Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00830/16.1BEPRT-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/11/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:RESOLUÇÃO FUNDAMENTADA; CONTROLO JURISDICIONAL DA RESOLUÇÃO;
Sumário:1 – O controlo judicial da fundamentação da resolução fundamentada, que deve ser aferido pelo critério estabelecido no artigo 125.º do CPA, é, simultaneamente, um controlo sobre o preenchimento, pela Administração, dos conceitos indeterminados contidos na previsão do artigo 128.º do CPTA, no âmbito do qual o tribunal só pode sindicar o respeito pelos limites de juridicidade que vinculam o preenchimento dessa indeterminação normativa, quando esta envolve valorações próprias do exercício da atividade administrativa.
2 – O mecanismo de tutela contida no artigo 128.º do CPTA, decompõe-se em três fases:
A primeira, consiste na proibição legal de execução do ato suspendendo e assenta numa ponderação de interesses efetuada, em abstrato, pelo legislador, na qual se presume que os prejuízos decorrentes da imediata execução do ato são superiores para o requerente da providência cautelar (artigo 128.º/1 CPTA);
A segunda, desenrola-se num plano extrajudicial e permite que a Administração afaste tal presunção legislativa, sobrepondo a sua própria avaliação de interesses e afastando proibição de executar, mediante uma resolução fundamentada que reconheça que o diferimento da execução é, em concreto, gravemente prejudicial para o interesse público (artigo 128.º/1, 2.ª parte);
A terceira, permite que o requerente da providência requeira ao tribunal a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, com vista a neutralizar os efeitos dos atos entretanto praticados em execução do ato suspendendo, assim restabelecendo, em certa medida, o efeito de proibição da execução (artigo 128.º/4 CPTA).
3 – A Resolução Fundamentada mostrar-se-á insuficientemente fundamentada caso assente predominantemente em afirmações conclusivas e genéricas, designadamente no que concerne aos supostos prejuízos invocados.
O controlo judicial da validade da fundamentação da resolução fundamentada deve ser aferido pelo critério estabelecido no atual artigo 153.º do Código de Procedimento Administrativo (anterior Artº 125º CPA), não se bastando com a verificação da existência de fundamentação, em termos claros e congruentes, mas exigindo também que os motivos apontados sejam suficientes, por conterem elementos bastantes, capazes ou aptos a basear a decisão.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Ministério da Administração Interna e Outro(s)...
Recorrido 1:SINOP – Sindicato Nacional de Oficiais de Policia e Outr(s)...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Outros despachos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento a ambos os recursos.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório

O Ministério da Administração Interna e o SINOP – Sindicato Nacional de Oficiais de Policia, devidamente identificados nos autos, à margem do Procedimento Cautelar apresentado, vieram, separadamente, recorrer jurisdicionalmente, do Despacho de 2 de dezembro de 2016, proferido no TAF do Porto, que julgou improcedentes as razões em que assentou a Resolução Fundamentada e, em consequência, declarou a ineficácia dos atos de execução indevida.

Concluiu o Ministério da Administração Interna o seu recurso apresentado em 22 de dezembro de 2016, o seguinte (Cfr. fls. 19 a 21 Procº físico):

“A. A douta Sentença recorrida, salvo melhor e douta opinião, padece de erro de facto e de direito, quanto à concretização, densificação e valoração do interesse público, em que se baseia a Resolução Fundamentada.

B. Erro de facto porque, entendeu que as funções desempenhadas pelos comissários também poderiam ser desempenhadas pelos subcomissários, por competência própria deste ou neles delegada.

C. Estas duas categorias, da carreira de oficial de polícia da PSP, são distintas e são, igualmente distintas, as funções atribuídas a cada uma.

D. As funções atribuídas à categoria de comissário encontram-se enunciadas no ponto 12 da Resolução Fundamentada, que reproduz o quadro 1, do anexo I, do Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 246/2015 de 19 de outubro.

E. A análise destas funções, em comparação com as dos subcomissários, revela o quanto são diferentes, quanto à natureza orgânica, funcional, hierárquica técnica e operacional e que são insuscetíveis de delegação de competências.

F. A Resolução Fundamentada menciona as necessidades atuais, de meios humanos operacionais da PSP, para assegurar as missões e atribuições que lhe estão cometidas e que ditaram a promoção dos candidatos aprovados, conforme as listas de classificação final, em cada procedimento concursal.

G. Daqui resulta que, a declaração de ineficácia destes atos, praticados pelo Senhor Diretor Nacional da PSP, conduz a um défice operacional, pondo em causa a prossecução das atribuições da PSP, tal como definidas no artigo 3.º da Lei Orgânica da PSP (aprovada pela Lei 53/2007, de 31 de agosto), nomeadamente a garantia das condições de segurança interna, que permitem o exercício dos direitos, liberdades e garantias a todos os cidadãos.

H. Por outro lado, o interesse público na manutenção destes atos é bastante superior aos dos ora Recorridos, com a paralisação dos procedimentos concursais em causa, na medida a situação profissional destes é sempre reparável, em função da decisão sobre o mérito das suas pretensões, na ação principal. Monetariamente, através da atribuição de uma compensação pelo diferencial da remuneração efetivamente recebia e da que, eventualmente, seria devida e, funcionalmente, pelo ajuste das carreiras profissionais, retroativamente.

I. Erro de direito quanto à apreciação da existência do interesse público, apresentado na Resolução Fundamentada.

J. Ficou provado e demonstrado que o interesse público em causa é suficientemente forte e preponderante, justificando a manutenção dos atos praticados ao abrigo da Resolução Fundamentada, sendo esta igualmente legal, válida e eficaz.

K. Ficou igualmente provado e demonstrado que a declaração de ineficácia dos atos aqui sindicados causa um grave prejuízo para o interesse público, na medida em que ficam afetadas as capacidades de resposta e atuação da PSP, na prossecução das suas missões e atribuições.

L. Ora, não tendo o Tribunal a quo, na análise que efetuou, detetado qualquer erro patente ou a utilização de critérios inadequados, nas motivações do interesse público, constantes da Resolução Fundamentada, não poderá declarar a ineficácia dos atos de execução, como o fez.

M. Por isto, o interesse público subjacente à motivação da Resolução Fundamentada encontra-se devidamente provado e demonstrado, sendo os atos de execução praticados ao abrigo daquela, legalmente válidos e eficazes.

Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o mui Douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, por provado, e, em consequência, deverá ser revogada a Douta Sentença recorrida.

Já em 26 de dezembro de 2016 o Sindicato Nacional de Oficiais de Policia e os Associados por si representados nos autos, vieram apresentar Recurso do mesmo despacho, “na parte em que julgou procedente o incidente de declaração de ineficácia de atos praticados ao abrigo de resolução fundamentada”, concluindo (Cfr. fls. 32, 32v e 33 Procº físico):

“1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido nos autos em 2 de Dezembro de 2016, na parte em que julgou procedente o incidente de declaração de ineficácia de atos praticados ao abrigo de resolução fundamentada.

2. Uma vez que os Requerentes não lograram impedir, em tempo útil, a promoção a Comissário por parte dos candidatos providos, afigura-se aos Recorrentes que eles não têm sequer interesse em agir no âmbito do incidente de declaração de ineficácia.

3. Por essa razão, no prisma dos Recorrentes, tal incidente não poderia deixar de ser liminarmente rejeitado, por inexistência de interesse em agir.

4. De tal modo que, ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou as disposições dos arts. 128.º, n.º 3 do CPTA e art. 30.º, n.º 1, 1.ª parte do CPC, ex vi art. 1.º CPTA.

5. Não é aceitável que, no quadro de uma mera resolução, o grau de exigência relativamente à alegação de factos seja equivalente àquele que se verifica num processo judicial, ainda para mais quando tal alegação não é habitualmente levada a cabo por advogados ou profissionais forenses.

6. Aquilo que é aceitável, dentro de um quadro de normalidade, é que a resolução fundamentada exprima, em condições que possam ser sindicadas pelos interessados, os inconvenientes inerentes à imediata execução dos atos suspendendos.

7. Do ponto de vista dos Recorrentes, esse ónus foi cumprido pela Administração, pelo que não se poderá invocar um argumento meramente formal para se declarar a ineficácia dos atos praticados ao abrigo da citação resolução fundamentada.

8. Entendem, pois os Recorrentes que, neste particular, o Douto Despacho recorrido violou, além de outras, a disposição do n.º 3 do art. 128.º do CPTA.

9. Acresce ao exposto que, salvo melhor opinião, os fundamentos invocados na resolução fundamentada permitem extrair a conclusão de que a prática de atos de execução implicaria, como consequência direta, a produção de graves prejuízos para o interesse público.

10. A carreira de Oficial de Polícia compreende as categorias de Superintendente-Chefe, Superintendente, Intendente, Subintendente, Comissário e Subcomissário.

11. Cada uma dessas categorias tem, pois, um conteúdo funcional perfeitamente delimitado.

12. Com a promoção para a categoria de Comissário, os associados do Requerente foram colocados em diferentes locais de trabalho, próprios de Oficiais com essa categoria.

13. A PSP é, de resto, uma estrutura fortemente hierarquizada, em que a qualificação profissional tem elevada importância, ao nível do relacionamento com os diferentes membros do pessoal com funções policiais da PSP.

14. De acordo com o n.º 1 do art. 10.º do Regulamento Disciplinar da PSP (Lei n.º 7/90, de 20 de Fevereiro), os Oficiais de Polícia estão obrigados a observar o dever de obediência, o qual, contudo, só oponível quando proveniente de superior hierárquico.

15. Transpondo esta ideia para os presentes autos, afigura-se-nos ser manifesto que a criação de uma situação de dúvida quanto à categoria dos associados do Requerente (estão promovidos, mas foi declarada a ineficácia da publicação da promoção) criará, como consequência direta, elevadas dificuldades no exercício da atividade policial, em particular no relacionamento com Oficiais com categoria de Subcomissário (que poderão não acatar ordens) e com Comissários (que poderão pretender dar ordens).

16. Ora, como muito bem se assinalou na resolução fundamentada, não é aceitável que 44 (quarenta e quatro) Oficiais de Polícia distribuídos por todo o país vejam posta em causa a sua legitimidade hierárquica, já que um tal facto redundará necessariamente na criação de obstáculos ao regular exercício da sua atividade.

17. Os Recorrentes estão, de resto, em crer que um tal facto é público e notório e enquadra-se mesmo no conceito previsto no art. 5.º, al. c) do Cód. Proc. Civil, aplicável por remissão do art. 1.º do CPTA.

18. A PSP tem a seu cargo a segurança pública da sociedade civil, que é uma das bases essenciais do Estado de Direito.

19. Neste contexto, a paralisação dos efeitos da publicação do despacho de promoção, criando uma situação de dúvida sobre a categoria dos associados do requerente, é suscetível de prejudicar a organização da Polícia de Segurança Pública e, maxime, a componente hierárquica necessariamente inerente ao exercício de funções de Oficial de Polícia.

20. Tais prejuízos não são, de todo, comparáveis com os interesses individuais e egoísticos dos Requerentes no decretamento desta providência.

21. Por todas as razões expostas, os Recorrentes entendem que, ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou, além de outras, as disposições dos n.º 3 e 4 do art. 128.º do CPTA.

22. Deve, pois, revogar-se o Douto Despacho recorrido, que deverá ser substituído por Douto Acórdão que, julgando procedente a apelação, conclua pela improcedência do incidente de declaração de ineficácia de atos praticados ao abrigo de resolução fundamentada.

Nestes termos, deve a presente apelação ser julgada procedente, com a consequente revogação do Douto Despacho recorrido e prolação, em sua substituição, de Douto Despacho que esteja em conformidade com as conclusões acima formuladas, com o que se fará Justiça!”

Em 11 de janeiro de 2017 vieram AFPM e AJCOS, apresentar as suas contra-alegações relativamente a ambos os Recursos, concluindo (Cfr. fls. 39 a 40v Procº físico):

“I – Nenhum vício ou erro se pode apontar à Sentença Recorrida

II - Recorridos intentaram a providência cautelar a que o presente incidente se apensa, requerendo a suspensão da eficácia do ato de abertura dos procedimentos concursais 04/2014 e 05/2014 e suas classificações finais, nos termos do artigo 112.º, nº 2 a), do CPTA.

III – A Recorrente MAI foi citada, com a expressa advertência de “que nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art.º 128.º do CPTA, não pode iniciar ou prosseguir a execução do ato, devendo impedir, com urgência, que os serviços competentes ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução do ato, salvo se, no prazo de 15 dias, mediante resolução fundamentada, reconhecer que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.”

IV - Dúvidas não restam, até pela confissão dos Recorrentes, que a Ré MAI e a Direção nacional da PSP não cumpriram o que lhes foi determinado.

V - Isto porque, após a citação, foram publicados no Diário da República, 2.ª Série, N.º 72, de 13 de Abril de 2016, o Despacho (extrato) n.º 5030/2016 e Despacho (extrato) n.º 5031/2016, do Exmo. Senhor Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública, promovendo ao Posto de Comissário, em cada um dos concursos, 22 candidatos.

VI – É normal na vida interna da PSP proceder-se a nomeações de categorias inferiores para superiores e vice-versa, conforme atestam as múltiplas situações publicadas nas diversas Ordens de Serviço Interna.

VII – Encontra-se publicado também publicado na Ordem de Serviço N.º 33, I Parte B, da Direção Nacional, de 27 de Junho de 2012 o Despacho N.º 23/GDN/2012, do Diretor Nacional Adjunto, com o seguinte teor:

“Exercício de Funções na Falta, Ausência ou Impedimento do Titular do Cargo

Na vida das instituições públicas acontece, não raro, por várias razões, que os titulares dos cargos dirigentes, quer de direção superior, quer das suas unidades orgânicas, nucleares ou flexíveis, de chefia ou de coordenação, encontram-se, temporariamente, impedidos do exercício do respetivo cargo.

Nestas situações impõe a prossecução do interesse público que seja assegurado o princípio da continuidade do órgão, da unidade orgânica ou do núcleo e a regularidade do exercício das respetivas funções, através dos respetivos “substitutos” ou suplentes legais, nos termos da lei, designadamente, art.º 41.º do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de novembro, com as sucessivas alterações, e art.º 42.º, n.º 3, do EPPSP, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de outubro.

Não se trata, evidentemente, de uma verdadeira substituição de órgãos, mas antes, de casos, denominados pela doutrina administrativista, de suplência, resultante da falta, ausência ou impedimento do titular do cargo, independentemente das razões que as determinam.

Assim, no sentido da clarificação das regras aplicáveis, nos termos do art.º 21.º da Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto, que aprovou a orgânica da PSP, determino:

1 – Nos casos de ausência, falta ou impedimento do titular de cargo dirigente, de chefia ou de coordenação, a substituição cabe, salvo o disposto na lei em contrário, ao inferior hierárquico imediato, mais antigo, do titular a substituir.

2 – No caso de igual antiguidade, cabe ao inferior hierárquico imediato, com melhor classificação na categoria ou, no caso de igualdade de classificação, mais antigo na Polícia de Segurança Pública.

3 – Para efeitos do disposto nos números anteriores entende-se por falta a situação de vacatura temporária do cargo; por ausência, as faltas do titular do cargo dadas, designadamente, por doença, férias, frequência de curso ou outra qualquer ação de formação ou por deslocação oficial; impedimento, quando o titular do cargo tiver sido declarado impedido em determinado procedimento, nos termos dos arts. 44.º, 47.º, 48.º e 50.º, do Código de Procedimento Administrativo.

4 – A decisão de designação do suplente ou “substituto” é da competência do Diretor Nacional, dos Diretores Nacionais Adjuntos, relativamente às unidades orgânicas da sua direta dependência, dos Comandantes dos Comandos, do Comandante da Unidade Especial de Polícia, dos Diretores dos Estabelecimentos de Ensino e dos Diretores de Departamento, relativamente às unidades orgânicas ou núcleos da sua direta dependência.

5 – No exercício das respetivas funções o suplente ou “substituto” deverá fazer menção da sua qualidade e da razão em que atua, através da forma seguinte: “Por falta do Diretor do Departamento (do Chefe de Divisão, Núcleo ou outro) (art.º 41.º do CPA), nome, posto ou categoria”.

6 – O presente despacho entra imediatamente em vigor.»

VIII - Não se vislumbra, assim, qualquer dano na suspensão da eficácia dos atos administrativos de abertura dos procedimentos concursais, uma vez que existe regulamentação interna a definir os critérios para ocupação dos cargos em caso de vagatura.

IX – por outro lado, no art.º 148.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, que aprova o novo Estatuto da Polícia de Segurança Pública, estabelece que podem ser imediatamente promovidos 45 subcomissários com base na antiguidade, cuja lista existe e é única para Subcomissários oriundos do ISCPSI e não oriundos do ISCPSI.

X - Esta possibilidade revela, por si, inexistência de qualquer dano para a estrutura policial, nomeadamente na promoção de subcomissários para a carreira de comissários, uma vez que o poderá fazer, legalmente, através da antiguidade, em número de 45, ou seja, em número superior aos 44 promovidos nestes concursos.

XI - A resolução fundamentada não pode consistir num mero prejuízo, mas uma gravidade excecional para o interesse público, que no caso não existe, não se alegou nem se demonstrou.

XII - Consubstanciam aquelas duas publicações a promover os concorrentes dos procedimentos concursais n.ºs 04/2014 e 05/2014, atos de execução indevidas – Cfr. art.º 128.º n.º 3 do CPTA.

XIII – Até porque, depois da publicação em “Diário da República” e da posterior convocatória de todos os candidatos promovidos pelos concursos 04/2014 e 05/2014, para serem empossados na categoria de Comissários, já relatados e documentados nos autos, foram ainda publicados na “Ordem de Serviço” de 11 de Maio de 2016, o despacho de promoção, com efeitos remuneratórios a partir do dia seguinte ao da sua publicação.

XIV - E no dia 12 de Maio, também através de “Ordem de Serviço”, foi pulicada notificação inscrição para colocação “por oferecimento”.

Termos em que julgando-se improcedentes os Recursos, confirmando-se a Sentença proferida farão V. Ex. as como sempre JUSTIÇA.”

O Ministério Público, junto deste Tribunal, veio a emitir Parecer em 24 de março de 2017, concluindo “(…) no sentido de que ambos os recursos jurisdicionais não deverão ser providos, in totum” (Cfr. fls. 213 a 216 Procº físico).

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, insurgindo-se o Ministério da Administração Interna, contra o facto de ter sido julgado procedente o incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, imputando-lhe erros de julgamento de facto e de direito, sem que tenha especificado quais as normas legais que se mostrariam concretamente violadas.
Já o Recorrente Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia e os associados por si representados vieram imputar ao Despacho Recorrido erros de julgamento de direito, por violação dos artigos 128.º, n.ºs 3 e 4, do CPTA e 30.º, n.º 1, 1.ª parte, do CPC.
Em qualquer dos casos, os Recursos acham-se balizados pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Matéria Factual

Refere-se no Despacho Recorrido:

“Incidente para declaração de ineficácia de atos de execução indevida
AFPM, residente na cidade do Funchal, AJCOS, residente no Porto, oficiais da Polícia de Segurança Pública (PSP), doravante Requerentes, ambos detentores da categoria de Subcomissários, deduziram contra o Ministério da Administração Interna, com sede em Lisboa, doravante Requerido, o presente processo com vista à adoção da providência cautelar de suspensão da eficácia dos atos de abertura dos procedimentos concursais n.º s 04/2014 e 05/2014 e suas classificações finais, procedimentos esses que se destinaram à promoção para a categoria de Comissário dos oficiais de polícia integrados na categoria de Subcomissários.
Pelo req. de fls. 301 e ss. do processo físico, os Requerente vieram suscitar o incidente supra epigrafado, dizendo, em resumo, que no DR de 13/04/2016 foram publicados os despachos do Diretor Nacional da PSP que, em cada um dos indicados concursos, promoveram os candidatos à categoria de Comissário, sem terem em conta a instauração do presente processo cautelar e a proibição de executar os atos suspendendos que decorre do previsto no artigo 128.º, n.º 1, do CPTA.
O Requerido e os Contrainteressados responderam ao incidente “sub judice”, pugnando pela improcedência do mesmo. Cumpre apreciar e decidir.
A proibição de executar os atos administrativos contra os quais seja pedida a providência cautelar de suspensão da eficácia decorre do artigo 128.º, n.º 1, do CPTA, que preceitua o seguinte: “Quando seja requerida a suspensão da eficácia de um ato administrativo, a autoridade administrativa, recebido o duplicado do requerimento, não pode iniciar ou prosseguir a execução…”.
Como vimos, os Requerentes insurgem-se contra a publicação no DR de 13/04/2016 dos despachos do Diretor Nacional da PSP que, em cada um dos indicados concursos, promoveram os candidatos à categoria de Comissário (cf. fls. 308 e 309 do processo físico).
Importa ter presente que a publicação em DR mais não traduz do que uma condição de eficácia ou oponibilidade de um determinado ato administrativo, que o visa dar a conhecer ou publicitar aos seus destinatários, proferido, com certeza, em data antecedente.
“In casu”, a predita publicação em DR destina-se à publicitação dos despachos de 31/03/2016 do Diretor Nacional da PSP, que, na decorrência dos aludidos procedimentos concursais, decidiu promover os 22 Subcomissários em cada um daqueles concursos à categoria de Comissários.
Ora bem, quando tais atos de promoção foram proferidos, ou seja, em 31/03/2016, a entidade requerida não havia ainda sido citada para os termos deste processo, posto que, tal citação só acabou por ocorrer em 07/04/2016 (cf. fl. 316 do processo físico), o que significa, com efeito, que os serviços do Requerido desconheciam a instauração da presente providência cautelar, não se encontrando, assim, sujeitos à disciplina do artigo 128.º, n.º 1, do CPTA, isto é, não se encontravam impedidos de proferir os mencionados atos administrativos de promoção, que se inserem no domínio de uma execução ainda válida.
Mas, se o Requerido não foi citado a tempo de impedir a prolação dos atos de promoção, indaguemos, todavia, no que tange aos atos e formalidades tendentes à publicitação dessas decisões promocionais em DR, posto que, tendo presente que o Impetrado havia sido citado em 07/04/2016, já não podia mais ignorar a partir dessa data a proibição contida no artigo 128.º, n.º 1, do CPTA, considerando-se, desde já, que o Requerido ia bem a tempo de impedir, “com urgência” (cf . o artigo 128.º, n.º 2, do CPTA), a publicação daquelas promoções, que só vieram a sair no DR de 13/04/2016 (seis dias após).
A execução dos atos administrativos suspendendos só é indevida “quando falte a resolução fundamentada…ou o tribunal julgue improcedentes as razões em que aquela se fundamenta” , conforme decorre do disposto no artigo 128.º, n.º 3, do CPTA.
No caso vertente, a Sra. Ministra da Administração Interna proferiu uma resolução fundamentada, datada de 22/04/2016 (cf. fls. 345 a 349 dos autos físicos), conforme a prerrogativa preconizada na ressalva do artigo 128.º, n.º 1, do CPTA, que dita o seguinte: “…salvo se, mediante resolução fundamentada, reconhecer, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público” .
Em primeiro lugar, uma vez citado o Requerido em 07/04/2016 e proferida a resolução fundamentada em 22/04/2016, facilmente se conclui que foi emitida dentro do prazo legal de 15 dias, sendo, por isso, tempestiva.
Em segundo lugar, a execução só será indevida se o Tribunal julgar improcedentes as razões em que aquela se fundamenta, que hão-de ser de modo a considerar que o “diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público”.
Compulsada a resolução fundamentada junta aos autos, verifica-se, em termos sintéticos, que o Requerido, para justificar a execução dos atos suspendendos, apresenta os seguintes argumentos:
i) alude genericamente ao bom funcionamento da instituição;
ii) funcionamento da cadeia hierárquica/desenvolvimento normal das carreiras do efetivo policial;
iii) elevação do nível motivacional dos efetivos;
iv) estrutura fortemente hierarquizada da carreira policial;
v) promoções enquanto resposta à necessidade de ocupação efetiva de postos de trabalho, enquanto garante da estrutura hierárquica e de continuidade da linha de comando;
vi) desmotivação e prejuízo dos oficiais promovidos;
vii) importância das funções de comando dos comissários, com falta de efetivos, o que se faria sentir ao nível da capacidade de resposta da instituição policial e enquadramento operacional.
As razões atrás sintetizadas, patentes na resolução fundamentada, traduzem um conjunto de asserções genéricas, relativas à estrutura policial e às suas funções, designadamente, ao nível das competências e importância da carreira de oficial de polícia.
Tal resolução fundamentada é também um exercício mais votado para a vertente teórica sobre essas mesmas funções policiais de comando, sem que da mesma se vislumbre razões concretas e verdadeiramente circunstanciadas sobre o que pode estar realmente em perigo para o interesse público prosseguido pelo Requerido.
É que não se trata de uma qualquer situação que coloque em causa um alegado interesse público, porquanto, o que exige o artigo 128.º, n.º 1, do CPTA, é que o diferimento da execução do ato suspendendo seja “gravemente prejudicial” a esse mesmo interesse, isto é, que a suspensão da eficácia dos atos suspendendos seja de forma a causar uma situação de facto perigosa, crítica e altamente desvantajosa para o interesse público.
Ora bem, não se deteta no caso vertente tal gravidade, porquanto, os elementos policiais em causa (os Contrainteressados), embora não promovidos, continuarão a prestar funções na orgânica da PSP e ao dispor e às ordens dos respetivos comandos, embora na categoria de Subcomissários, que não deixa, todavia, de corresponder a uma categoria de oficial de polícia, aos quais estão também adstritas funções de gestão e/ou comando, seja por competência própria ou delegada.
Em suma, não se vislumbra que o diferimento da execução dos atos suspendendos vá colocar a instituição policial e os seus operacionais de oficialidade, que o continuarão a ser, numa situação de caos ou de vazio de hierarquia.
Ante o exposto, o Tribunal julga improcedentes as razões em que se fundamenta a resolução fundamentada, declarando a ineficácia dos atos de execução indevida, nos termos do artigo 128.º, n.º 6, do CPTA.”

IV – Do Direito
Importa agora analisar e decidir o suscitado.

DA FUNDAMENTAÇÃO DA RESOLUÇÃO FUNDAMENTADA
Desde logo, refere-se no aplicável artigo 128.º do CPTA:
“Proibição de executar o ato administrativo”, prescreve o seguinte:
“1. Quando seja requerida a suspensão da eficácia de um ato administrativo, a autoridade administrativa, recebido o duplicado do requerimento, não pode iniciar ou prosseguir a execução, salvo se, mediante resolução fundamentada, reconhecer, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
2. Sem prejuízo do previsto na parte final do número anterior, deve a autoridade que receba o duplicado impedir, com urgência, que os serviços competentes ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução do ato.
3. Considera-se indevida a execução quando falte a resolução prevista no n.º 1 ou o tribunal julgue improcedentes as razões em que aquela se fundamenta.
4. O interessado pode requerer ao Tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida.
5. O incidente é processado nos autos do processo de suspensão da eficácia.
6. Requerida a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, o juiz ou relator ouve os interessados no prazo de cinco dias, tomando de imediato a decisão.”

Relativamente à natureza e requisitos de validade da resolução fundamentada importa enquadrar a referida questão, recorrendo ao lapidarmente expendido no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.02.2015, no processo 1354/05.8-A-A BRG:
“(…)
4.2. Importa começar por lembrar que o mecanismo de tutela precautelar contido no artigo 128.º do CPTA (em grande medida herdado do artigo 80.º da LPTA), decompõe-se em três fases: a primeira, consiste na proibição legal de execução do ato suspendendo e assenta numa ponderação de interesses efetuada, em abstrato, pelo legislador, na qual se presume que os prejuízos decorrentes da imediata execução do ato são superiores para o requerente da providência cautelar (artigo 128.º/1 CPTA); a segunda, desenrola-se num plano extrajudicial e permite que a Administração afaste tal presunção legislativa, sobrepondo a sua própria avaliação de interesses e afastando proibição de executar, mediante uma resolução fundamentada que reconheça que o diferimento da execução é, em concreto, gravemente prejudicial para o interesse público (artigo 128.º/1, 2.ª parte); a terceira, permite que o requerente da providência requeira ao tribunal a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, com vista a neutralizar os efeitos dos atos entretanto praticados em execução do ato suspendendo, assim restabelecendo, em certa medida, o efeito de proibição da execução (artigo 128.º/4 CPTA).
No que respeita ao incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, sublinhe-se que o mesmo traduz uma “providência cautelar secundária de tipo intimatório” (J.C.Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa (Lições), 12.ª ed, 2012, 325), ou seja, uma sub-providência destinada a assegurar a utilidade da providência cautelar de suspensão de eficácia, através da paralisação provisória dos efeitos dos atos de execução do ato suspendendo. O que significa que tal incidente não tem por objeto imediato a apreciação da legalidade da resolução fundamentada (não é um meio impugnatório de tal resolução), mas antes tem por objeto os atos de execução cuja ineficácia se pretende, ou seja, tem por objeto saber se a Administração procedeu a uma execução indevida do ato suspendendo o que, em alguns casos (quando tenha sido proferida resolução fundamentada dentro do prazo legal), passa por saber se a Administração invocou razões que justifiquem o grave prejuízo para o interesse público no diferimento da execução do ato (por isso mesmo se conclui no Acórdão do TCAS, de 07.05.2009, P. 04996/09, que “ [I]nexistindo atos de execução indevida não é possível solicitar no incidente previsto no artigo 128º/3 e segs do CPTA, a apreciação da legalidade da resolução fundamentada proferida.”).
A entidade administrativa só pode proferir resolução fundamentada (no prazo máximo de 15 dias a contar do recebimento do duplicado do requerimento da providência), quando reconhecer que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público (128.º/1, 2.ª parte), o que praticamente equivale à grave urgência para o interesse público na imediata execução do ato, a que antes se referia o artigo 80.º da LPTA (neste sentido v. Mário Aroso de Almeida/ Carlos Fernandes Cadilha, Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2.ª ed., 2007, 749).
Para que se possa afirmar que a resolução está “verdadeiramente fundamentada” não basta que a administração invoque a defesa da legalidade do ato suspendendo e a inconveniência, para o interesse público, na suspensão do ato ou a necessidade de o executar, pois, em princípio, a não execução do ato sempre trará algumas consequências negativas para o interesse público, especialmente quando encarado na perspetiva da entidade administrativa (cfr. Tiago Duarte, “Providência cautelar e resolução fundamentada: The winner takes it all?”, CJA, 55, 36-47, 45). Para que possa levantar a proibição legal de executar o ato, a Administração tem que invocar as razões em que se consubstancia a gravidade do prejuízo para o interesse público no diferimento da execução, de modo a justificar que se afaste aquela proibição legal até à decisão da providência cautelar.
Note-se, ainda, que o controlo judicial da “validade” da fundamentação da resolução fundamentada deve ser aferido pelo critério estabelecido no artigo 125.º do CPA (cfr. Acórdão do STA, de 03.04.2008, P. 01029/07), não se bastando com a verificação da existência de um discurso justificativo da decisão tomada, em termos claros e congruentes, mas exigindo também que os motivos apontados sejam suficientes, por conterem elementos bastantes, capazes ou aptos a basear a decisão (seguimos de perto a terminologia de J. C. Vieira de Andrade em O Dever de Fundamentação Expressa de Atos Administrativos, Almedina, 2003, 232 e s.), ou seja, elementos suficientes para fundamentar a afirmação de que há “grave prejuízo para o interesse público no diferimento da execução do ato”.
Simultaneamente, este controlo jurisdicional das razões em que assenta a resolução fundamentada é também um controlo sobre o preenchimento, pela Administração, dos conceitos indeterminados contidos na previsão do artigo 128.º do CPTA – “grave prejuízo no diferimento” e “interesse público” – que traduzem uma habilitação normativa para o exercício de “juízos de avaliação, prognose e ponderação próprios do exercício da função administrativa” (v. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo jurisdicional”, CJA, 70, 32-57,49). Efetivamente, para a Administração decidir, em concreto, se o diferimento da execução de um ato administrativo acarreta grave prejuízo para o interesse público, necessita de identificar o(s) interesse(s) público(s) em presença e formular um juízo de prognose sobre os prejuízos que o atraso na execução do ato traria para tais interesses e a gravidade dos mesmos. Estando em causa a verificação do respeito pelos limites de juridicidade que vinculam o preenchimento de tais conceitos indeterminados, o tribunal pode sindicar a clareza, a congruência, a suficiência e também a adequação e a idoneidade dos interesses e prejuízos invocados para o preenchimento dos conceitos indeterminados contidos na previsão legal, mas já não poderá substituir-se à Administração na parte em que a concreta identificação desses interesses e a prognose desses prejuízos implique valorações próprias do exercício da atividade administrativa (em sentido próximo, apelando a um critério de evidência no julgamento da improcedência das razões em que se funda a resolução fundamentada, veja-se o Acórdão do TCAS, de 07.02.2013, P. 09232/12).
(…)”

Em face do que precede, sem prejuízo do que ainda se dirá infra, mostra-se que a Resolução Fundamentada aqui controvertida se mostra insuficientemente fundamentada, pelo recurso a afirmações conclusivas e genéricas, designadamente no que concerne aos supostos prejuízos invocados.

Efetivamente, o controlo judicial da validade da fundamentação da resolução fundamentada deve ser aferido pelo critério estabelecido no atual artigo 153.º do Código de Procedimento Administrativo (anterior Artº 125º CPA), não se bastando com a verificação da existência de fundamentação, em termos claros e congruentes, mas exigindo também que os motivos apontados sejam suficientes, por conterem elementos bastantes, capazes ou aptos a basear a decisão.

Com efeito, não estará devidamente fundamentada a resolução aqui em análise, por assentar meramente em considerações genéricas e conclusivas, como enunciado no despacho recorrido e precedentemente transcrito.

A resolução não estará pois devidamente fundamentada porque nenhum dos fundamentos aduzidos integra o pressuposto grave prejuízo para o interesse público.

Objetivando a análise, e como sublinhado pelo Ministério Público no seu Parecer, no que concerne aos suscitados erros de julgamento invocados pelo Ministério da Administração Interna, por imprecisão da definição de funções dos comissários e dos subcomissários, se fosse caso disso, estar-se-ia perante um erro de direito, na interpretação do Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 246/2015, de 19 de outubro e não perante erro de julgamento.

Em bom rigor, tal afirmação referida no Despacho recorrido, que se consubstanciaria num erro de julgamento, mais não será do que um argumento aduzido em reforço do entendimento adotado.

Por outro lado, e como se viu já, resulta do n.º 3 do artigo 128.º do CPTA, que a execução, por parte da Administração, será indevida quando execute o ato sem ter emitido a resolução fundamentada; ou, ainda, quando lhe dê execução com base em resolução fundamentada que o Tribunal venha posteriormente a considerar que assentou em razões improcedentes.

Em concreto, o tribunal a quo, tendo concluído pela procedência do referido incidente de execução indevida, assentou o seu entendimento no facto do controvertido despacho se ter limitado a tecer considerações vagas e genéricas, não suportadas em factos concretos.
Como se referiu no Acórdão do STA, de 25/08/2010, no Processo n.º 0637/10, “A «resolução fundamentada» referida no art. 128.° do CPTA pecará se acaso não contiver «razões», se elas forem irreais ou se não suportarem logicamente a inferência de que o diferimento da execução lesaria gravemente o interesse público”.

Ainda a este propósito, referiu-se no Acórdão do TCAS de 10/07/2014, no Processo n.º 11202/14, que “(…) O julgamento de improcedência das razões em que se funda a resolução fundamentada, indicado no artigo 128.º, n.º 3, do CPTA, é um julgamento que apela a um critério de evidência.
(…) Naquele juízo apenas pode o Tribunal apreciar situações de erro manifesto, ostensivo, evidente, quer por inexistir uma situação de urgência, quer por não haver o indicado interesse público que se diz querer acautelar, ou por a imediata suspensão da execução não ser gravemente prejudicial a tal interesse”.

Por último, como exemplarmente se sumariou no acórdão deste TCAN n.º 01312/05.2BEBRG-C, de 04-10-2007:
“Toda a suspensão da eficácia dos atos administrativos prejudica, por definição, o interesse público que aqueles atos visam prosseguir, já que a paralisia provisória dos efeitos dos mesmos afeta inevitavelmente, ao menos «ratione temporis», os resultados a que eles se inclinem.
Não basta que a autoridade demandada cautelarmente se limite à invocação de que a execução do ato é útil ou mesmo necessária para o prosseguimento do interesse público, pois, a regra é a que determina a suspensão dos efeitos dum ato administrativo em decorrência da propositura dum procedimento cautelar de suspensão de eficácia e isso apesar de tal suspensão ser ou poder ser inconveniente para os objetivos que se visavam prosseguir com a emissão daquele ato, podendo, mesmo, a sua suspensão provisória ter consequências negativas ou aparentemente negativas para o interesse público.
Só e apenas nas situações em que o diferimento dessa execução seja gravemente prejudicial para o referido interesse se mostra justificado, nos termos do art. 128.º do CPTA, o afastamento daquela regra geral da proibição da execução do ato administrativo suspendendo.
A emissão da “resolução fundamentada” por parte da Administração constitui o exercício duma prerrogativa que apenas faz sentido ser utilizada na medida em que seja indispensável para dar resposta a situações de especial urgência.
A permissão de execução do ato administrativo constitui um mecanismo excecional, pontual, apenas admissível e legítimo para aquelas situações em que se verifique grave prejuízo para o interesse público com a imediata suspensão da execução do ato e que reclamam urgência naquele prosseguimento.
Com a proibição de execução do ato suspendendo decorrente da propositura da ação cautelar visa-se assegurar a manutenção do efeito útil à própria tutela cautelar de molde a evitar que quando o julgador tome posição sobre aquele litígio essa sua decisão ainda faça sentido ou tenha utilidade à luz mormente dos direitos e interesses que o requerente queria ver acautelados.
A Administração através da “resolução fundamentada” terá de indicar as razões que militam no sentido da existência de situação de urgência grave no prosseguimento da execução do ato administrativo suspendendo, decisão essa que é passível de ser sindicada contenciosamente pelos tribunais no âmbito deste incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida com fundamento quer no facto dos atos de execução não estarem baseados na “resolução fundamentada” (total ausência desta ou estarem fora da sua abrangência ou cobertura), quer no facto dos motivos aduzidos naquela “resolução” não constituírem fundamentos legais ou legítimos abarcados pelo conceito legal enunciado no n.º 1 do art. 128.º do CPTA do diferimento da execução ser “gravemente prejudicial para o interesse público”.
O dever de fundamentação que a Administração cumpre observar na prolação da “resolução fundamentada” traduz-se na enunciação das razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo competente à emissão daquela decisão e que são integradores do preenchimento em concreto do pressuposto/requisito do diferimento da execução ser gravemente prejudicial para o interesse público a ponto de não poder sustar-se tal execução até à prolação da decisão judicial cautelar.
No cumprimento desse especial ónus de explicitação motivadora não devem aceitar-se como válidas referências de tal modo genéricas, vagas e conclusivas que não habilitem os interessados e, por último, o próprio tribunal a entenderem e a aperceberem-se das efetivas razões que terão motivado a emissão da “resolução fundamentada” em questão.
A “resolução fundamentada” terá de conter em si a motivação suficiente que sustente de forma sucinta, clara, concreta, congruente e contextual, a necessidade imperiosa de prosseguir com a execução do ato administrativo suspendendo a ponto de não ser possível, sob pena de grave prejuízo para o interesse público, esperar pela decisão judicial cautelar.
(…)”
Volvendo à situação em concreto, e em função de tudo quanto precedentemente ficou expendido, sendo incontornável que a Resolução Fundamentada, assentou predominantemente em considerações genéricas e conclusivas, não se mostra censurável a decisão objeto dos recursos em análise.

Por outro lado, e no que respeita à invocação feita pelo Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia segundo o qual inexistirá interesse em agir por parte dos aqui Recorridos, não se vislumbra que assim pudesse ser, atento até o óbvio interesse que mantêm na suspensão do ato administrativo objeto de impugnação.

Aqui chegados, não tendo os Recorrentes logrado demonstrar serem exatas e inequívocos os pressupostos em que assentou a Resolução Fundamentada, como reiteradamente se afirmou, por genéricas e conclusivas, outra solução não restará que não seja a de confirmar o sentido do Despacho Recorrido.

Finalmente e em conclusão, não se reconhece que o despacho recorrido tenha violado quaisquer dos normativos invocados como tendo sido desrespeitados, nomeadamente, os artigos 128.º, n.ºs 3 e 4, do CPTA e 30.º, n.º 1, 1.ª parte, do CPC, em face do que se negará provimento a ambos os recursos apresentados.


* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento aos recursos, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.
Custas pelos Recorrentes

Porto, 11 de maio de 2017
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Migueis Garcia