Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00356/08.7BEVIS |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 09/15/2016 |
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Tribunal: | TAF de Aveiro |
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Relator: | Vital Lopes |
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Descritores: | FACTURAS FALSAS IVA CORRECÇÕES ÓNUS DE PROVA |
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Sumário: | 1. No caso de facturas falsas, compete à AT fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação correctiva e, só caso o faça, passa a recair sobre o contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto; 2. A AT só cumpre o ónus que lhe compete se recolher elementos factuais que pela sua objectividade, solidez e consistência consubstanciem claros e convincentes indícios de que as facturas desconsideradas para efeitos de dedutibilidade não titulam reais e efectivas operações. * * Sumário elaborado pelo Relator. |
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Recorrente: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Recorrido 1: | M..., Lda. |
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Decisão: | Negado provimento ao recurso |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE 1 – RELATÓRIO O Exmo. Representante da Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida por “M…– Sociedade Unipessoal, Lda.” contra as liquidações de IVA e Juros Compensatórios relativas ao ano de 2003, no valor total de 51.733,98€. O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.585). Na sequência do despacho de admissão, o Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões: A – O objecto do recurso 1. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por M... – SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA contra as liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios, referentes ao ano de 2003, pretendendo a Fazenda Pública a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação totalmente improcedente, confirmando na ordem jurídica as liquidações impugnadas. 2. Conquanto a impugnante tenha imputado variegados vícios às liquidações de IVA em causa, o douto Tribunal a quo entendeu aceder a apenas uma das pretensões, anulando, por vício de violação de lei, as correcções operadas em relação a operações alegadamente simuladas, no montante de € 51.733,98. B - A factualidade dada como provada 3. No que respeita aos factos dados como provados, e que não nos merecem qualquer reparo, destacam-se os pontos A. (pág. 2), B. (pág. 2 a 23, em especial o ponto III.1.2. IVA indevidamente deduzido em operações simuladas, de pág. 10 a 15), D. (pág. 23), e E a L. (pág. 24). C - O entendimento do douto Tribunal a quo 4. Na douta sentença entendeu-se que a AT “não cumpriu o ónus que lhe incumbia de provar a simulação de transacções comerciais”, estribando-se no acórdão proferido pelo TCA Norte no processo n.º 01380/05.7BEBRG, de 31-01-2014 (no mesmo sentido, os acórdãos proferidos nos processos n.ºs 00199/07.5BEBRG e 00126/06.7BEBRG, ambos de 31-01-2014 e também do TCA Norte). 5. Se logramos entender este segmento da douta sentença, para que se pudessem considerar aquelas facturas como falsas, a AT teria de reunir indicadores objectivos da existência de um acordo simulatório entre o verdadeiro fornecedor dos bens, o emitente das facturas e o utilizador das mesmas. 6. Não o fazendo, ficaria sempre em aberto a possibilidade de estarmos perante um caso de interposição fictícia (simulação subjectiva) ou perante um caso de interposição real (em que não haveria simulação), sendo esta situação de “dúvida” resolvida contra a AT. 7. No entanto, com o devido respeito, a douta decisão aqui recorrida, ao percorrer idêntico caminho ao trilhado pelos aludidos arestos do TCA Norte, acaba por padecer dos mesmos erros de interpretação e aplicação da lei, por partir de premissas que não encontram acolhimento, nem no texto, nem no espírito dessa mesma lei. D – A relação subjacente entre emitente e utilizador como requisito de deduT...lidade 8. Considerou o douto Tribunal recorrido que, para efeitos de IVA, não constitui requisito do direito à dedução que tenha sido o emitente da factura a transmitir os bens ou a prestar os serviços (até porque o legislador se abstraiu da relação subjacente titulada na factura), entendendo que a deduT...lidade só pode ser afastada por uma norma de exclusão, designadamente pelo n.º 3 do artigo 19.º do CIVA. 9. No entanto, o facto de o emitente que mencione indevidamente IVA [artigo 2.º, n.º 1, alínea c) do CIVA] estar obrigado a entregar o imposto não significa que o legislador não atribua relevância à relação entre emitente e utilizador. 10. Quer porque aquela norma também se aplica a situações em que existe uma relação (comercial) efectiva entre quem emite a factura e quem a utiliza, 11. Quer porque, naqueles casos em que o legislador obriga o emitente da factura a entregar o imposto que menciona e, concomitantemente, impede o utilizador de deduzir esse mesmo imposto, mais não faz do que assegurar o correcto funcionamento daquele imposto de matriz comunitária. 12. Logo, a existência de uma relação verdadeira entre emitente e utilizador constitui um requisito de deduT...lidade do IVA. 13. Por outro lado, o n.º 3 do artigo 19.º do CIVA é uma norma que estabelece mais um requisito para a dedução e não uma verdadeira norma de exclusão, 14. Quer porque foi opção do legislador estabelecer naquele artigo 19.º os requisitos materiais do direito à dedução (para além dos requisitos formais), definindo no artigo 20.º as operações que conferem esse direito e no artigo 21.º as exclusões ao mesmo, 15. Quer porque o legislador, em obediência à cláusula de standstill prevista na Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, apenas consagrou [manteve] as excepções ao direito à dedução no artigo 21.º do Código do IVA. E – O conceito fiscal de simulação e a interposição real de sujeitos 16. A douta sentença considerou que o conceito de operação simulada terá de ser encontrada no domínio do direito civil, com o sentido que aí se consagra, nos termos do n.º 2 do artigo 11.º da LGT. 17. Assim, fazendo apelo àquele regime, entendeu que, para que se possa falar em simulação subjectiva, é necessário que se verifique uma interposição fictícia, mas no sentido de se exigir um acordo entre todos os sujeitos intervenientes: o declarante, o declaratário e o interposto. 18. Caso contrário, não haverá simulação, mas uma interposição real de pessoas, caindo-se na figura do mandato sem representação, na modalidade da comissão mercantil. 19. Deste modo, deveria a AT reunir indicadores objectivos de que existe esse tal acordo entre todos os intervenientes pois, caso o não faça, subsistiria sempre a possibilidade de o interposto agir como comissário do verdadeiro fornecedor dos bens ou prestador dos serviços. 20. Porém, este entendimento resulta de uma visão puramente civilista do instituto da simulação, incompaginável com a realidade fáctico-jurídica que o n.º 3 do artigo 19.º do CIVA visa abranger. 21. Na verdade, a figura da simulação, tal como se encontra recortada no plano civil, não tem pleno cabimento na análise ao fenómeno das facturas simuladas, visto que, desde logo, a previsão do legislador civil não pretenderia abranger a factualidade que se verifica no plano tributário, i.e., o regime jurídico da simulação, não foi pensado para a simulação fiscal. 22. Ademais, “o conteúdo da simulação fiscal é, a nosso ver, determinado pela função do conceito neste ramo do direito. Visa prosseguir a verdade fiscal e a tributação segundo a capacidade contributiva. A área de protecção da norma (diversamente do que acontece na simulação civil) é uma relação jurídica concreta: a relação jurídico-fiscal” (PISÃO PEDREIRO, op. cit., pág. 145 e 146). 23. O erro de julgamento de direito consistiu, portanto, na consideração de que, para se poder falar de facturas simuladas, seria necessário a existência do tal acordo entre todos os intervenientes (e, consequentemente, que a AT reunisse indicadores objectivos desse acordo simulatório global). 24. Deste modo, a interposição real, sendo uma figura tipicamente pensada para o direito civil e para os problemas que nele se suscitam, não encontra aplicação no campo da denominada facturação falsa, pelo menos com os contornos que a Inspecção Tributária assinalou no seu Relatório. 25. Ao aplicar a figura da interposição real ao caso em apreço, o que o douto tribunal, no fundo, vem dizer é que, em sectores de actividade como os da cortiça, o sujeito A, estando interessado na compra de cortiça a B [o real fornecedor dos bens, regra geral, o chamado produtor, ente não registado/colectado e que, encontrando-se à margem dos sistema, não emite qualquer documento], acaba (por um qualquer motivo) por pedir ao sujeito C que compre os bens a B e lhos venda de seguida, cabendo a C a emissão da respectiva factura, 26. Sendo que esta construção, sendo perfeitamente possível no plano civil, afigura-se-nos totalmente descabida no plano tributário, no qual, o que normalmente existe é um adquirente de cortiça que, comprando esse material aos mais variados produtores não registados (e que, por isso, não emitem factura), necessita de alguém que lhe documente esses custos, recorrendo, para tal, à figura do emitente de facturas falsas. F – A questão do ónus da prova e do seu cumprimento pela AT 27. O douto Tribunal a quo andou bem ao considerar que recai sobre o contribuinte a prova da existência dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução do IVA, bem como que a AT não tem que demonstrar que o acordo simulatório existiu, cabendo-lhe reunir indicadores objectivos de que tal acordo deveria ter existido. 28. Diga-se ainda, a este propósito, que não é imperioso que a AT efectue uma prova directa da simulação. 29. No entanto, com o devido respeito, a douta sentença labora em erro quando, partindo destes pressupostos, acaba por considerar que a AT teria de invocar factos que indicassem a existência de acordo simulatório entre todos os intervenientes na operação (real fornecedor, interposto e utilizador). 30. Na verdade, não se contesta que é à AT que compete reunir os tais “indicadores objectivos” da existência do acordo simulatório: o que se contesta é que a AT tenha de reunir tais indicadores relativamente à totalidade dos elementos daquela cadeia. 31. Compete, isso sim, à AT reunir indicadores objectivos do acordo simulatório entre os emitentes das facturas (sociedades C…, Sociedade Unipessoal Lda e C… Unipessoal Lda) e o seu utilizador (M... – Sociedade Unipessoal Lda), o que, como resulta proficientemente do Relatório Inspectivo (ponto B. dos factos provados), foi por aquela realizado. 32. Tanto mais que, no caso sub judice, a prova que o douto Tribunal a quo entendeu dever ser produzida pela AT é manifestamente impossível, na medida em que a AT, embora admita a hipótese de a impugnante ter compras não registadas na contabilidade, não tem qualquer possibilidade de identificar esses eventuais fornecedores, por se tratar de elementos que, como se disse, laboram à margem do sistema, apenas sendo viável à impugnante a sua identificação. 33. Por outro lado, para além de os factos-índice elencados no ponto III.1.2. do Relatório (pág. 3 a 23 da sentença, ponto B. dos factos provados) serem manifestamente suficientes para que passasse a competir à impugnante a prova dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução do IVA declarado nas facturas (veja-se, a título de exemplo, o acórdão do TCA Norte, de 23-11-2012, processo n.º 1523/05.0BEVIS-AVEIRO), 34. Estamos em crer que os indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, podendo ser obtidos com recurso à denominada fiscalização cruzada (acórdãos do TCA Norte, de 28-02-2013, processo n.º 00383/08.4BEBRG, de 15-02-2013, processo n.º 01764/08.9BEPRT, de 26-04-2012, processo n.º 00964/06.0BEPRT e do TCA Sul, de 04-06-2013, processo n.º 06478/13). 36. O contribuinte não disponibilizou os elementos requeridos pelos serviços de inspecção tributária, alegando que os mesmos não estavam na sua disponibilidade material pois tinham sido apreendidos pelas autoridades policiais, no âmbito de um processo de inquérito que teve o cuidado de identificar. 37. Porém, esta realidade, como bem vem frisado no relatório, não impedia o contribuinte de solicitar cópias dos elementos em questão às respectivas entidades bancárias, pelo que, não o tendo feito, assumiu uma conduta omissiva que não pode deixar de ser censurada no plano da inobservância do dever de colaboração. 38. O pedido solicitado pelos serviços de inspecção tributária, face ao custo de obter cópias dos elementos requeridos, revela-se adequado e proporcional ao fim visado. 40. O retorno para o sujeito passivo dos montantes titulados nos cheques emitidos para pagamento das facturas, conforme vem lavrado no relatório, é, tão só, mais uma das conclusões nele contidas, alicerçada na falta de colaboração manifestada pelo contribuinte, que, uma vez associada aos restantes indícios apurados em sede inspectiva, sustentaram as correcções que estão na génese das liquidações sindicadas. 41. Rotular esta realidade como “uma inversão do dever instrutório por parte da Autoridade Tributária, imputando aos contribuintes o ónus de comprovar os factos investigados, sob pena de se dar os mesmos por verdadeiros”, como faz a douta peça decisória recorrida, traduz, ressalvado o devido respeito, uma incorrecta interpretação dos princípios da colaboração e do inquisitório, consagrados nos artigos 59.º, n.º 1 da LGT, 48.º, n.º 2 do CPPT, 9.º, n.º 1 e 48.º do RCPIT, e 58.º da LGT (cfr. pág. 33 e 34). 43. O Tribunal não pode substituir-se à AT ou ao Impugnante cumprindo o ónus da prova que só a estes cabe, mas deve diligenciar pela obtenção de provas complementares que se revelem essenciais para o conhecimento da causa, e que possam ser obtidas pelo Tribunal. 44. Ora, foi precisamente isto que fez o Tribunal a quo, quando em 09-04-2010 proferiu o seguinte despacho a fls. 168 a 170 SITAF: “Foi afirmado pela testemunha C…, que os cheques emitidos pela impugnante a favor de C… e C… retornaram às contas de M…, Sociedade Unipessoal, Lda. Esclareceu ainda que este movimento pode ser observado pela análise relatório técnico, alvos 41 e 42, também eles juntos ao processo n.º 47/03.5IDAVR. Assim, considerando a importância destes documentos na boa decisão da causa, solicite àquele processo certidão deste mesmo relatório (apenas nos alvos identificados).” - Sublinhado nosso. 46. No decurso desta mesma diligência, ocorrida em 17-09-2010, foi proferido novo despacho a fls. 496 a 498 SITAF: “ Atento o teor do depoimento da testemunha C…, entende-se essencial inquirir a testemunha H…, inspector tributário, designando-se, desde já, para o efeito o dia 08 de Outubro de 2010, pelas 14.30 horas” 47. Ambas as inquirições foram realizadas no dia e hora marcada (fls. 496 a 498 e 502 a 504 SITAF). 48. Pese embora esta circunstância, o Tribunal a quo, ciente da relevância dos elementos que tinha ao seu dispor, acabou por não se pronunciar sobre esta matéria, por considerar que aquela matéria não foi a mesma que sustentou “as correcções efectivadas, não podendo ser tomado em consideração como se de fundamentação «a posteriori» se tratasse.” (cfr. pág. 33). 49. Nesta perspectiva, afigura-se-nos que o Tribunal a quo, ao ordenar a junção aos autos do referido relatório técnico e, nos termos já expostos, ouvir as testemunhas, incorreu na prática de actos inúteis proibidos por lei, atento o preceituado no artigo 130.º do CPC. 51. De outra forma, não seria compreensível que o Tribunal a quo, após qualificar a referida matéria como importante para a boa decisão da causa, tenha ordenado, ao abrigo dos poderes concedidos pelos artigos 13.º do CPPT e 99.º da LGT, a realização das diligências que reputou como necessárias para ultrapassar a sua reconhecida complexidade. 53. Caso o Tribunal se tivesse pronunciado sobre a matéria em questão, para além de não exorbitar os seus poderes de cognição, também agiria em conformidade com as diligências probatórias oficiosamente realizadas, as quais visaram o esclarecimento de uma matéria reconhecidamente complexa e importante para a boa decisão da causa. 54. Não o tendo feito, em nosso entender, incorre num vício processual de omissão de pronúncia, o qual se reconduz a uma ausência de emissão de um juízo apreciativo sobre uma questão material-substantiva reconhecidamente importante para a boa decisão da causa e posta em equação perante o Tribunal a quo, e sobre o qual, em homenagem ao principio do dever de cognoscibilidade, deveria ter tomado conhecimento (cfr. artigo 125.º, n.º 1 do CPPT). 55. Nestes termos, incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento da matéria de direito, tendo sido violado o disposto no artigo 19.º, n.º 3 do Código do IVA e no artigo 74.º da LGT, devendo tais normas ser interpretadas e aplicadas no sentido de que, para que se não reconheça o direito à dedução do IVA, à AT apenas incumbe reunir indicadores objectivos do acordo simulatório entre o emitente das facturas e o utilizador – e já não entre o real fornecedor dos bens, o emitente e o utilizador – recaindo sobre o contribuinte a prova da existência dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução.
II - OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA II.1. - Credencial da acção Em cumprimento do determinado pela Ordem de Serviço Externa n.° OI200600101 de 13-01-2006, procedemos à análise externa ao ano de 2003 M... SOCIEDADE UNIPESSOAL IDA - NIF 5…. II.2 - Motivo, âmbito e incidência temporal A presente acção inspetiva, parcial e abrangendo apenas o tributo IVA, teve por objectivo o combate à fraude fiscal, no âmbito do processo de averiguações da facturação falsa no sector da cortiça. Surge na sequência de diversas diligências efectuadas junto de pseudo operadores económicos do sector da indústria da cortiça, indiciados como emitentes de facturas falsas, bem como da apreensão de facturas, efectuadas junto da contabilidade do SP em apreço, para integração no processo de averiguações fiscais n° 47/03.5IDVR, instaurado pela Direcção de Finanças de Aveiro. A carta aviso com o n°8402185 e datada de 06-03-2007 [anexo1] foi entregue em mão ao SP em 13-03-2007, nas instalações do seu TOC A… - NIF 1…, com sede na Rua…, Feira (Agência L…), bem como nesse local e na mesma data foi dado a assinar ao referido SP a Ordem de Serviço acima referida, de âmbito parcial, e relativa somente a IVA, respeitante aos exercícios de 2003. A nota de diligência foi entregue ao TOC em 2007-08-02, conforme ficou nela referido, ficando no seu gabinete à sua guarda com a incumbência de a entregar ao SP quanto tal fosse possível. Assim, o acto físico de exame da contabilidade existente foi efectuado tendo como base os documentos de suporte à contabilidade referentes a esses anos à guarda do seu TOC – M… - NIF 1…e no gabinete deste, Agência Contabilidade… Lda, com sede na Rua…, 4535 LOBÃO, tendo o mesmo sido iniciado em 26-03-2007 e finalizado em 2007-08-02. II.3 - Outras situações II - 3.1. Objecto social O objecto social da M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA - NIF 5…consiste na actividade de Comércio por grosso de cortiça - CAE 51562, actividade para o qual se encontra colectada desde 01-04-1999. De referir que o SP cessou a sua actividade em 27-08-2004. De acordo com o relatório referente à Ordem de Serviço acima referida, o SP não exibiu documentos solicitados no âmbito dessa Ordem de Serviço devido a terem sofrido um acidente de contaminação com águas de esgoto de um prédio, tendo posteriormente tais documentos sido colocados no lixo por engano, conforme a citação que se segue: Citação: Quanto aos documentos dos anos de 1999 e 2000 informou “não ser possível exibir tais documentos, mediante fotocópias, porquanto as pastas de arquivo onde os mesmos se encontravam ficaram completamente inutilizados e deteriorados em consequência de inundação com águas fétidas e residuais da cave do prédio onde estavam guardados tais documentos, edifício (fracção) que é propriedade da filha do legal representante da requerida e onde estavam arquivadas as pastas com os referidos documentos contabilísticos.” Quanto aos comprovativos de pagamento realizados até Junho de 2002, “não é possível a sua junção uma vez que a pasta que continha livros de cheques, letras e outros documentos Melos de pagamento foi objecto de furto das instalações da requerida, o mesmo sucedendo com outros objectos, situação acorrida em Junho de 2002 e que foi objecto de participação policial,...” Na mesma resposta remeteu: - conta corrente dos fornecedores acima referidos respeitantes aos anos de 2001, 2002 e 2003; - fotocópias das facturas e recibos e comprovativos de pagamento a partir de Julho de 2002; - uma declaração emitida pela administração do condomínio do prédio em causa, datada de 7 de setembro de 2001; - fotocópia de fotografias de um local onde se encontram uma secretária e uma série de pastas de arquivo; - fotocópia de uma participação à GNR - posto de Lourosa - datada de 22 de Junho de 2002, relativa a um furto de entre outros elementos de documentos da firma M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA, Lda: - fotocópia dos cartas a solicitar às instituições bancárias fotocópias dos cheques. Perante este cenário de inundação e furto dos documentos contabilísticos e de forma a obstar à sua destruição ou extravio (cfr. prevê o artigo 1°, da Lei Geral Tributária LGT), procedemos, em 15-03-2004, á apreensão de originais de documentos, nos termos do disposto no n° 2 do artigo 30° do Regime Complementar do Procedimento de inspecção Tributária (RCPIT), existentes na contabilidade da sociedade M... Unipessoal à data, e que se encontravam arquivados no gabinete de contabilidade L… - Agência de Documentação, Lda., NIF 5…, sita na Rua…, freguesia de Fiães, concelho de santa Maria da Feira. A diligência foi efectuada ao abrigo do Despacho n° 127/2004 da D. F. Aveiro - DPIT II, datado de 27-02-2004. Da diligência resultou a elaboração de um Auto de Apreensão, que foi assinado pelos inspectores intervenientes e pelo Técnico Oficial de Contas da sociedade M... Unipessoal, Sr. N…, NIF 1…. Os documentos apreendidos foram facturas e recibos das sociedades: C…, Lda., como NIF 5…, adiante designada, apenas, por Ca…; e C… Sociedade Unipessoal Lda., com o NIF 5…, adiante designada, apenas, por Co…, referentes ao exercício de 2003. A informação elaborada na sequência do Despacho 127/2004, refere que: “analisados os documentos constitutivos da contabilidade do SP do ano de 2003 verificou-se que este possuía facturas dos seguintes emitentes, ou prováveis emitentes de facturas falsas: CA…, Lda. - NIPC 5… CO…, Soc Unipess, Lda., - NIPC 5… J…, LDA.. E…, Lda. - NIPC 5… - relativamente à contabilidade dos anos de 2000 a 2002, o S.P. alega que tais documentos, que se encontravam na sua posse, foram, destruídos inicialmente por uma inundação e seguidamente colocados no lixo por um seu familiar. No entanto, foram, recolhidos, junto da Agência L…, os extractos e balancetes relativos à contabilidade desses exercícios.” As facturas e recibos apreendidos (originais e respectivo Auto de Apreensão foram integrados no Processo de inquérito n.° 47/03.5IDAVR. Decorrida a diligência anteriormente relatada e de forma a efectuarmos um ponto de situação na “saga” da documentação contabilística, importa reter: • Documentos dos anos de 1999 e 2000, destruídos por inundação (Setembro de 2001): • Documentos de 2001 e 2002, guardados juntos dos já infortunados documentos de 1999 e 2000, sofrem novo infortúnio, agora, deitados ao lixo (Agosto de 2003): • Documentos de 2003 (parte deles apreendidos) e os restantes arquivados na Agência L…. Ainda no tocante à “saga” da contabilidade, importa informar: Em relação à carta remetida pelo sócio gerente da sociedade M... Unipessoal, Sr. C…, acima aludida e que constituía o Anexo 1 da informação produzida em sequência do Despacho 127/2004, importa determo-nos no seguinte: - A Agência L…, tem implantado um sistema de controlo interno em que sempre que entrega a contabilidade a um cliente, entenda-se por esta os documentos contabilísticos, extractos, suportes informáticos (disquetes), preenche uma declaração de entrega onde identifica o cliente, os documentos que entrega e o ano a que dizem respeito. A declaração em apreço é datada com a data de entrega dos documentos e assinada pelo cliente e pela Agência: - Ora, no caso da contabilidade do exercício de 2002, a mesma foi entregue pela Agência L… ao Sr. C…, em 30-09-2003, Daí ser improvável que em Agosto de 2003 (cfr. declarou o Sr. C…), a mesma tivesse sido deitada ao lixo pelo seu genro. Fim de citação Conclui-se no relatório dessa Ordem de Serviço que no exercício de 2002, a sociedade M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA deduziu indevidamente IVA na medida em que não tinha na sua posse suporte documental às deduções de IVA efectuadas/declaradas nas declarações periódicas de IVA remetidas ao SIVA, situação prevista no n.° 2 do artigo 19.° do CIVA, nos montantes constantes do quadro abaixo, por períodos de imposto:
Com o procedimento descrito não foi somente corrigido o IVA deduzido com base em facturas simuladas nos termos do n° 3 do artigo 19 do CIVA, mas todo o IVA dedutível, nos termos do n°2 do artigo 19 do CIVA. (...) Nesse sentido e dando cumprimento ao artigo 44.° do RCPIT foi recolhida toda a informação disponível sobre o sujeito passivo objecto de inspecção e outros obrigados tributários com o qual este tenha tido relações económicas. Daí que, no âmbito do processo de averiguações em curso à facturação falsa no sector da cortiça, com particular ênfase na sua emissão e utilização (processo esse com origem no cruzamento de informações de outros processos de inspecção tributária e na informação solicitada ao núcleo de informática da D.S.E.P.C.P.I.T. onde se procedeu ao cruzamento da declarações anuais de diversos sujeitos passivos - Anexos O e P), foram efectuados os seguintes procedimentos de controlo/confirmação/investigação: • Análise dos documentos, extractos de conta corrente e comprovativo dos Melos de pagamento existentes na contabilidade do SP depositada nas instalações do seu TOC, e foi efectuada também a recolha por Meios informáticos [anexo 2] das facturas da totalidade das compras de mercadorias contabilizadas em 2003, tendo-se constatado que nelas estão incluídos os nomes referentes aos fornecedores a seguir identificados, já indiciados como emitentes de facturação falsa, e de que já se tinham até apreendido as respectivas facturas [anexo 3] e comprovativos do pagamento: Co…, Sociedade Unipessoal Lda – 5… Ca… Unipessoal Lda – 5… • De acordo com registos existentes na sua contabilidade, em 2003 o SP não tinha registos no CRSS a indicar qualquer pessoa ao serviço da empresa, o que confirma o declarado no anexo J cédula A de IRS da declaração anual [anexo 4]. • No mesmo anexo mas agora cédula B de IRS surgem pagamentos a um SP tributado por essa cédula [anexo 5], mas que se verificou estar colectado para o exercício da actividade de “advocacia. Assim, não se vislumbra quem seriam as pessoas a garantir o funcionamento das actividades económicas e financeiras consubstanciados em vendas no valor de 437.798,29 € e compras no valor de 369.377,00 c, actividade essa desenvolvida nos 12 meses do ano, conforme print em anexo 6 das DP’s de IVA do ano de 2003.
• Na análise efectuada aos registos contabilísticos do SP constatou-se, entre outras coisas que necessitavam de esclarecimentos, que não era utilizada a conta POC 12 Depósitos Bancários, pois apesar de existirem evidências da utilização de contas bancárias para efectuar movimentos relacionados com o normal desenrolar da sua actividade, estavam todos os pagamentos e recebimentos reflectidos contabilisticamente por movimentações na conta POC 11 Caixa. • Em 05-04-2007 marcou-se reunião com o gerente C… no gabinete do TOC para esclarecimentos diversos, entre os quais os relacionados com as contas bancárias e ainda para mostrar as instalações onde era desenvolvida a actividade da empresa. Reunião essa à qual compareceu acompanhado de pessoa que referiu ser sua filha, dizendo porém que a nada respondia por conselho do seu advogado, por se encontrar doente e em tratamento. Disse ainda que qualquer pedido de esclarecimentos deveria ser efectuado por escrito para a sede da empresa. Perguntado sobre a visita às instalações (recorde-se que foi cessada a actividade em 27-08-2004), mostrou algum desconforto ou pouca vontade em proceder a tal visita, e repetiu o mesmo discurso atrás referido, saindo da sala. Foi na altura lavrado termo da ocorrência [anexo 7]. • Nesse sentido foi remetido o ofício n° 8404508 de 08-05-2007 [anexo 8], questionando a empresa pela não reflexão das contas bancárias na sua contabilidade, pedindo cópias dos extractos bancários emitidos pelos bancos, e solicitando-lhe ainda informação do Meio de pagamento utilizado para efectuar o pagamento das facturas da Ca…, do Co… e do R…, indicando também os n°s dos cheques, banco e n°s da conta utilizados para tal. • Respondeu o SP em 16-05-2007, entrada n° 6328 de 21-05-2007 [anexo 9] em que, resumidamente, o SP confirma a utilização somente da conta POC 11 Caixa por uma questão de “simplificação” (adiantando razões do seu ponto de vista justificativos para o facto), e afirma a impossibilidade de remeter cópia dos extractos bancários e também a impossibilidade de identificar os n°s de cheques, bancos e contas bancárias utilizadas para o pagamento das facturas em questão, pelo motivo de todos esses elementos estarem apreendidos pela PJ do Porto no âmbito do processo de inquérito 47/03.1TDAVR. • Em relação à não utilização da conta POC 12 Depósito bancários, tecem-se os seguintes comentários sobre este comportamento do SP: Considerando que na sua contabilidade não constam registos na conta POC 12 - Depósitos Bancários no ano de 2003, estando todos os pagamentos e recebimentos reflectidos contabilisticamente por movimentações na conta POC 11 - Caixa; Considerando também que por outro lado existem referências à utilização de contas bancárias para movimentos relacionados com o normal exercício da sua actividade, por exemplo para pagamentos a fornecedores e de letras comerciais, e que importaria ter em conta para detectar eventuais discrepâncias ou falta de valores, já que, com efeito, se determinada entidade possui contas bancárias e as utiliza, mas não as faz reflectir nos seus registos contabilísticos, há uma distorção da sua situação patrimonial, na medida em que não faz reflectir no Balanço todo o seu património; Considerando ainda que a contabilidade como processo de recolha, análise, registo e interpretação de tudo o que afecta a riqueza das unidades económicas é, sem dúvida, um dos mais poderosos suportes de informação para a gestão. As informações disponibilizadas revestem interesse para um vasto conjunto de utilizadores, nomeadamente investidores, credores, fisco, estatísticas, etc.. Sendo assim, será fundamental a utilização de métodos e procedimentos comummente conhecidos e aceites, por forma a que se elaborem elementos susceptíveis de interpretação e comparáveis com os de outras sociedades; (...) • Sobre a segunda parte da questão, é óbvio que o SP, podendo requerer às suas entidades bancárias cópia de todos os elementos em questão e assim poder responder ao solicitado, preferiu não o fazer e responder como respondeu. Porquê, poder-se-á perguntar. • Dado já existir um processo de derrogação do sigilo bancário para efeitos do processo de averiguações fiscais n° 47/03.5IDAVR, que presentemente corre os seus termos a nível judicial no Tribunal da Feira, que engloba tudo o que diz respeito aos aspectos financeiros do SP relacionados com pagamentos e recebimentos, não surge oportuna, a vários níveis, a existência de um segundo pedido de levantamento do sigilo bancário que abranja o mesmo SP. • Conclui-se assim que SP NÃO QUIS esclarecer os factos que foi solicitado a esclarecer, pois com a investigação subsequente à análise dos elementos solicitados, se os mesmos fossem efectivamente entregues, concluir-se-ia certamente pela existência do retorno para o próprio SP ou gerente do mesmo das quantias alegadamente pagas à Ca.. e ao Co…. Registe-se a FALTA DE COLABORAÇÃO do SP nesta matéria. • Foi ainda consultada toda a informação disponível em arquivo sobre os fornecedores identificados acima, com os quais a M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA tem tido relações económicas, nomeadamente, - As informações derivadas do sistema informático no sentido de averiguar o grau de cumprimento das obrigações declarativas e de pagamento relativamente àqueles; - Os relatórios de inspecção tributária anteriores, onde aqueles tenham sido objecto de análise e cujas conclusões dessas inspecções eram já no sentido de indiciar tais fornecedores como emitentes de facturas falsas, adiantando-se mesmo com pormenor a actividade fraudulenta de todos estes actores, a saber:
• Neste âmbito, retoma-se agora a acção de inspecção ao ano de 2002 efectuada a este SP (M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA Lda), onde consta o que se vai passar a transcrever de seguida; Citação: Relativamente à contabilidade dos anos de 2000 a 2002 o SP alega que tais documentos, que se encontravam na sua posse, foram destruídos, inicialmente por uma inundação e seguidamente colocados no lixo por um seu familiar (cfr. cópia do declaração emitida pelo seu Sócio gerente que passa a constituir o Anexo 1). No entanto, foram recolhidos, junto da Agência L.., os extractos e balancetes relativos à contabilidade desses exercícios.” As facturas e recibos apreendidos (originais) e respectivo Auto de Apreensão foram integrados no Processo de inquérito n.° 47/03.5IDAVR. Decorrida a diligência anteriormente relatada e de forma a efectuarmos um ponto de situação na “saga” da documentação contabilística, importa reter; • Documentos dos anos de 1999 e 2000, destruídos por inundação (setembro de 2001); • Documentos de 2001 e 2002, guardados juntos dos já infortunados documentos de 1999 e 2000, sofrem novo infortúnio, agora, deitados ao lixo (Agosto de 2003); • Documentos de 2003 (parte deles apreendidos) e os restantes arquivados na Agência L…. Ainda no tocante à “saga” da contabilidade, importa informar; Em relação à carta remetida pelo sócio gerente da sociedade M... Unipessoal, Sr. C…, acima aludida e que constituía o Anexo 1 da informação produzida em sequência do Despacho 127/2004, importa determo-nos no seguinte; - A Agência L…, tem implantado um sistema de controlo interno em que sempre que entrega a contabilidade um cliente, entenda-se por esta os documentos contabilísticos, extractos, suportes informáticos (disquetes), preenche uma declaração de entrega onde identifica o cliente, os documentos que entrega e o ano a que dizem respeito. A declaração em apreço á datada com a data de entrega dos documentos e assinada pelo cliente e pela Agência; - Ora, no caso da contabilidade do exercício de 2002, a mesma foi entregue pela Agência L… ao Sr. C…, em 30-09-2003. Daí ser improvável que em Agosto de 2003 (cfr. declarou o Sr. C…), a mesma tivesse sida deitada ao lixo pelo seu genro. E caso pana nos perguntarmos; - será só infortúnio a saga acorrida com a contabilidade dos anos de 1999, 2000, 2001 e 2002? - O que tem o Sr. C… a esconder? A resposta foi-nos dada ao longo das investigações efectuadas, quer à sociedade M... Unipessoal, quer a outros obrigados tributários com o qual esta teve relações económicas. As investigações levadas a efeito até à data indiciam que a sociedade M... Unipessoal, está inserida num esquema de utilização de “facturas falsas”, emitidas pelas sociedades geridas pelo “Coelhinho1” e pelo “T...2” 1”Coelhinho”, alcunha dada a M…, gerente de facto das sociedade J…, Lda., com o NIF 5…e Co… sociedade Unipessoal, Lda., com o NIF 5…. 2 “T...”, alcunha dada a C…, gerente de facto das sociedades E…, Lda., com o NIF 5…e Ca…, Unipessoal, Lda., com o NIF 5…. - imagem omissa - Peso dos “emitentes de facturas falsas” no total das compras nos exercícios de 2000, 2001 e 2002:
Fonte: Balancete dos anos de 2000 a 2002 (...) Na medida e que a prova da prática do crime de fraude fiscal pela sociedade M… Unipessoal, se encontra em investigação no âmbito do Processo de Inquérito n.° 47/03.5IDAVR, não constituindo tal prova fundamento das correcções a efectuar na sequência do presente procedimento de inspecção, aqui abordada, apenas, como possível motivação para a não exibição da contabilidade, vamos desnudar a título exemplificativo alguns indícios que comprovam a participação da sociedade objecto de inspeção no esquema de utilização de facturas falsas atrás aludido. A saber: i) É o próprio gerente da sociedade Co… que reconhece a sua participação no esquema de facturas falsas (como emitente e utilizador de facturas falsas) envolvendo no esquema a sociedade M... Unipessoal como utilizadora de facturas falsas por si emitidas. Declarações do Co… 4 “Para além do facto de contabilizar facturas falsas de pseudo aquisições também emiti facturas falsas. O esquema de emissão facturação falsas foi praticado especialmente entre o T..., com a Ca… empresa que estava em, nome dos filhos do T...,) e com o C…., este com as firmas M... & S…, Lda. e M... Sociedade Unipessoal, Lda. Este esquema de facturação falsa consistia no seguinte: Eu emitia facturas falsas e quer para a Ca… quer para a M... & S…, Lda e M... Sociedade Unipessoal, Lda e estes simulavam o pagamento das facturas falsas com a emissão de cheques a favor da Co…, Lda que eu inicialmente depositava em contas bancárias da Co… Lda e efectuava o retorno desse dinheiro emitido em cheques de contas minhas individuais para o T... (Ca…) e para o M... (M... & S…, Lda e M... Sociedade Unipessoal Lda). Quando eu deixei de poder movimentar contas bancárias, pois tive problemas com cheques devolvidos e fiquei impossibilitado de ter e emitir cheques, passei, somente a endossar os cheques que a Ca… e M... Sociedade Unipessoal, Lda emitia para simular o pagamento das facturas falsas, ao que estes, posteriormente efectuavam o depósito em contas deles. ii) Existem provas de que o valor dos cheques emitidos pela sociedade M... Unipessoal para pagar as facturas emitida, pelas sociedades Co…, E… e Ca… (a sociedade J…, Lda cessou, a actividade em 23-11-2001) retorna para contas particulares do seu gerente Sr. C…, cfr, esquema abaixo: - imagem omissa - (*) Ex: contas da sociedade B…, Lda A saber: Em resposta à n/notificação, n/ofício n.° 8405602. a sociedade M... Unipessoal, remeteu fotocópias das facturas e recibos emitidos pela sociedade ( Co… bem como extratos de conta corrente pelos quais pudemos constatar o registo na sua contabilidade, no exercício de 2002 das facturas (ver quadro abaixo):
posteriormente e ainda como resposta à n/notificação remeteu fotocópia frente e verso do cheque n.° 7010392758, datado de 18-02-2003, no valor de 69.168,75€, emitido à ordem sociedade Co…, sobre a conta n° 2094569, que a sociedade M... Unipessoal, possuía no BPI. Da análise do verso do cheque constatamos que o mesmo foi endossado pela sociedade Co… (aposto carimbo + assinatura do gerente) e foi depositado na conta n.° 1… do BCP, cujo titular é a sociedade B…, Lda. iii) Outros indícios: - Da análise documental à contabilidade da sociedade Co…, verificamos que esta não registou todas as suas alegadas vendas. No caso da sociedade M... Unipessoal, registou a factura n° 239 e omitiu a factura n.° 171, datada de 03.06.2002. - Do confronto das Guias de Remessa com as Facturas da sociedade Co…, verificámos que esta, apenas, emitiu a Guia de Remessa (GR) n° 261 para a M... Unipessoal. Da análise da GR em apreço, verificamos que não tem data, nem local de carga ou descarga, bem como não tem qualquer indicação do veículo que efectuou o transporte. Pela sequência das datas das GR, constatámos que a GR n° 261 teria de ser datada entre 24.01.2002 (data da GR 260) e 29.01.20 02 (data da GR 262), ou seja, dos fins de Janeiro, o que é estranho dado que a primeira factura emitida pela sociedade Co… para a M... Unipessoal, data de Junho de 2002 (factura n.° 171). Fim de citação. • Em 2003 a percentagem no total das compras do valor das facturas emitidas pela Ca… Lda e pelo Co… é de 63,6% (43,9% + 19,7%), conforme se constata no seguinte quadro:
1. As facturas falsas são utilizadas para substituição de compras verdadeiras aos verdadeiros fornecedores de cortiça, pelo motivo destes não quererem “aparecer” no negócio como fornecedores de cortiça, não declarando assim as suas próprias vendas, evitando assim a tributação em sede de IVA e de IR por não existir facturação; 2. O negócio compensa ao adquirente devido a conseguir adquirir a cortiça mais barata por variados motivos, de que sobressai a não existência por parte do fornecedor de encargos com impostos, pelo que pode vender mais barato os seus produtos; 3. Fechando o círculo (ou o “circuito” do papel...), no “mercado de facturas falsas” (dependendo dos “fornecedores”, pois estes muitas das vezes até entregam facturas em branco por preencher!! - a um “custo” irrisório) é fácil a estas pessoas conseguirem facturas não representativas das transacções reais por um valor ínfimo ou até nulo do valor nelas inscrito, como é o caso de todas as facturas em questão acima referidas; • Com efeito, e a título de exemplo do afirmado nos n°s 1 e 2 do ponto anterior, circularizou-se o nome constante em recibo [anexo 10] que o SP contabilizou como compras de cortiça sem IVA liquidado (em boa verdade não poderiam ser contabilizadas tais compras, pois não são indicados nos referidos recibos nem descrição dos produtos adquiridos, nem quantidades nem custos unitários dos mesmos). Estes recibos teriam sido emitidos pelo próprio adquirente dos bens com o objectivo de substituírem os documentos de venda que deveriam ser emitidos pelos próprios fornecedores de cortiça indicados, mas que a tal não estariam obrigados, daí a “substituição”. [fiscalmente é admissível esta prática, mas os documentos emitidos têm de cumprir o disposto no artigo 35º do CIVA quanto às características técnicas e fiscais das facturas ou documentos equivalentes]
Da curiosa resposta do fornecedor se traça o requinte quadro resumo, anexando-se todos os documentos citados.
• De realçar que as duas sociedades têm (tinham, visto que cessaram ambas...) a mesma sede e instalações, pelo que existiam relações comerciais reais entre elas (como o provam os cruzamentos entre anexos O e P), mas os transportes realizados relativos às compras efectuadas aos dois fornecedores reais referidos eram efectuados em nome da outra sociedade de C…, e nas instalações que servem (serviam...) as duas empresas era efectuada a distribuição das mercadorias entre ambas, consoante os interesses do momento. • Não obstante existir apenas uma guia de transporte efectuado por Transportes H… (n°1642945 de 2-5-2003) com destinatário de “M...”, que se poderá referir quer ao SP em análise (M... Unipessoal Lda) quer à outra empresa do C…, o facto importante que indicia o referido no ponto anterior, é o de na sua contabilidade não constar registada em 2003 qualquer factura de transportadores, existindo no entanto evidências de que nesse ano um fornecedor comum a ambos (A…, Lda – 5…) utilizou a transportadora J… Lda para efectuar transportes de cortiça para a outra sociedade de C…, sendo certo que a factura do referido transportador se encontra registada na respectiva contabilidade. • Torna-se assim evidente que tanto as compras a J… como ao outro fornecedor real - e agora identificado: Al…, NIF 1…- tanto poderiam ser destinadas à sociedade M... Unipessoal Lda, quer à outra sociedade de C…, agora também identificada: M... & S… Lda. • Surge assim mais este motivo factual como um dos verdadeiros motivos pelos quais o SP entendeu não facultar os documentos bancários solicitados, pois certamente entre eles estariam cheques emitidos a J… e a Al… nas suas qualidades de verdadeiros fornecedores de cortiça a M... Sociedade Unipessoal Lda. • Com efeito, existe a constatação documental de que o fornecedor real indicado não declara a totalidade das suas vendas a M... Sociedade Unipessoal Lda, nem à outra sociedade de C…, que não o indicam como sendo fornecedor efectivo em 2003. Fornecedor real/NIPC J… - 1… Al…– NIF 1… • Se analisarmos a listagem dos fornecedores listada mais acima, constata-se sem sombra de qualquer dúvida que os dois nomes em questão (J… e Al…) não surgem lá mencionados, ou seja, M... Unipessoal Lda não os considerava fornecedores efectivos. • No entanto, através de investigação junto aos transportadores credenciados que prestaram serviços indistintamente quer a M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA quer a M... & S… LDA, surgiram as seguintes evidências que provam ter existido transportes de cortiça em que os dois surgem como expedidores da cortiça, tendo como destinatária a segunda empresa referida, mas podendo a cortiça transportada ter como destino final qualquer uma das empresas referidas, uma ou a outra indistintamente, dado o grau de promiscuidade existente entre ambas, que vai ao ponto de substituir essas compras verdadeiras por facturas falsas dos mesmos emitentes: a Ca… Lda e o Co… Unipessoal Lda, [os documentos referidos constituem o anexo 12]: - imagem omissa - • No sentido destes dois fornecedores reais poderem exercer o princípio do contraditório, foi-lhes remetido ofício nesse sentido, como os resultados indicados no seguinte quadro:
• Finalmente, cruzando as quantidades expedidas por estes dois fornecedores reais acima indicados (J… e Al…) com as quantidades constantes nas facturas falsas emitidas pelos emitentes já referidos (Ca… Lda e Co… Unipessoal Lda), constata-se que em alguns casos, indicados no quadro a seguir, é possível seguir um raciocínio de causalidade lógica entre, por um lado as quantidades do produto real que entram em armazém mas de que não se dispõe de factura que consubstancie e dê legalidade comercial e fiscal à respectiva compra, e por outro lado as quantidades indicadas nas facturas emitidas pela Ca… Lda e pela Co… Unipessoal Lda que substituíram as facturas que deveriam ter sido emitidas pelos fornecedores reais, mas não o foram. • Este exercício de atribuição de substituições do verdadeiro (mas não existente...) pelo falso é também um indício de que as facturas emitidas pela Ca… Lda e Co… Unipessoal Lda são falsas pois não têm a elas subjacente qualquer transacção de cortiça real entre as partes do negócio, que passa assim a ser um negócio simulado entre as referidas partes. - imagem omissa - NB: Atendendo a que as quantidades utilizadas tanto são expressas em fardos (a maioria), arrobas ou Kg, a fim de possibilitar a comparação transformaram-se os arrobas e os Kg em fardos, tendo em consideração que o peso de cada fardo nacional pode variar entre os 65 kg t os 75kg, sendo 70 kg em média, e o peso de cada fardo Espanhol é do 80 Kg em média. III.3. Indícios de operações fictícias junto dos emitentes: III.3.1 CO… SOC UNIPESSOAL, LDA – 5… Em conformidade com o relatório da inspecção elaborado no âmbito da Ordem de Serviço
onde consta informação elaborada na sequência dos procedimentos de inspecção e investigações levadas a efeito ao emitente supra mencionado, onde se prova que esta pseudo sociedade está indiciada no crime de fraude fiscal pela emissão de “facturas falsas” e se concluí pela inexistência de actividade susceptível de suportar as alegadas aquisições efectuadas por M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA, LDA antes mencionadas. Com efeito, consta do mesmo relatório [de que se junta cópia das partes relevantes em anexo 15] a indicação de que as facturas emitidas para o citado cliente não titulam quaisquer transacções reais. Conclusão Pelo exposto e de acordo com os elementos recolhidos junto do emitente e acima referidos, as facturas antes mencionadas não correspondem a efectivas aquisições de matérias primas, produtos ou serviços, efectuadas por M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA, LDA ao emitente Co… Sociedade Unipessoal Ida, correspondendo a documentos falsos, aquilo a que se comummente se designa de facturas falsas, por não existir suporte económico e financeiro real que consubstancie as operações nelas retratadas como verdadeiras 3.2 CA… LDA, -5… Relativamente a este SP, sabe-se que não exibe a sua escrita e os documentos de suporte, incluindo os financeiros/bancários, dificultando assim a análise das suas operações industriais e comerciais. Assim, como (também) já se referiu para o SP em questão, M... & S… Lda, igualmente este “fornecedor” do mesmo, com o seu procedimento, impede que se investigue com base nos seus próprios registos bancários o retorno para as contas bancárias de M... & S… Lda e/ou do seu sócio e gerente de facto C…, dos fluxos monetários e financeiros alegadamente utilizados para proceder à quitação das alegadas operações económicas suportadas pelas facturas falsas em questão. No entanto, a clarividência evidenciada pelo Co…, conjuntamente com as conclusões do relatório ao ano anterior a este SP (M... & S… Lda), prova claramente todo o esquema utilizado pelos três “sócios” em nome das suas respectivas empresas. Acresce que é conhecida como fazendo parte da actividade real da Ca… Lda apenas a aquisição real de rolhas, mas não de cortiça em qualquer uma das suas formas em bruto, pelo que nunca poderia assim transmitir para a M... & S… Lda os fardos constantes das facturas emitidas, o que também confirma a falsidade das mesmas. Com efeito, a partir dos elementos constantes do processo da Ca… Lda, nomeadamente facturas de compra e de venda recolhidas numa fase anterior, reconstituiu-se na medida do possível as suas condições operacionais de comercialização Com base na análise efectuada, conclui-se que se confirma com clareza que a actividade real (a que a é mesmo...) da Ca… Lda é efectivamente a compra e venda de ROLHAS e não de CORTIÇA EM BRUTO pois repare-se na coincidência: as compras registadas de cortiça foram alegadamente efectuadas aos seguintes pseudo - fornecedores - F… Lda - H… & F°s Lda - F… Lda - Co… Unipessoal Lda - I… Lda todos eles indiciados como emitentes de facturação falsa!!! Assim, não podem ser verdadeiras as facturas que simulam a venda de cortiça em bruto emitidas pela Ca… para a M... & S… Lda, pelo motivo de serem também falsas todas as facturas registadas pela Ca… Lda que simulam a compra por esta de cortiça em bruto. De referir que a Ordem de Serviço para a Ca… Lda e a seguir referida se encontra em fase de conclusão.
Conclusão Pelo exposto e de acordo com os elementos recolhidos junto do emitente e do utilizador e acima referidos, as facturas antes mencionadas não correspondem a efectivas aquisições de matérias primas, produtos ou serviços, efectuadas por M... & S... LDA ao emitente Ca… Lda, correspondendo a documentos falsos, aquilo a que se comummente se designa de facturas falsas, por não existir suporte económico e financeiro real que consubstancie as operações nelas retratadas como verdadeiras. III.4. Situação de direito - em sede de I.V.A. - Exercícios de 2003 - IVA deduzido em facturas falsas - transações simuladas - n.° 3 do artigo 19.° do CIVA A M... SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA, LDA, registou, no decurso do ano de 2003,facturas simuladas (cfr. ponto III.3. do presente relatório) nos montantes e períodos já mais acima indicados em quadro no final do ponto II.2, tendo deduzido indevidamente os seguintes montantes de IVA:
a) - NB: se bem que seja uma factura de Setembro de 2003, o respectivo IVA só foi deduzido na DP do 4° trimestre de 2003 Deduziu pois os respectivos montantes de IVA mencionados, no total de 44.588,63 €, subtraindo este ao montante de IVA devido no período (conforme estabelece o artigo 22.° do CIVA, na Declaração de IVA a que se refere a alínea c) do n.° 1 do artigo 28.° e 40.°, ambos do CIVA, remetida ao SIVA nos períodos constantes no quadro acima), contrariando, deste modo, o disposto no n.° 3 do artigo 19.° do CIVA. Por conseguinte propõe-se a correcção a favor do Estado do IVA indevidamente deduzido nos montantes e nos períodos indicados C). A impugnante foi notificada das seguintes liquidações de IVA e Juros Compensatórios dos períodos de 0303T, 03061 e 0312T, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 30-11-2007:
D). Foi elaborado “Relatório técnico dos alvos 41 e 42”, relativos às sociedades “M... - Sociedade Unipessoal, Lda” e “M... & S..., Lda”, que consta junto ao processo n° 47/03.5IDAVR do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, cfr. Teor do doc. de fls. 166 a 471 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido. E). A Impugnante desenvolve a actividade de comércio por grosso de cortiça, que se traduz na compra de cortiça para revenda, cfr. prova testemunhal; F). Algumas vezes, o único instrumento de trabalho necessário à sua actividade é o telefone, através do qual o sr. L.. estabelece contacto tanto com o vendedor - seu fornecedor - como com o seu comprador - seu cliente, cfr. prova testemunhal; G). E por esse motivo, por vezes, a cortiça fica empilhada nas instalações do seu fornecedor, aguardando que o seu cliente a vá buscar ao local, cfr. prova testemunhal. H). O José António Assunção era negociador de cortiça por conta da Impugnante, sendo conhecedor do ramo e dos agricultores produtores de cortiça no Alentejo, negociando cortiça para a Impugnante, cfr. prova testemunhal. I). Quando a cortiça é adquirida e transportada em arrobas, tal significa que ela é transportada “solta”, vulgarmente denominada “cortiça de mato”, cfr. prova testemunhal. J). Quando a cortiça é adquirida e transportada em quilos, significa que a cortiça já teve uma transformação e está em paletes, cfr. prova testemunhal. K). Quando a cortiça é transportada em fardos, significa que a mesma está embalada, já depois de extraídos eventuais desperdícios, como gordura, folhas, “bichos”, recortes, pés, cfr. prova testemunhal. L). Por esse motivo, não é possível estabelecer um paralelismo quantitativo entre quilos ou arrobas e fardos, cfr. prova testemunhal. M). A presente impugnação foi apresentada no TAF de Viseu em 29-02-2008, cf. teor do doc. de fls. 2 dos autos. Nada mais se deu como provado». 4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA Vem arguida pelo Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto a nulidade da sentença na medida em que o tribunal a quo “não estabeleceu ou fixou quais os factos que se podem retirar do relatório e que considerou como provados e os que o não são”, o que integra a nulidade prevista no n.º1 do art.º125.º do CPPT e na alínea b) do n.º1 do art.º615.º do CPC, por não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Nos termos da alínea b) do nº 1 do art.º615º do CPC, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Tal nulidade – por falta de especificação dos fundamentos de facto prevista naquele art.º615.º, nº1, alínea b) do CPC (e também no art.º125º, nº1 do CPPT) - abrange tanto a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, nº 2 do CPPT, como a falta do exame crítico das provas previsto no art.º607º, nºs 3 e 4 do CPC – vd., a propósito, Jorge Lopes de Sousa, “Código de Procedimento e Processo Tributário anotado e comentado”, 6ª ed., Vol. II, pág. 358, embora reportando-se ao CPC/61, que continha disposições idênticas. Com efeito, decorre do disposto nos artigos 123º, nº 2 do CPPT e 607º, nºs 3 e 4 do CPC [aplicáveis, com as devidas adaptações, por força do artigo 2º, alínea e) do CPTT], que o juiz tem o dever de declarar quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, fundamentando a decisão sobre a matéria de facto, devendo especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, analisando criticamente as provas. Exige-se, assim, por um lado, a análise crítica dos meios de prova produzidos e, por outro, a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida. O exame crítico da prova deve consistir, pois, na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro. Ou seja, a fundamentação de facto não se deve limitar à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto - assim, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pág. 321. O julgador não se deve limitar a uma simples e genérica indicação dos meios de prova produzidos, impondo-se-lhe que analise criticamente essa prova produzida. Porém, tal nulidade só ocorre quando faltem em absoluto os fundamentos de facto em que assentou a decisão. Apenas a total e absoluta ausência de fundamentação de facto afecta o valor legal da sentença, acarretando a sua nulidade, o que não ocorre quando a fundamentação é escassa, incompleta, não convincente, deficiente ou errada - cf. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol V, pág. 139/140 e Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra, pág. 687. No caso vertente, resulta que na matéria de facto dada como provada a Mma. Juiz indica o concreto meio de prova, documental e/ou testemunhal, que suporta a sua decisão. No que em particular concerne ao relatório, a sentença deu como provado que o documento existe com determinado conteúdo, mas não deu como «provada» ou «não provada» a materialidade que dele consta, é certo. No entanto, isso não integra, salvo o devido respeito, nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão, reconduzindo-se antes a eventual erro de julgamento na selecção da matéria de facto, pois que o julgador não terá levado ao probatório como factos «provados» ou «não provados» materialidade pertinente à decisão da causa, errando no juízo quanto à sua irrelevância. Por outro lado, note-se, embora em sede de fundamentação jurídica, a sentença recorrida não deixa de reportar a materialidade resultante da prova produzida nos autos e levada ao probatório que, a seu ver, infirma a factualidade relatada ou as ilações extraídas pela AT de determinados factos. Como se diz na sentença, «Como refere a impugnante na P.I., quanto ao quadro utilizado a fls.23 do relatório para pretensamente comprovar a aquisição de cortiça “sem factura”, como resulta da prova testemunhal prestada, os valores nele constantes, convertendo fardos em Kgs. não são credíveis, e portanto, não logram comprovar o que era pretendido, já que assim, cai por terra a alegada correspondência entre as facturas emitidas pelos fornecedores de cortiça, que se afirma serem fornecedores da M... e os pretensos emitentes de facturas que titulam transacções simuladas». Conclui-se, assim, que o tribunal a quo fundamentou a decisão de facto, indicando os concretos meios de prova que julgou relevantes, não se verificando que tenha omitido a análise crítica dos meios de prova, uma vez que esta se basta com a mera indicação do meio de prova que suporta a decisão perante a inexistência de elementos de prova documental e/ ou testemunhal contraditórios entre si, em que há que explicar por que se dá preponderância a uns em detrimento de outros, pelo que, nessa linha de entendimento, não ocorre a arguida nulidade da sentença recorrida, que assim improcede. Prosseguindo na apreciação das questões do recurso, cumpre salientar que o Recorrente não impugna a decisão de facto, com ela se conformando expressamente (Conclusão 3.ª). Já não se conforma o Recorrente com o modo como a sentença perspectivou o ónus da prova na situação em apreço em que a Administração tributária desconsiderou, para efeitos de deduT...lidade do IVA, facturas que reputou falsas, isto é, como não reflectindo qualquer real transacção entre o emitente e o utilizador. De acordo com o disposto no n.º1 do art.º82.º do CIVA (redacção vigente à data dos factos), «Sem prejuízo do disposto no artigo 84.º, o chefe da repartição de finanças procederá à rectificação das declarações dos sujeitos passivos quando fundamentalmente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos, liquidando adicionalmente a diferença». Como resulta do disposto no n.º1 do art.º19.º do CIVA, «para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzirão, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram», nomeadamente e nos termos da sua alínea a), «o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos». Ou seja, em regra, assiste ao sujeito passivo o direito à dedução do imposto suportado a montante na aquisição de bens e serviços necessários à operacionalidade da empresa e revelado nas respectivas facturas de aquisição, que devem documentar a contabilidade dos custos. No caso dos autos e como decorre expressamente do relatório de inspecção tributária (fls.29 do PA), as correcções à dedutibilidade do IVA alicerçaram-se no disposto no n.º3 do art.º19.º do respectivo Código, que dispõe: «Não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente». O que se passou foi que em acção inspectiva ao sujeito passivo impugnante a AT constatou a contabilização de facturas de determinados emitentes relativamente às quais o sujeito passivo exercera o direito à dedução, mas a seu ver ilegalmente por essas facturas não terem subjacente qualquer transacção real entre ele e tais emitentes, antes consubstanciando transacções simuladas destinadas a justificar contabilística e fiscalmente transacções reais não facturadas com outros sujeitos passivos, realidade subsumível ao disposto naquele n.º3 do art.º19.º do CIVA. A sentença não sancionou as correcções decorrentes da não-aceitação da dedução do IVA mencionado naquelas facturas, em vista da materialidade relatada que, a seu ver, não satisfaz o ónus de prova que legalmente impende sobre a Administração tributária. É com esse modo de ver que o Recorrente se não conforma. Vejamos de que lado está a razão. Como tem sido realçado, reiterada e uniformemente, pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, nomeadamente por este Tribunal Central Administrativo Norte, quando a Administração tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do art.º74.º da Lei Geral Tributária, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios e credíveis de que as operações constantes das facturas não correspondem à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção – vd., entre muitos outros, os acórdãos do STA, de 20/11/2002, proc.º01483/02 e do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF. Assim sendo, importa analisar se a Administração tributária fez a prova que lhe competia da verificação de indícios que permitem concluir que às facturas contabilizadas pela Impugnante, aqui Recorrida, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão. Tenha-se em conta, como também é aceite pela jurisprudência, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12 (processo nº 00964/06.0 BEPRT). Ou seja, a Administração Tributária não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Processo 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – art.º75º, n.º1 da LGT. Os indícios são definidos por João de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” - citado por Saldanha Sanches, in “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, pág. 311. Nesta tarefa e como é salientado no Acórdão deste TCA Norte de 28/02/2013, proferido no proc.º00383/08.4BEBRG, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, revelando-se até a fiscalização cruzada um procedimento crucial no combate à fraude e evasão fiscais. Salienta-se ainda, quanto à questão do ónus da prova e do seu cumprimento pela AT quando esteja em causa a não-aceitação da dedução do IVA mencionado nas facturas com apelo ao n.º3 do art.º19.º do CIVA, o recente acórdão do STA (Pleno do CT), de 17/02/2016, tirado no proc.º0591/15, em que se deixou consignado o seguinte: «Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende»; «Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução». Com esse pano de fundo, avancemos para o caso dos autos. No relatório vêm descritos os seguintes indicadores de falsidade das facturas emitidas à impugnante, ora Recorrida, por “Co…, Sociedade Unipessoal, Lda.” e “Ca… Unipessoal, Lda.”: (i) pagamentos por cheque e recebimentos reflectidos contabilisticamente na conta POC de caixa não estando os movimentos das contas bancárias reflectidos contabilisticamente na conta POC de depósitos bancários como devido, nem se tendo o sujeito passivo, notificado para tanto, disponibilizado para apresentar cópia dos extractos bancários nem para identificar o número dos cheques, bancos e contas bancárias utilizadas no pagamento das facturas em questão; (ii) a emitente “Co… Sociedade Unipessoal, Lda.” está referenciada em outro relatório inspectivo, abrangendo o IVA e o exercício de 2003, como emitente de facturas falsas e sem actividade para suportar as aquisições efectuadas pela impugnante (RIT, fls.25 do PA); (iii) a emitente “Ca…, Lda.” desenvolve actividade de venda de “rolhas” e não de “cortiça em bruto”, transacção que corresponde à que foi facturada à impugnante, sendo que os seus pretensos fornecedores de cortiça estão todos eles indiciados como emitentes de facturas falsas no processo inspectivo em curso a este emitente (Camercork, Lda.) referenciado ao IVA e ao exercício de 2003 (RIT, fls.26/27 do PA); (iv) consta da acção inspectiva a que foi sujeita a impugnante com referência ao exercício de 2002 que «é o próprio gerente da sociedade Co… que [em declarações no procedimento inspectivo a que esse s.p. foi sujeito] reconhece a sua participação no esquema de facturas falsas (como emitente e utilizador), envolvendo no esquema a sociedade M... Unipessoal como utilizadora de facturas falsas por si emitidas; (v) «existem provas de que o valor dos cheques emitidos pela sociedade M... Unipessoal para pagar as facturas emitidas pelas sociedades Co…, E… e Ca… (…) retorna para as contas particulares do seu gerente Sr. C…» [conforme esquema que se indica] – cf. fls.16 PA; (vi) as quantidades de produto real que entraram em armazém e que determinadas guias de transporte contabilizadas pela M... & S... (outra sociedade de M... e em cujas instalações também funcionava a impugnante) reflectem, aproximam-se das que constam de determinadas facturas dos emitentes Co… e Ca…, se convertidas as quantidades transportadas, expressas em arrobas e quilos nas guias de transporte, em fardos (em que estão expressas as quantidades nas facturas), conforme quadro do RIT, a fls.24 do PA. Em vista da factualidade relatada, poderá afirmar-se que a AT recolheu indícios sérios e credíveis que comprometem a presunção de veracidade dos elementos de escrita da impugnante e dos respectivos suportes documentais, concretamente das facturas em crise que contabilizou? A nosso ver, a resposta é negativa. Com efeito, não obstante os factos-índice recolhidos do lado dos emitentes (a circunstância de a “Co…” estar referenciada em outro processo inspectivo como emitente de facturas falsas, não apresentar actividade compatível com os serviços facturados à impugnante e o seu gerente, no âmbito de outro processo, ter referenciado a impugnante como utilizadora de facturas falsas por si emitidas; e a “Ca…” desenvolver actividade de venda de “rolhas” e não de “cortiça em bruto”, produto que facturou à impugnante, sendo que os seus pretensos fornecedores de cortiça estão todos eles indiciados como emitentes de facturas falsas no âmbito do procedimento inspectivo instaurado a esse sujeito passivo), a verdade é que não há elementos objectivos e consistentes que comprometam a presunção de veracidade de que beneficiam os documentos de suporte contabilístico da impugnante, sendo que tais factos índice de banda dos emitentes nem sequer estão expressamente reportados ano em causa de 2003, como a impugnante não deixa de referir. É que, como já temos salientado em anteriores arestos, determinado sujeito passivo pode estar referenciado como emitente de facturas falsas e efectivamente emitir facturas que não têm subjacente qualquer operação económica e, simultaneamente, dedicar-se à actividade económica para que está colectado, prestando os correspondentes serviços ou fornecimentos. Daí que se assuma, em regra, como decisivo no comprometimento da fiabilidade da escrita e respectivos documentos de suporte a recolha, também, de elementos indiciários do lado do utilizador das facturas, cuja leitura cruzada com os elementos de banda dos emitentes permita estabelecer um nexo entre a actividade ilícita destes e os documentos contabilizados pelo utilizador e não aceites pela AT para efeitos de deduT...lidade. E este modo de ver não contende com a doutrina do citado acórdão do STA, de 17/02/2016, porquanto sendo admissível que a factualidade indiciária de banda dos emitentes seja de per si susceptível de abalar a presunção de veracidade dos elementos declarativos e de contabilidade do beneficiário das facturas, a nosso ver tal não se verifica no caso concreto pois estão em causa emitentes com existência legal e actividade corticeira, embora no caso da “Camercork” não exactamente do tipo da facturada (refere-se, quanto a este emitente, que se dedica à actividade de venda de rolhas e facturou à impugnante “cortiça em bruto”). Ora, do lado do utilizador, a AT não recolheu qualquer factualidade objectiva e consistente, nomeadamente, no que respeita aos movimentos financeiros relativos ao pagamento das questionadas facturas e ao seu afirmado retorno às contas da impugnante. Na verdade, refere o relatório que o sujeito passivo impugnante não se disponibilizou para apresentar cópia dos extractos bancários, nem para identificar o número dos cheques, bancos e contas bancárias utilizadas no pagamento das facturas em questão sendo que a análise de tais documentos permitiria comprovar os movimentos de retorno dos pagamentos (efectuados através de cheques passados pela impugnante aos emitentes) às contas da impugnante, M... – Sociedade Unipessoal, Lda. No entanto, é bom lembrar que em causa estão elementos apreendidos no âmbito do processo de Inquérito-crime n.º47/03.5IDAVR, como o próprio Recorrente reconhece (cf. fls.621), embora a seu ver, na linha de entendimento da AT, tais elementos, independentemente da circunstância da sua apreensão em processo-crime, pudessem ser facultados à AT se solicitados pela impugnante às competentes entidades bancárias cópias ou segundas vias, colaboração a que a impugnante se não prestou apesar de lhe ter sido solicitada pela AT. É certo que o contribuinte está obrigado a deveres de colaboração nomeadamente no cumprimento das obrigações acessórias previstas na lei (art.º31.º, n.º2 da LGT) e no esclarecimento da sua situação tributária e das relações económicas que mantenha com terceiros (art.º59.º, n.º4 da LGT), podendo a presunção de veracidade das declarações, contabilidade e escrita – independentemente da constatação de quaisquer erros, inexactidões, omissões ou indícios fundados de que não reflectem a realidade tributária do sujeito passivo [cf. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, “LGT – Anotada e Comentada”, Encontro de Escrita, 4.ª ed. 2012, pág.665] – deixar de valer perante o incumprimento de tais deveres de esclarecimento, sem que se mostre legítima a recusa de informações ou a apresentação de documentos fiscalmente relevantes (art.º75.º, n.º2 alínea b), da LGT). No entanto e como se disse, não estando os documentos de despesa pretendidos pela AT na posse da impugnante por terem sido apreendidos em processo-crime, tendo ele disso mesmo informado a AT, não pode, em bom rigor, falar-se em recusa de colaboração do sujeito passivo no esclarecimento da sua situação tributária, pois a recusa supõe uma injustificada falta de apresentação da documentação da despesa que o contribuinte está obrigado a guardar e manter em seu poder e em boa ordem durante o período de tempo estabelecido na lei. Mas mesmo quando assim não se entenda, estando os factos revelados por tais documentos bancários a ser investigados no âmbito do Inquérito-crime em que foram apreendidos, não pode ser atribuída à falta de disponibilidade da impugnante para obter das entidades bancárias competentes cópia dos documentos apreendidos o desvalor de uma recusa de colaboração que a lei comina com a cessação da presunção de veracidade declarativa e dos dados da contabilidade [cf. art.º117.º, n.º2, do CPA, ex vi do 2.º alínea c), da LGT e Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pág.665]. O que significa que, não havendo inversão do ónus da prova (por não ocorrer recusa de colaboração, ou, em todo o caso, se mostrar legitima a recusa de colaboração com o acto de inspecção em causa), a afirmação que se faz no relatório de inspecção tributária que suporta as correcções de que os pagamentos das questionadas facturas retornaram às contas da impugnante, carecia de ser averiguado enquanto facto com interesse, mesmo determinante, para a decisão de procedimento (art.º58.º, da LGT), o que não foi feito, deixando sem suporte material tal afirmação. Por outro lado, a sentença, em vista da prova produzida nos autos, deu por não provado o apontado nexo de correspondência estabelecido pela AT entre as quantidades de produto entrado nos armazéns proveniente de fornecedores reais da impugnante e mencionado nas guias de remessa contabilizadas pela M... & S... (outra sociedade de M..., em cujas instalações também funcionava a impugnante) e as quantidades de produto facturadas pelos emitentes em questão, o que retira validade probatória a este indício (cf. factos h) a l) do probatório), através do qual pretendia a AT relacionar as quantidades de cortiça constantes das guias de remessa de fornecedores reais da impugnante (mas cujas operações económicas não eram por eles facturadas) com as descritas nas facturas fictícias destinadas à cobertura de tais operações para efeitos contabilísticos e fiscais. Ora, os elementos indiciários que subsistem, quer do lado dos emitentes, quer do lado da impugnante, não são bastantes para abalar a presunção de veracidade dos elementos de contabilidade desta. Salienta-se, quanto à fragilidade dos indícios subsistentes, que a irregularidade da utilização contabilística da conta caixa para pagamentos e recebimentos e não da conta de depósitos bancários, mesmo quando os pagamentos são efectuados através de meios de pagamento bancários, nomeadamente, cheques, vale para a generalidade das operações praticadas pela impugnante, não é apontada especificamente com relação aos pagamentos efectuados aos falsos emitentes; as declarações do gerente da Co… envolvendo a impugnante no esquema das facturas falsas por si emitidas estão reportadas ao anterior ano de 2002; a acção inspectiva em que se apurou estarem todos os fornecedores de cortiça da “Ca…” (produto que este sujeito passivo facturou à impugnante) referenciados como emitentes de facturas falsas ainda não se encontrava finalizada. Concluímos, pelas razões indicadas que a AT não recolheu factualidade indiciária bastante para abalar a presunção de veracidade dos dados e apuramentos inscritos na contabilidade da impugnante, dito de outro modo, factualidade que aponte, de modo sério, credível e consistente, para a falta de realidade das operações tituladas pelas questionadas facturas contabilizadas pela impugnante e relativamente às quais ela exerceu o direito à dedução do IVA nelas mencionado. Ora, como decorre da doutrina do citado acórdão do STA (Pleno do CT), de 17/02/2016, aliás na linha da jurisprudência uniforme daquele alto tribunal, só abalada a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (no caso, as facturas), passa a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (no caso, o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, «…o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução». Podendo a impugnante prevalecer-se da presunção de veracidade dos elementos constantes da sua contabilidade, nos termos gerais de direito, nenhum ónus de prova sobre si recai de demonstrar a realidade das operações facturadas (art.º344.º, n.º1, do Código Civil). Nessa medida, o resultado das diligências requeridas ao tribunal na petição inicial para demonstração da realidade das operações facturadas visando prevenir um diferente entendimento do tribunal quanto à ponderação e valoração da prova, não tinha de ser levado ao probatório, independentemente de a factualidade apurada suportar ou infirmar a posição da impugnante/Recorrida, não tendo a sentença incorrido em nulidade por falta de pronúncia sobre essa factualidade, nem em erro de julgamento na selecção dos factos, como pretende o Recorrente. A este respeito, cumpre assinalar que a sentença refere expressamente as razões por que não ponderou o resultado das diligências probatórias requeridas pela impugnante. Como se diz a pág.33 (fls.565 dos autos), «…não se relevou na apreciação supra o relatório técnico referido no probatório, já que não foi o mesmo que sustentou as correcções efectivadas, não podendo ser tomado em consideração como se de fundamentação “a posteriori” se tratasse». A posição do Recorrente, neste ponto, ao que julgamos, sustentada no princípio da aquisição processual – que estabelece que a prova pertence ao processo e não às partes e se destina a formar a convicção do julgador – não colhe porque a prova indiciária visando abalar a presunção de veracidade dos dados inscritos na contabilidade da impugnante que ao tribunal cumpre aquilatar é, única e exclusivamente, a que consta do relatório de inspecção e/ou demais actos do procedimento tributário anteriores à decisão correctiva, não podendo o julgador ponderar para esse efeito o que eventualmente venha a resultar da prova produzida em tribunal ainda quando esta prova venha a evidenciar factos afirmados, mas aí de modo não substanciado, no relatório ou demais actos do procedimento que integram a decisão correctiva. A ponderação dessa prova produzida em juízo e a selecção para o probatório dos factos que revela só se imporia ao tribunal se se impusesse à impugnante o ónus de demonstrar a realidade das operações representadas pelas questionadas facturas, o que in casu não ocorreu porque, repete-se, a AT na convicção do tribunal a quo, agora validada por este tribunal de apelação, não conseguiu abalar a presunção de veracidade dos dados e apuramentos inscritos na contabilidade da impugnante. De qualquer modo, a matéria factual considerada pelo tribunal a quo constitui base suficiente para a solução jurídica que entendeu adequada e este tribunal agora valida, pelo que não se impõe a sua ampliação nos termos preconizados pelo Recorrente, aliás de harmonia com a sua posição assumida nos autos, de que a AT cumpriu o ónus probatório que se lhe impunha de recolher indicadores de falsidade das facturas desconsideradas para efeitos de deduT...lidade do imposto nelas mencionado. Por último, não incorreu o tribunal a quo ilicitamente na prática de actos inúteis ao ordenar a produção da prova documental requerida pela impugnante aos autos visando alicerçar a sua defesa (junção de cópias integrais dos documentos contabilisticos e financeiros da impugnante, relativos ao ano de 2003, apreendidos no âmbito do processo de Inquérito-crime n.º47/03.5IDAVR – cf. fls.40 dos autos), posto que pertinente ao objecto do litigio e como expressamente se diz na decisão que ordenou a realização da prova, essencial à boa compreensão dos factos controvertidos tal como se apresentavam ao julgador na fase instrutória. De resto, não alcançamos que consequência de direito probatório material o Recorrente pretende extrair da prática de actos instrutórios ordenados pelo tribunal a requerimento de uma das partes, cujo resultado a decisão não relevou factualmente explicando porquê, sendo que não errou nesse juízo. É, pois, de confirmar a sentença recorrida na improcedência “in toto” dos vícios a ela assacados, assim se negando provimento ao recurso. 5 - DECISÃO Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso. Custas a cargo do Recorrente. Porto, 15 de Setembro de 2016. Ass. Vital Lopes Ass. Cristina da Nova Ass. Pedro Vergueiro |