Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00003/01 - PORTO
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/23/2006
Relator:Fonseca Carvalho
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Não se conformando com a sentença do TAF do Porto que julgou procedente o recurso contencioso interposto por José contra o despacho do Director da Alfândega do Freixieiro de 21 08 2000 que indeferiu o pedido de isenção de Imposto Automóvel e juros compensatórios no montante global de 920 250$00 veio a Fazenda Pública dela interpor recurso para o TCAN concluindo assim as suas alegações:
CONCLUSÕES
I É inaplicável ao caso em apreço o disposto no n.° 4 do art.° 12.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).
II. A douta sentença recorrida ao entender aplicar-se «in casu» o disposto no n.° 4 do art.° 12.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) e não a norma especialíssima contida no art° 99º da Reforma Aduaneira, na redacção dada pelo DL n.° 244/87, de 16 de Junho, fez errada interpretação e aplicação da lei III. Normas violadas: n.° 4 do art.° 12.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF); art.° 99.° da Reforma Aduaneira, na redacção dada pelo DL n.° 244/87, de 16 de Junho; art° 20.° do DL 264/93, de 30 de Julho.
Nestes termos, deverá dar-se provimento ao presente recurso e revogar-se a douta sentença recorrida.

Contra alegou o impugnante/recorrido da forma seguinte:
1 — A situação em apreço nos presentes autos não configura um acto de liquidação de receitas tributárias aduaneiras e, bem assim, cobranças não efectuadas em consequência de um acto fraudulento, mas antes um acto administrativo revogatório de um outro que concedera isenções fiscais e que se lhe aplicam, por isso e por força do estabelecido no n.° 4 do art.° 12° do EBF ou nos art.°s 2° do CPT, 2° ai. c) da LGT e 2° ai. d) do CPPT, as regras decorrentes da conjugação do art.° 141° do CPA e do art.° 28° da LPTA, e não a prevista no art.° 99° da Reforma Aduaneira, com a redacção que lhe foi dada pelo DL. n.° 244/87, a qual regula a caducidade do direito à liquidação.
II — De qualquer forma, atenta a matéria de facto dada como provada pelo douto tribunal “a quo”, sempre o despacho proferido pelo Director da Alfândega do Freixieiro em 2 1/08/2000 deve ser revogado, por se encontrarem preenchidos todos os requisitos ou condicionalismos necessários e previstos no art° 13° do D.L. n° 264/93 de 30 de Julho, para que o recorrido possa beneficiar da isenção requerida em Outubro de 1998.
III — Na verdade, conforme resulta da referida matéria de facto assente pelo tribunal “a quo”, o recorrente adquiriu o veiculo HH-RZ1264 num Estado membro da Comunidade Europeia onde tinha fixada a sua residência, isto é, na Alemanha, registando tal aquisição nesse pais em 29/01/98.
IV — O recorrente, conforme também resulta de tal matéria assente, transferiu a sua residência para Portugal em 09/09/1998.
V — Contrariamente ao doutamente decidido pelo tribunal “a quo”, encontram-se preenchidos os condicionalismo previstos nas ais. a) e b), do n° 1, do art° 13°, do D.L. n° 264/93 de 30 de Julho, pois que, apesar de ter cancelado temporariamente o seguro do seu veículo, tal não implica que o mesmo não estivesse afecto ao seu uso pessoal, na sua posse plena, com capacidade de o usar e fruir como entender.
VI — Além disso, entende ainda o recorrido que, o acto ou despacho proferido pelo Director da Alfândega do Freixieiro em 2 1/08/2000, o qual revogou o anteriormente proferido, em 13/10/1998, que deferiu a isenção do Imposto Automóvel, IVA e direitos aduaneiros requerida pelo recorrente, em Outubro de 1998, não está devidamente fundamentado.
VII — Assim, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 124°, n° 1, ai. e), 125° e 135°, todos do CPAdministrativo e sob pena de invalidade, os actos administrativos que, total ou parcialmente, revoguem um outro acto administrativo anterior deve ser fundamentado, isto é, deve conter expressamente uma clara e sucinta fundamentação de facto e de direito.
VIII — Ora, salvo o devido respeito, entende o recorrido que tal imposição legal não foi respeitada pela Alfândega do Freixieiro, pelo que deve o mesmo ser declarado nulo para todos os efeitos legais.
Termos em que, não tanto pelo que se deixa alegado, mas fundamentalmente pelo que V. Exas, como sempre, doutamente suprirão, negando provimento ao recurso, será feita a habitual sã Justiça.

O Mº Pº pronuncia-se pela incompetência em razão da hierarquia do TCAN
Colhidos os vistos cumpre decidir

Foi a seguinte matéria de facto que o Tribunal «a quo» deu como provada:
A - Em Outubro de 1998, o ora recorrente apresentou na Direcção de Alfândegas do Porto - Alfândega do Freixieiro, um requerimento solicitando a isenção de Imposto Automóvel, de IVA e de direitos aduaneiros, na importação do veículo automóvel marca Volkswagen, com a matrícula HH-RZ1264, o qual deu origem ao Processo VA4/4/945/98 (cfr. doc. de fls. 18 dos autos).
B - O pedido referido em A) foi deferido por despacho de 13/10/98 (cfr. doc. de f Is. 18 dos autos).
C - Em 18/08/00 foi elaborada pela Alfândega do Freixieiro uma informação em virtude do processo referido em A) ter sido objecto de triagem no âmbito do controlo a posteriori dos condicionalismos estipulados, previsto no artigo 20° do Decreto-lei n.° 264/93, de 30/07 (cfr. doc. de f Is. 21 dos autos).
D - A referida informação dá conta do facto de não se encontrar cumprido o condicionalismo previsto no artigo 13°, n.° 1, ai. b) do referido Decreto -lei, isto é, a afectação do veículo ao uso pessoal, no país de proveniência, pelo menos seis meses antes da transferência da residência (cfr. doc. de f Is. 21 dos autos).
E - O veículo em causa e identificado em A), foi adquirido na Alemanha pelo ora recorrente em 29/01/98, tendo deixado de circular nesse País a partir de 10/02/98 e até 07/09/98, por ter sido cancelado o seguro, embora tenha continuado na propriedade do ora recorrente, no mesmos país, até esta última data (cfr. doc. de fls. 33 dos autos).
F - O recorrente cancelou a sua residência na Alemanha em 07/09/98 (cfr. doc. de f Is. 7 do processo administrativo).
G - Na sequência da informação referida em b), foi proferido o seguinte despacho pelo Director da Alfândega do Freixieiro em 21/08/00 (cfr. doc. de fls. 22 dos autos): “face à informação supra, revogo o despacho de deferimento de 13/10/98 e indefiro o pedido de benefício fiscal. Proceda-se à cobrança a posteriori das imposições devidas. Participe-se em separado, nos termos do artigo 36° Dec. Lei n.° 376/A/89, de 25/10’
H - O referido despacho de 21/08/00 foi notificado ao ora recorrente por ofício n.° 05326, de 15/09/00 (cfr. doc. de f Is. 23 dos autos).

Fundamentacão da matéria de facto provada:
A convicção do tribunal quanto à matéria de facto provada alicerçou-se no conteúdo dos documentos juntos ao processo administrativo e acima indicados, os quais não foram impugnados.

As demais asserções da douta petição constituem conclusões de facto e/ou direito.

Entendeu o Tribunal «a quo» face à materialidade dada como provada que as
questões que importa apreciar e decidir no âmbito do presente processo são: a verificação dos vícios de violação de lei e de falta de fundamentação imputados ao acto pelo recorrente e a excepção da irrecorribilidade do mesmo, suscitada pela entidade recorrida.
Quanto à irrecorribilidade do a acto que é o despacho de 21/08/2000, proferido pelo Director da Alfândega do Freixieiro que acabou por revogar o acto administrativo que deferira o pedido de isenção de IA datado de 13 10 19888 considerava a Fazenda que não tendo o recorrente esgotado os meios de reclamação administrativa o acto se devia ter por não definitivo e consequentemente irrecorrível.
O Mº juiz «a quo» considerando o preceituado no artigo 243 do CAC e a doutrina emanada do TJCE considerou ser de aplicar ao caso o artigo 80 da LGT que prescrevendo a natureza meramente facultativa do recurso hierárquico salvo disposição em contrário permite a imediata impugnação contenciosa do mesmo e isto face ao preceituado já no CPT artigos 18 e 92 preceitos de aplicação em matéria aduaneira com a entrada em vigor da LGT o que aliás segundo o mº juiz derivaria também de uma interpretação do artigo 268 nº 4 da CRP
E face a todos os considerandos julgou não verificada a excepção da irrecorribilidade do acto.

Passando depois a apreciar o mérito da causa o mº Juiz «a quo» debruçou-se primeiramente sobre a invocada violação do disposto no artigo 13 nº 1 al b) do DL264/93 de 30 07 .
No entender da Alfândega não podia manter-se uma isenção de IA motivada por erro nos pressupostos de factos que a alicerçaram
No caso dos autos um dos requisitos constitutivos da isenção de IA fora o facto de se ter dado como provado que o veículo em causa estivera afecto ao uso pessoal do recorrente na Alemanha pelo menos por seis meses antes da transferência do recorrente para Portugal

Todavia a Alfândega apurou que o veiculo fora adquirido na Alemanha em 29 01 1998 pelo recorrente. Contudo desde 10 02 1998 até 07 09 1998 este veiculo esteve imobilizado por ter sido cancelado o contrato de seguro.
Segundo a Alfândega esta imobilização por cancelamento do seguro obsta a que seja concedida a isenção do IA por ser um dos requisitos constitutivos da isenção o facto de o veiculo além de ser propriedade do contribuinte estar durante o período legalmente definido na posse e fruição ou afectação do mesmo contribuinte o que o cancelamento do seguro obstaculiza.
O Mº juiz recorrido acabaria por sustentar esta tese pelo que decidiu que o despacho não sofria de violação de lei por erro nos pressupostos de facto.
Mas considerou verificado por parte da AT o vício de violação de lei designadamente por infracção do disposto no artigo 12 nº 4 do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Na medida em que proferiu o despacho revogatório para além do prazo que a lei lhe concedia para tal a Administração deixou de poder praticar tal acto cfr artiogo 12 /4 do EBF e 141 do CPA e 28 da LPTA.
Por preclusão do seu direito .
Daí que tenha julgado procedente o recurso

A Fazenda Publica insurge-se contra esta decisão por considerar inaplicável a este caso o nº 4 do artigo 12 dos EBF mas sim o artigo 99 da Reforma Aduaneira na redacção do DL 244/87 de 16 Junho.

Em contra alegações o recorrente ora recorrido pugna pela manutenção do decidido considerando que se encontram preenchidos os requisitos constitutivos da isenção do IA sendo que perante a factualidade dada como provada entende ainda que o despacho recorrido não se encontra fundamentado

Como se vê do anteriormente exposto as partes não questionam minimamente a matéria de facto constante do probatório da sentença.

Por tal razão o TCAN dá aqui como igualmente provados todos os factos constantes do probatório da sentença recorrida.

Aqui chegados fácil é de constatar que as questões que se põem neste recurso e que sumariamente analisamos são meramente de direito por interferirem directamente com a interpretação das normas ditas violadas ou se referirem a uma valoração e qualificação da matéria de facto dada como provada.

Porque das decisões dos Tribunais Tributários em 1º Instância que versem exclusiva matéria de direito cabe recurso directo para a Segunda Secção do Contencioso Tributário do STA o TCAN é incompetente em razão da hierarquia para conhecer deste recurso. Cfr. Artigo 280/1 do CPPT
Por tal razão acordam os Juízes do TCAN em julgar o TCAN incompetente em razão da hierarquia e abstêm-se de conhecer do recurso por ser competente para o seu conhecimento a 2ª Secção do Contencioso Tributário do STA.

Sem custas
Notifique e registe.
Porto 23 03 2006
José Maria da Fonseca Carvalho