Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00828/07.0BEPRT |
| Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
| Data do Acordão: | 01/14/2010 |
| Tribunal: | TAF do Porto |
| Relator: | Drº Carlos Luís Medeiros de Carvalho |
| Descritores: | ACTO INEXISTENTE ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL CONDENAÇÃO PRÁTICA ACTO DEVIDO - OBJECTO NULIDADES SENTENÇA [ART. 668.º, N.º 1, ALS. A), B). C) E D) CPC] |
| Sumário: | I. Para estarmos perante uma situação de inexistência jurídica importa que faltem os requisitos mínimos de identificabilidade (tanto orgânicos como formais ou substanciais) duma de certa realidade (omissiva ou activa) com um acto jurídico, com um acto administrativo. II. Não podemos equiparar a ausência da prática dum acto como o desvalor da inexistência jurídica, sendo que a infracção ao disposto no art. 75.º, n.º 8 do DL n.º 564/99 não gera ou conduz minimamente ao desvalor da inexistência. III. O objecto do processo na acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido traduz-se na imposição à Administração do dever de praticar um determinado acto administrativo que o autor reputa ter sido legalmente omitido ou recusado por força do seu pretenso direito subjectivo na concreta relação jurídica administrativa, sendo que, por força do n.º 2 do art. 66.º e do n.º 1 do art. 71.º do CPTA, tal objecto é sempre aquela pretensão do interessado e, nessa medida, mesmo em face dum acto de recusa (recusa de emissão de decisão favorável ou recusa de apreciação do requerimento) temos que este meio contencioso se dirige não à anulação contenciosa daquele acto de recusa, mas, ao invés, à condenação da Administração na prática dum acto que, substituindo aquele, emita pronúncia sobre o caso concreto ou que venha a dar satisfação à pretensão deduzida quanto ao invocado direito da relação jurídica administrativa substantiva tal como a mesma se configura no momento em que a decisão vai ser prolatada. * * Sumário elaborado pelo Relator |
| Data de Entrada: | 07/30/2009 |
| Recorrente: | A... |
| Recorrido 1: | Unidade Local de Saúde de Matosinhos, E.P.E. |
| Votação: | Unanimidade |
| Meio Processual: | Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
| Decisão: | Concedido parcial provimento ao recurso |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Negar provimento ao recurso |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A…, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 20.12.2007, que no âmbito da acção administrativa especial pelo mesmo deduzida contra a “UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DE MATOSINHOS, EPE”, igualmente identificada nos autos, julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção, absolvendo a R. dos pedidos. Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 78 e segs. - paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões: “… 1. O prazo de impugnação dos actos administrativos fixado em 3 meses no n.º 2 do art. 58.º do Cód. Proc. Tribunais Administrativos apenas diz respeito aos actos administrativos anuláveis; 2. Tratando-se de actos nulos ou inexistentes tal impugnação não está sujeita a prazo, nos termos do preceituado no n.º 1 do citado normativo. 3. No caso dos presentes autos não foi praticado qualquer acto administrativo que determinasse a caducidade do direito do Demandante de continuar a exercer para a Demandada trabalho em regime de horário acrescido. 4. Pelo que a propositura da presente acção, não estando sujeita a prazo, foi tempestiva dado ser inexistente acto administrativo dispondo naquele sentido. 5. Aliás, para fazer cessar tal regime de trabalho sempre teria a Demandada de observar o disposto no n.º 8 do art. 75.º do Dec.-Lei n.º 564/99 de 21 de Dezembro, que lhe impunha um pré-aviso de 60 dias e a observância de determinados condicionalismos. 6. O que não aconteceu. 7. A simples comunicação feita ao Demandante pela Directora do Departamento de Gestão de Recursos Humanos e Gestão Documental da Demandada, no sentido de que havia caducado o período devidamente autorizado para a prática do regime de trabalho de horário acrescido não constitui por si acto administrativo determinativo de caducidade. 8. Tanto mais que, por um lado, não se mostra a existência de qualquer delegação de poderes feita à mesma pelo Presidente do Conselho de Administração da Demandada. 9. Nem tal qualidade de Delegada aparece por qualquer forma referida em tal resposta, o que a lei exige (Cód. Proc. Admin., arts. 35.º, 37.º e 38.º), e, 10. Por outro lado, porque sempre teria que haver um acto administrativo expresso, nos termos do n.º 8 do art. 75.º do Dec.-Lei n.º 564/99 de 21 de Dezembro, dado que tacitamente o Presidente do Conselho de Administração da Demandada havia autorizado a prestação de trabalho pelo Demandante ao abrigo do indicado regime. 11. Conforme dispõe o art. 668.º do Cód. Proc. Civil, verifica-se nulidade de sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. 12. O mesmo ocorrendo se houver omissão de pronúncia sobre os fundamentos invocados pelas partes para alicerçar a sua pretensão. 13. In casu, o Meritíssimo Juiz a quo não se pronunciou sobre o pedido subsidiário formulado pelo Demandante. 14. Tendo cometido a mesma omissão de pronúncia no que toca ao alegado acto administrativo tácito do Presidente do Conselho de Administração da Demandada de renovação do regime de trabalho que aquele vinha praticando para esta, e que continuou para depois de 1 de Dezembro de 2005 até à instauração dos presentes autos, nos mesmos termos de sempre …”. O ente público R., ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 111 e segs.) nas quais conclui pela manutenção do julgado concluindo nos seguintes termos: “… 1. Através da presente acção administrativa, pretende o Autor que o Tribunal declare como inexistente o acto administrativo que procedeu à caducidade do regime de horário acrescido aplicável ao mesmo. 2. O acto impugnado corresponde ao descrito no art. 20.º da sua petição inicial, pois outro não vem definido naquele articulado. 3. Mais nenhum outro acto foi praticado, nem tão pouco foi promovida qualquer outra notificação ao Autor sobre o conteúdo ou interpretação do mesmo e da questão em discussão nos presentes autos, sendo certo que, cronologicamente, foi mesmo o último acto proferido no âmbito do presente processo administrativo. 4. Assim sendo, e considerando este acto como aquele que o Autor pretende ver declarado inexistente, o mesmo foi-lhe notificado a 2 de Fevereiro de 2006. Ora, decorre do carimbo aposto pela secretaria do Tribunal na petição a que se responde, que a presente acção administrativa foi intentada em 30 de Março de 2007. 5. É por demais evidente que a presente acção administrativa é extemporânea, pois encontra-se ultrapassado o prazo de três meses a que se refere a norma contida no art. 58.º, n.º 2, alínea b) do CPTA, pelo que, decidiu bem o Tribunal Recorrido. 6. Resulta ainda dos autos que o Autor, a partir da data em que tomou conhecimento da posição assumida pela Ré quanto à caducidade do direito de vir a exercer o trabalho em regime de horário acrescido, reuniu todas as condições para impugnar tal posição e acto respectivo; 7. Ou então, constatada a ausência de um qualquer acto administrativo que, no seu entender, fosse legalmente devido, poderia o Autor deduzir pretensão condenatória na prática do mesmo acto. 8. Tendo em consideração o regime-regra no que concerne ao vício gerador da invalidade dos actos administrativos - precisamente, a anulabilidade - o Autor não observou, nos presentes autos, o disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 58.º ou no n.º 1 do art. 69.º do CPTA, pelo que, a decisão do Tribunal Recorrido é legalmente correcta …”. O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso (cfr. fls. 149/150), parecer esse que objecto de contraditório não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 153 e segs.). Foi sustentada a decisão judicial recorrida quanto à arguição de nulidades da mesma pelo despacho da Mm.ª Juiz “a quo” (cfr. fls. 163) na sequência do que havia sido determinado neste Tribunal pelo despacho de fls. 156. Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento. Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2, 146.º, n.º 4 do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recursos de ‘revisão’” [cfr. J.C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 10.ª edição, págs. 452/453 e 467 e segs.; M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” - in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71]. As questões suscitadas reconduzem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao julgar ocorrer a excepção de caducidade do direito de acção incorreu, por um lado, em nulidades [infracção ao preceituado nas als. a), b) e c) do n.º 1 do art. 668.º e ainda os arts. 660.º, n.º 2 e 664.º todos do CPC] e, por outro, em erro de julgamento por infracção ao disposto nos arts. 35.º, 37.º, 38.º e 120.º do CPA, 58.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA e 75.º, n.º 8 do DL n.º 564/99, de 21.12 [cfr. alegações e conclusões de recurso supra reproduzidas]. 3.1. DE FACTO Resulta da decisão judicial recorrida como assente com interesse para a decisão da causa a seguinte factualidade: I) O A. é Técnico Especialista de Saúde Ambiental (Coordenador) da “Unidade Local de Saúde de Matosinhos, EPE”. II) No dia 10.11.2004 deu entrada nos serviços da entidade demandada um requerimento solicitando que lhe fosse concedido o regime de horário acrescido de acordo com os n.ºs 2 e 3 do artigo 75.º do DL n.º 564/99, de 21.12. III) No dia 17.11.2004 a demandada proferiu no rosto do referido requerimento a concessão do regime de horário acrescido com base na rescisão de contrato de um técnico que assegurava actividades da Unidade de Saúde Pública em parte do seu horário e se reconhecer que desta circunstância resultava necessidades de serviço que se impunham ultrapassar. IV) No dia 01.12.2004 o A. começou a trabalhar ao abrigo daquele regime. V) Por deliberação do Conselho de Administração de 27.04.2005, n.º 0715/2005, foi prorrogado por mais seis meses a partir de 01.06.2005 o regime de horário acrescido. VI) No dia 02.12.2005 foi publicada a Circular Normativa n.º 09 da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde sobre horário acrescido na qual se determinou a suspensão da atribuição do regime de horário acrescido nas carreiras de Enfermagem, dos Técnicos Superiores de Saúde e dos Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica. VII) No dia 13.12.2005 foi publicado um boletim informativo que procedeu à publicação integral da referida Circular Normativa e informou que, face ao conteúdo da mesma a prorrogação/atribuição de horário acrescido fica condicionada de futuro, pelas directrizes que vierem a ser produzidas na sequência de negociação do Contrato Programa para 2006. VIII) Em 03.01.2006 o A., em requerimento dirigido ao Presidente do Conselho de Administração da entidade demandada, solicitou informação sobre “… o facto de no mês de Dezembro de 2005 não lhe ter sido atribuído o acréscimo remuneratório de 37% da remuneração base, relativo a modalidade de regime de trabalho de horário acrescido …”. IX) A este pedido de informação respondeu-lhe, no dia 02.02.2006, a Directora do Departamento de Gestão de Recursos Humanos e Gestão Documental, Sr.ª Dr.ª Maria de Lurdes Andrade, informando que “… não foi processado o acréscimo remuneratório de 37% da remuneração base correspondente à remuneração do regime de horário acrescido por ter caducado, no dia 30 de Novembro de 2005, o período devidamente autorizado para a prática daquele regime …”. X) Os presentes autos deram entrada em juízo em 30.03.2007. «» 3.2. DE DIREITO Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise das várias questões suscitadas para se concluir pela procedência ou improcedência da argumentação desenvolvida pelo recorrente no recurso jurisdicional “sub judice”. * 3.2.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA O TAF do Porto em apreciação da pretensão deduzida pelo recorrente na presente acção administrativa especial concluiu no sentido de que “in casu” havia caducado o direito de acção do A.. Argumentou, no essencial, que o A. sustenta “… que, no caso dos autos, está em causa um acto inexistente que se reporte à caducidade do direito ao exercício do trabalho em regime de horário acrescido e que, porque se trata de acto inexistente, não está sujeita a prazo a sua impugnação e, consequentemente, esta acção. Mas o que ressuma dos autos é que o A. a partir da data do conhecimento da posição da demandada quanto à caducidade do direito de exercer o trabalho em regime de horário acrescido, passou a conhecer a posição da demandada quanto à concreta questão trazida a juízo e que configura um acto definidor da situação jurídica individual e concreta do A., cujo conteúdo é susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos. Em face deste acto, estavam reunidas as condições para o A. atacar a sua validade, como à sua maneira fez nos presentes autos, ao defender que o entendimento da demandada nesse acto está em desconformidade com a lei. Ou, então, constatada a ausência, alegadamente ilegal, da prática de qualquer acto expresso podia, como resulta dos autos, deduzir uma pretensão condenatória na prática do acto devido que, segundo a sua tese, foi ilegalmente omitido pela entidade competente para o proferir e que se consubstancia no pagamento do trabalho que alegadamente continuou a exercer no regime de trabalho acrescido. Estando em causa, pois, um acto expresso da entidade demandada que se reputa contrário ao regime jurídico aplicável, o que temos é um acto que se ataca na sua validade, imputando-lhe vício gerador do regime-regra de invalidade: a anulabilidade. … E, assim sendo, por força do disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 58.º do CPTA, dispunha o A. do prazo de três meses para ter intentado a presente acção, prazo que começou a correr a partir da data em que lhe foi notificada a resposta da entidade demandada. Em face disso, é manifesto que, quando o A. intentou a presente acção, havia já decorrido o referido prazo legal, pelo que, sendo esse o prazo aplicável, sempre estaria a acção intentada votada ao fracasso dado que a caducidade do direito de acção constitui fundamento que obsta ao prosseguimento do processo - cfr. alínea h) do n.º 1 do art. 89.º do CPTA. Acresce que, ainda que se possa dizer que o que o A. pretende não é atacar a validade do acto proferido pela entidade demandada mas, antes, alcançar a satisfação da condenação da entidade demandada na prática do acto devido e que, para o A., é o direito à percepção da quantia correspondente ao exercício do trabalho em regime de trabalho acrescido, ainda assim, a conclusão a que o Tribunal chega é a mesma, porquanto, à data da interposição da presente acção, tinha, também, decorrido o prazo de um ano estabelecido no n.º 1 do art. 69.º do CPTA para intentar uma acção de condenação à prática de acto devido. Ou seja, a caducidade do direito do A. de deduzir os pedidos formulados é manifestamente procedente, o que constitui fundamento que obsta ao prosseguimento dos presentes autos - cfr. art. 89.º, n.º 1, alínea h) do CPTA …”. * 3.2.2. DA TESE DO RECORRENTE Alega o mesmo que aquela decisão judicial incorreu em nulidade e erro de julgamento por haver contrariado o disposto nos arts. 660.º, 664.º e 668.º, n.º 1, als. a), b) e c) do CPC, 35.º, 37.º, 38.º e 120.º do CPA, 58.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA e 75.º, n.º 8 do DL n.º 564/99 já que, em seu entendimento, à luz do quadro fáctico e normativo invocado, não ocorreu qualquer caducidade do direito visto se estar perante ilegalidade geradora de inexistência do acto, sendo que não houve pronúncia sobre questões suscitadas e sobre o pedido subsidiário formulado. * 3.2.3. DO MÉRITO DO RECURSOEstá em causa, para além da questão das nulidades de sentença, o aferir se, em concreto, ocorreu ou não caducidade do direito invocado pelo A. e no qual o mesmo sustenta a sua pretensão condenatória. ~ 3.2.3.1. DAS NULIDADES DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA [arts. 660.º, 664.º, 668.º, n.º 1, als. a), b), c) e d) do CPC]Estipula-se no art. 668.º do CPC, sob a epígrafe de “causas de nulidade da sentença” e na parte que releva, que é “… nula a sentença: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento ...”. As situações de nulidade da decisão encontram-se legalmente tipificadas no art. 668.º, n.º 1 do CPC, cuja enumeração é taxativa, comportando causas de nulidade de dois tipos [de carácter formal - art. 668.º, n.º 1, al. a) CPC - e várias causas respeitantes ao conteúdo da decisão - art. 668.º, n.º 1, als. b) a e) CPC], sendo que a qualificação como nulidade de decisão de ilegalidades integradoras de erro de julgamento não impede o Tribunal “ad quem” de proceder à qualificação jurídica correcta e apreciar, nessa base, os fundamentos do recurso. Não merecendo ou carecendo a nulidade prevista na al. a) do n.º 1 do art. 668.º do CPC de qualquer esclarecimento pela sua evidência (ausência de assinatura do juiz), temos que a nulidade da decisão por infracção ao disposto na al. b) do mesmo normativo só ocorre quando do teor da decisão judicial sindicada em sede de recurso não constem com o mínimo de suficiência e de explicitação os fundamentos de facto e de direito que a justificam. A este respeito, a doutrina [J. Alberto dos Reis in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, pág. 140; J. Rodrigues Bastos in: “Notas ao Código de Processo Civil”, 3.ª edição, vol. III, pág. 193; Anselmo de Castro in: "Direito Processual Civil Declaratório", Tomo III, pág. 141; Antunes Varela, M. Bezerra e Sampaio e Nora in: "Manual de Processo Civil", 2.ª edição, pág. 687] e a jurisprudência [cfr. Acs. STJ de 14.04.1999 in: BMJ n.º 486, págs. 250, de 09.02.1999 - Proc. n.º 98A1228, de 10.05.2000 - Proc. n.º 00A3277, de 12.05.2005 - Proc. n.º 5B840, de 17.04.2007 - Proc. n.º 07B956 in: «www.dgsi.pt/jstj»; Acs. STA de 24.10.2000 (Pleno) - Proc. n.º 037128, de 26.03.2003 - Proc. n.º 047441, de 10.09.2009 - Proc. n.º 0940/08 in: «www.dgsi.pt/jsta»; Acs. deste TCAN de 21.10.2004 - Proc. n.º 00060/04, de 21.02.2008 - Proc. n.º 00462/2000 - Coimbra, de 24.04.2008 - Proc. n.º 00507/06.6BEBRG, de 08.05.2008 - Proc. n.º 00222/03-Coimbra, de 02.04.2009 - Proc. n.º 01993/08.5BEPRT, de 18.06.2009 - Proc. n.º 01411/08.9BEBRG-A in: «www.dgsi.pt/jtcn»], têm feito notar que não deve confundir-se a eventual sumariedade ou erro da fundamentação de facto e de direito com a sua falta absoluta, pois, só a esta última se reporta a alínea em questão. Já quanto à nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 668.º do CPC temos que na mesma, tal como tem sido decidido e afirmado em vários arestos [cfr. entre outros, Acs. do STJ de 20.03.2003 - Proc. n.º 03B62, de 04.12.2003 - Proc. n.º 03B2667 in: «www.dgsi.pt/jstj»; Acs. do STA de 17.03.1992 (Pleno) - Proc. n.º 17017 in: Ap. DR de 30/09/1994, págs. 163 e segs., de 13.02.2002 - Proc. n.º 047203, de 04.03.2004 - Proc. n.º 0391/03, de 23.06.2004 - Proc. n.º 047738, de 29.06.2004 - Proc. n.º 01666/02, de 29.06.2004 - Proc. n.º 0292/04, de 20.10.2004 - Proc. n.º 01939/03 in: «www.dgsi.pt/jsta»; Acs. TCA Norte de 30.10.2008 - Proc. n.º 00860/05.9BEBRG, de 15.01.2009 - Proc. n.º 00191/08.2BEMDL-A in: «www.dgsi.pt/jtcn»], a contradição que é geradora de nulidade da sentença é unicamente a que se localiza no plano da sua expressão formal, redundando num vício insanável do chamado “silogismo judiciário”, ou seja, é uma contradição de ordem formal, que se refere aos fundamentos estabelecidos e utilizados na sentença, e não aos que resultam do processo. Na verdade, esta nulidade está relacionada, por um lado, com a obrigação imposta pelos arts. 158.º e 659.º, n.ºs 2 e 3 do CPC de o juiz fundamentar os despachos e as sentenças e, por outro, pelo facto de a sentença dever constituir um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão deverá ser a consequência ou conclusão lógica da conjugação da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor). Tal significa, como ensinava J. Alberto dos Reis, que"… a sentença enferma de vício lógico que a compromete …", isto é, "… a construção da sentença é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso, mas a resultado oposto …"(in: "Código Processo Civil Anotado", vol. V, pág. 141), (cfr., no mesmo sentido, Antunes Varela, M. Bezerra e Sampaio e Nora in: "Manual de Processo Civil", págs. 689/690). Refere a este propósito Miguel Teixeira de Sousa que “… a decisão é nula quando os seus fundamentos estiverem em oposição com a parte decisória (…), isto é, quando os fundamentos invocados pelo tribunal conduzirem logicamente a uma conclusão oposta ou, pelo menos, diferente daquela que conta da decisão (…). Esta nulidade é o correspondente, quanto à decisão do tribunal, da ineptidão da petição inicial por contradição entre o pedido e a causa de pedir …” (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, pág. 224). Na mesma linha Lebre de Freitas sustenta que entre “… os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial …” (in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2.º, pág. 670). E conforme se decidiu no acórdão do STJ de 30.09.2004 (Proc. n.º 04B2894 in: «www.dgsi.pt/jstj») “… o vício de nulidade a que se reporta a alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º e o n.º 1 do artigo 716.º do Código de Processo Civil é o que ocorre quando os fundamentos de facto e de direito invocados conduzirem logicamente ao resultado oposto àquele que integra o respectivo segmento decisório. Isso significa que os fundamentos de facto e de direito do acórdão devem ser logicamente harmónicos com a pertinente conclusão ou decisão, como corolário do princípio de que o acórdão deve ser fundamentado de facto e de direito, e que tal se não verifica quando haja contradição entre esses fundamentos e a decisão nos quais assenta. Mas uma coisa é a contradição lógica entre os fundamentos e a decisão da sentença ou do acórdão, e outra, essencialmente diversa, o erro de interpretação dos factos ou do direito ou a aplicação deste, que não raro se confunde com aquela contradição …” (neste sentido para além da jurisprudência supra citada ver ainda Ac. do STJ de 22.01.2004 - Proc. n.º 03B4278 in: «www.dgsi.pt/jstj»). Com efeito, esta nulidade nada tem que ver com "o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro da construção do silogismo judiciário", que atrás se referiram, ou com a “inidoneidade dos fundamentos para conduzir à decisão”, porquanto não existe a oposição, geradora desta nulidade, se o julgador erra na subsunção, que fez, dos factos à norma jurídica aplicável ou se, porventura, ele errou na indagação da norma aplicável ou na sua interpretação. Se o juiz tiver entendido, erradamente, que os factos apurados acarretam determinadas consequências jurídicas e conseguiu exprimir tal entendimento nos fundamentos invocados e destes retira a conclusão lógica, haverá um erro de julgamento e mas não há a nulidade da oposição entre os fundamentos e a decisão. No que diz respeito à nulidade prevista na al. d) do normativo legal em referência a mesma prende-se com o dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (cfr. arts. 660.º, n.º 2 CPC e 95.º do CPTA). Trata-se, nas palavras de M. Teixeira de Sousa, do “... corolário do princípio da disponibilidade objectiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º 2.ª parte) …” que “… significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com excepção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões. (...) Também a falta de apreciação de matéria de conhecimento oficioso constitui omissão de pronúncia …” (in: ob. cit., págs. 220 e 221). Questões para este efeito são “... todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes …” (cfr. A. Varela in: RLJ, Ano 122.º, pág. 112) e não podem confundir-se “... as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão …” (cfr. J. Alberto dos Reis in: ob. cit., pág. 143). Daí que as questões suscitadas pelas partes e que justificam a pronúncia do Tribunal terão de ser determinadas pelo binómio causa de pedir-pedido. Como defende igualmente M. Teixeira de Sousa o “... tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa. (...) Verifica-se, pelo contrário, uma omissão de pronúncia e a consequente nulidade [art. 668.º, n.º 1, al. d) 1.ª parte] se na sentença, contrariando o disposto no art. 659.º, n.º 2, o tribunal não discriminar os factos que considera provados (...) ou se abstiver de apreciar a procedência da acção com fundamento numa das causas de pedir invocadas pelo autor (...). Se o autor alegar vários objectos concorrentes ou o réu invocar vários fundamentos de improcedência da acção, o tribunal não tem de apreciar todos esses objectos ou fundamentos se qualquer deles puder basear uma decisão favorável à parte que os invocou. (...) Em contrapartida, o tribunal não pode proferir uma decisão desfavorável à parte sem apreciar todos os objectos e fundamentos por ela alegados, dado que a acção ou a excepção só pode ser julgada improcedente se nenhum dos objectos ou dos fundamentos puder proceder …” (in: ob. cit., págs. 220/221). A sentença ou o acórdão constituem decisões jurisdicionais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, num caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses (públicos e/ou privados) no âmbito das relações jurídicas administrativas (cfr. arts. 01.º e 04.º ambos do ETAF). Os mesmos conhecem do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para aquele caso concreto, pelo que a sentença ou o acórdão podem estar viciados de duas causas que poderão obstar à eficácia ou validade da dicção do direito: - Por um lado, podem ter errado no julgamento dos factos e do direito e, então, a consequência é a sua revogação; - Por outro, como actos jurisdicionais, podem ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra do qual são decretados e, então, tornam-se passíveis de nulidade nos termos do art. 668.º do CPC. Munidos destes considerandos de enquadramento centremos nossa atenção nas nulidades assacadas à decisão judicial em crise. Desde logo, não se vislumbra minimamente procedente a invocada nulidade decorrente da al. a) do n.º 1 do art. 668.º do CPC porquanto a decisão judicial em crise se mostra assinada pela Mm.ª Juiz que a elaborou tal como se pode comprovar pela simples visualização de fls. 74 dos autos. De seguida não se descortina, igualmente, qualquer infracção às als. b) e c) do mesmo preceito tanto mais que pese embora a referência nas respectivas alegações quanto a uma pretensa violação daquelas alíneas o recorrente em sede conclusiva centra o seu ataque em nulidade por omissão de pronúncia [cfr. conclusões 11.ª a 14.ª]. Na verdade, o recorrente não justifica em concreto em que medida a decisão judicial sindicada padece de nulidade por elaborada em infracção ao disposto naquelas alíneas, sendo certo que à luz do enquadramento supra efectuado, na situação vertente e uma vez analisada a estrutura global da decisão recorrida, temos que esta contém, por um lado, o mínimo de suficiência e de explicitação os fundamentos de facto e de direito que a justificam e que é exigido pela al. b) do n.º 1 do art. 668.º e, por outro lado, verifica-se que a respectiva conclusão decisória (absolvição da R. por procedência de excepção de caducidade do direito de acção) está logicamente encadeada com a respectiva motivação fáctico-jurídica desenvolvida pela Mm.ª Juiz “a quo” que a elaborou, não ocorrendo, nessa medida, a arguida nulidade enquanto fundada na al. c) do mesmo preceito legal. Cumpre, agora, centrar a nossa atenção na arguição da nulidade decorrente da violação da al. d) do mesmo normativo. Ora analisada a decisão recorrida temos que relativamente à questão da invocação de pretensão assente na inexistência de acto administrativo que determinasse a cessação do trabalho em regime de horário acrescido e que no entender do recorrente afastaria a caducidade do direito e acção temos que não resulta que a Mm.ª Juiz “a quo” tenha incorrido em qualquer omissão de pronúncia que conduza à nulidade daquela decisão porquanto, dentro da lógica que presidiu à sua elaboração, a mesma, mercê do enquadramento e julgamento feito quanto à “excepção de caducidade”, acabou por considerar que tal realidade não seria geradora de qualquer desvalor conducente à figura da inexistência jurídica mas apenas da anulabilidade e, nessa medida, julgou procedente tal excepção. Se tal pronúncia é a correcta tal não releva em sede de nulidade da decisão, mas ao invés no âmbito de erro de julgamento de facto de direito. Já o mesmo não se pode afirmar quanto à questão do pedido formulado a título subsidiário visto neste caso ocorrer clara omissão de pronúncia porquanto a Mm.ª Juiz “a quo” improcedendo, por procedência de excepção, a pretensão principal nada disse quanto à pretensão condenatória fundada alegadamente no regime legal previsto para o trabalho suplementar, pelo que tendo deixado de conhecer de questão que no caso deveria ter conhecido enferma nesse segmento de nulidade a decisão judicial. Nessa medida, procede parcialmente este fundamento de recurso. ~ 3.2.3.2. DO ERRO DE JULGAMENTO [arts. 35.º, 37.º, 38.º e 120.º CPA, 58.º, n.ºs 1 e 2 CPTA e 75.º, n.º 8 DL n.º 564/99, de 21.12]Defende o recorrente, em sede de fundamento material, que a sentença sob impugnação padece de erro de julgamento porquanto a impugnação através da acção administrativa “sub judice” é tempestiva já que inexistindo acto administrativo que haja determinado a cessação do regime de horário acrescido a que o mesmo estava sujeito a dedução da presente acção poderia ocorrer a todo o tempo, não estando sujeita portanto a qualquer prazo, tanto mais que, se bem se entende a tese do recorrente, o prazo de accionamento judicial só se iniciaria com a prática do acto e sua devida notificação. Mais refere que o acto que lhe foi comunicado da autoria da Sr.ª Directora de Departamento de Gestão de Recursos Humanos e Gestão Documental não se trata, ao que se infere da argumentação pelo mesmo expendida, de acto administrativo e que o sendo fosse susceptível de impugnação para assim desencadear o início do prazo de impugnação, na certeza de que inexistiu qualquer delegação de poderes por parte do CA da R. naquele dirigente, nem a comunicação faz referência à sua existência. Perante este posicionamento vejamos se lhe assiste razão, para o que importa, no essencial, enquadrar e caracterizar, por um lado, a acção administrativa especial em presença e, por outro, as figuras da inacção/silêncio da Administração e suas consequências e a da inexistência jurídica enquanto desvalor. Iniciando, desde logo, a nossa análise quanto a esta última figura cumpre afirmar, tal como é sustentado por Freitas do Amaral, que a “validade” dum acto é a sua “… aptidão intrínseca … para produzir os efeitos jurídicos correspondentes ao tipo legal a que pertence, em consequência da sua conformidade com a ordem jurídica …” (in: “Curso de Direito Administrativo”, vol. II, págs. 342 e segs.). Daí que enunciando a lei, quanto aos actos administrativos em geral, determinados requisitos a sua não verificação em concreto por referência a cada acto gera o desvalor da “invalidade”, a qual, seguindo de novo a doutrina daquele Professor, é “… a inaptidão intrínseca para a produção de efeitos, decorrente de uma ofensa à ordem jurídica …”. Como também afirma J. C. Vieira de Andrade a “… validade diz respeito a momentos intrínsecos, pondo a questão de saber se o acto comporta, ou não, vícios ou malformações, em face das normas que estabelecem os termos em que é possível a produção de efeitos jurídicos por via de autoridade...” [em “Validade (do acto administrativo)” in: Dicionário Jurídico da Administração Pública (DJAP), vol. VII, pág. 582]. Na sequência da lição deste Autor (in: ob. cit., págs. 583 e segs.), bem como de Freitas do Amaral (in: ob. cit., págs. 342 e segs.), a apreciação da validade de um determinado acto afere-se por referência ao sujeito que o pratica [conformidade com as normas referentes às suas atribuições e com as suas competências legais (quer quanto aos poderes em razão da matéria e do lugar, quer se em concreto está legitimado para os exercer)], ao objecto mediato [este tem de ser possível física e juridicamente, determinado ou identificável, bem como terá de ser idóneo em termos de adequação do objecto ao conteúdo e deve estar legitimado para suportar os efeitos do acto], ao procedimento, à forma, ao fim, ao conteúdo e decisão (visando o acto a produção de efeitos jurídicos numa situação concreta aqueles efeitos têm de ser determinados ou compreensíveis, possíveis e lícitos) e à vontade. Ora as ilegalidades/vícios susceptíveis de afectarem o acto administrativo não geram todos os mesmos desvalores, isto é, não conduzem todos às mesmas consequências, recortando-se entre os tais desvalores a inexistência, a nulidade e a anulabilidade A regulamentação legal relativa à matéria das formas de invalidade constava anteriormente dos arts. 363.º e 364.º do Código Administrativo, sendo que, posteriormente, passou a constar dos arts. 88.º e 89.º da LAL/84 e tem hoje regime geral vertido nos arts. 133.º a 136.º do CPA. É controversa ou controvertida a caracterização do desvalor da “inexistência”, mormente, quanto à sua relevância enquanto desvalor e quanto ao seu reconhecimento e consagração legal no nosso ordenamento (cfr., entre outros, Marcelo Rebelo de Sousa em “Inexistência jurídica” in: “DJAP”, vol. V, págs. 231 e segs., em especial, sobre a controvérsia pág. 241; Freitas do Amaral in: ob. cit., págs. 413 e segs.; Sérvulo Correia in: “Noções de Direito Administrativo”, págs. 350/353; Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim in: “Código de Procedimento Administrativo - Comentado”, 2.ª edição, pág. 638; Santos Botelho, Pires Esteves e Cândido Pinho in: “Código Procedimento Administrativo - Anotado e Comentado”, 5.ª edição, págs. 783 e segs.). Temos para nós que no nosso ordenamento jurídico-administrativo a inexistência jurídica existe e existe enquanto desvalor distinto da nulidade, padecendo daquele desvalor aquele facto ou factos que duma forma inequivocamente grosseira pretenda(m) querer passar-se por acto administrativo e sem que corporize(m) qualquer realidade com correspondência com o conceito pelo mesmo definido. E para tal não é necessário que a lei expressamente o refira ou afirme, já que a inexistência jurídica constitui um meio através do qual o ordenamento jurídico ou o Direito recusa aceitar qualquer valor ou efeito a determinadas situações fulminando-as com aquele desvalor. Nas palavras de Freitas do Amaral o acto administrativo inexistente “… é um quid que se pretende fazer passar por acto administrativo, mas a que faltam certos elementos estruturais constitutivos que permitam identificar um tipo legal de acto administrativo (…). Na inexistência, por conseguinte, faltando requisitos mínimos de identificabilidade (tanto orgânicos como formais ou substanciais), não há acto administrativo …” (in: ob. cit., pág. 415). Também Marcelo Rebelo de Sousa afirma que “… na inexistência jurídica não há acto, e, portanto, de uma estrita perspectiva de legalidade, que não de licitude, não faz sentido censurar acto que não existe (…). … O que define, …, a inexistência jurídica no Direito Português - … -, é a inidentificabilidade de certa realidade - omissão ou comissão - como acto jurídico. … Consequência da definição apresentada, o regime da inexistência jurídica caracteriza-se, …, essencialmente pelos seguintes traços essenciais: a) Não produção de efeito jurídico algum; b) Insanabilidade, inconvertibilidade, totalidade e irredutibilidade; c) Não necessidade de declaração jurisdicional; d) Não vinculação ao princípio do respeito dos casos julgados; e) Inexecutoriedade pelo poder político do Estado, envolvendo a sua não aplicação e a cessação do dever de obediência na Administração Pública, se respeitar ao domínio da actuação do poder político estadual; f) Quanto a este domínio, reconhecimento do direito de resistência por parte dos cidadãos …” (em loc. cit., págs. 233 a 235). Atente-se, por outro lado, que no nosso ordenamento jurídico-administrativo o regime regra em termos de forma de invalidade é o da anulabilidade, já que a forma de invalidade da nulidade reveste de natureza excepcional (cfr. arts. 135.º e 133.º do CPA) (cfr., por todos, Freitas do Amaral in: ob. cit., págs. 408/409). Refere a este propósito J.C. Vieira de Andrade (in: ob. cit., págs. 586/587) que num “… sistema de administração executiva, como o português, a generalidade da doutrina está de acordo em que a anulabilidade constitui a «invalidade-regra», em função das ideias de estabilidade (das relações jurídicas criadas pelos actos ou à sombra deles) e de autoridade (mas não já de «presunção de legalidade»), do acto administrativo - para uns porque a nulidade só existe nos casos expressamente previstos na lei; para outros, porque o regime da nulidade só se aplica em casos de vícios particularmente graves …” (cfr., também, o mesmo Autor em “Nulidade e anulabilidade do acto” in: CJA n.º 43, JAN/FEV 2004, págs. 41 a 48, em especial, págs. 46/47, bem como Freitas do Amaral in: ob. cit., pág. 409). Daí que os casos de nulidade no nosso ordenamento são aqueles que vêm estabelecidos no art. 133.º do CPA, normativo este que encerra em si, para além duma remessa para o que se mostre fulminado em lei especial com o desvalor da nulidade, um enunciado genérico que contém a lista das nulidades. Temos ainda que resulta do art. 01.º do CPA que se entende por “… procedimento administrativo a sucessão ordenada de actos e formalidades tendentes à formação e manifestação da vontade da Administração Pública ou à sua execução …” (n.º 1) e por “… processo administrativo o conjunto de documentos em que se traduzem os actos e formalidades que integram o procedimento administrativo …” (n.º 2), sendo que nos termos do art. 122.º do mesmo Código os “… actos administrativos devem ser praticados por escrito, desde que outra forma não seja prevista por lei ou imposta pela natureza e circunstâncias do acto …” (n.º 1) e a “… forma escrita só é obrigatória para os actos dos órgãos colegiais quando a lei expressamente a determinar, mas esses actos devem ser sempre consignados em acta, sem o que não produzirão efeitos …” (n.º 2). Deriva, assim, deste último quadro legal citado que um procedimento administrativo se traduz numa cadeia ou numa sucessão de actos e formalidades (de factos e de operações) legalmente previstos, devidamente interligados, ordenados, estruturados e funcionalmente orientados para a emissão duma decisão final, sendo que esta, enquanto consubstancia o acto administrativo, carece de ser tomada ou manifestada por escrito, destinando-se tal exigência a servir como mecanismo ou instrumento de segurança e de certeza jurídica no âmbito das relações jurídico-administrativas. Note-se, ainda, que tais escritos, que consubstanciam, como aludimos, os actos administrativos, constituem documentos autênticos por emitidos por autoridade pública no exercício das suas funções, natureza que se estende aos de mais actos do procedimento praticados pelas autoridades instrutora ou decisora. Ora socorrendo-nos do enquadramento que fomos desenvolvendo e respectivo quadro legal trazido à colação importa, desde já, concluir que a tese sustentada pelo recorrente não pode merecer o nosso acolhimento porquanto o alegado e invocado nunca pode conduzir à inexistência jurídica enquanto desvalor do acto que legitime, no caso, a dedução de acção administrativa a todo o tempo. A realidade articulada pelo recorrente nos autos traduz-se numa situação em que o mesmo, tendo deixado de auferir o acréscimo remuneratório de 37% previsto no art. 75.º, n.º 6 do DL n.º 564/99, confrontou a instituição hospitalar em que trabalha sobre o porquê e fundamento do processamento remuneratório havido pelos serviços administrativos/financeiros sem que os respectivos órgãos competentes hajam respondido a esta interpelação [o ofício enviado e subscrito pela Sr.ª Directora de Departamento aludido na matéria de facto apurada sob o n.º IX) não relevaria nessa sede] e sem que, alegadamente, tenha havido qualquer decisão proferida pelos mesmos órgãos a determinar a cessação do regime de horário acrescido ao aqui recorrente. Ora esta realidade e a dedução da pretensão/pedido em presença não conduz ou não gera a inexistência jurídica do acto administrativo enquanto desvalor que o inquina e que legitima a dedução de acção administrativa a todo o tempo tendente a fazer repor/reconhecer a legalidade afectada. Na verdade, no caso vertente não estamos perante a falta de qualquer elemento estrutural constitutivo do acto enquanto “quid” definidor e decisor duma determinada situação objecto de pronúncia por parte de órgão da Administração. Para estarmos perante uma situação de inexistência jurídica, como aludimos supra, importa que faltem os requisitos mínimos de identificabilidade (tanto orgânicos como formais ou substanciais) duma de certa realidade (omissiva ou activa) com um acto jurídico, com um acto administrativo. Tal não é essa manifesta e inequivocamente a situação em discussão nos autos visto que o que está em causa prende-se com uma alegada ausência no procedimento remuneratório desenvolvido pelos serviços administrativos/financeiros de prévia decisão a determinar a cessação do regime de horário acrescido ao aqui recorrente, que no entender do mesmo seria exigível nos termos do art. 75.º, n.º 8 do DL n.º 564/99, e que inquinaria de ilegalidade os sucessivos actos de processamento de vencimento praticados e que seriam lesivos dos direitos e interesses patrimoniais do ora recorrente. Só que a ausência daquela decisão no âmbito do procedimento administrativo em questão não afecta ou gera que os actos de processamento estejam ou padeçam de inexistência jurídica que os invalide, nem que nos confrontemos com uma situação de inexistência jurídica que funde a pretensão condenatória formulada. Não podemos equiparar a ausência da prática dum acto como o desvalor da inexistência jurídica que inquina aquele “quid” praticado que se pretende fazer passar por acto administrativo, sendo que a infracção ao disposto no art. 75.º, n.º 8 do DL n.º 564/99 não gera ou conduz minimamente ao desvalor da inexistência. Nessa medida, improcede a tese propugnada pelo recorrente enquanto estribada numa situação de alegada inexistência jurídica que permita a dedução independentemente de qualquer prazo de acção administrativa com a qual vise a reconstituição/reparação da sua esfera jurídica lesada pelo procedimento remuneratório havido e desenvolvido pela instituição hospitalar onde o mesmo desempenha funções. O facto de alegadamente não ter sido proferido acto tido por necessário ou de resposta ao pedido formulado pelo recorrente no procedimento administrativo em presença tal não gera a inexistência jurídica que inquine tal procedimento e/ou que gere desvalor que invalide os actos de processamento de vencimento havidos, os quais, assim, serão eventualmente afectados de desvalores que não o da inexistência (cfr. arts. 133.º e segs. do CPA). Daí que nos confrontamos, no caso, com uma situação de improcedência da pretensão deduzida pelo recorrente a título principal nesta acção já que não lhe assiste razão no fundamento no qual o mesmo sustenta o seu direito e pedido condenatório, sendo certo que, igualmente, não podemos configurar estarmos em face de uma inacção ou silêncio da Administração que seja susceptível de ser apreciada em sede de acção administrativa especial prevista nos arts. 66.º e segs. do CPTA. Com efeito, sobre a Administração impende o dever de pronúncia de harmonia com o regime decorrente dos art. 09.º do CPA, no qual se preceitua que os “… órgãos administrativos têm, nos termos regulados neste Código, o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares, e nomeadamente: a) Sobre os assuntos que lhes disserem directamente respeito; b) Sobre quaisquer petições, representações, reclamações ou queixas formuladas em defesa da Constituição, das leis ou do interesse geral …” (n.º 1), inexistindo, todavia, um dever de decisão “… quando, há menos de dois anos contados da data da apresentação do requerimento, o órgão competente tenha praticado um acto administrativo sobre o mesmo pedido formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos …” (n.º 2), sendo que o procedimento administrativo se extingue, nomeadamente, pela tomada de decisão final (cfr. art. 106.º do mesmo código). E para a aferição das consequências do silêncio ou da inacção da Administração perante pretensões que lhe sejam dirigidas e relativamente às quais sobre a mesma impenda um dever legal de decisão importa ter ainda presente o que deriva dos arts. 108.º e 109.º do CPA (sob a epígrafe, respectivamente, de “deferimento tácito” e de “indeferimento tácito”). Assim, deriva do art. 108.º que quando “… a prática de um acto administrativo ou o exercício de um direito por um particular dependam de aprovação ou autorização de um órgão administrativo, consideram-se estas concedidas, salvo disposição em contrário, se a decisão não for proferida no prazo estabelecido por lei …” (n.º 1), sendo que na ausência de preceito legal que fixe “… prazo especial, o prazo de produção do deferimento tácito será de 90 dias a contar da formulação do pedido ou da apresentação do processo para esse efeito …” (n.º 2), prazos estes cujo cômputo se suspende “… sempre que o procedimento estiver parado por motivo imputável ao particular …” (n.º 4), na consideração de que se mostram “… dependentes de aprovação ou autorização de órgão administrativo, para além daqueles relativamente aos quais leis especiais prevejam o deferimento tácito, os casos de: a) Licenciamento de obras particulares; b) Alvarás de loteamento; c) Autorizações de trabalho concedidas a estrangeiros; d) Autorizações de investimento estrangeiro; e) Autorização para laboração contínua; f) Autorização de trabalho por turnos; g) Acumulação de funções públicas e privadas …” (n.º 3). E do aludido art. 109.º resulta que sem “… prejuízo do disposto no artigo anterior, a falta, no prazo fixado para a sua emissão, de decisão final sobre a pretensão dirigida a órgão administrativo competente confere ao interessado, salvo disposição em contrário, a faculdade de presumir indeferida essa pretensão, para poder exercer o respectivo meio legal de impugnação …” (n.º 1), sendo que o “… prazo a que se refere o número anterior é, salvo o disposto em lei especial, de 90 dias …” (n.º 2) e tais prazos “… contam-se, na falta de disposição especial: a) Da data de entrada do requerimento ou petição no serviço competente, quando a lei não imponha formalidades especiais para a fase preparatória da decisão; b) Do termo do prazo fixado na lei para a conclusão daquelas formalidades ou, na falta de fixação, do termo dos três meses seguintes à apresentação da pretensão; c) Da data do conhecimento da conclusão das mesmas formalidades, se essa for anterior ao termo do prazo aplicável de acordo com a alínea anterior …” (n.º 3). Atente-se que quanto a este último preceito legal face ao poder conferido aos tribunais administrativos pelo CPTA de condenarem a Administração à prática de actos administrativos ilegalmente omitidos [cfr. arts. 02.º, n.º 2, al. i), 03.º, 46.º, n.º 2, al. b), 51.º, 66.º e segs., 95.º todos do CPTA], se procedeu à abolição da figura do até aí denominado “indeferimento tácito” [cfr. arts. 51.º, n.º 4 e 67.º, n.º 1, al. a) do CPTA], mostrando-se actualmente revogado o regime decorrente do n.º 1 do art. 109.º do CPA [cfr. Acs. TCA Norte de 18.10.2007 - Proc. n.º 00032/05.2BECBR, de 17.01.2008 - Proc. n.º 00353/06.7BEPRT in: «www.dgsi.pt/jtcn»; na doutrina, vide J.M. Sérvulo Correia em “O incumprimento do dever de decidir” in: CJA n.º 54, págs. 06 e segs., em especial, pág. 16; M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira in: “Código de Processo dos Tribunais Administrativos e Estatutos dos Tribunais Administrativos e Fiscais Anotados”, vol. I, pág. 412/413, nota II; J.C. Vieira Andrade in: ob. cit., pág. 314; M. Aroso Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: ob. cit., págs. 313 e segs.; M. Aroso de Almeida in: O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 4.ª edição, págs. 206 e segs. e em “Implicações de direito substantivo da reforma do contencioso administrativo” in: CJA n.º 34, págs. 69 a 71]. Tal como impressivamente refere J.M. Sérvulo Correia o “… objecto adstrito pelo CPTA à acção de condenação à prática de acto administrativo devido veio esvaziar de função útil a figura do indeferimento tácito. … O art. 51.º, n.º 4 do CPTA, conjugado com os outros preceitos já citados deste diploma que definem o objecto da acção de condenação, veio vedar o emprego do meio impugnatório (isto é, anulatório ou cassatório) nas situações de violação do dever de decidir por força de uma recusa da pretensão e, por maioria de razão, de inércia perante requerimento. Sendo, pois, o n.º 1 do art. 109.º do CPA incompatível com estes novos preceitos, deve ser considerado revogado por eles. Encontram-se deste modo revogados o n.º 1 do art. 109.º do CPA e quaisquer outros preceitos de legislação avulsa anteriores ao CPTA que configurassem situações de indeferimento tácito …” (in: loc. cit., pág. 16). Refira-se, por outro lado, que com a criação da “subespécie” da acção administrativa especial de condenação à prática de acto legalmente devido se veio dar concretização, no plano do direito ordinário, àquilo que o legislador constitucional, na revisão de 1997, havia consagrado no n.º 4 do art. 268.º da CRP, prevendo-se com este meio contencioso uma pronúncia condenatória. Este meio processual mostra-se regulado e disciplinado nos citados arts. 66.º e segs. do CPTA, definindo-se logo nos n.ºs 1 e 2 do referido art. 66.º o respectivo objecto, sendo que os seus respectivos pressupostos constam do art. 67.º no qual se estipula que a “… condenação à prática de acto administrativo legalmente devido pode ser pedida quando: a) Tendo sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido; b) Tenha sido recusada a prática do acto devido; ou c) Tenha sido recusada a apreciação de requerimento dirigido à prática do acto ...” (n.º 1) e que para os efeitos do disposto daquela al. a) “… a falta de resposta a requerimento dirigido a delegante ou subdelegante é imputada ao delegado ou subdelegado, mesmo que a este não tenha sido remetido o requerimento …” (n.º 2). Do cotejo dos normativos em referência, ora parcialmente reproduzidos, resulta que o objecto do processo neste tipo de acções se traduz na imposição à Administração do dever de praticar um determinado acto administrativo que o autor reputa ter sido legalmente omitido ou recusado por força do seu pretenso direito subjectivo na concreta relação jurídica administrativa, sendo que, por força do n.º 2 do art. 66.º e do n.º 1 do art. 71.º do CPTA, tal objecto é sempre aquela pretensão do interessado e, nessa medida, mesmo em face dum acto de recusa (recusa de emissão de decisão favorável ou recusa de apreciação do requerimento) temos que este meio contencioso se dirige não à anulação contenciosa daquele acto de recusa, mas, ao invés, à condenação da Administração na prática dum acto que, substituindo aquele, emita pronúncia sobre o caso concreto ou que venha a dar satisfação à pretensão deduzida quanto ao invocado direito da relação jurídica administrativa substantiva tal como a mesma se configura no momento em que a decisão vai ser prolatada (cfr. arts. 66.º, 70.º e 71.º do citado código). Retendo, ainda, os pressupostos deste meio processual surge-nos a problemática que se prende com a necessidade ou não de dedução de pretensão substantiva por parte do interessado junto da Administração como condição/pressuposto da interposição deste meio processual. Assim, o art. 67.º do CPTA parece exigir sempre a dedução de iniciativa por parte do interessado mediante a apresentação junto da Administração de requerimento contendo a formulação da sua pretensão substantiva, sob pena de na ausência ou falta de apresentação daquele requerimento inexistir o requisito/pressuposto do interesse processual gerando a sua rejeição. Tal exigência decorrente do “princípio da provocação” apenas não se mostrará necessária quando estivermos perante o exercício de acção pública face ao regime decorrente do citado preceito e que importa concatenar com o do art. 68.º, n.º 1, als. c) e d) do CPTA. Na aferição dos pressupostos processuais específicos deste meio processual (legitimidade processual, omissão/acto conteúdo negativo, oportunidade da dedução do pedido) importa atentar nas várias situações possíveis pelo que temos, desde logo, os da: - Existência duma omissão de decisão por parte da Administração face a requerimento do interessado deduzido perante órgão competente uma vez decorrido o prazo legal para emissão daquela decisão [cfr. situação prevista na al. a) do n.º 1 e n.º 2 do art. 67.º do CPTA e arts. 09.º, 109.º, n.º 2 do CPA]. - Existência de um acto administrativo de conteúdo negativo que traduziu na recusa da prática do acto devido mercê do indeferimento expresso, total e directo, da pretensão substantiva deduzida [cfr. situação prevista na al. b) do n.º 1 do art. 67.º do CPTA]. - Existência de um acto administrativo de recusa expressa de apreciação do requerimento (ausência do conhecimento de fundo/mérito da pretensão do interessado) [cfr. situação enunciada na al. c) do n.º 1 do art. 67.º do CPTA]. Encerrando aqui esta breve caracterização da acção administrativa especial de condenação à prática de acto legalmente devido, seu objecto e pressupostos, temos, na sequência do que supra já fomos referindo, que não nos movemos no seu âmbito, nem formalmente o recorrente deduziu a presente acção administrativa nesse pressuposto (cfr. na petição inicial os normativos invocados pelo A., aqui recorrente, e ao abrigo dos quais o mesmo formulou sua pretensão). É que na situação vertente não se pode considerar que com o requerimento formulado em 03.01.2006 pelo recorrente este haja deduzido pretensão administrativa tendente a que se lhe fosse processado o acréscimo remuneratório em questão e que sobre tal pretensão a Administração nada haja decidido ou que tenha havido indeferimento passível de ser objecto de acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido (arts. 66.º e segs. CPTA), visto o que efectivamente está em causa naquele mesmo requerimento é um mero pedido de fornecimento de informação procedimental relativo aos actos de processamento havidos, com esclarecimento quanto ao motivo da ausência de atribuição do referido acréscimo remuneratório relativamente à sua retribuição, pedido esse de informação que foi objecto de satisfação por parte da Sr.ª Directora de Departamento através do ofício datado de 27.01.2006 e recebido em 02.02.2006 [cfr. n.º IV) dos factos apurados], na certeza de que tal resposta não é aqui sindicada ou é passível de ser sindicada numa acção administrativa especial como a “sub judice”. Não releva, pois, nessa sede qualquer infracção ao regime dos arts. 35.º, 37.º, 38.º e 120.º CPA, tanto mais que no juízo que fazemos da situação em presença analisada petição inicial e pedido nela formulado, em divergência com o julgado sob apreciação, não está aqui a ser impugnado o “acto”/ofício subscrito pela referida Sr.ª Directora de Departamento da instituição hospitalar R. visto este constituir uma mera resposta ao pedido de informação procedimental e o mesmo não possui qualquer virtualidade ou intenção de definir a situação/posição jurídica remuneratória do recorrente. Nessa medida, pese embora não sufragando o enquadramento feito pelo tribunal “a quo” ainda assim não assiste razão ao recorrente na procedência que o mesmo reclama quanto à pretensão substantiva deduzida nos autos a título principal pelo que importa, com a fundamentação antecedente, julgar improcedente, absolvendo o R. do pedido formulado a título principal [declaração de inexistência de acto administrativo que haja procedido à caducidade do regime de horário acrescido e de condenação ao pagamento da quantia devida a título de acréscimo remuneratório de 37% pela prestação de trabalho de 42 horas semanais desde Dezembro até 30.03.2007 - data da propositura de acção]. * Cumpre, agora, de harmonia com o supra julgado em sede de nulidades da decisão judicial impugnada entrar na análise da pretensão e do pedido formulado pelo A. a título subsidiário [pedido de condenação da R. no pagamento da quantia de 7930,48€ decorrente de prestação de trabalho suplementar].Ora nesta sede valendo os considerandos referidos anteriormente temos que, no caso, a presente acção administrativa especial enquanto acção impugnatória e face aos termos em que a mesma se mostra interposta, carece de objecto porquanto o A. não impugna efectivamente qualquer acto administrativo que haja sido praticado pela R. e cuja pretensa ilegalidade em reposição conduza à procedência da pretensão deduzida a título subsidiário, quando é certo que esta assente em pressupostos de direito substantivo completamente dispares e que nunca mereceram qualquer apreciação no âmbito procedimental (cfr. arts. 46.º, 47.º, 50.º e segs. do CPTA). Por outro lado, e tentando configurar ou problematizar a hipótese da acção “sub judice” se apresentar como acção administrativa especial de condenação à pratica de acto legalmente devido temos, como já supra fomos aludindo, que tal hipótese será também de afastar porquanto inexistiu, como vimos, qualquer requerimento do A. dirigido à R. a peticionar o pagamento do acréscimo e quantias em questão que legitime a análise e julgamento da pretensão formulada, agora a título subsidiário, considerando para o efeito uma apreciação global da relação jurídica controvertida e que se mostra descrita nos autos, já que falha este pressuposto específico na hipótese de se configurar a acção administrativa “sub judice” como de condenação à prática de acto legalmente devido. Pelo exposto, com esta motivação soçobra a possibilidade de apreciação do pedido subsidiário, que assim, importa desatender o seu conhecimento. Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional e, em consequência: A) Julgar nula a decisão judicial recorrida por omissão de pronúncia quanto à apreciação do pedido deduzido a título subsidiário; B) Desatender, com e pela motivação atrás exposta, o pedido subsidiário, dele absolvendo a R.; C) Manter aquela decisão judicial apenas no segmento que absolveu a R. do pedido, estribando tal juízo na fundamentação antecedente. Custas em 1.ª instância a cargo do A., fixando-se a taxa de justiça em 05 (CINCO) UC’s [cfr. arts. 73.º-A, n.º 1, 73.º-D, n.º 3 do CCJ, 446.º do CPC e 189.º do CPTA]. Custas nesta instância a cargo de A. e R., na proporção ¾ e ¼, sendo que a taxa de justiça nela é reduzida a metade [cfr. arts. 73.º-A, n.º 1, 73.º-E, n.º 1, al. a), 18.º, n.º 2 todos do CCJ, 446.º do CPC e 189.º do CPTA]. Notifique-se. D.N.. Ass. Carlos Luís Medeiros de Carvalho Ass. Antero Pires Salvador Ass. Ana Paula Soares Leite Martins Portela |