Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 03125/06.5BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 04/27/2012 |
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Tribunal: | TCAN |
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Relator: | Rogério Paulo da Costa Martins |
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Descritores: | BASE INSTRUTÓRIA INEXISTÊNCIA CASO JULGADO FORMAL AMPLIAÇÃO BASE INSTRUTÓRIA EM SEDE RECURSO JURISDICIONAL MATÉRIA EXCEPÇÃO IMPUGNAÇÃO RÉPLICA CONFISSÃO OU ACORDO DAS PARTES VALOR INDEMNIZAÇÃO |
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Sumário: | 1.Dada a natureza instrumental e provisória da fase da condensação, a fixação dos factos assentes e a organização da base instrutória não têm eficácia preclusiva, não constituindo caso julgado formal, conforme doutrina do Assento do Supremo Tribunal de Justiça nº 14/94 de 26 de Maio (agora com valor de acórdão de uniformização), sendo perfeitamente viável que o tribunal, no decurso da audiência final, proceda à respectiva ampliação, nos termos estabelecidos nos artigos 650.º, n.º 2 alínea f) e n.º 3 e 264.º Código de Processo Civil, com vista a tomar atendíveis, não apenas factos articulados que, por lapso (embora não reclamado) naquela não foram incluídos, como inclusivamente a atender a factos complementares ou concretizadores, não alegados oportunamente pela parte interessada, mas atendíveis nos termos estabelecidos no n.º 3 do art.º264º do Código de Processo Civil. 2. Por não operar a preclusão, qualquer das partes pode, no recurso da decisão final, invocar omissões dos factos assentes e da base instrutória, ainda que não tenha apresentado prévia reclamação contra os factos assentes e a base instrutória. 3. Se o Réu invoca um facto que traduz culpa presumida da Autora na ocorrência do acidente - que é causa de pedir na acção para efectivação de responsabilidade fundada em acto ilícito culposo -, está a defender-se por excepção - artigo 570º, n.º1, do Código Civil, e 2ª parte do n.º2 do artigo 487º do Código de Processo Civil. 4. Tratando-se de facto pessoal, da Autora, e que constitui matéria de excepção, a não impugnação do mesmo na réplica leva a que se deva ter por assente tal facto por acordo das partes - artigos490º, n.ºs 1 e 2, e 502º, n.º1, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 5. Não estando vedado o trânsito a veículos acima de determinada altura, e sendo a altura máxima permitida por lei de 4 metros – artigo 56º n.º3 do Código da Estrada – a existência de um obstáculo sobre a via pública abaixo dessa altura, traduz por si mesmo um facto ilícito uma vez que impede a livre circulação de veículos que, pela lei, podem circular pelo local livremente. 6. A culpa efectiva do Réu município, traduzida na existência de um ramo sobre a via pública a 3,77 metros de altura, afasta a existência de culpa presumida da autora, resultante da relação comitente/comissário, com o condutor do veículo sinistrado. 7. A reparação da caixa isotérmica do veículo sinistrado na empresa que a fabricou é a que melhor garante a reconstituição natural da situação que existia antes do acidente -artigo 566º, n.º1, do Código Civil; acrescendo a isto o facto de o Réu ter proposto um orçamento mais baixo mas, depois, não ter providenciado pela reparação do veículo, justifica-se a indemnização pelo orçamento mais elevado, apresentado pela referida empresa, assim como o pagamento de uma parcela pecuniária pela imobilização do veículo.* * Sumário elaborado pelo Relator |
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Data de Entrada: | 09/20/2011 |
Recorrente: | Município de Vila Nova de Gaia |
Recorrido 1: | V. ..., Ldª |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Nega provimento ao recurso jurisdicional |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Deverá ser negado provimento ao recurso |
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Decisão Texto Integral: | EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Município de Vila Nova de Gaia veio interpor, a fls. 327 e seguintes, RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 25.06.2010, a fls. 307 e seguintes, pela qual foi julgada procedente a acção administrativa comum, sob forma ordinária, movida pela sociedade V. …, Lda, condenando-se o Município Réu a pagar à Autora a quantia de 31.978,70 euros, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação e, por outro lado, se julgou improcedente o pedido reconvencional, absolvendo-se, em consequência, a Autora deste pedido.
Invocou para tanto, em síntese, que a sentença recorrida errou no julgamento da matéria de facto omitindo, em particular, que o veículo era conduzido por conta e no interesse da Autora, existindo assim uma presunção de culpa que impende sobre esta e exime A Autora de qualquer responsabilidade; sustenta também que o veículo circulava distante do eixo da via, o que foi causal do acidente, o embate no ramo de uma árvore; defende igualmente que houve erro no enquadramento jurídico dos factos, devendo afastar-se a culpa do Réu face à existência de culpa exclusiva por parte do condutor da autora ou, pelo menos, culpa concorrente; defende, por fim, que o valor da indemnização é excessivo, devendo antes ter por referência ou orçamento mais baixo apresentado e não o mais elevado, valor este que, sustenta, nem sequer está provado ter sido pago. A Recorrida contra-alegou, defendendo a manutenção do decidido. O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer também no sentido de ser negado provimento ao recurso. * Cumpre decidir já que nada a tal obsta. * São estas as conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional e que definem respectivo objecto: I. É quanto à questão de facto e de direito o presente recurso, impugnando o julgado nessa ambivalente dimensão. Com efeito, II. Pela prolação da decisão da questão de facto, o Tribunal “a quo”não levou à materialidade dirimida a circunstância fáctica alegada pelo Réu no item 3 da Contestação, que interessa à decisão da causa, devendo a mesma ser considerada assente, face aos elementos dos autos e depoimento do condutor como testemunha em que referiu essa qualidade e função (cf. início da cassete 1, Lado A, voltas 0008 a 1109), seja pela repetição da prova, para esse alcance – Artigos 149, do CPTA e 712, nº 4, do C. P. Civil. Por outro lado, III. Importa a alteração ao ponto VI do probatório, ao dar por provado que o MM circulava no eixo daquela Avenida, sentido sul/norte. IV. E que esse quesito foi retirado da alegação da A. do item 2 da p.i., que tinha como formulação: “O MM circulava na hemifaixa direita, sentido sul/norte?”, e foi levada ao questionário, apesar do Réu apenas ter contestado genericamente o circunstancialismo de modo, tendo alegado reforçadamente mesmo que seguia muito junto à berma, no sentido sul/norte (Ut. Itens 12 e 22 da contestação), o que reforçou até que seguia necessariamente pela hemifaixa direita. V.Também o Senhor Agente Autuante (Cf. depoimento in cassete 2, lado A, Voltas 0031 a 1004), confirmou essa circulação, talqualmente o posicionamento estancado do veículo no esboço de fls. 15, que reiterou e foi dado por assente (ut. XXXVII do probatório), bem assim o depoimento da testemunha Arquitecta MA. … (cassete 2 – Lado B – Voltas 1187 a 1720 e cassete 3, Lado A – voltas 0008 a 0470). Só o condutor, num testemunho incongruente, arrimou em afirmar reiteradamente que seguia no eixo da via e sossegadamente. (Cfr. cassete 1, lado A, voltas 0008 a 1109). Outrossim, VI. Também o quesito do item 33 da B.I., deve ser dado por provado, com o esclarecimento de tratar-se de ramo primário, entroncado, podado e direccionado para suportar a copa, em túnel, ou seja: “No circunstancialismo de tempo e lugar o condutor do MM embateu num ramo da copa de uma árvores situada na berma da Av. da república, a Granja, junto ao nº 2.114, uma vez que, sem considerar o arvoredo existente e com copas perfeitamente visíveis e definidas, seguia muito junto à berma, no sentido sul – norte, com o esclarecimento de tratar-se de ramo primário, entroncado, podado e direccionado para suportar a copa, em túnel”. VII.Tanto resulta indelevelmente do posicionamento do veículo e caracterização do local, confirmado pelo depoimento transcrito das testemunhas Engª DM. … e Arq.ª MA. … e pelo testemunho referido do Senhor Agente autuante. (Cf. ut as respeitantes voltas). VIII.Deverá, pois, ser alterada a matéria de facto impugnada, no alcance propugnado que reflecte a dinâmica do acidente e que os autos e a prova registada e documentada ostentam. Por outro lado, IX. A condução imponderada e imprevidente do condutor do veículo, ao circular numa via de zona residencial com um veículo pesado e de altura relevante, havendo céu aberto no eixo da via que potenciava essa circulação sem perigo, deu causa ao acidente e suas consequências, de danos no tronco primário da árvore. X. Ao invés do sentenciado, a existência desse tronco que suporta a copa, podada em túnel, tendo nas zonas marginais laterais necessária e previsivelmente menor altura, não foi a causa do acidente, mas a condução descansada imprimida, que deu azo ao acidente e suas consequências. XI. Aliás, sendo o condutor Comissário da A. e ao seu serviço, essa culpa até se presume – Artigo 503, nº 3, do C. Civil. XII.Mau grado a existência desse tronco primário a 3,77 m próximo da berma direita e sobre a via na zona marginal, deverá ser dado um juízo de valor de imputação da responsabilidade ao veículo sinistrante. XIII.E, sempre, a não se entender assim, julgar-se pela concorrência da culpa na produção dos danos dirimentes, na proporção de metade – Artigo 506, nº 1, do C. Civil. XIV.Julgando-se a acção improcedente ou procedente nessa proporção, talqualmente procedente total ou parcialmente a reconvenção como peticionado, concorrendo os pressupostos da responsabilidade civil, para tanto. Finalmente, XV.Nunca por nunca o valor indemnizatório atribuído pelo Tribunal, quer ao dano emergente (€ 12.497,70), quer ao lucro cessante (paralisação de € 19.481,00) é o adequado e justo. XVI. O valor do conserto mais elevado, que não foi comprovado despender, e apenas orçamentado para reparação em espécie, com a diferença de terem valores na base de metade – ut. IX e XV do probatório não pode ser considerado. E a paralisação, apesar de oferta de preço para a reparação natural em 18/11/2005, não merecerá tutela do direito, a partir de então. Na verdade, XVII.Apodíctico é que o Réu, através do seu agente de seguros assumiu o valor disponibilizado para a reparação, como resulta do ofício assente - ut. Parágrafo penúltimo, de 13 de Dezembro de 2005 ...”considerando este montante apenas e tão – só para a reparação da viatura sinistrada”... (Sic), retardando a reparação, por anos, só accionando em Dezembro de 2006. XVIII.A possibilidade de reparação “in natura” por metade do valor orçamentado pela A. com disponibilidade do valor pecuniário para o efeito, não justifica à luz da boa – fé o retardamento da reparação e, muito menos a exigência do valor da paralisação que, pelo menos a partir de Novembro de 2005 deu causa, é grandemente excessivo e desproporcionado, em declarando abuso de direito. (Artigo 334º, do C. Civil) XIX.O cômputo dos danos não deve exceder os valores propugnados, vinculado ao valor orçamentado mais barato e a paralisação a Novembro de 2005, como propugnado. XX.Ao decidir em desconformidade, a Sentença recorrida errou quanto à matéria de facto, devendo ser alterada como propugnado. XXI.Outrossim, quanto à questão de direito, por erro de julgamento, com violação dos sobreditos preceitos legais, devendo ser revogada e provido o recurso. * Matéria de facto: O Recorrente ataca, desde logo, o julgamento da matéria de facto. Começa por referir que na contestação alegou, no item 3, que o condutor do veículo, “era Comissário da autora, por conta, a mando e no interesse de quem tripulava o referido pesado”; essa factualidade apesar de interessar à boa decisão da causa, não foi levada nem aos factos assentes, nem à base instrutória, tendo ficado tão – só inscrito a matéria do ponto 1), dos factos assentes e do probatório; tratando-se de matéria relevante, a sua ampliação deverá ser ordenada seja levada ao probatório, face ao depoimento prestado, ou, sempre ordenada a repetição do julgamento, nessa parte – Artigos 712, nº 4, do C. P. Civil e 749, do C.P.T.A. Vejamos. Como se extrai do sumário do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08.02.2011, no processo n.º 2022/08.4TBFIG.C1, com o qual, nesta parte aqui relevante, concordamos integralmente: 1.Dada a natureza instrumental e provisória da fase da condensação, a fixação dos factos assentes e a organização da base instrutória não têm eficácia preclusiva, não constituindo caso julgado formal, conforme doutrina do Assento do STJ nº 14/94 de 26 de Maio (agora com valor de acórdão de uniformização), sendo perfeitamente viável que o tribunal, no decurso da audiência final, proceda à respectiva ampliação, nos termos estabelecidos nos artigos 650.º, n.º 2 alínea f) e n.º 3 e 264.º CPC, com vista a tomar atendíveis, não apenas factos articulados que, por lapso (embora não reclamado) naquela não foram incluídos, como inclusivamente a atender a factos complementares ou concretizadores, não alegados oportunamente pela parte interessada, mas atendíveis nos termos estabelecidos no n.º 3 do art.º264º do CPC. 2. – Por não operar a preclusão, qualquer das partes pode, no recurso da decisão final, invocar omissões dos factos assentes e da base instrutória, ainda que não tenha apresentado prévia reclamação contra os factos assentes e a base instrutória.” O Recorrente estava, assim, legitimado para pedir o aditamento deste facto, relevante, e do qual resulta uma presunção de culpa. Por outro lado, não se mostra necessário produzir tal prova por se dever ter o facto como assente. Este facto invocado na contestação não constituiu mera defesa por impugnação – 1ª parte do n.º2 do artigo 487º do Código de Processo Civil. O Réu não se limitou aqui a dizer que não tinha culpa a produção do evento danoso. Acrescentou algo novo: disse que a culpa, neste caso presumida, na ocorrência do acidente foi da própria Autora, afastando assim o dever de indemnizar, e o correspondente direito da autora a receber uma indemnização, ou, pelo menos, pretendendo ver reduzido este direito – artigo 570º, n.º1, do Código Civil. Defendeu-se, portanto, aqui, por excepção - 2ª parte do n.º2 do artigo 487º do Código de Processo Civil. Tratando-se de facto pessoal, da Autora, e que constitui matéria de excepção, deveria esta, se o considerava falso, tê-lo impugnado no articulado próprio, a réplica– artigo 502º, n.º1, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Não tendo impugnado este facto, pessoal, na réplica que apresentou (ver fls. 99 e seguintes), deve o mesmo ter-se por assente, por acordo das partes - artigo 490º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Civil. Acrescenta ainda o Réu, no ataque ao julgamento da matéria de facto, que se deverá dar como provado que o veículo da Autora seguia muito junto à berma, como questionado na parte final do ponto 33 da base instrutória, dando-se aqui resposta positiva, com a consequente alteração do ponto 6 da matéria dada como provada na sentença. Mas nesta parte não tem razão o Recorrente. Diz o Recorrente que Agente autuante no seu depoimento na cassete 2, lado A, Voltas 0031 a 1004, confirmou essa circulação, talqualmente o posicionamento estancado do veículo no esboço de fls. 15, que reiterou e foi dado por assente (ut. XXXVII do probatório), bem assim o depoimento da testemunha Arquitecta MA. … (cassete 2 – Lado B – Voltas 1187 a 1720 e cassete 3, Lado A – voltas 0008 a 0470). Só o condutor, num testemunho incongruente, arrimou em afirmar reiteradamente que seguia no eixo da via e sossegadamente. (cf. cassete 1, lado A, voltas 0008 a 1109). Vejamos. Desde logo a afirmação de que o veículo “seguia muito junto à berma” é meramente conclusivo. Muito ou pouco junto são, aliás, conceitos subjectivos, impossíveis de traduzir uma realidade de facto. Para se traduzir num facto teria de mencionar em concreto a distância até à berma. Em todo o caso, os elementos probatórios produzidos nos autos, confirmam a decisão tomada quanto a este ponto de facto. O depoimento do Agente autuante traduziu-se, basicamente, em confirmar o esboço por si desenhado. Ora nesse croquis, a fls. 15 verso, é referido que a via tem, no local do acidente, 6 metros de largura (A). E refere-se que o (lado esquerdo do) veículo estava a uma distância de 2,8 metros da berma do lado oposto (B). O que significa que não só o veículo não circulava próximo da berma do seu lado direito, como, pelo contrário, estava a circular pisando parte (cerca de 20 centímetros) da outra metade da via. Esta circunstância é justificada pelo condutor, cujo depoimento, ao contrário do alegado pelo Réu, é perfeitamente coerente e credível (cassete 1 – Lado A – Voltas 0008 a 1109, a partir da volta 54) “… se encostasse mais para a minha mão então aí já tinha batido antes, porque eu vi que as árvores eram assim um tanto ou quanto baixas. E eu ia ao eixo da via que era para não me desviar da esquerda e para não me desviar da direita.” Impõe-se por isso manter a decisão de facto nesta parte. Refere ainda o Recorrente que também o quesito do item 33 da base instrutória, deve ser dado por provado, com o esclarecimento de tratar-se de ramo primário, entroncado, podado e direccionado para suportar a copa, em túnel, ou seja: “No circunstancialismo de tempo e lugar o condutor do MM embateu num ramo da copa de uma árvores situada na berma da Av. da república, a Granja, junto ao nº 2.114, uma vez que, sem considerar o arvoredo existente e com copas perfeitamente visíveis e definidas, seguia muito junto à berma, no sentido sul – norte, com o esclarecimento de tratar-se de ramo primário, entroncado, podado e direccionado para suportar a copa, em túnel”. Invoca para tanto que tal resulta do posicionamento do veículo e caracterização do local, confirmado pelo depoimento transcrito das testemunhas Engª DM. … e Arq.ª MA. … e pelo testemunho referido do Senhor Agente autuante. (cf. ut as respeitantes voltas). Antes de mais importa referir que aquilo que o Recorrente pretende que seja dado como provado a título de “esclarecimento”, são na verdade factos invocados inovatoriamente que não vêm referidos no seu articulado de contestação. O que não impediria, como acima se referiu, que pudessem ser tidos em conta. Sucede que, tirando o facto de ser um ramo primário, entroncado – do qual se poderia retirar a boa visibilidade do mesmo para o condutor do veículo – o restante “esclarecimento” não tem o mínimo relevo para explicar a ocorrência do acidente, e, portanto, para decisão do pleito. E mesmo a visibilidade do tronco não é determinante para esclarecer as causas do acidente - ou as hipóteses de o evitar - mas antes releva para esse efeito a possibilidade de percepção para o condutor de que o embate se iria dar, ou seja, o cálculo, quase instantâneo, da distância do ramo ao solo. Ora sendo entroncado ou não o ramo em que embateu o veículo, a percepção da possibilidade do embate é a mesma, pelo que também nessa parte é irrelevante o “esclarecimento”. Quanto ao posicionamento do veículo já verificámos que, dos depoimentos e do croquis junto aos autos não se demonstrou a tese do Recorrente, pelo contrário, ficou provado que o veículo circulava no eixo da via, ultrapassando, em parte, o meio da via. Nenhum dos testemunhos invocados pelo Autor contradiz esta versão; em particular as demais testemunhas, para além do agente autuante e do condutor nem sequer presenciaram o acidente; as extensas citações destas testemunhas, feita pelo Recorrente, nenhuma luz trazem quanto a esta parte da matéria de facto e, sobretudo, em nada contradizem o testemunho do condutor e o croquis elaborado pelo Agente autuante. Pelo que também aqui se impõe manter a matéria de facto. Nenhuma outra crítica se aponta nas conclusões das alegações – que definem o objecto do recurso – ao julgamento da matéria de facto. E nenhum outro ponto da matéria de facto se impõe alterar, dado que nenhum erro grosseiro ou evidente aqui se detecta, a justificar qualquer alteração (ver a este propósito, por todos, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14.04.2010, no recurso 0751/07). Devemos assim dar por provados os seguintes factos: I) No dia 30 de Agosto de 2005, cerca das 14 horas e 15 minutos, na Av. da República, Granja, Arcozelo, Vila Nova de Gaia, LC. …, conduzia o veículo automóvel, pesado de mercadorias, da marca Scania, matrícula …-…-MM, de 8.974 C.C., propulsionado a gasóleo, tipo fechada, isotérmica, propriedade da Autora, por conta, a mando e no interesse de quem o tripulava. II) No circunstancialismo de tempo e lugar supra referidos, o condutor do MM embateu num ramo da copa de uma árvore situada na berma da Av. da Republica, a Granja, junto ao n° 2.114. III) Em consequência do referido incidente, a caixa frigorífica do veículo MM sofreu danos materiais. IV) O circunstancialismo fáctico referido em I), II) e III) foi comunicado ao Município de Vila Nova de Gaia por carta datada de 8 de Setembro de 2009 e, bem assim, por fax enviado no mesmo dia. V) O Município de Vila Nova de Gaia, através de contrato de seguro válido e eficaz à data do sinistro, titulado pela apólice nº 0084.07.121590, havia transferido para a A …, Companhia de Seguros, S.A. a responsabilidade no ressarcimento dos prejuízos que a Autora sofreu em consequência do circunstancialismo fáctico referido em I). VI) O MM circulava no eixo daquela avenida, sentido Sul/Norte. VII) A altura do ramo da copa da árvore referido em II) (local do embate) ao solo era de 3,77 metros. VIII) A via onde ocorreu o acidente é municipal. IX) Para reparação do MM tornava-se necessário o valor de 10.328,68, acrescido de 2.169,02 de I.V.A., totalizando o valor de € 12.497,70. X) Por indicação do Município Réu. A A. …, Companhia de Seguros, S. A., passou a regularizar o presente sinistro, por via do contrato de seguro titulado pela apólice nº 0084.07.121590 e ao qual atribuiu o Processo nº 0007578/2005. XI) O perito da referida Companhia de Seguros deslocou-se à I. … para proceder pessoalmente à verificação e avaliação dos danos do MM que se encontrava nas instalações da entidade reparadora. XII) A Autora nunca recebeu da referida Companhia de Seguros qualquer comunicação acerca do resultado da peritagem realizada pelos seus serviços técnicos. XIII) A A. … (companhia de seguros) não ordenou a reparação do MM junto da I. …. XIV) A A. … (companhia de seguros), através do perito e a pedido deste, solicitou junto de uma oficina reparadora denominada N. …, Lda., um orçamento para a reparação da caixa frigorífica do MM XV) O mediador dos contratos de seguro da A., na pessoa do Sr. SS. …, foi informado pelo perito da A. … (companhia de seguros) que a reparação do MM seria possível por quantia inferior a 50% do orçamento apresentado pela I. …. XVI) Aquele transmitiu ao perito que a A. pretendia a reparação do MM. XVII) A A … (companhia de seguros) nunca procedeu à deslocação do MM para a oficina por si escolhida a fim desta proceder à reparação dos danos do MM. XVIII) Tal situação foi confirmada pela A., através do referido mediador. XIX) A Autora recepcionou da A. … (companhia de seguros) um recibo de indemnização por esta emitido em 18/11/05, a título de quitação total e por todos os prejuízos sofridos pela A. no âmbito do presente sinistro, no valor de € 5.400,00. XX) Em face de tal, a Autora transmitiu à A. … (companhia de Seguros) a sua discordância. XXI) Entre as quais, através da carta datada de 13/12/05. XXII) A A. … (companhia de seguros) foi várias vezes instada para o ressarcimento dos danos sofridos pela A. XXIII) A A. … (companhia de seguros) não ressarciu a Autora dos danos por si sofridos. XXIV) Nem o município Réu nem a A. … (companhia de seguros) ordenaram a reparação do MM. XXV) A Autora é uma sociedade comercial por quotas cujo objecto consiste a actividade de agricultura, comércio de plantas, flores e bolbos, árvores, artigos para jardins, animais domésticos, rações e alimentos e snack-bar. XXVI) O veículo MM está afecto a esta actividade lucrativa efectuando regularmente transporte de flores e plantas. XXVII) A caixa frigorífica é isotérmica destinada especialmente ao transporte de plantas, cujas condições para o referido transporte dependem da aprovação em sede de inspecção a qual é sujeita. XXVII) Com referência à data de interposição da presente acção, o MM encontrava-se paralisado, não podendo circular na via pública. XXIX) A Autora deixou de contar com o MM para poder continuar a desenvolver a sua actividade. XXX) Perdendo as utilidades que o veículo era susceptível de proporcionar. XXXI) O MM encontrava-se com ausência de quaisquer deficiências e em conformidade com a regulamentação em vigor. XXXII) Face à necessidade de continuar a fazer o referido transporte, a Autora foi forçada a requisitar um veículo de substituição, com o qual despendeu, até à instauração da presente acção, o valor de € 19.481,00. XXXIII) A A. … (companhia de seguros), em carta datada de 12/01/06 deu conta ao mediador de seguros da Autora o contrato de seguro em causa não garantia quaisquer paralisações. XXXIV) A largura da via é de cerca de 6 metros. XXXV) O tráfego do local é zona residencial. XXXVI) O embate supra referido danificou a copa da árvore, património municipal, retirando-lhe qualidades e características. XXXVII) Dá-se por reproduzido o teor de todos os documentos que integram os autos. * Enquadramento Jurídico. A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, no domínio dos actos de gestão pública, tema aqui em discussão, rege-se pelo disposto no Decreto-Lei n.º 48.051, de 21.11.1967. Determina o seu art.º 2º, nº1, que “O Estado e demais pessoas colectivas públicas, respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas aos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício”. São assim pressupostos deste tipo de responsabilidade civil: a) o facto, comportamento activo ou omissivo voluntário; b) a ilicitude, traduzida na ofensa de direitos de terceiros ou disposições legais destinadas a proteger interesses alheios; c) a culpa, nexo de imputação ético - jurídica do facto ao agente ou juízo de censura pela falta de diligência exigida de um homem médio ou de um funcionário ou agente típico; d) a existência de um dano, ou seja, a lesão de ordem patrimonial ou moral, esta quando relevante; e) o nexo de causalidade entre a conduta e o dano, segundo a teoria da causalidade adequada (cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27.1.1987, de 12.12.1989 e de 29.1.1991, in Ac. Dout. n.º 311, p. 1384, n.º 363, p. 323 e n.º 359, p. 1231). Este tipo de responsabilidade corresponde, no essencial, ao conceito civilístico de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos que tem consagração legal no artigo 483º, nº1, do Código Civil (acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 10.10.2000, recurso n.º 40576, de 12.12.2002, recurso n.º 1226/02 e de 6.11.2002, recurso n.º 1311/02). Há no entanto de ter em atenção o disposto no artigo 6º do mesmo diploma que nos dá neste domínio particular uma definição de ilicitude: é ilícito o acto que viole normas legais e regulamentares ou princípios gerais aplicáveis, bem como aquele que viole as regras de ordem técnica e de prudência comum”. O conceito de ilicitude consagrado neste preceito é, pois, mais amplo que o consagrado na lei civil (vd. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10º ed., vol. II, p. 1125; ac. Supremo Tribunal Administrativo de 10.5.1987, in Ac. Dout. 310, p. 1243 e segs.). No caso concreto a Autora imputa ao Réu uma conduta ilícita e culposa por ter deixado estender-se sobre a via pública, a 3,77 metros de altura, o ramo de um plátano, pertença do município, no qual foi embater um veículo seu provocando estragos cuja reparação, para além dos custos de um veículo de substituição, ascendeu ao montante que peticiona acrescidos de juros. O Réu defende-se sustentando que o tronco era visível e contra-ataca sustentado que, para além da culpa presumida que onera a Autora, em virtude da relação comitente-comissário existente entre ela e o condutor do veículo, verificou-se culpa efectiva do condutor do veículo que conduzia descuidadamente e muito próximo da berma o que, exclusivamente ocasionou o acidente. Não tem qualquer razão o Réu. Ainda que circulasse próximo da berma, o condutor do veículo mais não estaria a fazer do que cumprir a lei – artigo 13º, n.º1, do Código da Estrada. Não o estava a fazer, no entanto, e seguia pelo eixo da via. E embateu apenas porque existia um tronco a 3,77 metros de altura em cima da via. Ora não estando o trânsito vedado no local a veículos acima de determinada altura, e sendo a altura máxima permitida por lei de 4 metros – artigo 56º n.º3 do Código da Estrada – a existência de um obstáculo sobre a via pública abaixo dessa altura, traduz por si mesmo um facto ilícito uma vez que impede a livre circulação de veículos que, pela lei, podem circular pelo local livremente. O Município, através dos seus funcionários competentes, estava obrigado a manter a via livre de obstáculos até à altura máxima permitida de 4 metros porque a isso obriga a lei e as regras de prudência comum. Não o tendo feito agiu com culpa, efectiva. Existindo culpa efectiva do Réu, desde logo fica afastada a culpa presumida da Autora face à relação comitente – comissário com o condutor do veículo – artigo 503º, n.º3, do Código Civil - dado não haver a possibilidade de concorrência de culpa efectiva com culpa presumida (neste sentido, por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.01.2004, no processo 04B26338). Isto sendo certo que também sobre o Réu impendia uma presunção de culpa, a que decorre do artigo 493º, n.º1, do Código Civil, dado que a árvore contra a qual embateu o veículo estava numa estrada municipal. E tal conduta ilícita e culposa – deixar um ramo de árvore crescer sobre a via pública a uma altura inferior ao máximo permitido por lei – foi inequivocamente causal do acidente. Ainda que o condutor do veículo seguisse distraído – ou descontraído para usar os termos do Réu – se o ramo da árvore não estivesse a 3,77 metros sobre a via pública o acidente não teria ocorrido. Por outro lado, uma condução atenta e cautelosa não poderia ter evitado o embate: a distância entre a altura a que estava o ramo e a altura máxima permitida são escassos 23 cm. É humanamente impossível concluir, para quem está na cabine fechada de um veículo, que a caixa do mesmo, situada atrás, não vai passar sem embater no tronco que está àquela altura. Isto sendo certo que não era exigível ao condutor do veículo, antes pelo contrário, que circulasse ainda mais para o seu lado esquerdo pois já estava a circular invadindo em cerca de 20 cm a outra metade da faixa de rodagem. O acidente é, pois, única e exclusivamente imputável ao Réu, objectiva e subjectivamente. Quantos aos danos que a Autora quer ver ressarcidos, do mesmo modo carece o Réu de razão no ataque que faz à decisão recorrida. É certo que a seguradora do Réu, a A. … (companhia de seguros), apresentou um orçamento para reparação do veículo inferior, em mais de 50%, ao Orçamento apresentado pela empresa indicada pela Autora. Mas também ficou provado que nem a A. (companhia de seguros) nem o Réu procederam à transferência do veículo da I. … para a N. …, empresa que tinha dado o orçamento mais baixo, nem ordenaram a reparação do veículo sinistrado. Acresce que a reparação na I. …, empresa que produziu a caixa danificada, é a solução que melhor garante a reconstituição natural da situação que existiria se não fosse o acidente, fim primeiro da indemnização – artigo 566º, n.º1, do Código Civil. Pelo que, tal como decidiu a 1ª Instância, outra alternativa não resta ao Réu do que suportar agora o custo da reparação orçado pela I. …, empresa indicada pela Autora. O mesmo se diga sobre o custo com a imobilização do veículo. Provado que o veículo esteve imobilizado assim como a necessidade de usar um veículo de substituição, por um lado, e, por outro, provado que o Réu – ou a sua seguradora – não providenciou pela reparação do veículo sinistrado, também por aqui se impõe proceder a acção, e, consequentemente, improceder o presente recurso jurisdicional. Quanto ao pedido reconvencional: O acidente é, como vimos, exclusivamente imputável, objectiva e subjectivamente, ao Réu, traduzindo um facto ilícito e culposo imputável ao município e causal do acidente a existência do ramo de árvore sobre a via pública a uma altura inferior a 4 metros naquele local. O improvável dano no património do Réu, dada a natural capacidade regenerativa das árvores, a existir, sempre seria da responsabilidade do próprio município, nos termos supra expostos, pelo que, necessariamente, claudica o pedido reconvencional, de indemnização pelo estrago do ramo do plátano. * Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional, pelo que mantêm a sentença recorrida. Custas pela Recorrente. * Porto, 27 de Abril de 2012. Ass. Rogério Martins Ass. Ana Paula Portela Ass. Maria do Céu Neves |