Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00139/09.7BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/14/2012
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA
PRESCRIÇÃO
NOTIFICAÇÃO
RECLAMAÇÃO GRACIOSA
TEMPESTIVIDADE
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
CASO DECIDIDO
CASO RESOLVIDO
Sumário:I - Das decisões de indeferimento de reclamações graciosas cabe sempre impugnação judicial, a deduzir no prazo referido no n.º 2 do artigo 102.º do CPPT, independentemente de nelas ter sido ou não apreciada a legalidade do acto de liquidação que foi administrativamente impugnado.
II - Só a tempestividade da reclamação graciosa abre à impugnante, neste caso, a possibilidade de discutir a legalidade das liquidações impugnadas, pois a sua extemporaneidade da reclamação ainda que não consequencie a extemporaneidade da impugnação conduz à sua necessária improcedência, por se reagir, então, contra um caso decidido ou resolvido.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:G..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
I - RELATÓRIO
G… - INDÚSTRIA E TRANSFORMAÇÃO DE CARNES, LDA, NIPC 500…, com sede na …, Miranda do Corvo, impugnou a decisão de indeferimento, datada de 06.01.2009, do recurso hierárquico relativo às liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios com os números 00068116 (relativa ao período 09 de 1997, no montante de € 4 831,42), 00068117 (relativa ao período 12 de 1997, no montante de € 3 404,10) e 00068118 (relativa ao exercício de 1997 no valor de € 30 961,50).
No Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra foi proferida sentença que julgou verificada a caducidade do direito de impugnar, decisão com que a impugnante não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.
Alegou, tendo concluído da seguinte forma:
A) No articulado inicial, a impugnante alegou para além das questões do incumprimento das formalidades na notificação dos actos e da tempestividade da apresentação da reclamação graciosa, o vício de violação da lei traduzido na errada apreciação dos elementos de facto e na errada quantificação da matéria colectável e como resulta da decisão recorrida, o Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre o apontado vício de violação da lei.
B) No presente caso, está fora de qualquer dúvida que o tribunal apenas se pronunciou sobre a prescrição, o vicio do incumprimento das formalidades da notificação e sobre a tempestividade da reclamação graciosa e não avançou para o conhecimento das outras duas questões relativas ao vicio mais forte da violação da lei e são, por isso, imprescindíveis à decisão da causa.
C) Resulta dos artigos 660º do CPC e 95º nº1 do CPTA, que o tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, sejam de natureza processual - artigo 660º nº 1 do CPC - ou substantiva, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e deve limitar-se a tais questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
D) O tipo de vício de forma em causa traduz-se na violação do preceituado no art.º 660º, nº 2 do CPC, na medida em que estatui sobre o poder dever, estritamente vinculado, dos tribunais, de conhecerem de todas as questões que lhes sejam submetidas pelas partes para tal fim, com excepção daquelas, apenas, que vejam a respectiva solução prejudicada pela que haja sido dada a outra ou outras entretanto apreciadas.
E) A omissão de pronúncia significa ausência de posição expressa ou de decisão expressa do tribunal sobre as matérias que os sujeitos processuais interessados submeteram à apreciação do tribunal em sede de pedido, causa de pedir e excepções, bem como sobre as que sejam de conhecimento oficioso, isto é, de que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.
F) O tribunal a quo, nada disse sobre o vicio de violação da lei e, assim, é notório que há ilegal omissão de pronúncia, i.e., nulidade da sentença.
G) Nos presentes autos estão em causa as liquidações adicionais de IVA relativas aos períodos 07 e 12 do ano de 1997 e respectivos juros compensatórios.
H) O prazo de prescrição era, à data em que se verificaram os factos tributários, de 10 anos, nos termos do artigo 34°, nº 1 do Código de Processo Tributário, aprovado pelo D.L. nº 154/91, de 23 de Abril.
I) Todavia, atendendo à nova redacção do artigo 49° da LGT, introduzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29.12, em especial os seus nº 3 e 4, a impugnação já não tem efeito interruptivo por terem ocorrido outras, anteriormente, e, por outro lado, não ocorre a suspensão até à decisão definitiva na reclamação, pois que esta tinha já sido decidida aquando dessa alteração legislativa.
J) Assim, desde a data da cessação do efeito interruptivo ocasionado pelo recurso hierárquico, que ocorreu a 10.4.2007, até hoje, decorreram 3 anos, 9 meses e 15 dias que, somados aos períodos acima contabilizados, excedem o prazo de prescrição de 8 anos.
K) Resulta ainda dessa disposição legal que não ocorre a suspensão até à decisão definitiva na reclamação, pois que esta tinha já sido decidida aquando da entrada em vigor alteração legislativa constante da Lei nº 53-A/2006 de 29/12.
L) Deste modo, verifica-se se encontrar prescrita a dívida.
M) Conforme resulta do P.A., a Administração Tributária remeteu ao sujeito passivo carta registada com aviso de recepção, com vista à notificação das liquidações adicionais de imposto e juros.
N) Os AR dessas cartas foram remetidos pelos CTT à Administração Tributária sem a assinatura dos correspondentes avisos de recepção pela sócia gerente da impugnante.
O) A partir da entrada em vigor do CPT e do seu artigo 65º, todos os actos tributários, qualquer que seja o imposto em causa, que alterem a situação tributária do contribuinte, devem ser notificados por carta registada com A/R, sob pena de omissão de formalidade legal que conduz à inexigibilidade do imposto liquidado.
P) No caso estamos, antes, perante uma alegada concretização efectiva de tal notificação, uma vez que o recibo de A/R que corresponde ao registo do envio da mesma, à recorrente, se mostra assinado no local, para o efeito reservado ao destinatário.
Q) Só que está por demonstrar que quem assinou o referido AR fosse alguém que, no dizer da lei, estivesse presente no domicílio do contribuinte, o que, necessariamente, implica que se não possa concluir que a recorrente foi, efectivamente, notificada do acto de liquidação.
R) Sendo assim foi omitida formalidade essencial quanto à notificação dos actos de liquidação, pelo que esta não pode validamente considerar-se efectuada.
S) Em consequência a dívida é inexigível, constituindo tal inexigibilidade fundamento de recurso contencioso das liquidações.
T) O sujeito passivo tomou conhecimento das notificações das liquidações adicionais de imposto efectuadas pelos Serviços em 31/01/2001, apresentou o sujeito passivo reclamação graciosa na secção de processos do serviço de Finanças de Miranda do corvo em 06/02/2001.
U) Por conseguinte, a reclamação graciosa foi apresentada no prazo de 90 dias previsto na alínea a) do nº 1 do art. 102º e do nº 1 do art. 70º do CPPT.
V) Em suma, não ocorre caducidade do direito de impugnar os actos de liquidação.
Deverá, assim, ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e anulando-se o acto de liquidação impugnado.
Não houve contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso.
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões a conhecer no presente recurso são, da omissão de pronúncia, da prescrição da dívida exequenda e do erro de julgamento sobre a omissão de formalidade legal que conduz à inexigibilidade do imposto, tempestividade da reclamação graciosa e da caducidade do direito de impugnar a liquidação.
III – FUNDAMENTAÇÃO
III -1. Matéria de facto
O Tribunal “a quo” deu como assente a seguinte matéria de facto,
Para conhecimento da excepção da prescrição:
a) A execução fiscal foi instaurada em 21.12.2000;
b) G…– Indústria e transformação de Carnes, ld.ª, foi citada pessoalmente no âmbito da execução fiscal supra a 27.12.2000;
c) G…– Industria e Transformação de Carnes, ld.ª, apresentou reclamação graciosa a 06.02.2001;
d) A reclamação graciosa referida supra esteve parada entre 20.02.2001 e 27.02.2005;
e) A 17.01.2006 G…– Indústria e Transformação de Carnes, Ld.ª apresentou recurso hierárquico;
f) O recurso hierárquico esteve parado entre 10.04.2006 e 08.01.2009;
g) Em 16.02.2009 G…– Industria e Tranformação de Carnes, ld.ª instaurou a presente impugnação judicial;
Fixação dos factos relevantes para o mérito da causa:
1. G… - Indústria e Transformação de Carnes, Lda é uma sociedade por quotas com o capital social de € 71 819,69, constituída por escritura pública de 29 de Julho de 1977 e matriculada na Conservatória de Miranda do Corvo;
2. A sociedade referida tem como sócios Maria…, titular de duas quotas com os valores nominais de e 37 409,84 e de € 17 457,93 e José … com uma quota de € 19 951,92;
3. A gerência da sociedade pertence a Maria…;
4. Quanto à forma de obrigar é necessária a assinatura do, sócio José…;
5. A sociedade mencionada tem por objecto a indústria e comércio de carnes com o CAE 611111, encontrando-se enquadrada em sede de IVA no regime normal de periodicidade mensal no Serviço de Finanças de Miranda do Corvo;
6. Pela ordem de serviço nº 27963 de 31.08.1999 foi ordenada inspecção externa à sociedade supra referenciada, relativamente aos exercícios de 1995 a 1998;
7. Foi elaborado relatório de inspecção tributária a 30.03.2000, o qual foi alvo de despacho favorável pelo director de finanças a 05.04.2000;
8. Procedeu-se à notificação do relatório de inspecção tributária, tendo sido remetida carta registada com aviso de recepção para a seguinte morada:
(…)
9. Do respectivo aviso de recepção consta o seguinte:

10. Foi remetido à sociedade para a morada referida carta registada com registo de 22.05.2000 convidando-a a exercer direito de audição;
11. A contribuinte exerceu direito de audição prévia por escrito;
12. Das conclusões do relatório de inspecção, relativamente ao ano de 1997, resulta o seguinte:

13. Procedeu-se ao procedimento de revisão da matéria colectável;
14. Foi remetida para a morada referida em 8) a liquidação adicional nº 00068116, relativo ao período 09 de 1997, no montante de € 4 831,42; a liquidação adicional nº 00068117, relativa ao período 12 de 1997, no montante de € 3 404,10; e a liquidação adicional nº 00068116, relativa ao exercício de 1997, no montante de € 30 961,50, todas com data limite de pagamento de 31.07.2000;
15. Dos respectivos avisos de recepção consta o seguinte:

16. Em 06.01.2001 apresentou reclamação graciosa da qual consta o seguinte:
1º - Quanto à Liquidação nº 0068118-97 referente a IVA, no valor de 6.207.224$00, esta liquidação deverá ser anulada.
2º - Já que se refere a Vendas a Dinheiro com os nº s 009820 e 009814 de 31/12/1997 e 30/09/1997, respectivamente, (Doc. n° 4 e 5), as quais por lapso foram incluídas nas vendas do ano de 1999 e enviadas na declaração periódica de Janeiro de 1999.
3º - Caso assim não fosse, estaria a ser exigido à firma o pagamento em duplicado.
4º - As liquidações nº 0068117-97/12 e nº 006811697/09, respectivamente no valor de 682.461$00 e 968.612$00, relativas a juros de mora, também terão que ser rectificadas, dado que os dias mencionados são superiores aos reais.
Assim, teremos:
Venda a dinheiro
Imposto a entregar
Imposto entregue
30/09/199710 Novembro 1997 Decl. P. 01/99 – 10.03.99
31/12/199710 Fevereiro 1998 Decl. P. 01/99 -10.03.99

5 - Daqui se conclui que os dias para os respectivos juros não são relativamente à Liquidação nº 0068116 de 97/09 de 923 dias, mas sim, 485 dias. E para a Liquidação n° 0068117 de 97/12, não serão de contabilizar 831 dias, mas antes 393 dias.
Requer-se assim, a V. Exa. atentos os motivos supra invocados e os documentos juntos, se digne deferir a presente reclamação.
17. O sujeito passivo foi notificado por carta registada da proposta da decisão de indeferimento da reclamação graciosa;
18. O sujeito passivo apresentou direito de audição escrito a 11.10.2005;
19. O sujeito passivo foi notificado da decisão final por ofício de 13.12.2005, que lhe indeferiu a reclamação graciosa apresentada;
20. O sujeito passivo apresentou recurso hierárquico a 05.01.2006;
21. Por ofício de 26.01.2009 o sujeito passivo foi notificado da decisão final do recurso hierárquico, a qual confirmou a decisão de indeferimento;
22. A 16.02.2009 apresentou a presente impugnação.
“… FACTOS NÃO PROVADOS
Todos os restantes, sendo com interesse para a decisão da causa o seguinte:
1- Os avisos de recepção das liquidações adicionais referidas em 14) e 15) foram rubricadas pela sócia gerente da sociedade, Maria ….
…MOTIVAÇÃO.
A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos pelas partes, cuja veracidade não foi impugnada.
Teve-se também em consideração o relatório da inspecção e documentos que lhe estão anexos, constantes do P.A. apenso.
Considerou-se ainda os elementos constantes dos vários volumes apensos relativos à reclamação graciosa, recurso hierárquico e execução, que foram requeridos, sob promoção da ilustre magistrada do Ministério Público para efeitos de conhecimento da questão prescrição.
O ponto 1 – dos factos não provados baseia-se na comparação das rubricas existentes no processo instrutor com a rubrica constante da citação para a execução fiscal a qual está rubricada pela sócia gerente.”
III – 2. DE DIREITO
2.1 Da omissão de pronúncia
Delimitado que se mostra o objecto do presente recurso, cumpre conhecer em primeiro lugar da nulidade assacada à sentença sob recurso, de omissão de pronúncia, por ter desprezado o conhecimento de questões do incumprimento das formalidade na notificação dos actos e da tempestividade da reclamação graciosa, e do vício de violação da lei traduzido na errada apreciação dos elementos de facto e na errada quantificação da matéria colectável, invocados em sede de p.i..
Como se sabe, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, prevista tanto no art. 125º do CPPT como no art. 668º alínea d) do CPC, está directamente relacionada com o comando fixado nº 2 do art. 660º do CPC, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».
Daí que exista omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar e decidir uma questão, isto é, um problema concreto que haja sido chamado a resolver, a menos que o seu conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio.
Conforme o disposto no artigo 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra «a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer». Como já se referiu, esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660.º nº 2 do Código de Processo Civil, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Assim, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.
No caso vertente, desde já diremos, que não ocorre tal vício.
Com efeito, só se verificará omissão de pronúncia se o juiz deixar de se pronunciar sobre questão que lhe tenha sido submetida pelas partes e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento e decisão dada a outra questão.
No caso concreto dos autos, a decisão recorrida conheceu da prescrição e, de seguida, fundamentando tal, inverteu o conhecimento das questões, do seguinte modo: “A impugnante pretende que o acto de liquidação deve ser anulado, invocando em vista à procedência da acção os seguintes argumentos, que especifica pela seguinte ordem: tempestividade da reclamação graciosa; incumprimento de formalidades na notificação; errada apreciação dos elementos de facto e errada quantificação da matéria colectável.
Atento o disposto no artigo 124° do CPPT, importa inverter a ‘ordem das questões a conhecer nos presentes autos, uma vez que a questão da (ir)regularidade da notificação dos actos tributários constitui uma questão de que depende a análise da tempestividade da reclamação graciosa, pelo que deverá ser conhecida em primeiro lugar, sendo que após conhecer das duas primeiras questões importa que o tribunal se pronuncie sobre a questão da tempestividade da presente acção, cujo conhecimento depende das duas questões anteriores.”
E, em consonância com o patente, conheceu do incumprimento das formalidades da notificação, da tempestividade da Reclamação e, por último, da tempestividade da impugnação, no âmbito da qual entendeu que: “Assim, demonstrando-se que a reclamação graciosa foi intentada de forma extemporânea, deve considerar-se que caducou o direito de impugnar, o que é de conhecimento oficioso e conduz à absolvição do pedido, como decorre do disposto no artigo 333°, n° 1 do Código Civil e dos artigos 493°, n° 3 e 496° do CPC. Fica assim prejudicado o conhecimento das restantes questões nos termos do número 2 do artigo 660° do CPC aplicável por força do disposto no artigo 2°, al. e) do CPPT.”
Resulta assim evidente que a decisão sindicada não conheceu do vício de violação de lei, que vinha assacado às liquidações, porque entendeu que não podia conhecer delas: isto é, o conhecimento daquelas questões - “errada apreciação dos elementos de facto e errada quantificação da matéria colectável” - ficou prejudicado pela solução que o Tribunal deu à questão da possibilidade de conhecimento – caducidade do direito de impugnar.
Quando o Tribunal, consciente e fundamentadamente, não toma conhecimento de qualquer questão, por entender que não pode dela conhecer, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia. Esta só ocorrerá nos casos em que o Tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão de que devesse conhecer, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento.
Não se verifica, deste modo, qualquer omissão de pronúncia da sentença recorrida.
2.2 Da prescrição da dívida
Vejamos, então, se se verifica o alvitrado erro de julgamento sobre a questão da prescrição, que é de conhecimento oficioso por força do disposto no art. 175º do CPPT.
Afirma a recorrente (conclusões G) a M)) que neste momento já se mostram prescritas as dívidas decorrentes das liquidações adicionais de IVA relativas aos períodos de 07 e 12 do ano de 1997 e respectivos juros compensatórios face ao disposto no art. 49º da LGT, introduzida pela Lei N.º 53-A/2006, de 29.12, importando, declarar a prescrição da obrigação tributária.
Vejamos:
Nos autos está em causa (atendendo ao objecto do recurso) obrigação proveniente de IVA do ano de 1997, pelo que se nos impõe determinar qual o regime legal aplicável, visto que desde essa data até hoje se sucederam dois regimes diversos e que se elencam: O do art. 34.° do CPT, cuja vigência se manteve no período compreendido entre l de Julho de 1991 e l de Janeiro de 1999, data em que entrou em vigor a Lei Geral Tributária (LGT), cujo diploma de aprovação, o DL n.° 398/98, de 17 de Dezembro, revogou expressamente aquele preceito (cfr. arts. 2°, n° l, e 6° do referido DL); O dos arts. 48° e 49° da LGT, desde l de Janeiro de 1999 até à presente data.
As dívidas em causa, se constituíram ainda no domínio da vigência do CPT, cujo art. 34º determinava o prazo de 10 anos para a prescrição dos impostos.
Em 01.01.1999 entrou em vigor a LGT, diploma que encurtou tal prazo para 8 anos: cf. art. 48º n.º 1.
Aos prazos prescricionais é aplicável o disposto nos arts. 296º ss do Código Civil (CC); nos termos do art. 297º n.º 1 deste diploma, a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
Por outro lado, é ponto assente que seja qual for o prazo que se considere vir a ser aplicável ao caso em concreto, deverá o respectivo regime ser aplicado em bloco, designadamente no tocante a causas de interrupção e suspensão, e não apenas a norma relativa ao prazo.
Tecidas estas considerações, importa ter em conta os seguintes factos:
a) A dívida impugnada reporta-se ao ano de 1997.
b) A impugnante não efectuou o pagamento voluntário, pelo que foi instaurado processo executivo para cobrança da dívida do IVA de 1997;
c) A impugnante foi citada em 27.12.2000, após a citação não foi praticado qualquer outro acto em sede de execução.;
d) Foi deduzida reclamação graciosa a 06.02.2001, que esteve parada entre 20.02.2001 e 27.02.2005;
e) Foi apresentado recurso hierárquico a 17.01.2006, que esteve parado entre 10.04.2006 e 08.01.2009;
d) E, em 16.02.2009 foi apresentada a impugnação judicial.
Vejamos:
Assim, o prazo de prescrição das dívidas de IVA de 1997, independentemente dos períodos a que dizem respeito, começa a correr em 01.01.1998, sendo que o prazo à data em as dívidas se constituíram era de 10 anos, pelo que a prescrição, se nada obstasse ao seus curso, ocorreria a 01.01.2008.
Em 01.01.1999 entrou em vigor a LGT, aprovada pelo Decreto-Lei n° 398/99, de 17 de Dezembro, conforme previsto artigo 6° do mesmo diploma.
A LGT veio reduzir o prazo de prescrição de 10 anos para 8 anos, conforme disposto no artigo 48°, n° 1.
Vale isto por dizer que, em atenção ao caso concreto, no regime do CPT, o prazo conta-se com início do ano seguinte ao do facto tributário.
É forçoso concluir que o regime prescricional aplicável à situação sub judice é o do art. 49º da LGT, tanto mais que, por força do princípio geral de Direito em matéria de sucessão de leis, segundo o qual a lei que estabelecer, para qualquer efeito um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
Assim, faltando menos tempo segundo a nova lei, deve ser esta a regular o curso do prazo prescricional, devendo contar-se o prazo de prescrição de oito anos a partir da entrada em vigor da LGT, ou seja, desde 01.01.1999 começa a correr prazo de prescrição de oito anos, pelo que a mesma ocorreria, se nada obstasse ao seu curso, a 01.01.2007.
Em conformidade com os factos assentes, a impugnante foi citada no âmbito do processo de execução fiscal, que fora instaurado, a 27.12.2000.
Tinha decorrido desde 01.01.1999 até à citação o prazo de 1 ano, 11 meses e 27 dias.
Ora, a citação nos termos do número 1 do artigo 49° da LGT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n° 100/99, de 26 de Julho, interrompe a prescrição, ou seja, constitui um facto cuja verificação inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do facto interruptivo, conforme dispõe o art. 326°, n° 1 do CC.
Porém, havendo interrupção da prescrição (v. g., pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente) o tempo decorrido anteriormente é inutilizado, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo (artigos 323.º e 326.º do Código Civil). Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado decisão que ponha termo ao processo e, quando ocorra desistência ou a absolvição da instância, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo (artigo 327.º do Código Civil).
Para aqui releva, o declarado em sede de sentença, que após a citação ocorrida em 27.12.2000, não foi praticado qualquer acto em sede de execução.
Em 06.02.2001, foi instaurada reclamação graciosa, a qual para efeitos do número 1 do artigo 49° da LGT, constitui também facto interruptivo.
Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição antes da entrada em vigor da actual redacção do n.º 3 do artigo 49.° da LGT (introduzida pelo art.º 89.° da Lei 53-A/2006, de 29/12), devem todas elas ser consideradas, desde que ocorram após a cessação do efeito interruptivo das anteriores (veja-se Acórdão do STA, de 13 de Janeiro de 2010, proc.º n.º 01148/09).
Como acertadamente, se referiu na sentença sob recurso, “sendo certo que não pode interromper-se um prazo que está interrompido, a reclamação graciosa mantém, no entanto, o seu efeito útil, de modo que ocorrendo a 28.12.2001, mais de um ano de paragem no processo executivo, a reclamação graciosa obsta a que o prazo de prescrição corra os seus termos conforme o efeito descrito no artigo 49°, n° 2 da LGT.
Porém também a reclamação graciosa não teve qualquer movimento por facto inimputável à contribuinte entre 20.02.2001 e 27.07.2005 e não havendo facto que a tal obstasse, o efeito constante do número 2 do artigo 49° da LGT produz-se a 21.02.2002.
Assim, e por via desta norma, o efeito interruptivo produzido é transformado em efeito suspensivo, na medida em que se prevê que se some o período que decorrer após a paragem por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte ao período que decorreu até à data da autuação do facto interruptivo.
Deste modo e aplicando o referido aos autos, o prazo de 1 ano, 11 meses e 27 dias inutilizado por efeitos da citação pessoal de 27.12.2000, vai ser somado ao prazo que decorrer após 21.02.2002.
A 17.01.2006 a contribuinte intentou recurso hierárquico contra o indeferimento da reclamação graciosa.
Decorreu entre 21.02.2002 e 17.01.2006 o prazo de 3 anos, 10 meses e 27 dias, que a somar ao prazo de 1 ano, 11 meses e 27 dias, totaliza o prazo de 5 anos, 10 meses e 24 dias.
Este prazo foi interrompido por efeito da instauração do recurso hierárquico, pois também ele constitui um facto interruptivo, nos termos do disposto no artigo 49°, n° 1 da LGT.”
As causas de interrupção ou suspensão que ocorreram (anteriormente à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro) foram correctamente relevadas em sede de decisão sob recurso, pelo que cumpre atentar à divergência manifestada pela recorrente em sede de alegações de recurso, qual seja a de que, atendendo à nova redacção do artigo 49° da LGT, introduzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29.12, em especial os seus nº 3 e 4, a impugnação já não tem efeito interruptivo por terem ocorrido outras, anteriormente, e, por outro lado, não ocorre a suspensão até à decisão definitiva na reclamação, pois que esta tinha já sido decidida aquando dessa alteração legislativa, desde a data da cessação do efeito interruptivo ocasionado pelo recurso hierárquico, que ocorreu a 10.04.2007, até hoje, decorreram 3 anos, 9 meses e 15 dias que, somados aos períodos acima contabilizados, excedem o prazo de prescrição de 8 anos.Ou seja, a Recorrente pretende aplicação à situação sub judice do disposto no art. 49.º, n.º 2, da LGT, na redacção anterior à alteração da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que dizia: «A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação».
Na verdade, nos termos da alegação da Recorrente, o Recurso Hierárquico parou por motivo que não lhe é imputável.
Resulta da matéria assente, não colocada em crise, que o Recurso Hierárquico, esteve parado de 10.04.2006 e 08.01.2009.
Porém, na data em que ocorreu essa paragem já não estava em vigor (desde 1 de Janeiro de 2007 (Cfr. art. 163.º da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro.)) o n.º 2 do art. 49.º da LGT, revogado que foi pelo art. 90.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007), que apenas salvaguardou dos efeitos dessa revogação os casos em que, na data da entrada em vigor da lei, tivesse já decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo (art. 91.º da referida Lei).
Recorde-se que a Lei n.º 53-A/2006 revogou a regra segundo a qual a paragem do processo a que a lei atribuiu efeito interruptivo, por período superior a um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, faz cessar o efeito interruptivo (artigo 89.° da Lei n.º 53-A/2006) e veio determinar que «a revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo» (artigo 91º da Lei n.º 53-A/2006). Significa isto que, se o ano de paragem já se tiver consumado em 2006, o facto interruptivo continua a valer como facto suspensivo. Mas se o ano de paragem se consumar em 2007, o facto interruptivo vale como tal, sendo irrelevantes eventuais paragens do processo, uma vez que começou a correr novo prazo de prescrição a partir do facto interruptivo, cuja contagem se suspende enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo, quando a reclamação, impugnação, recurso ou oposição determinem a suspensão da cobrança da dívida. (neste sentido vejam-se, entre outros, os acórdão do STA de 16.11.2011, in proc. n.º 0289/11 e de 02.03.2011, in proc. n.º 0125/11).
Pelo que, não tem aplicação à situação dos autos o n.º 2 do art. 49.º da LGT.
Assim, o Recurso Hierárquico, instaurada em 17.01.2006, interrompeu o prazo da prescrição (art. 49.º, n.º 1, da LGT), inutilizando para a prescrição todo o tempo até então decorrido e determinando a abertura de novo prazo igual ao primitivo (cfr. os n.ºs 1 e 2 do art. 326.º do Código Civil (CC)), que não volta a correr até ao trânsito em julgado do processo (cfr. art. 327.º, nº 1, do CC).
Pelo exposto, é manifesto que, ao contrário do que sustenta a Recorrente, não está prescrita a obrigação tributária correspondente às liquidações impugnadas, improcedendo, assim, este fundamento de recurso.
2.3. Da caducidade do direito de Impugnar
A recorrente de acordo com as conclusões do recurso e que delimitam o seu objecto, vem articular (vide conclusão N) a V)) que em conformidade com o disposto no artigo 65º do CPT, todos os actos tributários, devem ser notificados por carta registada com A/R, sob pena de omissão de formalidade legal que conduz à inexigibilidade do imposto liquidado, o que terá ocorrido pois “está por demonstrar que quem assinou o referido A/R fosse alguém que estivesse presente no domicílio do contribuinte”, o que por si é fundamento de recurso contencioso da liquidação. Notificada da liquidação adicional em 31.01.2001 a reclamação graciosa apresentada em 06.02.2001 foi-o no prazo de 90 dias, pelo que não ocorre caducidade do direito de impugnar os actos de liquidação, contrariamente ao decidido na sentença sob recurso.
Da notificação da liquidação
A Recorrente discorda da sentença quanto à conclusão a que nela se chegou, de que ela se deve considerar notificado das liquidações que deram origem à dívida exequenda, na data de 02.06.2000 (data constante do aviso de recepção).
Cumpre desde logo ter presente que não é discutível o domicílio fiscal da Impugnante à data em que lhe foram remetidas as notificações das liquidações, nem a falta de comunicação de qualquer mudança de domicílio à AT, não tendo esta sequer alegado que a falta de notificação tenha origem em mudança de residência não oportunamente comunicada da notificanda ora Recorrente.
De igual modo não se discute que a notificação era a efectuar por carta registada com aviso de recepção, se bem que haja divergência entre o Recorrente e a sentença recorrida quanto à legislação que impunha tal forma de comunicação, sendo que na sentença fez-se aplicação dos preceitos do CPPT e a recorrente invoca aplicação do CPT, pelo que cumpre antes do mais, apurar-se qual o quadro legal em que deve indagar-se da perfeição da notificação.
Vejamos:
No caso, as liquidações foram praticadas no âmbito da vigência do CPPT e, consequentemente as diligências com vista à notificação desses actos foram também elas realizadas depois da entrada em vigor daquele Código, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2000, o diploma que aprovou este Código – o Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro – continha no seu art. 4.º uma norma de direito transitório (Norma que, como salienta JORGE LOPES DE SOUSA, CPPT Anotado e Comentado Vol. I, nota 1 ao art. 4.º do diploma que aprovou o Código, págs. 34/35, «teve o evidente objectivo de afastar os problemas de aplicação da lei no tempo que se poderiam gerar com a aplicação imediata do C.P.P.T.».) que determinava que o mesmo só se aplicava aos procedimentos iniciados a partir dessa data, o procedimento que conduziu as liquidações teve o seu início em 31.08.21999, na vigência do CPT (Note-se que o referido art. 4.º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, veio a ser revogado pelo art. 12.º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, que, no seu art. 12.º, determinou a aplicação do CPPT aos procedimentos e processos pendentes regulados pelo CPT, sem prejuízo do aproveitamento dos actos já realizados.). O que significa que a validade dos actos praticados com vista à notificação dos referidos actos de notificação deve ser aferida face ao quadro legal previsto no CPT.
Temos, pois, que concordar com a Recorrente quando invoca o art. 65º do CPT, uma vez que o procedimento que culminou com as liquidações que deram origem à dívida exequenda se iniciou no âmbito da vigência daquele Código.
Preceituava o art. 65.º, n.º 1, do CPT, que «As notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes», entre os quais se contam, sem margem para dúvida, os actos de liquidação, logo no n.º 4 do mesmo artigo se prevê que «As notificações serão pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade que a elas proceder o entenda necessário».
Temos pois por assente, que liquidações adicionais determinantes de pagamento de um imposto em falta são actos que alteram a situação tributária do contribuinte, para efeitos de aplicação daquele artigo.
E, tendo por ponto de referência um sociedade comercial, a notificação de actos tributários como o que aqui está em causa ,- apuramento de IVA com recurso aos métodos indirectos -, se há-de processar de forma consonante , em primeira linha , com o que dispõe o CPT , naquele artº. 65º e , subsidiariamente , com o que preceitua o CPC.
Concluindo, por aplicação do art. 65º n.º1 do CPT, aquela alteração dos valores de imposto em falta de IVA tinha de ser levada ao conhecimento do contribuinte (sociedade), através de uma notificação a processar pelos serviços postais, mediante registo com AR.
No que concerne à notificação das sociedades comerciais, o artº 68º do CPT estatuía, que as notificações e citações das pessoas colectivas se concretizariam, em primeira linha, na pessoa de um dos seus administradores ou gerentes, em qualquer lugar em que fossem encontrados, e, em segundo lugar e na impossibilidade de a realizar nos preditos termos, na pessoa de um seu qualquer empregado capaz de a transmitir, desde que se encontre na respectiva sede ou nalguma sua dependência, neste último com a salvaguarda de a notificanda se não encontrar em fase de liquidação ou falência, pois, em tal hipótese, a diligência tinha de ser realizada na pessoa do liquidatário ou administrador da massa falida.
Assim, temos que, por regra, a notificação da liquidação haverá que ser feita directamente na pessoa do representante da pessoa colectiva ou de qualquer empregado que se encontre na sede ou em qualquer dependência daquela.
Assim, e em face do que preceituam(vam) aquele artº 65º n.º 1 e , ainda , o art. 66º n.º 3 do mesmo CPT , e, como já referimos, aplicável ao caso, a notificação da sociedade, daquele valor em falta de imposto IVA apurado pela AT em sede de procedimento inspectivo, podia e devia ser levada a cabo, como foi , por carta registada com AR, considerando-se concretizada, na data da assinatura aposta, no recibo que aquele constitui, por quem a recepcionasse, nos termos do regulamento dos serviços postais.
O Regulamento do Serviço Público dos Correios foi aprovado pelo Decreto-Lei nº 176/88 de 18 de Maio. Nos termos do artº 28º desse Regulamento, as correspondências registadas têm tratamento especial. De acordo com o seu nº 4, al. a) “ a entrega das correspondências registadas é sempre comprovada por recibo e tem lugar na morada do destinatário, desde que esteja implantada a distribuição domiciliária.
Quanto à modalidade de aviso de recepção, o art. 30º não exige que a entrega da carta registada seja em mão ao próprio destinatário. Deste modo, uma carta registada com aviso de recepção pode ser entregue a pessoa que se encontre na morada do destinatário.
Coisa diferente é a modalidade de correspondência a entregar em mão própria, nos termos do art. 31º. Mas não foi esta a modalidade especial seguida no caso dos autos. E esta modalidade especial de entrega em mão própria não é aplicável por analogia á modalidade de carta registada com aviso de recepção.
Refira-se, ainda, que o art. 31º n.º 1 do citado Regulamento, ao referir “entregar em mão própria” parece estar estabelecer uma faculdade legal, em favor e no interesse do remetente, a quem competirá solicitar a entrega da correspondência em mão própria. Ora, no caso vertente, e tendo em linha de conta a forma legalmente utilizável de notificação das pessoas colectivas, por carta registada com AR, o interesse em tal entrega em mão própria, a existir, coloca-se do lado do destinatário.
Pelo que não podemos deixar de acompanhar a sentença recorrida, quando considera a validade da notificação de 02.06.2000, quando refere que:
“… A impugnante insurge-se contra as notificações das liquidações adicionais referidas nos pontos 14) e 15) do probatório.
Não ficou provado que tal rubrica — que consta também da notificação do relatório (factos 8) e 9) do probatório) fosse da gerente da sociedade, Maria…— ponto 1— dos factos não provados.
Importa pois verificar se as notificações impugnadas deveriam ter sido feitas na pessoa da gerente da sociedade, pelo que os avisos de recepção deviam estar assinados por ela.
(…)
Em princípio a notificação de uma pessoa colectiva é efectuada na pessoa do administrador ou gerente, na sede da sociedade, na residência destes ou noutro local onde se encontrem. O número 1 do artigo transcrito contém apenas uma preferência legal de que as notificações sejam feitas na pessoa do administrador ou gerente, todavia, tal não exclui que a notificação possa ser realizada numa outra pessoa.
No número 2 do mesmo artigo dispõe-se que quando o funcionário que procede à notificação não encontre administrador ou gerente pode fazê-lo na pessoa de qualquer empregado que se encontre na sede da pessoa colectiva.
Assim, a notificação em pessoa que não é administrador ou gerente da pessoa colectiva a notificar é válida desde que efectuada em empregado que se encontre no local onde normalmente funciona a sede da sociedade, presumindo-se, nesta situação, que “as cartas com aviso de recepção são oportunamente entregues ao destinatário, mesmo quando o aviso de recepção foi assinado por terceiro, admitindo-se a prova de que não foi feita a entrega”.
No caso dos autos, as cartas registadas com aviso de recepção em questão foram remetidas para a Cova da Ponte, 6, Miranda do Corvo; tal morada corresponde com a indicada ao tribunal pela impugnante como sua sede, pelo que pode concluir-se que as mencionadas cartas foram remetidas para a sede da empresa.
É certo que não foi possível apurar quem rubricou os avisos de recepção que foram devolvidos à Administração Tributária.
Porém tal não invalida a notificação.
Na verdade, não se podendo apurar que tais rubricas pertencem à sócia gerente, naturalmente pode presumir-se que pertencerão a um empregado que se encontraria na sede da empresa, por a sócia não se encontrar presente.
É que a impugnante alega tão-só que as cartas registadas não foram assinadas pela sócia gerente e como se viu a lei não exige que a notificação seja feita exclusivamente na pessoa da sócia gerente, mas só preferencialmente: pelo que se o funcionário dos CTT não encontrar o sócio deve entregar a carta a um empregado que assinará os respectivos avisos.
Na situação dos autos a impugnante não ilide a presunção de que se encontrava na sede no momento em que a notificação foi realizada, nem a presunção de que a carta entregue na sede foi atempadamente remetida à sócia gerente.
Acresce que a rubrica em questão consta também do aviso de recepção relativo à notificação do relatório de inspecção.
E é certo que a impugnante não alega que não tomou conhecimento nem do relatório nem das liquidações adicionais, ou que só lhe foram remetidas mais tarde, pelo que pode presumir—se que quem rubricou os avisos de recepção entregou atempadamente as respectivas cartas à sócia gerente..”
Em resumo, pois, se tem de concluir que a notificação das liquidações adicionais de IVA – apuramento do imposto em falta por recurso a métodos indirectos com referência ao exercício de 1997, por meio de carta registada com AR, assinada por alguém que se encontrava na sede fiscal da sociedade, se tem por válida e legalmente concretizada, na data em que esta assinou aquele recibo.
E como, assim, foi entendido pela decisão recorrida forçoso se impõe concluir que não cometeu qualquer erro de julgamento.
Da tempestividade da reclamação graciosa e suas consequências na impugnação
A sentença sob recurso apreciou a questão da tempestividade da reclamação (para aferir da tempestividade da impugnação), sendo que a mesma implicava uma tomada de posição prévia sobre a validade e eficácia da notificação das liquidações, tendo por premissa que aquela notificação ocorreu efectivamente a 02.06.2000 (veja-se item 14º e 15º do probatório).
Alega a recorrente em sede de conclusões que:“…tomou conhecimento das notificações das liquidações adicionais de imposto efectuadas pelos Serviços em 31/01/2001, apresentou o sujeito passivo reclamação graciosa na secção de processos do serviço de Finanças de Miranda do corvo em 06/02/2001. Por conseguinte, a reclamação graciosa foi apresentada no prazo de 90 dias previsto na alínea a) do nº 1 do art. 102º e do nº 1 do art. 70º do CPPT. Em suma, não ocorre caducidade do direito de impugnar os actos de liquidação.” (vide conclusões Z), T) e V)).
Dispunha o art. 70º do CPPT (na redacção anterior à Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro – OE 2006) que:
“1 – A reclamação graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial e será apresentada no prazo fixado no n.º 1 do art. 120º:”
Por sua vez, o art. 102º n.º 1 do CPPT, estabelecia que a impugnação será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir dos factos enumerados nas al. a) a f), e na parte que aqui nos releva do “Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte.”
Nos termos, daquele, artigo 102.º do CPPT o termo inicial do prazo de impugnação difere, fundamentalmente, em função do tipo de acto impugnado, que não do fundamento da impugnação deduzida, o que, aliás, bem se compreende atento a que os fundamentos da impugnação podem consistir em qualquer ilegalidade (artigo 99.º do CPPT) e podem ser invocados como fundamentos desta, a título principal ou subsidiário, vários vícios geradores daquele valor jurídico negativo.
Não obstante, até à revogação dos nºs 2 e 3 do artigo 70.º do CPPT (operada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro – OE/2006) o legislador admitia a possibilidade de ser deduzida reclamação graciosa no prazo de um ano com fundamento na preterição de formalidades essenciais ou na inexistência, total ou parcial do facto tributário, considerando-se que se verificaria o fundamento da inexistência total ou parcial do facto tributário em caso de violação das normas de incidência tributária ou sobre o conteúdo de benefícios fiscais (cfr. o n.º 3 do artigo 70.º do CPPT, na redacção anterior à da Lei n.º 60.º-A/2005).
Em caso de indeferimento da reclamação “graciosa” deduzida com aquele fundamento poderia ainda o interessado “aproveitar” do prazo de 15 dias posterior à notificação para deduzir impugnação judicial (do indeferimento da reclamação), na qual o acto reclamado seria apreciado (mesmo que o indeferimento da reclamação tivesse sido motivado pela extemporaneidade da reclamação).
Assente que está nos presentes autos de recurso, que a impugnante se considera regulamente notificada das liquidações a 02.06.2000, com data limite de pagamento 31.07.2000 (item 14º e 15º do probatório) e tudo aquilo que se referiu supra acerca “ da notificação da liquidação”.
Bem andou, pois, a sentença recorrida ao julgar intempestiva a reclamação, por ter sido deduzida para além do prazo fixado no n.º 1 do artigo 70.º do CPPT (correspondente, ao tempo, ao prazo de impugnação judicial estabelecido no artigo 102.º do CPPT), teria de tê-lo sido dentro dos 90 dias seguintes ao termo do prazo para pagamento do imposto liquidado (no caso dos autos, ocorrido a 31.07.2000, conforme a item 14 do probatório fixado), sendo intempestiva a reclamação que apenas foi apresentada no dia 06.02.2001 (cfr. item 22 do probatório fixado).
E, disso dá conta a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que atesta a sua extemporaneidade, porquanto terá sido apresentada para além do prazo de 120 dias, previsto nos artigos 70.º, n.º 1 e 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, contado a partir do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas. Desta decisão de indeferimento cabia impugnação judicial a deduzir no prazo referido no n.º 2 do artigo 102.º do CPPT, ou seja, 15 dias após a sua notificação ou recurso hierárquico apresentar no prazo de 30 dias em conformidade com o disposto no art. 76º e 66º n.º 2 do CPPT.
Ora, tendo a recorrente/impugnante sido notificada da mesma, decisão da reclamação graciosa, em 13.12.2005 (v. item 19 do probatório), e apresentado recurso hierárquico em 05.01.2006 e notificado da decisão final deste em 26.01.2009 (v. item 20 e 21 do probatório), a impugnação judicial deduzida a 16.02.2009 é, por isso, tempestiva porque deduzida no prazo legal (art. 120º do CPPT).
A eventual irrelevância dos fundamentos invocados pode reflectir-se na apreciação do seu mérito mas não prejudica a sua tempestividade.
A sentença recorrida incorreu, assim, neste erro de análise, ao considerar a impugnação intempestiva.
Mas, por outro lado, ainda que se reconheça a tempestividade da impugnação, não se pode conhecer do mérito da mesma, não se podendo olvidar os fundamentos de ordem adjectiva que obstam ao conhecimento do mérito, pois que, só a tempestividade da reclamação graciosa abre à impugnante, neste caso, a possibilidade de discutir a legalidade das liquidações, pois confirmada que se mostra a intempestividade da reclamação tudo se passa como se esta não tivesse existido.
E se, como supra se disse, embora a eventual extemporaneidade da reclamação não consequencie a extemporaneidade da impugnação, não há dúvida que a extemporaneidade da reclamação conduz à necessária improcedência da impugnação, por se reagir, então, contra um caso decidido ou resolvido (neste sentido acórdão do STA de 02.04.2009, proferido in proc. 0125/09).
Improcedem, deste modo, as alegações do recorrente, estando o seu recurso votado ao insucesso, cumpre confirmar a sentença recorrida.
III. DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Porto, 14 de Março de 2012
Ass. Irene Isabel Gomes das Neves
Ass. Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia
Ass. Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro