Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00829/08.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/20/2012
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Paula Soares Leite Martins Portela
Descritores:CONCURSO PROVIMENTO
CRITÉRIOS AVALIAÇÃO
FIXAÇÃO - PRINCÍPIO IMPARCIALIDADE
Sumário:1- A fixação de critérios de avaliação na data da 1ª reunião do júri, ou seja, dois dias depois da publicação do aviso de abertura do concurso, quando o júri ainda não podia ter acesso aos currículos dos candidatos, só por si, não põe em causa o princípio da imparcialidade previsto no art. 18º nº3 al. c) do DL 437/91 de 8/11.
2- O 29º do DL 437/91 supra referido exige que os critérios de avaliação constem do aviso de abertura, pelo que a fixação dos mesmos pelo júri implica a violação do mesmo.
3- A reunião para a fixação dos critérios de avaliação, dois dias após a publicação do aviso de abertura do concurso, sem que deste constasse que tal iria acontecer viola a alínea g) do art. 27º do DL 204/98 de 11/6.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Data de Entrada:02/24/2011
Recorrente:Centro Hospitalar do Porto, EPE e outra
Recorrido 1:S...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Nega provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:CENTRO HOSPITALAR …, E.P.E. [CH…], e MA… e MC, Enfermeiras, contra-interessadas nos presentes autos de acção administrativa especial, interposta pelo Sindicato …, em representação da sua associada S…, inconformados, interpuseram recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo TAF do PORTO, em 11/10/2010, que julgou procedente a acção e anulou o acto impugnado - lista de classificação final do concurso interno geral de acesso para provimento de dois lugares de enfermeiro especialista em Enfermagem Comunitária do quadro de pessoal da ex-Maternidade ….
Para tanto o CH… alega em conclusão:
“1º - Discorda o aqui recorrente, da decisão do Tribunal de Primeira Instância que decidiu anular o despacho de homologação da lista de classificação final do concurso interno geral de acesso, para provimento de dois lugares de enfermeiro especialista em Enfermagem na Comunidade, no quadro residual de enfermagem da Maternidade …;
2º - É que, desde logo, com o devido respeito por opinião diferente, entende o recorrente que não se verificam as alegadas vicissitudes, tendo a decisão ora em feito, uma errada interpretação do direito aplicável, aliás desde logo no que concerne à invocada divergência entre o publicitado no DR e afixação dos critérios da acta n.º 1;
3º - Com efeito, contrariamente ao que se decidiu em sede de primeira instância, entende-se que com a publicação do aviso de Abertura, foi publicitada a constituição do Júri dando-se início ao procedimento e como resulta do conteúdo do referido anúncio, ai ficou definida a constituição do Júri, bem como, a fórmula de Classificação Final da Avaliação, tendo sido cumprido o estipulado no art. 27º do Decreto-Lei 204/98 de 11 de Junho;
4º - Entendendo-se por sistema de classificação final ”o conjunto de regras constituído pelas médias aritméticas simples ou ponderadas, das classificações a atribuir a cada um dos métodos de selecção a utilizar, pelos factores que os integram e respectivos Índices de ponderação” ;
5º - Daí que, o facto do Júri depois de constituído, ter elaborado a Acta n.º 1, não acarreta em nosso entender a anulabilidade do concurso, é que, tal como se impõe no artigo 16º do supra mencionado Decreto-lei o acesso à Acta n.º 1 ficou disponível, não tendo por isso sido coarctado qualquer direito à associada do ora demandante ou a qualquer outro interessado;
6º - Importa ainda, esclarecer que, aquando da reunião de 26 de Julho de 2007, o Júri do Concurso, não sabia nem podia prever quem iria concorrer pois, os currículos dos candidatos, foram entregues posteriormente, salientando-se ainda, que o teor do aviso de abertura respeitou a fórmula de cálculo para a seriação final dos candidatos;
7º - Com efeito, constata-se que, existiu divulgação atempada dos critérios de avaliação e ainda que, foi possibilitado o conhecimento dos mesmos, não só à associada do ora demandante como aos restantes concorrentes, aliás, os “sub-critérios” fixados na acta n.º 1, não foram fixados pelo Júri “a seu bel-prazer” mas sim de acordo com o estabelecido na lei;
8º - Há pois, que ter presente que nos métodos de selecção, a opção dos critérios é uma competência do Júri que os escolhe em função dos interesses da Instituição, no caso em apreço as vagas foram abertas na Maternidade …, não podendo, nem devendo o Júri desviar-se dos objectivos da Instituição, prestação de assistência no âmbito da saúde materno infantil atendendo assim, com tal escolha em nosso entender, às necessidades específicas da Instituição;
9º - Na verdade, pretendeu-se prover vagas em enfermagem na comunidade, e sendo a Instituição uma maternidade a experiência e a formação profissional nas áreas de Obstetrícia assumem uma importância fulcral, o que se alcança do teor da mencionada Acta nº 1, onde o Júri procedeu à definição dos critérios dos métodos de selecção, visando a ponderação do desempenho efectivo de funções na área de actividade para a qual o concurso era aberto, bem como, outras capacitações adequadas com a avaliação da sua natureza e duração;
10º - Entende-se assim que, os critérios selectivos constantes da referida Acta n.º 1, estão de acordo com a especificidade do concurso em questão – dois Enfermeiros da área especializada em Enfermagem na Comunidade numa Maternidade – o que justifica plenamente as regras que aí constam;
11º - Compete ao Júri, depois de publicado o aviso preencher os itens EP; (experiência profissional), FC (formação continua) e OER (Outras experiências relevantes) de acordo com os interesses da instituição de acordo com o tipo de vagas a prover de forma a poder seleccionar os candidatos que entende estarem melhor habilitados e mais capacitados para desempenhar as funções inerentes a tais vagas, podendo inclusive em nosso entender “ não ter em conta a experiência no sector privado “ uma vez que estamos perante um “ concurso interno” logo restrito e condicionado a “funcionários públicos”, sem que dai se possa concluir pela existência de qualquer irregularidade;
12º - É que, ao adequar tais itens às necessidades da instituição o Júri actuou em conformidade com a lei, sob pena de, não o fazendo, ver as vagas a concurso preenchidas por pessoal não especializado;
13º - Não há, em nosso entender, qualquer divergência, entre o que o Júri decidiu na Acta nº1 e o teor do Aviso de Abertura, pois, facilmente se verifica pelo seu teor, que este último se limitou a completar, o que havia sido, já estipulado no aviso e consequentemente não há violação dos princípios da Isenção e da Imparcialidade, pelo que, se afigura dever ser nesta parte a Douta decisão revogada;
14º - Entendeu também o Tribunal “a quo”, em nosso entender, por errónea interpretação da lei que, há violação da alínea c) do n.º 3 do art. 19.º do Decreto- Lei n.º 437/91, de 11-07 e consequentemente violação dos princípios da imparcialidade, transparência e isenção, concluindo em suma que tais vícios só seriam sanados se a acta n.º 1 tivesse sido publicitada;
15º - Ora, o Júri definiu na acta n.º 1 detalhadamente a metodologia a fixar na aplicação dos métodos de selecção, concretamente a fixação dos factores de apreciação da avaliação curricular, respectivos critérios e coeficientes de ponderação de cada factor, bem como a respectiva fórmula de classificação o que lhe era permitido ao que acresce o facto da acta n.º1 ter sido disponibilizada a todos os concorrentes que a solicitaram em cumprimento do estipulado no Decreto-lei n.º 204/98 de 11 de Julho;
16º - É que, a lei distingue entre divulgação de elementos essenciais e secundários e naqueles incluem-se os métodos de selecção, o seu carácter eliminatório, assim como, o programa das provas de conhecimentos e o sistema de classificação final;
17º - Só a divulgação destes elementos faz a lei incluir no núcleo duro das garantias preventivas de salvaguarda o cumprimento dos princípios concursais e é, com base neles que os candidatos têm de preparar o seu currículo, e documentar a sua candidatura;
18º - No presente caso, este conjunto de elementos foi publicitado no aviso de abertura do concurso tal como impõe o Decreto-Lei 204/98, de 11 de Julho, sendo que, a fixação dos restantes elementos é deixada ao Júri, apenas tendo o anúncio de dar a conhecer aos candidatos que assim será, o que foi feito e sobre estes elementos a lei apenas exige que haja decisão do Júri, mas não divulgação, visto que a mesma só ocorrerá a pedido do candidato;
19º - Como a lei não estabelece o "dies ad quem" para o Júri tomar esta decisão, tem-se considerado que a mesma tem de ocorrer até ao termo do prazo de apresentação das candidaturas, ora tal prazo não tinha ainda ocorrido e encontrava-se longe de ocorrer no caso em análise;
20º - Conclui-se que, na situação dos autos, o concurso foi aberto por Aviso publicado a 24.07.2007, e pelo prazo de 15 dias úteis a contar da data da publicação, a primeira reunião do Júri ocorreu a 26.07.2007, muito antes, pois, do termo daquele prazo, o que permite concluir que o júri observou as prescrições constantes da lei;
21º - Em síntese, o princípio da imparcialidade, referido no texto constitucional e recebido no art. 6º do CPA, decorre do princípio da igualdade e com ele está intimamente conexionado que o que através dele se pretende alcançar é um desempenho isento, concreto, imparcial, independente, sem privilégios, em resumo, sem a representação de factores de ponderação diversos daqueles que formam o centro do interesse juridicamente protegido;
22º - Assim, e sob pena de violação do princípio da imparcialidade administrativa, a fixação dos critérios de apreciação e ponderação da avaliação curricular, bem como do sistema de classificação final, incluindo a respectiva fórmula classificativa, deve ser feita em momento anterior ao conhecimento (real ou possível), pelo Júri, da identidade dos candidatos e, consequentemente, à abordagem dos respectivos currículos, o que significa que a fixação desses elementos não pode ocorrer depois de decorrido o prazo para apresentação das candidaturas, numa altura em que o Júri já tinha possibilidade de conhecimento da identidade dos candidatos.”
23º - Por outro lado, essa possibilidade de consulta das actas antes de elaboração dos currículos é essencial para a elaboração destes, como se tem entendido doutrinariamente, pois destina-se a permitir ao candidato definir a estratégia que entender mais correcta para poder alcançar o fim a que se propôs com a sua candidatura, ser nomeado, ora, tal objectivo foi claramente atingido, na verdade, tanto a associada do Demandante como os restantes concorrentes em nada viram prejudicado os seus direitos;
24º - Aliás, em momento algum dos autos, se demonstra ou prova que a elaboração e instrução da candidatura apresentada pela associada do demandante, seria ou teria sido diversa, ou que a irregularidade quanto ao teor do aviso de abertura do concurso tenha conduzido à elaboração duma deficiente candidatura em termos da escolha da melhor estratégia face ao sistema de classificação final definido para o concurso, ou, que em algum momento aquela tenha sofrido uma diminuição das suas garantias concursais em decorrência do modo como foi publicitado o concurso, em especial, o seu “sistema de classificação final;
25º - Ora, o propósito final e último em matéria de divulgação ou publicitação do sistema de classificação final e dos critérios de avaliação é o de permitir e assegurar aos eventuais e potenciais candidatos a definição da melhor estratégia para poderem alcançar o fim a que se propuserem, com a sua candidatura, ou seja, a nomeação para o lugar posto a concurso, mediante a apresentação da melhor candidatura, do melhor currículo para aquele lugar, e que tal desiderato seja efectivado no âmbito da Administração através dum procedimento concursal transparente, em igualdade de oportunidades entre candidatos e com imparcialidade e isenção, propósito este que foi efectivamente em nosso entender, conseguido, no caso ora em análise;
26º - Aliás, se a concorrente não solicitou a acta n.º 1, foi porque não o pretendeu, contrariamente às outras concorrentes. Pelo exposto, não podemos pois, concordar com a decisão sob recurso quando nesta se afirma que todo o sistema de classificação, incluindo a respectiva fórmula classificativa e a inerente indicação dos critérios de apreciação curricular, terá que constar do aviso de abertura ou de acta do júri já elaborada à data da sua publicação;
27º - Pelos motivos já alegados supra, discordamos também, do facto de se considerar que os requisitos que constam da acta nº 1 são inovadores, e, como tal, ao serem introduzidos após a publicitação em DR implicarem um encurtamento do prazo disponível para apresentação de candidaturas e consequente violação do princípio da imutabilidade do concurso;
28º - Na verdade, afigura-se que tais princípios são apenas um complemento do publicitado no Aviso de Abertura em cumprimento do estipulado no Decreto-Lei n.º 437/91, de 08/11;
29º - Discorda também o recorrente da decisão na parte em que se entende que foi o Júri quem estabeleceu a respectiva fórmula classificativa aquando da realização da acta nº 1, pelos motivos supra expostos, inexistindo em nosso entender violação do princípio da imparcialidade, é que, com o devido respeito por entendimento diferente, o Júri ao elaborar a acta n.º 1, estabeleceu critérios para os quais estava habilitado e dentro das suas competências;
30º - Com efeito, como resulta do conteúdo do referido anúncio, aí ficou definida a constituição do Júri, bem como, a fórmula de Classificação Final da Avaliação, tendo sido cumprido o estipulado no art. 27º do Decreto-Lei 204/98 de 11 de Junho;
31º - Daí que, o facto do Júri depois de constituído, ter elaborado a Acta n.º 1, não acarreta em nosso entender a anulabilidade do concurso, é que, tal como se impõe no artigo 16º do supra mencionado Decreto-lei o acesso à Acta n.º 1 ficou disponível, não tendo por isso sido coarctado qualquer direito à associada do ora demandante ou a qualquer outro interessado;
32º - Importa ainda esclarecer que, aquando da reunião de 26 de Julho de 2007, o Júri do Concurso, não sabia nem podia prever quem iria concorrer pois, os currículos dos candidatos foram entregues posteriormente, salientando-se ainda que, o teor do aviso de abertura respeitou a fórmula de cálculo para a seriação final dos candidatos inexistido a alegada violação do principio da imparcialidade;
33º - Constatando-se assim, pelo supra exposto, que existiu divulgação atempada dos critérios de avaliação e ainda que, foi possibilitado o conhecimento dos mesmos, não só à associada do ora demandante como aos restantes concorrentes;
34º - A tudo acresce que, o aviso de abertura que publicitou o concurso em apreço não é omisso quanto ao sistema de classificação, contendo igualmente a respectiva fórmula classificativa, inexistindo assim violação do preceituado na alínea o) do n.º 1 do artigo 29º consequentemente afigura-se que foram respeitados os princípios da imparcialidade transparência e isenção.
35º - Por ultimo, em relação ao ponto 8 do aviso de abertura, onde se menciona que o método de avaliação do concurso, é a avaliação curricular com base na experiência profissional, formação contínua e outras experiências relevantes, afigura-se que tal como estava obrigado o Júri limitou-se a complementar os referidos itens tendo como objectivo as necessidades da instituição e em nosso entender em momento algum se pode aferir que foi o Júri que estabeleceu a fórmula de classificação final;
36º - O aviso de abertura respeita em nosso entender o disposto na alínea o) do n.º 1 do artigo 29.º do Decreto – Lei n.º 347/91 de 8/11;
37º - Considerou o Tribunal de Primeira Instância, que o item respeitante à área de registos electrónicos (CIPE) é claramente violador do princípio de igualdade de oportunidades a todos os candidatos, posição esta da qual se discorda, é que, para o Júri poder apurar tal factualidade teria de cometer, aí sim, uma ilegalidade, violando claramente o princípio da imparcialidade, pois só, sabendo quem eram os candidatos poderia efectuar tal selecção;
38º - Ao Júri compete estabelecer previsões gerais e abstractas que se dirijam a uma generalidade de candidatos com diferentes e múltiplas características, às quais devendo consagrar para essas previsões, soluções valorativas e equitativas como foi o caso em análise. Ora, afigura-se assim ao recorrente que, com as escolhas dos critérios colocados em causa pela decisão em crise, tivesse o Júri violado qualquer dos princípios por si enumerados;
39º - Assim sendo entende-se que também nesta parte o Tribunal “a quo” fez um errada interpretação do estabelecido na alínea b) do n.º 3 do artigo 18.º do Decreto-Lei do Decreto-lei 437/91 de 8 do 11;
40º- Pelo exposto, ao decidir como decidiu violou o Tribunal de Primeira Instância por ter feito uma má interpretação e aplicação da lei nomeadamente do estipulado na alínea b) do n.º 3 do artigo 18.º, alínea c) do n.º 3 do art. 19.º na alínea o) do n.º 1 do artigo 29º do Decreto-Lei 437/91, de 11.07 do art. 27 do Decreto-Lei 204/98 de 11 de Junho e nos artigos 6º e 135º do C.P.A.;
Termos em que, concedendo V. Ex.ª provimento ao presente recurso e consequentemente revogando a decisão ora recorrida, substituindo-a por uma outra, que não considere nula a deliberação do Conselho de Administração, de 13 de Dezembro de 2007, que homologou a lista de classificação final do concurso interno geral de acesso para provimento de dois lugares de enfermeiro especialista em Enfermagem na Comunidade, do quadro residual de enfermagem da Maternidade …, farão como sempre Inteira e Sã Justiça.”
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As recorrentes contra-interessadas concluíram da seguinte forma as suas alegações:
“1ª Não ocorre qualquer violação do princípio da divulgação atempada dos critérios de selecção quando perante um aviso de abertura concursal incompleto o Júri do concurso procede à organização dessa completude durante o decurso do próprio prazo de apresentação das candidaturas;
2ª Isso mesmo aconteceu no procedimento de recrutamento e selecção em apreço em que o Júri reuniu a 26 de Julho de 2007, ao segundo dia posterior ao da publicação do aviso, a 24 de Julho de 2007 sendo de quinze dias úteis o prazo para apresentação das candidaturas;
3ª Por outro lado, não actuou o Júri nem contra legem nem em desarmonia com as regras constantes do aviso de abertura, respeitando a fórmula do método de selecção consagrado e limitando-se a operacionalizar a avaliação dos candidatos de acordo com os parâmetros habituais neste tipo de procedimentos, objectivamente justificados;
4ª Com efeito, e como ensina a doutrina, o júri veria a sua tarefa de apreciação das candidaturas dificultada – e os resultados dessa apreciação seriam deturpados ou enganosos – se não fosse dado o poder de fixar (e graduar) sub-critérios com vista à posterior classificação das mesmas»;
5ª Por outro lado, nenhum dos elementos densificados pelo Júri do procedimento é estranho ou anómalo por relação aos habituais requisitos;
6ª Nem a Autora, ou o douto acórdão recorrido demonstra ter havido densificação de qualquer sub-factor contra ou em desarmonia com o estatuto constante do aviso de abertura, o que se impunha para a procedência do alegado vício;
7ª Finalmente, não há qualquer violação do princípio da igualdade quando se elencam dezasseis sub-factores abarcando todas as áreas possíveis da experiência profissional, segundo critérios objectivos lançando uma álea favorecendo e prejudicando relativamente todos os candidatos.
8ª Não está sustentada em prova constante dos autos nem se afigura correcta a asserção do douto acórdão segundo a qual foi no caso sub judice «estabelecido um item que todos os potenciais candidatos não possuíam por impossibilidade objectiva»;
9ª Ao decidir como o fez violou o douto acórdão recorrido as normas dos arts 29º nº 1 alínea o) do Dec-Lei nº 437/91, de 8-11,na interpretação divergente da aqui enunciada que realiza para a decisão proferida, bem como a norma do art 18º nº 3 alínea b) do mesmo diploma ao adoptar um conceito de igualdade de condições que subverte o verdadeiro e correcto alcance da norma;
10ª Tudo o que, em ponderada reflexão, conduzirá à revogação do acórdão recorrido.
Termos em que, e nos melhores da douta ponderação de V. Exªs, deve proferir-se acórdão que revogue o acórdão recorrido, com as legais consequências, designadamente a de manter o acto originário impugnado”
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O Sindicato … apresentou contra-alegações em defesa da manutenção do acórdão recorrido, embora sem formular conclusões.
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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado para o efeito, não emitiu parecer.
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FACTOS FIXADOS EM 1ª INSTÂNCIA (e com relevância para os autos):

1. Mediante Despacho proferido a 25/06/2006, pelo Director Clínico da «Maternidade …» foi ordenada a abertura de concurso interno geral de acesso na categoria de enfermeiro especialista em enfermagem na comunidade fls. 4, 5 e 6 do PA.

2. Mediante Aviso (extracto) n.º 13253/2007, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 141, de 24/07/2007, foi aberto Concurso interno geral de acesso para provimento de 2 lugares de enfermeiro especialista em enfermagem na comunidade, do quadro de pessoal da Maternidade …, cujo teor era o seguinte:
«Por deliberação do conselho de administração de 20 de Junho de 2007 e no uso da competência conferida pelo artigo 22.o do Decreto--Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, encontra-se aberto pelo prazo de 15 dias úteis a partir da publicação do presente aviso no Diário da República concurso interno geral de acesso para provimento de dois lugares de enfermeiro especialista em enfermagem na comunidade, do quadro de pessoal desta Maternidade, aprovado pela Portaria n.º 313/99, de 12 de Maio.
2— Prazo de validade - este concurso é válido para o preenchimento das vagas postas a concurso e esgota-se com o seu preenchimento.
3— Legislação aplicável - o presente concurso rege-se pelo regime próprio da carreira de enfermagem, definido pelo Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.ºs 412/98, de 30 de Dezembro, e 411/99, de 15 de Outubro, e pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro.
4— Conteúdo funcional - as funções a desempenhar são as constantes do n.º 3 do artigo 7.o do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, e do Decreto-Lei n.º 412/98, de 30 de Dezembro.
5— Vencimento - o vencimento é o correspondente ao escalão e índice fixados no anexo ao Decreto-Lei n.º 411/99, de 15 de Outubro.
6— Local de trabalho - Maternidade … e outros locais decorrentes do âmbito de actividade desta Maternidade, sita no Largo …, ….
7— Requisitos de admissão:
7.1— Requisitos gerais - os previstos no n.º 3 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro;
7.2— Requisitos especiais - os referidos no n.º 2 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, com a nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 412/98, de 30 de Dezembro.
8— O métodos de selecção a utilizar será o da avaliação curricular, com base na seguinte fórmula:
CF= (EP×2)+(FC×1)+(OER×3)
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em que:
CF = classificação final (até 20 valores);
EP = experiência profissional (até 20 valores);
FC = formação contínua (até 20 valores);
OER = outras experiências relevantes (até 20 valores).
9— Apresentação das candidaturas:
9.1— As candidaturas devem ser formalizadas mediante requerimento dirigido ao presidente do conselho de administração desta Maternidade e entregue no Serviço de Pessoal, durante as horas de expediente, ou remetido pelo correio com aviso de recepção, expedido dentro do referido prazo, dele devendo constar os seguintes elementos:
a) Identificação completa do requerente (nome, filiação, naturalidade, residência e telefone, número e data do bilhete de identidade e serviço que o emitiu e o número de contribuinte);
b) Habilitações literárias e profissionais;
c) Identificação do concurso a que se candidata, fazendo referência ao Diário da República onde este aviso vem publicado;
d) As funções que exerce e instituição ou serviço onde trabalha e quadro a que está vinculado;
e) Identificação dos documentos que instruem o requerimento, bem como a sua sumária caracterização;
f) Quaisquer outros elementos que os candidatos reputem susceptíveis de influir na apreciação do seu mérito ou de constituir motivo de preferência legal, os quais serão considerados se devidamente comprovados.
10— Os requerimentos devem ser acompanhados, sob pena de exclusão, dos seguintes documentos:
a) Comprovativo do curso de enfermagem geral ou equivalente legal, devidamente registado;
b) Documento comprovativo das habilitações literárias;
c) Documento comprovativo da posse de uma das habilitações previstas no n.º 2 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, com a nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 412/98, de 30 de Dezembro;
d) Documento comprovativo da inscrição na Ordem dos Enfermeiros;
e) Declaração passada pelo serviço a que se encontra vinculado, comprovativa da existência e natureza do vínculo à função pública e do tempo de serviço na categoria, na carreira e na função pública, bem como a avaliação de desempenho referente ao último triénio;
f) Três exemplares do curriculum vitae.
10.1— Os candidatos ficam dispensados da apresentação dos documentos comprovativos dos requisitos enumerados no n.º 7.1 do presente aviso, desde que no requerimento do pedido de admissão ao concurso declarem, sob compromisso de honra, a situação precisa em que se encontram relativamente a cada um dos requisitos gerais.
11— Assiste ao júri a faculdade de exigir a qualquer candidato, em caso de dúvida sobre a situação que descrever, a apresentação de documentos comprovativos das suas declarações.
12— As falsas declarações serão punidas nos termos da lei.
13— A lista dos candidatos admitidos e excluídos e a lista de classificação final serão afixadas no placard do Serviço de Pessoal desta Maternidade.
(…)».

3. No dia 26/07/2007, foi realizada a 1.ª reunião do Júri do concurso na qual aprovou os critérios de avaliação curricular dos candidatos e o modo de contagem do tempo de serviço (fls. 232 a 234 do PA), nos seguintes termos:
«Foram estabelecidos os critérios de avaliação curricular dos candidatos ao concurso em epígrafe, de acordo com a seguinte fórmula:
CF= (E.P x 2) + (F.C. x 1) + (O.E.R. x 3)
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em que:
C.F - Classificação Final
E.P. - Experiência Profissional
F.C. - Formação Contínua
O.E.R - Outras experiências Relevantes
E.P.= Experiência Profissional - ≤ 20 Pontos
• Por cada ano de experiência em Serviços de Obstetrícia/Ginecologia = 1,5 Pontos
• Por cada ano de experiência noutros Serviços = 0,5 Pontos
F.C.= Formação Contínua - ≤ 20 Pontos
• Visitas de Estudo, como profissional, por cada 1 Ponto até ao máximo de 4 Pontos
• Colaboração com o Departamento de Formação no acompanhamento de Visitas de Estudo às Instituições - 1 Ponto
• Exercício de funções de responsável pela Formação em Serviço (Artigo 64° do Dec. Lei 437/91 de 08 de Novembro de 1991) = 1 Pontos
Como Formando:
• Por cada acção de formação organizada por DEP/ARS ou formação em serviço, entre 2000 e 2007 = 0,25 pontos até ao máximo de 4 Pontos
• Por cada acção de formação organizada por DEPIARS ou formação em serviço, antes de 2000 = 0,1 Pontos. até ao máximo de 1 Ponto
• Por cada acção de formação organizada por outros organismos entre 2000 e 2007 = 0,1 Pontos até ao máximo de 1 Ponto
Como Formador:
• Por cada acção de formação como Prelectora, Moderação de Mesas Redondas, Trabalhos Publicados, Apresentação de Posters entre 2000 e 2007 = 0,5 Pontos até ao máximo de 6 Pontos
• Por cada acção de formação como Prelectora, Moderação de Mesas Redondas, Trabalhos Publicados, Apresentação de Posters antes de 2000 = 0,25 pontos. até ao máximo de 2 Pontos
O.E.R.= Outras Experiências Relevantes - ≤ 20 Pontos
• Experiência em registos electrónicos (CIPE), em serviços de Obstetrícia/Ginecologia - 2 Pontos
• Experiência em registos electrónicos (CIPE) noutros serviços - 1 Ponto
• Responsável pela implementação do Projecto dos Registos Electrónicos (CIPE/SAPE)- 2 Pontos
• Orientação de alunos em estágio em Serviços de Obstetrícia/Ginecologia - 1 Pontos
• Orientação de alunos em estágio noutros Serviços - 0,5 Pontos
• Exercício de funções de responsável de turno em serviços de Obstetrícia/Ginecologia - 1 Pontos
• Exercício de funções de responsável de turno noutros Serviços - 0,5Pontos
• Integração de novos elementos em Serviços de Obstetrícia/Ginecologia – 1 Ponto
• Integração de novos elementos noutros Serviços - 0,5 Pontos
• Participação em Comissões ou Grupos de Trabalho, na área de Obstetrícia/Ginecologia, por cada -1 Pontos até ao máximo de 6 Pontos
• Participação em Comissões ou Grupos de Trabalho, noutras áreas, por cada - 0,5 Pontos até ao máximo de 2 Pontos
• Participação em Comissões de Escolha, por cada 1 ponto até ao máximo de 4 Pontos -
• Participação Comissões de Honra, Organizadoras, Cientificas ou Secretariados de Congressos/Jornadas por cada - 1 Pontos até ao máximo de 2 Pontos
• Participação em Projectos de Melhoria Continua da Qualidade - 2 Pontos
• Participação no Projecto dos Padrões de Qualidade em colaboração com a Ordem dos Enfermeiros - 1 Ponto
• Participação em Júris de Concurso da carreira de Enfermagem ou da carreira de Auxiliar de Acção Medica, por cada - 1 Ponto até ao máximo de 2 Pontos
Nota - O Júri decidiu ainda não contabilizar as experiências ou actividades desenvolvidas no sector privado ou em regime de acumulação. O júri não pontuará qualquer actividade feita no âmbito escolar (durante a formação base ou pós base)
Para efeitos da contagem de tempo o júri entendeu considerar como data limite o dia 31/07/07 e contabilizar as contagens ao dia
O júri decidiu considerar como Serviços de Obstetrícia/Ginecologia os serviços hospitalares de Internamento, Consulta Externa ou Bloco Operatório/Recobro de Obstetrícia e Ginecologia
A participação em Comissões ou Grupos de Trabalho só será contabilizada se ocorrer por nomeação do Enfermeiro Director ou Conselho de Administração.
Só serão aceites Declarações/Certificados emitidos pelos Enfermeiros Directores ou pelos Conselhos de Administração. Declarações/Certificados elaborados pelas Enfermeiras Chefes só serão contabilizados se emitidos pelos Serviços de Pessoal (Departamento de Recursos Humanos). Só serão contabilizadas as actividades documentadas
Em caso de igualdade de classificação final, serão aplicados os critérios previstos no Art.º 37.º n.º 7 do Decreto-Lei 437/91 de 8 de Novembro, com a nova redacção dada pelo Decreto Lei 412/98 de 30 de Dezembro. Subsistindo a igualdade de classificação após a aplicação dos critérios referidos o júri estabeleceu como critério de desempate a maior antiguidade profissional.
E para constar se lavrou a presente acta, que depois de lida e achada conforme, vai ser assinada por todos os elementos presentes ...»

4. A Autora foi opositora ao referido concurso e admitida, conforme Aviso (extracto) publicado no Diário da República, 2ª séria, n.º 177, de 13/09/2007.

5. Foi elaborado projecto de lista de classificação final, perante a qual a Autora se pronunciou ao abrigo do direito de audição prévia, não tendo sido acolhidos os seus argumentos e mantida a proposta de classificação das candidatas.

6. No dia 10/12/2007, o Júri deliberou a fixação da Lista de Classificação Final, bem como o seu envio ao Conselho de Administração para homologação.

7. A referida lista foi homologada por deliberação tomada em 13/12/2007 pelo Conselho de Administração do «Centro Hospitalar …, EPE» e publicitada conforme Aviso n.º 1072/2008, publicado no Diário da República, 2ª série de 11/01/2008.

8. Em 25/01/2008 a Autora interpôs recurso hierárquico necessário para o Ministro da Saúde (vide fls. 271 do PA).

9. Mediante despacho proferido a 12/02/2008, o Conselho de Administração da Entidade Demandada deliberou manter a decisão recorrida e notificar a subida do recurso.

10. A 11/04/2008, foi apresentada Petição Inicial tendo em vista a impugnação do acto de homologação da lista final.

11. Em 07/05/2008, foi espontânea e presencialmente apresentada Petição Inicial corrigida, com a indicação dos contra-interessados; o que não sucedia com a Petição Inicial primitiva; a qual foi admitida mediante despacho proferido a 16/03/2010, conforme fls. 309 dos autos.

12. Em 16/04/2008, foi proferido Despacho de indeferimento do recurso hierárquico (vide fls. 330 do PA), pela Secretária-Geral do Ministério …, com competências delegadas pela Ministra ….

13. O sistema de registos electrónicos (CIPE), à data da abertura do concurso, ainda não estava implantado em todos os serviços públicos – facto admitido por acordo ou não especificadamente impugnado.
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QUESTÕES QUE IMPORTA CONHECER
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, tendo presente que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º, n.º 3 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 140º do CPTA.
Mas, sem esquecer o disposto no artº 149º do CPTA nos termos do qual ainda que o tribunal de recurso declare nula a sentença decide do objecto da causa de facto e de direito.
A questão que aqui importa conhecer é se no concurso aqui em causa ocorreu divulgação atempada dos critérios de avaliação e se por isso foram violados os arts 27º do DL 204/98 e 19º e 29º do DL 437/91 assim como dos princípios da igualdade e da imparcialidade.

O DIREITO
Alegam os recorrentes a violação os princípios da igualdade e da imparcialidade.
E fazem-no quer relativamente a situações que integram em preceitos legais quer relativamente ao facto referido em 37 das conclusões das alegações.
Dispõe o art. 266º nº2 da Const. que "os órgãos e os agentes administrativos(...) devem actuar com justiça e imparcialidade no exercício das suas funções".
Diz Freitas do Amaral in Dº Administrativo, V.II, pág. 201 que este princípio significa que "a Administração Pública deve harmonizar o interesse público específico que lhe cabe prosseguir com os direitos e interesses legítimos dos particulares eventualmente afectados".
E, continua este jurista, salientando que este princípio comporta três corolários que se desdobram em três princípios: a) princípio da justiça "stricto sensu", b) princípio da igualdade e c) princípio da proporcionalidade.
Na verdade, como a jurisprudência e a doutrina têm sustentado, a igualdade deve ser compreendida com um sentido que vai para além, tanto do segmento formal (igualdade de todos perante a lei) alcançando a igualdade da própria lei e a igualdade para o direito [cfr Maria da Glória F P D Garcia, in Estudos Sobre o Princípio da Igualdade, Ed Almedina, 2005, de onde se destaca o seguinte:
«A igualdade é, pois, um conceito essencialmente comparativo».
«A igualdade é, pois, um conceito ligado a valores, não sendo possível estabelecê-la em concreto sem que se passe por uma prévia valoração da realidade».
«A desmontagem estrutural do princípio permitiu detectar o seu ponto nevrálgico – a opção ou escolha do critério. Permitiu também detectar que, sem valores, o princípio não tinha sentido nem actual e permitiu ainda compreender a razão pela qual uma concepção puramente lógico-formal não podia retirar do princípio ilações que não fossem puramente lógico-formais, e, consequentemente, inúteis para o mundo do direito, transformando-o em fórmula vazia. Daí que se tivesse «salvo» a força normativa do princípio através de uma sua materialização indirecta: evidência de um critério objectivo e suficiente de qualificação das situações como iguais, em função do fim a atingir com o tratamento jurídico».
«... quando Gomes Canotilho e Vital Moreira afirmam que do princípio da igualdade decorre a «obrigação de diferenciação para compensar a desigualdade de oportunidades»..., «o dever de eliminação ou atenuação, pelos poderes públicos, das desigualdades sociais, económicas e culturais, a fim de assegurar uma igualdade jurídico-material», têm este dever e aquela obrigação, em nosso entender, de ser reconduzidos ao que atrás se disse, isto é, à ideia de realização de justiça social que a Sociedade exige em cada momento da sua vivência histórica».
«Ao lado de uma igualdade puramente jurídico-normativa, desligada da intencionalidade da norma e preocupada somente com a justiça da aplicação da lei – igualdade de todos face à lei, o que implica, tendencialmente, a generalidade da norma – encontramos uma igualdade juridico-política, preocupada, por um lado, com o critério material de qualificação igual para efeitos de tratamento jurídico, e, por outro lado, com a própria intencionalidade da norma – igualdade da própria lei – critério e intencionalidade que, por sua vez, se encontram intimamente ligados ao processo formativo dos valores que lhes presidem – igualdade para o direito – quer na sua faceta política quer na sua faceta factual.
É este entendimento alargado que permite e promove uma maior confiança nas potencialidades do princípio da igualdade, na luta contra a injustiça. Compreende-se, pois, que os particulares cada vez mais o invoquem na sua ânsia de alcançar a justiça.
Concomitantemente, porque é este o entendimento unitário que do princípio da igualdade pode e deve ser feito, julga-se ter dissipado quaisquer dúvidas sobre a utilidade no mundo do direito, sendo, assim, de rejeitar a concepção de quem lhe reconhece uma carácter de fórmula vazia, juridicamente sem préstimo».
Ora, estes princípios relevam autonomamente quando a lei confere à Administração uma margem de autonomia decisória, constituindo um limite material interno ao poder discricionário.
Na verdade, se o acto for vinculado a eventual injustiça resulta directamente da lei, que o juiz não pode deixar de aplicar, salvo em caso de inconstitucionalidade. E, quando estamos perante um poder vinculado ou discricionário? O poder é vinculado na medida em que o seu exercício está regulado por lei. O poder será discricionário quando o seu exercício fica entregue ao critério do respectivo titular, deixando-lhe liberdade de escolha do procedimento a adoptar em cada caso como o mais ajustado à realização do interesse público protegido pela norma que o confere (Sérvulo Correia, Noções de Dº Administrativo, 1982, pág. 230.).
Discricionaridade é uma liberdade de decisão que a lei confere à Administração, a fim de que esta, dentro dos limites legalmente estabelecidos, escolha de entre várias soluções possíveis aquela que lhe parecer mais adequada ao interesse público. (Freitas do Amaral, Dº Adm., 2º V., pag.142, 1988).
Discricionário significa, pois, "livre dentro dos limites permitidos pela realização de certo fim. O fim é o vínculo: corresponde a um requisito de validade cuja falta produz a invalidade do acto administrativo ". (Manual de Dº Administrativo, 1º Vol., 1991, pág. 486, M.Caetano).
Segundo o princípio da Igualdade “nas suas relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum administrado em razão da ascendência, sexo, raça, língua…etc” art. 5º do CPA.
Mas também viola este princípio aquela diversidade de tratamento que não encontre justificação e fundamento na realização de outros interesses e princípios constitucionais e legais, também eles conformadores da actividade da Administração, e considerados preferentes, em abstracto pelo legislador, em concreto pelo autor do acto quando agindo no âmbito da sua discricionariedade.
De todo o modo e em qualquer caso, tratar desigualmente diversos administrados não será forçosamente violar o princípio da Igualdade, se afinal se estiver a tratar de modo desigual o que e no que é efectivamente desigual.
No caso sub judice está em causa a violação de preceitos legais que visam precisamente salvaguardar aqueles princípios contendo alguns preceitos conceitos que implicam precisamente a concretização destes mesmos princípios, alegando o recorrente que, contrariamente ao decidido em 1ª instância, não foram violados os arts 27º do DL 204/98 de 11/6 e 18º e 29º do Dl 437/91 de 8/11.
Para tanto refere que o facto de o «aviso de abertura do concurso» estar insuficientemente elaborado por, precisamente, lhe faltar a natureza de completude do «sistema de classificação final» a que se refere a norma do nº 2 do art 29º do Dec-lei nº 437/91 não implica que tenha havido qualquer alteração da fórmula prevista no nº 8 do Aviso de Abertura do Concurso.
A seu ver, esta «irregularidade», relativa à questão da «divulgação atempada» e à «harmonia entre o sistema de classificação previsto no aviso e a efectiva aplicação feita pelo Júri na sua primeira reunião não é adequada a provocar proporcionalmente a anulação de todo o procedimento.
A questão é, pois, a de saber se tendo sido publicado um dado aviso de abertura de um concurso cujo regime exija um desenvolvimento, o júri pode proceder ao seu desenvolvimento e em que termos o poderá fazer.
A este propósito decidiu-se em 1ª instância que:
No que concerne à invocada divergência entre o publicitado no DR e a fixação dos critérios na acta n.º 1, detecta-se que o Júri do concurso introduziu subcritérios em relação aos critérios estabelecidos no Aviso de abertura. Assim, nos critérios gerais EP (experiência profissional), FC (formação contínua) e OER (outras experiências relevantes), o Júri decidiu preenchê-los com itens estabelecidos a seu bel-prazer, sem que no Aviso de abertura se faça alguma referência a quais itens o Júri se podia socorrer. Por outro lado, o Júri deliberou atribuir a pontuação que muito bem entendeu a cada um desses itens ou subcritérios, sem que para o efeito estivesse mandatado pelo Aviso de abertura do concurso. Para além disso, o Júri decidiu inovar quando refere que não contabiliza as experiências ou actividades desenvolvidas no sector privado ou em regime de acumulação, sendo que o Aviso de abertura não prevê exclusões de qualquer tipo de experiência, limitando-se a estabelecer um critério genérico de experiência profissional, não se vislumbrando onde é que o Júri interpretou que apenas servia a experiência no sector público.
Refere a Autora que, nos termos do n.º 1 do art.º 25.º do Decreto-lei n.º 437/91, de 08/11, o Júri é o responsável por todas as operações do concurso e que segundo o disposto no n.º 1 do art. 28.º do mesmo diploma “o processo do concurso inicia-se com a publicação do respectivo Aviso de Abertura”, querendo com isto referir que não podiam ser aprovados critérios após a abertura do concurso, mostrando-se violado os princípios da isenção e da imparcialidade.
Refere a Entidade Demandada que a Acta n.º 1 foi disponibilizada aos concorrentes que a solicitaram, ninguém tendo ficado prejudicado e tendo sido cumprido o estipulado do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de Julho.
Não obstante a bondade da argumentação, compete referir que, tendo a Acta n.º 1 a importância que teve na introdução de elementos fundamentais para a classificação dos candidatos, deveria ter tido publicitação igual à que teve o Aviso de abertura (que não teve, uma vez que a acta n.º 1 não foi publicada no Diário da República), desconhecendo-se até em concreto qual foi a publicitação utilizada para a divulgação dessa Acta n.º 1, se bem que se antolhe não ter tido a devida publicitação, porquanto admitir-se que apenas foi disponibilizada a quem a solicitou, significa reconhecer que não existiu uma publicitação geral, sem necessidade de ser disponibilizada a cada sujeito interessado em concorrer.
Dispõe o art. 27º aqui em causa que:
1 - O concurso é aberto por aviso publicado nos termos do artigo seguinte, contendo os seguintes elementos:
a) Requisitos gerais e especiais de admissão ao concurso;
b) Remuneração e condições de trabalho;
c) Descrição breve do conteúdo funcional do lugar a prover;
d) Categoria, carreira, área funcional e serviço para que é aberto o concurso, local de prestação de trabalho, tipo de concurso, número de lugares a preencher e prazo de validade;
e) Composição do júri;
f) Métodos de selecção, seu carácter eliminatório, existência de várias fases, se for o caso, referência à publicação do programa de provas, se for caso disso, e ainda sistema de classificação final a utilizar;
g) Indicação de que os critérios de apreciação e ponderação da avaliação curricular e da entrevista profissional de selecção, bem como o sistema de classificação final, incluindo a respectiva fórmula classificativa, constam de actas de reuniões do júri do concurso, sendo a mesma facultada aos candidatos sempre que solicitada;
h) Entidade a quem apresentar o requerimento, com o respectivo endereço, prazo de entrega, forma de apresentação, documentos a juntar e demais indicações necessárias à formalização da candidatura;
i) Local de afixação da relação de candidatos e lista de classificação final.
2 - Nos avisos de abertura de concursos internos de acesso é dispensada a referência aos elementos previstos nas alíneas a) a c).”
Por sua vez o art. 18º do DL 437/91 refere que:
“1 - O concurso é o processo de recrutamento e selecção normal e obrigatório para o pessoal abrangido pela aplicação do presente diploma.
2 - O disposto no número anterior não se aplica ao recrutamento para o cargo de enfermeiro-director, o qual se processa nos termos do artigo 13.º
3 - O concurso obedece aos seguintes princípios:
a) Liberdade de candidatura;
b) Igualdade de condições e oportunidades para todos os candidatos;
c) Divulgação atempada dos métodos de selecção e do sistema de classificação final a utilizar;
d) Aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação;
e) Neutralidade da composição do júri;
f) Direito de recurso”
E, o art. 29º do mesmo diploma que:
“Do aviso de abertura deve constar, obrigatoriamente:
a) Identificação do despacho de autorização da abertura do concurso e das disposições legais permissivas;
b) Menção obrigatória à existência de despacho de descongelamento e ao parecer da Direcção-Geral da Administração Pública a que se refere o artigo 21.º, no caso de concursos externos;
c) Tipo de concurso e prazo de validade;
d) Localidade e estabelecimento ou serviço a que o concurso respeita;
e) Categoria, número de vagas a preencher e sua distribuição;
f) Índices remuneratórios correspondentes à categoria publicitada;
g) Descrição sumária das funções inerentes aos lugares a preencher;
h) Indicação dos requisitos gerais e especiais de admissão;
i) Entidade, e respectivo endereço, à qual devem ser apresentadas as candidaturas;
j) Prazo para apresentação das candidaturas;
l) Elementos que devem constar do requerimento e os documentos que o devem acompanhar;
m) Indicação expressa do presente diploma;
n) Composição do júri;
o) Métodos de selecção a utilizar, seu carácter eliminatório e sistema de classificação final;
p) Quaisquer outras indicações julgadas necessárias para melhor esclarecimento dos interessados;
q) Indicação do local ou locais onde serão afixadas, quando for caso disso, a lista dos candidatos e a lista de classificação final, bem como quaisquer outros elementos julgados necessários para melhor esclarecimento do interessados.
2 - Quando se tratar de concurso em que se torne necessária uma especialização em enfermagem, deverá o aviso de abertura mencionar expressamente a área de especialização exigida para o efeito.
3 - Sempre que o concurso vise a constituição de reservas de recrutamento, deverá tal objectivo constar expressamente do aviso de abertura.”
Desde logo o aviso de abertura de concurso foi publicado em 24/07/07 devendo os interessados apresentar no prazo de 15 dias a contar daquela data as suas candidaturas, que incluem, sob pena de exclusão, os curriculum vitae.
Daí que, à partida, ao fixarem-se os critérios de avaliação na data da 1ª reunião, ou seja, 26/07/07, o júri ainda não podia ter acesso aos mesmos pelo que facto, só por si, não poria em causa o princípio da imparcialidade previsto no art. 18º nº3 al. c) supra referido.
Relativamente a este preciso facto parece-nos que é diferente o prazo de dois dias ou de uma semana que é caso do acórdão do STA no proc. 1075/07 de 19/6/08, em que mesmo numa situação em que foi indicado no aviso de abertura do concurso que os critérios de avaliação seriam fixados pelo júri entendeu que mesmo assim tinham sido violados os referidos preceitos legais, com os seguintes fundamentos:
“A decisão recorrida anulou o despacho contenciosamente impugnado com base no seguinte discurso argumentativo :
“…Dir-se-á, então, que tudo estaria bem se a reunião em que o júri do concurso estabeleceu o sistema de avaliação final e os critérios de avaliação curricular e da entrevista profissional, previstos na al. g) do artigo 27°, não tivesse ocorrido em 16/11/99, ou seja, mais de uma semana depois da publicação do aviso de abertura de concurso (conforme ponto III. da matéria de facto).
Isto é o quanto basta para concluir que, com tal conduta, o júri violou os princípios constitucionais, da imparcialidade e da igualdade, consagrados no artigo 266.°, n.° 2, da CRP, vazados nos artigos 5.° e 6° do C.P.A, por violação dos 5°, alínea b) e 27.° al. f e g), do DL n.° 204/98, de 11 de Julho, independentemente de ter, ou não, existido um favorecimento ou desfavorecimento relativamente a qualquer dos opositores ao concurso.”
Uma vez que, naquele momento já havia a possibilidade do júri conhecer identidade de alguns candidatos ou dos seus currículos, e como a violação do princípio da imparcialidade não está dependente da prova de concretas actuações parciais, verificando-se sempre que um determinado procedimento faz perigar as garantias de isenção, de transparência e de imparcialidade (cfr. Ac. do STA de 13/01/2005 in Proc. n.° 0730/04).”
Diga-se, desde já que, face à factualidade assente, a decisão recorrida perfilha a orientação jurisprudencial pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo segundo a qual nos concursos de pessoal regulados pelo DL n.º 204/98, de 11-07, os métodos de selecção e o sistema de classificação final devem ser fixados e divulgados de forma a serem levados ao conhecimento dos interessados, potenciais candidatos, sempre antes da apresentação das respectivas candidaturas e a tempo de os mesmos poderem orientar a sua estratégia de acordo com as regras de avaliação e pontuação estabelecidas no concurso, devendo tais indicações constar do aviso de abertura, constituindo a inobservância de tais procedimentos violação do princípio da imparcialidade e ofensa do disposto no artigo 5º, n.º 2, al. b), e 27 n.º 1, al. f) e g), ambos do DL n.º 204/98, de 11-07 ( - Ver entre outros, os acórdãos da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo de :
- 19-02-97, do Pleno, no Proc.º n.º 28.280, in Ap DR de 28-05-1999, 307;
- 30-06-98, no Proc.º n.º 29574, in Ap DR de 26-04-02, 4693;
- 27-05-99, do Pleno, no Proc.º n.º 31962, in Ap DR de 8-05-2001,800 ;
- 15-01-2002, no Proc.º n.º47.615, in Ap DR de 18-11-2003, 107 ;
- 24-01-2002, no Proc.º n.º 41737, in Ap DR de 18-11-2003, 388 ;
- 7-03-2002, no Proc.º n.º 39386, in Ap DR de 18-11-2003, 1706 ;
- 13-11-2003, no Proc.º n.º 1524/02 ;
- 13-01-2005, no Proc.º n.º 730/04
- 3-02-05, no Proc.º n.º 952/04.).”
Pelo que, quanto a esta questão não nos parece que mereça acolhimento o entendimento vertido na sentença recorrida.
Contudo a questão não se resume a saber se o facto de os critérios de selecção terem sido fixados dois dias depois de publicado o aviso de abertura do concurso viola aquele preceito legal e os referidos princípios que aquele visa salvaguardar.
O DL 437/91 de 8/11 que regula a carreira de enfermagem refere no seu art. 29º alíneas o) e p) que têm que constar obrigatoriamente do aviso de abertura de concurso os métodos de selecção a utilizar, seu carácter eliminatório e sistema de classificação final e quaisquer outras indicações julgadas necessárias para melhor esclarecimento dos interessados.
Posteriormente o DL 204/98 de 11/7 veio regular a selecção de pessoal para a Administração Pública “ aplicando-se aos serviços e organismos da administração central, bem como aos institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos”(art. 2º nº1).
Põe-se assim a questão de saber se este preceito foi revogado por aquele art. 27º do DL 204/98, posterior.
Nos termos do artigo 7º do Código Civil:
“1. Quando não se destine a ter vigência temporária, a lei só deixa de vigorar se for revogada por outra lei.
2. A revogação pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior.
3. A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador.
4. A revogação da lei revogatória não importa o renascimento da lei que esta revogara.”
A revogação pressupõe, pois, a entrada em vigor de uma nova lei que pode ser expressa ou tácita (nº 2).
E, no caso sub judice, não tendo ocorrido qualquer revogação expressa cumpre-nos aferir se tal revogação foi tácita.
Vejamos então se há entre as disposições novas e as disposições antigas uma relação de recíproca que as torne inconciliáveis.
Parece-nos que sim.
É que, ou pode ou não pode, constar de acta do júri, a fixação de critérios de selecção.
E, estando em causa uma lei geral, que não revoga inequivocamente a lei especial, parece-nos que esta continua em vigor nesta parte.
De qualquer forma sempre teriam, no caso sub judice, sido violados ambos os preceitos.
É certo que no art.º 27 do DL 204/98, de 11/7 al. f) se exige que o aviso de abertura de concurso contenha o sistema de classificação final a utilizar.
Contudo, a al. g) do preceito citado permite que o sistema de classificação conste das actas de reuniões do júri do concurso, desde que seja indicada no respectivo aviso de abertura.
Mas, se no caso sub judice o júri se reuniu para esse efeito, dois dias após a publicação do aviso de abertura do concurso, fixando os critérios de classificação, o que é certo e que não constava do aviso de abertura, tal como o impõe a alínea g) do art. 27º do diploma em causa, que tal iria acontecer.
E tal impor-se-ia para que os candidatos tivessem a preocupação de averiguar a existência das actas que contivessem tais critérios.
A questão que se põe é a de acesso dos candidatos aos critérios de classificação a fim de que os seus currículos possam ser elaborados em conformidade, o que acaba por interferir na imparcialidade ao potenciar em abstracto que uns candidatos tenham acesso aos métodos de selecção e outros não.
E o conhecimento desses critérios de selecção tinha de estar perfeitamente comunicado e acessível.
Na verdade, a obrigatoriedade de divulgar atempadamente o sistema de classificação e os critérios de avaliação destina-se a colocar todos os candidatos em pé de igualdade, permitindo-lhes inteirarem-se dos critérios pelos quais irá ser pontuado e avaliado o seu mérito, só assim podendo estes saber quais são as probabilidades de serem providos e quais as provas que melhor devem preparar.
Em resumo, a divulgação atempada do sistema de classificação final e dos critérios de avaliação destina-se a permitir ao candidato definir a estratégia que entender mais correcta para poder alcançar o fim a que se propôs com a sua candidatura: ser nomeado.
Pelo que, tal como resulta da lei não basta que o sistema de classificação final e dos critérios de avaliação fossem definidos antes do conhecimento dos currículos e da realização dos métodos de selecção mas ainda que estivesse claro que os mesmos iriam ser definido através de acta.
O que não aconteceu.
Já o art. 29º do DL 437/91, exige que tais critérios constem do aviso de abertura, pelo que este foi inequivocamente violado.
Quanto à questão da natureza das «regras» concursais estabelecidas pelo Júri, ou seja, a questão de se saber se o Júri actuou contra e ou para além do consagrado no aviso de abertura, descaracterizando o regime originário do procedimento, entendeu a sentença recorrida que:
“Por sua vez, não podiam ter sido criados ou preenchidos, da forma como foram (nalguns casos inovadoramente), critérios após a Abertura do concurso, mesmo que dois dias após e ainda antes do termo do prazo de entrega das candidaturas. É que, por um lado, o Júri acaba por encurtar o prazo disponível para apresentação das candidaturas, e, por outro lado, introduz elementos já no decurso do concurso, violando-se o princípio da imutabilidade do concurso (mesmo que ainda não tivessem sido apresentadas quaisquer candidaturas).
Por outro lado, foi o Júri quem acabou por estabelecer o sistema de classificação final, incluindo a respectiva fórmula classificativa, uma vez que a pontuação atribuída nos subcritérios é da sua exclusiva responsabilidade, sendo a pontuação conferida a cada item o factor relevante para atribuição da classificação final.
Por seu turno, com a mera abertura do concurso, é possível, desde logo, anteverem-se potenciais candidatos, o que só por si impede que após a abertura sejam criados ou preenchidos critérios, porquanto, mesmo que não estejam destinados a alguém, não se mostra cumprido o princípio da imparcialidade, uma vez que este se basta com a simples hipótese de se poder admitir a lesão de eventual interesse de qualquer candidato.
Conforme vem sendo jurisprudência constante do Supremo Tribunal Administrativo, o simples risco de lesão e o perigo de parcialidade, constituem fundamento bastante para a anulação, mesmo que se desconheça em concreto a efectiva violação dos interesses de algum concorrente. Vide Acórdão do STA de 09/12/2004, proferido no processo n.º 0594/04 (em www.dgsi.pt).
Chama-se, ainda, à colação o Acórdão do STA de 19/06/2008, proferido no processo n.º 01057/07 (em www.dgsi.pt), cujo sumário se transcreve:
«I - Nos concursos de pessoal regulados pelo DL n.º 204/98, de 11-07, os métodos de selecção e o sistema de classificação final devem ser fixados e divulgados de forma a serem levados ao conhecimento dos interessados, potenciais candidatos, sempre antes da apresentação das respectivas candidaturas e a tempo de os mesmos poderem orientar a sua estratégia de acordo com as regras de avaliação e pontuação estabelecidas no concurso, devendo tais indicações constar do aviso de abertura.
II- O facto de o júri ter fixado o sistema de avaliação final e os critérios de avaliação curricular e da entrevista profissional depois da publicação do aviso de abertura do concurso, viola os princípios da imparcialidade e transparência bem como o disposto nos artigos 5º, n.º 2, al. b), e 27 n.º 1, al. f) e g), ambos do DL n.º 204/98, de 11-07, a tal não obstando o facto eventual de, nessa altura, ainda não ter tido conhecimento dos elementos que integravam as situações concretas dos concorrentes».
Determina a alínea c) do n.º 3 do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 437/91, que o concurso obedece ao princípio da divulgação atempada dos métodos de selecção e do sistema de classificação final a utilizar, devendo como tal, interpretar-se que a divulgação deve ser efectuada no Aviso de abertura..(…)”
Ora, se é verdade o que aqui vem dito tendo por referência o art. 29º nº1 al. o) do DL 437/91, já tendo em conta a al. g) do art. 27º do supra referido DL 204/98 é permitido que o júri fixe critérios de apreciação e ponderação da avaliação desde que no aviso de abertura se refira que tal irá acontecer.
E, não nos parece que, por isso, esteja o júri, no caso concreto, e apenas à luz do referido art. 27º, impedido de estabelecer os critérios a que se refere em 3 da matéria de facto ao abrigo deste preceito, isto é, se do aviso de abertura constasse que os mesmos iriam ser fixados em acta, o que não aconteceu.
Por outro lado o facto de o recorrido nada ter dito na petição no sentido de que o seu currículo seria diferente se tivesse conhecimento do conteúdo da acta da 1ª reunião do júri não é de molde a alterar a decisão.
Pelo que, apesar de, mesmo que fosse aplicável ao caso sub judice o artigo 27º al. nº1 al. f) e g) do DL 204/98 de 11/7, este ter sido violado, parece-nos que este não revogou o art. 29º do DL 437/91, porque norma especial, tendo este sido claramente violado nos termos supra referidos.
Alega também o recorrente a violação da alínea b) do n.º 3 do art. 18º do DL 437/91, nomeadamente a princípio da igualdade e condições de oportunidade ao estabelecer o item respeitante à área de registos electrónicos já que só sabendo quem eram os candidatos poderia efectuar tal selecção.
Entendeu a sentença recorrida que:
“…No que concerne ao estabelecimento de itens respeitantes à área de registos electrónicos (CIPE), como violadores do princípio da igualdade por não estar tal sistema implantado em todos os serviços, cumpre perguntar se o Júri devia eliminar tal item em face da não concretização daquele programa em todos os serviços públicos, independentemente de se saber quais seriam os candidatos.
Estabelece a alínea b) do n.º 3 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 437/91, que o concurso deve conferir igualdade de condições e de oportunidades a todos candidatos.
Ora, sabendo-se de antemão que determinado sistema ainda não estava operacionalizado em todos os serviços públicos e atribuir à experiência na utilização desse sistema uma valoração, implica necessariamente beneficiar uns candidatos (os já utilizadores de registos electrónicos - CIPE), em detrimento de outros não utilizadores de CIPE. Ainda que tal tivesse involuntariamente sido decidido, acaba por, na prática beneficiar uns em relação a outros.
Assim, a introdução de tal item acaba por ser violador do princípio da igualdade de oportunidades, uma vez que é o próprio Estado que não conferiu uma igualdade de exercício na profissão e ao mesmo tempo está a desigualar essa situação num concurso público. Logo a diferenciação não decorre de uma característica subjectiva ou que esteja no âmbito da disponibilidade de cada candidato, mas antes de uma impossibilidade objectiva – a ausência de CIPE em todos os serviços públicos onde exercem funções os potenciais candidatos.”
É que, independentemente de poderem concretamente serem ou não afectados os eventuais candidatos ao concurso, o que é certo é que em abstracto tal possibilidade existe, o que basta para a violação do referido princípio, que não pressupõe uma concreta violação do mesmo, antes se bastando com essa possibilidade.
É, pois, de negar provimento ao recurso.
*
Em face de todo o exposto acordam os juízes deste TCAN em negar provimento ao recurso nos termos supra expostos.
Custas pelo recorrente.
R. e N.
Porto, 20/01/012
Ass. Ana Paula Portela
Ass. Maria do Céu Neves
Ass. João Beato Sousa