Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00325/10.7BEBRG |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 02/10/2017 |
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Tribunal: | TAF de Braga |
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Relator: | João Beato Oliveira Sousa |
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Descritores: | ISS, IP; JUSTIFICAÇÃO FALTA; AVISO RECEPÇÃO |
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Sumário: | 1- Admitindo-se como lícita a opção da Administração pelo envio de carta registada com aviso de recepção, diferentemente do que era preconizado no n.º 1 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 360/97, de 17.12 (pessoalmente ou mediante carta registada), deverá coerentemente concluir-se que se auto vinculou a respeitar essa forma e o seu regime legal, com as inerentes consequências e corolários. Dito de outro modo, admitindo-se que a Administração poderia ter feito doutra maneira (carta registada), deve assumir as consequências do que fez (carta registada com aviso de recepção). 2 - Ora, a modalidade da carta com aviso de recepção não é apenas um “plus” formal em relação à modalidade da carta registada, mas sim uma figura com uma filosofia própria, buscando ser uma (quase) notificação pessoal e não o mero depósito de um objecto postal (aviso) numa caixa de correio. Na hipótese de devolução da carta registada com aviso de recepção, sem que este se mostre assinado, estatui o CPC que deverá proceder-se à notificação (citação) mediante contacto pessoal (artigo 239º) ou enviar-se nova carta (na hipótese do artigo 237º-A/4), soluções divergentes das estatuídas para a hipótese de carta registada e, por alguma razão, não comportam norma semelhante à do artigo 254º/3/4 CPC. 3. Portanto, no caso, não impendia sobre o Autor o ónus de ilidir a presunção da notificação prevista no artigo 254º/4 CPC e, consequentemente, o ISS não poderia tê-lo considerado notificado para comparecer ao exame médico em causa, nem considerar que houve “falta” injustificada ao mesmo.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
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Recorrente: | MSNM |
Recorrido 1: | Estado Português |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido do provimento do recurso. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO MSNM veio interpor recurso da sentença pela qual o TAF de BRAGA julgou improcedente a acção administrativa especial que intentou contra o Estado Português, representado pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, e o Instituto da Segurança Social, I.P., tendo por objecto o despacho proferido em 05.08.2009 pelo Coordenador Técnico do SVI, que indeferiu o pedido de justificação de falta a CRIT (cfr. doc. 32 junto com a p.i.) e a decisão a que se reporta o ofício n.º 215327, de 07.08.2009, que determinou a cessação do subsídio de doença por não ter sido atendível a justificação apresentada para a falta ao exame médico convocado (cfr. doc. 31 junto com a p.i.). * Conclusões do Recorrente:
CONCLUSÕES 1ª Vem o presente Recurso interposto da decisão constante do douto Acórdão proferido em 21/10/2013 nos autos do processo nº 325/10.7BEBRG, a correr termos na 1ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga e, através dele, procurará a Recorrente/Apelante demonstrar e provar que, salvo o devido respeito, não andou bem o douto Tribunal a quo ao ter julgado improcedente a Ação que, ao invés, exigia Decisão diametralmente oposta. 2ª O citado douto Acórdão julgou totalmente improcedente a Ação instaurada conta o Instituto da Segurança Social, I.P. e, em consequência, manteve o Tribunal a quo os atos administrativos impugnados. 3ª Da matéria de facto assente consta que: a) “Em 22.07.2009, o autor apresentou requerimento dirigido à Directora do Centro Distrital da Segurança Social de Braga, pedindo a fixação de nova data para a realização do referido exame médico, por não ter recebido qualquer convocatória, notificação ou aviso, não tendo de outra forma tomado conhecimento de que deveria apresentar-se perante a Comissão de Reavaliação. cfr. PA apenso.” – (Cfr. al. E) da Fundamentação de Facto). b) “Em 05.08.2009, pelo Coordenador do SVI foi proferido despacho a indeferir o pedido de justificação de falta do autor a CRIT por este ter sido convocado através de carta registada com aviso de recepção, devolvida pelos CTT com a indicação de não reclamada – cfr. doc. 32 junto com a p.i.”. (Cfr. al. F) da Fundamentação de Facto). – Sublinhado nosso. c) “Por ofício nº 215327 do Centro Distrital da Segurança Social de Braga, dirigido ao autor, sob o assunto “Notificação da decisão”, datado de 06.08.2009, foi informado o autor de que teria lugar a cessação do subsídio de doença por não ter sido atendida a justificação da falta apresentada, caso não fossem juntos novos elementos no prazo de dez dias – cfr. doc. 31 junto com a p.i.” (Cfr. al. H) da Fundamentação de Facto). – Sublinhado e negrito nossos. d) “Em 22.09.2009, pela Directora do Centro Distrital da Segurança Social de Braga foi proferido despacho a manter a injustificação de falta do autor a CRIT em 20.07.2009 – cfr. doc. 38 junto com a p.i.” (Cfr. al. I) da Fundamentação de Facto). 4ª Mais refere o douto Acórdão recorrido que “Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos, com relevância para a decisão da causa.” (Cfr. Fundamentação de Facto, in fine). 5ª Sob a rubrica “Motivação”, o douto Tribunal a quo considerou que “A prova da matéria de facto dada como assente resultou da análise crítica dos documentos juntos aos autos e da prova por admissão das partes.” (sublinhado nosso). 6ª Salvo o devido respeito, não pode o Recorrente acompanhar o entendimento do douto Tribunal a quo e, consequentemente, a decisão proferida. 7ª Ao invés do que o douto Tribunal Recorrido dá como provado, o beneficiário, ora Recorrente, não pode considerar-se notificado da convocatória para comparecer 20/07/2009 perante a Comissão de Reavaliação da Incapacidade Temporária – CRIT. 8ª No Processo Administrativo apenso aos autos, consta um envelope de janela, que alegadamente continha o Ofício nº 172440, datado de 25/06/2009, expedido por carta com aviso de receção para a morada do beneficiário/Recorrente, pese embora com o código postal completamente errado. 9ª O código postal inscrito no citado Ofício é “4700-000 BRAGA” em vez de 4705-238 BRAGA”. 10ª A referida carta foi expedida em 25/06/2009 sob registo com A.R. nº RM437559690PT e, alegadamente, objeto de tentativa de entrega em 29/06/2009. 11ª No verso do sobrescrito encontra-se aposto um autocolante com a indicação de “Carteiro: M...; Giro 20; Não atendeu”. 12ª A referida carta foi devolvida ao ISS, I.P. em 08/07/2009, e por esta Entidade recebida em 09/07/2009, ou seja, 11 dias antes da data marcada para a realização do exame médico em sede de Comissão de Reavaliação da Incapacidade Temporária. 13ª Na data de 20/07/2009 que o I.S.S., I.P. fixou para a apresentação do beneficiário/Recorrente perante a CRIT, já o Recorrido sabia há 11 (onze) dias que o beneficiário não havia tomado conhecimento da convocatória. 14ª Em parte alguma do subscrito em apreço, ou em documento anexo, se encontra declarado que o carteiro preencheu e introduziu na caixa de correio do destinatário o aviso de que a carta ficaria depositada na estação dos CTT para aí ser levantada dentro de certo prazo. 15ª Tendo a carta sido expedida com aviso de receção e não tendo esta sido entregue ao destinatário, não pode, salvo melhor entendimento, presumir-se que este teve conhecimento do seu conteúdo. 16ª O Tribunal recorrido entendeu que as normas contidas nos nrs. 3, 4 e 6 do art. 254º do Código de Processo Civil (com a numeração anterior à que lhe foi dada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho) se aplicam às notificações em Procedimento Administrativo. 17ª Porém, o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07-07-2005 (proc. nº 0553/05), in www.dgsi.pt, considerou que (reproduzimos com a devida vénia): “I - Nos procedimentos administrativos a notificação postal constitui a regra geral (art.º 70 do CPA). II - O DL 121/76, de 11.2, dispensou mas não proibiu que as notificações postais continuassem a ser feitas através de carta com aviso de recepção, podendo, embora, sê-lo por carta registada. III - A notificação por carta registada com aviso de recepção considera-se perfeita desde que dirigida ao domicílio do notificando, ainda que o aviso não tenha sido assinado por este, e considera-se feita no dia em que foi assinado o aviso de recepção. (Negrito e sublinhado nossos). 18ª Caso houvessem de aplicar-se, ainda que subsidiariamente, como sustentado pelo Tribunal a quo, as regras do Código de Processo Civil às formalidades da notificação a que se refere o art. 70º do Código do Procedimento Administrativo, a devolução da carta expedida com aviso de receção haveria, também, por aplicação analógica do disposto no nº 4 do art. 237-A do CPC na redação anterior à Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, de dar lugar à expedição de segunda carta. 19ª A análise crítica dos documentos juntos aos autos revela-se incompleta e deficiente. 20ª Apesar de constarem dos autos e/ou do Processo Administrativo a estes apenso, o Tribunal a quo não analisou criticamente os seguintes aspetos, nos termos do nº 2 do art. 95º do CPTA: a) Através do Requerimento que o beneficiário, aqui Recorrente, enviou ao Diretor do Centro Distrital de Segurança Social de Braga em 08/06/2009, foi solicitado que “Caso não seja possível a realização do exame em qualquer das três datas indicada em 4., supra, indicar três outras em alternativa, devendo uma delas ser imediatamente aceite e confirmada a V. Exa. pelo requerente.” (Cfr. doc. nº 26 junto com a P.I.); b) Tais apontadas datas eram: 08/07/2009, 15/07/2009 e 22/07/2009 e haviam sido sugeridas pelo médico indicado pelo beneficiário/examinando como Perito para integrar o colégio dos médicos examinadores em sede de CRIT. c) Não obstante as peticionadas datas alternativas, o Instituto da Segurança Social, I.P., sem mais, fixou uma data completamente diversa, estabelecendo o dia 20/07/2009 para a realização do exame – submissão a CRIT. d) Apenas em 12/08/2009, aquando da receção do Ofício nº 214248 do ISS., I.P., o beneficiário/Recorrente tomou oficialmente conhecimento de que aquele Instituto havia marcado o exame médico para o dia 20/07/2009. (Cfr. doc. nº 32 junto com a P.I.). e) Em sede de Reclamação de 18/08/2009 do Ato Administrativo vertido no despacho do Senhor Coordenador Técnico do SVI, de 05/08/2009, foi requerida a produção de prova e oferecidas testemunhas, não tendo a mesma sido admitida, nem sobre a mesma se haver sequer pronunciado o Órgão decisor; f) A prova oferecida foi pura e simplesmente ignorada pelo ISS., I.P. ora Recorrido, g) Tendo a Entidade Recorrida, ancorada no seu “ius imperium”, desconsiderado em absoluto o requerimento de prova oferecido, e dele feito tábua rasa. h) Consequentemente, foi o beneficiário coartado do direito à produção de prova, (para que havia sido notificado em 12/08/2009), nomeadamente, prova ilidível da alegada presunção de notificação, maxime decorrente de suposto aviso que o carteiro deveria deixar no recetáculo de correio do destinatário/recorrente para levantamento da carta na estação dos CTT. (Cfr. art. 21º da P.I. e doc. nº 36 junto com a mesma); i) Também em sede de Recurso Hierárquico dos Atos Administrativos consistentes na cessação do subsídio de doença e de injustificação da falta de comparecimento na CRIT, foi oferecida prova testemunhal cuja produção não teve lugar em virtude de até à data da propositura da Ação (10/02/2010), nem posteriormente a esta, o Ente Público ISS, I.P. não se haver pronunciado sobre o citado Recurso Hierárquico. (cfr. item nº 4 do Recurso Hierárquico de 19/10/2009 – doc. nº 40, e doc. 38 juntos com a P.I, bem assim como o art. 32º desta). j) Através do Ofício nº 215327, datado de 07/08/2013, o beneficiário foi convidado a juntar “meios de prova se for caso disso” (Cfr. doc. nº 31 junto com a P.I.). k) O beneficiário/Recorrente, ofereceu os meios de prova, nomeadamente testemunhal, em sede de Reclamação recebida pelo ISS, I.P. em 18/08/2009. (cfr. docs. nrs. 33 e 37 juntos com a P.I.). l) Apesar de tempestivamente apresentada a prova testemunhal, nunca o ISS, I.P. deu ao beneficiário a oportunidade de a produzir. m) Violou, pois, o Órgão decisor, aqui Recorrido, as normas ínsitas nos arts. 87º/1, 88º/2, 124º/1 e 125º/1, todos do CPA, e ainda o disposto nos arts. 266º/1 e 2, e 268º/4 e 5 da Constituição da República Portuguesa, doravante abreviadamente CRP. n) Os factos supra vertidos consubstanciam a nulidade do Ato Administrativo por violação do princípio Constitucional da proibição da indefesa, consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa. o) Ademais, A Decisão do ISS, I.P. notificada ao beneficiário/Recorrente através do Ofício nº 215327, de 07/08/2009, não se encontra devidamente fundamentada de Direito. (Crf. § 3º do doc. nº 31 junto com a P.I.: “… alínea b) do n.º 2 do art.º 24º”, sem alusão a qualquer diploma legal). 21ª Salvo melhor entendimento, a norma contida na parte final do nº 1 do art. 66º do DL nº 360/97, de 17 de Dezembro, não permite ao ISS, I.P., sem mais, rectius, sem qualquer fundamentação, considerar não atendível a justificação da falta. 22ª O beneficiário, ora Recorrente, “justificou” a sua não comparência (leia-se não-presença) com o facto de não haver chegado ao seu conhecimento qualquer convocação para comparecer perante a CRIT em 20/07/2009, nem tão-pouco qualquer aviso deixado pelo distribuidor postal para proceder ao levantamento da carta que alegadamente continha a convocatória. 23ª Em 12/08/2009 o beneficiário/Recorrente recebeu o Ofício nº 214248, datado de 06/08/2009, expedido pelo ISS.,I.P., em anexo ao qual seguiam duas fotocópias atinentes ao Ofício nº 172440 e alegado sobrescrito com aviso de receção nº RM437559690PT, 24ª Só nessa data de 12/08/2009 o beneficiário/Recorrente tomou conhecimento oficial de que alegadamente lhe havia sido enviado em 25/06/2009 a citada convocatória e as disposições legais aplicáveis para efeitos de eventual justificação da falta à CRIT de 20/07/2009. 25ª Padece, assim, o douto Acórdão recorrido do vício de deficiente e insuficiente fundamentação no que tange à matéria de facto assente. Na verdade, 26ª Resulta dos documentos juntos aos autos e/ou do Processo Administrativo que o Ente Público ora Recorrido violou grosseiramente os mais elementares princípios do Direito Administrativo, nomeadamente o princípio do contraditório, maxime audiência prévia, e de fundamentação legal do Ato Administrativo (violação esta, de resto, reconhecida pelo Tribunal a quo – cfr. item III da Fundamentação de Direito). 27ª Consta também dos documentos que integram o Processo Administrativo que o ISS, I.P. violou as normas contidas na al. a) do nº 1 e no nº 2 do art. 123º do CPA (Cfr. art. 28º da P.I. e item II da douta Fundamentação de Direito) e no nº 3 do art. 63º da Constituição (cfr. item nº 28 do doc. nº 35 junto com a P.I.). 28ª A clamorosa violação por parte do ISS, I.P., do direito ao contraditório (a que o douto Acórdão faz referência em sede de Motivação), expressamente previsto no CPA, e do direito à tutela jurisdicional efetiva consagrado no nº 4 do art. 268º da CRP e no art. 2º do CPTA, não foi objeto de apreciação pelo Tribunal recorrido. 29ª A alegação na P.I. e a prova que resulta dos autos e do Processo Administrativo, consistente na violação por parte do ISS, I.P. das normas ínsitas nos arts. 6º-A, 87º/1, 88º/1 e 2, 100º, 103º/2, als. a) e b), 5º/2, 8º/1, al. a) e 9º, todos do CPA; e os preceitos Constitucionais ínsitos nos nrs. 1 e 3 do art. 63º, nrs. 1 e 3 do art. 266º, e nrs. 3 e 4 do art. 268º, todos da Constituição da República, não permite ao douto Tribunal a quo concluir que “bem andou a entidade demandada ao considerar não justificada a falta do autor”. (Cfr. arts. 34º a 36º da P.I.). 30ª Também nesta matéria, o Tribunal recorrido interpretou e aplicou incorretamente a Lei e os preceitos Constitucionais que enformam a relação da Administração com os administrados. Acresce que, 31ª O douto Tribunal a quo considerou que “foi o autor notificado para comparecer, em 20.07.2009, pelas 14 horas no CDSS Braga a fim de ser submetido a exame médico (…) sendo que o autor recebeu cartas no âmbito do procedimento administrativo em apreço naquela morada.” (Sublinhado nosso), e 32ª Consta, ainda, do item I da Fundamentação de Direito que “… tendo sido expedida a notificação para a concreta morada do autor, presume-se a notificação, ainda que tenha sido devolvida, não se mostrando afastada a presunção da notificação, constante dos artigos 254.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ao presente litígio…” (Negrito e sublinhado nossos). 33ª O facto de o Recorrente haver, no âmbito do Procedimento Administrativo, recebido cartas na morada constante do Ofício de 25/06/2009 não permite, sem mais, ao Tribunal a quo concluir que, necessariamente, também a carta (RM437559690PT) que continha o alegado Ofício, haveria de ser entregue naquela morada. 34ª Desde logo, porque o código postal está completamente errado e, nenhuma informação consta dos autos ou do Processo Administrativo que identifique o carteiro “M...” com o distribuidor postal que, porventura conhecedor da morada e do destinatário, procedeu à entrega das outras cartas procedentes do ISS, I.P. 35ª A tese do Recorrente, segundo o qual não pode de modo algum considerar-se aquele notificado para comparecer em sede de CRIT em 20/07/2009, é inequivocamente sustentada e amparada pelo entendimento do Supremo Tribunal Administrativo, vertido no seu douto Acórdão de 07/07/2005, parcialmente supra transcrito. 36ª Lê-se, ainda, na douta Fundamentação “Ora, o autor veio dizer que não recebeu a convocatória, sem alegar qualquer circunstância susceptível de afastar a referida presunção, i. é, que permita concluir que o autor não recebeu a convocatória nem a podia ter recebido… Na verdade, o autor limita-se a dizer que não recebeu a notificação.” (É nosso o negrito). 37ª O beneficiário/autor, ora Recorrente, nada mais poderia alegar senão os factos verdadeiros, consistentes na não receção da carta expedida em 25/06/2009 bem assim como a não receção de qualquer aviso supostamente deixado pelo distribuidor postal para proceder ao levantamento daquela na estação de depósito. 38ª Ainda que hipoteticamente, tal como entende o Tribunal recorrido, devesse presumir-se a notificação do Recorrente, o que de todo não merece a adesão deste, o ISS, I.P. coartou-o do exercício do direito à ilisão daquela presunção, porquanto 39ª O requerimento de prova oferecido, nomeadamente testemunhal, foi pura e simplesmente ignorado, não tendo o ISS, I.P. dado a menor oportunidade ao beneficiário/Recorrente para a produção da mesma. 40ª Ora, Sem prescindir do entendimento sufragado no supramencionado douto Acórdão do STA, de 07/07/2005, ainda que o beneficiário houvesse de se encontrar onerado com a prova de que não lhe foi entregue, nem sequer deixado pelo carteiro o suposto aviso para proceder ao levantamento da carta com aviso de receção RM437559690PT, não poderia ser-lhe sonegado o direito à produção da respetiva prova, nomeadamente através de testemunhas. 41ª Sendo que, em 22/07/2009, imediatamente após ter sido informado, no dia anterior, pelo seu médico assistente, de que este se havia deslocado a Braga, em 20/07/2009, para integrar a CRIT, o beneficiário/Recorrente deslocou-se ao Centro Distrital de Braga da Segurança Social, tendo aí comunicado a não receção de qualquer convocatória e disponibilizando-se para a realização do exame. (Cfr. docs. nrs. 28, 29,30 e 33, maxime itens nrs. 32,34 e 35 deste último documentos junto com a P.I.). 42ª Salvo melhor entendimento, e contrariamente ao entendimento vertido no item I, in fine, da douta Fundamentação de Direito, a justificação das faltas a que se refere o art. 66º do DL 360/97, de 17 de Dezembro assenta no pressuposto de que tais faltas se verificaram em consequência de o beneficiário/examinando ter sido devida e regularmente convocado, tendo chegado ao seu conhecimento a convocatória ou, pelo menos, e sem prescindir do anteriormente alegado, que a carta que a continha se encontrava depositada e à disposição na estação dos CTT. 43ª O conceito de “justo impedimento” constante do nº 1 do art. 140º do CPC (anterior art. 146º) tem subjacente um “evento não imputável à parte…” 44ª In casu, salvo o devido respeito, inexiste qualquer evento gerador de justificação de falta em virtude de “justo impedimento”, já que apenas em 12/08/2009 chegou oficialmente ao conhecimento do beneficiário/Recorrente que em 25/06/2009 havia sido expedida a alegada convocatória. 45ª No que tange à invocada falta de fundamentação jurídica da decisão de cessação do subsídio de doença, também o acerto da decisão recorrida não encontra sustentação legal. 46ª O Tribunal a quo partiu do princípio de que “estamos perante um acto vinculado e por força da aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo, que afasta a invalidade do acto em caso de incumprimento de formalidades legais quando se conclui que a sua substância é acertada.” (Sublinhado nosso). 47ª O Ato Administrativo em apreço, para além de ilegal, viola o preceito ínsito no nº 3 do art. 268º da CRP, na medida em que a factualidade vertida Processo Administrativo não conferia ao ISS, I.P. a prerrogativa de declaração da cessação do pagamento do subsídio de doença ao beneficiário/Recorrente. Senão, vejamos: a) Estriba-se o douto Acórdão recorrido na norma contida na al. b) do nº 2 do art. 24º do Decreto-Lei nº 28/2004, de 4 de Fevereiro. b) A citada norma refere que “O direito ao subsídio de doença cessa ainda quando o beneficiário não tiver apresentado justificação atendível para a falta a exame médico para que tenha sido convocado.” (Negrito e sublinhado nossos). c) O inciso “justificação atendível”, não consubstancia um poder ilimitado e absolutamente discricionário e “sem fronteiras” do Ente Público ISS, I.P., d) Antes, deverá forçosamente ceder perante o princípio da legalidade e da boa fé e, nomeadamente, à prova produzida que logre demonstrar a atendibilidade da justificação. e) Só que, para tanto, é necessário que ao “justificante” seja dada a oportunidade de se justificar e de produzir prova. 48ª A justificação apresentada pelo Recorrente só não foi atendida porque o Instituto da Segurança Social coartou o beneficiário, ora Apelante, do direito à produção de prova. 49ª A falta de convocação válida e eficaz para o ato (CRIT), deverá inquinar de nulidade o próprio ato e todos os subsequentes (à semelhança da falta de citação em processo civil). 50ª Salomonicamente, dotado do seu jus imperium, a ISS, I.P. pura e simplesmente, fez tábua rasa das alegações e respetiva defesa oferecidas pelo beneficiário, e limitou-se prepotentemente e ao arrepio do princípio da legalidade, a manifestar a força inamovível daquele (seu) “ius imperium” ante a fragilidade, impotência e desigualdade de armas do beneficiário administrado, a que está sujeito por força dessa relação de supra-infra ordenação. 51ª A este propósito, e no que tange à produção e admissibilidade de prova, atenta a similitude das situações versadas, transcreve-se parcialmente infra, o sumário constante do recente douto Acórdão de 18/03/2013 (proc. nº 05789/01), disponível em www.dgsi.pt, proferido pelo Venerando Tribunal Central Administrativo do Sul: “II - Hoc sensu devem ser considerados tempestivos os novos meios de prova apresentados em sede de recurso hierárquico, peticionado pelo advogado entretanto constituído. III - A não admissão desses meios de prova, que além de tempestivos se revelavam pertinentes e necessários para uma correcta ponderação do caso, faz a decisão impugnada incorrer na violação dos artigos 61º e 76º do ED, conduzindo inevitavelmente à respectiva anulação.” 52ª Diversamente do entendimento vertido no douto Acórdão recorrido, entende o Recorrente que não têm aplicação analógica ao procedimento administrativo, maxime notificações, os arts. 254º e 255º do CPC (numeração anterior à Lei nº 41/2013). 53ª Em parte alguma do Código do Procedimento Administrativo se faz referência à aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. 54ª O art. 254º (agora 248º com a renumeração conferida pela Lei nº 41/2013) do CPC diz respeito às notificações às “PARTES”, ou seja, aos sujeitos processuais, e não às comunicações estabelecidas entre a Administração e os administrados (obviamente, no âmbito da relação Administrativa). 55ª Do mesmo modo, entende o Recorrente que a norma ínsita no nº 1 do art. 255º (agora art. 249º) do CPC, com remissão para o art. 254º (agora art. 248º) do mesmo diploma, aplica-se única e simplesmente aos processos judiciais pendentes (nomeadamente a impugnação judicial de atos administrativos) e já não aos procedimentos administrativos (i.e., no âmbito de processo administrativo). Cfr., por todos, Ac. STA de 01-10-2008, proc. nº 0337/08, relatado pelo Exmo. Senhor Conselheiro Jorge de Sousa. Sem conceder, 56ª A entender-se que se aplicam analogicamente ao Procedimento Administrativo as regras dos arts. 254º e 255º do anterior CPC (atuais arts. 248º e 249º) e ao ter sido expedida a convocatória através de carta com aviso de receção, sempre a devolução da mesma haveria de dar lugar ao envio de uma segunda carta, e 57ª Ainda assim, só se consideraria notificado o destinatário depois de assinado o aviso de receção, ainda que por pessoa diversa do mesmo. 58ª Salvo melhor entendimento, apenas e só a norma constante do nº 1 do art. 32º do DL nº 360/97 é aplicável à notificação do beneficiário para comparecimento na CRIT. 59ª Prescreve o nº 2 do citado artigo que “No acto da convocação, o beneficiário deve ser informado dos efeitos decorrentes da sua não comparência …” 60ª A citada norma, e a sua ratio, inculca a ideia de que para que o beneficiário seja “informado dos efeitos decorrentes da sua não comparência”, é condição sine qua non que o mesmo tenha acesso a essa informação/convocação, ou pelo menos, que à mesma haja podido aceder. 61ª Portanto, o regime da justificação da falta de comparência e atendibilidade da mesma a que se referem os arts. 66º do DL nº 370/97 e 24º, nº 2, al. b) do DL nº 28/2004, tem implícito e como pressuposto, que a notificação para o ato haja chegado atempadamente ao conhecimento do beneficiário/paciente/destinatário. 62ª Nada dispondo os citados diplomas legais, nem o CPA, sobre as consequências da devolução da carta registada com aviso de receção deverá, in extremis, socorrer-se o julgador das normas contidas no nº 3 do art. 9º e nos nrs. 1 e 2 do art. 10º, ambos do Código Civil e no art. 13º da CRP, levando em conta o regime das notificações previstas para idêntico fim atinente aos trabalhadores em funções públicas – Decreto Regulamentar nº 41/90, de 29/11, alterado pelo DL nº 377/2007, de 09 de Novembro. 63ª Na situação supra figurada, aplicar-se-iam, então, as regras do Processo Civil (Cfr. Ac. TCA Sul, de 15/02/2001; proc. nº 4015/00, disponível em www.dgsi.pt). 64ª No seu douto Acórdão de 01/10/2008, acima referido, o Supremo Tribunal Administrativo considerou que (reproduzimos com a devida vénia, sendo nossos o negrito e sublinhado): “I - A presunção de notificação efectuada através de carta registada, prevista no art. 254.º, n.º 2, do CPC, não é aplicável no âmbito do procedimento administrativo, nomeadamente nos casos em que seja utilizado aviso de recepção, em que a notificação deve considerar-se efectuada na data em que o aviso é assinado. II - Não se referindo no aviso de recepção a data em que a carta foi entregue, é de aceitar a afirmação do recorrente contencioso de que só foi notificado na data em que ocorreu a devolução do aviso pelos serviços postais.” 65ª Mais se lê no citado Acórdão que: “3 – A Autoridade Recorrida defende no presente recurso jurisdicional que, não tendo sido indicada a data em que foi assinado o aviso de recepção, deve aplicar-se a regra do art. 254.º, n.º 3, do CPC, que estabelece a presunção de recebimento de cartas registadas no terceiro dia posterior ao do registo, com transferência para o primeiro dia útil subsequente, caso o último dia não o seja. Na tese da Autoridade Recorrida, deve presumir-se que a carta foi recebida em 15-11-2002, por aplicação daquela regra. No entanto, como bem refere a Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta, aquela presunção foi estabelecida no CPC, pelo que é aplicável nos processos a que este Código é aplicável, directa ou subsidiariamente. Não é esse o caso dos processos administrativos, que são regulados em primeira linha pelo CPA, em que não há qualquer norma que determine a aplicação subsidiária do CPC.” (Negrito e sublinhado nossos). 66ª O mesmo Superior Tribunal já anteriormente, no seu douto Acórdão de 07/07/2005 (proc. nº 0553/05), disponível em www.dgsi.pt, havia considerado que: “I - Nos procedimentos administrativos a notificação postal constitui a regra geral (art.º70 do CPA). II - O DL 121/76, de 11.2, dispensou mas não proibiu que as notificações postais continuassem a ser feitas através de carta com aviso de recepção, podendo, embora, sê-lo por carta registada. III - A notificação por carta registada com aviso de recepção considera-se perfeita desde que dirigida ao domicílio do notificando, ainda que o aviso não tenha sido assinado por este, e considera-se feita no dia em que foi assinado o aviso de recepção.” (Negrito e sublinhado nossos). 68ª Por razões de certeza e segurança jurídicas é que a norma ínsita no nº 1 do art. 32º do DL nº 360/97, de 17 de Dezembro estatui que “Nas situações em que o exame médico tenha lugar em instalações indicadas pelo centro regional, o beneficiário é convocado para o efeito, pessoalmente ou mediante carta registada.” (É nosso o negrito). 69ª Ao ter-se, também, o Tribunal a quo estribado no comentário ao art. 70º do CPA feito por Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim (cfr. item I da Fundamentação de Direito) para a sustentação de que o beneficiário/Apelante deve considerar-se notificado, aquele douto Tribunal não interpretou correta e convenientemente o comentário daqueles Autores. 70ª No seu comentário ao art. 70º do CPA, os referidos Autores e Doutrinadores, referem que (in Código do Procedimento Administrativo comentado, 2ª Ed., 8ª reimpressão da edição de 1997, Almedina, págs. 360 e 361): “II. (…) Note-se, porém, que não funciona para as notificações procedimentais feitas por registo postal a regra aplicável em matéria de notificações judiciais (n.º 3 do art. 1º do Decreto-Lei nº 121/76), segundo a qual elas se consideram feitas no terceiro dia posterior à data do registo (ou no primeiro dia útil imediatamente subsequente). […] mas o registo postal simples fornece os elementos suficientes para se comprovar, em caso de dúvida, quando foi entregue a notificação postal.” (Negrito e sublinhado nossos). “III. A entrega pessoal da notificação ao seu destinatário, prevista na alínea b), deve obviamente ficar titulada em livro de protocolo (ou similar) ou documentada no próprio processo, com assinatura do receptor, na cópia da notificação.” (Sublinhado nosso). 71ª Ora, se como afirmam os referidos Mestres, “a entrega pessoal da notificação ao seu destinatário, prevista na alínea b), deve obviamente ficar titulada em livro de protocolo (ou similar) ou documentada no próprio processo, com assinatura do receptor, na cópia da notificação”, parece não poder, sem mais, presumir-se que o simples facto de o distribuidor postal haver declarado no sobrescrito devolvido “não atendeu”, constitui prova bastante e segura de que o suposto aviso da tentativa de entrega da carta foi efetivamente depositado na caixa do correio e/ou chegou ao conhecimento do destinatário. 72ª Atenta a similitude das situações (sem descurar o apelo ao princípio da igualdade ínsito no art. 13º da CRP), reproduz-se seguidamente o sumário do douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 02/05/2001 (proc. nº 4015/00) disponível em www.dgsi.pt: “1. A convocação para Junta Médica faz-se através de carta registada com aviso de recepção (v. n.º 2 do art.º 9.º do Dec-Reg. nº 41/90, de 29.11). 2. Equivale isto por dizer que àquelas notificações se aplicam as disposições relativas à citação pessoal, nas quais se incluem o art.º 238.º do CPCivil (v. art.º 256º do CPCivil). (Negrito nosso). 3. Não resultando provado que a recorrente tivesse assinado o aviso de recepção para comparência a uma determinada Junta Médica, nem que aquele tivesse sido assinado por terceiro (art.º238.ºdo CPCivil), forçoso será concluir que a recorrente não foi notificada para comparecer à dita Junta Médica, pelo que não pode a mesma ser considerada na situação de faltas injustificadas (art. 39.º do DL n.º 497/88,de30/12.” (É nosso o negrito e sublinhado). 73ª Pese embora seja ligeiramente distinta a situação nele versada, o recentíssimo douto Acórdão do Tribunal Constitucional, nº 636/2013, de 01 de Outubro de 2013, com força obrigatória geral (DR I, nº 203, de 21/10/2013) considerou, relativamente à certeza da notificação do administrado, que: “…nem se exige outra formalidade que permita saber, com um mínimo de segurança, designadamente, se a carta foi enviada e para que morada, qual a data da sua expedição, se a carta foi efetivamente entregue ou depositada no recetáculo postal do seu destinatário e em que data tal se verificou…” “Pelo exposto, estando-se perante uma situação em que se pressupõe o efetivo conhecimento de um ato administrativo, quando o envio de carta simples para notificação deste não representa um índice seguro da sua receção e dificilmente pode ser ilidido, forçoso é concluir que a interpretação normativa sindicada afeta a garantia de uma proteção jurisdicional eficaz do respetivo destinatário, em violação das exigências decorrentes do nº 3 do artigo 268.º da Constituição e do princípio constitucional da “proibição da indefesa”, ínsito no artigo 20.º também da Constituição. “ (Negrito e sublinhado nossos). 74ª Por via da prolação do douto Acórdão ora recorrido, o Tribunal a quo, atento o erro de julgamento consistente na incorreta análise e valoração da prova e na incorreta interpretação e aplicação do Direito, violou, inter alia, as normas contidas nos arts. 13º, 20º, 63º, nrs. 1 e 3, 266º, nrs. 1 e 2, e 268º, nrs. 3 e 4, todos da CRP; as normas legais contidas nos arts. 2º e 95º, nrs. 1 e 2 do CPTA; as normas constantes dos arts. 5º, nº 2, 6º-A, 8º, nº 1, al. a), 9º, 70º, nº 1, 87º, nº 1, 88º, nrs. 1 e 2, 103º, nº 2, als. a) e b), e 104º, todos do CPA; as normas dos nrs. 1 e 2, primeira parte, do art. 32º, e nrs. 1 e 2 do art. 66º, ambos do DL nº 360/97, de 17 de Dezembro; e ainda a norma da alínea b) do nº 2 do art. 24º do DL nº 28/2004, de 4 de Fevereiro, o que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos. 75ª Deve, pois, ser dado total provimento ao presente Recurso e, em consequência, ser revogada integralmente a Decisão constante do douto Acórdão recorrido, e substituída por douto Acórdão deste Venerando Tribunal Central Administrativo cuja Decisão julgue totalmente procedente a Ação. TERMOS EM QUE, E NOS MAIS DE DIREITO COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, VENERANDOS DESEMBARGADORES, DEVERÁ EM JULGAMENTO AMPLIADO DO RECURSO, NOS TERMOS DO Nº 1 DO ART. 148º DO CPTA, REVOGAR-SE INTEGRALMENTE A DECISÃO CONSTANTE DO DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE, DANDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, JULGUE A AÇÃO TOTALMENTE PROCEDENTE. DECIDINDO NESTA CONFORMIDADE, FARÃO VOSSAS EXCELÊNCIAS, VENERANDOS DESEMBARGADORES, A COSTUMADA JUSTIÇA! * Contra alegando concluiu o ISS:
1. O presente recurso vem interposto da decisão que negou procedência à ação proposta pelo aqui recorrente, por entender que, tendo os serviços do recorrido expedido, para a morada do recorrente, uma convocatória para que este comparecesse a exame médico-pericial no âmbito do sistema de verificação de incapacidades temporárias previsto no Decreto-Lei n.' 360/97, citado, ainda que a comunicação tenha sido devolvida, não se mostra afastada a presunção da notificação constante dos artigos 254.°, n.ºs 3 e 4 do CPC, pois impendia sobre o A. a prova de que não foi notificado e de que essa falta de notificação provinha de facto que lhe não era imputável, de acordo com o artigo 254.°, n.° 6 do mesmo diploma; 2. Alega o recorrente que não se deve considerar notificado para o exame em causa, conquanto, em suma, em parte alguma do CPA se faz referência à aplicação subsidiária do CPC, que respeita às notificações entre as "partes", ou seja, entre os sujeitos processuais e não entre a administração e os administrados, e que só se aplica aos processos judiciais pendentes e não aos procedimentos administrativos e, mesmo que assim fosse, a notificação por carta registada com aviso de receção considera-se perfeita desde que dirigida ao domicilio do notificando, e considera-se feita no dia em que foi assinado o aviso de receção, pelo que a devolução da carta havia de importar, por aplicação analógica do CPC, a expedição de uma segunda carta; 3. Pelo que requer seja determinada a revogação da decisão a quo, por "deficiente e insuficiente fundamentação no que tange à matéria de facto assente", e a sua substituição por outra que, dando provimento ao recurso, julgue a ação totalmente procedente. Sem que, salvo o devido respeito, que é muito, lhe assista razão; 4. Decorre das disposições conjugadas dos artigos 32.º, 66.º e 68.º do Decreto-Lei n.º 360/97, e do n.º 2 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 28/2004, ambos citados que, nas situações em que o exame médico tenha lugar em instalações indicadas pelo centro regional, o beneficiário é convocado para o efeito, pessoalmente ou mediante carta registada; se o interessado, devidamente convocado, não se apresentar ao exame clínico no dia, hora e local indicados nem justificar, no prazo dos 10 dias subsequentes, o motivo da não comparência, ou, justificando-o, não for atendível, é considerada falta injustificada, o que determina o arquivamento do processo pericial de verificação, com os efeitos previstos nos regimes jurídicos das correspondentes prestações, a saber, a cessação do direito ao subsídio de doença; 5. Os diplomas citados não contêm norma que disponha sobre as consequências da devolução das convocatórias para realização de exame médico, pelo que importa recorrer ao artigo 70.° do CPA e, igualmente por falta de previsão expressa, ao regime constante do CPC; 6. Como salienta a doutrina e jurisprudência, não há razão para distinguir, neste aspeto, o processo judicial e o procedimento administrativo, até por razões de certeza, ficando feita a prova no processo (ao qual é junto o respetivo talão de registo) de que a notificação foi enviada e em que data, podendo presumir-se (como em juízo) que os serviços postais entregaram, nos prazos normais, aos respetivos destinatários, a correspondência que lhes foi confiada (cfr. acórdãos do TCA Norte de 25.11.2013, proc. n.° 503/12.4 BEBRG, e de 21.10.2011, proc. nº 920/09.7BEAVR, e do STA, de 07.07.2005, proc. n° 0553/05, citados); 7. Tanto mais que constituem designadamente deveres dos beneficiários abrangidos pelo regime de proteção na doença, comparecer aos exames médicos para que forem convocados, e não se ausentar do seu domicílio nos períodos entre as 11 e as 15 e entre as 18 e as 21 horas, salvo em caso de tratamento ou de autorização médica expressa, bem como comunicar à instituição de segurança social a mudança de residência (artigo 28.° do Decreto-Lei n.° 28/2004); 8. Impondo-se a aplicação do artigo 254.° do CPC, atual artigo 249.°: "1 - Se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações são feitas por carta registado, dirigida para a sua residência ou sede ou para o domicílio escolhido para o efeito de as receber, presumindo-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja. 2 - A notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para a residência ou a sede da parte ou para o domicílio escolhido para o efeito de a receber; nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere a parte final do número anterior."; 9. Encontrando-se provado que a notificação enviada pelos serviços do recorrido foi remetida para a morada correta, deve ter-se por irrelevante, ao contrário do que pretende o recorrente, o lapso na indicação do código postal pois, como é sabido, trata-se de deficiência que os serviços postais corrigem oficiosamente e, ainda que assim não fosse, sempre a notificação teria sido devolvida com a inscrição de endereço insuficiente, o que se encontra demonstrado que não sucedeu; 10. Do facto de os serviços do recorrido terem enviado a referida convocatória com aviso de receção apenas se deve retirar que estes foram além do que a lei exige (envio por carta registada), mas, considerando, como se salientou, que o interessado, aqui recorrente, se encontrava incapacitado para o trabalho e, em consequência, obrigado nos termos da lei a não se ausentar do seu domicílio nos períodos entre as 11 e as 15 e entre as 18 e as 21 horas, salvo em caso de tratamento ou em caso de autorização médica expressa, e resultando dos autos que a convocatória enviada pelos serviços do recorrido foi remetida para o endereço postal correto e que do envelope devolvido pelos serviços postais constam as inscrições "não atendeu" e "avisado" (cfr. processo administrativo), nada obstava, como bem entendeu a douta decisão recorrida, à aplicação da cominação do artigo 254.º, citado, sendo por conseguinte irrelevante o regime previsto no CPC para a citação postal registada com aviso de receção. Em consequência e pelo exposto, deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida. * O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.* O Recorrido respondeu ao parecer do MP cf fls 524/5 do processo físico.* FACTOS
Consta na sentença: Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos, com relevância para a decisão da causa. Motivação: DIREITO Na tese do Autor/Recorrente, sufragada no parecer do Ministério Público, nem sequer ocorreu a dita falta de comparência ao exame médico marcado para 20-07-2009, simplesmente porque aquele não foi devidamente convocado para o efeito. Não que a convocatória não tivesse sido enviada, que foi, por carta registada com aviso de recepção, mas porque nunca chegou ao poder do destinatário e, nas circunstâncias, não poderia ser considerada notificação eficaz. Pondera-se na sentença: «Estatui o n.º 1 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 360/97, de 17.12 – que define, no âmbito da segurança social, o sistema de verificação de incapacidades -, sob a epígrafe “Convocatória para o exame médico” [de verificação da incapacidade temporária para o trabalho] que «Nas situações em que o exame médico tenha lugar em instalações indicadas pelo centro regional, o beneficiário é convocado para o efeito, pessoalmente ou mediante carta registada.» Não contendo o referido diploma norma relativa à devolução da notificação expedida e suas consequências, importa chamar à colação os normativos insertos no Código do Procedimento Administrativo [CPA]. Dispõe o n.º 1 do artigo 70.º do CPA que «As notificações podem ser feitas: Por via postal, desde que exista distribuição domiciliária na localidade de residência ou sede do notificando;». Sobre este preceito, referem MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM [In Código do Procedimento Administrativo, 2.ª Edição, 2010, pp. 360-361] que «II. O envio da notificação pelos correios é feito sob a forma registada, não havendo nenhuma razão para distinguir neste aspecto o processo judicial e o procedimento administrativo, considerando-se, portanto, que vale aqui, até por razões de certeza, a regra do art. 254.º do Código de Processo Civil: fica feita a prova no processo (ao qual é junto o respectivo talão de “registo”) de que a notificação foi enviada e em que data, podendo presumir-se (como em juízo) que os serviços postais entregam, nos prazos normais, aos respectivos destinatários, a correspondência que lhes é confiada.» O que quer dizer que, quer em processo administrativo, quer no âmbito do procedimento administrativo, valem, quanto às notificações, as regras estatuídas no Código de Processo Civil. Estabelece o artigo 255.º, n.º 1, do CPC, que «Se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações ser-lhe-ão feitas no local da sua residência ou sede ou no domicílio escolhido para o efeito de as receber, nos termos estabelecidos para as notificações aos mandatários.» Em anotação ao artigo citado, JOSÉ LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA e RUI PINTO [In Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º, p. 449] referem que ficou consagrado no n.º4 do preceito em apreço, o entendimento que «as partes e os seus mandatários têm o dever de fornecer ao tribunal o conhecimento da residência, local de trabalho ou sede do réu, quando o venham a ter, assim como o juiz tem o dever de se servir para o efeito do conhecimento privado que porventura tenha, ao abrigo do princípio geral da cooperação (art. 266).» Por seu turno, o artigo 254.º do CPC dispõe que «3. A notificação postal presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. 4. A notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para o escritório do mandatário ou para o domicílio por ele escolhido; nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere o número anterior. (…) 6. As presunções estabelecidas nos números anteriores só podem ser ilididas pelo notificado provando que a notificação não foi efectuada ou ocorreu em data posterior à presumida, por razões que lhe não são imputáveis.». Voltando ao caso em apreço, tendo sido expedida a notificação para a concreta morada do autor, presume-se a notificação, ainda que tenha sido devolvida, não se mostrando afastada a presunção da notificação, constante dos artigos 254.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ao presente litígio, conforme se justificou acima. Efectivamente, impendia sobre o autor a prova que não foi notificado e que essa falta de notificação provinha de facto que lhe não era imputável, cfr. n.º 6 do artigo 254.º do CPC. Ora, o autor apenas veio dizer que não recebeu a convocatória, sem alegar qualquer circunstância susceptível de afastar a referida presunção, i. é, que permita concluir que o autor não recebeu a convocatória nem a podia ter recebido [v.g. por ter sido indevidamente entregue noutra morada; ter sido extraviada; ou ter sido endereçada para morada incorrecta]. Por outro lado, também não apresenta justificação atendível, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 66.º daquele diploma, pelas razões já expostas. Na verdade, o autor limita-se a dizer que não recebeu a notificação. Assim, bem andou a entidade demandada ao considerar não justificada a falta do autor, pelo que, nesta parte, improcede o pedido do autor.» A jurisprudência tem, realmente, avançado para a aplicabilidade supletiva das normas do CPC, em casos análogos. Veja-se por exemplo o Acórdão deste TCAN, 1ª Secção, de 25-11-2013, Proc. 00503/12.4BEBRG, com o seguinte sumário: «1. O conteúdo do art.º 254º do Cód. Proc. Civil aplica-se, com as necessárias aplicações, a qualquer notificação que haja de fazer-se. 2. Sendo o envio da notificação pelos correios efectivado sob a forma registada, não há nenhuma razão para distinguir neste aspecto o processo judicial e o procedimento administrativo, considerando-se, portanto, que vale aqui, até por razões de certeza, a regra do art.º 254.º do Código de Processo Civil.» Para tanto são justificadamente invocadas razões de certeza e segurança jurídica. Mas, exactamente por força deste imperativo, existindo diferenciados regimes de notificação por via postal no CPC, por exemplo para a carta registada e a carta registada com aviso de recepção, quando existam situações carentes de regulamentação omissas no Decreto-Lei n.º 360/97, de 17.12 ou no CPA, o seu suprimento normativo deverá alcançar-se por aplicação do regime análogo do CPC específico para a modalidade postal concretamente em causa. Por outro lado, admitindo-se como lícita a opção da Administração pelo envio de carta registada com aviso de recepção, diferentemente do que era preconizado no n.º 1 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 360/97, de 17.12 (pessoalmente ou mediante carta registada), deverá coerentemente concluir-se que se auto vinculou a respeitar essa forma e o seu regime legal, com as inerentes consequências e corolários. Dito de outro modo, admitindo-se que a Administração poderia ter feito doutra maneira (carta registada), deve assumir as consequências do que fez (carta registada com aviso de recepção). Por outro lado, em nome da certeza do Direito, repete-se, deverá ser seguido um regime específico coerente, não sendo curial que se possa criar, ou ficcionar, um novo regime híbrido, composto por normas selecionadas aqui e ali conforme as conveniências. Que mais não seja, por ser de presumir que existe alguma racionalidade específica subjacente a cada regime, que o legislador pretendeu acautelar. Ora, a modalidade da carta com aviso de recepção tem uma filosofia própria, buscando ser uma (quase) notificação pessoal e não o mero depósito de um objecto postal ou aviso numa caixa de correio. Na hipótese de devolução da carta registada com aviso de recepção, sem que este se mostre assinado, estatui o CPC que deverá proceder-se à notificação (citação) mediante contacto pessoal (artigo 239º) ou enviar-se nova carta (na hipótese do artigo 237º-A/4). Tais soluções são divergentes das estatuídas para a hipótese de carta registada e por alguma razão não comportam norma semelhante à do artigo 254º/3/4 CPC. Portanto, a modalidade da carta registada com aviso de recepção não é apenas um “plus” formal em relação à modalidade da carta registada, mas sim uma modalidade diferente, com tramitação, formalidades e regime diverso. Em suma, a analogia relevante para regulação da situação no caso em apreço, nos termos do CPC, não poderia encontrar-se no artigo 254º/3/4 do CPC, que rege em matéria de notificação por carta registada, mas sim nas normas do mesmo diploma aplicáveis à carta registada com aviso de recepção, designadamente os artigos 236º, 237º-A e 238º. Para mais a carta foi imperfeitamente endereçada, com o código postal errado. É verdade que a morada, mesmo com o código postal deficiente, era a do Autor e que outras cartas igualmente endereçadas lhe chegaram às mãos. Mas forma-se uma zona de aleatoriedade não despicienda e que no caso era perfeitamente escusada por a deficiência do código postal ser manifesta e facilmente corrigível, bastando para tanto atentar no endereço que o Autor apresentava nas cartas que dirigia aos serviços, conforme documentos juntos aos autos. Ora, mesmo na via normativa seguida em 1ª instância só impenderia sobre o Autor o ónus de justificar a falta se tivesse existido notificação eficaz a convocá-lo. E só impendia sobre ele o ónus de ilidir a presunção da notificação se estivessem reunidas as condições constitutivas dessa presunção. E pelos motivos supra apontados é duvidoso que estivessem, pois como dispõe o artigo 254º/4 CPC «A notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para o escritório do mandatário ou para o domicílio por ele escolhido; nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere o número anterior» - sublinhado nosso. É que simetricamente ao pesadíssimo e quase inultrapassável fardo de ilisão da presunção colocado pelo artigo 254º/6 do CPC sobre os ombros do destinatário (prova de um facto negativo de terceiro) deverá ser exigível do lado do remetente idêntico grau de esforço e rigor no endereçamento da correspondência. Na prática, o que seria então expectável que fizessem serviços normalmente zelosos - e cautelosos - perante a verificada frustração da via postal alternativa escolhida? O mais sensato, adequado e conforme à lei seria repetirem a convocatória, “pessoalmente ou mediante carta registada” no estrito cumprimento do artigo 32º/1 do DL 360/97 de 17/12 especificamente aplicável à situação. Em suma, por falta da devida convocatória não pode censurar-se a ausência do Autor ao exame médico em causa, pelo que o impugnado despacho proferido em 05-08-2009 pelo Coordenador Técnico do SVI, que indeferiu o pedido de justificação de falta a CRIT, é anulável por incorrer no vício de erro nos pressupostos de facto, ao pressupor erradamente que existia a dita “falta”. Deste modo, a sentença não pode manter-se e a acção deve ser julgada procedente quanto ao pedido anulatório do despacho de 05-08-2009. No entanto, nada se pode dizer sobre a procedência ou improcedência do pedido subsequente, uma vez que os subsídios de doença dependem de razões clínicas que não estão estabelecidas e que, justamente, deveriam ter sido oportunamente verificadas e reavaliadas pelos peritos médicos. Por outro lado, a realização agora, vários anos transcorridos, do exame médico preterido, afigura-se destituída de sentido e utilidade. Assim, a única solução aceitável, nesse âmbito, será aguardar que o Autor requeira em execução de sentença ou em acção autónoma a reparação dos hipotéticos danos sofridos em virtude da actuação ilegal da Administração.
Porto, 10 de Fevereiro de 2017 |