Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1 – RELATÓRIO
MN vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 20 de Fevereiro de 2015 e que julgou improcedente a presente acção administrativa especial intentada contra o Ministério da Administração Interna – Serviço de Estrangeiro e Fronteiras, e onde era solicitado, que:
“ …julgue procedente a presente acção; declarando anulado o acto de indeferimento, concedendo a renovação de autorização de residência temporária”.
Em alegações o recorrente concluiu assim:
a) A decisão ora recorrida julgou improcedente o pedido de anulação do ato de indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária e a consequente renovação da autorização de residência temporária, por entender que o Autor não preenche o requisito elencado no artigo 78º nº 2 al.a) da lei nº 23/2007 de 4 de julho, o da posse de meios de subsistência.
b) A decisão proferida ora recorrida, não faz um enquadramento correto do alegado pelo A. na petição inicial, referindo que o A. invoca que o “acto de indeferimento é ilegal, quer por violação de lei, quer por erro nos respectivos pressupostos”.
c) na verdade, o A. alega na petição inicial que o ato de indeferimento do pedido renovação da autorização de residência temporária, padece de um vício no procedimento (na medida em que não aguardou que o A. fizesse a prova dos meios de subsistência, o qual só poderia fazer em sede de declaração de IRS) e de um vício de violação de lei.
d) A verificação de um vícios implica a anulabilidade do ato de indeferimento.
e) De uma leitura atenta do acórdão, constata-se que o tribunal entendeu e “resumiu” como questões a apreciar e decidir o seguinte: “ se o A. reúne os requisitos para o deferimento do pedido de renovação da autorização de residência, concretamente, se se encontra demonstrado que o A. detém meios relevantes de subsistência”.
f) Tendo olvidado aquando das questões a apreciar e a decidir o alegado vício no procedimento, o qual gera a anulabilidade do ato.
g) Passando a analisar unicamente se o A. possui os meios de subsistência exigidos pela lei para a concessão da renovação da autorização de residência temporária.
h) Conforme resulta do artigo 95º do CPTA o tribunal deve decidir no acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.
i) O tribunal a quo não apreciou nem se pronunciou autonomamente sobre o alegado vício no procedimento.
j) O que constitui nos termos do artigo 615º nº1 al. d) do CPC ex vi artigo 1º do CPTA, fundamento de nulidade da sentença.
k) A decisão ora recorrida é nula, por omissão de pronúncia, na medida em que não se pronunciou sobre todas as questões que lhe foram submetidas á apreciação.
Sem prescindir,
Da posse dos meios de subsistência pelo A.
l) O A. na data em que o pedido de renovação de autorização de residência temporária é apreciado detém os meios de subsistência exigidos por lei, conforme comprovou na declaração de IRS de 2013, referente ao ano de 2012.
m) Em sede de apreciação do pedido do A., solicitou a R. em 10 de fevereiro de 2012, que o A. apresente: “- Comprovativo dos seus atuais meios de subsistência (contrato de trabalho e 3 últimos recibos de vencimento) ”. – doc. junto aos autos e que consta do processo administrativo a fls. 30. – Matéria dada como provada.
n) O A., ora recorrente informou a R., ora recorrida, que reiniciou em fevereiro de 2012 a atividade de vendedor ambulante de artesanato e bijuteria, sendo trabalhador independente.
o) Para comprovar os seus rendimentos (referentes ao ano de 2012- conforma solicitado pela R. na sua comunicação), referiu o A. que poderia apresentar declaração de IRS em 2013, referente ao ano de 2012.
p) Refere o art.º 63º nº 3 deste decreto regulamentar que: “O pedido de renovação de autorização de residência emitida para o exercício de uma actividade profissional é ainda acompanhado dos seguintes documentos: a) Contrato de trabalho ou declaração da entidade empregadora confirmando a manutenção de relação laboral ou de outra entidade legalmente autorizada; ou b) Contrato de prestação de serviços ou requerimento para verificação da declaração de IRS junto da administração tributária, por forma a atestar a manutenção de actividade”.
q) O A. informou a R., que tinha reiniciado a atividade como trabalhador independente em fevereiro de 2012, na categoria de vendedor ambulante, tendo juntado cópia do reinício da atividade, tendo ainda referido que para comprovativo dos seus rendimentos referentes ao ano 2012, poderia apresentar declaração de IRS – conforme resulta das comunicações enviadas á R. 23 de fevereiro de 2012 e 16 de março de 2012.
r) Pelo que, não tem cabimento, como refere a decisão em apreço, que o A. não poderia demonstrar a posse dos meios de subsistência através da declaração de IRS em 2013, referente a 2012, por considerar a decisão recorrida que “ a demonstração da posse dos meios de subsistência nunca poderá referir-se apenas ao futuro (e, neste caso, eventual), mas essencialmente ao presente, ou seja, à data em que é efetuado o pedido de renovação de autorização de residência ou à data em que é proferido o acto decisório sobre tal pedido.”
s) A decisão recorrida parece olvidar que foi a própria entidade administrativa, ora R., em sede de apreciação do pedido, que solicitou em fevereiro de 2012, comprovativo dos atuais meios de subsistência, tendo o ato somente sido proferido em abril de 2012.
t) Tendo este informado que se encontrava a trabalhar, exercendo a profissão de vendedor ambulante de artesanato, com a atividade aberta, sendo trabalhador independente. Desta atividade retiraria os rendimentos necessários para a subsistência.
u) Logrou o autor demonstrar que mantinha a disponibilidade ou a possibilidade de adquirir legalmente os meios de subsistência a que alude o artigo 5.º da presente portaria. – Conforme estatui o artigo 7º da portaria 1563/2007 de 11 de dezembro, para a renovação da autorização de residência temporária.
v) Pelo que não lhe deveria ter sido indeferido o seu pedido de renovação da autorização de residência temporária.
w) Tanto é, que além do A. provar que mantinha a disponibilidade ou a possibilidade de adquirir legalmente os meios de subsistência exigidos por lei, manifestou propósito de comprovar tais rendimentos, através da declaração de IRS em 2013, referente ao ano 2012.
x) A decisão recorrida não contempla duas situações: a primeira é que aquando da apreciação do pedido do A., este encontrava-se a trabalhar, com atividade aberta, demonstrando que mantinha a disponibilidade ou a possibilidade de adquirir legalmente os meios de subsistência exigidos por lei. Em segundo lugar, o A. sendo trabalhador independente só poderia comprovar tais rendimentos, em sede declaração de IRS em 2013, referentes ao ano 2012.
y) O A. auferiu de rendimentos em 2012, no exercício da sua profissão, €9.890,00 (nove mil, oitocentos e noventa euros), conforme resulta da declaração de IRS apresentada, referente ao ano de 2012.
z) Pelo que tendo o A. em 2012, auferido um rendimento de €9.890,00, teve um rendimento mensal superior à retribuição mínima mensal garantida – que no ano de 2012, foi fixada em €485, 00.
aa) A decisão ora recorrida, como o A. é trabalhador independente, aplica a norma remissiva constante do nº 2 do artigo 7º da portaria 1563/2007 de 11 de dezembro, normativo não convocado ou discutido nos articulados. Questão que pela primeira vez o A., ora recorrente, tem oportunidade de discutir.
bb) Tal norma prescreve que “Para efeitos de concessão e renovação de autorização de residência temporária habilitante do exercício da actividade profissional independente, na determinação dos montantes referidos no número anterior são utilizados os critérios previstos no Código de IRS ou no Código de IRC para apuramento do rendimento tributável.”
cc) Verifica-se que há aqui um tratamento desigual e desproporcional entre trabalhadores independentes e trabalhadores dependentes.
dd) Esta norma ao determinar que no caso dos trabalhadores independentes para apuramento do rendimento devem ser aplicados os critérios previstos no Código de IRS ou no Código de IRC para apuramento do rendimento tributável, viola ostensivamente o princípio da igualdade previsto no artigo 13º da CRP.
ee) Refere JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, toda a lei deve obedecer ao princípio da igualdade, “o arbítrio, a desrazoabilidade da solução legislativa, a sua inadequação ou desproporção revelam, de forma mais flagrante, a preterição.” in Constituição portuguesa anotada, tomo I, 2ª edição, introdução geral. Coimbra editora, p.221.
ff) O artigo 7º nº 2 da portaria 1563/2007 de 11 de dezembro, viola o princípio da igualdade constante do artigo 13º da CRP, bem como viola o artigo 7º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o qual prescreve que “Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei”.
gg) Não pode haver um tratamento desigualitário ou uma exigência desproporcionada entre cidadãos, em razão do regime de trabalho em que se encontram para efeitos de permanência ou residência em território nacional.
hh) O artigo 7º nº 2 padece de inconstitucionalidade material, em face da violação do principio constitucional da igualdade.
ii) O tribunal a quo não poderia ter aplicado tal norma, violadora do princípio da igualdade.
Ad summam,
jj) A norma aplicada pelo tribunal a quo, por violação do princípio constitucional da igualdade, padece de inconstitucionalidade material.
sem prescindir,
kk) O A. logrou demonstrar á data da apreciação do pedido que mantinha a disponibilidade ou a possibilidade de adquirir legalmente os meios de subsistência exigidos por lei.
ll) Tendo com a declaração de IRS de 2013, referente ao ano de 2012, demonstrado que possui os meios de subsistência exigidos, tendo tido um rendimento mensal superior à retribuição mínima mensal garantida – que no ano de 2012, foi fixada em €485, 00.
mm) Ao contrário do que entende a decisão ora recorrida, o montante auferido com as vendas poderá dividir-se pelos meses de trabalhado, alcançando-se o rendimento mensal, o qual foi superior à retribuição mínima mensal garantida.
nn) Os bens vendidos pelo A. são peças de artesanato, praticamente isentas de qualquer custo.
oo) O rendimento auferido pelo A. em 2012, €9.890,00, e declarado em sede de IRS, demonstra que o A. possui os meios de subsistência exigidos por lei.
pp) A decisão recorrida, ao decidir nos termos em que o fez, violou o disposto no artigo 95º do CPTA, o que constitui fundamento de nulidade da sentença, nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC ex vi artigo 1º do CPTA, devendo a decisão ora recorrida ser considerada nula, por omissão de pronúncia. Mais se refere, que a decisão em apreço, não poderia ter aplicado a norma do artigo 7º nº2 da portaria 1563/2007 de 11 de dezembro, visto que tal norma viola o princípio constitucional da igualdade.
qq) Deve, assim, ser julgado procedente o presente recurso, em consequência ser revogada a decisão ora recorrida, anulando-se o ato de indeferimento do pedido de autorização de residência temporária, por se encontrar ferido de um vício no procedimento e um vício de violação de lei, e em consequência conceder-se a renovação da autorização de residência temporária, por o A. reunir os requisitos constantes do art. 78º da lei 23/2007 de 4 de julho.
O recorrido, notificado para o efeito, contra-alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões:
23º O ora Recorrente veio interpor recurso da douta sentença do Tribunal a quo, apresentando as alegações que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidas.
24º O ora Recorrente não vem pôr em causa o probatório, limitando-se a fazer um enquadramento distinto daquele que foi feito na douta sentença a quo, no que respeita:
1. Posse de meios de subsistência;
2. A decisão de indeferimento do pedido de renovação de autorização de residência temporária está ferida de vício no procedimento e de violação de lei, vícios que acarretam a anulabilidade da decisão.
3. Falta de pronúncia, pois que o tribunal deve decidir todas as questões submetidas pelas partes, não se tendo pronunciado (autonomamente) sobre o alegado vício de procedimento.
25º No que concerne aos meios de subsistência, foi entendimento do Tribunal a quo que o ora Recorrente não demonstrou a sua posse aquando da apresentação do pedido de renovação de autorização de residência temporária, nem posteriormente quando solicitado pela Entidade Recorrida. 26º O ora Recorrente instruiu o pedido de renovação de autorização de residência temporária (apresentado em 08/06/2011) com cópia de contrato de trabalho a termo incerto, celebrado em 21/09/2010, extracto de remunerações para a Segurança Social e cópia da nota de liquidação de IRS relativa a 2010, por forma a comprovar os meios de subsistência.
27º Do extracto de remunerações para a Segurança Social afere-se que o Recorrente não apresenta descontos desde Dezembro de 2010, e da cópia da nota de liquidação de IRS, relativa ao ano de 2010, afere-se que o Recorrente auferiu um rendimento bruto de 4.165,96 Euros.
28º Destes factos inferiu a Entidade Recorrida que o ora Recorrente não detinha meios de subsistência, nos termos previstos na lei. Não obstante, notificou o Recorrente (em Fevereiro de 2012) para apresentar meios de subsistência actuais, vindo este afirmar que esteve ausente de Portugal e que desde Abril de 2011 que não exerce uma actividade profissional subordinada, e que deu início à actividade de feirante em 22/02/2012.
29º O ora Recorrente em Março de 2012 apresentou alguns documentos que comprovam despesas e não rendimentos pelo exercício da actividade de feirante.
30º Nestes termos, foi entendimento do Tribunal a quo que o Recorrente não comprovou a posse dos meios de subsistência, ao abrigo do disposto no art. 78º n.º 1 e n.º 2 al. a) da Lei 23/2007, de 4 de Julho, conjugado com os arts. 2º, 5º n.º 1 e 7º n.º 1 da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro.
31º No que respeita ao alegado vício de procedimento, a douta sentença pronunciou-se nos seguintes termos:
“E não colhe em contrário das asserções expostas o argumento de que, tendo o A. reiniciado actividade independente em 22/02/2012, apenas em 2013 é que poderia demonstrar a posse dos meios de subsistência dado que o único documento idóneo é a competente declaração fiscal. Realmente, o A. labora em claro erro, visto que, a demonstração da posse dos meios de subsistência nunca poderá referir-se apenas ao futuro (e, neste caso, eventual), mas essencialmente ao presente, ou seja à data em que é efectuado o pedido de renovação de autorização de residência ou à data em que é proferido o acto decisório sobre tal pedido. E, neste domínio, a demonstração da posse de meios de subsistência não prescinde da indagação da situação do requerente no passado recente e no momento em que o pedido é apresentado.
Quer isto significar que, a hipótese do requerente poder vir, eventualmente e no futuro, a alcançar rendimento mensal correspondente à RMMG estabelecida, não pode fundar o deferimento de um pedido de renovação de autorização de residência, visto que tal afronta, cristalinamente, o disposto no art. 78º da Lei n.º 23/2007 e da Portaria n.º 1563/2007”.
32º O ora Recorrente imputa à douta sentença recorrida nulidade, com fundamento em falta de pronúncia.
33º É entendimento da jurisprudência dominante que a nulidade por omissão de pronúncia, verifica-se quando o Juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, devendo apreciar as questões que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras. E neste âmbito, importa distinguir entre questões – matérias respeitantes ao pedido e causa de pedir -, e argumentos – razões invocadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista (cf. Acórdão STA de 13/05/2003, Proc. 204/03).
34º A nulidade por omissão de pronúncia não se verifica quando a sentença recorrida aprecia todas as questões suscitadas, directamente ou por remissão para outras decisões da doutrina, embora não aprecie todos os argumentos. As questões não se confundem com os argumentos, as razões ou motivações produzidas pelas partes para fazer valer as suas pretensões (cf. Acórdão TCA Sul, Proc. 07800/11/A, de 08/06/2011).
35º Por outro lado, é entendimento unânime que só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade (cf. Acórdão TRL de 10/03/2005, Proc. 69/05-2).
36º Ao contrário do entendimento do ora Recorrente, a sentença impugnada pronunciou-se sobre os vícios invocado, ao referir o seguinte:
“Destarte, resta concluir que o A. não reúne recursos estáveis e regulares que sejam suficientes para as suas necessidades essenciais. Pelo que, o invocado acto de indeferimento proferido em 02/04/2012 não padece de qualquer ilegalidade, seja a título de violação de lei, seja a título de erro nos pressupostos. O que significa que o A., por não reunir o requisito elencado no art. 78º n.º 2, alínea a) da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julo, não tem direito ao deferimento do seu pedido formulado em 08/06/2011, de renovação da autorização de residência temporária”.
37º O Juiz a quo não deixou de conhecer sobre o pedido e a causa de pedir, antes estando aqui em causa uma discordância quanto à solução de direito acolhida na sentença recorrida, não podendo, por esta razão, proceder o vício de nulidade por falta de pronúncia invocado pelo Recorrente.
38º O Recorrente vem também alegar que a douta sentença do Tribunal a quo aplica à questão em litígio o disposto no art. 7º n.º 2 da Portaria 1563/2007, de 11 de Dezembro, normativo não discutido nem invocado nos articulados, e sobre a qual não teve oportunidade de se pronunciar.
39º Neste âmbito a douta sentença impugnada salienta o seguinte:
“Mas ainda que, hipoteticamente, se admitisse a posição do A. e, nessa sequência, se conferisse relevância aos rendimentos obtidos desde Fevereiro de 2012 para efeitos de aferir da posse dos meios de subsistência, sempre o desfecho dos autos seria o mesmo.
Com efeito, importa realçar que, desde Fevereiro de 2012, o A. passou a exercer uma actividade independente, a de feirante. De resto, o A. declarou ter obtido, no ano de 2012, rendimentos comerciais brutos, relativos a vendas de mercadorias e produtos, no montante de 9.890,00Euros e mencionou estar abrangido pelo regime simplificado de tributação, em conformidade com o exarado na declaração de rendimentos – Modelo 3 do IRS -, apresentada à Administração Fiscal em 20/05/2013, e que integra os Anexos B e SS (cfr. ponto 16 do probatório.
Ora, estando em causa o exercício pelo A. de uma actividade profissional independente, cumpre referir que a determinação dos meios de subsistência é realizada com a aplicação dos critérios previstos no Código do IRS ou no Código do IRC para apuramento do rendimento tributável, em consonância com o estipulado no art. 7º n.º 2 da Portaria n.º 1563/2007”
40º Pretendeu o Juiz a quo com essa análise demonstrar ao ora Recorrido que mesmo que sufragado o seu entendimento e fossem tidos em linha de conta os rendimentos auferidos por aquele em 2012 e declarados em sede de IRS em 2013, não estaria, mesmo assim, preenchido o requisito previsto no art. 78º n.º 2 al. a) da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, pois que os mesmos eram insuficientes para provir às suas necessidades essenciais, designadamente para alimentação, alojamento e cuidados de saúde e higiene, por aplicação dos critérios previstos no art. 7º n.º 2 da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro.
41º Sufraga a Entidade Recorrida o entendimento do Tribunal a quo na medida em que o mesmo, na sentença recorrida, subsumiu correctamente o pedido ao direito aplicável.
42º Em suma, o Tribunal a quo não incorre em erro de julgamento, quer na apreciação dos factos, quer quanto à interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis. O Tribunal a quo subsumiu correctamente o pedido ao direito aplicável.
43º Urge concluir que a sentença recorrida não enferma de quaisquer vícios ou erros de julgamento, mostrando-se inteiramente válida e legal, não merecendo, pois, censura.
As questões suscitadas e a decidir resumem-se em determinar se o recorrente reúne condições para que lhe seja reconhecido o direito à renovação de autorização de residência.
O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no art.º 146º, nº 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.
2– FUNDAMENTAÇÃO
2.1 – DE FACTO
Na decisão sob recurso ficou assente o seguinte quadro factual:
1) O A. é nacional da República do Senegal;
2) O R. concedeu ao A., em 03/06/2009, autorização de residência temporária nos termos do art.º 78º da Lei n.º 23/2007, autorização esta válida até 23/05/2011 (cfr. fls. 20 dos autos- suporte físico-, cujo teor se considera como inteiramente reproduzido nesta sede);
3) Em 08/06/2011, o A. apresentou nos serviços do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF, em diante), pedido de renovação da autorização de residência de que era titular, instruído com cópia do contrato de trabalho a termo incerto, celebrado em 21/09/2010, extracto de remunerações com os descontos para a segurança social, atestado de residência e Demonstração de liquidação de IRS relativa ao ano de 2010 (cfr. fls. 1 a 20 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
4) Entre os documentos que instruíram o pedido do A.- descrito no ponto anterior - inclui-se documento com, além do mais, o seguinte conteúdo:
“(…)
MN, (…) vem expor e requerer a V.ª Ex.ª o seguinte:
Entre 20/01/2011 e 07/04/2011 deslocou-se o requerente ao seu país de origem de modo a rever a sua mulher, as suas duas filhas menores, pais e restante família.
Aí permanecendo com autorização da sua entidade patronal que lhe assegurou a relação laboral e a continuidade do seu contrato de trabalho.
Quando regressou de imediato se apresentou no seu posto de trabalho, mas tendo terminado a obra, foi solicitado pela sua entidade patronal que aguardasse ser novamente chamado uma vez que prevê iniciar nova obra em breve.
Deste modo, encontra-se o requerente igualmente a diligenciar por encontrar novo posto de trabalho enquanto não é chamado pela sua entidade patronal.
O requerente recebe igualmente apoio por parte do seu irmão NC, cidadão residente em Portugal.
(…)” (cfr. fls. 4 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
5) Em 08/06/2011, o R. notificou o A., pessoalmente, para apresentar, no prazo de 10 dias úteis, declaração da entidade patronal (cfr. fls. 21 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
6) Em 08/02/2012, o R. realizou consulta de remunerações declaradas à Segurança Social, sendo que do extracto das remunerações declaradas constam, no período de Junho de 2009 a Dezembro de 2012, as seguintes remunerações:
[imagem omissa]
(cfr. fls. 28 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
7) Em 14/02/2012, o A. foi notificado do ofício do R. datado de 10/02/2012, nos termos do qual foi solicitado ao A. que, no prazo de 10 dias úteis, apresentasse os seguintes documentos:
- comprovativo dos seus actuais meios de subsistência (contrato de trabalho e 3 últimos recibos de vencimento).
- Deve esclarecer e comprovar a ausência de descontos para a Segurança Social após Dezembro de 2010.
(cfr. fls. 30, frente e verso, do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
8) Em 23/02/2012, o A. apresentou ao R. a seguinte exposição:
“(…)
[imagem omissa]
(cfr. fls. 31 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
9) Além da exposição descrita no ponto antecedente, o A. apresentou ao R. o comprovativo de reinício de actividade via internet, realizado em 22/02/2012, e declaração da Segurança Social, atestando que o A. tem a sua situação contributiva regularizada (cfr. fls. 32 a 36 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
10) Em 29/02/2012, pelos serviços do SEF foi elaborado o seguinte despacho:
“O requerente, quando apresentou o pedido, não possuía qualquer comprovativo de meios de subsistência.
Notificado para que os apresentasse, declarou que tem exercido actividade profissional junto de colegas na venda de artesanato (sem qualquer comprovativo, seja de emissão de recibos escritos, de pagamento de impostos ou de enquadramento na segurança social) e que se inscreveu, no dia 22/2, como trabalhador independente.
Não faz, também, prova de qualquer meio de subsistência.
Assim, não se verificam os requisitos previstos no art.º 78º, n.º 2- a) e c), da Lei n.º 23/07, pelo que é provável o indeferimento do pedido.
Notifique-se.”
(cfr. fls. 37 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
11) Por ofício n.º 1594, datado de 05/03/2012 e recebido pelo A. em 07/03/2012, o A. foi notificado do despacho descrito no ponto anterior (cfr. fls. 38, frente e verso, do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
12) Em 16/03/2012, o A. apresentou resposta, nos termos que se seguem:
“(…)
[imagem omissa]
(cfr. fls. 39, frente e verso, do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
13) O A. fez acompanhar a resposta descrita no ponto anterior dos seguintes documentos:
- recibo emitido em 07/07/2010 pela Comissão de Festas de S. Bento, Santo Tirso, a favor do A., em que é declarado o recebimento do valor de 150,00 Euros relativo à taxa de ocupação referente a Bijoteria, com a área de 10 m2;
- licença de exploração emitida em 13/09/2010 pela Comissão de Festas de N.ª S.ª das Dores, Póvoa de Varzim, a favor do A., em que é declarado o recebimento do valor de 120,00 Euros relativo à ocupação de 6 metros de comprimento durante os dias 17 a 19 de Setembro de 2010;
- recibo emitido em 13/06/2010 pela Associação Famalicão Concelho com Futuro, Vila Nova de Famalicão, a favor do A., em que é declarado o recebimento do valor de 50,00 Euros relativo à taxa de ocupação de 2 metros no n.º 125;
- recibo emitido em 24/08/2010 pelo Município de Lamego, Lamego, a favor do A., em que é declarado o recebimento do valor de 81,60 Euros relativo à taxa de ocupação do domínio público respeitante às festas da cidade 2010;
- licença de exploração emitida em 13/09/2011 pela Comissão de Festas de N.ª S.ª das Dores, Póvoa de Varzim, a favor do A., em que é declarado o recebimento do valor de 120,00 Euros relativo à ocupação de 6 metros de comprimento durante os dias 17 a 19 de Setembro de 2010;
(cfr. fls. 40 a 43 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
14) Em 02/04/2012, pelos serviços do SEF foi elaborado o seguinte despacho:
“Continua o requerente a não apresentar qualquer comprovativo de que dispõe de meios de subsistência (os documentos que, em sede de alegações, apresentou, referem-se a despesas por si realizadas).
Assim, mantenho o sentido da decisão e indefiro o pedido.
Notifique-se.”
(cfr. fls. 44 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
15) Por ofício n.º 2933, datado de 17/04/2012 e recebido pelo A. em 20/04/2012, o A. foi notificado do despacho descrito no ponto anterior (cfr. fls. 45 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido);
16) O A. declarou ter obtido, no ano de 2012, rendimentos comerciais brutos, relativos a vendas de mercadorias e produtos, no montante de 9.890,00 Euros e mencionou estar abrangido pelo regime simplificado de tributação, em conformidade com o exarado na declaração de rendimentos- Modelo 3 do IRS-, apresentada à Administração Fiscal em 20/05/2013, e que é integra os Anexos B e SS (cfr. fls. 68 a 71 dos autos- suporte físico-, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido).
3 – DE DIREITO
Cumpre apreciar as questões suscitadas pelos Recorrentes, o que deverá ser efectuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito, pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redacção conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.
I- Nas suas conclusões a) a k) vem o recorrente sustentar que ocorre nulidade da decisão uma vez que não foram apreciados todos os vícios invocados ao acto impugnado nomeadamente o que refere denominar-se vício de procedimento. Sustenta que nas suas alegações referiu que a única forma que tinha de comprovar que possuía meios de subsistência referentes ao ano de 2012 seria quando apresentasse o modelo 3 de IRS em 2013. O Tribunal não teria analisado esta sua argumentação o que acarretaria nulidade da decisão por omissão de pronúncia.
De acordo com a alínea d) do artigo 615º do CPC, é nula a sentença quando: “ o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar…”
Como refere A. Reis (Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143. não se pode confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões. "São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão."
Ou seja, o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições. Apenas tem que resolver as questões que por aquelas lhe tenham sido postas (A Reis, ob. cit., pág. 141 e A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 688).
Como se refere no Acórdão deste Tribunal, Proc. n.º 0157/07.1BEBRG, de 11-02-2915:
2. Apenas se verifica a nulidade da decisão judicial por omissão de pronúncia, a que alude a alínea d) do n.º1, do artigo 615º, por referência à primeira parte do n.º2, do artigo 608º, do Código de Processo Civil de 2013 (alínea d) do n.º1, do artigo 668º, por referência ao artigo 660º do anterior Código de Processo Civil), aplicável por força do disposto no artigo 1º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
3. Questões para este efeito são todas as pretensões processuais formuladas pelas partes, que requerem a decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer acto especial, quando realmente debatidos entre as partes.
No caso em apreço é manifesto que não ocorre omissão de pronúncia. Em primeiro lugar porque a questão que coloca o recorrente não tem a ver com as questões que o Tribunal tinha de decidir. O que está em causa é saber se o recorrente fez prova ou não de possuir meios de subsistência para que o seu pedido de renovação de autorização de residência pudesse ser deferido. Se só podia fazer prova em 2013 de tal facto é um argumento que utilizou para a não apresentação atempada dos rendimentos. Por seu lado, a decisão recorrida refere-se expressamente quanto a estes aspectos, no trecho que por comodidade de exposição passamos a transcrever:
E não colhe em contrário das asserções expostas o argumento de que, tendo o A. reiniciado actividade independente em 22/02/2012, apenas em 2013 é que poderia demonstrar a posse dos meios de subsistência dado que o único documento idóneo é a competente declaração fiscal. Realmente, o A. labora em claro erro, visto que, a demonstração da posse dos meios de subsistência nunca poderá referir-se apenas ao futuro (e, neste caso, eventual), mas essencialmente ao presente, ou seja, à data em que é efectuado o pedido de renovação de autorização de residência ou à data em que é proferido o acto decisório sobre tal pedido. E, neste domínio, a demonstração da posse dos meios de subsistência não prescinde da indagação da situação do requerente no passado recente e no momento em que o pedido é apresentado.
Quer isto significar que, a hipótese do requerente poder vir, eventualmente e no futuro, a alcançar rendimento mensal correspondente à RMMG estabelecida, não pode fundar o deferimento de um pedido de renovação de autorização de residência, visto que tal afronta, cristalinamente, o disposto no art.º 78º da Lei n.º 23/2007 e na Portaria n.º 1563/2007.
Verifica-se do exposto que a decisão recorrida pronunciou-se sobre a questão que o recorrente vem sustentar que não se pronunciou, e tendo ainda em atenção que estamos perante um argumento utilizado pelo recorrente para sustentar o facto de não ter apresentado atempadamente os rendimentos referentes ao ano de 2012, é manifesto que não ocorre omissão de pronúncia.
Não podem assim proceder estas conclusões do recorrente.
II- Nas suas conclusões l) a pp) vem o recorrente sustentar que ocorre erro de julgamento uma vez que demonstrou possuir meios de subsistência para que pudesse ser deferido o seu pedido de renovação de autorização de residência.
Menciona ainda que o artigo 7º da Portaria 1563/2007, de 11 de Dezembro, ao determinar que no caso dos trabalhadores independentes para apuramento do rendimento devem ser aplicados os critérios previstos no Código de IRS ou no Código de IRC para apuramento do rendimento tributável, viola ostensivamente o princípio da igualdade previsto no artigo 13º da CRP e o artigo 7º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
A decisão recorrida quanto à questão em apreço refere:
Neste contexto, releva salientar que o A. apresentou o pedido de renovação de autorização de residência em 08/06/2011, sendo que a anterior autorização de residência manteve-se válida pelo período de 03/06/2009 a 23/05/2011.
O pedido de renovação de autorização de residência formulado pelo A. em 08/06/2011 foi instruído com cópia de um contrato de trabalho a termo incerto celebrado em 21/09/2010, extracto de remunerações do mesmo para a segurança social e cópia da demonstração da liquidação do IRS relativa ao ano de 2010. E do exame de tais elementos retira-se claramente que a relação laboral detida pelo A. é de natureza absolutamente precária, sendo certo que o mesmo A. declara que tal relação não foi retomada desde Janeiro de 2011. Ademais, do extracto de remunerações não consta qualquer remuneração recebida pelo A. desde Dezembro de 2010. Finalmente, a nota de liquidação respeitante ao IRS de 2010 indica que o A. recebeu a título de remunerações por trabalho dependente o montante de rendimento bruto de 4.165,96 Euros.
Ora, do cotejo dos elementos referenciados resulta, claramente, que o rendimento obtido pelo A. em 2010 não preenche o critério estabelecido no art.º 2º, n.ºs 1 e 2 da Portaria n.º 1563/2007, visto que o rendimento mensal obtido pelo A. no ano de 2010 não alcança o valor da Retribuição Mínima Mensal Garantida (doravante, RMMG) estabelecida para o ano de 2010- 475,00 Euros, por força do Decreto-Lei n.º 5/2010, de 15 de Janeiro.
Sendo assim, e relevando que o A., de acordo com a informação que o mesmo indica, quer porque se ausentou do território nacional desde Janeiro de 2011 a Abril de 2011, quer porque não tinha encontrado ainda novo trabalho (cfr. ponto 4 do probatório), na data em que o A. apresentou o pedido de renovação de autorização de residência- 08/06/2011-, o mesmo não dispunha de qualquer meio de subsistência, e isto para além de, no ano de 2010, estar claramente demonstrado que o A. não preencheu o critério respeitante à posse de meios de subsistência equivalentes, no mínimo, à RMMG no montante de 475,00 Euros mensais.
Acrescente-se que, já em Fevereiro de 2012, o R. notificou o A. para, então, demonstrar que possuía meios de subsistência que garantissem a sua sobrevivência em território nacional. E em resposta, o A. declarou que, desde Abril de 2011 a Fevereiro de 2012 não logrou encontrar trabalho dependente, tendo “ajudado outros colegas na venda de artesanato desde Abril do ano transacto até ao momento”. E que procedeu ao reinício de actividade de feirante em 22/02/2012.
Ora, resulta evidente da pronúncia do A. que o mesmo mantém a omissão na demonstração de posse de meios de subsistência. Apenas em 16/03/2012 é que o A. procedeu à apresentação de elementos documentais que, na sua óptica, são demonstrativos da posse dos ditos meios de subsistência. Sucede, porém, que analisada a citada documentação, a posição do A. não pode deixar de, uma vez mais, naufragar.
Com efeito, verifica-se que os documentos remetidos pelo A. titulam despesas realizadas pelo mesmo, mas não demonstram a existência de rendimentos e, muito menos, do quantitativo de remuneração. Na verdade, e quando muito, o que deriva dos elementos documentais em apreço é que o A. se dedicava, pontualmente, à actividade de feirante.
Por outro lado, 4 dos 5 documentos apresentados pelo A. respeitam a despesas realizadas no ano de 2010, no período de Junho a Setembro de 2010, e que titulam valores relativamente modestos: 50,00 Euros, 150,00 Euros, 81,60 Euros e 120,00 Euros, respectivamente.
Deste modo, não apresentando o A. qualquer documentação de natureza fiscal, e não reflectindo o extracto de remunerações do ano de 2010 quaisquer rendimentos que não os provenientes do trabalho dependente, falece a posição do A. na demonstração de posse de meios de subsistência relevantes no ano de 2010.
Adicionalmente, é de ressaltar que, quanto ao ano de 2011, o A. não apresenta qualquer elemento capaz de demonstrar, sequer, que o mesmo auferiu algum tipo de remuneração ou angariou algum tipo de rendimento. Na verdade, tendo o A. regressado ao território nacional em Abril de 2011, desde então e até 22/02/2012 inexiste qualquer cadastro ou informação oficial quanto à angariação e posse de rendimentos de quaisquer natureza por banda do A.. De facto, não só não se descortina qualquer indicação de remunerações no extracto da segurança social, como não existe qualquer informação fiscal que permita fincar a convicção fundada de que o A. logrou obter meios de subsistência desde Abril de 2011 a Fevereiro de 2012. É certo que o A. apresenta um recibo emitido em Setembro de 2011 por uma Comissão de Festas, no valor de 120,00 Euros. Todavia, como já se expendeu supra, tal documento exara uma despesa do A. e não rendimentos, sendo que apenas é apto a indiciar, no máximo, que o A., pontualmente, exerceu a actividade de feirante desde Abril de 2011 a Fevereiro de 2012.
De qualquer modo, com os elementos documentais apresentados, nunca o A. pode ter sucesso na demonstração de que, no ano de 2011, conseguiu obter um rendimento mensal mínimo de 485,00 Euros, em conformidade com a RMMG fixada para o ano de 2011- Decreto-Lei n.º 143/2010, de 31 de Dezembro.
Destarte, e ponderando toda a argumentação esgrimida pelas partes, a factualidade pertinente e que se encontra demonstrada nestes autos e, finalmente, o direito aplicável, impera concluir que, em bom rigor, nem momento em que apresentou o pedido de renovação de autorização de permanência (08/06/2011), nem momento em que o R. proferiu o acto de indeferimento (02/04/2012), o A. não demonstrou preencher o requisito plasmado no art.º 78º, n.º 1 e 2, al. a) da Lei n.º 23/2007, e em consonância com o exigido nos art.ºs 2º, 5º, n.º 1 e 7º, n.º 1 da Portaria n.º 1563/2007.
É que, não se olvide que o ónus de demonstração da posse dos relevantes meios de subsistência recai inteiramente sobre o A., sucedendo que, no caso dos autos, o R. conferiu ao A. pelo menos 3 oportunidades de apresentar documentação idónea à referida demonstração (cfr. 5, 7, 10 e 11 do probatório).
A questão essencial a discutir nos presentes autos prende-se com a necessidade de saber se o recorrente e fez ou não prova de que dispunha de meios de subsistência para que o seu pedido de renovação de autorização de residência pudesse ser deferido.
Neste âmbito, refere o artigo 78º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, que:
1 - A renovação de autorização de residência temporária deve ser solicitada pelos interessados até 30 dias antes de expirar a sua validade.
2 - Só é renovada a autorização de residência aos nacionais de Estados terceiros que:
a) Disponham de meios de subsistência tal como definidos pela portaria a que se refere a alínea d) do n.º 1 do artigo 52.º;
b) Disponham de alojamento;
c) Tenham cumprido as suas obrigações fiscais e perante a segurança social;
d) Não tenham sido condenados em pena ou penas, que, isolada ou cumulativamente, ultrapassem 1 ano de prisão.
(…)
Por seu lado, refere o artº 63º, n.ºs 1 e 2 do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de Novembro, que o pedido de renovação de autorização de residência temporária deve ser acompanhado dos seguintes documentos:
a) Passaporte ou outro documento de viagem válido;
b) Comprovativo da posse de meios de subsistência, nos termos a definir na portaria a que se refere a alínea d) do n.º 1 do artigo 52.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho;
c) Comprovativo de que dispõe de alojamento; …
A Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro, fixa os meios de subsistência de que devem dispor os cidadãos estrangeiros para a entrada e permanência em território nacional, referindo n.º 2 do artigo 2º que “ o critério de determinação dos meios de subsistência é efectuado por referência à retribuição mínima mensal garantida…”.
O recorrente solicitou, no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, em 8 de Junho de 2011, pedido de renovação de autorização de residência. Instruiu o seu requerimento com cópia do contrato de trabalho a termo incerto, celebrado em 21/09/2010, extracto de remunerações, com os descontos efectuados para a segurança social, atestado de residência e demonstração de liquidação de IRS relativa ao ano de 2010 (n.º 3 da matéria de facto dada como provada).
Quando da solicitação da renovação do seu pedido de autorização de residência referiu que já não estava a trabalhar mas que se encontrava a diligenciar para encontrar novo posto de trabalho. Do extracto de remunerações não consta qualquer remuneração recebida pelo A. desde Dezembro de 2010. A nota de liquidação respeitante ao IRS de 2010 indica que o A. recebeu a título de remunerações por trabalho dependente o montante de rendimento bruto de 4.165,96 Euros.
Ou seja, analisando os rendimentos declarados pelo recorrente e referentes à data em que solicitou a renovação de autorização de residência temporária verifica-se que o recorrente não apresentava meios de subsistência mínimos para que o seu pedido pudesse ser autorizado.
Na verdade, o rendimento obtido pelo A. em 2010 não preenche minimamente o estabelecido no art.º 2º, n.ºs 1 e 2 da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro, uma vez que o rendimento mensal, no ano de 2010, não alcança o valor da Retribuição Mínima Mensal Garantida estabelecida para o ano de 2010 - 475,00 Euros, por força do Decreto-Lei n.º 5/2010, de 15 de Janeiro.
No entanto, em 8 de Junho de 2011, o Réu notificou o recorrente para apresentar, no prazo de dez dias úteis, declaração da sua entidade patronal (n.º 5 do probatório) e não se encontra provado que tivesse dado resposta a esta solicitação.
Por seu lado, em 14 de Fevereiro de 2012, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras solicitou que apresentasse os seus actuais meios de subsistência, devendo ainda esclarecer a comprovada ausência de descontos para a Segurança Social.
O recorrente optou por responder, no dia 22 de Fevereiro de 2012, referindo, entre outras questões, que tinha optado “ hoje” por reiniciar a actividade de venda de artesanato e que entretanto tinha estado a ajudar colegas seus nessa actividade de onde tirava o seu rendimento.
Como o recorrente não apresentou meios de subsistência válidos, foi indeferido o seu pedido de renovação de autorização de residência temporário, com data de 29 de Fevereiro de 2012.
Na resposta a este indeferimento veio o recorrente sustentar que apenas em 2013 poderia apresentar o rendimento referente a 2012, quando da apresentação do seu IRS.
O recorrente, na sua petição de recurso, vem apresentar este mesmo argumento, referindo que o seu pedido não podia ser indeferido, uma vez que só em 2013 poderia apresentar os seus rendimentos, referentes ao ano de 2012, com a apresentação do IRS.
Em primeiro lugar é de referir que a apresentação de meios de subsistência, tem que ser aferida à data do pedido de entrega do requerimento de autorização de renovação de residência, ou então, no máximo, na data do despacho que recair sobre o requerimento em causa. Na verdade, no seguimento do princípio tempus regit actum, será na data da prolação do acto que se tem de verificar do preenchimento dos pressupostos necessários ao deferimento da sua pretensão.
E, na verdade, nesta data, esses pressupostos não estavam preenchidos. Não estavam quando solicitou a renovação da sua autorização da sua residência, em 8 de Junho de 2011, como já vimos, nem quando da prolação do acto de indeferimento da pretensão em 2 de Abril de 2012. É que quando em 14 de Fevereiro de 2012 lhe foi solicitado que apresentasse os documentos comprovativos da sua subsistência, e isto já dando uma nova oportunidade para que pudesse, posteriormente ao seu pedido, apresentar novas provas de ter adquirido meios de subsistência, veio o recorrente referir que nessa data (data de resposta a esta solicitação) optou por iniciar a sua actividade de vendedor de artesanato e apenas em 2013 poderia apresentar o seu rendimento referente a 2012, com a apresentação do IRS. Esta prova não pode ser deferida no tempo, nem podem os requerimentos de autorização de residência ficarem suspensos até que os seus apresentantes consigam apresentar os seus rendimentos. Estes têm que ser demostráveis quando da entrega do requerimento, ou pelo menos, como acontece no caso dos autos, quando solicitados a apresentarem os documentos em causa. Não pode ocorrer deferimento a prazo, como parece solicitar o recorrente.
Não podem assim proceder estas suas conclusões.
Vem ainda o recorrente referir que apresentou o seu modelo 3 do IRS à Administração Fiscal em 20 de Maio de 2013 e onde se verifica que no ano de 2012 teria tido rendimento de € 9 890,00, o que dá um rendimento mensal superior ao rendimento mínimo mensal garantido.
É de referir, em primeiro lugar, que a apresentação destes documentos teve lugar em 6 de Junho de 2013 quando o presente processo já tinha entrado em Tribunal (Janeiro de 2013), e quando o acto impugnado foi proferido em 20 de Abril de 2012. Ou seja, esta apresentação da comprovação dos seus rendimentos tem que ser considerada extemporânea para a apreciação do acto impugnado, nos termos já referidos. Mas mesmo assim, como se refere na decisão recorrida, também com a apresentação destes documentos o recorrente não logra fazer prova de que dispõe de meios de subsistência de acordo com o referido na Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro.
Refere-se na decisão recorrida quando a este aspecto:
Com efeito, importa realçar que, desde Fevereiro de 2012, o A. passou a exercer uma actividade independente, a de feirante. De resto, o A. declarou ter obtido, no ano de 2012, rendimentos comerciais brutos, relativos a vendas de mercadorias e produtos, no montante de 9.890,00 Euros e mencionou estar abrangido pelo regime simplificado de tributação, em conformidade com o exarado na declaração de rendimentos -Modelo 3 do IRS-, apresentada à Administração Fiscal em 20/05/2013, e que é integra os Anexos B e SS (cfr. ponto 16 do probatório).
Ora, estando em causa o exercício pelo A. de uma actividade profissional independente, cumpre referir que a determinação dos meios de subsistência é realizada com a aplicação dos critérios previstos no Código do IRS ou no Código do IRC para apuramento do rendimento tributável, em consonância com o estipulado no art.º 7º, n.º 2 da Portaria n.º 1563/2007.
Sendo assim, no anexo B do Modelo 3 do IRS verifica-se que o A. declarou, a título de rendimentos ilíquidos, o valor de 9.890,00 Euros. Ora, facilmente se verifica, utilizando os critérios de determinação do rendimento tributável previstos no artigo 31.º do Código do IRS (o apuramento do rendimento tributável resulta da aplicação de indicadores objectivos de base técnico-científica definidos para os diferentes sectores da actividade económica. Na ausência destes indicadores, o rendimento tributável é o resultante da aplicação do coeficiente 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos), que a retribuição mensal do A. não atinge dos valores mínimos previstos para a qualificação positiva quanto à existência de meios de subsistência. Efectivamente, aplicando o coeficiente 0,20 ao valor de 9.890,00 Euros (vendas de mercadorias e produtos), apura-se o rendimento tributável a que se refere o artigo 7.º, n.º 2 da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro. E, no caso versado, ascende ao montante de 1.978,00 Euros.
E atentando no disposto no Decreto-Lei n.º 143/2010, de 31 de Dezembro, verifica-se que o valor da retribuição mínima mensal garantida, para o ano de 2012, a que se refere o n.º 1 do artigo 266.º do Código do Trabalho, era de 485,00 Euros.
O que quer significar, que, manifestamente, o A., no ano de 2012, deteve valor muitíssimo inferior a 485,00 Euros mensais para sobreviver, confirmando-se, assim, a insuficiência dos meios de subsistência do A., por não atingir a referida retribuição mínima mensal garantida (475,00 Euros em 2010 e 485,00 Euros em 2011 e em 2012).
Importa, ainda, ressaltar a impossibilidade de, pura e simplesmente, dividir o rendimento declarado pelo A. com vendas de mercadorias e produtos pelos meses de trabalho em 2012 (para determinar a retribuição mensal), uma vez que esse valor inclui os encargos, nomeadamente, despesas e custos com a compra dessas mercadorias. Pelo que, independentemente dos critérios referenciados- artigo 31.º do Código de IRS e 7.º da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro- nunca poderíamos (como o efectua o A. nas suas alegações escritas) considerar o rendimento ilíquido declarado a título de categoria B como rendimento efectivo e estável do A. para aferir das suas condições de subsistência. Simplesmente porque não é com a totalidade desse valor que o A. faz face às suas despesas de alojamento e alimentação. E realce-se ainda, que a retribuição mensal que o A. deve ter disponível para assegurar a sua subsistência é líquida de quotizações para a segurança social.
Destarte, resta concluir que o A. não reúne recursos estáveis e regulares que sejam suficientes para as suas necessidades essenciais. Pelo que, o invocado acto de indeferimento proferido em 02/04/2012 não padece de qualquer ilegalidade, seja a título de violação de lei, seja a título de erro nos pressupostos. O que significa que o A., por não reunir o requisito elencado no art.º 78.º, n.º 2, alínea a) da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, não tem direito ao deferimento do seu pedido formulado em 08/06/2011, de renovação da autorização de residência temporária.
Esta fundamentação encontra-se clara e objectiva, não podendo colher a argumentação do recorrente. Na verdade não pode o mesmo vir referir que o n.º 2 do artigo 7º da Portaria 1563/2007, de 11 de Dezembro será inconstitucional por violação do artigo 13º da Constituição, uma vez que leva a que ocorra um tratamento desigual e desproporcional entre os trabalhadores dependentes e independentes. Não se vê como. É o próprio recorrente na sua argumentação que refere estarmos perante duas situações diferentes. Uma, a dos trabalhadores por contra de outrem, e outra a dos trabalhadores por conta própria. Se estamos perante realidades diferentes tem de haver tratamento diferente. De referir que à violação do princípio da igualdade só corre quando se verifica que há tratamento desigual perante realidades iguais, o que não é manifestamente o caso. O princípio da igualdade impõe que se trate de modo igual o que é juridicamente igual e diferente o que é juridicamente diferente, na medida da diferença. No caso dos autos estamos perante situações diferentes, não havendo motivo, antes pelo contrário, que ambas as situações sejam tratadas da mesma forma. Não ocorre assim qualquer inconstitucionalidade do artigo em questão.
Refere o recorrente que os bens vendidos pelo A. são peças de artesanato, praticamente isentas de qualquer custo. Além de não densificar esta conclusão, não há dúvidas que uma peça de artesanato quer seja feita pelo próprio, quer seja adquirida, tem necessariamente de ter um custo. Não se compreende que seja de outra forma a não ser que sejam objectos oferecidos, o que não se encontra minimamente demostrado. Ou seja, o montante apresentado pelo recorrente quanto aos seus rendimentos de 2012, como trabalhador independente terá de apurado de acordo com os critérios previstos no Código do IRS ou no Código do IRC para apuramento do rendimento tributável, em consonância com o estipulado no artigo 7º da Portaria n.º 1563/2007. Também neste aspecto, como se refere na decisão recorrida, o recorrente não demostra possuir meia subsistência necessário à renovação de autorização de residência.
Assim sendo, e tendo sido este o entendimento seguido pela decisão recorrida, tem de se concluir que não podem proceder as conclusões do recorrente, não merecendo a decisão recorrida a censura que lhe é assacada e, em consequência, nega-se provimento ao recurso interposto.
3 – DECISÃO
Pelo exposto acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, sem prejuízo do eventual apoio judiciário de que goza.
Notifique.
Porto, 9 de Junho de 2017
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco |