Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00586/16.8BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 06/23/2017 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Luís Migueis Garcia |
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Descritores: | CONCURSO. ANTIGUIDADE |
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Sumário: | I) – A contagem do tempo de serviço nos concursos para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário tem em consideração a última lista de antiguidade publicada.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
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Recorrente: | Ministério da Educação e Ciência |
Recorrido 1: | MLMO |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não foi emitido parecer. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Ministério da Educação e Ciência (Av.ª…, Lisboa) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, em acção intentada por MLMO (Praceta …, Vila Nova de Gaia), julgada procedente. O recorrente conclui: A) em Direito Administrativo, a passagem do tempo e a omissão dos interessados levam à consolidação na ordem jurídica dos atos administrativos, entretanto praticados, pelo que cada ato administrativo de contagem de tempo de serviço vai-se sucessivamente firmando na ordem jurídica, para qualquer efeito legal, se não for objeto de oportuna impugnação. B) As listas de antiguidade do pessoal docente, que configuram verdadeiros atos administrativos e, como tal, tem entendido a jurisprudência que se consolidam na ordem jurídica se não fossem oportunamente impugnadas. C) Apesar da aplicação do artigo 103.º do ECD a todos os efeitos das faltas por doença, a partir de 20 de janeiro de 2007, os atos administrativos relativos à contagem do tempo de serviço desde então praticados, nos termos supra referidos, consolidaram-se na ordem jurídica, decorrido um ano após a sua prática, nos termos do, à data vigente, artigo 141.º do CPA. D) O tempo de serviço constante desses atos administrativos não é passível de alteração decorrido um ano após a sua prática, não devendo assim ser contabilizado nos termos e para os efeitos do artigo 103.º do ECD. E) A decisão recorrida ao decidir como decidiu fez errada interpretação do estabelecido no artigo 103º do ECD, conjugado com o então vigente artigo 141º do CPA.
1- A Autora é professora do ensino público, exercendo funções no Agrupamento de Escolas de C.... 2 - Em Dezembro de 2015 requereu ao Senhor Director do Agrupamento a rectificação da sua contagem de tempo de serviço, concretamente que lhe fossem contabilizados 444 dias de serviço referentes aos períodos de doença que sofreu nos anos escolares de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010. 3 - Tendo obtido a decisão impugnada nestes autos, a docente não se conformou, porquanto considera que a mesma é violadora da lei. 4 - O artigo 103º do Estatuto da Carreira Docente (ECD) equipara as ausências ao serviço da docente por doença/doença prolongada, a prestação efectiva de serviço, pelo que não existe nenhuma dúvida quanto à justiça da pretensão da docente. 5 - O mesmo quanto à oportunidade do seu pedido, porquanto o acto é impugnável e a contagem de tempo de serviço é susceptível de ser alterada, conforme tem vindo a ser decidido pela jurisprudência acima invocada e citada. 6 - Em conformidade, conclui bem a decisão recorrida ao decidir que assiste razão à Autora, assistindo-lhe o direito a ver-lhe contados como prestação efectiva de serviço, os dias em que faltou por motivo de doença nos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010. * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto nada deu em parecer.* Os factos, fixados como relevantes na decisão recorrida:1. A Autora é professora do ensino público, exercendo funções no Agrupamento de Escolas de C..., como docente do Quadro de Zona Pedagógica. 2. Em Dezembro de 2015, a aqui A. apresentou junto do Senhor Director do Agrupamento um requerimento a solicitar as razões da rectificação da contagem do tempo de serviço efectivamente prestado nos termos do artigo 103º do ECD, na redacção que lhe foi conferida pelo DL nº 15/2007, de 19 de Janeiro – cfr. doc. nº 1 junto aos autos com a p.i. e que aqui se dá por integralmente reproduzido; 3. Nos anos lectivos 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010, esteve, em diferentes momentos, ausente ao serviço por motivo de doença, devidamente justificada. 4. A A. após ter requerido que lhe fosse feita nova contagem, veio a receber a decisão do Director do Agrupamento de lhe descontarem os dias de ausência por motivo de doença dados nesses anos lectivos - cfr. doc. nº 2 junto aos autos com a p.i. e que aqui se dá por integralmente reproduzido. --- Com vista à melhor compreensão e decisão da causa, melhor se aclara o que, vindo referenciado neste último ponto 4. do elenco fáctico supra, a autora/recorrente requereu (doc. nº 1 da p. i.), e a resposta dada (doc. nº 2 da p. i.).Sequencialmente: «(…) 1 - A requerente foi declarada que para o concurso de 2015/2016, tinha 8.894 dias contados a 31.Agosto.2014. 2— Foi informada posteriormente que tal tempo terá sido alterado. 3 - Tem toda a necessidade de ter uma posição definida sobre esta questão. Termos em que requer a V. Exa. se digne ordenar certificar qual o tempo de serviço que lhe é computado e, se foi alterado, quais os fundamentos para tanto, para efeitos de possível impugnação, em prazo não superior a 10 dias. (…)» «(…) Em resposta ao solicitado, e de acordo com a informação constante nos Serviços Administrativos deste Agrupamento de Escolas, somos a informar do seguinte: 1 .Em 2007/08 registam-se 173 dias de falta por doença, tendo sido descontados 143 dias para efeitos de antiguidade, concurso e progressão. 2.Em 2008/09 registam-se 231 dias por doença, tendo sido descontados 201 dias para efeitos de antiguidade, concurso e progressão. 3.Em 200912010 registam-se 130 dias, tendo sido descontados 100 dias para efeitos de antiguidade, concurso e progressão. 4.Com a informação B14015519V do DGAE de 04.07/2014 o tempo de serviço contabilizava, até 31/08/2014, 8894 dias. Foi anotado que com a informação de 04/07/2014 supra-referida, o tempo era contabilizado. 5.Com a circular B15009956X de 27/032015 do DGAE, recebeu-se esclarecimento que estabeleceu que os atos administrativos relativos à contagem de tempo de serviço praticados a partir de 20 de janeiro de 2007se consolidavam ; pós um ano da sua prática, não sendo passíveis de alteração uma vez decorrido um ano após a sua prática, não devendo assim ser contabilizado nos termos e para os efeitos do artigo 103º do ECD. No caso vertente, já tinha sido ultrapassado o ano. Portanto, de acordo com esta orientação, os 444 dias em causa não podiam ser contabilizados. 6.Consequentemente, nas listas de antiguidade o tempo dado por faltas não foi contabilizado (conforme anexo). Refira-se que as listas foram pedidas, e enviadas para a DGAE em 05/11 /2015. Na expectativa de terem sido prestados os esclarecimentos solicitados enviamos os melhores cumprimentos (…)» * O Direito:A autora/recorrida veio na presente acção pedir “a) a condenação do Exmo. Senhor Director do Agrupamento de Escolas de C..., à prática do acto administrativo requerido (decisão sobre o requerimento de 12/2014) onde se solicita a anulação do acto de desconto dos 444 dias para efeitos de concurso referentes aos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/20101; b) a condenação do Réu ao deferimento da pretensão da Autora manifestada nesse requerimento conforme acima se peticionou (…)”. O tribunal “a quo” julgou a acção procedente, determinando: - Anulo o acto que procedeu ao desconto de 444 dias para efeitos de concurso referentes a falta por motivo de doença dadas nos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010; - Condeno o Réu a praticar novo acto, procedendo a nova contagem, tendo em consideração que os períodos em que a Autora esteve de baixa médica equivalem a prestação efectiva de serviço. Perante os factos supra expostos, entendeu: «(…) A Autora pretende que o tribunal condene o Réu à prática do acto administrativo requerido (decisão sobre o requerimento de 12/2014) onde solicita a anulação do acto de desconto dos 444 dias para efeitos de concurso referentes aos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010 e ao deferimento da pretensão aí formulada, ou seja que que lhe fosse feita nova contagem, tendo em consideração que os períodos em que esteve de baixa médica equivalem a prestação efectiva de serviço. O Réu defende que, se bem que assista razão à Autora, na leitura que faz do artº 103º do Estatuto da Carreira Docente (ECD), as listas de antiguidade que foram sendo publicadas são agora irrevogáveis/inatacáveis. Vejamos, pois. Segundo o artigo 103.º do Estatuto da Carreira Docente (ECD), na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro: “Para efeitos de aplicação do disposto no presente Estatuto, consideram-se ausências equiparadas a prestação efectiva de serviço, para além das consagradas em legislação própria, ainda as seguintes: a) Assistência a filhos menores; b) Doença; c) Doença prolongada; d) Prestação de provas de avaliação por trabalhador-estudante abrangido pelo n.º1 do artigo 101.º; e) Licença sabática e equiparação a bolseiro; f) Dispensas para formação nos termos do artigo 109.º; g) Exercício do direito à greve; h) Prestação de provas de concurso; Embora a questão em apreço não ofereça dúvidas (tanto que o próprio Réu assim o reconhece), convocando, no que à aplicação ao caso em preço respeita, uma interpretação “a contrario sensu”, o Tribunal Central Administrativo Sul, em acórdão datado de 20-12-2012, proferido no processo nº05085/09, concluiu que: “I. As faltas dadas por doença, nos anos letivos de 1999/2000 a 2005/2006, antes da entrada em vigor do D.L. nº 15/2007, de 19/01, não sendo equiparadas a serviço efetivo, nos termos do artº 10º, nºs 3 e 5, do D.L. nº 200/2007, de 22/05, são consideradas no fator “experiência profissional” e no seu subfactor "assiduidade”, no âmbito do concurso para Professor Titular, regido pelo D.L. nº 200/2007, de 22/05. II. Segundo o disposto no nº 3 do artº 508º do CPC, verificadas imprecisões ou insuficiências na exposição ou concretização na matéria de facto alegada, pode o juiz convidar qualquer das partes ao respetivo suprimento. III. Está em causa um despacho discricionário do juiz, distinto do despacho que deve ser proferido se verificadas as circunstâncias previstas no nº 2 do artº 508º do CPC, esse sim, de natureza vinculada. IV. Não é de reconduzir a falta do despacho previsto no nº 3 do artº 508º do CPC, à violação do princípio da cooperação, consagrado no artº 266º do CPC ou à violação do disposto nos artº 264º do CPC e do artº 88º do CPTA. V. De acordo com o princípio dispositivo cabe às partes alegar os factos essenciais e concretizadores que integram a sua causa de pedir, necessários à procedência do pedido, não estando vedado ao Tribunal de considerar oficiosamente os factos instrumentais, no caso de os mesmos resultarem dos documentos constantes dos autos ou insertos no processo administrativo. VI. A incompletude do processo administrativo, não acarreta, por si só, que se considerem provados os factos alegados pela autora na petição inicial, pois é necessário que tenha existido uma recusa da Administração ou que não seja apresentada uma justificação aceitável para a falta do seu envio e ainda, que essa falta tenha tornado a prova impossível ou de considerável dificuldade, nos termos do nº 5 do artº 84º do CPTA. VII. Constitui finalidade da avaliação do fator “experiência profissional” e do seu subfactor, “assiduidade”, aferir do efetivo desempenho de funções na escola e dos níveis de cumprimento do dever de assiduidade, pelo que relevam todas as faltas e ausências ao serviço, salvo aquelas que a lei considere prestação efetiva de serviço, segundo o D.L. nº 100/99, de 31/03 e o ECD. VIII. As faltas dadas ao abrigo do disposto no artº 102º do ECD, isto é, por conta do período de férias, correspondem efetivamente a ausências ao serviço, não lhes sendo reconhecida a equivalência a prestação efetiva de serviço. IX. Considerando a tramitação prevista no D.L. nº 200/2007, de 22/05, enquanto procedimento administrativo especial, sendo prevista a pronúncia dos candidatos nos momentos aí previstos, carece se sentido convocar a aplicação do disposto no artº 100º do CPA.” Aqui chegados, inevitavelmente, teremos de concluir que assiste razão à Autora, assistindo-lhe o direito a ver-lhe contados como prestação efectiva de serviço, os dias em que faltou por motivo de doença nos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010. Assim sendo, sem necessidade de mais considerações, cumpre julgar procedente a presente acção, anulando-se o acto em crise, que procedeu ao desconto de 444 dias para efeitos de concurso referentes a falta por motivo de doença dadas nos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010 e ao deferimento da pretensão aí formulada, ou seja que que lhe fosse feita nova contagem, tendo em consideração que os períodos em que esteve de baixa médica equivalem a prestação efectiva de serviço. (…)». Indo de encontro ao que foi pretensão da autora/recorrida, a sentença situou e confinou o efeito anulatório decretado ao desconto de 444 dias na antiguidade da autora/recorrida “para efeitos de concurso”. Não é de estranhar. Efectivamente, foi na sequência de discordante interpelação da docente, a propósito da antiguidade que lhe foi considerada “para o concurso de 2015/2016”, que verteu o acto impugnado. Tirou o tribunal “a quo” que o “desconto” desses 444 dias não poderia ser efectuado, já que reportados a períodos em que esteve de baixa médica, equivalendo a prestação efectiva de serviço, perante o disposto no art.º 103º do ECD. Todavia, dispõe o Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27/06 (regula os concursos para seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário), no seu art.º 7º, que: «6 - O tempo de serviço declarado no boletim de candidatura é contado até ao dia 31 de agosto imediatamente anterior à data de abertura do concurso, devendo ser apurado de acordo com: a) O registo biográfico do candidato, confirmado pelo órgão de direção do agrupamento de escolas ou escola não agrupada onde aquele exerce funções, tendo em consideração a última lista de antiguidade publicada;» Como se sumaria no Ac. do STA, de 22-02-2006, proc. nº 0699/05: III - As listas de antiguidade são actos de registo que visam a declaração do tempo de serviço contado aos funcionários e a ordenação das posições relativas de todos eles. IV - Transcorrido o prazo de reclamação da lista anual de antiguidade sem que impugnação lhe tenha sido dirigida, ela torna-se imodificável em obediência ao princípio da estabilidade e segurança das relações jurídicas, firmando-se assim na ordem jurídica como caso decidido ou resolvido, sem prejuízo, porém, de rectificação no que concerne a erros materiais. [Ensinava Marcello Caetano que a “… lista é um acto que se limita a registar ou declarar factos (o tempo de serviço contado a cada um). Mas decorrido o prazo da reclamação sem que o interessado haja formulado os seus reparos, a lista é considerada expressão autêntica da verdade dos factos, e como tal imodificável na altura em que se pratique qualquer acto com base nos dados dela extraídos. Por isso, um erro que se deixou consolidar na lista de antiguidades não poderá ser reparado ao fazer-se uma nomeação ou promoção segundo a ordem que consta dessa lista. … Estes actos, portanto, condicionam outros actos posteriores, prejudicando as soluções que não se conformem com o conteúdo deles. Embora sejam meras verificações de factos, estas passam a integrar, como únicas verídicas, a esfera jurídica dos interessados. São o que se pode chamar actos prejudiciais, os quais se tornam destacáveis do processo de que façam parte, para o efeito de impugnação contenciosa” (in “Manual de Direito Administrativo”, Tomo I, 10.ª edição, pág. 446)] É neste pressuposto que se identifica o motivo determinante do acto impugnado. Que o réu reiterou em juízo. E para que novamente chama a atenção em recurso. Com razão que se lhe reconhece. Manda a lei que se atenda, para efeitos do concurso, à antiguidade constante da última lista publicada. Esse o princípio, na base do qual estão valores de segurança e eficiência. Princípio que merece afirmação sem postergar que, na falta de consolidação, outra possa/pudesse ser a contagem. Não se afasta a possibilidade de, numa tal situação, a docente poder por em causa o “acertamento” da lista; como também aqui e agora não está em causa saber se ele pode ser modificado em lista posterior. O que há que evidenciar é que a autora/recorrida não contrariou a afirmação do réu quanto ao que este devia seguir e teve como adquirido. Não pode, pois, afirmar-se que o acto impugnado incorra em erro nos pressupostos com que operou. Cfr. Ac. do STA, de 12-02-2009, proc. nº 0910/08 : III – O erro nos pressupostos de facto resulta do convencimento, por parte do Autor do acto, de que existe uma determinada realidade e desta, de facto, inexistir. IV - Sendo assim, cumpre aos Recorrentes, em primeiro lugar, contrapor à realidade suposta por aquele acto a realidade que eles têm por verdadeira, com a alegação dos correspondentes factos, e, depois, provar que os factos expressamente invocados como motivação daquele acto não existem ou não têm a dimensão que foi suposta. * Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em julgar procedente o recurso, revogando a sentença e julgando improcedente a acção.Custas: pela recorrida Porto, 23 de Junho de 2017. |