito do acesso à informação procedimental, não é um pedido inicial de um qualquer procedimento mas antes um requerimento inserido num procedimento já instaurado pelo que não se aplica a exigência de assinatura desse requerimento face ao disposto no artigo 74º do Código de Procedimento Administrativo de 1991 (aprovado pela Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de Novembro).
4. A exigência de assinatura para aceder a documentos ou informações procedimentais, nos termos do artigo 13º da Lei de Acesso aos documentos da Administrativos (Lei n.° 65/93, de 26.08), não se limita a garantir a identificação do requerente ou sua legitimidade para fazer o requerimento.
5. Esta exigência de assinatura vai mais além, antes se configura como assumir de um compromisso pessoal, o de utilizar os dados pessoais comunicados para fins diversos dos que determinaram o acesso, nos termos consignados no artigo 10º da Lei de Acesso aos documentos da Administrativos.
6. Face a estes dispositivos, o pedido de emissão de certidão no âmbito do acesso à informação procedimental, feito por correio electrónico sem assinatura autenticada, não é legal pelo que a entidade requerida não está obrigada a satisfazer o pedido formulado desta forma.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados
Recorrido 1:JLCMSC
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Intimação para prestação de informações, consulta de documentos e passagem de certidões (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
O Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 09.07.2015, pela qual foi julgada totalmente procedente a intimação para prestação de informações e passagem de certidões intentada por JLCMSC.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 62.º, n.º 2, 64.º, n.º 1 do Código de Procedimento Administrativo, 3.º, n.º 1, alínea b) e 6.º, nº 5 da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos, 87.º, n.º 1, alínea b) e 120.º, n.º 4 e 6 do Estatuto da Ordem dos Advogados e 104.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

O recorrido contra-alegou, defendendo a manutenção do decidido; suscitou ainda a questão prévia da falta de pagamento integral da taxa de justiça devida pela interposição do recurso.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*
Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

I. O presente recurso de apelação tem por objecto a impugnação, com vista à sua revogação pelo Tribunal ad quem, da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 09 de Julho de 2015, que julgou totalmente procedente a intimação para passagem de certidão, condenando o recorrente/requerido “a passar, no prazo de 10 dias, certidão integral do processo disciplinar” n.º 306/2009-P/D referente a um advogado inscrito na Ordem dos Advogados Portugueses.

II. Tendo por fundamento a verificação de erros de julgamento de Direito por erro na determinação das normas aplicáveis e por erros de interpretação e aplicação, e consequente violação, pelo menos das normas dos artigos 62.º, n.º 2, 64.º, n.º 1, 74.º, n.º 1, alínea e), 77.º e 79.º do CPA (na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15/11), 2.º, 3.º, n.º 1, alínea b), 4.º, n.º 1, alínea c), 6.º, n.º 5, 8.º, n.º 2, 13.º, n.º 1 da LADA, e 87.º, n.º 1, alínea b) e 120.º, n.ºs 4 e 6 do EOA – cf. artigos 140.º do CPTA e 639.º, n.º 2 do CPC, na redacção em vigor.

III. A questão de fundo que importa resolver nos presentes autos reside em saber se o recorrido/requerente tem, no caso concreto, e na qualidade de participante/denunciante, o direito ou não à passagem de certidão integral de todo o procedimento disciplinar n.º 306/2009-P/D, que respeita a um advogado português e que foi tramitado no seio do Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados Portugueses.

IV. O recorrido/requerente, por mensagem de correio electrónico não assinada, apresentou ao recorrente um requerimento de passagem de certidão de todo o procedimento disciplinar n.º 306/2009-P/D, sem no entanto invocar ou sequer demonstrar qual o fim especifico a que se destinava a informação, sem alegar qualquer interesse que, com a mesma, pretendia assegurar e sem sequer ter identificado os documentos que pretendia ver certificados (ponto A) da matéria de facto dada como assenta na douta Sentença recorrida.

V. O recorrente/requerido, através de oficio n.º D/2192-15, já tinha procedido à notificação ao recorrido da decisão final do procedimento disciplinar e da respectiva fundamentação (ponto B) da matéria de facto dada como assente na douta sentença recorrida).

VI. O recorrente/requerido não se conforma como o teor da sentença recorrida, porquanto entende, desde logo, que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de Direito, por errada determinação das normas aplicáveis à resolução do litígio, dado que o Regulamento n.º 42/2002 não era aplicável ao caso concreto, por já ter sido revogado pelo Regulamento Disciplinar n.º 873/2010.

VII. Por outro lado, a resolução da questão de Direito sob apreciação exigia, ao contrário do sustentado pelo Tribunal a quo, a aplicação das pertinentes normas do CPA, da LADA e do EOA, tendo a sentença recorrida feita aplicação apenas das normas constantes do Regulamento Disciplinar n.º 42/2002.

VIII. O Tribunal a quo, ao sustentar a sua decisão (de fundo) apenas nas normas do Regulamento n.º 42/2002 e ao afastar a aplicação das normas da LADA, sem tomar em consideração a norma do artigo 120.º, n.º 4 do EOA, incorreu em erro de julgamento de Direito, por erro na determinação da norma aplicável, com consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 62.º, n.º 2 e 64.º, n.º 1 do CPA, 2.º, 3.º, n.º 1, alínea b), 4.º, n.º 1, alínea c), 6.º, n.º 5, 8.º, n.º 2, 13.º, n.º 1 da LADA e 120.º, n.º 4 do EOA.

IX. O Tribunal a quo, ao não qualificar a informação e os documentos administrativos do processo disciplinar em referência como sendo nominativos e, consequentemente, de acesso legalmente condicionado, incorreu em erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 3.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 6.º, n.º 5 da LADA, 62.º, n.º 2 e 64.º, n.º 1 do CPA, 87.º, n.º 1, alínea b) e 120.º, n.º 4 do EOA – cf. o paradigmático acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 17/04/2015, processo n.º 2907/14.9BEPRT, que, juntamente com a maioria dos pareceres da CADA, sustenta serem os documentos integrados em processos disciplinares de natureza nominativa e, consequentemente, sujeitos a restrições legais no que respeita ao seu acesso.

X. A sentença recorrida padece ainda de erro de julgamento de Direito ao considerar que o requerimento, no qual foi solicitada a passagem de certidão, era válido, mesmo tendo sido apresentado via electrónica e sem a assinatura do requerente/recorrido.

XI. As normas dos artigos 77.º, n.º 1 e 79.º do CPA (na redacção então em vigor) impõem que os requerimentos em procedimentos administrativos sejam apresentados pessoalmente no serviço ou mediante correio registado com aviso de recepção – o que, in casu, não se verificou.

XII. Todo o requerimento contendo pedido escrito de informação administrativa, incluindo passagem de certidão, deve ser sempre assinado pelo requerente ou por outrem a seu rogo, como resulta expressamente das normas dos artigos 74.º, n.º 1, alínea e) do CPA e 13.º, n.º 1 da LADA.

XIII. A falta de assinatura do requerimento em referência constitui fundamento de inexistência jurídica do mesmo ou, pelo menos, de nulidade, pelo que, sendo o requerimento juridicamente inexistente ou nulo, conclui-se que não podia o recorrente/requerido pronunciar-se sobre o mesmo.

XIV. Como a acção de intimação pressupõe a existência (jurídica) de um prévio requerimento de pedido de informação administrativa, que não foi satisfeito ou o foi apenas parcialmente, conclui-se que o requerente/recorrido não tinha legitimidade processual para intentar a presente acção de intimação.

XV. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 74.º, n.º 1, alínea e), 77.º e 79.º do CPA, 13.º, n.º 1 da LADA e 104.º, n.º 1 do CPTA.
Sem prejuízo e por dever do ofício.

XVI. O Tribunal a quo, ao decidir que a mera invocação da qualidade de participante no processo disciplinar e de que a informação solicitada se destinava a fins judiciais era suficiente para que o requerente/recorrido pudesse ter acesso a certidão integral da totalidade do procedimento disciplinar, incorreu em erro de julgamento de Direito, por erro na determinação das normas aplicáveis, bem como por erro na interpretação e aplicação, e consequente violação, das normas dos artigos 62.º, n.º 2 e 64.º, n.º 1 do CPA, 3.º, n.º 1, alínea b), 6.º, n.º 5 da LADA, 87.º, n.º 1, alínea b) e 120.º, n.º 4 do EOA.

XVII. O acesso a certidão referente a documentos nominativos integrados em processos (administrativos) disciplinares, tramitados no âmbito da Ordem dos Advogados Portugueses, encontra-se legalmente condicionado ao preenchimento dos pressupostos estabelecidos na lei geral em matéria de acesso a informações administrativas (artigos 62.º, n.º 2 e 64.º, n.º 1 do CPA, 6.º, n.º 5 da LADA, 87.º e 120.º, n.º 4 do EOA).

XVIII. A mera invocação da qualidade de denunciante/participante do procedimento disciplinar apenas legitimava o requerente/recorrido a ter acesso à decisão final do procedimento e respectiva fundamentação, sendo que, quanto ao mais, teria sempre o recorrido/requerente que invocar e demonstrar especificamente o fim a que se destinava a informação, o interesse que pretendia garantir através do uso da mesma, bem como, sobretudo, quais as informações e documentos que pretendia que fossem certificados.

XIX. O recorrido/requerente, no seu requerimento – que é, aliás, inexistente ou nulo – limita-se apenas a mencionar a sua qualidade de participante e a referir que a informação pedida será usada para fins judiciais. No entanto, não identifica qual o tipo de processo a que a informação se destina, não identifica os documentos que pretende ver certificados e não invoca nenhum interesse que pretende, através da dita informação, garantir.

XX. A simples invocação do fim judicial a que se destina a certidão requerida é manifestamente inócua e, por outro lado, a intimação não serve para obter elementos de prova a usar em processos civis ou penais, pelo que, logo por aí, teria sempre a intimação em referência que ser julgada totalmente improcedente, por falta de legitimidade processual.

XXI. É este o entendimento maioritário na nossa doutrina e Jurisprudência, nomeadamente de MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA: “De acordo com o acórdão do STA de 27 de Maio de 1997, o processo de intimação destina-se a garantir ao interessado o direito à informação ou a permitir o uso de garantias graciosas ou contenciosas no âmbito de relações jurídicas administrativas. A recolha de provas no decurso de um processo-crime ou obtenção de informações, pareceres ou documentos que se mostrem necessários para instruir uma acção cível terá de realizar-se através dos mecanismos processuais adequados a esses fins” (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2.ª edição revista, Almedina, 2007, pág. 618, e, no mesmo sentido, os Acórdãos do STA de 27/05/1997, 23/03/2001, 14/02/1989 e de 26/06/1990, aí citados).

XXII. A total falta de invocação do fim específico a que se destina a informação, a falta de indicação dos documentos a que pretendia ter acesso e a falta de alegação de um qualquer interesse que pretendia ver assegurado com o uso da mesma, determina a falta de legitimidade e de interesse (processual ou procedimental) em o Recorrido/Requerente ter acesso a certidão integral da totalidade do procedimento disciplinar.

XXIII. Perante tal omissão, o recorrente/requerido não podia dar cumprimento às normas legais que condicionam o acesso e disponibilização de informações administrativas nominativas, designadamente não podia, em concreto, determinar se a comunicação desses dados é adequada, necessária e estritamente proporcional, nem podia limitar o acesso a tal informação em cumprimento das normas fixadas nos artigos 62.º, n.º 2 do CPA, 8.º, n.º 2 da LADA, 120.º, n.ºs 4 e 6 do EOA.

XXIV. Como não se sabe qual o fim nem qual o interesse a que se destina a informação nominativa solicitada e como nem sequer se sabe que informação o recorrido/requerente pretende, é lógico que nenhuma informação lhe deve ser comunicada/certificada.

XXV. Para além das limitações resultantes do regime geral – que por si só condicionam o acesso à referida informação – importa ainda considerar o regime especial estabelecido no EOA, em especial o disposto no artigo 120.º, que prevê que todo o processo disciplinar é secreto até ao despacho de acusação e “perdura posteriormente como sendo confidencial” (neste sentido, FERNANDO DE SOUSA MAGALHÃES, Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado e Comentado, 3.ª edição, Almedina, 2006, pág. 162).

XXVI. O acesso a tais informações, com a passagem de certidão da totalidade do procedimento disciplinar do advogado visado, está sujeito às restrições constantes do artigo 120.º do EOA, que determina que o Conselho de Deontologia “pode”, em função da qualidade do requerente e do interesse (legitimo) que este invoque, autorizar ou não autorizar a passagem de certidão.

XXVII. O requerente/recorrido tinha o dever, caso quisesse aceder a informação disciplinar para além da decisão final e sua fundamentação, que especificar (i) qual o fim a que se destina a informação, (ii) qual o interesse que pretende salvaguardar e, sobretudo, (iii) quais os documentos que pretende ver certificados, pois, só assim se consegue, se for o caso e se for necessário, condicionar a utilização dessa informação e eventualmente responsabilizar o Requerente caso a mesma seja usada indevidamente – cf. parte final do n.º 4 e n.º 6 do artigo 120.º do EOA.

XXVIII. Como o requerente não invocou nenhum fim nem interesse específico e como nem sequer disse quais os documentos a que pretendia ter acesso, o recorrido/requerido tinha o dever deontológico – resultante do instituto do segredo profissional – e a obrigação legal de não dar satisfação ao pedido do requerente.

XXIX. Como não estavam concretamente preenchidos os pressupostos legais para aceder àquela informação, o Tribunal a quo não podia intimar o recorrente/requerido a prestar essa informação.

XXX. Concluindo, e sem prescindir dos restantes argumentos, o Tribunal a quo, ao intimar o Recorrente a passar certidão integral do procedimento disciplinar respeitante a advogado português, incorreu em erro de julgamento de Direito por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 62.º, n.º 2, 64.º, n.º 1 do CPA, 3.º, n.º 1, alínea b) e 6.º, nº 5 da LADA, 87.º, n.º 1, alínea b) e 120.º, n.º 4 e 6 do EOA e 104.º, n.º 1 do CPTA.

XXXI. Devendo, consequentemente, ser julgado totalmente procedente o presente recurso de apelação com consequente revogação da douta Sentença recorrida e sua substituição por outra decisão que julgue totalmente improcedente a presente intimação, com as legais consequências.
*

Questão prévia: a falta de pagamento da taxa de Justiça devida.

Esta questão foi já apreciada em primeira instância, pelo despacho de fls. 142, de 25.08.2015.

E o recorrido – único que decaiu no incidente – não interpôs recurso deste despacho, pelo que o mesmo transitou em julgado.

Termos em que não se conhece desta questão.


*

II – Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

A) No dia 23/02/2015, o autor requereu mediante correio electrónico, o seguinte:

«(…)

Exmo Senhor Presidente do Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados

Proc. 306/2006-P/D

JLCMSC, participante nos autos à margem, com morada (…), vem requerer, nos termos do artigo 62 e seguintes do Código de Procedimento Administrativo, uma certidão integral de todo o processo disciplinar, incluindo as capas do processo, para efeitos judiciais.

Nos termos do n. 4 do artigo 112.º do EOA “A prescrição do procedimento disciplinar tem sempre lugar quando, desse o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade” (prazo com início na data dos factos) e legalmente o processo disciplinar prescreveu em outubro de 2014, tendo em conta que os factos do processo são de Maio de 2007 e não existem interrupções ou suspensões conhecidas do processo.

Face a prescrição (oficial ou oficiosa) o processo passa a ser de consulta livre das partes processuais, incluindo a emissão de certidões.

Aguarda notificação no prazo de 10 dias.

Com os melhores cumprimentos.

O Participante.

JLCMSC

(…)».

B) Mediante carta registada, datada de 18 de Março de 2015, o autor foi notificado pelo Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados, do seguinte:

«(…)

Pela presente fica V. Exa. notificado do Acórdão proferido pela 1ª Secção do Conselho de Deontologia do Porto, reunida em sessão de conselho no dia 13 de Março de 2015 e bem assim, do Parecer exarado pelo Exmo Senhor Relator, no processo supra identificado, em que sob participação remetida por V. Exa. é participado (…).

Em anexo, encontrará V. Exa. cópia dos mencionados Parecer e Acórdão.

O prazo para interposição de recurso, querendo, é de 15 (quinze) dias, devendo o mesmo ser motivado, enunciando especificadamente os fundamentos do recurso e terminando com a formulação de conclusões, sob pena da sua não admissão, mais devendo ser dirigido ao Conselho Superior mas apresentado neste Conselho de Deontologia.

Consigna-se que o disposto no art.º 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil não é aplicável à contagem do prazo ora indicado, sendo certo que o mesmo suspende durante as férias judiciais.

(…)”.


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III - Enquadramento jurídico.

1. O requerimento apresentado por via electrónica: a falta de assinatura.

É o seguinte o teor da decisão recorrida, nesta parte:

“(…)

Em primeiro lugar compete apreciar a validade do requerimento efetuado pela via eletrónica.

Sobre este assunto compete chamar à colação a jurisprudência dos tribunais superiores que sobre assuntos idênticos já se pronunciaram. Assim, no Acórdão do TCA Sul de 21/03/2013, proferido no processo n.º 09623/13, decidiu-se o seguinte:

«4. A correspondência transmitida via correio electrónico e por telecópia (fax) tem o mesmo valor da trocada em suporte de papel, devendo ser-lhe conferida, pela Administração e pelos particulares, idêntico tratamento - artº 26º nº 2 do DL 135/99 de 22.04, interpretado extensivamente».

No mesmo sentido o Acórdão do STA de 18/06/2009, proferido no processo n.º 0393/08, segundo o qual a transmissão por correio eletrónico tem ao mesmo valor que o suporte papel.

Ora, o aqui Autor, naquele processo disciplinar, não era um cidadão desconhecido para a Ordem dos Advogados, porque foi, precisamente, o queixoso. Assim, a Entidade Requerida, muito bem sabia quem a estava a interpelar. Aliás, no requerimento, o Autor identifica-se nominalmente e como «O Participante». Daí que o Requerente se deva considerar cabalmente identificado, porque, com o pedido de certidão não está a iniciar um procedimento, mas a realizar um pedido no próprio processo disciplinar, onde foi o participante. Também, por esse motivo, não pode ser aplicável a exigência do artigo 74.º do CPA, uma vez que não se tratava de um requerimento inicial de pedido de abertura de um procedimento administrativo, mas um pedido realizado no próprio processo administrativo, o qual não carece já da solenidade inicial, porquanto o impetrante já está devidamente identificado no procedimento.

Face ao exposto, o pedido de passagem de certidão pode ser efetuada pela via eletrónica, da forma como foi realizada.

(…)”

Dispõe o artigo 74º do Código de Procedimento Administrativo de 1991 (aprovado pela Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de Novembro), sob a epígrafe “Requerimento inicial):

1 - O requerimento inicial dos interessados, salvo nos casos em que a lei admite o pedido verbal, deve ser formulado por escrito e conter:

(…)

e) A data e a assinatura do requerente, ou de outrem a seu rogo, se o mesmo não souber ou não puder assinar.

O pedido de emissão de certidão no âmbito do acesso à informação procedimental – o que aqui sucede - não é um pedido inicial de um qualquer procedimento mas antes um requerimento inserido num procedimento já instaurado pelo que não se aplica a exigência de assinatura desse requerimento.

No caso presente o requerente foi o denunciante pelo que estava perfeitamente identificado e a entidade requerida conhecia a sua identidade pelo que não se aplicava a esta situação a exigência de assinatura do requerimento, como forma de assegurar e controlar a identidade do requerente, nos termos desta disposição legal.

O que não invalida, no caso, a exigência de assinatura por fundamento diverso que abordaremos à frente.

Por seu turno dispõe o artigo 77º do Código de Procedimento Administrativo, sob a epígrafe “Apresentação de requerimentos”:

“1 - Os requerimentos devem ser apresentados nos serviços dos órgãos aos quais são dirigidos, salvo o disposto nos números seguintes.

(…)

4 - Os requerimentos apresentados nos termos previstos nos números anteriores são remetidos aos órgãos competentes pelo registo do correio e no prazo de três dias após o seu recebimento, com a indicação da data em que este se verificou.”

E, por fim, do mesmo diploma, o artigo 79º, sob a epígrafe “Envio de requerimento pelo correio”:

“Salvo disposição em contrário, os requerimentos dirigidos a órgãos administrativos podem ser remetidos pelo correio, com aviso de recepção.”

Mas o artigo 26º Decreto-Lei n.º135/99, de 22.04, sob a epígrafe “Correio electrónico”:

“1 - Os serviços e organismos da Administração Pública devem disponibilizar um endereço de correio electrónico para efeito de contacto por parte dos cidadãos e de entidades públicas e privadas e divulgá-lo de forma adequada, bem como assegurar a sua gestão eficaz.

2 - A correspondência transmitida por via electrónica tem o mesmo valor da trocada em suporte de papel, devendo ser-lhe conferida, pela Administração e pelos particulares, idêntico tratamento.”

A intenção do legislador foi clara e expressamente modernizar a Administração e as suas relações com os particulares e simplificar todos os procedimentos, conforme consta do preâmbulo e do artigo 1º deste diploma.

Pelo que nesta parte e estabelecendo a única forma de apresentação de requerimentos por correio, salvo disposição em contrário, a apresentação por carta registada com aviso de recepção, deve ter-se por revogado o disposto nos artigos 77º e 79º do Código de Procedimento Administrativo, face à possibilidade expressamente consagrada, em sentido contrário, nos n.ºs 1 e 2, artigo 26º do Decreto-Lei n.º135/99, de 22.04, de apresentar, por regra e indistintamente, requerimentos por correio em papel ou por via electrónica – n.º2 do artigo 7º do Código Civil.

Equiparação que, de resto, se manteve no n.º 3 do artigo 103.º do Código de Procedimento Administrativo de 2015 (aprovado pela Lei 4/2015, de 07.01, que entrou em vigor 90 dias após a sua publicação – artigo 9º):

“Os requerimentos apresentados nos termos previstos no número anterior são remetidos aos órgãos competentes pelo registo do correio, ou por via eletrónica, no prazo de três dias após o seu recebimento, com a indicação da data em que este se verificou.

Simplesmente o n.º 3 do citado artigo 26º do Decreto-Lei n.º135/99, de 22.04, determina:

“À aplicação do princípio constante do número anterior exceptuam-se os efeitos que impliquem a assinatura ou a autenticação de documentos, até à publicação de diploma regulador da autenticação de documentos electrónicos.”

Ou seja, embora por regra os requerimentos possam ser apresentados em papel ou por correio electrónico esta equiparação cessa quando seja necessária, para o requerimento produzir efeitos, a assinatura do requerente.


Os acórdãos citados na decisão recorrida, do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.06.2009, processo 0393/08, e do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21.03.2013, processo 09623/13, não abordam esta questão, da apresentação de um requerimento em que seja exigível a assinatura mas apenas apreciam e decidem - em sentidos opostos, de resto - a questão de saber qual o momento relevante para averiguar a tempestividade do requerimento apresentado por via electrónica, o da remessa pelo requerente ou o da recepção nos serviços administrativos.

Pelo que não resolvem a questão em apreço, saber se no caso concreto o requerimento de passagem e entrega de certidão ao requerente devia ser assinado ou não e, como tal, devia ter sido entregue por carta registada com aviso de recepção.

Ora o artigo 13º da Lei de Acesso aos documentos da Administrativos (Lei n.° 65/93, de 26.08), sob a epígrafe “Forma do pedido”:

O acesso aos documentos deve ser solicitado por escrito através de requerimento do qual constem os elementos essenciais à sua identificação, bem como o nome, morada e assinatura do interessado.

Esta exigência de assinatura vai, em nosso entender, para além da mera necessidade de identificar cabalmente o interessado quando apresenta um requerimento.

Trata-se também de assumir um compromisso, o de que o requerente da certidão não utilizará indevidamente ou para fim diverso do requerido a informação e os dados contidos na certidão a emitir.

Na verdade, ao contrário do que sucede para a generalidade dos requerimentos, o pedido de informações sobre processos pendentes implica para o requerente assumir uma responsabilidade, decorrente do disposto no artigo 10° da Lei de Acesso aos documentos da Administrativos:

1 - É vedada a utilização de informações com desrespeito dos direitos de autor e dos direitos de propriedade industrial, assim como a reprodução, difusão e utilização destes documentos e respectivas informações que possam configurar práticas de concorrência desleal.

2 - Os dados pessoais comunicados a terceiros não podem ser utilizados para fins diversos dos que determinaram o acesso, sob pena de responsabilidade por perdas e danos, nos termos legais.”

Assim se compreende a exigência de assinatura que vai para além da necessidade de identificação do interessado ou até da sua legitimidade para fazer o requerimento, como assumir de um compromisso pessoal.

No caso concreto e face ao se expos o requerimento em apreço, enviado por correio electrónico, porque não assinado, não satisfaz essa exigência legal e, por isso, não traduz para o requerente a assumpção da responsabilidade pela informação requerida.

Pelo que a entidade requerida não estava obrigada a dar satisfação ao pedido de emissão e entrega certidão integral do procedimento disciplinar em apreço.

Termos em que se impõe, na procedência do recurso jurisdicional, revogar o acórdão recorrido e julgar o pedido de intimação totalmente improcedente.


*

2. Restantes questões suscitadas:

Na procedência do recurso e impondo-se julgar logo pela falta do requisito essencial do requerimento, a aposição da assinatura do requerente, improcedente o pedido, fica prejudicado o conhecimento de todas as demais questões.


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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que revogam a decisão recorrida e julgam o pedido de intimação totalmente improcedente.

Custas em ambas as instâncias pelo requerente, ora recorrido, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe vier a ser concedido.

Porto, 23 de Setembro de 2015
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Miguéis Garcia
Ass.: Frederico Branco