Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03256/09.0BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/18/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Esperança Mealha
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
-INVESTIGAÇÃO DO DESAPARECIMENTO DE JOVEM ADULTO
Sumário:I – O juízo crítico que o tribunal deve fazer, com vista a apurar se ocorreu algum facto ou omissão ilícitos ou uma violação dos deveres de cuidado, não pode basear-se numa avaliação meramente retrospetiva, perspetivada a partir do presente, mas antes exige que se identifique o que era devido e exigível (tomando como padrão o funcionário médio e prudente), em cada momento, em função dos dados que nessa altura eram conhecidos: Apesar de ser realizado depois da prática do facto, o juízo deve ser formulado numa perspectiva ex ante, levando-se em conta apenas os dados conhecidos no momento da prática da ação ou omissão (o que implica um juízo de prognose póstuma).
II – O processo de averiguações de pessoa desaparecida (e o consequente processo de inquérito) não são procedimentos inteiramente formais ou formalizados (em especial o primeiro), nem pautados por uma tramitação rigidamente tipificada, exigindo, antes pelo contrário, uma margem de manobra e de avaliação por parte dos respetivos intervenientes, a quem, em cada momento do processo, cabe valorar as circunstâncias relatadas e dar-lhes a resposta adequada. Na ausência de indícios criminais, tal resposta não envolve necessariamente a movimentação de todos os meios disponíveis, antes obedece a princípios de legalidade, proporcionalidade e necessidade no uso dos recursos públicos, guiada, além do mais, pelo respeito pela liberdade e auto-conformação individual e por critérios de adequação das medidas a adoptar às circunstâncias que são conhecidas. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:LAGM
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte
1. Relatório
LAGM interpõe recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto que julgou improcedente a ação administrativa comum emergente de responsabilidade civil por facto ilícito que o Recorrente intentou contra o ESTADO PORTUGUÊS, na qual peticiona a condenação do Réu no pagamento de uma indemnização no montante de €50.000,00, correspondente às despesas que alega ter suportado com as diligências que realizou para a localização de sua filha, bem como no pagamento de uma compensação de €1.000.000,00, decorrente do sofrimento e ansiedade que invoca ter sofrido em consequência da forma com as autoridades de investigação criminal conduziram o processo referente ao desaparecimento de sua filha.

O Recorrente apresentou alegações, onde conclui nos seguintes termos, que delimitam o objeto do recurso:

1. A douta sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto, por não ter feito uma correta interpretação, consideração e valoração da prova gravada, pelo que o presente recurso tem por objecto a reapreciação da prova gravada.
2. Os concretos pontos de facto que o autor considera incorretamente julgados são os constantes dos quesitos 40, 41, 42, 46, 47, 60, 69, 96, 97, 99 e 100 da base instrutória.
3. Reapreciada a prova sobre a matéria dos quesitos 40,41 e 42, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente o seguinte:
Quesito 40 – Foi transmitido ao autor pelos agentes que nada tinha sido feito
Quesito 41 – …alegando o facto de a RSM ser maior de idade
Quesito 42 - …e da sua doença do foro psiquiátrico não estar provada documentalmente.
4. Os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa daquela que foi tomada pelo tribunal “a quo”, em relação a esta matéria, são os depoimentos das testemunhas JSA (cujo depoimento se encontra gravado no CD 1, desde 01:29:44 a 1:51:30), e LJBM (cujo depoimento se encontra gravado no CD 2, desde 02:01:29 a 02:26:33), cujos trechos foram transcritos na motivação, testemunhas que foram peremptórias na comprovação da referida matéria quesitada.
5. Por outro lado, pese embora na decisão sobre a matéria de facto o tribunal “a quo” tenha julgado como “não provados” os referidos quesitos, na fundamentação de facto constante da douta sentença, foi alterada a decisão, dando como provada a matéria dos quesitos 41 e 42 e parcialmente provada a matéria do quesito 40 (cfr pontos RRRRR), SSSSS), TTTTT) da douta sentença)
6. Reapreciada a prova produzida sobre a matéria dos quesitos 46 e 47, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente o seguinte:
Quesito 46 – Nenhuma diligência de investigação foi realizada desde a data da participação do desaparecimento da RSM às forças policiais até ao dia 21.02.2006
Quesito 47 - A única diligência referida no ponto K da matéria de facto assente foi realizada no dia 21.02.2006
7. O tribunal “a quo” fundamentou a sua decisão, para além do mais, nos depoimentos das testemunhas RA, OR e DFLS.
8. As testemunhas RA e JOMR não foram indicadas nem ouvidas sobre a matéria do quesito 46, pelo que não podem fundamentar a decisão sobre a matéria de facto em relação a este quesito como erradamente faz o tribunal “a quo”.
9. Os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa daquela que foi tomada pelo tribunal “a quo”, e que não foram valoras por este, são os depoimentos das testemunhas:
- HMSM, inspetora da Policia Judiciária (depoimento gravado no CD 4, desde 00:00:00 a 2:04:51), no que respeita à proposta da PSP para a SIRENE, donde resulta que esta proposta apenas teve efeitos práticos a partir de 2009, pelo que não pode ser entendida como ato de investigação.
- DFLS (depoimento gravado no CD 6, desde 00:00:00 a 2:58:28), que refere no seu depoimento refere ter dado instruções ao inspetor JOMR para a urgência do assunto na segunda-feira dia 19.02.2006, tendo este inspetor afirmado no seu depoimento (depoimento gravado no CD 5 de 00:56:17 a 03:09.34) que o processo só lhe foi distribuído na terça-feira, ou seja, no dia 20.02.2006.
- MFGC (depoimento gravado no CD 3, desde 00:00:00 a 00:39:05), de que este senhor inspetor lhe transmitiu que a RSM quando tivesse frio e fome iria bater à porta do pai, matéria do quesito 31, dada como provada.
- DMMPN (depoimento gravado no CD 5, desde 00:00:00 a 00:56:17), quando afirma “mas o que interessa no caso dos desaparecidos é o ato imediato e portanto contactar logo que possível as pessoas que rodeiam o desaparecido e ver se daquelas pessoas que mais próximo se relacionam com ele existe algum elemento que nos leve mais longe porque qualquer uma das amigas dela poderia dizer qualquer elemento significativo que nos apontasse numa direção de investigação”, o que é suficiente para afastar o fundamento tido em conta pelo tribunal “a quo”, dando cobro ao depoimento das testemunhas RA, JOMR (estas sem prejuízo do que já se aduziu relacionado com o facto de não terem sido indicadas a esta matéria) sobre a pertinência ou a impertinência das diligências que, naquela altura, se impunham ou não impunham levar a cabo.
- (I) a ausência do processo de qualquer registo de diligência em ordem a verificar a informação
- (ii) na matéria assente sobre as diligências realizadas, nomeadamente, o contacto com as amigas da RSM ter ocorrido apenas em 2007, mais de um ano depois do desaparecimento, e a melhor amiga em 2009.
10. Reapreciada a prova produzida sobre a matéria dos quesitos 60, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente:
Quesito 60 - A amiga da RSM, AIS, não foi ouvida no âmbito da diligência descrita na cota referida em AAA) da matéria de facto assente.
11. O tribunal “a quo” não faz qualquer referência, na fundamentação da resposta à matéria de facto, a este quesito, donde se depreende, de que nenhuma prova foi produzida em relação a essa matéria, o que não corresponde à verdade.
12. Sobre esta matéria foi ouvida a visada AIS (depoimento gravado no CD 2 de 02:42:50 a 02:59:38), cujo depoimento não foi devidamente valorado pelo tribunal “a quo”, que expressamente afirma que não foi contactada, meio de prova que impõe, necessariamente, a modificação da resposta a este quesito 60.
13. Reapreciada a prova produzida sobre a matéria dos quesitos 69, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto que “a investigação não procurou saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006”
14. Os concretos meios probatórios que impõem decisão no sentido ora preconizado, diverso do decidido pelo tribunal “a quo”, que, aliás, não apresenta qualquer fundamento para essa decisão, são:
- A ausência de documentação da diligência no processo de investigação, apesar de a mesma ser essencial para o sucesso da investigação, como resulta do depoimento da testemunha DMMPN (depoimento gravado no CD 5, desde 00:00:00 a 00:56:17),
- O apelo às regras da experiência, decorrente do facto assente de a investigação estar convencida de que a RSM voltaria, que o seu desaparecimento foi voluntário, pelo que não faria sentido, na óptica a investigação, a realização daquela diligência.
- Do depoimento da testemunha JOMR (depoimento gravado no CD 5, desde 00:56:17 a 03:09:34) inspetor responsável pelo processo, que nega ter procurado saber com quem a RSM esteve no dia anterior ao seu desaparecimento.
15. Reapreciada a prova sobre a matéria dos quesitos 96, 97,99,100 e 101, esta deve ser dada como integralmente provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto, que a deu como provada, mas acrescentando a perspectiva do autor e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente o seguinte:
- Quesito 96 - O sofrimento do Autor foi intensificado pela inércia e inépcia do réu em conduzir a investigação relativa ao desaparecimento da sua filha RSM de forma coerente e eficaz
- Quesito 97 - A incompetência demonstrada pelos serviços de investigação provocaram-lhe e provocam-lhe enorme revolta e frustração
- Quesitos 99 e 100 - O Autor sentia revolta por os agentes da investigação não terem uma preparação profissional adequada para investigar o desaparecimento da filha e não existir uma orientação traçada pelos magistrados do Ministério Público para a investigação
- Quesito 101 - O Autor lembra-se recorrentemente das diligências que poderiam ter sido feitas, como a localização do telemóvel da filha, o visionamento das imagens das câmaras dos autocarros que circulam na interface do Mercado de M... no sentido de identificar a desconhecida que acompanhava a RSM e imagina o que poderia ter acontecido
16. Os concretos meios probatórios que não foram devidamente valorados e que impõem decisão no sentido ora preconizado são os que resultam
- Dos depoimentos das testemunhas HMSM (depoimento gravado no CD 4, desde 00:00:00 a 2:04:51), DMMPN (depoimento gravado no CD 5, desde 00:00:00 a 00:56:17) e DFLS (depoimento gravado no CD 6, desde 00:00:00 a 2:58:28), no que concerne à atuação do réu na investigação
- Nos factos assentes sobre os atos e omissões da investigação.
- Dos depoimentos das testemunhas MFGC (depoimento gravado no CD 3 de 00:00:00 a 00:39:05), IMMG (depoimento gravado no CD 3 de 00:39:05 a 01:10:57) e VSM (depoimento gravado no CD 3 de 01:10:57 a 01:41:04)
- Nas regras da experiência que contradizem a conclusão do Tribunal “a quo”. Até 2009 a investigação andou mal e devagar e, a partir de 2009 ela teve um impulso, sem nenhum motivo aparente. A partir de 2009 foram realizadas diligências que deveriam ter sido realizadas em 2006, como ouvir as amigas da RSM, a médica, entre outras, melhor descritas nos factos assentes. O que permite concluir que, ao contrário da conclusão extraída pelo tribunal “a quo”, também na perspectiva dos próprios (pelo menos até 2009) a investigação não andou bem.
17. A douta sentença recorrida padece ainda de erro de julgamento de direito, por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas e princípios da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito do Estado Português.
18. O autor intentou ação contra o Estado reclamando o pagamento de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados pelos erros e omissões no âmbito do processo de investigação pelo desaparecimento da sua filha RSM.
19. Os erros e omissões, como resulta da factualidade apurada, resultam da inexistência de meios de formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público para a investigação deste tipo de casos, bem como de meios específicos, donde decorre a ineficiência da atuação dos órgãos do Estado encarregados da investigação criminal, que, por isso, em tempo útil de oportuno, não procederam às diligências de investigação adequadas e necessárias ao caso, pondo em causa, consequentemente, qualquer possibilidade de sucesso, ou seja, a descoberta da RSM, ou mesmo da descoberta da verdade.
20. O regime da responsabilidade aplicável ao caso em apreço, face ao permanente, continuado e ainda atual comportamento omissivo do réu, iniciado em 2006 e que se prolongou, pelo menos até 2009, pelos danos ilicitamente causados pela administração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa, é o que resulta da Lei 67/2007 de 31 de Dezembro e não, como o de 1967, como decidido na douta sentença recorrida.
21. Nos termos da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro, o Estado e as demais pessoas colectivas de direito público são exclusivamente responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício.
22. Nos termos do nº3 e 4, da citada norma o Estado é ainda responsável quando os danos não tenham resultado do comportamento concreto de um titular de órgão, funcionário ou agente determinado, ou não seja possível provar a autoria pessoal da ação ou omissão, mas devam ser atribuídos a um funcionamento anormal do serviço, existindo funcionamento anormal do serviço quando, atendendo às circunstâncias e a padrões médios de resultado, fosse razoavelmente exigível ao serviço uma atuação susceptível de evitar os danos produzidos.
23. Por sua vez, nos termos do artigo 8º da citada lei, os titulares de órgãos, funcionários e agentes são responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, por eles cometidas com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do cargo, e o Estado responsável de forma solidária com os respectivos titulares de órgãos, funcionários e agentes, se as ações ou omissões referidas no número anterior tiverem sido cometidas por estes no exercício das suas funções e por causa desse exercício.
24. São consideradas ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos, existindo ainda ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no n.º 3 do artigo 7.º da citada lei.
25. A culpa dos titulares de órgãos, funcionários e agentes deve ser apreciada pela diligência e aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias de cada caso, de um titular de órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor, e sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos.
26. Por sua vez, nos termos do artigo 3º, quem esteja obrigado a reparar um dano, segundo o disposto na Lei 67/2007, deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, devendo a indemnização é fixada em dinheiro quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa.
27. A responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas colectivas públicas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, com as especialidades resultantes das normas próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos - facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade – pressupostos que estão verificados nos caso em apreço.
28. A douta sentença recorrida ao não considerar ilícito e culposo o comportamento do réu, assumiu uma atitude desculpabilizante dos atos e das omissões das investigação, não propriamente pela sua ação e omissão, oportuna ou inoportuna.
29. À luz da lei processual penal, o inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação (art. 262º do Código de Processo Penal), cabendo ao Ministério Público, que pode ser coadjuvado pelos órgãos de policia criminal, praticar todos os atos e assegura os meios de prova necessários à realização das finalidades referidas no artigo 262º do CPP.
30. O legislador, no que respeita aos atos a praticar, não definiu, nem estabeleceu atos de investigação concretos que devam ser praticados no âmbito de uma investigação, limitando-se a estabelecer as finalidades da investigação, e deixando ao Ministério Público e aos órgãos de polícia criminal a determinação dos atos necessários a alcançar essas finalidades.
31. Isto, necessariamente, sem prejuízo do que estabelece no artigo 249º do CPP, no que concerne às providencias cautelares, que determina que compete aos órgãos de polícia criminal, mesmo antes de receberem ordem da autoridade judiciária para procederem a investigações, praticar os atos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova, nomeadamente, proceder a exames de vestígios de crime, em especial às diligências previstas no nº 2 do artigo 171º de no artigo 173º, ambos do CPP, colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime e a sua reconstituição.
32. Da factualidade apurada, é inequívoco que o réu não agiu de forma diligente e adequada à localização da RSM, já que, perante a notícia do desaparecimento, o réu, uma vez que a RSM era já maior de idade, assumiu como certo que o desaparecimento foi voluntário e que ela voltaria quando tivesse frio e fome.
33. Condicionando, erradamente, toda a investigação ao aparecimento voluntário da RSM, tivesse frio e fome - e não às finalidades da descoberta do seu paradeiro ou do que lhe aconteceu, erro de julgamento ou de previsão que é causa do insucesso da investigação, que ainda hoje se mantém em aberto.
34. Como resulta dos factos assentes, os factos foram participados ao réu, não às 14H27, mas às 11H41m, ou seja, cerca de 1:30 minutos antes do encerramento dos tribunais de turno.
35. Resulta também assente, que o autor alertou a PSP e a PJ para o facto de a bateria acabar e o telemóvel desligar-se, o que, nem carecia de o fazer, por tal facto ser notório e os órgãos de policia terem obrigação de o saber.
36. Consequentemente, tinha sido possível aos órgãos do Réu obter a autorização judicial necessária para se proceder à localização do telemóvel da RSM.
37. O réu tinha, por isso, obrigação de proceder com diligência à localização celular e não o fez, pelo que a sua omissão é ilícita, sendo irrelevante que na participação efectuada pelos pais da RSM, tivesse sido, ou não, configurada, por eles, a hipótese de crime, pois não cabe ao cidadão fazê-lo.
38. Por outro lado, em face da comunicação de desaparecimento, excluir, como fizeram os órgãos do Estado, a possibilidade de estarmos perante um crime, constitui, por si só, uma omissão grave dos seus deveres que resultaram na ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos, da RSM e do Autor.
39. Sem prejuízo disso, ainda que se admita a impossibilidade de ser obtida em tempo útil a autorização judicial para a localização celular, compete exclusivamente ao Réu dotar os seus órgãos dos meios necessários a uma eficiente ação, de modo a não esvaziar de sentido as providências cautelares que impõe aos seus agentes.
40. Compete ao Réu, no âmbito dos seus poderes de regulação, organizar os tribunais de modo a que, entre as 13 horas de sábado e as 9 horas de Segunda-Feira esteja disponível um magistrado judicial para conceder as autorizações que a lei impõe.
41. Como lhe compete dotar a investigação das normas necessárias ao efeito, como, aliás, fez em 2007, permitindo, a partir dessa data, às autoridades judiciárias e de policia criminal a obtenção de dados sobre a localização celular quando eles forem necessários a afastar o perigo para a vida ou de ofensa à integridade física grave (artigo 252ºA do CPP).
42. Não o tendo feito, num ou noutro caso, o comportamento do Réu não pode deixar de se considerar ilícito, por dele resultar, também nesta perspectiva, uma ofensa grave de direitos ou interesses legalmente protegidos, da RSM e do Autor.
43. Acresce que, apesar da urgência do ato, como resulta dos factos assentes, o Réu apenas no dia 22.02.2006, ou seja, 4 dias depois da notícia do desaparecimento solicitou à operadora de comunicações, a localização celular, e fê-lo de forma deficiente, por não ter sido acompanhado de despacho prévio de juiz de instrução criminal.
44. Em face da factualidade assinalada, não pode deixar de se extrair que o Réu e os seus órgãos tiverem uma conduta culposa, por negligente, que os trâmites burocráticos ou administrativos não justificam, nomeadamente a querela doutrinária e jurisprudencial, pelo que, face ao perigo iminente em concreto, impunha-se que tivesse tomado as medidas cautelares necessárias a afastar o perigo, pelo que, na dúvida, como manda a jurisprudência das cautelas, o pedido deveria ter sido acompanhado da autorização judicial e não foi.
45. Em relação ao demais, como resulta da factualidade apurada, o Réu absteve-se de praticar quaisquer outras diligências relevantes para as finalidades da investigação do caso em apreço.
46. O réu não contactou logo que possível as pessoas que rodeiam o desaparecido, nem curou de ver se daquelas pessoas que mais próximo se relacionam com ele existe algum elemento que leve a investigação mais longe, obtendo, deste modo, elementos significativo que apontasse uma direção de investigação.
47. Estes atos, se realizados, de forma eficiente, nos primeiros momentos a seguir ao desaparecimento, são cruciais para o processo de investigação, já que, como é consabido, à medida que as horas passam diminui a taxa de sucesso de a pessoa desaparecida ser encontrada e, consequentemente, da investigação.
48. Na situação concreta, resulta que o réu não ouviu as amigas da RSM, só o fez, em relação à melhor amiga, em 2009.
49. Só ouviu as colegas de turma que a iam acompanhar na viagem cerca de um mês depois do desaparecimento.
50. Não ouviu a médica que acompanhava a RSM, só o tendo feito em Novembro de 2006 e depois em 2009.
51. Não fez qualquer diligência junto do lixeiro, apesar da informação prestada no dia 19.02.2006, pelo pai de que este a teria visto no parque da cidade, no Porto.
52. Apesar disso a PSP não alargou a área de buscas para o Porto, mantendo-se apenas na área geográfica de M....
53. Não ouviu o motorista do autocarro, nem as funcionárias do café I... em M..., que terão sido as ultimas pessoas que a viram.
54. Não procuraram saber com quem a RSM esteve no dia anterior.
55. Apesar o processo ter carácter de urgência, conforme decisão do coordenador responsável da PJ, o mesmo só foi distribuído ao inspetor responsável, numa terça-feira, ou seja, no 4º dia posterior ao da participação.
56. Só ter visionado as imagens dos autocarros dos STCP, após diligências do autor para o efeito.
57. Não ter procedido a qualquer diligência para identificar a desconhecida que acompanhava a RSM na paragem do autocarro.
58. Não ter pedido o visionamento de outros autocarros, nem das câmaras do Metro, sendo irrelevante que se tenha constatado posteriormente, que as composições do Metro não dispunham dele.
59. Só ter ouvido a mãe da RSM mais de uma semana depois da participação.
60. Não ter procedido a nenhuma busca ao quarto e à casa da RSM, o que só fez em 2009.
61. Ter efectuado de forma deficiente a participação ao Gabinete SIRENE, o que teve como consequência, o desaparecimento da RSM ficar omisso no espaço Schengen, na Interpol e mesmo no sistema interno de informação do Estado, situação que só foi reparada em 2009.
62. Na busca do Bairro do L..., apesar de ter obtido um mandado desde 12.04.2006, só realizou a diligência mais de 15 dias depois, o que fez depois de ter estado no local no dia 12.04, sem mandado, pondo assim em crise o sucesso da diligência, como o Réu não podia ignorar.
63. É, por isso, inequívoco que o réu violou a legis artis a que estava obrigado e que não afectou os meios necessários e adequados ao caso.
64. Pelo que o réu agiu de forma ilícita, por violação culposa dos seus deveres, do que resultou a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.
65. Com este comportamento, o réu casou dano, lesão ou prejuízo de ordem patrimonial ou não patrimonial, produzido na esfera jurídica de autor.
66. Como resulta da matéria assente, o autor, com a conduta do réu, sofreu danos, quer de natureza patrimonial, ainda que não os tenha logrado demonstrar com exatidão, e que por isso deverão ser relegados para execução de sentença, quer danos de natureza não patrimonial, que não sofreria se não fosse a conduta ilícita e culposa do réu.
67. Assim, sendo, o pedido de indemnização formulado pelo A. contra o R. Estado Português deve proceder, por verificados os pressupostos em que assenta a responsabilidade civil extracontratual do Estado da Lei 67/2007, ou, sem conceder, do DL 48051 de 21.11.67.
68. Pelo que, decidindo, como decidiu, o Tribunal “a quo”, violou o disposto nas citadas normas e ainda nos artigos 483º e 562 e seguintes do Código Civil e artigos 655º nº 1 e 659º do C.P.C.".
69. Termos em que, deve a douta sentença recorrida ser revogada e, em consequência, ser a ação julgada procedente, como é de JUSTIÇA.

*

O Recorrido contra-alegou, concluindo o seguinte:

1º - O autor LAGM instaurou contra o réu Estado português ação de responsabilidade civil extracontratual, por fato ilícito;
2º A qual tem por objeto os “…erros e omissões que na sua ótica, resultam da inexistência de meios e de formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público para a investigação deste tipo de casos…”;
3º - Concretamente ao MP e aos OPC’s (PSP/PJ) faltou-lhes preparação técnica na condução do processo do inquérito [NUIPC n.º 1.027/06.4 TAVNG] que visou o apuramento do desaparecimento da sua filha RSM;
4º - Entidades a quem imputa, em resumo, que “…em tempo útil e oportuno, não procederam às diligências de investigação adequadas e necessárias ao caso…” pondo desta maneira em causa o “…qualquer possibilidade de sucesso, ou seja, a descoberta da RSM ou da verdade.”;
5º - Desideratos estes que, na sua opinião, determinaram o insucesso da investigação criminal;
6º - Os quais foram causa adequada a provocar-lhe danos patrimoniais (computados em 50.000,00 €) e danos não patrimoniais (computados em 1.000.000,00 €) respetivamente;
Porém,
7º - Realizado o julgamento e analisada a prova constante dos autos, a Meritíssima Juíza de Direito a quo proferiu douta sentença absolutória considerando a presente ação improcedente, por não provada e, em consequência absolveu o R Estado português dos pedidos que contra o mesmo tinham sido formulados pelo ora recorrente LAGM;
8º - Em que concluiu, o seguinte:
“O Autor não conseguiu demonstrar o pressuposto da ilicitude na atuação dos órgãos de investigação criminal envolvidos no processo de desaparecimento da sua filha RSM, pelo que, não se verificando este pressuposto, a sua pretensão carece de soçobrar, sendo desnecessário, porque inútil, proceder-se à apreciação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado.”
9º - O autor LAGM não concordando com a douta sentença absolutória interpôs recurso, no qual invocou que a mesma padece de erro de julgamento de facto, por não ter feito uma correta interpretação, consideração e valoração da prova gravada, pelo que o presente recurso tem por objeto a reapreciação dessa prova gravada;
10º - Os concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados são os constantes das respostas aos pontos 40, 41, 42, 46, 47, 60, 69, 96, 97, 99 e 100 da Base Instrutória;
Na sua opinião,
11º - Reapreciada a prova sobre a matéria dos quesitos 40, 41 e 42, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto “não provado” e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente o seguinte:
Quesito 40 — Foi transmitido ao autor pelos agentes que nada tinha sido feito
Quesito 41 — …alegando o facto de a RSM ser maior de idade
Quesito 42 …e da sua doença do foro psiquiátrico não estar provada documentalmente.
12º - Os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa daquela que foi tomada pelo tribunal a quo, em relação a esta matéria, são os depoimentos das testemunhas JSA (cujo depoimento se encontra gravado no CD 1, desde 01:29:44 a 1:51:30), e LJBM (cujo depoimento se encontra gravado no CD 2, desde 02:01:29 a 02:26:33), cujos trechos foram transcritos na motivação, testemunhas que foram perentórias na comprovação da referida matéria quesitada.
13º - Reapreciada a prova produzida sobre a matéria dos quesitos 46 e 47, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente o seguinte:
Quesito 46 — Nenhuma diligência de investigação foi realizado desde a data da participação do desaparecimento da RSM às forças policiais até ao dia 21.02.2006
Quesito 47 - A única diligência referida no ponto K da matéria de facto assente foi realizada no dia 21.02.2006
14º - O tribunal a quo fundamentou a sua decisão, para além do mais, nos depoimentos das testemunhas RA, JOMR e DFLS.
15º - As testemunhas RA e JOMR não foram indicadas nem ouvidas sobre a matéria do quesito 46, pelo que não podem fundamentar a decisão sobre a matéria de facto em relação a este quesito como erradamente faz o tribunal “a quo”.
16º - Os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa daquela que foi tomada pelo tribunal “a quo”, e que não foram valoradas por este, são os depoimentos das testemunhas:
- HMSM, inspetora da Policia Judiciária (depoimento gravado no CD 4, desde 00:00:00 a 2:04:51), no que respeita à proposta da PSP para a SIRENE, donde resulta que esta proposta apenas teve efeitos práticos a partir de 2009, pelo que não pode ser entendida como ato de investigação.
- DFLS (depoimento gravado no CD 6, desde 00:00:00 a 2:58:28), que refere no seu depoimento refere ter dado instruções ao inspetor JOMR para a urgência do assunto na segunda-feira dia 19.02.2006, tendo este inspetor afirmado no seu depoimento (depoimento gravado rio CD 5 de 00:56:17 a 03:09.34) que o processo só lhe foi distribuído na terça-feira, ou seja, no dia 20.02.2006.
- MFGC (depoimento gravado no CD 3, desde 00:00:00 a 00:39:05), de que este senhor inspetor lhe transmitiu que a RSM quando tivesse frio e fome iria bater à porta do pai, matéria do quesito 31, dada como provada.
- DMMPN (depoimento gravado no CD 5, desde 00:00:00 a 00:56:17), quando afirma “mas o que interessa no caso dos desaparecidos é o ato imediato e portanto contactar logo que possível as pessoas que rodeiam o desaparecido e ver se daquelas pessoas que mais próximo se relacionam com ele existe algum elemento que nos leve mais longe porque qualquer uma das amigas dela poderia dizer qualquer elemento significativo que nos apontasse numa direção de investigação”, o que é suficiente para afastar o fundamento tido em conta pelo tribunal “a quo”, dando cobro ao depoimento das testemunhas RA, JOMR (estas sem prejuízo do que já se aduziu relacionado com o facto de não terem sido indicadas a esta matéria) sobre a pertinência ou a impertinência das diligências que, naquela altura, se impunham ou não impunham levar a cabo.
- (i) a ausência do processo de qualquer registo de diligência em ordem a verificar a informação
- (ii) na matéria assente sobre as diligências realizadas, nomeadamente, o contacto com as amigas da RSM ter ocorrido apenas em 2007, mais de um ano depois do desaparecimento, e a melhor amiga em 2009.
17º - Reapreciada a prova produzida sobre a matéria dos quesitos 60, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente:
Quesito 60 - A amiga da RSM, AIS, não foi ouvida no âmbito da diligência descrita na cota referida em AAA) da matéria de facto assente.
18º - O tribunal “a quo” não faz qualquer referência, na fundamentação da resposta à matéria de facto, a este quesito, donde se depreende, de que nenhuma prova foi produzida em relação a essa matéria, o que não corresponde à verdade.
19º - Sobre esta matéria foi ouvida a visada AIS (depoimento gravado no CD 2 de 02:42:50 a 02:59:38), cujo depoimento não foi devidamente valorado pelo tribunal “a quo”, que expressamente afirma que não foi contactada, meio de prova que impõe, necessariamente, a modificação da resposta a este quesito 60.
20º - Reapreciada a prova produzida sobre a matéria dos quesitos 69, esta deve ser dada como provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto que “a investigação não procurou saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006”
21º - Os concretos meios probatórios que impõem decisão no sentido ora preconizado, diverso do decidido pelo tribunal “a quo”, que, aliás, não apresenta qualquer fundamento para essa decisão, são:
- A ausência de documentação da diligência no processo de investigação, apesar de a mesma ser essencial para o sucesso da investigação, como resulta do depoimento da testemunha DMMPN (depoimento gravado no CD 5, desde 00:00:00 a 00:56:17),
- O apelo às regras da experiência, decorrente do facto assente de a investigação estar convencida de que a RSM voltaria, que o seu desaparecimento foi voluntário, pelo que não faria sentido, na óptica a investigação, a realização daquela diligência.
- Do depoimento da testemunha JOMR (depoimento gravado no CD 5, desde 00:56:17 a 03:09:34) inspetor responsável pelo processo, que nega ter procurado saber com quem a RSM esteve no dia anterior ao seu desaparecimento.
22º - Reapreciada a prova sobre a matéria dos quesitos 96, 97,99,100 e 101, esta deve ser dada como integralmente provada, ao contrário do decidido na resposta à matéria de facto, que a deu como provada, mas acrescentando a perspectiva do autor e, consequentemente, ficar a constar na matéria assente o seguinte:
- Quesito 96 - O sofrimento do Autor foi intensificado pela inércia e inépcia do réu em conduzir a investigação relativa ao desaparecimento da sua filha RSM de forma coerente e eficaz
- Quesito 97 - A incompetência demonstrada pelos serviços de investigação provocaram-lhe e provocam-lhe enorme revolta e frustração
- Quesitos 99 e 100 - O Autor sentia revolta por os agentes da investigação não terem uma preparação profissional adequada para investigar o desaparecimento da filha e não existir uma orientação traçada pelos magistrados do Ministério Público para a investigação
- Quesito 101 - O Autor lembra-se recorrentemente das diligências que poderiam ter sido feitas, como a localização do telemóvel da filha, o visionamento das imagens das câmaras dos autocarros que circulam na interface do Mercado de M... no sentido de identificar a desconhecida que acompanhava a RSM e imagina o que poderia ter acontecido
23º - Os concretos meios probatórios que não foram devidamente valorados e que impõem decisão no sentido ora preconizado são os que resultam
- Dos depoimentos das testemunhas HMSM (depoimento gravado no CD 4, desde 00:00:00 a 2:04:51), DMMPN (depoimento gravado no CD 5, desde 00:00:00 a 00:56:17) e DFLS (depoimento gravado no CD 6, desde 00:00:00 a 2:58:28), no que concerne à atuação do réu na investigação
- Nos factos assentes sobre os atos e omissões da investigação.
- Dos depoimentos das testemunhas MFGC (depoimento gravado no CD 3 de 00:00:00 a 00:39:05), IMMG (depoimento gravado no CD 3 de 00:39:05 a 01:10:57) e VSM (depoimento gravado no CD 3 de 01:10:57 a 01:41:04)
- Nas regras da experiência que contradizem a conclusão do Tribunal “a quo”. Até 2009 a investigação andou mal e devagar e, a partir de 2009 ela teve um impulso, sem nenhum motivo aparente. A partir de 2009 foram realizadas diligências que deveriam ter sido realizadas em 2006, como ouvir as amigas da RSM, a médica, entre outras, melhor descritas nos factos assentes. O que permite concluir que, ao contrário da conclusão extraída pelo tribunal “a quo”, também na perspectiva dos próprios (pelo menos até 2009) a investigação não andou bem.
24º - Ora, o recorrente parte de vários equívocos que inquinam todo o seu raciocínio subsequente.
Vejamos,
25º - Confunde a natureza e as finalidades do processo de inquérito com o processo de averiguações.
Ora,
26º - A investigação criminal ocorre em sede formal de processo de inquérito, onde tendencialmente todos os atos são reduzidos a escrito, em auto ou a informação colhida vertida por escrito no mesmo, nos termos do artigo 275.º do CPP.; na averiguação de desaparecimento a necessidade de documentação dos atos só é exigível e necessária quando desta resulta informação positiva relevante para apreciação das circunstâncias do desaparecimento, não sendo de exigir que diligências com resultado negativo – que são a maioria - sejam documentadas, sob pena de esgotar os meios humanos e materiais na descrição e materialização dessas diligências negativas e dessa maneira inviabilizar o restante decurso normal das diligências ainda em curso, tornando a averiguação um emaranhado formal de atos inúteis e ineficazes.
Mas,
27º - A grande diferença entre processo de inquérito e processo de averiguação verifica-se na eventual ocorrência do instituto de natureza substantiva - a prescrição – a qual se verifica naquele, o que já não sucede com este; daí que não existindo suspeitas da prática criminosa, esta demanda na averiguação da desaparecida mantém-se porque estas diligências são imprescritíveis, o que já não sucede no processo de inquérito, o qual tem prazos de prescrição fixados no CP.
Assim e voltando ao caso concreto,
28º - A participação do desaparecimento da RSM, de 18 anos de idade, foi efetuada na esquadra da PSP de M... pela sua mãe, MWS no dia 18.02.2006, pelas 11.41 horas.
Não obstante,
29º - No próprio dia do desaparecimento (17.02.2006), a partir da parte da tarde, a RSM deixou de responder às chamadas e mensagens que lhe foram feitas pelos seus pais, outros familiares e amigas.
30º - Situação que perdurou durante a noite do dia do desaparecimento e na madrugada do dia seguinte.
Assim,
31º - O que denota da parte da mãe da desaparecida, MWS uma condescendência e até aquiescência com a ausência, designadamente a noturna por parte da sua filha RSM.
Aliás,
32º- A participação policial ocorreu mais de vinte e quatro horas após a última vez que a RSM foi vista com vida pela mãe (17.02.2006, pelas 09.15 horas).
33º - Essa participação de desaparecimento deu origem na PSP ao Número de Participação Policial (NPP) 42465/2006.
Destarte,
34º - Desde 17.02.2006 (data do desaparecimento) até hoje, nunca o autor LAGM, a mãe da desaparecida MWS, outro familiar ou amigo fazendo alusão às circunstâncias de tempo, lugar e modo em que a RSM desapareceu fizeram queixa-crime, ou apresentaram quaisquer fatos susceptíveis de serem enquadrados como crime, ainda que imputáveis contra incertos.
Nem,
35º - Das diligências efetuadas no decurso da averiguação de desaparecida realizada pela PJ não resultou, até hoje, qualquer indício suscetível de ser configurado como prática de crime.
Pois que nesta última hipótese,
36º - A mesma daria azo a ser classificada como Número Único Identificador de Processo Crime (NUIPC), com consagração legal e tramitação na Portaria n.º 1223-A/91, de 30 de dezembro, iniciando-se obrigatoriamente então o processo de inquérito.
Aliás,
37º - O que não sucedeu num primeiro momento, como se disse em 31.º, face à inexistência de queixa-crime, designadamente por parte dos pais, familiares e amigos da desaparecida.
Situação,
38º - Que se mantém até hoje.
Por outro lado,
39º - A participação [e o aditamento] de desaparecimento efetuada pelo ora autor LAGM realizada em 18 e 19 de fevereiro de 2006 ao Piquete da PJ foram vertidas nas Informações de Serviço com as mesmas datas, respetivamente que deram origem ao Registo de Desaparecida n.º 14.264/06.
Ora,
40º - A participação policial só passou a ser tramitada como processo de inquérito, sob o NUIPC n.º 1.027/06.4 TAVNG única e exclusivamente a partir do momento em que a PJ teve necessidade de proceder à localização celular do telemóvel que a desaparecida RSM tinha na sua posse no momento em que foi vista pela última vez.
Solicitação essa que,
41º - À data dos fatos – 17/02/2006 – tal meio de obtenção de prova só podia ser concretizado junto das operadoras de serviços móveis terrestres, através de pedido emanado de autoridade judiciária.
Destarte,
42º - A existência formal de processo de inquérito, não retira ao mesmo a sua verdadeira natureza e as características de processo de averiguação qua tale na PJ, entidade a quem está encarregue de proceder às diligências de averiguação, com exceção das referentes à eventual prática de ato processual para o qual fosse (seja) necessário a intervenção de autoridade judiciária, com redução a escrito (vg. nomeadamente, pedido de busca domiciliária e execução da mesma, auto de apreensão e pedido de localização de paradeiro).
Aliás,
43º - Se atentarmos no CPP não está prevista a marcha de qualquer fase de processo, ainda que preliminar/paralela/posterior ao processo de inquérito, com a classificação de averiguação.
O que,
44º - Já não sucede com o processo de inquérito propriamente dito, o qual tem consagração legal no CPP, a partir dos artigos 262.º e ss.
Acresce que,
45º - Ainda assim no âmbito do processo de inquérito, o ora autor LAGM nunca manifestou o desejo de vir a constituir-se assistente, apesar de ter legitimidade processual para o efeito, interesse em agir, estar em tempo, ser válida e legal esta sua eventual pretensão, desde que para isso tivesse indicado qualquer suspeita ou indício suscetível de ser configurada como crime.
Por outro lado,
46º - Ao contrário do alegado pelo autor, LAGM este processo de inquérito sempre foi considerado urgente ao abrigo do artigo 103.º, n.º 2, al. a) do CPP.
E ainda por mera cautela,
47º - Ao abrigo do artigo 103.º, n.º 2, al. b) do CPP veio a ser declarado expressamente urgente por despacho proferido, em 13.03.2009, pela ilustre magistrada do MP titular do processo de inquérito.
O que pode ser confirmado,
48º - Pela simples consulta do processo de inquérito, o qual tem a natureza de público, visto que, a partir de 15.9.2007, não está sujeito ao segredo de justiça.
49º - Ao contrário do que parece inculcar o autor LAGM
50º - O processo de inquérito sob o NUIPC n.º 1.027/06.4 TAVNG não foi arquivado e continua pendente, encontrando-se ainda em fase de diligências processuais complementares – designadamente de revisão a tudo o que anteriormente foi feito - tendo em vista o conhecimento do paradeiro da RSM ou do seu cadáver.
Assim,
51º - O processo de inquérito continua ainda hoje na titularidade da PJ [embora na dependência funcional do MP], sob a supervisão da Coordenadora Superior de Investigação Criminal, Dra. HMSM, considerada como uma das melhoras investigadoras policiais da PJ sobre esta matéria.
Aliás,
52º - O desaparecimento da RSM, com foto e dados biográficos da mesma continua ainda inserto no campo das “Pessoas Desaparecidas”, página 2, no sítio electrónico da PJ www.pj.pt.
53º - O processo de inquérito que esteve (e continua a estar) sempre aberto a qualquer sugestão dos pais biológicos (designadamente do autor LAGM), familiares, parentes e amigos chegados, desde que as diligências sugeridas fossem/sejam plausíveis, exequíveis e com interesse para a investigação do desaparecimento.
Em suma,
54º - O Estado português enquanto responsável pelo sistema de justiça globalmente considerado não está legalmente obrigado a proceder à detenção ou à retenção de uma cidadã nacional, maior de idade – a qual não está declarada judicialmente que sofre de doença do foro mental – que desaparece aparentemente de forma voluntária.
55º - Nem a fornecer aos magistrados do MP enquanto titulares da ação penal e aos inspetores da PJ, OPC encarregados das diligências de averiguação sobre os desaparecidos, como por exemplo a RSM, preparação específica para tratar de matérias que nem estão legal e objetivamente catalogadas como processo de natureza criminal.
56º - Por outro lado, diga-se, em abono da verdade, que as Escolas Profissionais que ministram formação específica aos magistrados (CEJ) e aos polícias da PJ (Escola Superior da PJ) estão reputadas como do melhor que existe neste sector, a nível mundial.
57º - Estar – aqui e agora, o ora recorrente por razões de índole subjetiva - a por em causa o Estado português enquanto responsável pela organização e gestão destas duas instituições em geral é quase uma heresia.
58º - Aliás, o próprio recorrente LAGM que procedeu à contratação dos serviços de um especialista privado na matéria de desaparecimentos, o Dr. JGPRP, especialista em criminalista, com escritório em Lisboa, não obteve melhor resultado do que a PJ e o MP.
Aliás,
59º - Rapidamente o recorrente prescindiu dos seus serviços, por não rever nesse especialista competências de nível superior às existentes na PJ e MP.
Por outro lado,
60º - Entende-se os sentimentos pessoais de desespero e de angústia do ora recorrente LAGM ao querer denodadamente reencontrar a sua filha RSM.
Todavia,
61º - Esta nossa compreensão assenta numa base moral, emocional e parental, a qual porém não tem qualquer correspondência na lei, em virtude do pedido formulado pelo ora recorrente ser insustentável deste ponto de vista legal.
Aliás,
62º– Estranha-se que o dever de celeridade na descoberta sobre o paradeiro da desaparecida RSM que o ora recorrente põe em causa no que concerne aos organismos do Estado português (PSP/PJ/MP) que tomaram conta do processo de averiguação do desaparecimento da sua filha acusando-os de falta de preparação técnica e não já ao próprio recorrente (e à mãe da sua filha MWS).
Designadamente,
63º - No que tange ao timing da participação do desaparecimento efetuado pela mãe MWS mais de 24 horas após a última vez que teve notícia da sua filha.
Mas,
64º- Ao contrário, na opinião do ora recorrente, os OPC’s que receberam a participação do desaparecimento tinham o “dever legal” de agir de imediato, iniciando rapidamente a localização celular do telemóvel da RSM quando os próprios progenitores deixaram passar mais de 24 horas após o seu desaparecimento.
Ademais,
64º - Os inspetores da PJ receberam a participação do desaparecimento no dia 18/2, pelas 14h27m e o telemóvel da RSM deixou de estar ligado no mesmo dia, pelas 14h.46m, ou seja, o telemóvel esteve ativo mais 19 (dezanove) minutos, sendo certo que o ora recorrente quando saiu das instalações da PJ do Porto já aquele instrumento móvel se tinha desligado.
E,
65º – Pelas mesmas razões se diga sobre a temática da RSM padecer de doença do foro psicológico, quando a mesma até à data do seu desaparecimento viveu sempre - enquanto menor e depois enquanto maior - à guarda dos seus pais, os quais nunca requereram qualquer providência jurídica para atalhar e prevenir tal incapacidade, designadamente meio de tutela jurídica (quer a título de processo de promoção e proteção enquanto menor, quer a título de internamento compulsivo ou interdição/inabilitação enquanto maior) que possibilitasse a defesa dos interesses da RSM.
Para além disso,
66º– O ora recorrente invoca a ilicitude com que o Estado português omitiu nas diligências que devia ter realizado e não fez ou na sua atuação menos cuidada e zelosa, mas nunca invoca quais as normas jurídicas violadas (leis, regulamentos e estatutos) ou até mesmo as boas práticas policiais violadas.
E,
67º – Não o fez, porque efetivamente in casu o Estado português agiu de acordo com as leis e a boa praxis policial.
Porquanto,
68º - Apesar da falta de confiança do recorrente LAGM no profissionalismo dos organismos do Estado português que tem sob a sua jurisdição a incumbência de descobrir o destino da sua filha, o aludido processo de inquérito NUIPC n.º 1.027/06.4 TAVNG continua pendente na busca incessante da verdade material.
Por outro lado,
69º - No que concerne à fundamentação da resposta da base instrutória aos pontos 40, 41 e 42 o douto despacho judicial ora posto em crise, refere nesta parte, o seguinte:
“...aquela PSP de M..., logo após a participação apresentada pela mãe da RSM, tratou imediatamente de:
- divulgar o desaparecimento da RSM pelos seus vários carros patrulha, distribuindo-lhes a fotografia da RSM e uma breve descrição dos factos;
- colocou uma sua fotografia num placard da Esquadra;
- participou o desaparecimento da RSM, via fax, para o Gabinete Sirene.
Deste modo, não pode dar-se como provado que aquela PSP nada tenha feito e consequentemente, de acordo com as regras normais da experiência de vida, não pode dar-se como provado que tenha sido dito ao autor nada ter sido feito em relação ao desaparecimento da sua filha.
Por sua vez, a não prova da matéria constante dos pontos 41.º e 42.º é consequência, desde logo, da não prova da matéria inserta no ponto 40.º. Porém importa ainda referir que a identificada testemunha [JSA] disse ter ouvido a PSP de M... dizer ao Autor que o facto da RSM ser de maioridade idade limitava as investigações, uma vez que, ela poderia ter desaparecido voluntariamente, assistindo-lhe o direito de o fazer.
Por sua vez, a testemunha VF, agente da PSP de M... declarou não se recordar de ter visto o A. na esquadra de M... no dia 19.02.2006, admitindo que o mesmo lá tenha estado posto que foi feito um aditamento à participação de desaparecimento, para ser junta uma informação médica.
...
Em conclusão, o Tribunal está convencido que o Autor no dia 19.02.2006 se dirigiu novamente à PSP de M... com o propósito de obter informações sobre o resultado das diligências para a localização da sua filha e que não foi pedida à mãe da RSM nem ao Autor, no dia 18.02.2006 qualquer documento médico.”
E,
70º - Ao contrário do que afirma o ora recorrente LAGM de que na sentença a quo já foram dados como provados os aludidos pontos 40, 41 e 42 – ao contrário do que nas respostas à Base Instrutória tinha sido dado como não provados - estas asserções de não provados foram corroboradas na fundamentação constante na douta sentença a quo ora posta em crise, designadamente no seguinte trecho:
“Por fim, acrescente-se que, no caso da RSM, tendo em conta o facto de ter sido comunicado às polícias (PSP e PJ) que a mesma padecia de problemas psiquiátricos, e ainda antes da junção de qualquer documento a atestar esse facto, foram logo encetadas algumas diligências com vista à sua localização.”
71º - Por outro lado, da própria análise e consulta do processo de inquérito verifica-se que a PSP de M..., ainda antes de ter o indício mínimo de que a RSM sofria de “ doença do foro psiquiátrico”, realizou, de imediato, as seguintes diligências preliminares:
“- elaborou, por escrito, o expediente da participação sobre o desaparecimento da RSM;
- divulgou o desaparecimento da RSM pelos seus vários carros patrulha, distribuindo-lhes a fotografia da RSM e uma breve descrição dos factos;
- colocou uma sua fotografia num placard da Esquadra; e
- participou o desaparecimento da RSM, via fax, para o Gabinete Sirene.”
Simultaneamente,
72º - Da mesma análise e da consulta do processo de inquérito verifica-se igualmente que a PJ do Porto realizou, de imediato, as seguintes diligências preliminares:
→ “Nos dias 18 e 19 o Serviço de Piquete elaborou, por escrito, a participação e o aditamento sobre o desaparecimento da RSM;
→ Nos dias 18 e 19 o Serviço de Piquete desencadeou as diligências urgentes, que se impunha realizar face aos elementos disponíveis, dos quais de destacam as seguintes:
. Recolheu informação junto dos familiares mais próximos, neste caso o pai, aqui autor, no sentido de despistar qualquer suspeita de crime ou de outra situação que pudesse representar perigo para a vida ou integridade da desaparecida;
. Apurou se a desaparecida utilizava telemóvel, possuía cartão de crédito ou débito ou outros elementos que pudessem vir a fornecer informação sobre o seu eventual paradeiro e verificar se esses meios se encontram ativos.
. Difundiu a notícia do desaparecimento, com vista à sua eventual localização, (já efectuada pela PSP de M..., por ter sido esta a primeira entidade policial a tomar conhecimento da ocorrência).
. Registou e tratou a informação do desaparecimento a fim de poder ser cruzada com outra ocorrência relacionada, ou com qualquer informação comunicada ou recolhida pelos nossos serviços, designadamente o aparecimento de feridos e cadáveres nos hospitais.”
73º - Logo, cai por base toda a argumentação aduzida pelo ora recorrente quanto às respostas aos aludidos pontos 40,41 e 42 da Base Instrutória.
Por outro lado,
74º - No que concerne às respostas aos pontos 46 e 47 da Base Instrutória, ao contrário do que alega o ora recorrente LAGM, o Tribunal a quo não considerou o ponto 47 da Base Instrutória como não provada.
Antes pelo contrário,
75º - Deu como provado que a diligência referida no ponto K da matéria de facto assente foi realizada no dia 21.2.2006.
Mais uma vez,
76º - O ora recorrente LAGM precipitou-se na análise das respostas dadas à Base Instrutória.
E,
77º -Na parte que interessa à elucidação deste problema passamos a transcrever o douto despacho judicial – fundamentação da resposta à Base Instrutória - nesta parte:
“- remessa da “Proposta de Indicação” do desaparecimento da RSM para o Gabinete Sirene, efetuada pela PSP de M... no dia 18.02.2006, a que corresponde o registo n.º 676/06 (cfr. fls. 137/138 do Proc. Inq.);
- divulgação do desaparecimento da RSM junto dos vários carros patrulha da PSP de M..., no dia 18.02.2006, juntamente com a sua fotografia e breve resumo dos factos, e início das buscas na área geográfica da PSP de M...;
- informação de serviço de fls. 102 e 103 do processo de inquérito, elaborada pelo inspetor RVA e remetida no dia 18.02.2006 ao senhor Coordenador de Investigação Criminal, na qual aquele informa ter sido apresentado pelo A a participação de desaparecimento da sua filha, informando ainda o seguinte:
- que a família tem encetado diversas diligências junto dos restantes familiares e amigos da RSM, com vista à sua localização;
- que te sido efetuadas diversas tentativas de contacto telefónico através do número 9...536 utilizado pela RSM verificando-se que embora as chamadas sejam recebidas não são atendidas e que pese embora o elevado número de SMS’s enviado o espaço de memória não se encontra esgotado, tudo levando a crer que as mesmas estão a ser recebidas e posteriormente apagadas;
- despacho do Coordenador de Investigação Criminal exarado sobre a sobredita informação a ordenar a sua remessa ao SCRIPT (cfr. fls. 102 do Proc. Inq.).
- informação de serviço de fls. 107 do Proc. Inq., elaborada pela inspetora SF no dia 19.02.2006 e dirigida ao senhor Coordenador de Investigação Criminal de Piquete, a informar:
- que pelas 21.15 do dia 19.02.2006 o Autor compareceu no Piquete da PJ referindo que a mesma sofre de perturbação mental, juntando uma mensagem enviada pela sua médica psiquiátrica, e que o mesmo referiu que a sua filha já esteve internada, por duas vezes, no Hospital Magalhães Lemos, por crises psicóticas, em Setembro de 2004 e Outubro de 2004. ...
- despacho de 20.02.2006 do Coordenador de Investigação Criminal exarado sobre a sobredita informação a ordenar a sua remessa ao SCRIPT, para aditamento ao anterior expediente.
- fax de fls. 109 do Proc. Inq., enviado pela Polícia Judiciária ao procurador-adjunto de VNG, no dia 21.02.2006, a solicitar a localização celular do telemóvel da RSM, com o n.º 9...536.”
78º - E mais adiante continua o douto aresto ora posto em crise:
Teve-se também em consideração os depoimentos prestados pelas testemunhas RVA, JOMR e DFLS os quais foram unânimes em afirmar entre os dias 18.02.2006 e 21.02.2006 as diligências acima referidas, para além ainda das diligências efectuadas pelo Autor, tais como o contacto com os familiares e amigos da RSM na tentativa de descobrirem o seu paradeiro, tendo os mesmos afirmado, de forma unânime, que em face do caso não se impunha a realização de qualquer outra diligência, tudo indicando, de acordo com as respectivas experiência profissionais, que a RSM voltaria dentro de pouco tempo.”
79º - Já no que concerne à temática das pessoas desaparecidas/procuradas, note-se que o ora recorrente LAGM não destrinça e confunde as competências/e as atribuições da PJ, PSP, GNR, SEF (entidade portuguesa gestora do GABINETE NACIONAL SIRENE), ESPAÇO SCHENGEN, EUROPOL e INTERPOL.
Ademais,
80º - A proposta de indicação da desaparecida RSM remetida pela PSP de M... para inserção no SISTEMA SIRENE dando conta dos seus elementos de identificação e dos dados de facto sobre o desaparecimento da mesma foram efetivamente remetidos pela PSP de M... como se pode ver pela matéria de facto assente ponto D
“No dia 18.2.2006, a PSP de M... elaborou e enviou por fax a Proposta de Indicação para o Gabinete Nacional Sirene - cfr. docs. fls. 124 e 128 dos autos.”
81º - E ao contrário do que quer fazer crer o ora recorrente LAGM que apesar de, em 2009, a PJ do Porto ter detectado que no SISTEMA SIRENE não estava inserido o desaparecimento da RSM, tal não significa porém que entre 18.02.2006 a 2009 não tivesse o aludido desaparecimento sido inserido na sobredita Base de Dados.
(a este propósito, vide depoimento da Dra. HMSM, Coordenadora Superior de Investigação Criminal na PJ do Porto, gravado no CD 4, desde 00:00:00 a 2:04:51)
“Dra. HMSM:...essa informação, porque a ficha foi feita, constava da participação...
Advogado: Muito bem. Mas então é pacífico que aquela proposta que o Sr. Dr. E muito bem mostrou à Sra. Dra. foi realizada, e também muito bem pela PSP, logo no dia 18, não resultou numa diligência concreta de a RSM ficar a constar daquela plataforma.
Dra. HMSM: Pronto. Eu só posso dizer, é que quando verificamos em 2009, não constava.
Advogado: Sim.
Dra. HMSM: Não sei se constou antes, era isso que eu estava a querer dizer...”
(sublinhado nosso).
101º - Sendo certo que o SISTEMA SIRENE é um sistema europeu cuja inserção dos dados que lhe são remetidos pelos OPC’s portugueses são da inteira e exclusiva responsabilidade daquela entidade europeia e não do Estado português.
102º - Logo, cai por base toda a argumentação aduzida pelo ora recorrente quanto às respostas aos aludidos pontos 46 e 47 da Base Instrutória.
Por outro lado,
103º - No que concerne às respostas aos pontos 60 e 69 da Base Instrutória, o tribunal a quo considerou relevante o seguinte:
“- a participação efetuada pelo Autor no dia 19.02.2006 na PJ na qual refere ter já contactado as amigas e familiares da RSM a fim de saber do seu paradeiro;
- e-mail de 28.03.2006, de fls. 267/269 dos autos, enviado pelo Autor ao Dr. JGPRP, seu detetive particular, na qual expressamente refere: “A Judiciária já entrevistou as colegas da RSM e aparte do que foi mencionado anteriormente, não há nada de relevante”, donde resulta que, a investigação, pelo menos antes de 28.03.2006, ouviu as colegas da RSM.
- cota de fls. 359 do processo de inquérito, de 12.03.2007, na qual se exarou o seguinte: “Consigno nos autos que tendo contactado várias amigas da RSM nomeadamente a por muitos considerada a sua melhor amiga AIS, solteira, atualmente a estudar na Universidade de Guimarães (contactável pelo n.º 9...932) apuramos que a RSM não manifestou junto de qualquer delas o propósito de abandonar a casa dos pais”.
104º - E ainda, na parte que nos interessa, o Tribunal a quo teve em consideração o depoimento da seguinte testemunha:
- JOB, inspetor da PJ, o qual disse que após a participação do desaparecimento da RSM, a equipa andou toda a trabalhar no caso, recordando-se de ter ido á Escola que era frequentada pela RSM e de falar com as suas colegas, tendo para o efeito sido interrompida uma aula que estava a ser dada pela diretor de turma. Disse que “fomos lá logo nos primeiros trinta dias”. Disse ter a ideia que o “Óscar falou com as amigas mais próximas...penso que eram duas amigas...creio até que uma delas referiu a hipótese da RSM ter ido para Barcelona.”.
105º - E no que concerne especificamente à resposta ao ponto 69 da Base Instrutória, transcrevemos o ponto YY da matéria assente:
“Em 20.11.2006, no seguimento de informação do A., a PJ contactou uma amiga da RSM, SPNP constante do “Relato de Diligência Externa (RDE)”, entre o mais, o seguinte:
“ [...] Face a tal informação contactei de imediato a SPNP, que identifiquei como, SPNP, solteira, 20 anos de idade, residente em Leça, tendo-me esta confirmado que efetivamente 2 ou 3 dias antes do desaparecimento da RSM, esta tivera em Leça uma conversa consigo...”
Cfr. doc. de fls. 192 e 272 dos autos.
(sublinhado nosso).
106º - Ademais, o ponto ZZ da matéria assente desmente igualmente esta teoria da omissão de diligência da PJ no dia anterior ao desaparecimento da RSM:
“Em 30.11.2006 os inspetores da PJ realizaram diligência externa tendo procedido à inquirição de MHVSDL, médica especialista em Psiquiatria que acompanhava a RSM.
Cfr. doc. de fls. 286 e 287 dos autos.”
107º - Assim, deste Relato de Diligência Externa (RDE) resulta claro que a Dra. MHVSDL médica psiquiátrica, esteve com a RSM precisamente no dia anterior ao seu desaparecimento, no seu consultório, durante uma consulta privada, a qual esteva acompanhada pelo seu pai, ora A.
108º - Para além destas duas pessoas devidamente identificadas (SPNP e Dra. MHVSDL) existem outras duas, estas com ligações familiares e de amizade bem mais fortes e intensas do que as amigas da RSM, que estiveram com a mesma no dia anterior ao seu desaparecimento, que são: os pais biológicos da RSM (no qual se inclui o ora A) e com quem especificamente a PJ estabeleceu, de imediato, um diálogo intenso com vista à localização da RSM.
109º - Logo, cai por base toda a argumentação aduzida pelo ora recorrente quanto às respostas aos aludidos pontos 60 e 69 da Base Instrutória.
Por outro lado,
110º - No que concerne às respostas dos pontos 96, 97, 99, 100 e 101 da Base Instrutória, o ora recorrente insurge-se contra o Tribunal a quo por este deixar logo aí plasmado “...uma inadmissível decisão sobre o mérito da ação, em sede de resposta à matéria de facto.”.
111º - Ora, nesta parte, a discordância do ora recorrente LAGM devia ter sido apresentada imediatamente após a leitura das respostas à matéria constante da Base Instrutória, sob a forma de reclamação por deficiência, obscuridade ou contradição da decisão ou contra a falta da sua motivação, nos termos do artigo 653.º, n.º 4 do CPC.
112º - O que o ora recorrente LAGM não fez atempadamente.
113º - Daí, que ao fazer agora, em sede de recurso, fê-lo extemporaneamente, o que se invoca para todos os efeitos legais.
114º - Por isso, deve esta discordância ser desatendida liminarmente, por extemporaneidade.
Acresce que,
115º - Sempre diremos na esteira do que consta na fundamentação das respostas dadas a estes pontos da Base Instrutória pelo Tribunal a quo o seguinte:
“Em face da prova produzida e das regras de experiência de vida o Tribunal não tem qualquer dúvida em como é profunda a dor que o Autor sofreu e continua a sofrer com o desaparecimento da sua filha, continuando na ignorância quanto ao que lhe terá acontecido. O Tribunal também não tem dúvidas, atento o depoimento das testemunhas supra referidas, de que o Autor está convencido que os agentes de investigação que intervieram no processo da sua filha não estavam preparados profissionalmente para a investigação, assim como está convencido que a investigação não foi conduzida, do seu ponto de vista, de forma competente, o que tudo determina a intensificação da dor, da revolta e da frustração que sente.”. (sublinhados nossos).
Por outro lado,
116º - No que concerne à discordância do ora recorrente sobre a matéria de direito, fazemos nossas as judiciosas considerações a esse respeita feitas pelo Tribunal a quo por concordarmos integralmente com as mesmas.
Sendo de realçar que,
117º - O ora recorrente, pese embora repute a atuação da PSP/PJ e do MP de ilícita, não identifica as normas legais, regulamentares, estatutárias ou da praxis de atuação dos órgãos de investigação criminal, que terão sido violadas e, não o faz, porque, de facto, não conseguiu, tal como nós não conseguimos, identificar qualquer norma que tenha sido violada pelos referidos órgãos de investigação criminal.
118º - Do cotejo da factualidade apurada não se vislumbra que a PSP/PJ ou o MP tenham violado as “legis artis” (sic) a que se encontravam obrigados, sequer que não tivessem afetado os meios necessários e adequados ao caso vertente, ou que, noutros casos de desaparecimento os mesmos tivessem atuado de forma diferente da que caracterizou a sua intervenção no processo do desaparecimento da RSM.
119º - Na situação vertente, não pode ignorar-se que para além das diligências realizadas pela PJ foram inúmeras as diligências de investigação encetadas pelo Autor na tentativa de apurar o que se passou com a RSM e qual o seu paradeiro, o qual foi ao ponto de contratar um detetive particular para o ajudar nessa tarefa, tendo o A. dado conhecimento à PJ dos elementos que foi recolhendo e das pistas que lhe iam sendo transmitidas.
120º - E conforme resulta do probatório, foram inúmeras as diligências encetadas pela PJ no âmbito do processo de investigação do desaparecimento da RSM ao longo de todo o ano de 2006 e anos posteriores, verificando-se que ainda hoje continuam a realizar-se diligências na tentativa de se alcançar alguma informação sobre o que terá sucedido à RSM.
121º - Ponderando em toda a factualidade apurada, não vemos que tenha havido uma atuação ilícita da PSP/PJ, violadora do direito que assiste ao recorrente de ser protegido e auxiliado pelos órgãos de investigação criminal na defesa dos seus interesses, in casu, na procura da descoberta do que se passou com a sua filha RSM a partir do momento em que a mesma foi deixada em M..., no dia 17.02.2006, pelas 09 horas para apanhar transporte público com destino a uma viagem de estudo ao Museu de Serralves.
122º - Não resulta dos autos, a nosso ver, que os OPC’s e o MP não tenham procedido às diligências adequadas ao esclarecimento da situação relativa ao desaparecimento da RSM ou que não tenham recolhido os elementos probatórios exigíveis, sequer que tenham sido violados os princípios da adequação, da oportunidade e da proporcionalidade na utilização dos meios que tinham ao seu dispor.
123º - A circunstância de a partir de 2009 terem sido iniciadas nova diligências e de, por exemplo, as amigas da RSM terem sido ouvidas formalmente, em nada colide com a conclusão que supra afirmámos a propósito da atuação da PJ e do MP nos primeiros meses que seguiram ao desaparecimento da RSM.
124º - Aliás, com o decurso do tempo e ante a não obtenção de qualquer informação sobre o paradeiro da RSM, é perfeitamente compreensível que as autoridades de investigação procurem fechar todas as portas em termos de investigação, e que, nesse desiderato, procedam à realização de novas diligências e à sua formalização e também para que haja registo que permita aos investigadores que se forem sucedendo no tempo, o conhecimento do que foi já efetuado no âmbito do respetivo processo de inquérito.
125º - A presente ação vem proposta, com vista à efetivação da responsabilidade civil extracontratual, com base em ato ilícito por parte do Estado português.
126º - Para que a responsabilidade civil do Estado por atos ilícitos de gestão pública, prevista no artigo 2°, do Decreto-Lei n° 48.051, de 21.11.67, se verifique, é necessário a ocorrência cumulativa dos seguintes pressupostos ou requisitos: ato ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade entre o facto (ilícito e culposo) e o dano verificado.
127º - Ato ilícito é o ato (ativo ou omissivo) que viola as normas legais ou regulamentares ou os princípios gerais do direito aplicáveis e os atos materiais que infrinjam essas normas e princípios ou ainda os de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração (artigo 6°, do mesmo diploma).
128º - A culpa é o nexo de imputação ético — jurídica que liga o facto à vontade do agente e envolve um juízo de censura, apreciado em concreto, face à ação ou omissão, segundo a diligência de um bom pai de família (artigo 4°, n°1, do mesmo D.L. 48.051 e artigo 487°, do Código Civil).
Ora,
129º - No presente caso, decorre da própria falta de alegação do ora recorrente, quando o mesmo é omisso na invocação de violação de lei, estatuto policial ou regulamento concreto, pelo que não estão preenchidos nenhum dos requisitos da responsabilidade civil.
Na verdade,
130º - A lei aplicável ao caso concreto é o Decreto-Lei n.º 48.051 de 21 de novembro de 1967 e não a Lei n.º67/2007, de 31 de dezembro, a qual só entrou em vigor em 30 de janeiro de 2008 (artigo 6º do preâmbulo).
Ora,
131º - Os factos reportam-se a 17 de Fevereiro de 2006 (data do desaparecimento da RSM) e nos dias imediatos (a quem o ora recorrente imputa as falhas da investigação), mas anteriores a 30 de janeiro de 2008.
Logo,
132º - Ao contrário do que alga o ora recorrente a legislação aplicável in casu é o Decreto-Lei n.º 48.051 de 21 de novembro de 1967.
Em conclusão,
133º - Da prova produzida em audiência de julgamento e da demais elementos existente nos autos, não ocorreu da parte do Tribunal a quo qualquer erro de julgamento sobre a matéria de facto.
E,
134º - Muito menos ocorreu erro de julgamento de direito, em face da matéria de facto estar correta e adequadamente enquadrada na lei.


***

2. Factos

2.1. Sem prejuízo de o Recorrente ter impugnado a decisão relativa à matéria de facto, nos termos a seguir apreciados, importa desde já elencar os factos dados como assentes pela sentença recorrida:

A) O A. é pai de RSM. – cfr. doc. a fls. 80 dos autos.

A1) A RSM nasceu em 24 de Julho de 1987 – cfr.doc. de fls. 37 dos autos.

B) No dia 18.2.2006, pelas 11.41 horas, a mãe da RSM, MWS, participou o seu desaparecimento à Polícia de Segurança Pública – Divisão Policial de M... – Esquadra de M..., participação essa à qual foi atribuído o NPP 42465/2006. – cfr. doc. de fls. 123 dos autos.

C) Da participação referida no ponto B) consta, entre o mais, o seguinte: Por à hora e data mencionados, ter deixado a sua filha, a qual já tem 18 anos e sofre de problema do foro psíquico, para se encontrar com os seus colegas, pois neste dia tinham uma visita de estudo à Fundação de Serralves, foi questionado aos seus colegas se esta teria comparecido na alegada visita, foi confirmado por estes que ela não tinha chegado a ir à visita de estudo nem sequer tinha estado em contacto com nenhum dos seus colegas de escola. A RSM dispõe de uma conta bancária, da qual tem consigo um cartão Multibanco, não tendo até ao momento efectuado nenhum levantamento. Na altura do desaparecimento, vestia calça de ganga azul escuro, um casaco preto de bombazina, e botas castanhas de salto alto, e era portadora de uma carteira de mão de cor verde, na qual continha além da sua identificação, objetos de uso pessoal.” – cfr. doc. de fls. 123 dos autos.

D) No dia 18.2.2006, a Polícia de Segurança Pública – Divisão Policial de M... – Esquadra de M... elaborou e enviou por fax a “Proposta de Indicação” para o Gabinete Nacional Sirene. – cfr. docs. de fls. 124 e 128 dos autos.

E) Na mesma data a Polícia de Segurança Pública – Divisão Policial de M... – Esquadra de M... elaborou a Ficha de Difusão relativa ao desaparecimento de adulto com perturbações mentais e procedeu à sua difusão e da participação referida nos pontos B) e C) pelas autoridades policiais. – cfr. doc. de fls. 125, 127, 129 dos autos.

F) No dia 18.2.2006, pelas 14.27 horas, o A. deslocou-se às instalações da Polícia Judiciária do Porto, constando, entre o mais, da Informação de Serviço elaborada: “[…] comunicando o desaparecimento de sua filha RSM, […] ocorrido no dia de ontem pelas 09H00, altura em que a mesma saiu da residência para se encontrar com os colegas, junto ao Mercado de M..., o que não chegou a acontecer. Na altura do desaparecimento a RSM era portadora de todos os seus documentos identificativos, bem como do seu cartão multibanco, verificando-se que ao longo do dia não foram efectuados quaisquer movimentos na conta bancária a que o mesmo respeita. Levou apenas a roupa que na altura vestia.
Desde então, a família tem efectuado diversas diligências junto de restantes familiares e amigos, tendo em vista a localização da RSM, diligências essas que até ao momento resultaram negativas.
Têm sido efectuadas diversas tentativas de contacto telefónico através do número 9...536, por ela utilizado, verificando-se que embora as chamadas sejam recebidas, não são atendidas. Pese embora o elevado número de SMS’s enviado, verifica-se que o espaço de memória do telemóvel para mensagens não se encontra esgotado, tudo levando a crer que as mesmas estão a ser recebidas e posteriormente apagadas.
Esclareceu que a sua filha tem vindo a sofrer de diversas perturbações de carácter neurológico e psíquico, que lhe provocam episódios de alheamento da realidade.
Tais factos foram já participados no dia de hoje na P.S.P. de M....” – cfr. doc. de fls. 130 a 133.

G) Na deslocação referida em F) o A. manifestou ao inspetor a sua ansiedade e medo de se estar a perder a possibilidade de localizar a RSM através do sinal do seu telemóvel. – facto admitido por acordo das partes, art.º 42.º da p.i. e 1.º da contestação.

H) No dia 19.2.2006 o A. deslocou-se, novamente, à Polícia Judiciária, constando da Informação de Serviço elaborada que referiu que a filha sofria de perturbações mentais e que já esteve internada no Hospital de Magalhães Lemos e que no dia anterior “a RSM foi vista por um lixeiro na companhia de um jovem, provavelmente da mesma idade, no parque da cidade, entre a doca de Leixões e a doca de Leça”, que “desde as 16:00 do dia de ontem deixou de ser possível contactar a RSM através do telemóvel, sendo agora apenas perceptível a mensagem de que o telemóvel está desligado. A RSM desde que saiu de casa não efetuou qualquer movimento com o cartão de débito (...). (...) a RSM está sem medicação desde sexta-feira, constituindo este facto um perigo para o equilíbrio mental da mesma”. – cfr. doc. de fls. 134 dos autos.

I) Na deslocação referida em H) o A. juntou um email da médica psiquiatra que vinha assistindo a RSM, MHVSDL, datado de 19.2.2006 e do qual consta que declara que a RSM sofre de perturbações mentais que podem fazer perigar a gestão da sua pessoa e bens. – cfr. doc. de fls. 135 dos autos, art. 90.º da contestação.

J) As informações de serviço elaboradas no Serviço de Piquete em 18.2.2006 e 19.2.2006, referidas em F) e H), foram remetidas à Secção Regional de Informação Criminal e Polícia Técnica. – docs. de fls. 132 e 134 dos autos.

K) Em 21.2.2006 a Polícia Judiciária solicitou aos Serviços do Ministério Público de Vila Nova de Gaia que promovesse as diligências necessárias à localização do telemóvel da RSM. – cfr. doc. 136 dos autos.

L) O pedido referido em K) foi concretizado junto da operadora “Optimus” pelos Serviços do Ministério Público. – facto admitido por acordo cf. art. 45.º da p.i. e 1.º e 21.º da contestação.

M) O Ministério Público, aquando do pedido referido em K), não estava na posse do IMEI. – facto admitido por acordo, art. 24.º da contestação.

N) O pedido referido em K) não teve cobertura de uma decisão judicial, emitida por um Juiz de Instrução Criminal, nem foi acompanhado pelo IMEI do telemóvel. – facto admitido por acordo cf. art. 46.º, art. 22.º da contestação.

O) Na sequência de informação do A., em 22.6.2006, a Polícia Judiciária procedeu a averiguações no sentido de identificar um individuo, MFGR, com quem a RSM teria sido vista e, bem assim, deslocou-se à sua residência, procedendo a contactos com este, a sua companheira e vizinhos. - cfr. Informação de Serviço a fls. 154 e 155 dos autos.

P) Em 22.2.2006 a Guarda Nacional República deslocou-se à residência de CFSC, tendo inquirido esta relativamente às informações que disse ter acerca da RSM. – cfr. Auto de Ocorrência n.º 31/06 a fls. 156 dos autos

Q) Por ofício com data de entrada no Tribunal de Instrução Criminal do Porto de 24.2.2006 e hora de recepção via fax 16:29, a “Optimus” informou nos autos que corriam no Tribunal de Instrução Criminal do Porto – 3.º Juízo sob o número 1027/06.4TAVNG que “apenas temos registo de uma chamada efectuada com identificação da localização no dia 17 às 09:02:19, sendo que, todas as outras chamadas existentes posteriormente foram feitas para o Voice Mail isto porque o telemóvel estava desligado ou sem rede”. – cfr. doc. a fls 137 dos autos.

R) A Policia Judiciária remeteu, às 18:29 h do dia 24.2.2006, fax ao Juiz de Direito do Tribunal de Instrução Criminal do Porto – 3.º Juízo, com a indicação do IMEI do telemóvel da RSM. – cfr. doc. de fls. 145 dos autos.

S) Na mesma data pelas 18.35h foi proferido despacho pela Juiz titular do processo referido em P) e formulado pedido à Optimus solicitando a intercepção por um período de 90 dias ao IMEI 354311009782197, onde constem as chamadas efectuadas e recebidas (trace back) e, ainda, “informação sobre quais os cartões que operam no referido IMEI, a identificação dos respectivos titulares, a faturação detalhada de onde constem as chamadas efectuadas e recebidas (trace back)”. – cfr. doc. de fls. 146 a 149 dos autos.

T) Foram formulados pedidos iguais ao referido em S) à “TMN” e “Vodafone”. – cfr. doc. de fls 151 e 153.

U) Em 25.2.2006 a “Optimus” informou nos autos que corriam no Tribunal de Instrução Criminal do Porto – 3.º Juízo sob o número 1027/06.4TAVNG, entre o mais, que a 18 de Fevereiro às 14:46, o SIM deixou de ter cobertura Optimus, não respondendo aos pedidos da rede. Isso acontece, por exemplo, nas seguintes situações: SIM perde repentinamente a cobertura ou é retirada a bateria do telemóvel.
Mais informamos que o código da Cell Id 495 referido no quadro anexo, identifica que a antena está inserida no concelho de M... e garante cobertura nas freguesias de LAVRA, AVELEDA E VILA NOVA DA TELHA.
Dentro destas freguesias, a célula em questão é provável de garantir cobertura nas seguintes localidades;
Cruz de Paranhos (bastante provável)
Cabanelas (bastante provável)
Avilhos (bastante provável)
Gandra (bastante provável)
Antela (bastante provável)
Paico (bastante provável)
Agudela (medianamente provável)
Angeiras (medianamente provável)
Aveleda (medianamente provável)
Corgo (medianamente provável)
Lavra (medianamente provável)
Pampelido Novo (medianamente provável)
Vilar do Senhor (medianamente provável)”
- cfr. doc. de fls. 138 e 139, 252 e 253 dos autos.
V) Com o ofício referido em U) a Optimus remeteu listagem que descreve a actividade do telemóvel da RSM no dia 18 de Fevereiro de 2006. – cfr. doc. de fls. 140 e 141 dos autos.
W)Por ofício datado de 1.3.2006 a “Optimus” informou nos autos que corriam no Tribunal de Instrução Criminal do Porto – 3.º Juízo sob o número 1027/06.4TAVNG, entre o mais, que “A célula cujo cellid 5F34 corresponde à estação VILA-NOVA-DA-TELHA-2 que garante cobertura nas freguesias de VILA NOVA DA TELHA e MOREIRA.
Dentro destas freguesias, a célula em questão é provável de garantir cobertura nas seguintes localidades;
Pedras Rubras (bastante provável)
Aldeia (bastante provável)
Barreiro (bastante provável)
Matos (medianamente provável)
Paico (medianamente provável)
A célula cujo cellid 6895 corresponde à estação AEROPORTO_IC24_RELOC_3 que garante cobertura nas freguesias de SANTA CRUZ DO BISPO e PERAFITA.
Dentro destas freguesias, a célula em questão é provável garantir cobertura nas seguintes localidades: Padrão (bastante provável)
Gandra (bastante provável)”
- cfr. doc. de fls. 142 a 143, 254 e 255 dos autos.

X) O aeroporto Internacional Francisco Sá Carneiro situa-se em Pedras Rubras. – facto notório e do conhecimento público.

Y) Não foi ordenada a inquirição dos funcionários do aeroporto de serviço no dia 18 de Fevereiro de 2006, pelas 14.00 horas. – facto admitido por acordo, art.º 74.º da p.i. e art.º 61 da contestação. Z) Era do conhecimento das entidades de investigação que a mãe da RSM é de nacionalidade holandesa e a RSM tem dupla nacionalidade (portuguesa e holandesa). – facto admitido por acordo, art. 71.º da p.i. e 1.º da contestação.

AA) A Polícia Judiciária quis visionar as imagens da RSM das câmaras dos autocarros n.º 3184 e 3166, tendo em 24.2.2006 solicitado esse visionamento à Administração dos Serviços de Transportes Colectivos do Porto, S.A.. – cfr. facto admitido por acordo, art. 80.º da p.i. e 1.º da contestação, e doc. de fls. 195 dos autos.

BB) Em 24.2.2006 os Inspetores da Polícia Judiciária efetuaram diligência externa, a qual ficou descrita no Relato de Diligência Externa, aos Serviços de Transportes Colectivos do Porto, S.A., onde foram visionados e recolhidos os vídeos obtidos através de câmaras instaladas em dois autocarros. - cfr. doc. de fls. 196 e 202 dos autos.

CC) Em 27.2.2006 a Polícia Judiciária solicitou informações aos Institutos de Medicina Legal de Lisboa, Porto e Coimbra, no sentido de apurar se o cadáver da RSM ali tinha dado entrada. – cfr. docs. de fls. 203 a 205.

DD) Em 3.3.2006 a Polícia Judiciária solicitou informações ao Hospital Geral de Santo António, Hospital de São João e Hospital Pedro Hispano, no sentido de apurar se a RSM tinha dado entrada naqueles serviços. – cfr. docs. de fls. 206 a 208.

EE) Em 15.3.2006 a Polícia Judiciária contactou telefonicamente RM, que em 23.2.2006 se tinha dirigido ao agente da PSP em serviço de patrulha na Estação Ferroviária de Campanhã comunicando ter reconhecido a RSM naquele dia pelas 3 horas nas imediações do Casino de Espinho, e que informou ter havido confusão na identificação da RSM. – cfr. doc. cota ao aditamento ao NPP 42465/2006 a fls. 157 dos autos.

FF) Em 17.3.2006, na sequência de contacto telefónico via 112 efectuado pelo Chefe-Principal A… do Regimento de Sapadores Bombeiros Av. D. Carlos I, o inspetor da Polícia Judiciária contactou o Chefe – Principal Alves que reportou as circunstâncias em que reconheceu a RSM. - cfr. Informação de Serviço a fls. 159 e 160 dos autos.

GG) Na mesma data o inspetor da Policia Judiciária contactou o A., que referiu não ter pistas sobre o paradeiro da filha. - cfr. Informação de Serviço a fls. 159 e 160 dos autos.

HH) O A. falou com as funcionárias do Café I..., perto da paragem de autocarro junto ao Mercado Municipal de M..., e onde a RSM esteve no dia 17.2.2006, a quem mostrou fotografias da RSM e que se lembravam de ela lá ter estado no dia e hora em causa. – facto admitido por acordo, arts. 86.º e 87.º da p.i. e 1.º da contestação.

II) O A. transmitiu a informação referida no ponto HH) aos agentes da investigação. – facto admitido por acordo, art. 88.º da p.i. e 1.º da contestação.

JJ) As entidades investigadoras não falaram com as funcionárias do “Café I...”. - facto admitido por acordo, art. 92.º da p.i. e 1.º da contestação.

KK) O A. entregou aos agentes de investigação uma fotografia, captada às 9:24 horas pela câmara de vigilância de um autocarro, por nela ser visível a RSM acompanhada por uma desconhecida. – facto admitido por acordo, arts. 93.º e 94.º da p.i. e 1.º da contestação.

LL) As entidades investigadoras não ordenaram o visionamento das imagens das câmaras de vigilância dos autocarros e composições de metro que tivesse permanecido, passado ou partido da zona do Mercado Municipal de M... posteriormente ao autocarro n.º 3166 e depois das 9:30 horas. – facto admitido por acordo, art. 91.º, 95.º, 2.ª parte da p.i. e 1.º da contestação.

MM) Não foram realizadas diligências no sentido de identificar a desconhecida referida em AA). – facto admitido por acordo, art. 95.º, 2.ª parte da p.i. e 1.º da contestação.

NN) Em 20.3.2006 o A. apresentou no Tribunal Judicial de M... requerimento de internamento compulsivo da sua filha, RSM. – cfr. doc. de fls. 38 a 41 dos autos.

OO) O Ministério Público não promoveu a emissão de mandados de detenção por falta de comparência da RSM à junta médica no âmbito do processo de internamento compulsivo que corria termos do 3.º Juízo de Competência Criminal de M... sob n.º 3512/06.9TBMTS. – cfr. facto admitido por acordo das partes, cf. artigo 129.º da petição inicial e 1.º da contestação.

PP) Na sequência de comunicação telefónica anónima, a Guarda Nacional Republicana – Posto Territorial de E..., procedeu em 5.4.2006 a busca domiciliária, no sentido de averiguar se a RSM se encontrava a residir na Rua 27 de Maio, n.º 1, R/C Norte, E.... – cfr. doc. de fls. 161 e 162, 194 dos autos.

QQ) Em 12.4.2006 o A. informou a Polícia Judiciária de que a RSM se poderia encontrar em casa de FNPD, no Bairro do L..., bloco 13, ent. 57, casa 31, P…. – facto admitido por acordo, art. 116.º da p.i. e 1.º da contestação.

RR) Nesse mesmo dia, deslocaram-se à habitação referida em QQ) quatro agentes da Policia Judiciária, para averiguar da veracidade da informação. – facto admitido por acordo, art. 95.º, 2.ª parte da p.i. e 1.º da contestação.

SS) A busca à residência referida em QQ) foi autorizada por despacho judicial proferido em 12.4.2006 e cuja cópia foi certificada em 13.4.2006. - cfr. doc. de fls. 285 dos autos.

TT) A busca à residência referida em QQ) foi realizada em 28.4.2006. – doc. de fls. 193 dos autos.

UU) Em 3.6.2006, na sequência de informação transmitida pelo A. de que a filha teria sido vista na zona da Sé do P..., os inspetores da Polícia Judiciária percorreram diversas artérias daquela freguesia e concluíram tratar-se de pessoa distinta da RSM. – cfr. Informação de Serviço a fls. 163 dos autos.

VV) Na sequência de participação apresentada em 13.6.2006 por DCVS que informou ter visto a RSM nas instalações da Segurança Social de Faro, a Polícia Judiciária em 27.6.2006 e em 28.8.2006 contactou a informante para obter informações relativamente ao paradeiro da RSM. – cfr. doc. de fls. 164 a 181 dos autos.

WW) Em 28.8.2006 a Policia Judiciária realizou diligência externa junto dos serviços da Segurança Social de Faro no sentido de, junto dos funcionários, recolher informações relativas ao paradeiro da RSM. – cfr. doc. de fls. 182 e ss. dos autos.

XX) Na sequência de contacto telefónico de Paula Cristina Morais referindo ter informações sobre o paradeiro da RSM em 17.10.2006, a Policia Judiciária realizou diligência externa no sentido de recolher mais informações junto desta informante relativas ao desaparecimento da RSM. – cfr. docs. de fls. 188 e ss. dos autos.

YY) Em 20.11.2006, no seguimento de informação do A., a Polícia Judiciária contactou uma amiga da RSM, SPNP, constando do “Relato de diligência externa”, entre o mais, o seguinte:
[...] Face a tal informação contactei de imediato a SPNP, que identifiquei como SPNP, SOLTEIRA, 20 ANOS DE IDADE, RESIDENTE EM Leça, tendo-me esta confirmado que efetivamente 2 ou 3 dias antes do desaparecimento da RSM esta tivera, em Leça, uma conversa consigo acerca do programa Erasmus, sendo que então a RSM lhe disse que estava até a pensar “ir pelo mundo forma, sem destino” (sic) convidando-a a acompanha-la. --- A SPNP disse-lhe que se fosse para estudarem no âmbito do Erasmus tudo bem, mas noutras circunstâncias não estava disponível para a acompanhar. --- Recorda que a RSM lhe tinha falado com alguma simpatia da cidade de Barcelona como sendo a que mais lhe agradava. --- Certo é que depois desta conversa apenas falou mais uma vez com ela, ao telefone, pensa que um ou dois dias antes do desaparecimento da RSM que lhe ligou perguntando se a SPNP estava disponível para conversarem um pouco, só que a SPNP estava ocupada e disse-lhe que aquele não era o melhor momento, ficando de falaram mais tarde, o que nunca chegou a acontecer. […]”
- cfr. doc. de fls. 192 e 272 dos autos.

ZZ) Em 30.11.2006 os inspetores da Policia Judiciária realizaram diligência externa tendo procedido à inquirição de MHVSDL, médica especialista em Psiquiatra que acompanhava a RSM. – cfr. doc. de fls. 286 e 287 dos autos.

AAA) O inspetor da Polícia Judiciária consignou em cota, em 12.3.2007, que “tendo contactado várias amigas da RSM, nomeadamente a por muitos considerada a sua melhor amiga AIS, solteira, atualmente a estudar na Universidade de Guimarães (contactável pelo n.º 93449332) apuramos que a RSM não manifestou junto de qualquer elas o propósito de abandonar a casa dos pais”. – cfr. doc. de fls. 275 dos autos.

BBB) Em 1.6.2007 A. apresentou requerimento no âmbito do processo referido em NN), para emissão de mandatos de captura nacionais e internacionais, com vista à condução da RSM a uma junta médica para concretização do seu internamento compulsivo. – cfr. doc. de fls. 85 e ss. dos autos.

CCC) Na sequência do requerimento referido em NN) foi ordenada em 28.6.2007, pelo Juiz titular do processo, a emissão de mandado de detenção e conclusão a estabelecimento hospitalar psiquiátrico, a difundir a nível nacional, através dos comandos da PSP, GNR e PJ e indeferida a emissão de mandado de captura internacional. – cfr. doc. de fls. 88 dos autos.

DDD) Consta de “Listagem das Chamadas Efectuadas n.º 9...536”, da operadora “Optimus”, relativa aos dias 14.02.2006 a 18.02.2006, entre o mais, que no dia 17.02.20006, pelas 09:16:19, chamada com origem no número 3519...536 e destino 3519...557, com duração de 13 segundos.EEE) Em cota datada de 30.11.2007 no verso da listagem referida no ponto anterior consta “A última chamada efectuada pela RSM, no dia do seu desaparecimento, foi para uma colega de turma, JM, a fim de saber onde estavam para se juntar à turma a fim de irem em visita de estudo para a Casa de Serralves. Nada de estranho foi notado pela JM, no comportamento da RSM, Desde este telefonema não voltou a falar com a RSM” – cfr. doc. de fls. 257 e 258 dos autos.

FFF) Consta do Relatório datado de 22.10.2008, elaborado pelo inspetor da Polícia Judiciária e dirigido à Coordenadora de Investigação Criminal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o relato e descrição de todas as diligências levadas a cabo pelas autoridades policiais no âmbito do Inq. n.º 1027/06.4TAVNG relativo ao desaparecimento da RSM, incluindo as referidas nos pontos anteriores, e entre outras, as diligências realizadas junto das operadoras de telemóvel, a investigação da possibilidade de a RSM se encontrar na casa de um individuo, solicitação de informação aos Institutos de Medicina Legal e Hospitais do Grande P..., o visionamento das imagens dos STCP, buscas domiciliárias realizadas, diligências e contactos levados a cabo após diferentes denúncias, contactos com as médicas que acompanhavam a RSM, deslocação à escola da RSM e contactos com os colegas de turma e amigas, designadamente SPNP e AIS, contactos com as autoridades espanholas e de Cabo Verde, diligências em Lisboa, Aveiro, M.... – cfr. doc. de fls. 209 e ss. dos autos.

FFF.1) Em 13.3.2009 foi decidido atribuir carácter urgente aos autos de inquérito – cfr.doc. de fls. 435 a 437 dos autos.

GGG) Em 16.4.2009 o A. foi inquirido pela a Polícia Judiciária, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 288 e ss. dos autos.

HHH) Em 27.4.2009, VSM, irmão da RSM, foi inquirido pela Polícia Judiciária, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 307 e ss. dos autos.

III) Em 5.5.2009, MWS, mãe da RSM, foi inquirida pela Polícia Judiciária, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 313 e ss. dos autos.

JJJ) O quarto da RSM foi inspeccionado pela Polícia Judiciária em 5.5.2009. – cfr. doc. de fls. 297 e ss. dos autos.

KKK) O companheiro da mãe da RSM, de nacionalidade inglesa, que com elas vivia, não foi investigado, nem ouvido. -– facto admitido por acordo, cf. art. 144.º da p.i. e 1.º da contestação.

LLL) Em 7.5.2009, Emília Maria Gomes Tiago Simões Dias, diretora de turma da RSM na Escola Secundária da Boa Nova em Leça da Palmeira, foi inquirida pela Policia Judiciária, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 311 e ss. dos autos.

MMM) Em 8.5.2009 a Polícia Judiciária inquiriu Ângela Patrícia Pereira de Carvalho Ferreira, que afirmou ter reconhecido a RSM e descreveu as circunstâncias em que tal ocorreu, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 311 e ss. dos autos.

NNN) Em 8.5.2009 a Policia Judiciária inquiriu Zélia Maria Teixeira Brandão Figueiredo, médica psiquiatra que efetuou consultas à RSM, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 328 e ss. dos autos.

OOO) Em 13.5.2009 a Polícia Judiciária procedeu à inquirição de Paula Alexandra Ferreira Mendes, empregada doméstica da mãe da RSM, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 332 e ss. dos autos.

PPP) Em 26.5.2009 a inspetora da Polícia Judiciária elaborou relatório, dirigido à Coordenadora de Investigação Criminal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de onde consta o relato e descrição das diligências levadas a cabo pelas autoridades policiais – incluindo as referidas nos pontos anteriores e, entre outras, as inquirições ao pai, mãe e irmão da RSM, diretora de turma, psiquiatra, empregada doméstica, busca no quarto da RSM, no seu computador e recolhas de vestígios, pedido de colaboração a autoridades espanholas, francesas e holandesas, diligências tendentes à localização do telemóvel da RSM, diligências relativas a denúncias – e bem assim, sugerindo a realização de outras diligências – recolha de elementos e informações junto das operadoras de telemóveis e de televisão – no âmbito do Inq. n.º 1027/06.4TAVNG relativo ao desaparecimento da RSM. – cfr. doc. de fls. 219 e ss. dos autos.

QQQ) Na sequência de pedido de auxílio judiciário de 25.6.2009 pelo Ministério Público relativamente ao desaparecimento da RSM, as autoridades holandesas informaram, entre o mais, que: “- Não foi emitida uma Requisição de Fornecimento de Dados Históricos sobre Tráfego de Comunicações pelo Procurador dado que não existe suspeita de que a desaparecida tenha sido vítima de um ato punível. Além disso, não se pôde deduzir de nenhuma forma de que o mencionado número EMEI esteja ou tenha estado ativo nos Países Baixos.
- Não se pôde deduzir que existam meios de comunicação registados em nome da desaparecida.
- Presentemente já não é possível verificar a partir de que número de telefone se efetuou em 15 de Abril de 2006 uma chamada para ao número de telefone da avó da pessoa desaparecida. [...] – cfr. docs. de fls. 279 e ss. dos autos.

QQQ.1) Em 26.6.2009 foram expedidas cartas precatórias para as autoridades de Espanha, França e Holanda, pedindo a localização da RSM – cfr. doc. de fls. 424 a 434 dos autos.

RRR) Em 24.8.2009 a Polícia Judiciária realizou a inquirição de Rui Pedro Costa Roque dos Santos, colaborador da Sonaecom, constando do seu auto de inquirição entre o mais: “[...] as chamadas efectuadas a partir do dia 17/02/2006, pelas 26H10, foram todas elas encaminhadas para o voice-mail do nº 9...536. [...] Os dígitos !1,3,4” logo a seguir ao prefixo “35193” significa que alguém lhe tentou ligar, tendo sido imediatamente conduzido para o seu voice-mail. Tal listagem não dispõe de elementos suficientes que permitam concluir se o telemóvel, nesta altura, se encontrava ligado ou desligado. Quanto à chamada efectuada no dia 17/02/2006, pelas 09H02 e mencionada no ofício de fls. 34, não coincidir em termos de hora, com a primeira chamada efectuada nesse dia e constante de fls. 420, revelando uma discrepância de 14 minutos, esclarece que a informação fornecida através do ofício de fls. 34, dirá apenas respeito a uma sinalização, não tendo existido naquele momento chamada alguma, como por lapso, ali se refere. [...]”– cfr. doc. de fls. 254 e 255 dos autos.

SSS) Consta do Relatório Intercalar datado de 30.12.2009, elaborado pela inspetora da Polícia Judiciária, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o relato e descrição de todas as diligências levadas a cabo pelas autoridades policiais, a metodologia utilizada e conclusões alcançadas e, bem assim, sugerindo a realização de outras diligências no âmbito do Inq. n.º 1027/06.4TAVNG relativo ao desaparecimento da RSM. – cfr. doc. de fls. 227 e ss. dos autos.

TTT) Em 21.10.2009 a Polícia Judiciária procedeu à inquirição de Sofia Raquel de Sousa Azevedo, colega de ballet da RSM, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 336 e ss. dos autos.

UUU) Em 22.10.2009 a Polícia Judiciária inquiriu Martina Pedrosa Dias de Almeida e Vânia Patrícia Pinto Silva, colegas de turma da RSM, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo dos respectivos autos de inquirição. – cfr. doc. de fls. 336 e ss. dos autos.

VVV) Em 23.10.2009, Ricardo Luís da Conceição Silva, namorado de SPNP, foi inquirido pela Polícia Judiciária, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 344 e ss. dos autos.

WWW) Em 23.10.2009 a Polícia Judiciária inquiriu AIS de Sousa Martins, amiga da RSM, cujo teor do auto de inquirição aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. doc. de fls. 276 e 277 dos autos.

XXX) Em 4.11.2009 a Polícia Judiciária inquiriu Carla Marina Moreira da Rocha, utilizadora do telemóvel 933954145, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 349 e ss. dos autos.

YYY) Em 4.11.2009 a Polícia Judiciária realizou a inquirição de Rosa Manuela Quelhas da Cruz Martins Ferreira, médica psiquiátrica que acompanhou a RSM, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 353 e ss. dos autos.

ZZZ) Em 9.11.2009, SPNP, amiga da RSM, foi inquirida pela Polícia Judiciária, dando-se aqui por integralmente reproduzido o conteúdo do respectivo auto de inquirição. – cfr. doc. de fls. 358 e ss. dos autos.

AAAA) Em 28.5.2009 foi criada a Ficha de Pessoa Procurada, Informação Interpol e Informação Schengen, relativa à RSM. – cfr. doc. de fls. 361 e ss. dos autos.

AAAA.1) Em 25.02.2010 a Polícia Judiciária pediu ao Instituto de Meteorologia, IP, informação sobre o estado do tempo e do mar no dia 17.2.2006 e no dia seguinte – cfr. doc. de fls. 438 a 441 dos autos.

BBBB) Em 6.4.2010 a Polícia Judiciária inquiriu JGPRP, investigador particular que prestou serviços para o A., cujo auto de inquirição aqui se dá por integralmente reproduzido, tendo descrito as diligências por si efectuadas e disponibilizando um “Relatório de contactos” e e-mail enviado pelo pai da RSM que se encontra junto ao Auto de Inquirição. – cfr. doc. de fls. 259 e ss. dos autos.

CCCC) Consta, entre o mais, do e-mail referido no ponto anterior, enviado em 28.3.2006 pelo A. a JGPRP, que “[…] Por verificação dos horários e pela presença nos vídeos, as colegas (5 raparigas) encontravam-se no mesmo local mas, aparte um telefonema que receberam da RSM a perguntar onde elas se encontravam e que dentro em pouco se iria encontrar com elas, nunca se chegaram a encontrar, mas há confirmação por parte de uma colega que a viu dirigir-se ao café (por volta das 9h15m).[…] Para além dos vídeos de segurança dos autocarros da STCP há também vídeos de segurança do aeroporto Pedras Rubras para o período de Sábado dia 18/02 entre as 12h e as 18h que tem 2 pessoas parecidas com a RSM e que vou tentar junto de um especialista verificar sem margem para dúvidas se essas pessoas são ou não a minha filha. A Judiciária já entrevistou as colegas da RSM […]. A Judiciária só na última semana entrevistou a Ria (Mãe da RSM) […]. Relativamente à informação guardada no computador da RSM ela foi vista pela Judiciária e não houve dados relevantes, mas e apesar disto não fiquei com a impressão que foi corretamente e exaustivamente checkada […]. Foram seguidas várias pistas por informações anónimas, mas revelaram-se falsas, […]. - cfr. doc. de fls. 267 e ss.

DDDD) Em 26.5.2010 a Metro do Porto, S.A. informou os Serviços do Ministério Público do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que “os veículos que operavam na Rede do Sistema de Metro Ligeiro da Área Metropolitana do Porto em 2006 (denominados veículos “Eurotram”) não eram, nem são, dotados de sistema de vídeo vigilância.” – cf. doc. de fls. 270 dos autos.

EEEE) O A. é sócio gerente da sociedade comercial por quotas “S... – Logística e Trânsitos, Lda” – cfr. doc. de fls. 413 e 141 dos autos.

FFFF) A partir de 29.11.2006 e até 13.07.2010, o A. dispunha de 15% do capital social da “S... – Logística e Trânsitos, Lda”- cfr. doc. de fls.413 e 141 dos autos.

GGGG) À data do seu desaparecimento a RSM sofria de psicose esquizofrénica grave, apresentando desequilíbrios mentais graves que conduzem a uma imprevisibilidade da sua lógica de raciocínio- resposta dada aos pontos 1.º e 2.º da B.I.;

HHHH) Em consequência da perturbação mental de que padecia - psicose esquizofrénica grave - a RSM esteve internada no Hospital Central Esp. Crianças Maria Pia entre os dias 28/10/2004 a 05/11/2004 e 08/11/2004 a 09/11/2004, tendo ainda estado internada no Hospital Magalhães Lemos, entre os dias 11/10/2005 a 08/11/2005 – resposta dada ao ponto 3.º da B.I.;

IIII) À data do desaparecimento a RSM encontrava-se em tratamento ambulatório - resposta dada ao ponto 4.º da B.I.;.

JJJJ) Aquando do desaparecimento da RSM a doença de que padecia reclamava uma «vigilância continuada, uma monitorização das suas atividades e uma toma regular da medicação prescrita»- resposta dada ao ponto 5.º da B.I.;

KKKK) Em face dos problemas do foro psíquico da RSM o A. e a mãe da RSM não providenciaram pela interdição ou inabilitação da RSM- resposta dada ao ponto 6.º da B.I.; LLLL) No dia 17.02.2006, cerca das 9 horas, estava previsto a RSM deslocar-se, na companhia de colegas e inserida em visita de estudo, à Fundação Serralves, no P... – resposta dada aos pontos 7.º e 8.º da B.I.;

MMMM) No dia 17.2.2006 a mãe da RSM, MWS, conduziu-a até perto da zona do mercado de M... - resposta dada ao ponto 9.º da B.I.;

NNNN)... onde a deixou cerca das 9 horas - resposta dada ao ponto 10.º da B.I.;

OOOO)... para que a RSM se deslocasse à Fundação de Serralves, usando o autocarro dos Serviços dos Transportes Colectivos do Porto - resposta dada ao ponto 11.º da B.I.;

PPPP) Desde a altura dos factos referidos em 9) e 10) a RSM desapareceu - resposta dada ao ponto 12.º da B.I.;

QQQQ)... não mais tendo sido vista até aos dias de hoje - resposta dada ao ponto 13.º da B.I.;

RRRR)... e dela ninguém tendo notícias - resposta dada ao ponto 14.º da B.I.;

SSSS) No dia 17.2.2006, o A. encontrava-se a caminho de Lisboa, em trabalho - resposta dada ao ponto 15.º da B.I.;

TTTT) No dia 18.2.2006 o A. chegou de Lisboa a M... à hora de almoço - resposta dada ao ponto 16.º da B.I.;

UUUU) E deslocou-se, de imediato, à esquadra da Polícia de Segurança Pública de M... - resposta dada ao ponto 17.º da B.I.;

VVVV) Na esquadra da PSP de M... foi-lhe transmitido pelos agentes do piquete que tudo o que poderia ser feito para encontrar até àquele momento já tinha sido feito - resposta dada ao ponto 18.º da B.I.;

WWWW)... nomeadamente, de que tinha sido distribuída uma fotografia da RSM por todas as viaturas da PSP de modo a que os respectivos agentes a tentassem avistar - resposta dada ao ponto 19.º da B.I.;

XXXX) Quando desapareceu a RSM era portadora de um telemóvel - resposta dada ao ponto 20.º da B.I.;

YYYY) O telemóvel de que a RSM era portadora esteve ligado até às 14h46m do dia 18/02/2006 - resposta dada ao ponto 21.º da B.I.;

ZZZZ) O A. sabia que a qualquer momento esse telemóvel se poderia desligar por se esgotar a bateria - resposta dada ao ponto 22.º da B.I.;

AAAAA) O Autor transmitiu aos agentes da Polícia de Segurança Pública com quem falou na deslocação que efetuou à esquadra de M... no dia 18.02.2006, a sua preocupação de que a qualquer momento o telemóvel da RSM se poderia desligar por se esgotar a bateria – resposta dada ao ponto 23.º da B.I.;

BBBBB)... pedindo-lhes que despoletassem o procedimento que permitisse a localização do telemóvel enquanto a bateria não se esgotasse - resposta dada ao ponto 24.º da B.I.;

CCCCC) Os agentes da PSP disseram ao A. que era uma questão que só poderia ser tratada pela Polícia Judiciária - resposta dada ao ponto 25.º da B.I.;

DDDDD)... aconselhando-o a dirigir-se à Polícia Judiciária, se assim o entendesse - resposta dada ao ponto 26.º da B.I.;

EEEEE) A Polícia de Segurança Pública – Esquadra de M... - procedeu à divulgação do desaparecimento da RSM por todos os seus efetivos, incluindo distribuição de fotografias da RSM pelos carros patrulha com informação resumida sobre o caso e afixou em placard a fotografia da desaparecida – resposta dada ao ponto 27.º da B.I.;

FFFFF) Com a ajuda de um amigo o A. obteve o número de telemóvel de um Inspetor da Polícia Judiciária – resposta dada ao ponto 28.º da B.I.;

GGGGG)... a quem imediatamente telefonou, explicando a situação e manifestando o seu enorme receio de o telemóvel da RSM ficar sem bateria, o que impediria a sua localização – resposta dada ao ponto 29.º da B.I.;

HHHHH) Em 18.02.2006, por ser sábado, os tribunais estavam fechados da parte da tarde o que impossibilitava a obtenção da autorização judicial necessária á localização do telemóvel da RSM – resposta dada ao ponto 30.º da B.I.;.

IIIII) Segundo esse inspetor, quando a RSM tivesse fome e frio apareceria - resposta dada ao ponto 31.º da B.I.;

JJJJJ) Na opinião do referido inspetor da Policia Judiciária a RSM acabaria por aparecer dentro de dias - resposta dada ao ponto 32.º da B.I.;

KKKKK) Na deslocação do Autor à Polícia Judiciária, referida em F, foi-lhe respondido que atentas as diligências já efectuadas por si e pela PSP de M..., pelo serviço de piquete da PJ pouco mais poderia ser feito durante o fim de semana - resposta dada ao ponto 30.º da B.I.;

LLLLL) Na deslocação referida em F) da matéria de facto assente o A. foi elucidado, pelo inspetor, sobre a impossibilidade de aceder a dados sobre a localização do telemóvel sem a intervenção das autoridades judiciárias, cujo despacho não seria possível de colher de imediato já que se estava em pleno fim-de-semana - resposta dada ao ponto 34.º da B.I.;

MMMMM) As informações de serviço a que se refere o ponto J) da matéria de facto assente foram distribuídas à Brigada de Prevenção Criminal - resposta dada ao ponto 35.º da B.I.;

NNNNN) O pedido de localização celular do telemóvel da RSM efetuado diretamente pelo Ministério Público de Vila Nova de Gaia à Optimus foi recusado por esta operadora pelo facto de não ter sido acompanhado de uma decisão judicial – resposta dada ao ponto 36.º da B.I.;

OOOOO) O pedido referido em L da matéria de facto assente foi formulado sem o IMEI do telemóvel da RSM por o mesmo não ser do conhecimento dos seus familiares nem da Polícia Judiciária, esclarecendo-se que o IMEI é um dado do conhecimento da operadora – resposta dada ao ponto 37.ºda B.I.;

PPPPP) No dia 19.2.2006 o A. deslocou-se às instalações da PSP de M... - resposta dada ao ponto 38.ºda B.I.;

QQQQ)... procurando obter informações sobre o andamento das investigações - resposta dada ao ponto 39.ºda B.I.;

RRRRR) Foi transmitido ao A. pelos agentes que nada mais tinha sido feito - resposta dada ao ponto 40.ºda B.I.; [ELIMINADO, por força da retificação feita infra, no ponto 3.1.]

SSSSS)... alegando o facto de a RSM ser maior de idade - resposta dada ao ponto 41.ºda B.I.; [ELIMINADO, por força da retificação feita infra, no ponto 3.1.]

TTTTT)... e da sua doença do foro psiquiátrico não estar provada documentalmente - resposta dada ao ponto 42.ºda B.I.; [ELIMINADO, por força da retificação feita infra, no ponto 3.1.]

UUUUU) A prova da doença do foro psiquiátrico da RSM não foi pedida ao A. - resposta dada ao ponto 43.ºda B.I.;

VVVVV)... nem à mãe da RSM - resposta dada ao ponto 44.ºda B.I.;

WWWWW) O Autor não forneceu às autoridades encarregues da investigação cópia da declaração médica junta no âmbito do requerimento referido em NN), nunca tendo sido pedido ao Autor que juntasse ao processo nenhuma declaração médica a comprovar o estado de doença mental da RSM – resposta dada ao ponto 45.º da B.I.;

XXXXX) A diligência referida no ponto K da matéria de facto assente foi realizada no dia 21.02.2006 – resposta dada ao ponto 47.º da B.I.;

YYYYY) As autoridades de investigação, pelo menos entre o dia 22.11.2007 e 30.11.2007, averiguaram a identidade de quem recebeu a chamada efetuada às 09:16:19 do dia 17.02.2006, com origem no número 3519...536 e destino 3519...557 – resposta dada ao ponto 49.º da B.I;.

ZZZZZ) Não foi ordenada a verificação das listas de passageiros do aeroporto Francisco Sá Carneiro no dia 18 de Fevereiro de 2006, nem o visionamento das imagens de vídeo de segurança, sendo que em data não concretamente apurada, mas após o dia 18.02.2006, e próximo desta data, foram verificadas pelos elementos da PJ destacados no aeroporto Francisco Sá Carneiro, em cooperação com os elementos da PSP também colocados nesse aeroporto, as listas de passageiros desse aeroporto e visionadas as imagens das câmaras de vídeo de segurança desse aeroporto – resposta dada aos pontos 50.º e 51.º da B.I.;

AAAAAA) Sabendo que a sua filha desapareceu junto ao mercado de M..., onde deveria ter tomado o autocarro para a zona de Serralves, o A. conseguiu visionar as imagens das câmaras de vigilância dos autocarros que circularam naquela zona entre as 9:00 e as 9:30 – resposta dada ao ponto 52.º da B.I.;

BBBBBB) Nas câmaras dos autocarros n.º 3184 e 3166 o A. encontrou imagens da RSM - resposta dada ao ponto 53.º da B.I.;

CCCCCC) O A. transmitiu a informação referida em AAAAAA e BBBBBB à Polícia Judiciária - resposta dada ao ponto 54.º da B.I.;

DDDDDD) Os vídeos referidos no ponto AA) da matéria de facto assente não continham gravação áudio - resposta dada ao ponto 55.º da B.I.;

EEEEEE) Na sequência dos factos referidos em II) e HH) da matéria de facto assente ninguém interveniente na investigação decidiu ouvir imediatamente as amigas e colegas da RSM que a acompanharam, com o esclarecimento que estas foram imediatamente contactadas pelos familiares da RSM e que, pelo menos antes de 28.03.2006, as colegas de turma foram ouvidas pela policia judiciária – resposta dada ao ponto 55.º.1 da B.I.;

FFFFFF) Nem decidiram visionar as imagens das câmaras de vigilância das composições de metro que partiram da zona do Café I... perto da hora em que a RSM terá sido vista pelas funcionárias do mesmo, nem ordenaram o visionamento das imagens das câmaras de vigilância das composições do metro que tivessem partido da zona do Mercado Municipal de M... entre as 9.00h e as 9.30, esclarecendo-se que ainda hoje as câmaras existentes nas composições do metro não possuem registos de imagens – resposta dada aos pontos 55.º.2 e 56.º da B.I.;.

GGGGGG) O A. insistiu perante as entidades investigadoras na realização de diligências no sentido de identificar a desconhecida referida no ponto KK) da matéria de facto assente, esclarecendo-se que o próprio Autor contratou um técnico especializado que se deslocou à Polícia Judiciária do Porto a fim colaborar com os mesmos no tratamento dessa imagem, não se tendo logrado identificar a desconhecida que acompanhava a RSM – resposta dada ao ponto 57.º da B.I;

HHHHHH) A fotografia referida em JJ) não permitia observar os traços fisionómicos da desconhecida e identificá-la – resposta dada ao ponto 58.º da B.I.;

IIIIII) As inquirições das amigas da RSM referidas no Relatório referenciado em AAA) da matéria de facto assente não foram transcritas para os autos ou ordenada a sua transcrição – resposta dada ao ponto 59.º da B.I.;

JJJJJJ) Aquando da diligência referida em RR) da matéria de facto assente os agentes da Policia Judiciária, apesar de saberem que o FD se encontrava em casa, como este não abriu a porta, deram sem efeito a diligência, esclarecendo-se que atuaram dessa forma por não serem portadores de mandato de busca que os legitimasse a introduzirem-se no interior da respetiva residência – resposta dada ao ponto 61.º da B.I.;

KKKKKK) Os investigadores aquando da diligência referida em RR) da matéria de facto assente estabeleceram contactos com diversos moradores do Bairro do L... - resposta dada ao ponto 62.º da B.I.;

LLLLLL)... e que, confirmando que a residência era visitada por uma jovem de idade semelhante à da RSM, permitiram afastar a hipótese de se tratar da RSM - resposta dada ao ponto 63.º da B.I.;

MMMMMM) No período de tempo que mediou a primeira tentativa de busca à residência de FD, em 12.4.2006, e a data em que a busca foi efetivamente realizada, 28.4.2006, a casa não foi vigiada - resposta dada ao ponto 64.º da B.I.;

NNNNNN) A investigação procurou saber com quem esteve a RSM no dia do desaparecimento, designadamente junto da amiga JM - resposta dada ao ponto 69.º da B.I.; [alterado, por força do decidido infra no ponto 3.4.]

OOOOOO) A PJ recolheu, entre o dia 28.02.2006 e 28.03.2006 a informação dos colegas que acompanhavam a RSM no dia do desaparecimento - resposta dada ao ponto 70.º da B.I.;

PPPPPP) A PSP de M... participou o desaparecimento da RSM ao Gabinete Sirene em 18.02.2006, e a PJ participou esse desaparecimento à Interpol em 2007 e ao sistema Schengen em 2009, com o esclarecimento que a participação ao Gabinete Sirene não chegou a ser inserida por aquele Gabinete - resposta dada ao ponto 71.º da B.I.;

QQQQQQ) O A. mandou fazer milhares de cartazes com a fotografia da sua filha, alertando para o seu desaparecimento e mencionando os contactos de quem poderia recolher informações sobre o caso - resposta dada ao ponto 73.º da B.I.;

RRRRRR) O A. procedeu à colagem de centenas desses cartazes - resposta dada ao ponto 74.º da B.I.;

SSSSSS)... por quase todo o país - resposta dada ao ponto 75.º da B.I.;

TTTTTT) O A. obteve informação que indiciava a presença da RSM em Grenoble, França - resposta dada ao ponto 77.º da B.I.;

UUUUUU) Tendo enviado um grupo de três pessoas da sua confiança a Grenoble para investigar a veracidade dessa informação - resposta dada ao ponto 78.º da B.I.;

VVVVVV) O A. recebeu informações que indiciavam a presença da RSM em Tavira, Coimbra, Lisboa, Serra de Monchique, S. Brás de Alportel, Algeciras e Vigo - resposta dada ao ponto 80.º da B.I.;

WWWWWW) O A. deslocou-se aos locais referidos em 80) para proceder a investigações - resposta dada ao ponto 81.º da B.I.;

XXXXXX) O A. contratou um detective particular para proceder a investigações sobre o desaparecimento da RSM - resposta dada ao ponto 83.º da B.I.;

YYYYYY) O A. recebeu uma informação de uma prostituta portuguesa que dava como certa a presença da RSM no Norte de Espanha, retida por uma rede organizada de prostituição - resposta dada ao ponto 85.º da B.I.;

ZZZZZZ) O A., acompanhado por um familiar, deslocou-se várias vezes aos arredores de Vigo - resposta dada ao ponto 86.º da B.I.;

AAAAAAA) … entrando e permanecendo em vários bares e discotecas referenciados como estando relacionados com prostituição - resposta dada ao ponto 87.º da B.I.;

BBBBBBB) Uma amiga da RSM recebeu uma chamada telefónica relacionada com o desaparecimento da RSM no Brasil - resposta dada ao ponto 89.º da B.I.;

CCCCCCC) Após ter descoberto a origem da chamada referida na alínea que antecede, o A. contratou um detective brasileiro para investigar nessa cidade qualquer facto que tivesse relação com o desaparecimento da filha - resposta dada ao ponto 90.º da B.I.;

DDDDDDD) Para a análise das imagens colhidas pelas câmaras dos STCP e seu melhoramento o A. contratou serviços informáticos - resposta dada ao ponto 92.º da B.I.;

EEEEEEE) Para a realização das diligências referidas nos ponto anteriores o A. permaneceu dois meses sem trabalhar - resposta dada ao ponto 94.º da B.I.;

FFFFFFF) O desaparecimento da filha provocou, e provoca, no A. enorme tristeza, angústia, depressão, frustração e revolta - resposta dada ao ponto 95.º da B.I.;

GGGGGGG) O sofrimento do Autor foi intensificado pelo facto de na sua perspectiva, o Réu não ter conduzido a investigação relativa ao desaparecimento da sua filha RSM de forma coerente e eficaz – resposta dada ao ponto 96.º da B.I.;

HHHHHHH) Essa perspectiva do Autor quanto aos serviços de investigação do Réu aliada ao não aparecimento da sua filha provocaram-lhe e provocam-lhe enorme revolta e frustração – resposta dada ao ponto 97.º da B.I.;

IIIIIII) Frustração resultante de saber que não conseguiria substituir o R. no seu papel de titular da investigação e de não dispor dos seus meios – resposta dada ao ponto 98.º da B.I.;

JJJJJJJ) O Autor sentia revolta por, na sua perspectiva, os agentes da investigação não terem uma preparação profissional adequada para investigar o desaparecimento da filha e não existir, sempre na sua perspectiva, uma orientação traçada pelos magistrados do Ministério Público para a investigação – resposta dada aos pontos 99.º e 100.º da B.I.;

KKKKKKK) O Autor lembra-se recorrentemente das diligências que, na sua perspectiva, poderiam ter sido feitas, como a localização do telemóvel da filha, o visionamento das imagens das câmaras dos autocarros que circulam na interface do Mercado de M... no sentido de identificar a desconhecida que acompanhava a RSM e imagina o que poderia ter acontecido – resposta dada ao ponto 101.º da B.I.;

LLLLLLL) Quando se lembra o A. experimenta uma enorme revolta, fúria e frustração – resposta dada ao ponto 102.º da B.I.;

MMMMMMM) A sociedade “S... – Logística e Trânsitos, Lda.” dedica-se à atividade de transitário e transporte de mercadorias - resposta dada ao ponto 103.º da B.I.;

NNNNNNN) A maior parte dos serviços desta empresa relaciona-se com transporte de mercadorias do estrangeiro para Portugal e vice-versa - resposta dada ao ponto 104.º da B.I.;

OOOOOOO) Estes serviços exigem contacto direto com clientes estrangeiros - resposta dada ao ponto 105.º da B.I.;

PPPPPPP) O A. fala fluentemente castelhano, francês, inglês e holandês - resposta dada ao ponto 106.º da B.I.;

QQQQQQQ)... sendo o único com tais competências na “S... – Logística e Trânsitos, Lda.” - resposta dada ao ponto 107.º da B.I.;

RRRRRRR) Por se ter ausentado da S... no período referido em 86) o A. sentiu medo de perder a sua única fonte de rendimento - resposta dada ao ponto 108.º da B.I.;

SSSSSSS)... temendo que a qualquer momento os restantes sócios deliberassem a sua destituição de gerente e a consequente perda de rendimento - resposta dada ao ponto 109.º da B.I.;

TTTTTTT)...o que, além de medo, provocou no A. angústia e depressão - resposta dada ao ponto 110.º da B.I.

2.2. Aos factos acima enunciados, importa aditar o seguinte, por ser relevante para a decisão e se encontrar documentado nos autos:

UUUUUUU) Do Relatório de Diligência Externa, elaborado em 30.1.2006, onde se relata o contato realizado pela Polícia Judiciária com a Dra. MHVSDL, médica especialista em psiquiatria, a qual refere, nomeadamente o seguinte:
“Que acompanha a RSM desde aproximadamente 2005. Anteriormente esta tinha acompanhamento pedopsiquiátrico no Hospital Magalhães Lemos – Porto. Que é verdade que um ou dois dias antes da RSM desaparecer teve uma consulta no seu consultório, primeiramente a sós com ela, e logo de seguida com ele e com os seus pais, para decidirem o melhor para a RSM. Foi então considerado que a melhor opção para a RSM seria uma vigilância continuada, uma monitorização das suas atividades e uma toma regular da medicação prescrita (da a irregularidade anterior). Tudo isto para evitar o internamento da RSM, que aconselhou só se efetuar em último caso. Finda esta consulta a RSM ficou muito contente por não ter sido internada, tendo-lhe inclusive telefonado cerca de uma hora depois, pedindo-lhe para lhe ligar posteriormente.
Que das consultas que teve com a RSM extrai o seguinte quadro clínico. A RSM sofre de perturbações psicóticas (doença cerebral) apresentando desequilíbrios mentais graves que conduzem a uma imprevisibilidade da sua lógica de raciocínio. Na verdade, a RSM tem frequentemente uma perplexidade perante a realidade, ou seja, parecia que só ela é que via aquilo que era óbvio, estando todos os outros equivocados. Tinha igualmente frequentes alucinações auditivas (tipo ordens) a que não conseguia escapar: tinha de as cumprir (exemplo: atira-te ao mar). Face a este comportamento impulsivo (auto-destrutivo) da RSM e tendo em conta que os portadores deste tipo de doença apresentam uma alta taxa de suicídio, teme o pior para a RSM, ou seja, acha altamente provável que a mesma se tenha suicidado.
(...) esclareceu que nos últimos meses tem tido frequentes contatos quer com a mãe da RSM, que inclusive lhe solicitou – por mais de uma vez declaração médica por forma a justificar as faltas da RSM na escola na esperança que a sua filha voltasse a casa a tempo de não perder o ano letivo, quer com o pai a quem sempre deu conta da altíssima probabilidade da RSM se ter suicidado, não por forma a penalizar quem quer que fosse, nomeadamente os pais, mas tão só com uma forma de libertação.” (doc. fls. 286/287 dos autos).


***

3. Impugnação da decisão relativa à matéria de facto

O Recorrente considera incorretamente julgados os pontos constantes dos quesitos 40, 41, 42, 46, 47, 60, 69, 96, 97, 99, 100 e 101 da base instrutória, nos termos a seguir analisados.

3.1. Entende o Recorrente que a matéria dos quesitos 40, 41 e 42 devia ter sido dada como provada, com base nos depoimentos das testemunhas JSA e LJBM. Mais alega que embora tais quesitos tenham sido dados como “não provados”, na fundamentação de facto, constante da sentença recorrida, tal decisão foi alterada, dando-se como provada a matéria dos quesitos 41 e 42 e parcialmente provada a matéria do quesito 40, nos termos que constam dos pontos RRRRR), SSSSS) e TTTTT) da sentença.

Compulsados os autos, verifica-se que foi proferido despacho, em separado, que respondeu à matéria de facto constante da base instrutória (despacho de fls. 677 e s. dos autos), no qual o Tribunal recorrido julgou “não provados” os referidos quesitos, 40, 41 e 41, onde se perguntava:
Quesito 40: Foi transmitido ao A. pelos agentes que nada tinha sido feito?
Quesito 41: .... alegando o facto de a RSM ser maior de idade?
Quesito 42: ... e de sua doença do foro psiquiátrico não estar provada documentalmente?
Contudo, quando transcreveu a matéria de facto (julgada provada naquele despacho) para a sentença recorrida, o Tribunal recorrido fez constar o seguinte dos citados pontos RRRRR), SSSSS) e TTTTT):
RRRRR) Foi transmitido ao A. pelos agentes que nada mais tinha sido feito - resposta dada ao ponto 40.ºda B.I.;
SSSSS)... alegando o facto de a RSM ser maior de idade - resposta dada ao ponto 41.ºda B.I.;
TTTTT)... e da sua doença do foro psiquiátrico não estar provada documentalmente - resposta dada ao ponto 42.ºda B.I.

Ora, esta transcrição da sentença recorrida não pode senão consubstanciar um manifesto lapso de escrita, ocorrido durante a cópia da matéria de facto apurada nos termos do citado despacho de fls. 677, pois não há dúvida que o Tribunal recorrido julgou não provados os quesitos 40, 41 e 42, tendo fundamentado essa resposta nos termos que constam do mesmo despacho de fls. 677 e ss. Note-se que a decisão sobre a matéria de facto consta daquele despacho autónomo (que antecede a sentença) e que foi notificado às partes, que dele não reclamaram (cfr. ata de fls. 745). Quando proferiu a sentença, o Tribunal recorrido limitou-se a nela incluir (como fundamentação de facto) os factos que já havia apurado no julgamento contido em tal despacho, entre os quais, repete-se, não deviam constar os correspondentes aos quesitos 40, 41 e 42, porque estes tinham sido dados como não provados. A sua inclusão na sentença só se explica, assim, por manifesto lapso do julgador, ocorrido durante a transcrição (cópia) do despacho que respondeu à matéria de facto (despacho de fls. 679 e s.). Este lapso é suscetível de retificação, porque traduz um erro de escrita (de cópia), perceptível pelo próprio teor da sentença recorrida: por um lado, porque os pontos RRRRR), SSSSS) e TTTTT) remetem para a resposta dada, respetivamente, aos quesitos 40, 41 e 42 e estes, como referido, foram inequivocamente dados como não provados (cfr. fls. 638 dos autos); por outro lado, porque, apesar do lapso, o Tribunal recorrido teve sempre em consideração a decisão que tomara nesta matéria (a decisão de considerar tais factos como não provados), como resulta, além do mais, do seguinte trecho da sentença recorrida: “Por fim, acrescente-se que, no caso da RSM, tendo em conta o facto de ter sido comunicado às polícias (PSP e PJ) que a mesma padecia de problemas psiquiátricos, e ainda antes da junção de qualquer documento a atestar esse facto, foram logo encetadas algumas diligências com vista à sua localização.”

Impõe-se, por isso, retificar a matéria de facto transcrita na sentença recorrida, eliminando os seus pontos RRRRR), SSSSS) e TTTTT), por corresponderem aos quesitos 40, 41 e 42, que foram dados como não provados.

Retificado este lapso, importa agora averiguar se assiste razão ao Recorrente quando defende que os elementos de prova (concretamente, os depoimentos de JSA e LJBM) determinavam resposta diferente aos quesitos 40, 41 e 42, ou seja, impunham que tais quesitos tivessem sido dados como provados.

O Tribunal recorrido fundamentou da seguinte forma, na parte mais relevante, a resposta negativa (não provado) a tais quesitos:
A única testemunha que acompanhou o Autor à PSP de M... no dia 19.02.2006 foi o JSA e pese embora o mesmo tenha dito que ouviu a PSP de M... dizer ao Autor que sendo a RSM de maior idade nada poderia ser feito, a verdade é que, conforme resulta do que já se deu como provado aquela PSP de M..., logo após a participação apresentada pela mãe da RSM, tratou imediatamente de:
- divulgar o desaparecimento da RSM pelos seus vários carros patrulha, distribuindo-lhes a fotografia da RSM e uma breve descrição dos factos;
- colocou uma sua fotografia num placard da esquadra;
- participou o desaparecimento da RSM, via fax, para o Gabinete Sirene;
Deste modo, não pode dar-se como provado que aquela PSP nada tenha feito e consequentemente, de acordo com as regras normas da experiência de vida, não pode dar-se como provado que tenha sido dito ao Autor nada ter sido feito em relação ao desaparecimento da sua filha.
Por sua vez, a não prova da matéria constante dos pontos 41.º e 42.º é consequência, desde logo, da não prova da matéria inserta no ponto 40.º Porém, importa ainda referir que a identificada testemunha disse ter ouvido a PSP de M... dizer ao Autor que o facto da RSM ser de maior idade limitava as investigações, uma vez que, ela poderia ter desaparecido voluntariamente, assistindo-lhe o direito de o fazer.
Por sua vez, a testemunha VF, agente da PSP de M... declarou não se recordar de ter visto o A. na esquadra de M... no dia 19.02.2006, admitindo que o mesmo lá tenha estado posto que foi feito um aditamento à participação de desaparecimento, para ser junta uma informação médica.
Quanto ao facto da RSM ser de maior idade e de essa circunstância ter tido influência nas investigações, disse ser uma regra nos desaparecimentos de pessoas de maior idade as investigações do desaparecimento só se iniciarem cerca de 48 horas depois do desaparecimento, o que foi igualmente confirmado pelo agente da PSP MAF. Acrescentou que no caso concreto não teve qualquer conversa neste sentido com o Autor no dia 19.02.2006, posto que não se cruzou com o mesmo, não lhe tendo também sugerido que juntasse aos autos qualquer informação médica sobre o estado de saúde da RSM. Referiu que já constava da participação que a RSM sofria de perturbações mentais e por isso é que iniciaram as diligências com vista à sua localização no âmbito da área geográfica da competência da PSP de M..., logo no dia 18.02.2006.
Em conclusão, analisando o processo de inquérito, mormente as diligências realizadas após a participação do desaparecimento da RSM, no dia 18.02.2006, e que se encontram documentadas nesse processo, tais como a imediata distribuição de fotografias da RSM pelos carros patrulha da PSP de M..., a afixação da sua fotografia no placard da esquadra de M... e a participação do seu desaparecimento ao gabinete Sirene não pode dar-se como provado que os agentes da PSP tenham dito ao Autor, quando este ali se dirigiu no dia 19.02.2006, que nada tinha sido feito por a RSM ser de maior idade e a sua doença não estar comprovada, o que é incompatível com as diligências já então realizadas. (...)”.

Ouvidos os depoimentos das testemunhas indicadas pelo Recorrente – JSA e LJBM – as quais afirmaram ter acompanhado o Recorrente à PSP de M..., no dia 19.02.2006 e tendo em consideração os trechos dos mesmos, transcritos pelo Recorrente nas suas alegações, tem de concluir-se no mesmo sentido do Tribunal recorrido, ou seja, que não ficou provado que os agentes da PSP tenham transmitido ao Autor, ora Recorrente, “que nada mais tinha sido feito”, alegando o facto de “a RSM ser maior de idade” e de “a sua doença do foro psiquiátrico não estar provada documentalmente”. Na verdade, os depoimentos de JSA e LJBM não são suficientes para dar como provados tais quesitos, nem afastam a circunstância de se ter provado que, em 19.02.2006, as entidades policiais já tinham desenvolvido certas diligências com vista à localização da RSM, o que, logicamente, determina a resposta negativa aos referidos pontos 40, 41 e 42 da base instrutória que foi dada pelo Tribunal a quo, com a fundamentação acima transcrita.

Como aí foi salientado pelo Tribunal recorrido, no próprio dia da participação do desaparecimento (18.02.2006), a PSP elaborou e difundiu entre as autoridades policiais uma “Ficha de Divulgação”, com a fotografia da RSM e a menção de que se tratava de “Desaparecimento de Adulto com Perturbações Mentais” (cfr. ponto E) dos factos). Pelo que não se pode dar como provado que “nada foi feito” por a RSM “ser maior de idade” ou por “não estar provado documentalmente que sofria de perturbações mentais”. Além disso, os próprios depoimentos das referidas testemunhas não são perentórios ou inequívocos quanto à matéria dos referidos quesitos. Assim, embora a testemunha JSA afirme que, na esquadra da PSP de M... lhes teria sido dito que “não tinha sido feito nada que não, portanto que ela era maior de idade (...) e que tinha 18 anos e que não tinha sido feito nada...”, já a testemunha LJBM, que também terá acompanhado o Recorrente nessa ida à esquadra de M..., disse que os agentes da PSP que lá estavam nesse dia (sábado) de piquete afirmaram “que ia ser complicado, pronto, por ser fim-de-semana e por ser...por ela ser maior de idade, pronto, e contudo também tinham, pronto, feito o alerta para os carros patrulha, pronto, para tentar descobrir alguma coisa”; e disse também que lhes foi dito que “já tinham difundido a fotografia da RSM pelos carros e pelo placard da esquadra”.

Pelo que, sem prejuízo da retificação do lapso acima referido, não há fundamento para alterar a resposta de “não provado” dada pelo Tribunal recorrido aos quesitos 40, 41 e 42, improcedendo o recurso nesta parte.

3.2. No que respeita à matéria dos quesitos 46 e 47, alega o Recorrente que a mesma devia ter sido dada como provada, por um lado, porque o Tribunal recorrido assentou a resposta ao quesito 46 no depoimento de testemunhas que não foram indicadas, nem ouvidas, sobre essa matéria (as testemunhas RA e OR); e, por outro, porque os depoimentos de HMSM, de DFLS, de MFGC e de DMMPN, impunha resposta diversa.

O Tribunal recorrido julgou não provado o quesito 46, onde se perguntava: “Nenhuma diligência de investigação foi realizada desde a data da participação do desaparecimento da RSM às forças policiais até ao dia 21.02.2006?”. E ao quesito 47 (“A única diligência realizada no dia 21.02.2006 foi a referida no ponto K) da matéria de facto assente?”) respondeu da seguinte forma: “Provado que a diligência referida no ponto K da matéria de facto assente foi realizada no dia 21.02.2006”. Estas resposta foram fundamentadas pelo Tribunal recorrido com base em documentos constantes do processo de inquérito (nomeadamente, a “Proposta de Indicação” do desaparecimento da RSM para o Gabinete Sirene, efetuada pela PSP de M... no dia 18.02.2006; a divulgação do desaparecimento junto dos carros patrulha da PSP de M..., com envio fotografia, também no dia 18.02.2006; a informação de serviço, elaborada pelo inspetor RA, em 18.02.2006 e despachada na mesma data pelo coordenador de investigação criminal, ordenando a sua remessa à SCRIPT; a informação de serviço, datada de 19.02.2006) e, ainda, com base nos depoimentos das testemunhas RA, JOMR e DFLS, que o Tribunal recorrido refere que “foram unânimes em afirmar que entre os dias 18.02.2006 e 21.02.2006 foram realizadas as diligências acima referidas, para além ainda das diligências efetuadas pelo Autor”.

Assiste razão ao Recorrente quando refere que as testemunhas RA e JOMR não responderam à matéria do quesito 46, pelo menos é o que resulta da delimitação do objeto dos seus depoimentos, tal como foi transcrita nas atas da audiência de discussão e julgamento (cfr. atas de fls. e de fls. 626). Contudo, esta circunstância é insuficiente para inquinar a resposta dada ao quesito 46, uma vez que ela se baseia noutros elementos de prova, nomeadamente, em documentos constantes do processo de inquérito, que inquestionavelmente apontam no sentido de as forças policiais terem realizado diligências entre o dia 18.02.2006 e o dia 21.02.2006, na sequência da participação do desaparecimento da RSM, pelo que a resposta ao quesito não podia ser outra, senão a que foi dada.

Note-se que o que vinha perguntado no quesito 46 era, apenas, se “nenhuma diligência de investigação fora realizada” nesse período, independentemente da questão de saber se as diligências efetuadas foram as adequadas (questão que não se situa no plano dos factos, mas sim no plano da análise jurídica dos mesmos).

Além disso, não procede o argumento do Recorrente segundo o qual os referidos documentos do processo de inquérito atestam “atos administrativos” e não “atos de investigação”. É que na formulação dos quesitos o tribunal não deve usar conceitos técnico-jurídicos, nem a expressão “atos de investigação”, que foi utilizada, pode assim ser entendida. Como resulta do respetivo teor, o quesito 46 terá de ser lido como visando saber se naquele período as forças policiais encetaram alguma diligência que tenha dado sequência à participação do desaparecimento da RSM. O que, repete-se, se mostra suficientemente documentado nos termos referidos, pelo Tribunal recorrido, na fundamentação da resposta. Acresce que aqueles elementos documentais (juntamente com o testemunho de DFLS) não são diretamente contrariados pelos excertos dos depoimentos referidos nas alegações pelo Recorrente (onde essencialmente se discute a pertinência ou eficiência das diligências encetadas nesses dias, mas não se contraria que as mesmas tenham sido realizadas). Por último, já está assente noutros pontos da matéria de facto (não impugnados pelo Recorrente), que as forças policiais realizaram determinadas diligências no próprio dia em que foi comunicado o desaparecimento da RSM (18.02.2006), nomeadamente, as referidas nos pontos D), E) e J) da matéria de facto.

Pelo que não há fundamento para alterar a resposta de “não provado” dada ao quesito 46. Assim como não se vislumbra qualquer motivo para modificar a resposta dada ao quesito 47 que, em rigor, o próprio Recorrente também não fornece.

3.3. No quesito 60 perguntava-se: “A amiga da RSM, AIS, não foi ouvida no âmbito da diligência descrita na cota referida em AAA) da matéria de facto assente?” O Tribunal recorrido deu como “não provado” este quesito com a seguinte fundamentação, na parte essencial: “No que concerne à amiga AI [AIS], pese embora a mesma tenha declarado apenas ter sido contactada em 2009, existe uma cota no processo de Março de 2007, na qual se exarou que a mesma foi contactada, tendo aquela testemunha admitido que os dados referentes ao seu número de telemóvel e à sua situação universitária estarem corretos, facto que, associado ao depoimento do inspetor JOMR, nos deixou dúvidas sobre se a mesma terá sido ou não contatada em momento anterior a 2009.

Assim, contrariamente ao alegado pelo Recorrente, o Tribunal recorrido ponderou o depoimento da AIS e valorou o facto de esta ter afirmado que apenas foi contatada em 2009. Contudo, o Tribunal considerou que esse depoimento era insuficiente para dar como provado o referido quesito, porque era contrariado pela cota exarada no processo de inquérito e pelo testemunho do referido inspetor, salientando que os dados constantes da cota (telemóvel e situação universitária da referida AIS) eram corretos. Em suma, o Tribunal recorrido entendeu existirem “dúvidas” sobre se a referida AIS fora, ou não, contatada antes de 2009. Ora, por força das regras da distribuição do ónus da prova, tais dúvidas revertem em desfavor da parte a quem incumbia a prova de tal facto, ou seja, do Autor/Recorrente (cfr. artigo 342.º/1 do Código Civil).

Pelo que deve manter a resposta ao quesito 60, improcedendo o recurso nesta parte.

3.4. No que respeita ao quesito 69 (“A investigação não procurou saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006?”), o Tribunal recorrido considerou “provado que a investigação procurou saber com quem estava a RSM no dia do desaparecimento, designadamente junto da amiga JM.” (cfr. ponto NNNNNN) dos factos).

O Recorrente insurge-se contra o assim decidido, salientando que o que se perguntava neste quesito era se a investigação procurou saber com quem a RSM este no dia anterior ao desaparecimento e não no dia do desaparecimento (17.02.2006) e alegando que o Tribunal recorrido não apresenta qualquer fundamentação para a resposta dada. Mais invoca que o referido quesito 69 devia ter sido dado como provado, uma vez que tal diligência não se encontra documentada no processo de inquérito e, além disso, resulta de diversos depoimentos que a mesma não foi levada a cabo, concretamente, dos depoimentos das testemunhas do A., MGOC, JFS, MFGC e das testemunhas indicadas pelo Réu, JOMR e JOB.

Neste ponto assiste parcialmente razão ao Recorrente.

Na verdade, a resposta dada ao quesito refere-se a questão diversa da que aí estava colocada (perguntava-se se a investigação procurou saber com quem a RSM esteve no dia anterior a 17.02.2006 e a resposta dada refere-se às averiguações sobre com quem a RSM esteve no próprio dia 17.02.2006, dia em que desapareceu). Por outro lado, o Tribunal recorrido não fornece qualquer explicação para a resposta que deu a este quesito, nada se retirando a este respeito da fundamentação que foi aduzida, em conjunto, para as respostas aos quesitos 55.º, 59.º, 60.º, 69.º e 70.º (cfr. fls. 727 e s. dos autos).

Ainda assim, verifica-se que a resposta dada ao quesito 69.º – segundo a qual a “investigação procurou saber com quem estava a RSM no dia do desaparecimento, designadamente junto da amiga JM” – mais não é do que a repetição de um facto que já se extraía de outros dado como assente (e não impugnado pelo Recorrente), vertido no ponto EEE) dos factos provados (onde se lê: “Em cota datada de 30.11.2007 no verso da listagem referida no ponto anterior consta ´A última chamada efectuada pela RSM, no dia do seu desaparecimento, foi para uma colega de turma, JM, a fim de saber onde estavam para se juntar à turma a fim de irem em visita de estudo para a Casa de Serralves. Nada de estranho foi notado pela JM, no comportamento da RSM, Desde este telefonema não voltou a falar com a RSM´ – cfr. doc. de fls. 257 e 258 dos autos”). Ou seja, embora o facto fixado como resposta ao quesito 69 resulte de outro facto já provado (e nessa medida não corresponda a uma inveracidade), o certo é que tal facto não responde ao que vinha quesitado (mas a questão diversa) e, por isso, não pode manter-se a resposta ao quesito 69, tal como foi dada pelo Tribunal recorrido.

Do exposto não resulta, no entanto, que se possa dar como provado o quesito 69 (ou seja, que a “investigação não procurou saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006”), tal como defendido pelo Recorrente. É que essa conclusão não se retira qua tale dos depoimentos das testemunhas referidas nas alegações de recurso, concretamente, dos excertos dos mesmos aí transcritos. Do testemunho do Inspetor JOMR apenas se retira que este não considerava “relevante” ouvir as pessoas com quem a RSM tivesse estado no dia anterior; e do depoimento do Inspetor JOB extrai-se que este não fez nenhuma diligência para apurar com quem a RSM esteve na véspera do seu desaparecimento, salientado, contudo, que terá estado com os pais.

Contudo, encontram-se provados outros factos (não impugnados pelo Recorrente) que, pelo menos em parte, contrariam aquela asserção (segundo a qual a investigação não teria procurado saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006), na medida em que revelam que as entidades policiais recolherem elementos e inquiriram pessoas que lhe eram próximas ou que estiveram com a RSM nos dias imediatamente anteriores ao seu desaparecimento. É o que se extrai dos pontos B), F), I), YY), ZZ), KKK), PPP) e UUUUUUU) da matéria de facto, onde consta que as entidades policiais inquiriram uma amiga, SPNP, que relatou uma conversa havida com a RSM, dias antes do seu desaparecimento; assim como inquiriram a médica psiquiatra que a acompanhava (e com quem a RSM tinha tido uma consulta um ou dois dias antes do desaparecimento) e ouviram a mãe da RSM (com quem esta vivia) e o pai, nas respetivas deslocações à PSP de M..., em 18.02.2006.

Pelo que, nada mais se tendo apurado para além do referido, impõe-se alterar a resposta ao quesito 69, ou seja, o ponto NNNNNN) da matéria de facto (“A investigação não procurou saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006?”), que deve passar a ser a seguinte: NNNNNN) Provado apenas o que consta dos pontos B), F), I), YY), ZZ), KKK), PPP) e UUUUUUU) da matéria de facto.

3.5. Finalmente, o Recorrente entende que o Tribunal a quo valorou erradamente a prova relativa à matéria dos quesitos 96, 97, 99, 100 e 101, pois apesar de ter considerado provados tais quesitos, “acrescentou que os mesmo são provados apenas na perspetiva do autor, antecipando (...) uma inadmissível decisão sobre o mérito da ação, em sede de resposta à matéria de facto”.

O Recorrido entende que esta “discordância” do Recorrente deve ser liminarmente desatendida por extemporaneidade, uma vez que o Recorrente não apresentou reclamação contra a resposta à matéria constante da base instrutória, nos termos então previstos no artigo 653.º/4 do CPC, na versão anterior à Lei n.º 41/2013.

Mas sem razão. Pois a falta de tal reclamação não preclude o direito de impugnar, em sede de recurso, a decisão sobre a matéria de facto, sendo certo que a decisão relativa à matéria de facto, apesar de inicialmente proferida em despacho autónomo (de acordo com o regime então vigente na lei processual civil), passa depois a constituir parte integrante da fundamentação (de facto) da sentença recorrida.

Os quesitos 96, 97, 99, 100 e 101 tinham o seguinte teor
96) “O sofrimento do A. foi acrescido pela inércia e inépcia do R. em conduzir a investigação de forma coerente e eficaz?
97) “A incompetência demonstrada pelos serviços de investigação provocam enorme revolta e frustração no A.?
99) “O A. sentiu revolta por verificar que os agentes da investigação não tinham a menor preparação profissional para investigar o desaparecimento da filha?
100) “...e por não existir uma orientação traçada pelos magistrados do Ministério Público?
101) “O A. lembra-se recorrentemente das diligências que poderiam ter sido feitas e não o foram – designadamente, a localização do telemóvel da filha, o visionamento das imagens das câmaras dos autocarros e composições de metro que circularam na interface do Mercado de M... e no sentido de identificar a desconhecida que acompanhava a RSM – e imagina o que poderia ter acontecido?
A tais quesitos o Tribunal recorrido respondeu da seguinte forma:
96) Provado apenas que o sofrimento do Autor foi intensificado pelo facto de, na sua perspetiva, o Réu não ter conduzido a investigação relativa ao desaparecimento da sua filha RSM de forma coerente e eficaz.
97) Provado apenas que essa perspetiva do Autor quanto aos serviços de investigação do Réu, aliada ao não aparecimento da sua filha, provocara-lhe e provocam-lhe enorme revolta e frustração.
99) e 100) Provado que o Autor sentia revolta por, na sua perspetiva, os agentes da investigação não terem uma preparação profissional adequada para investigar o desaparecimento da filha e não existir, sempre na sua perspetiva, uma orientação traçada pelos magistrados do Ministério Público para a investigação.
101) Provado que o Ator lembra-se recorrentemente das diligências que, na sua perspetiva, poderiam ter sido feitas, como a localização do telemóvel da filha, o visionamento das imagens das câmaras dos autocarros que circulam na interface do Mercado de M... no sentido de identificar a desconhecida que acompanhava a RSM e imagina o que poderia ter acontecido.”

Na fundamentação destas respostas, o Tribunal recorrido escreveu o seguinte, na parte mais relevante: “(...) Em face da prova produzida e das regras de experiência de vida o Tribunal não tem qualquer dúvida em como é profunda a dor que o Autor sofreu e continua a sofrer com o desaparecimento da sua filha, continuando na ignorância quanto ao que lhe terá acontecido. O Tribunal também não tem dúvidas, atento o depoimento das testemunhas supra referidas, de que o Autor está convencido que os agentes de investigação que intervieram no processo da sua filha não estavam preparados profissionalmente para a investigação, assim como está convencido que a investigação não foi conduzida, do seu ponto de vista, de forma competente, o que tudo determina a intensificação da dor, da revolta e da frustração que sente

O Recorrente entende que o Tribunal recorrido, ao dar como provados tais quesitos na perspetiva do autor, antecipou um juízo de Direito sobre o mérito da ação, assim incluindo considerações jurídicas na decisão relativa à matéria de facto. E defende que a prova produzida nos autos (nomeadamente o depoimento de certas testemunhas indicadas pelo Réu, que identifica), aponta para que “até 2009 a investigação andou mal e devagar, e a partir de 2009, ela teve um impulso, sem motivo aparente”, o que, no entender do Recorrente, “permite concluir (...) que ao contrário da conclusão do Tribunal a quo, também na perspetiva dos próprios (pelo menos até 2009) a investigação não andou bem”.

Contudo, não se vislumbra qualquer erro nas respostas aos quesitos acima identificados que, por versarem sobre os factos relativos sofrimento e padecimento do Autor/Recorrente, não podem deixar de colocar esses sentimentos na perspetiva do próprio, uma vez que se trata de factos relativos a estados psíquicos e subjetivados naquela concreta pessoa.

Acresce que o próprio Recorrente não questiona que os factos dados como provados na perspetiva do autor, são os que resultam da prova produzida. O que verdadeiramente o Recorrente pretende, é alargar o âmbito das respostas dadas a estes quesitos, para nelas incluir um juízo sobre a forma como decorreu a investigação, ou seja, uma avaliação crítica dos factos provados, conducente, na sua perspetiva, à conclusão de que a “investigação não andou bem”. Contudo, a admitir-se esta sua pretensão, estaríamos a cometer – aí sim – o erro que o Recorrente imputa à decisão recorrida, visto que estaríamos a incluir, em sede de decisão relativa à matéria de facto, uma conclusão jurídica, determinante para a verificação do pressuposto da ilicitude subjacente à responsabilidade civil extracontratual em que assenta a ação. O que, por razões óbvias, é inadmissível.

Pelo que o recurso improcede nesta parte.

3.6. Em resumo, improcede o recurso na parte em que impugna a decisão relativa à matéria de facto, com exceção dos seguintes pontos que merecem provimento:

i. Retifica-se a matéria de facto transcrita na sentença recorrida, eliminando-se os seus pontos RRRRR), SSSSS) e TTTTT), por corresponderem aos quesitos 40, 41 e 42, que foram dados como não provados;

ii. Altera-se a resposta ao quesito 69 (“A investigação não procurou saber com quem esteve a RSM no dia anterior a 17.02.2006?”), correspondente ao ponto NNNNNN) da matéria de facto, que passa a ser a seguinte: “NNNNNN) Provado apenas o que consta dos pontos B), F), I), YY), ZZ), PPP) da matéria de facto.”


***
4. Erros de julgamento de Direito

4.1. A sentença recorrida julgou improcedente a presente ação, assente em responsabilidade civil por facto ilícito, consubstanciado em erros e omissões alegadamente cometidos na investigação referente ao desaparecimento da filha do Autor/Recorrente, no âmbito da qual o Recorrente reclama do Estado o pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais (correspondentes às despesas que alega ter suportado com as diligências que realizou tendo em vista a localização da sua filha), bem como por danos não patrimoniais (decorrentes do sofrimento e ansiedade que lhe provocou a forma com as autoridades conduziram o processo).

O Recorrente começa por imputar à sentença recorrida um erro na identificação do regime legal aplicável, defendendo que o caso dos autos se rege pelo disposto no Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31 dezembro.

Mas sem razão, pelos motivos que já constam da sentença recorrida: “Tendo em conta que o desaparecimento da RSM se deu no dia 17.02.2006 e que a atuação da Policia Judiciária e do Ministério Público que o Autor considera estarem na base do direito indemnizatório que reclama, foi a que se teve lugar, nos primeiros dias e meses imediatamente subsequentes ao desaparecimento da RSM, o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado aplicável será o que se encontra em vigor à data dos factos em causa, ou seja, o que consta do Decreto-Lei n.º 48051, de 21.11.1967.” Na verdade, a citada Lei n.º 67/2007 apenas entrou em vigor 30 dias após a sua publicação (cfr. artigo 6.º), ou seja, em 31.01.2008, revogando o anterior Decreto-Lei n.º 48051. Como os factos ilícitos que o Autor/Recorrente imputa ao Réu/Recorrido terão ocorrido a partir de 18.02.2006 (data da participação do desaparecimento da RSM) e nos meses imediatamente seguintes, afigura-se óbvio que o regime legal aplicável é o que constava do Decreto-Lei n.º 48051, que à data de tais factos/omissões ainda se encontrava vigente.

A responsabilidade civil do Estado por atos ilícitos, regulada naquele Decreto-Lei n.º 48051 correspondia, no essencial, ao conceito civilístico de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, consagrado no artigo 483.º/1 do Código Civil (v. Ac. STA 27.01.1987, in Ac. Dout. 311, 1384), cujos pressupostos são: a) o facto, comportamento ativo ou omissivo voluntário; b) a ilicitude, traduzida na ofensa de direitos de terceiros ou disposições legais destinadas a proteger interesses alheios; c) a culpa, nexo de imputação ético-jurídica do facto ao agente ou juízo de censura pela falta de diligência exigida a um homem médio ou a um funcionário ou agente típico; d) a existência de um dano, i.e., lesão de ordem patrimonial ou moral, esta quando relevante; e) o nexo de causalidade entre a conduta e o dano, segundo a teoria da causalidade adequada. (Note-se, aliás, que tais pressupostos se mantém, no essencial, à luz do atual Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007).

No caso vertente, a sentença recorrida julgou a ação improcedente, por ter considerado que “o Autor não conseguiu demonstrar o pressuposto da ilicitude na atuação dos órgãos de investigação criminal envolvidos no processo de desaparecimento da sua filha RSM, pelo que, não se verificando este pressuposto, a sua pretensão carece de soçobrar, sendo desnecessário, porque inútil, proceder-se à apreciação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado”.

A sentença recorrida considerou que faltava um dos primeiros pressupostos da responsabilidade civil, por entender que não estava verificado o facto ilícito, na medida em que não ficara provado que as entidades envolvidas (Polícia de Segurança Pública; Polícia Judiciária; e Ministério Público) tivessem praticado qualquer ato ou omissão ilícitos, ou seja, que tivessem procedido com diligência inferior à exigida ou infringido as leges artis vigentes na sua área ou que não tivessem afetado os meios adequados ao caso.

Ao assim decidido o Recorrente imputa erro de julgamento, em resumo, por entender que os factos demonstram que o Réu, atuando através das entidades referidas, não afetou os meios necessários e adequados ao caso, violando de forma ilícita e culposa os seus deveres, do que resultou a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos. Em concreto, o Recorrente considera que ficaram provados os seguintes fatos/omissões ilícitos do Réu:
i. Inexistência de meios de formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público;
ii. Omissão de diligências de investigação que se revelavam necessárias e adequadas.

4.2. No que respeita à invocada inexistência de meios de formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público, as alegações do Recorrente são vagas e não concretizam minimamente esta sua afirmação, limitando-se a afirmar genericamente, quer no corpo das alegações, quer nas respetivas conclusões, que “[O]s erros e omissões, como resulta da factualidade apurada, resultam da inexistência de meios de formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público para a investigação deste tipo de casos, bem como de meios específicos, donde decorre a ineficiência da atuação dos órgãos do Estado encarregados da investigação criminal, que, por isso, em tempo útil de oportuno, não procederam às diligências de investigação adequadas e necessárias ao caso, pondo em causa, consequentemente, qualquer possibilidade de sucesso, ou seja, a descoberta da RSM, ou mesmo da descoberta da verdade.”

Mas em momento algum o Recorrente identifica um elemento concreto do qual se pudesse inferir a invocada falta de “formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público para a investigação deste tipo de casos” e muito menos demonstra um qualquer nexo causal entre a alegada falta de formação (não demonstrada) e os resultados (infrutíferos) das diligências realizadas para a localização da RSM.

Acresce que esta alegação não tem qualquer suporte da matéria de facto dada como provada, da qual não se retira qualquer indício de falta de preparação ou de ausência de formação dos vários agentes (incluindo polícias e Ministério Público) que intervieram nas diversas diligências empreendidas na tentativa de localizar a filha do Recorrente. Relembre-se, ainda, que todas as entidades referidas (Polícia de Segurança Pública; Polícia Judiciária; e Ministério Público) são integradas por pessoal que, após recrutamento mediante provas prestadas em concurso público, frequenta obrigatoriamente um curso ou estágio de formação e que ao longo da carreira tem um direito/dever de formação contínua (cfr. nomeadamente, os artigos 110.º/1 e 114.º a 117.º do Estatuto dos Magistrados do Ministério Público; os artigos 100.º a 103.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, na versão então em vigor, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 275-A/2000, com as alterações posteriores; e os artigos 78.º, 80.º e 83.º e s. da Lei Orgânica da Polícia de Segurança Pública, na versão à data vigente, aprovada pela Lei n.º 5/99, com as alterações posteriores).

Pelo que não pode dar-se como verificado o invocado facto ilícito consubstanciado na “falta de formação específica dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público para a investigação deste tipo de casos”, não se vislumbrando, a este respeito, qualquer erro de julgamento da sentença recorrida.

4.3. Quanto aos alegados erros e omissão de diligências de investigação, o Recorrente defende que as entidades policiais assumiram que o desaparecimento da sua filha fora voluntário e que voltaria quando tivesse frio e fome, pressuposto este que condicionou toda a sua atuação no período imediatamente seguinte ao desaparecimento e levou a que tivessem omitido um conjunto de diligências que, se tivessem sido realizadas logo após o desaparecimento, se teriam revelado essenciais à localização da RSM ou à descoberta da verdade.

Na análise de cada uma das questões colocadas pelo Recorrente o que, a final, sempre se procurará saber é se as entidades policiais e o Ministério Público agiram com diligência inferior à que lhes era exigível ou omitiram procedimentos que se impunham nas circunstâncias do caso, tomando como padrão o funcionário médio diligente.

Sublinhe-se que a averiguação da existência, ou não, de facto ilícito é, no caso vertente, uma operação complexa e delicada, por várias razões: primeiro, porque nos encontramos a analisar a conduta de várias entidades, com competências distintas e regimes legais autónomos; segundo, porque os procedimentos em causa (processo de averiguações de pessoa desaparecida e posterior processo de inquérito) não são procedimentos inteiramente formais ou formalizados (em especial o primeiro), nem pautados por uma tramitação rigidamente tipificada, exigindo, antes pelo contrário, uma margem de manobra e de avaliação dos respetivos intervenientes, em cada momento do processo; terceiro, porque o juízo de valor a emitir sobre a conduta daquelas entidades – ou seja, o juízo crítico que o tribunal deve fazer com vista a apurar se ocorreu algum facto ou omissão ilícitos ou uma violação dos deveres de cuidado objetivos – não pode basear-se numa avaliação meramente retrospetiva, perspetivada a partir do presente, mas antes exige que se identifique o que era devido e exigível (tomando como padrão o funcionário médio e prudente), em cada momento, em função dos dados que nessa altura eram conhecidos; ou seja, apesar de ser realizado depois da prática do facto, o juízo deve ser formulado numa perspectiva ex ante, levando-se em conta apenas os dados conhecidos no momento da prática da ação ou omissão (o que implica um juízo de prognose póstuma).

Por último, a verificação do ilícito que aqui está em causa não está dependente do desfecho dos processos de averiguação e inquérito, que, infelizmente, como é sabido, tiveram, até hoje, resultados infrutíferos na localização da desaparecida (assim como se mostraram frustradas as diligências efetuadas por seu pai, aqui Recorrente). Note-se, aliás, que os danos peticionados pelo Autor/Recorrente não se referem ao desaparecimento de sua filha, em si mesmo considerado, mas ao alegado sofrimento e ansiedade que lhe terão provocado a invocada falta de diligência das entidades na condução do processo de averiguações para a sua descoberta. Ou seja, o ilícito imputado ao Réu não vem invocado como causa da manutenção da situação da RSM, como pessoa desaparecida, mas sim como causa de agravamento do padecimento do Autor/Recorrente no decurso do processo encetado com vista à sua localização. O que, necessariamente, tem consequências no apuramento do nexo de causalidade entre o facto ilícito e os danos invocados, que, contudo, apenas cumprirá esclarecer caso se verifiquem os demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.

Nesta fase, importa começar por verificar se o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento quando deu como não verificado o facto (omissão) ilícito.

4.4. Em concreto, o Recorrente alega que estão provados os seguintes erros, omissões e atrasos nas diligências desenvolvidas pelas polícias e pelo Ministério Público, que a sentença recorrida não terá valorizado devidamente:

- Atraso nas diligências de localização do telemóvel de que a RSM era portadora à data do desaparecimento, nomeadamente, na obtenção da necessária autorização judicial;
- Omissão de diversas diligências, que o Recorrente defende que deviam ter sido tomadas logo após a participação do desaparecimento, quais sejam: contactar as pessoas que rodeavam a desaparecida e as que lhe eram mais próximas; averiguar com quem a RSM tinha estado no dia anterior ao desaparecimento; alargar as buscas à área do Porto, não as mantendo confinadas a M...;
- Visionamento das imagens dos autocarros dos STCP só efetuado após as diligências empreendidas pelo próprio Recorrente para o efeito;
- Participação ao Gabinete SIRENE feita de forma deficiente, tendo como consequência que o desaparecimento da RSM tivesse ficado omisso no espaço Schengen, Interpol e mesmo no sistema interno de informação do Estado, situação que só foi reparada em 2009;
- Demora de mais de 15 dias, após a emissão do mandado necessário, na realização da busca no Bairro do L..., efetuada depois de uma primeira ida ao local, sem mandado, pondo em crise o sucesso da diligência.

4.4.1. Antes de nos debruçarmos sobre as demais questões suscitadas no recurso, é necessário sublinhar que a alegação do Recorrente parte de um pressuposto que, por razões semelhantes às avançadas na sentença recorrida, não podemos partilhar. Entende o Recorrente que, após a participação do desaparecimento havia, por parte das autoridades, uma obrigação de acionar de imediato todos os meios ao dispor das forças policiais e do Ministério Público. Acontece que estamos perante o desaparecimento de uma jovem adulta (na altura com 18 anos de idade), que embora tenha sido assinalada como sofrendo de perturbações mentais, não se encontrava interditada ou inabilitada e, pelo contrário, conduzia a sua vida com relativa liberdade e autonomia, aparentemente em correspondência com a maioridade que já atingira.

Isso mesmo resulta do circunstancialismo que antecedeu o desaparecimento e que revela que a RSM, em 17.02.2006, pelas 9 horas, foi deixada por sua mãe numa paragem de autocarro, em M..., a fim de apanhar o autocarro para se encontrar com umas colegas, para efetuarem uma visita de estudo à Fundação de Serralves, no Porto. Não tendo a RSM comparecido naquela visita, nem tido mais nenhum contato com os colegas, amigos e família, no dia 18.02.2006, pelas 11:53horas, a mãe da RSM deslocou-se à PSP de M... para participar o seu desaparecimento, ou seja, mais de 24 horas depois de ter deixado a filha naquela paragem de autocarro.

Na certeza de que não se pretende agravar o sofrimento, certamente incomensurável, dos pais da RSM, estas circunstâncias não podem deixar de ser convocadas, na medida em que são objetivamente relevantes para analisar o problema que foi colocado ao Tribunal: o de saber se as autoridades policiais agiram de forma ilícita no tratamento dado ao caso. Dos factos acima referidos extrai-se que a ausência da RSM (o seu não regresso a casa) – desde, pelo menos, o final da tarde do dia 17.02.2006 e até à manhã do dia seguinte – não foi encarada, pela família, como sendo um facto que motivasse uma ida imediata à polícia. Este dado específico do presente caso, aliado à experiência que, em geral, se pode retirar de casos idênticos (onde muitas vezes se verifica que o desaparecimento de jovens adultos não envolve necessariamente qualquer indício de crime e antes é voluntário e temporário), apontam para uma situação em que, à data em que é reportado o desaparecimento, se verifica não haver indícios de um eventual crime ou de perigo iminente para a vida da desaparecida. Note-se, ainda, que os próprios progenitores da RSM, nos contatos havidos com a polícia no dia em que foi reportado o desaparecimento (18.02.2006) e, mesmo mais tarde, nunca colocaram a hipótese de haver indícios criminais ligados ao seu desaparecimento, nem apresentaram qualquer queixa crime contra incertos.

Com estes elementos – que, sublinhe-se, eram os disponíveis à data e, por isso, os únicos que aqui relevam – somos forçados a concluir que não é descabido, nem injustificado que, no dia 18.02.2006, um inspetor da Polícia Judiciária tenha dito ao Recorrente que “a RSM acabaria por aparecer dentro de dias, quando tivesse fome e frio”. Ou seja, contrariamente ao invocado pelo Recorrente a hipótese, colocada pelas entidades policiais, de o desaparecimento ser um ato voluntário não era infundada e, pelo contrário, vários indícios apontavam nesse sentido. O que significa que, não há erro grosseiro na avaliação inicial do desaparecimento da RSM, ao não ter sido entendido como um desaparecimento involuntário, ligado a um eventual ato criminoso.

Importa agora responder às questões concretas colocadas no recurso, respeitantes a particulares atuações ou omissões que o Recorrente reputa ilícitas.

4.4.2. No que respeita às diligências para a localização do telemóvel que a RSM transportava consigo no dia do desaparecimento, provaram-se os seguintes factos, a seguir reordenados, por ordem cronológica:

- Quando desapareceu a RSM era portadora de um telemóvel, que esteve ligado até às 14h46m do dia 18/02/2006 (pontos XXXX) e YYYY) dos factos);
- Em 18.02.2006, pelas 11:41 horas, MWS efetuou participação junto da PSP de M..., dando conta do desaparecimento de sua filha, RSM, ocorrido no dia anterior (17.02.2006), cerca das 9:00h, nos seguintes termos: Por à hora e data mencionados, ter deixado a sua filha, a qual já tem 18 anos e sofre de problema do foro psíquico, para se encontrar com os seus colegas, pois neste dia tinham uma visita de estudo à Fundação de Serralves, foi questionado aos seus colegas se esta teria comparecido na alegada visita, foi confirmado por estes que ela não tinha chegado a ir à visita de estudo nem sequer tinha estado em contacto com nenhum dos seus colegas de escola. A RSM dispõe de uma conta bancária, da qual tem consigo um cartão Multibanco, não tendo até ao momento efectuado nenhum levantamento. Na altura do desaparecimento, vestia calça de ganga azul escuro, um casaco preto de bombazina, e botas castanhas de salto alto, e era portadora de uma carteira de mão de cor verde, na qual continha além da sua identificação, objetos de uso pessoal. (pontos B) e C) dos factos);
- No mesmo dia 18.02.2006, o Recorrente deslocou-se à esquadra de M... e transmitiu aos agentes da Polícia de Segurança Pública a sua preocupação de que a qualquer momento o telemóvel da RSM se poderia desligar por se esgotar a bateria, pedindo-lhes que despoletassem o procedimento que permitisse a localização do telemóvel enquanto a bateria não se esgotasse (pontos ZZZZ), AAAAA) e BBBBB) dos factos);
- Os agentes da PSP disseram ao Autor que era uma questão que só poderia ser tratada pela Polícia Judiciária, aconselhando-o a dirigir-se à PJ, se assim entendesse (ponto CCCCC) dos factos);
- No mesmo dia 18.02.2006, pelas 14:27horas, o pai da RSM, ora Recorrente, deslocou-se à Polícia Judiciária do Porto, comunicando o desaparecimento de sua filha e dando conta, da sua ansiedade e medo de se estar a perder a possibilidade de localizar a RSM através do sinal do seu telemóvel e de terem sido efetuadas diversas tentativas de contato telefónico através do n.º 9...536, por ela utilizado, verificando-se que embora as chamadas sejam recebidas, não são atendidas” e que apesar do “elevado número de SMS enviado, verifica-se que o espaço de memória do telemóvel não se encontra esgotado, tudo levando a crer que as mesmas estão a ser recebidas e posteriormente apagadas (pontos A), F), G) dos factos);
- Na deslocação do Autor à Polícia Judiciária, em 18.02.2006, foi-lhe respondido que atentas as diligências já efectuadas por si e pela PSP de M..., pelo serviço de piquete da PJ pouco mais poderia ser feito durante o fim de semana; e o A. foi elucidado sobre a impossibilidade de aceder a dados sobre a localização do telemóvel sem a intervenção das autoridades judiciárias, cujo despacho não seria possível de colher de imediato já que se estava em pleno fim-de-semana (pontos KKKKK) e LLLLL) dos factos);
- Em 18.02.2006, por ser sábado, os tribunais estavam fechados da parte da tarde o que impossibilitava a obtenção da autorização judicial necessária à localização do telemóvel da RSM (ponto HHHHH) dos factos);
- Com a ajuda de um amigo, o A. obteve o número de telemóvel de um Inspetor da Polícia Judiciária, a quem imediatamente telefonou, explicando a situação do telemóvel e, na opinião deste Inspetor, a RSM acabaria por aparecer dentro de dias, quando tivesse fome e frio (pontos FFFFF), GGGGG), IIIII) e JJJJJ) dos factos).
- No dia 19.02.2006, o Recorrente voltou à Polícia Judiciária, tendo informado, nomeadamente, que desde as 16:00 horas do dia de ontem deixou de ser possível contactar a RSM através do telemóvel, sendo agora apenas perceptível a mensagem de que o telemóvel está desligado (ponto H) dos factos);
- Em 21.02.2006, a Polícia Judiciária solicitou aos Serviços do Ministério Público de Vila Nova de Gaia que promovessem as diligências necessárias à localização do telemóvel da RSM, o que foi concretizado pelos Serviços do Ministério Público junto da operadora “Optimus”, sendo que este pedido não teve cobertura de uma decisão emitida por Juiz de Instrução Criminal, e foi formulado sem o IMEI do telemóvel da RSM por o mesmo não ser do conhecimento dos seus familiares nem da Polícia Judiciária, esclarecendo-se que o IMEI (“International Mobile Equipment Identity”) é um dado do conhecimento da operadora (pontos K) a N), OOOOO) e XXXXX) dos factos);
- Aquele pedido de localização celular do telemóvel da RSM efetuado diretamente pelo Ministério Público de Vila Nova de Gaia à Optimus foi recusado por esta operadora pelo facto de não ter sido acompanhado de uma decisão judicial (ponto NNNNN) dos factos);
- Por ofício de 24.02.2006, recepcionado via fax às 16:29horas, a operadora Optimus informou o Tribunal de Instrução Criminal do Porto que apenas temos registo de uma chamada efectuada com identificação da localização no dia 17 às 09:02:19, sendo que, todas as outras chamadas existentes posteriormente foram feitas para o Voice Mail isto porque o telemóvel estava desligado ou sem rede (ponto Q) dos factos);
- Em 24.2.2006, pelas 18:29 horas, a Policia Judiciária remeteu fax ao Juiz do TIC do Porto com a indicação do IMEI do telemóvel da RSM e de imediato, pelas 18.35h, foi proferido despacho pelo juiz, pedindo à Optimus a intercepção por um período de 90 dias ao IMEI 35…197, onde constem as chamadas efectuadas e recebidas (trace back) e, ainda, informação sobre quais os cartões que operam no referido IMEI, a identificação dos respectivos titulares, a faturação detalhada de onde constem as chamadas efectuadas e recebidas (trace back), tendo idênticos pedidos sido formulados junto da TMN e da Vodafone (pontos R) a T) dos factos);
- Em 25.02.2006, a Optimus informou, além do mais, o seguinte: a 18 de Fevereiro às 14:46, o SIM deixou de ter cobertura Optimus, não respondendo aos pedidos da rede. Isso acontece, por exemplo, nas seguintes situações: SIM perde repentinamente a cobertura ou é retirada a bateria do telemóvel. (ponto U) dos factos);
- Com a informação acima referida, a Optimus remeteu listagem que descreve a atividade do telemóvel da RSM no dia 18 de Fevereiro de 2006, da qual consta que pelas 09:16 horas do dia 17.02.2006 foi feita uma chamada com origem no n.º da RSM (3519...536) e destino no n.º 3519...557, com duração de 13 segundos (pontos V) e DDD) dos factos);
- Em face dos problemas do foro psíquico da RSM o A. e a mãe da RSM não providenciaram pela interdição ou inabilitação da RSM (ponto KKKK) dos factos).

O Autor alega que teria sido possível obter a autorização judicial necessária para se proceder à localização do telemóvel da RSM, sendo irrelevante para esse efeito que na participação efetuada pelos pais da desaparecida não estivesse configurada a hipótese de crime; além de que cabe ao Estado organizar os tribunais de modo a que entre as 13 horas de sábado e as 9 horas de segunda-feira esteja disponível um magistrado judicial para conceder as autorizações que a lei impõe e dotar as autoridades judiciária e de polícia criminal dos meios para obter os dados quando esteja em causa o perigo para a vida ou integridade física (como veio o legislador veio a fazer em 2007, com a alteração ao artigo 252.º-A do CPP). Mais alega que o Réu só solicitou a localização do celular à operadora de comunicações 4 dias depois da notícia do desaparecimento, e ainda assim fê-lo de forma deficiente, por o pedido não ter sido acompanhado de despacho prévio de juiz de instrução criminal.

Contudo, os factos provados não permitem sustentar a posição do Recorrente.

Note-se que, apesar de o desaparecimento da RSM ter sido participado por sua mãe às 11:41 horas do dia 18.02.20006, o certo é que tal participação – feita na esquadra da PSP de M... – é totalmente omissa quanto ao telemóvel (apenas descreve a roupa que trazia vestida e a sua carteira de mão, contendo objetos de uso pessoal, a sua identificação e o cartão multibanco, no qual não se verificava qualquer movimento desde o dia anterior). O telemóvel apenas é referido quando o próprio Recorrente se deslocou à Polícia Judiciária do Porto, nesse mesmo dia 18.02.2006, pelas 14:27 horas (constatando-se que, antes disso, o Recorrente dirigiu-se à PSP de M..., onde foi informado que a questão do telemóvel tinha que ser tratada com a Polícia Judiciária).

Ora, como mais tarde se veio a saber, através da informação prestada pela operadora (na sequência do pedido que lhe foi dirigido pelas entidades judiciárias), o telemóvel da RSM deixou de ter cobertura, não respondendo aos pedidos da rede, a partir das 14:46 horas do dia 18 de fevereiro (o que, segundo a operadora, acontece quando “perde repentinamente a cobertura ou é retirada a bateria do telemóvel”). O que significa que entre o momento em que a Polícia Judiciária tomou conhecimento do número do telemóvel da RSM e o momento em que se tornou impossível esse aparelho, por ter deixado de ter cobertura, mediaram apenas 19 minutos.

Por isso, a análise dos factos revela que quaisquer incidentes posteriormente ocorridos no processo para a localização do telemóvel sempre seriam irrelevantes para o seu resultado, uma vez que a impossibilidade de localizar o aparelho ocorreu minutos depois da comunicação dos dados respetivos à Polícia Judiciária. Ou seja, a circunstância de o processo de localização do telemóvel não ter sido iniciado no próprio dia 18.02.2006 (quando, por ser sábado, os tribunais de turno estavam fechados desde as 13 horas, conforme se encontra legalmente previsto) e de o pedido só ter sido efetuado em 21.02.2006 e ainda de ter havido uma recusa inicial da operadora em responder (por o primeiro pedido não ter sido acompanhado da necessária autorização judicial), tendo a informação sido prestada apenas em 24.02.2006, são circunstâncias que não têm nexo de causalidade com a impossibilidade de localizar o telemóvel, que foi, antes disso, determinada pela perda de rede, ocorrida pelas 14:46 horas do dia 18 de fevereiro.

Assim, independentemente da (i)licitude das atuações descritas, tais factos são insuscetíveis de se configurar como causa dos resultados infrutíferos na localização do telemóvel e consequentemente, dos danos invocados. Pelo que não são aptos a fundamentar a responsabilidade civil que o Recorrente imputa ao Recorrido.

Ainda que assim não fosse, sempre se teria de concluir, como concluiu a sentença recorrida, que dos factos provados não é possível extrair “qualquer atuação ilícita, sequer negligente, quer por parte da PJ em apenas ter requerido ao MP de VNG a localização celular do telemóvel da RSM no dia 21.02.06, quer por parte dos Serviços do Ministério Público de Vila Nova de Gaia, por terem dirigido esse pedido de localização celular à operadora Optimus sem IMEI e, sem despacho emanado pelo juiz de instrução criminal”. O tribunal a quo fez uma correta análise do problema, assente em razões que subscrevemos e passamos a transcrever:
A localização celular do telemóvel de uma determinada pessoa permite obter informação, através da ligação à rede telefónica móvel, sobre a localização deste, o percurso físico efetuado pelo possuidor do telemóvel e a sua mobilidade ou permanência num determinado local, pelo que, bem se compreende que a possibilidade de se efetuar uma tal diligência dependa de apertados requisitos, tanto quanto é certo estar-se perante uma medida intrusiva à liberdade das pessoas, pelo que a obtenção de tais dados estão abrangidos pelo âmbito de proteção da norma constitucional do artigo 34.º, n.º 4, da CRP.
Na situação vertente, importa ter presente que aquando do pedido de localização celular apresentado pelo Autor junto da PJ, não existia no nosso ordenamento jurídico a possibilidade legal da PJ proceder a tal localização sem prévia autorização judicial, diferentemente do que passou a suceder após a entrada em vigor das alterações introduzidas ao Código de Processo Penal (CPP) pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, em cujo n.º1 do art.º 252.º-A, sob a epígrafe “Localização Celular” se estabelece que «As autoridades judiciárias e as autoridades de polícia criminal podem obter dados sobre a localização celular quando eles forem necessários para afastar perigo para a vida ou de ofensa à integridade física grave”. Com tal alteração, não só se atribuiu essa possibilidade à PJ como se permitiu a possibilidade de localização celular sem ser por referência a um processo crime, desde que tal se destine a evitar um perigo, ou seja, para efeitos de pura prevenção criminal, não faltando, por isso, avalizadas opiniões a sustentarem a inconstitucionalidade de tal norma tendo em conta o disposto na CRP.
Porém, à data a que nos reportamos, não subsiste qualquer dúvida em como a localização celular do telemóvel da RSM apenas poderia efetuar-se se ordenada por despacho de autoridade judiciária e no âmbito de um processo crime que estivesse em curso, não se prevendo a possibilidade da mesma ser ordenada como medida de prevenção criminal, mesmo pelas autoridades judiciárias.
Sucede que, como já se viu, a PJ apenas tomou conhecimento da notícia do desaparecimento da RSM no dia 18.02.06, pelas 14h27m, após o Autor se ter deslocado às suas instalações a fim de apresentar a competente participação.
A essa hora, e como bem referiram os elementos do piquete da PJ ao Autor, não estava ao alcance dos mesmos obter a necessária autorização judicial para efeitos da localização celular do telemóvel da RSM posto que, por ser um sábado de tarde, os tribunais de turno já se encontravam fechados.
Ademais, estava-se perante um situação de desaparecimento de uma jovem adulta, sem que tivessem sido participado factos dos quais se pudesse suspeitar estar-se perante uma situação de crime a envolver a desaparecida, o que, por si, à partida, impedia que se avançasse de imediato para a localização celular do telemóvel da desaparecida.
Acresce referir que, ainda que assim não fosse e estivesse ao alcance da PJ proceder à localização celular do telemóvel da RSM, escassos 19 minutos após o Autor ter entrado nas instalações da PJ a fim de participar o desaparecimento da RSM, o telemóvel daquela desligou-se, pelo que o tempo de que dispunha para o efeito era de escassos 19 minutos, donde decorre poder concluir-se, de acordo com as normais regras da experiência de vida, que dificilmente tal localização celular se lograria conseguir, uma vez que tal pedido teria de ser remetido para a operadora e, esta, uma vez recepcionado esse pedido, teria de proceder a essa localização, tudo, tarefas cuja concretização, não vislumbramos que pudesse conseguir-se dentro dos indicados 19 minutos.
Deste modo, a não localização celular do telemóvel da RSM antes do mesmo se ter desligado não se ficou a dever a nenhuma atuação ilícita da PJ. Ademais, não existe nenhuma norma jurídica ou regulamentar da qual resulte que, perante o concreto circunstancionalismo que relatamos, outro comportamento se impusesse à PJ, não tendo o A. logrado demonstrar que a PJ tenha violado, com o seu comportamento, alguma norma jurídica ou regulamentar, ou ainda, qualquer norma de conduta que faça parte da praxis de atuação das polícias. (...)
No que concerne ao facto do pedido de localização celular ter sido remetido pelo MP de VNG sem previamente se ter diligenciado pela obtenção de despacho judicial, tal conduta não traduz qualquer atuação ilícita por parte da Sra. Magistrada do MP que interveio nesse procedimento.
Na verdade, sabe-se que ao tempo existia uma querela doutrinária e jurisprudencial a propósito da questão de saber se o acesso aos dados de tráfego e de localização estava incluído ou não no âmbito do elenco das competências do juiz de instrução criminal constantes do artigo 269.º do CPP vigente à data dos factos, havendo partidários da posição que entendia ser tal competência do juiz de instrução criminal e partidários da corrente oposta, como era o caso da Sra. Magistrada do MP que formulou o pedido de localização celular, que subscrevia o entendimento de que tal competência não se incluía no âmbito dos poderes do juiz de instrução criminal e que estava antes incluída no âmbito dos poderes atribuídos ao Ministério Público.
Porém, é de realçar que pese embora a Sra. Magistrada do MP fosse partidária da corrente que entendia ser desnecessária a intervenção do senhor juiz de instrução criminal para a formulação de um pedido de localização celular, a verdade é que mal rececionou a resposta da Optimus logo tratou de diligenciar pela obtenção do pretendido despacho judicial, tudo em ordem à rápida obtenção dessa informação, abdicando da discussão das razões que presidiram à sua atuação, o que, tudo, demonstra não ter existido qualquer atuação ilícita do MP, antes pelo contrário, os factos demonstram uma atuação competente e empenhada daquela senhora magistrada do MP.

Note-se que o Autor, pese embora repute a atuação da PJ e do MP de ilícita, não identifica as normas legais, regulamentares, estatutárias ou da praxis de atuação dos órgãos de investigação criminal, que terão sido violadas e, não o faz, porque, de facto, não conseguiu, tal como nós não conseguimos, identificar qualquer norma que tenha sido violada pelos referidos órgãos de investigação criminal.

Em suma, conclui-se que não houve atuação ilícita por parte das polícias ou do Ministério Público na condução do processo para a localização do telemóvel, o qual, de qualquer modo, acabou por se revelar impossível de localizar, por circunstâncias absolutamente estranhas àquela atuação.

4.4.2. O Recorrente alega também que foram omitidas diversas diligências, que entende que deviam ter sido tomadas logo após a participação do desaparecimento, concretamente, contactar as pessoas que rodeavam a desaparecida e as que lhe eram mais próximas; averiguar com quem a RSM tinha estado no dia anterior ao desaparecimento; alargar as buscas à área do Porto, não as mantendo confinadas a M.... Mais alega que o visionamento das imagens dos autocarros dos STCP só foi efetuado após as diligências empreendidas pelo próprio Recorrente para o efeito; que a participação ao Gabinete SIRENE foi feita de forma deficiente, tendo como consequência que o desaparecimento da RSM tivesse ficado omisso no espaço Schengen, Interpol e mesmo no sistema interno de informação do Estado, situação que só foi reparada em 2009; e que houve uma demora de mais de 15 dias, após a emissão do mandado necessário, na realização da busca do bairro do L..., efetuado depois de uma primeira ida ao local, sem mandado, pondo em crise o sucesso da diligência.

Como já anteriormente referimos, o juízo de prognose póstuma que aqui cabe fazer, para apurar se ocorreu violação dos deveres de conduta suscetível de configurar facto ilícito, implica que tomemos em consideração apenas os dados que à data eram conhecidos pelos órgãos e agentes a quem vêm imputados os factos ou omissões ilícitos. Dito de outra forma, implica que verifiquemos o que era exigível que fosse feito (tendo como padrão o funcionário médio) no dia em que foi comunicado o desaparecimento e nos dias seguintes, tomando em linha de conta os elementos que, à data, foram comunicados àquelas entidades e as circunstâncias concretas que rodearam o desaparecimento e a sua participação.

Como se refere na sentença recorrida, “A notícia do desaparecimento de uma pessoa de maior idade, quando desacompanhada de elementos que indiciem que a pessoa em causa possa ter sido vítima de rapto ou sequestro, coloca sempre a hipótese, prima facie, do desaparecimento ter sido um ato voluntário e, como tal, as diligências a encetar pelos órgãos policiais são, necessariamente, condicionadas por tal hipótese, sabendo-se, que em tais situações, as pessoas acabam, a maior parte das vezes, por aparecer (facto do conhecimento geral) e que, ainda que não o façam, tratando-se de uma pessoa maior e estando subjacente, em regra, a esses desaparecimentos, um comportamento voluntário da pessoa, a quem a ordem jurídica reconhece liberdade de reger a sua pessoa e bens, protegendo-a de intrusões no seu espaço de liberdade pessoal e autodeterminação.

Na verdade, podendo o desaparecimento de um jovem adulto constituir um ato voluntário, ainda que contra a vontade da respetiva família (e, em muitos casos, é o que acaba por suceder) e não havendo, à data, quaisquer indícios de que a falta de notícias da RSM estivesse associada a um crime, não havia fundamento para de imediato agir como se agiria na prossecução (investigação) de uma atividade criminosa (por exemplo, de um rapto ou sequestro). Esta diferente forma de atuação é uma exigência, além do mais, do respeito pela liberdade pessoal e autodeterminação pessoal, uma vez que as medidas mais eficientes para a localização de uma pessoa são necessariamente violadoras desse seu espaço de autonomia e liberdade. Como se salienta na decisão recorrida, o acionamento da máquina do Estado ao serviço da localização de uma pessoa que pode voluntariamente ter querido desaparecer, “pode traduzir uma conduta violadora da sua liberdade individual conferindo-lhe o direito de ser indemnizada pelos eventuais prejuízos que dessa conduta dos agentes do Estado para ela pudessem decorrer”.

Neste contexto difícil – que tem como polos, de um lado, a necessidade de agir com rapidez para obter resultados, quando há indícios de crime e, do outro, a necessidade de, perante a ausência desses indícios, evitar medidas invasivas da privacidade e da autodeterminação individual, que possam vir a revelar-se ilícitas – a identificação de quais as diligências suficientes e necessárias que devem ser adoptadas após a participação de um desaparecimento exige uma margem de apreciação por parte das forças policiais, a quem incumbem as primeiras averiguações e a quem cabe valorar as circunstâncias relatadas e dar-lhes a resposta adequada, a qual, pelas razões referidas, não é sempre a mesma, nem envolve necessariamente a movimentação de todos os meios disponíveis, pois obedece a princípios de legalidade, proporcionalidade e necessidade no uso dos recursos públicos, no respeito dos direitos individuais e na adequação das medidas a adoptar às circunstâncias que são conhecidas.

Por razões idênticas, o evoluir da situação (nomeadamente, o prolongamento injustificado da ausência e a falta de notícias, não obstante as averiguações entretanto efetuadas) pode conduzir – como no caso aconteceu – a que as medidas que inicialmente foram consideradas desproporcionadas ou desnecessárias, passem a revelar-se adequadas e justificadas.

Acresce que há também uma diferença substancial consoante o desaparecimento dê azo a um processo (informal) de averiguações (a cargo da Polícia Judiciária) ou seja tratado em sede de processo (formal) de inquérito (dirigido pelo Ministério Público, nos termos regulados no Código de Processo Penal) por haver indícios de crime.

Relembre-se que o presente caso foi inicialmente conduzido em sede de processo de averiguações, no âmbito da PSP e da Polícia Judiciária, uma vez que na data em que foi participado o desaparecimento e nos dias seguintes, após as várias diligências efetuadas, não se apurou qualquer indício suscetível de ser configurado como prática de crime (situação que, aliás, se mantém até hoje). Ainda que formalmente a participação policial tenha passado, logo em 21.02.2006, a ser tramitada como processo de inquérito, sob o NUIPC n.º 1.027/06.4 TAVNG, nessa data tal foi originado unicamente pela necessidade de proceder à localização celular do telemóvel que a desaparecida tinha na sua posse no momento em que foi vista pela última vez, solicitação essa que, à data dos fatos, só podia ser concretizada junto das operadoras de serviços móveis terrestres, através de pedido emanado de autoridade judiciária. Como salienta o Recorrido, nas suas contra-alegações, a existência formal de processo de inquérito, não retira ao mesmo a sua verdadeira natureza e as características de processo de averiguação na Polícia Judiciária, entidade que está encarregue de proceder às diligências de averiguação, com exceção das referentes à eventual prática de ato processual para o qual fosse (seja) necessário a intervenção de autoridade judiciária.

Perante o exposto, não se vislumbra nenhum erro ao considerar-se que o desaparecimento devia, num primeiro momento ser enquadrado no âmbito de um processo de averiguações e só, posteriormente, com novos dados e necessidade de obtenção de autorizações judiciais, ainda que mantendo-se a ausência de indícios de crime, tenha dado lugar a processo de inquérito, necessariamente mais formal e com outra dimensão. Nem tal erro pode ser assacado pela circunstância de se tratar do desaparecimento de uma adulta muito jovem e que foi logo referenciada como tendo perturbações mentais (cfr. pontos E), H) e I) dos factos). Pois, sendo maior de idade, não se encontrava interditada ou inabilitada, antes se movimentava livremente e com a autonomia própria da idade, de tal forma que só após uma ausência de mais de 24 horas a família considerou haver motivo para participar o desaparecimento à polícia.

O Recorrente alega que foram omitidas diligências que eram devidas, por não terem sido contactadas as pessoas mais próximas da desaparecida, nem averiguado com quem a RSM tinha estado no dia anterior ao desaparecimento, nem alargadas as buscas à área do Porto, não as mantendo confinadas a M....

Contudo, ficou provado que, no âmbito do processo de averiguações que se iniciou com a participação do desaparecimento, em 18.02.2006, os pais da desaparecida foram ouvidos e ficaram registados os seus relatos nas respetivas Informações de Serviço (dos quais constava, além do mais, que nenhum dos colegas ou amigos da RSM sabia do seu paradeiro ou tivera qualquer contato com ela desde a altura em que foi deixada, pela mãe, na paragem do autocarro); e, na mesma data, a Polícia de Segurança Pública elaborou a Ficha de Difusão, com fotografia, relativa ao “desaparecimento de adulto com perturbações mentais” e procedeu à sua difusão e da participação do desaparecimento pelas autoridades policiais; o Serviço de Piquete elaborou informações de serviço (em 18.02.2006 e 19.02.2006), que remeteu à Secção Regional de Informação Criminal e Polícia Técnica; e a PSP de M... enviou por fax (no dia 18.02.2006) a “Proposta de Indicação” para o Gabinete Nacional Sirene – cfr. pontos A) a J) dos factos.

Dos factos expostos, resulta, nomeadamente, que a polícia ouviu as pessoas mais próximas da RSM (os pais) e difundiu pelas autoridades policiais a notícia do seu desaparecimento, com fotografia e indicação de se tratar de “adulto com perturbações mentais”. Nesta fase, com os dados da questão que eram conhecidos e que já anteriormente mencionámos, não se inscrevendo o caso no âmbito de um processo de inquérito, por não haver suspeita ou indícios de crime (que pudessem motivar uma atuação diversa), não se afigura que as medidas adoptadas estejam aquém da margem de atuação que incumbe às entidades policiais, nem se vislumbra erro grosseiro nos procedimentos adotados.

Os factos provados também não suportam a alegação de que as “buscas” ficaram confinadas à área de M... e não foram alargadas à área do Porto, desde logo porque se provou que a PSP de M... difundiu a “Ficha de Difusão” pelas “autoridades policiais” e as suas informações de serviço foram remetidas à Seção Regional de Informação Criminal e Polícia Técnica (pontos E) e J) dos factos). Além disso, a partir de, pelo menos, 22 fevereiro 2006 e durante os meses seguintes, foram investigadas informações sobre alegados avistamentos da RSM ou de pessoas que com ela teriam sido vistas; e foram solicitadas informações junto dos hospitais e institutos de medicina legal, no sentido de apurar se aquela, ou o seu cadáver, ali tinham dado entrada (cfr., nomeadamente os pontos O), P), EE), FF), CC) e DD) dos factos). E em data não apurada concretamente, mas próxima do dia em que foi participado o desaparecimento, foram visionadas as imagens gravadas pelas câmaras do sistema de segurança do aeroporto e verificadas as listas de passageiros, com o propósito de apurar de a RSM teria viajado para o estrangeiro (e considerando que tinha dupla nacionalidade, portuguesa e holandesa), tendo estas diligências também resultados negativos (ponto Y), Z) e ZZZZZ) dos factos).

Quanto ao visionamento das imagens dos autocarros dos STCP, provou-se que o Recorrente, sabendo que a sua filha desapareceu junto ao mercado de M..., onde deveria ter tomado o autocarro para a zona de Serralves, conseguiu visionar as imagens das câmaras de vigilância dos autocarros que circularam naquela zona entre as 9:00 e as 9:30 e encontrou imagens da RSM (e contratou serviços informáticos para as analisar), tendo transmitiu essa informação à Polícia Judiciária que de seguida, em 24.02.2006, solicitou o visionamento de tais imagens à Administração dos Serviços de Transportes Colectivos do Porto, S.A e, no mesmo dia, os Inspetores da Polícia Judiciária efetuaram diligência externa, a qual ficou descrita no Relato de Diligência Externa, aos Serviços de Transportes Colectivos do Porto, S.A., onde foram visionados e recolhidos os vídeos obtidos através de câmaras instaladas em dois autocarros (cfr. os pontos AA), BB), BBBB), AAAAAA), BBBBBB), CCCCCC) e DDDDDDD) dos factos).

A circunstância de o Recorrente se ter antecipado à polícia nas diligências empreendidas para o visionamento das imagens dos autocarros dos STCP, ou de ter obtido análises técnicas mais detalhadas, em nada afasta a conclusão de que as autoridades policiais não incorreram na prática de ato ou omissão ilícitos, mas apenas documenta os enormes esforços que o próprio Recorrente fez para localizar a sua filha e os contatos que o mesmo tinha e que lhe permitiram visionar imagens que, em geral, não são de acesso público.

Sublinhe-se que a polícia manteve contacto com o Recorrente (e este com aquela), inteirando-se do resultado das muitas averiguações que este, por sua conta, também desenvolveu e que incluíram a contratação de um investigador particular, mas que, em qualquer caso, se revelaram sempre infrutíferas, quer em Portugal, quer no estrangeiro, nomeadamente, no Brasil (cfr., entre outros, os pontos GG) a KK), BBBBBBB), CCCCCCC) dos factos). Da mesma forma, as diligências efetuadas pelos serviços do Ministério Público junto das autoridades holandesas, francesas e espanholas tiveram resultados negativos (pontos PPP), QQQ) e QQQ1) dos factos).

O Recorrente alega também que houve uma demora de mais de 15 dias, após a emissão do mandado necessário, na realização da busca no Bairro do L..., que teria sido efetuada depois de uma primeira ida ao local, sem mandado, pondo em crise o sucesso da diligência.

A este respeito ficou provado que em 12.04.2006, o A. informou a Polícia Judiciária de que a RSM se poderia encontrar em casa de FNPD, numa morada identificada no Bairro do L...; que nesse mesmo dia, quatro agentes da polícia deslocaram-se à referida habitação para averiguar da veracidade da informação; e que a busca à residência foi autorizada por despacho judicial proferido em 12.04.2006 e foi realizada em 28.04.2006 (pontos QQ), RR), SS) e TT) dos factos).

Ou seja, provou-se que, tal como alegado pelo Recorrente, houve um lapso de tempo de cerca de 15 dias entre a emissão do mandado e a realização da busca, mas nada se provou que permita concluir que a deslocação dos agentes da polícia ao local, antes da emissão do mandado possa ter comprometido o sucesso da diligência ou que o tempo decorrido entre a emissão do mandado e a realização da busca pudesse ter comprometido a viabilidade de a mesma trazer algum elemento para o caso. Além disso, nada se provou quanto aos motivos subjacentes ao decurso de tal período de tempo, não se podendo concluir automaticamente que se tratou de uma inércia ou desinteresse, desde logo porque não pode excluir-se a hipótese de o mesmo se fundamentar em razões de oportunidade relativas à própria investigação.

O Recorrente alega, ainda, que a participação ao Gabinete SIRENE foi feita de forma deficiente, tendo como consequência que o desaparecimento da RSM tivesse ficado omisso no espaço Schengen, Interpol e mesmo no sistema interno de informação do Estado, situação que só teria sido reparada em 2009.

A este respeito provou-se que a PSP de M... participou o desaparecimento da RSM ao Gabinete Sirene em 18.02.2006, ou seja, logo a seguir à comunicação do desaparecimento; e que a Polícia Judiciária participou esse desaparecimento à Interpol em 2007 e ao sistema Schengen em 2009, com o esclarecimento que a participação ao Gabinete Sirene não chegou a ser inserida por aquele Gabinete, tendo, em 28.5.2009, sido criada a Ficha de Pessoa Procurada, Informação Interpol e Informação Schengen, relativa à RSM (pontos D), AAAA) e PPPPPP) dos factos).

O Gabinete Nacional Sirene (SIRENE, abreviatura para “Supplementary Information Required at the National Entries”), criado pelo Decreto-Lei n.º 292/94, de 16 de novembro, na dependência do Ministro da Administração Interna, é o responsável pela ligação com os restantes Estados membros do Acordo de Schengen e da Convenção de Aplicação, no âmbito do estabelecimento de relações conexas ao Sistema de Informação Schengen, constituindo uma unidade orgânica integrada no Sistema Nacional de Informação Schengen.

Os factos dados como provados são insuficientes para saber o que se passou na sequência da proposta de indicação feita ao Gabinete Sirene pela PSP de M.... Não há dúvida que tal informação foi transmitida àquele Gabinete por fax, logo no dia 18.02.2006, e que com ela foi enviada a “proposta de indicação” devidamente preenchida com o n.º de registo 676/06. Em 2009, ou seja passados mais de 3 anos, a Polícia Judiciária verificou que essa participação ao Gabinete Sirene não estava “inserida no sistema” (no Sistema de Informação Schengen), pelo que diligenciaram pela sua inserção. Mas, em rigor, não se sabe se a informação relativa à RSM nunca esteve no inserida no sistema, ou se foi inserida e posteriormente apagada. Além disso, e mais importante, ainda que, em 2006, possa ter havido algum erro (humano ou informático) que tenha motivado que, até 2009, não tenha existido uma “Ficha de Pessoa Procurada, Informação Interpol e Informação Schengen, relativa à RSM, ainda assim essa circunstância isolada não é suficiente para considerar que ocorreu a prática de algum ato ilícito ou violação de um dever de cuidado. Pois provou-se que a PSP de M... fez a comunicação que era necessária ao Gabinete Sirene, utilizando o procedimento legalmente previsto para o efeito, mas nada se provou sobre o que aconteceu com o registo n.º 676/06 neste Gabinete, apenas se sabendo que em 2009 não existia uma Ficha relativa à RSM, mas desconhecendo-se qual a situação nos três anos anteriores. Relembre-se que a investigação prosseguida pelas autoridades portugueses ao longo desse tempo incluiu várias diligências para o exterior, tendo sido feitos vários pedidos de colaboração a entidades estrangeiras e emitidas cartas rogatórias dirigidas às autoridades espanholas, francesas e holandesas; assim como foram verificadas listas de passageiros e visionadas imagens das câmaras de vigilância no Aeroporto Sá Carneiro, nada se tendo apurado por qualquer dessas vias.

Pelo que a circunstância de em 2009 se ter verificado que a ficha relativa à RSM não estava inserida no sistema, não obstante ter sido feito a competente comunicação com “proposta de indicação”, logo em 18.02.2006, é insuficiente para concluir pela verificação de um facto ilícito imputável ao Réu e causal dos danos invocados.

4.4.3. Em suma, a matéria de facto provada demonstra que as autoridades policiais que, num momento inicial, consideraram que era provável que se tratasse de um desaparecimento voluntário (avaliação que tinha fundamento objetivo nos dados à data conhecidos), ainda assim desenvolveram imediatamente, após a comunicação do desaparecimento, um conjunto de diligências com vista a tentar localizar a RSM (nomeadamente, através dos depoimentos recolhidos aos pais e da divulgação, pelas autoridades policiais, da “ficha de difusão” relativa a “desaparecimento de adulto com perturbações mentais”, com os dados e a fotografia da RSM, bem como das informações de serviço que o Serviço de Piquete remeteu à secção Regional de Informação Criminal e Polícia Técnica). Provou-se, ainda que, tendo o desaparecimento sido comunicado num sábado de manhã e apenas tendo a polícia judiciária sido informada do número de telemóvel da RSM na tarde desse sábado, as diligências para a localização desse aparelho só puderam iniciar-se na segunda-feira seguinte (21.02.2006), por já estarem fechados (desde as 13horas de sábado) os tribunais de turno; sendo certo, contudo, que se veio a verificar que nunca teria sido possível localizar o telemóvel, ainda que o procedimento se tivesse iniciado no próprio sábado, por terem mediado escassos minutos entre a informação dada à polícia sobre o aparelho e o momento em que este deixou de ter cobertura, não respondendo aos pedidos da rede (o que acontece quando perde repentinamente a cobertura ou é retirada a bateria). Nos dias, meses e anos que se seguiram, foi realizado, pela Polícia e pelo Ministério Público, um conjunto alargado de diligências (que, nomeadamente, incluíram o visionamento de imagens, contactos com pessoas que alegadamente tinham visto a RSM ou com quem alegadamente fora vista, busca a domicílio, verificação da lista passageiros no aeroporto, pedidos de informação aos hospitais e institutos de medicina legal). Também foi mantida comunicação frequente com o Recorrente, permitindo obter informações ou dados que este conseguiu encontrar através dos muitos esforços que fez, pelos seus próprios meios, para a localizar a sua filha, verificando-se, contudo, que nenhuma das pistas prosseguidas, quer pelas entidades policiais, quer pelo Recorrente, obteve o mínimo resultado. Com o passar do tempo, em especial a partir de 2009, realizaram-se muitas outras diligências, todas elas igualmente infrutíferas. Note-se, ainda, que apesar de ter sido expressamente atribuída natureza urgente ao processo de inquérito, por despacho de 13.03.2009, o certo é que o mesmo sempre foi tratado como tal (assim decorrendo do artigo 103.º, n.º 2, alínea b), do CPP e da própria informação constante dos autos de inquérito).

Nos factos descritos e nos acima analisados em mais pormenor, não se deteta qualquer omissão ou facto ilícito, nem violação das regras legais (que o próprio Recorrente não identifica) ou da leges artis da conduta policial ou do Ministério Público, que, em casos como estes, relembre-se não se rege por padrões de conduta rígidos, mas antes exige uma margem de atuação e valoração, orientada por princípios de legalidade, proporcionalidade e de necessidade. Também no uso dessa margem de autonomia não se encontra erro grosseiro ou diligência inferior à média.

Pelo que forçoso é concluir, como concluiu a sentença recorrida, pela falta de demonstração do facto ilícito, pressuposto indispensável da responsabilidade civil que vinha imputada ao Réu, com o consequente decaimento do recurso.

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5. Decisão

Pelo exposto, acordam em:

a) Rectificar o lapso de escrita constante da matéria de facto, com a consequente eliminação dos seus pontos RRRRR), SSSSS) e TTTTT); e modificar a resposta ao quesito 69, constante do ponto NNNNNN) dos factos provados, nos termos referidos;

b) No demais, negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.

Porto, 18.12.2015
Ass.: Esperança Mealha
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Hélder Vieira