Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00845/04.2BEBRG-B
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/26/2017
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:CAUSA LEGITIMA DE INEXECUÇÃO; PERDA DE OPORTUNIDADE/CHANCE; INDEMNIZAÇÃO
Sumário:
1 – A indemnização prevista pela verificação de causa legítima de inexecução – artigo 166.º do CPTA – visa, no caso, ressarcir um dano certo resultante da perda de oportunidade de concorrer a um concurso, entretanto anulado.
A indemnização a atribuir por perda de oportunidade visa predominantemente compensar a inexecução, atenta a necessária equidade, justiça e proporcionalidade, em conformidade com a factualidade dada como provada.
2 - Não podendo ser efetuada com exatidão a quantificação da perda, é legítimo fixar essa indemnização através de um juízo de equidade, em sintonia com o preceituado no n.º 3 do art. 566.º do CC, de modo a compensar a perda da situação jurídica cujo restabelecimento a execução da sentença lhe teria proporcionado, de modo a determinar a expressão pecuniária de tal prejuízo.
3 - A figura da perda de chance tem como pressupostos a existência de um determinado resultado não apresentando como certo.
Se o tribunal anulou o procedimento, tal significa que o interessado teria direito a que o concurso fosse retomado e que se produzisse novo ato apreciando os currículos dos concorrentes, avaliando-se o mérito de cada um dos candidatos, já sem o vício que determinou a anulação.
Perante a impossibilidade de ser retomado o procedimento, impunha-se ponderar o modo como o interessado deveria ser compensado, enquanto expressão pecuniária de tal prejuízo, sendo que é incontornável que as suas probabilidades vir a obter a almejada vaga, não deixam de ser incertas.
Não dispondo o Tribunal do grau de probabilidades que o interessado tinha de obter a pretendida vaga, não se mostrava possível arbitrar uma indemnização sem recurso à equidade nos termos do artigo 566º, n.º 3, do CC, não sendo possível admitir com plena certeza que o interessado viesse a obter a vaga a que se candidatou.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:MZMCN
Recorrido 1:ARSN, IP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução de Sentença
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório

MZMCN, devidamente identificado nos autos, no âmbito da presente Execução de julgado, apresentada contra a ARSN IP, inconformado com a Sentença proferida em 30 de novembro de 2016, na qual foi determinado que lhe fosse paga uma indemnização de 7.500€, resultante da originária anulação da deliberação do júri do concurso aberto pelo Hospital de S. M..., de provimento na categoria de assistente de neurologia, a qual havia fixado a grelha de critérios de classificação, veio interpor recurso jurisdicional da referida Sentença, proferido em primeira instância no TAF de Braga.

Formula o aqui Recorrente/Manuel Costa e Nora nas suas alegações de recurso, apresentadas em 19 de janeiro de 2017, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 367v a 370 Procº físico):

“A) A presente execução de julgado tem em vista a execução de uma decisão judicial que consistiu no acórdão do Tribunal Central Administrativo do Porto proferido em 13 de Março de 2008 e notificado ao ora recorrente em 17 de Março seguinte, em que foi decidida “a anulação da deliberação do júri que fixou os critérios de classificação e, porque dependentes daquela, a deliberação classificativa e o ato homologatório da lista classificativa”.
B) Na sequência de ter sido instaurada a presente execução de julgado e depois de vicissitudes várias ao longo de vários anos – a presente execução de julgado foi instaurada em 18/10/2008 (facto E) considerado provado) – foi proferida em 11 de Março de 2013, a sentença de fls. 116 e ss. a julgar parcialmente procedente a presente execução, instaurada pelo Exequente MZMCN, tendo condenado a Entidade Executada Administração Regional de Saúde do Norte – I.P. (Ex. Hospital de S. M... – Braga) a praticar, em 20 dias, os atos e operações nele definidos, o que não aconteceu.
C) Foi proferida em 12 de Abril de 2016, decisão a considerar existir causa legítima de inexecução do julgado referido, decisão que se encontra a fls. 1046 e ss. dos autos – Cfr. al. P) dos factos provados, mas não sem que antes tivesse havido uma tentativa de arquivar o processo, contra a vontade do exequente e sem fundamento legal, como se reconheceu depois
D) Por fim, é relevante considerar que “Na ação administrativa especial que correu termos sob o n.º 845/04.2 BEBRG, julgou-se provado o seguinte facto: foram aceites três candidatos ao Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar – cf. acórdão, de 13/03/2008, do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido em sede de recurso na ação administrativa especial n.º 845/04.2 BEBRG.” – Cfr. facto Q), considerado provado.
E) Resulta do que se deixa enunciado que, a presente execução de julgado já pende neste Tribunal há mais de 8 anos, sendo que o julgado dado à execução transitou em 24/4/2008 (facto provado D) e o Hospital S. M... de Braga só transitou para a administração privada em 9/2/2009 (facto provado H), pelo que o inicial executado teve mais que tempo para executar a decisão proferida e não o fez frustrando as expectativas do ora exequente e, mais que isso, acabou por frustrar definitivamente a possibilidade de a decisão referida ser executada.
F) Convém referir que o acórdão anulatório do ato administrativo impugnado, apenas anulou os atos de designação do júri e de fixação da grelha por este realizada e, na fixação dos atos a praticar pela entidade recorrida o tribunal definiu, com trânsito em julgado, que devia: vi. ¯ assegurar o cumprimento, por este, do dever de fixar os critérios a utilizar na avaliação dos fatores de avaliação em momento prévio ao conhecimento das candidaturas e da apreciação dos curricula dos opositores ao concurso.
G) Manteve as candidaturas já apresentadas, o que até foi objeto de especificação, no âmbito dos factos provados e essas candidaturas são 3 e constam dos respetivos curricula, o percurso profissional dos candidatos que deveria ser apreciado nos termos da Portaria 43/98 de 26/1/1998.
H) Comete a sentença recorrida o grave erro de afirmar que “não é possível afirmar com exatidão o ganho que o Exequente obteria se a Entidade Demandada desse continuidade ao Concurso, agora, num contexto de legalidade. Não é possível adiantar quais as reais hipóteses do Exequente no Concurso. Sabe-se – tão só – que tinha condições para concorrer num universo de três candidatos, não se sabe se iria obter a melhor pontuação, fator necessário para alcançar o resultado pretendido”. I) O Tribunal pode proceder a essa avaliação, porque se trata de um concurso curricular, em que não ocorre qualquer entrevista, pelo que comparando os curricula dos concorrentes pode o tribunal fazer um juízo de prognose sobre quem seria o candidato vencedor e considerando todos os elementos que a citada Portaria 43/98 de 26/1/1998 manda ter em conta nos concursos curriculares, seria possível ao tribunal formular um juízo de probabilidade sobre as hipóteses de o exequente ser o vencedor do «Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar» aberto pelo Hospital de S. M... de Braga.

J) E feito esse cotejo através da análise do quadro acima com o (realce a amarelo) dos valores que importa avaliar comparativamente, constata-se que os valores referentes ao Internato não podem ser contabilizados, pois já são considerados nas alíneas b) e c) sob pena de existir uma dupla valorização e apenas na alínea c) e num terço da alínea b), ambas da Portaria 43/98, não é o exequente superior aos outros candidatos e está em igualdade a um deles em parte da alínea e) e na alínea f) está em igualdade relativamente aos outros candidatos.
K) Estamos a falar nestas 3 exceções, em 6 valores num total de 20 valores, pois nos outros 14 valores o exequente sempre teve a supremacia e nalguns casos com proporcionalidade elevada.
L) Ao contrário do que refere a sentença recorrida A PROBABILIDADE DE VENCER ESTE CONCURSO POR PARTE DO EXEQUENTE ERA MUITO ELEVADA, como se demonstra com o quadro comparativo, pois o exequente estava no topo da Carreira Médica Hospitalar de Neurologia (Chefe de Serviço), ou seja tinha mais 2 graus acima dos outros concorrentes que estavam na graduação mais baixa (Assistentes) em Hospitais Distritais.
M) Todos estes dados podem ser comprovados no curriculum do ora exequente e dos restantes concorrentes que foram juntos aos autos com a ação principal, pelo que a probabilidade de ganhar o concurso e ser provido no lugar a concurso era superior a 80%.
N) Acresce que, face à frustração da possibilidade de o exequente ser colocado em Braga, para além dos danos materiais avultados, tendo, em 16 de Junho de 2016, o ora exequente apresentou ao tribunal a lista dos prejuízos sofridos com o facto de a Administração não ter dado execução em tempo ao acórdão anulatório, cujo valor total ascende a € 103.892,8, tendo sofrido como é natural avultados danos não patrimoniais.
O) Conforme é doutrina pacífica, “numa ação executiva de julgado anulatório em que ocorra situação de causa legítima de inexecução apenas pode ser peticionada e arbitrada indemnização dos danos “pelo facto da inexecução” e não dos danos advenientes do ato administrativo ilegal, sendo que a reparação destes deverá ser realizada na ação administrativa comum enquanto forma processual idónea e adequada para tal efeito”, conforme se escreve no Ac. do STA de 7/5/2015, proferido no processo 047307A, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.
P) Constatada de forma objetiva que a causa legítima de execução frustrou as expectativas do ora recorrente, que este tinha forte probabilidade de vencer o concurso, como se demonstrou, que, dessa frustração resultaram avultados danos patrimoniais sob a forma de despesas que não teria feito, que tal acarretou para o exequente um sacrifício maior para o exercício da sua atividade profissional, a indemnização a que se refere o artº. 178º. do CPTA.
Q) A estas circunstâncias, acresce o tempo decorrido desde o trânsito em julgado, como refere o do STA de 29-11-2005, atrás citado, pois a presente execução de julgado já pende neste Tribunal há mais de 8 anos, sendo que o julgado dado à execução transitou em 24/4/2008 (facto provado D) e o Hospital S. M... de Braga só transitou para a administração privada em 9/2/2009 (facto provado H), pelo que podia perfeitamente se a Administração tivesse cumprido os seus deveres legais ter-se realizado e completado o concurso.
R) Deste modo, tudo visto e ponderado, pode o tribunal basear-se nos danos reclamados ou, caso entenda não o dever fazer, atento o circunstancialismo do caso presente, o tribunal não pode fixar a indemnização senão através da formulação de um juízo equitativo (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil) e considerando todos aqueles elementos conjugadamente, e voltando a sublinhar que não se está, in casu, a proceder a qualquer decisão sobre lucros cessantes em razão do ato anulado, nem à determinação de danos emergentes do mesmo ato, mas, simplesmente, a uma fixação, através de um juízo que se entende equitativo, da indemnização devida pela não execução, nos termos do artigo 178.º, n.º 1, do CPTA, considera-se equilibrado computar aquela indemnização no valor de €90.000
S) “(…) O que interessa, pois, é determinar como é que essa perda deve ser compensada. É apenas essa perda que está em causa, essa perda é que é o “dano real”, e está demonstrada. O que falta determinar é o “dano de cálculo”, isto é, “a expressão pecuniária de tal prejuízo” (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, “Direito das Obrigações”, 9ª edição, pág. 545).
T) Só assim se indemnizará adequadamente a destruição da posição jurídica de vantagem do ora exequente, pois que, para além de razões de justiça comutativa impondo que a responsabilidade por facto ilícitos na inexecução de decisão judiciais cubra a totalidade dos danos há ainda razões de prevenção geral (proteção dos bens jurídicos em causa através do fortalecimento da expectativa de atuações zelosas), que podem ter um papel regulador importante no exercício da atividade administrativa.
U) A sentença ora recorrida, apesar da manifesta ilicitude da atividade da Administração, ainda condenou o ora exequente em custas, decisão ilegal, porque, nos termos do artº. 527º., nº. 1 do Cod. Proc. Civil, “a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa …”
V) É manifesto que quem deu causa à presente execução de julgado, foi a Administração, porque não cumpriu espontaneamente a decisão anulatória e porque criou a situação de facto que levou à existência de causa legítima de inexecução.
X) As custas terão de ser suportadas integralmente pela executada, nos termos do artº. 527º., nº. 1, 1ª. parte do Cod. Proc. Civil, devendo com este fundamento ser revogada a sentença recorrida também no que respeita à condenação em custas.
Y) O certo, porém, é que a sentença ora recorrida não faz uma correta aplicação do disposto no artº. 168º. do CPTA, atribuindo uma indemnização miserabilista e decide contra legem, em matéria de condenação por custas, violando o disposto no artº. 527º., nº. 1, 1ª. parte do Cod. Proc. Civil, pelo que deve ser revogada e substituída por outra decisão que, dando provimento ao presente recurso, decida nos termos das conclusões que se deixam formuladas como é de lei e de JUSTIÇA!”

A aqui Recorrida/ARSN, IP veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 1 de março de 2017, tendo concluído (Cfr. fls. 387, 387v e 388 Procº físico):

“1ª A operatividade de uma causa legítima de inexecução permite a indemnização do exequente mas sempre no limite das forças do ato objeto do processo de onde emerge a execução e por relação ao qual ocorre a causa legítima;

2ª E se estamos, como parece seguro concluir, perante um direito de natureza procedimental, um procedimento de recrutamento e seleção de candidatos a um posto de trabalho, a um lugar de emprego público, não há base legal para «indemnizar» além do dano em abstrato da própria frustração do procedimento concursal;

3ª Nem base legal para indemnizar fora do círculo de danos abrangidos pelo pressuposto da causalidade adequada, que termina com o dano da frustração do procedimento, e não atinge a relação de emprego subsequente;

4ª Na operatividade de uma causa legítima de inexecução e da indemnização a arbitrar não há lugar para considerações em torno da culpa da Administração nem releva o fator tempo associado à demora dos processos judiciais e ou da prática dos atos que conduzam à constatação da causa;

5ª O juízo de equidade seguido pela sentença recorrida contém-se no quadro das conclusões precedentes e pode merecer juízos subjetivos de crítica mas não á atacável no essencial da linha que adota, que corresponde à da jurisprudência dominante sobre a matéria.

6ª São assim de recusar, com o devido respeito, as asserções do recorrente segundo as quais i) quanto ao fator tempo, que o mesmo deve relevar em abstrato e ainda em imputação contra a Executada, ii) que a douta sentença recorrida «comete o erro de afirmar» não ser possível «adiantar quais as reais hipóteses do Exequente no Concurso» e que o Tribunal ad quem pode e deve realizar as operações tendentes a estabelecer o «direito» procedimental do Exequente à «nomeação» e iii) a douta sentença recorrida não se moveu num quadro de juízo de equidade.

7ª É assim de manter a douta decisão recorrida!

Termos em que, e nos melhores de direito do douto suprimento, Deve proferir-se acórdão que mantenha incólume a douta decisão recorrida. Assim se fazendo justiça!”

O Recurso Jurisdicional foi admitido por despacho de 3 de março de 2017 (Cfr. fls. 393 Procº físico).

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 17 de março de 2017 (Cfr. fls. 400 Procº físico), nada veio dizer, requerer ou Promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
As questões aqui em apreciação cingem-se às custas face às quais a Exequente foi condenada, mais importando verificar a justiça do quantitativo indemnizatório fixado, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto

O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade:
A) Por sentença prolatada no dia 04.01.2007 nos autos que aí correram termos sob o n.º 845/04.2BEBRG, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou parcialmente procedente a ação administrativa especial interposta por MZMCN, ora exequente, e, consequentemente, anulou a deliberação do júri do concurso aberto pelo Conselho de Administração do Hospital de São M..., por aviso n.°1302912002, publicado no Diário da República, II Série de 09.12.2002 («Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar»), que fixou a grelha de critérios de classificação e, a respetiva deliberação classificativa e o ato homologatório da lista de classificação final.
B) Da sentença referida em A) recorreu a entidade demandada Hospital de São M..., tendo os autos subido em conjunto com os recursos da mesma demandada e do ora exequente do despacho saneador proferido, a montante, nos mesmos.
C) No dia 13.03.2008, o Tribunal Central Administrativo proferiu acórdão nos autos referidos em A), onde se deixou consignado, além do mais, o seguinte. «[...] Finalmente, apreciemos o recurso interposto pelo HSMBRAGA DA DECISÃO FINAL - o mérito, do recurso. I O Tribunal a quo; anulou a deliberação do júri do concurso em questão, que fixou a grelha dos critérios de classificação e; consequentemente; a deliberação classificativa e o ato homologatório da lista classificativa, por ter entendido que na fixação daquela o júri violou a princípio de transparência e imparcialidade, previstos no art.6° do CPA e; mais concretamente: no nº 29.2 da Portaria nº43/98, de 26.01. I Contra o decidido insurge-se o recorrente alegando que era impossível ao júri reunir e aprovar a grelha classificativa antes de ser possível aos candidatos apresentarem a sua candidatura; sendo certo que reuniu e deliberou esses critérios antes de terminar o prazo para apresentar a candidatura, nos termos do § 11° da Portaria n.º 43/98. I Está em causa o “Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospital, regulado pela Portaria n.º 43/98, de 26.01. I Nos termos do ponto 11, al. b) a referida Portaria "Compete ao júri: definir previamente ao termo do prazo para a apresentação das candidaturas, os critérios que vai utilizar na avaliação dos fatores mencionados no n.º 28.” E, estipula o n.º 29.2 da mesma Portaria que "Cabe ao júri definir em ata, previamente ao termo do prazo para a apresentação das candidaturas e do conhecimento dos currículos dos candidatos, os critérios que irá obedecer a valorização dos fatores enunciadas nos números precedentes." I Nestes normativos está implícito o princípio da transparência concursal, que constitui uma garantia preventiva da imparcialidade, impõe que a administração atue de forma a dar uma imagem de objetividade, isenção e equidistância dos interesses em presença: de molde a projetar para o exterior um sentimento de confiança, tudo de molde a que nenhuma duvida possa subsistir relativamente à sua atuação (Cfr. Esteves de Oliveira e outros in. Código do Procedimento Administrativo em anotação ao art. 6º). I O Tribunal a quo anulou deliberação que fixou a grelha dos critérios de classificação por ter entendido ter sido violado o mencionado princípio, uma vez que essa grelha só foi elaborada pelo júri "aquando da própria classificação (portanto, num momento em que os candidatos eram já conhecidos) se desdobraram os critérios e valorações antes definidos". I Os normativos supra transcritos impõem que o júri, previamente ao termo do prazo para a apresentação das candidaturas e do conhecimento dos currículos dos candidatos, defina a grelha de classificação. I No caso, aparentemente, a grelha de classificação foi definida atempadamente, isto é, antes do termo do prazo de apresentação das candidaturas e, em princípio antes de o júri conhecer o currículo dos candidatos, uma vez que, como diz o recorrente, o prazo terminava em 8 de janeiro de 2003 e o júri reunir para fixar os critérios a utilizar na avaliação, elaborando a grelha classificativa em 7.01.2003 - cfr. ata nº 1 I Porém, como resulta da matéria de facto dada como provada (ponto 4 da matéria de facto) essa deliberação do júri nunca foi notificada aos candidatos. I E, no momento de classificação dos candidatos, à grelha classificativa definida naquela reunião de 7.01.2003, o júri desdobra essa grelha, atribuindo determinada valoração a cada um dos sub itens. (Cfr. doc. 7 a fls.47 a 57). I Pelo que, como se diz na decisão recorrida, a grelha de classificação não foi atempadamente fixada nem dada a conhecer aos candidatas, ofendendo o principio da imparcialidade/transparência. I A Constituição, no art. 266º, n.º 2 subordina toda a atividade administrativa à Constituição e à lei, com respeito - além de outros - pelo princípio de imparcialidade. O Código de Procedimento Administrativo, no art. 6º, na esteira do mencionado normativo constitucional, também impõe à Administração Pública o dever de tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entram em relação. I A dimensão da imparcialidade está ligada a "uma postura da administração”, com uma natureza instrumental e de garantia da “objetividade final” que não é apenas aplicável aos concursos da função pública mas a toda a atividade administrativa em geral. I Estando, no caso dos autos, um procedimento de seleção de candidatos, como tem sublinhado a jurisprudência do STA, o principio de imparcialidade, impõe nestes casos, que o critério de avaliação, não possam ser criados depois de conhecidos os "factos" a que se vão aplicar. Está em causa afastar o perigo de parcialidade: “o simples risco de lesão e o perigo de parcialidade, constituem fundamento bastante para a anulação, mesmo que se desconheça em concreto a efetiva violação dos interesses de algum concorrente." (cfr. Ac. STA (Pleno), de 23.05.2006, rec. 1328-03-20). I Assim, mostra-se violado o principio da imparcialidade (através da degradação da transparência) pelo facto de a júri no próprio ato de classificação dos candidatos definir uma sub grelha classificativa. I Nestes termos, acordam em: I — Não tornar conhecimento do recurso jurisdicional interposto pelo autor/recorrido; I — Negar provimento a ambos os recursos interpostos pelo Réu/recorrente Hospital; I — Custas pelo Hospital e autor, fixando-se a taxa de justiça em 10 UCs e no mínimo., respetivamente, e a Procuradoria em 50%.[…]».
D) O acórdão referido em C) transitou em julgado a 24.04.2008.
E) O ora exequente intentou a presente execução, por correspondência eletrónica, no dia 18.10.2008.
F) No dia 06.11.2008, o Voga] Executivo do Conselho de Administração do Hospital de São M... expediu instrumento escrito, sob a designação de ofício n.º 07720, com a referência n.º 159/2008-CA; endereçado ao ora exequente, subordinado ao assunto «Processo n.º 845/04.2BEBRG — Recorrente MZMCN» e com o seguinte teor: «Informo V. Excia. que o Conselho de Administração deste Hospital irá nomear o novo júri em substituição do que foi objeto de sentença no Tribunal Central Administrativo Norte referente ao processo em epigrafe. Mais informo que está agendada para a próxima reunião do CA a nomeação do referido júri.».
G) Na dia 11.11.2008, o Conselho de Administração da entidade executada adotou deliberação, com o assunto «Júri do concurso institucional interno geral para provimento na categoria de assistente de Neurologia da carreira médica hospitalar, aberto pelo aviso n.º 13029/2c002, publicado no Diário da República n.º 284; II série, de 09/12/2002», e com o seguinte teor: «Em cumprimento do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, Processo oro 845/04.2BEBRG, referente ao concurso em epigrafe, o Conselho de Administração deste Hospital nomeou o respetivo júri, cuja composição a seguir se indica; I Presidente: Dr. MDPA, chefe de serviço de Neurologia da Unidade Local de Saúde de Matosinhos; EPE; I Vogais efetivos: Dr. JMBPS, assistente graduado de Neurologia da Unidade Local de Saúde de Matosinhos. EPE; I Dra. EMBGB, chefe de serviço de Neurologia do Centro Hospitalar do Alto Minho; EPE; I Vogais suplentes: Prof. Dr, JMLL, chefe de serviço de Neurologia do Hospital Geral de Santo António, EPE; I Dr. MABFM; chefe de serviço de Neurologia da Unidade Local de Saúde da Guardai EPE.»
H) No âmbito do Concurso n.º 3/2004, aberto para a Concessão da Hospital de Braga em, regime de parceria público-privada, no dia 09.02.2009 foram outorgados pelo Hospital de São M..., no ato representada pelo presidente do Conselho de Administração, LHSMM; e pela EB... ­Sociedade Gestora do Estabelecimento, SA, os seguintes instrumentos escritos:
a. Contrato de Gestão relativo á conceção, ao projeto, à construção, ao financiamento, á manutenção e à exploração do Hospital de São M… em regime de Parceria Público-privada;
b. Contrato de Transmissão do Estabelecimento Hospitalar afeto ao Hospital de São M....
I) Nos termos do contrato referido em H) b., ficou estipulado, alem do mais; o seguinte: «CLÁUSULA 4.ª I 1. Os contratos de trabalho dos trabalhadores em funções no Hospital de S. M... transmitem-se para o SEGUNDO CONTRAENTE, nos termos da lei e do Contrato de Gestão. I 2. São da responsabilidade do PRIMEIRO CONTRAENTE todas as dividas laborais, referentes a remunerações,
L) Por sentença de fls. 116 e ss. foi proferida sentença a julgar parcialmente procedente a presente execução, instaurada pelo Exequente MZMCN, tendo condenado a Entidade Executada Administração Regional de Saúde do Norte – I.P. (Ex. Hospital de S. M... – Braga) a praticar, em 20 dias, os seguintes atos e operações:
“i. “revogar a deliberação de abertura de concurso aberto pelo aviso n.º1302912002, publicado no Diário da República, II Série de 09.12.2002 («Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar»), na parte relativa ao Júri designado;
ii. “anular a deliberação classificativa do Júri do concurso aí nomeado;
iii. “anular o ato homologatório da lista classificativa;
iv. “designar novo Júri;
v. “promover a publicação da deliberação que designou o novo Júri”;
vi. “assegurar o cumprimento, por este, do dever de fixar os critérios a utilizar na avaliação dos fatores de avaliação em momento prévio ao conhecimento das candidaturas e da apreciação dos curricula dos opositores ao concurso.
E, bem assim:
vii. “os membros do Conselho Diretivo da entidade executada ARSN, IP — lic. LACN, lic. PMCO, lic. RAMPC e mestre JCJP —, ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no montante de € 50,00 por cada dia de atraso que, para além do limite estabelecido a montante, se possa verificar na execução da presente sentença;
viii. “o exequente e a entidade executada em custas, na proporção do seu decaimento, que desde já se fixa em 1/10 e 9/10, respetivamente.
M) Na sequência de um pedido de esclarecimento, este Tribunal apreciou e decidiu conforme segue:
“(…)
O pedido de aclaração de sentença ou acórdão, previsto nos artigos 669.º, n.º 1 alínea a), 716.º, n.º 1 e 732.º, todos do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, visa o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que a decisão aclaranda contenha. A decisão é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes.
Na fundamentação de direito da sentença aclaranda deixou-se consignado, além do mais, o seguinte (cf. pp. 8 e 9 de 12 que compõem a decisão, a fls. 123 e 124 dos autos em suporte físico):
[…]
Compulsadas as decisões das instâncias nos autos que correram termos sob o n.º 845/04.2BEBRG, constata-se, com mediana clareza, que a situação ora em apreço reconduz-se a esta última hipótese aludida (renovação de ato). Com efeito, por força da decisão exequenda, não sé foi anulada a deliberação do júri do concurso aberto pelo Conselho de Administração do Hospital de São M..., por aviso n.º 1302912002, publicado no Diário da República, II Série de 09.12.2002 («Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar»), que Mau a grelha de critérios de classificação, como foi igualmente anulada a respetiva deliberação classificativa e ato homologatória da lista de classificação final — cf. pontos A) e C) dos factos provados. Mas não foi revogado o concurso. Impunha-se, por isso mesmo, a prática de atos tendentes à designação de um novo Júri que fixasse novos critérios de avaliação em momento necessariamente anterior à avaliação das candidaturas, pois que só desse modo seria observado o desiderato legal (e imposto pela decisão exequenda) de assegurar a imparcialidade no recrutamento. E, para tanto, impunha-se, desde logo, revogar ao aviso de abertura, na parte que designava o Júri, porquanto só depois de efetuada essa revogação, poderia legitimamente ser designado novo Júri.
[…]
Procedem, pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, os pedidos constantes das alíneas (i) e (ii) do requerimento inicial do exequente. impõe-se a condenação da ora entidade executada ARSN, IP. a. no prazo de 20 dias: (i) revogar a deliberação de abertura de concurso aberto pelo aviso n.º 1302912002, publicado no Diário da República. II Série de 09.12.2002 («Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar»), na parte relativa ao Júri designado; (ii) anular a deliberação classificativa do Júri que fora nomeado; (iii) anular o ato homologatório da lista classificativa; (iv) designar novo Júri: (v) promover a publicação da deliberação que designou o novo júri; e (vi) assegurar o cumprimento, por este, do disposto no artigo 11.º. alínea b) da Portaria n.º 43/98. de 26.01 (fixação das critérios a utilizar na avaliação das fatores de avaliação em momento prévio ao conhecimento das candidaturas). (realçados deste tribunal).
No preciso contexto procedimental que constitui a relação material controvertida subjacente aos presentes autos, é apodíctico que, em bom rigor jurídico, a anulação de um aviso de abertura precede lógica, cronológica e ontologicamente a nomeação de um novo júri de procedimento concursal Daí o teor do excerto da sentença aclaranda, parcialmente transcrito supra. Entendimento esse que; então como agora, mantém toda a sua pertinência. De facto, reitera-se que, tendo a decisão exequenda anulado a deliberação do júri que fixou os critérios de decisão, impunha-se reconstituir um ambiente procedimental informado pelo principio da transparência, o qual não é compaginável com uma nomeação de júri sem prévia abertura de concurso.
De resto, não se lobriga como se propõe a mesma executada a, cumprindo o disposto em i. (revogar a deliberação de abertura do concurso em apreço), aproveitar uma nomeação de júri que fora efetuada por deliberação prévia à revogação da predita deliberação de abertura de concurso.
Tudo visto e sopesado, respondendo á aclaração requerida, mantem-se o sentido da condenação proferida a fls. 116-127 dos autos em suporte físico, em termos tais que implicam, para a entidade executada, as obrigações de: revogar a deliberação de abertura do concurso, na parte relativa ao júri designado; anular o ato homologatório da lista classificativa; publicar a deliberação que designou o novo júri; e cumprimento, por este, do disposto no artigo 11.º, alínea b) da Portaria n.º 43/98, de 26.01 (fixação dos critérios a utilizar na avaliação dos fatores de avaliação em momento prévio ao conhecimento das candidaturas).
O presente despacho, com a aclaração ora proferida, considera-se como complemento e parte integrante da decisão aclarada — artigo 670.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

*
(…)” – cf. despacho de fls. 139 e ss. dos autos.
N) A sentença proferida pelo Senhor Juiz Relator, com o esclarecimento prestado pelo aludido despacho de fls. 139 dos autos, foi mantida por acórdão – de fls. 195 e ss. dos autos – proferido em sede de reclamação prevista no artigo 27.º, n.º 2, do CPTA.
O) E, por sua vez, este acórdão, proferido em sede de reclamação prevista no artigo 27.º, n.º 2, do CPTA, foi confirmado pelo Tribunal Central Administrativo Norte, em sede de recurso jurisdicional – cf. de fls. 255 e ss. dos autos.
P) Foi proferida decisão a considerar existir causa legítima de inexecução do julgado acima referido, decisão da qual se extrai o seguinte:
“(…) Dando-se continuidade ao processo de execução do julgado e entrando-se já nas considerações necessárias com vista à apreciação da causa legítima de inexecução, importa relembrar que a força do julgado teve um efeito constitutivo de anulação.
Com efeito, e em bom rigor, foi a decisão anulatória que fez desaparecer a deliberação de abertura do concurso aberto pelo aviso n.º 130292002, publicado no Diário da república, II Série de 09.12.2002, na parte relativa ao Júri designado. Bem como foi a decisão anulatória que fez desaparecer a deliberação classificativa do Júri do concurso nomeado, bem como o ato de homologação da lista classificativa constante do despacho de 08 de Julho de 2008, do então Diretor do Hospital de S. M..., que foi publicitada pelo aviso n.º 8516/2003, no DR, II Série, n.º 182, de 8 de agosto.
Com vista a reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o ato ilegal ou se o ato tivesse sido praticado sem a ilegalidade, a Administração designou Júri para o concurso, promoveu a publicitação da deliberação de 12/11/2015, determinou a notificação do Júri ora designado para fixar critérios a utilizar na avaliação dos fatores de avaliação em momento prévio ao conhecimento das candidaturas e da apreciação dos curricula dos opositores ao concurso.
Sucede, porém, que recaía sobre Administração o dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado por referência – claro está – à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado.
Contudo, já não é possível reconstituir a situação de facto existente, atenta (i) a extinção do antigo Hospital de S. M..., (ii) a atribuição da atividade hospitalar à EB... – Sociedade Gestora do estabelecimento, S.A., e (iii) a fusão do antigo Hospital de S. M... com a ARS Norte, I.P., nos termos da Portaria n.º 40/2012, de 10 de Fevereiro.
Por essa razão, a Administração tentou reintegrar a situação – que se reportava a um ato ilegal praticado no âmbito de um “Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar - através de um lugar aditado no mapa de pessoal de ARS Norte, I.P., a extinguir quando vagar, na categoria de assistente de neurologia da carreira especial médica hospitalar, no Agrupamento de Centros de Saúde de Entre Douro e Vouga I – Feira/Arouca, para o exercício de funções no Serviço de Urgência Básica de Arouca.
O Exequente não concorda com esta solução, sendo certo que pelas razões objetiva s acima referidas, forçoso será concluir, indo ao encontro da posição das partes vertida nos instrumentos processuais, pela existência de causa legítima de inexecução do julgado que se pretende executar nos presentes autos. (…)» - cf. de fls. 312 e ss. dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
Q) Na ação administrativa espacial que correu termos sob o n.º 845/04.2 BEBRG julgou-se provado o seguinte facto: foram aceites três candidatos ao Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar – cf. acórdão, de 13/03/2008, do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido em sede de recurso na ação administrativa especial n.º 845/04.2 BEBRG.”

IV – Do Direito

Importa pois verificar o suscitado.
Por forma a enquadrar aquilo que aqui se mostra recorrido, infra se transcreverá o essencial do “Direito” expendido na decisão recorrida:
“Nos presentes autos, importa fixar o valor da indemnização pela inexecução do julgado.
(…)
A indemnização prevista pela inexecução do julgado anulatório – artigo 166.º do CPTA - visa ressarcir um dano certo que é a perda de oportunidade de concorrer ao Concurso institucional interno geral de provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar, com designação de novo Júri e com fixação dos critérios a utilizar na avaliação dos fatores de avaliação em momento prévio ao conhecimento das candidaturas e da apreciação dos curricula dos opositores ao concurso.
Esta oportunidade apresentou-se ao Executado como real face à decisão judicial, transitada em julgado, que obrigava a Entidade Exequente a praticar atos e operações de reconstituição desse mesmo Concurso respeitando o bloco de legalidade aplicável e o caso julgado. Chance de poder voltar a concorrer a esse mesmo Concurso num contexto de legalidade restabelecida quer por força efeitos constitutivos, conformativos e ultraconstitutivos do julgado anulatório, quer pela reconstituição de harmonia com procedimentos legalmente estabelecidos, constitui uma situação vantajosa, todavia, foi irremediavelmente afastada na pendência da execução pela
(i) extinção do antigo Hospital de S. M...,
(ii) atribuição da atividade hospitalar à EB... – Sociedade Gestora do estabelecimento, S.A., e
(iii) fusão do antigo Hospital de S. M... com a ARS Norte, I.P., nos termos da Portaria n.º 40/2012, de 10 de Fevereiro.
Assim, declarada que está a causa legítima de inexecução, os danos a indemnizar resultam diretamente e unicamente da inexecução do julgado – cf. artigo 178.º do CPTA.
Ou seja, a indemnização não resulta de um qualquer ato ilícito e culposo, isto é, de uma responsabilidade subjetiva da Administração, mas antes de um dever objetivo de indemnizar pela perda de chance no Concurso.
A perda de chance/oportunidade, pese embora um dano certo, é de difícil quantificação.
No caso dos autos, não é possível afirmar com exatidão o ganho que o Exequente obteria se a Entidade Demandada desse continuidade ao Concurso, agora, num contexto de legalidade. Não é possível adiantar quais as reais hipóteses do Exequente no Concurso.
Sabe-se - tão só - que tinha condições para concorrer num universo de três candidatos, não se sabe se iria obter a melhor pontuação, fator necessário para alcançar o resultado pretendido.
Daí que forçoso será recorrer a um juízo de equidade – artigo 566.º, n.º 3, do CC – para a atribuir a indemnização.
Destacou o acórdão, de 30/11/2012, do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no âmbito do processo n.º 00682-A/2002-Coimbra, que: «O juízo de equidade não é juízo arbitrário. É um juízo que terá de partir sempre do direito positivo, enquanto expressão histórica da justiça numa sociedade organizada, mas alijando elementos técnicos e formais exigíveis no juízo estritamente legal [a propósito, Menezes Cordeiro, in A Decisão Segundo a Equidade, O Direito, Ano 122º, II, página 280].
Nele devem ser sopesados elementos factuais apurados e tidos por pertinentes, que ajudem o tribunal a balizar os contornos a dar à indemnização, e ainda princípios estruturantes do direito, tal como o da justiça e o da proibição do enriquecimento sem causa».
Tal como foi já referido, não é possível estimar o grau de probabilidade do Exequente na obtenção de vencimento no Concurso em causa, já que o mesmo teria de ser retomado à fase da designação do júri, à fixação dos critérios a utilizar na avaliação dos fatores de avaliação, seguindo-se à apresentação das candidaturas e apreciação dos curricula dos opositores ao concurso. Porém, o universo de possíveis opositores, atendendo ao tipo de concurso em discussão, seria sempre reduzido, eventualmente voltaria a ter os mesmos três opositores. De uma ponderação global do exposto, temos que uma indemnização de €7.500,00 será adequada para indemnizar a perda de chance.
No requerimento de fls. 338 dos autos, o Exequente alude, ainda, a danos alegadamente “não patrimoniais”: “tempo adicional perdido em viagem, perda de chance e frustração por não ter conseguido o concurso, apesar do ganho da causa”.
Tal como ressalta do exposto, o Tribunal considerou estes danos quando fixou, à luz de critérios de equidade, a indemnização pela perda de chance, sendo de afastar qualquer correspondência dos mesmos com a figura dos “danos morais”, salvo no que respeita ao sentimento de frustração.
Dispõe o artigo 496º do Código Civil: “Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.”, sendo certo que, uma vez mais, “O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º, a saber: “quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem”.
A jurisprudência tem reiterado que os incómodos, contrariedades e/ou frustrações não constituem dano relevante, merecedores da tutela do direito, tutela que ficou legalmente reservada a casos graves, inequívocos, com repercussões sérias na vida do lesado. E não se pode olvidar que o sentimento de frustração aqui a atender será unicamente aquele que deriva da perda de chance por causa legítima de inexecução.
Assim, na fixação da indemnização, o Tribunal não irá atender ao alegado sentimento de frustração, enquanto dano não patrimonial, por não ser tutelado pelo direito.”

Independentemente da argumentação aduzida pelo Recorrente, segundo o qual teria 80% de probabilidades de conseguir o lugar originariamente concursado, tal não deixam de ser meras conjeturas, tanto mais que não estão fixados os critérios a ponderar curricularmente, que sempre caberia à administração fixar, não podendo o tribunal substituir-se à mesma nessa tarefa.

O único facto objetivamente relevante e suscetível de ser ponderado e mensurado do ponto de vista indemnizatório, prende-se com a perda de oportunidade ou perda de chance para o candidato, em virtude da impossibilidade de repetição do concurso entretanto anulado.

Refira-se desde já, atento até as decisões que têm vindo a ser adotadas em processos próximos daquele aqui em análise, que se entende que os 7.500€ fixados pelo tribunal a quo como indemnização a atribuir ao aqui Recorrente, se não mostra desviado da necessária equidade, justiça e proporcionalidade, em conformidade com a factualidade dada como provada.

Sublinha-se que na presente Execução apenas está em causa uma “compensação pelo facto da inexecução” (Mário Aroso e Fernandes Cadilha – CPTA Anotado – 3ª Ed – pag. 1079).

Com efeito, não podendo ser efetuada com exatidão a quantificação desta perda, é legítimo fixar essa indemnização através de um juízo de equidade, em sintonia com o preceituado no n.º 3 do art. 566.º do CC. Neste Sentido vg acórdão do STA de 29-11-2005, recurso n.º 41321A.

Do que se trata pois é de determinar “uma indemnização pela perda da situação jurídica cujo restabelecimento a execução da sentença lhe teria proporcionado” (Mário Aroso de Almeida, “Anulação de Atos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes”, pág. 821).

O que interessa é determinar como é que essa perda deve ser compensada. É apenas essa perda que está em causa, a qual é o “dano real”, e está demonstrada. O que falta determinar é o “dano de cálculo”, isto é, “a expressão pecuniária de tal prejuízo” (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, “Direito das Obrigações”, 9ª edição, pág. 545).

Atento o circunstancialismo do caso presente, afigura-se que efetivamente o tribunal não poderia fixar a indemnização senão através da formulação de um juízo equitativo (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil), não havendo, naturalmente, parâmetros únicos que devam ser considerados.

Como se sumariou no recente Acórdão deste TCAN nº 02589/14.8BEPRT de 07.10.2016, “(…) a apreciação do mérito científico e pedagógico dos trabalhos e da prestação de um candidato em matéria concursal, … insere-se no âmbito da discricionariedade técnica, competindo, no caso, ao júri a apreciação subjetiva, proferida no âmbito da sua livre, cientifica e legitima apreciação.
(…)”

Em qualquer caso, não tendo o Recorrente logrado demonstrar de modo irrefutável, que teria direito à almejada vaga, ainda assim, e perante a anulação do procedimento, não se poderá ignorar a sua posição, sob pena de se lhe negar qualquer tutela.

É pois razoável admitir a “perda de chance” como fonte autónoma da obrigação de indemnizar para situações, como a vertente, em que está em causa a impossibilidade de ser retomado um concurso entretanto anulado, pelo que perante a impossibilidade de reconstituição desse procedimento, importará compensar o lesado.

A figura da perda de chance tem como pressupostos a existência dum determinado resultado ainda que não apresentando como certo.

Se o tribunal anulou o procedimento, tal significa que o Recorrente teria direito a que o concurso fosse retomado e que se produzisse novo ato apreciando os currículos dos concorrentes, avaliando-se o mérito de cada um dos candidatos, já sem o vício que determinou a anulação.

Perante a impossibilidade de ser retomado o referido procedimento, tal como foi feito pelo tribunal a quo, impunha-se ponderar o modo como o Recorrente deveria ser compensado, enquanto expressão pecuniária de tal prejuízo, sendo que é incontornável que as suas probabilidades vir a obter a almejada vaga, ainda assim não deixam de ser incertas.

Não dispondo o Tribunal do grau de probabilidades que o recorrente tinha de obter a pretendida vaga, não se mostrava possível arbitrar uma indemnização sem recurso à equidade nos termos do artigo 566º, n.º 3, do CC, não sendo possível admitir com plena certeza que, independentemente da perda de Chance, viesse o Recorrente a obter a vaga a que se candidatou.

Reafirma-se pois e em concreto, atenta a circunstâncias de estarmos perante um procedimento concursal, com três candidatos, entende-se como razoável e adequado ter sido atribuído ao Recorrente, por via do recurso à equidade, em consequência da evidenciada perda de oportunidade/Chance não quantificável, a estabelecida indemnização de valor correspondente 7.500€, montante que se mostra equitativo e coerente com a configuração do dano que se pretende ressarcir, face à insusceptibilidade de retomar o procedimento e a incerteza no preenchimento da referida vaga.

No que concerne já às outras questões suscitadas pelo Recorrente, refira-se mal se percecionar o sentido e objetivo das afirmações feitas relativamente ao “fator tempo”.

É certo que o presente Processo se viu condicionado pelas vicissitudes por que passou o Hospital, desde logo em decorrência da extinção do Hospital de S. M..., e a criação da parceria público-privada celebrada entre o Estado, através da ARSN e a EB..., SA o que veio definitivamente a determinar a insusceptibilidade de ser retomado o controvertido concurso.

Independentemente das referidas vicissitudes, não nos poderemos desviar da realidade processual objeto da presente Ação que assenta incontornavelmente no facto de estarmos perante um concurso interno geral para provimento na categoria de assistente de neurologia da carreira médica hospitalar, aberto por aviso publicado no DR II série de 9-02-2002, importando tão-só aferir dos direitos do exequente enquanto candidato ao mesmo.

Refira-se pois, em conclusão que o Recorrente, e tal como se aludiu já precedentemente, contesta o facto da Sentença Recorrida questionar “as reais hipóteses do Exequente no Concurso”, sendo que é manifesto que essa demonstração não foi nem poderia ser feita, atenta a ausência de definição objetiva de critérios de avaliação, sempre aferidos no âmbito da discricionariedade técnica, no caso, do júri.

Em face de tudo quanto supra ficou expendido, não se vislumbra qualquer dos vícios suscitados, mostrando-se razoável, equilibrada e equitativa a indemnização estabelecida em 1ª instância, em face do que se manterá a decisão recorrida, improcedendo, consequentemente, o Recurso Jurisdicional interposto.

Das Custas
Recorre-se ainda do facto de em 1ª instância ter o exequente ficado responsável pelo pagamento das custas.

Afirma o Recorrente insidiosamente que tal terá resultado da “má vontade que se foi manifestando neste processo contra o exequente.”

Se é certo que a referida insinuação feita se mostra, no mínimo, censurável e desprovida de qualquer fundamento, não pode deixar de se reconhecer que a condenação em custas em 1ª instância constituiu um mero lapso, sempre corrigível.

Com efeito, estamos em sede de execução, em virtude do facto da Entidade Executada não ter executado voluntariamente a decisão anulatória que preteritamente havia sido proferida, tirando as consequentes ilações.

Nos termos do atual artº. 527º., nº. 1 do CPC, “a decisão que julgue a ação ou algum dos algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa …”

Em face do que precede, resulta que quem deu causa, por omissão, à presente execução, foi a Administração.

Assim, as custas em 1ª instância deverão ser suportadas pela Entidade Executada, nos termos do artº. 527º., nº. 1, 1ª. parte do CPC.

* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em confirmar a Sentença do TAF do Porto, negando-se provimento ao recurso jurisdicional interposto.

Custas em 1ª instância pela Entidade Executada, e pelo Executado nesta instância.

Porto, 26 de maio de 2017
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Migueis Garcia