Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:04709/04-Viseu
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/16/2015
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Mário Rebelo
Descritores:MÉTODOS INDIRETOS
PRESSUPOSTOS
QUANTIFICAÇÃO
Sumário:1. À luz dos requisitos enunciados no CIRS vigente em 1999 e 2001e ainda na LGT, o apuramento da matéria tributável calcula-se directamente segundo os critérios próprios de cada tributo através de procedimentos objectivos (art. 84º/1 LGT) com vista à determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação (art. 83º/1 LGT).
2. Para os rendimentos empresariais não decorrentes do regime simplificado, a determinação da matéria colectável fazia-se com base na contabilidade (art. 28º/1,b) CIRS/2001) fiável, creditada com a presunção de verdade e boa fé.
3. Porém, se as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo cessa a presunção de verdade e boa fé nas declarações dos contribuintes e nos apuramentos inscritos na sua contabilidade (art.º 75º/1,2,a) LGT).
4. E se mercê dessa infidelidade se tornar impossível a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (art.º 87º/1,a) e 88º LGT) há lugar à avaliação indirecta.
5. Não são todas as omissões, imperfeições ou deficiências da contabilidade que conduzem à tributação por métodos indirectos, mas apenas aquelas cuja gravidade impossibilite a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (Art.º 87/1,b) e 88 LGT).
6. Se a contabilidade, mesmo imperfeita, permitir a reconstituição dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, não pode a AF lançar mão daquele meio de apuramento. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:B...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

O Exmo. Representante da Fazenda Pública inconformado com a sentença proferida no TAF de Viseu que julgou procedente a impugnação deduzida por B... contra as liquidações de IRS e juros compensatórios referentes as anos de 1999 e 2001, dela recorreu formulando alegações e concluindo como segue:

a) Incide o presente recurso sobre a douta sentença que julgou procedente a impugnação apresentada nos autos, na parte respeitante á determinação da matéria tributável com recurso a métodos indiretos, com a consequente anulação dos atos de liquidação de IRS impugnados;
b) Não obstante se ter considerado em primeira instância que no se encontram preenchidos os pressupostos invocados pela Fazenda Pública para apurar o lucro tributável por métodos indiretos (erro nos pressupostos de facto) e na quantificação da matéria coletável, certo é que o Mmo Juiz reconduziu tal questão ao vicio de falta de fundamentação do relatório de inspeção que recorreu a métodos indiretos para o cálculo da matéria tributável;
c) Entende, todavia, a Fazenda Pública que os vicios imputados á decisão de aplicação de métodos indiretos (erro nos pressupostos de facto e excesso na quantificação) não se reconduzem ao vicio de falta de fundamentação, sendo vícios próprios, nos termos da alínea a) do art.° 99° da LGT, que constituem vício de violação cuja prioridade de conhecimento é imposta pelo art.° 124° do CPPT, sendo que o vício de falta de fundamentação consubstancia um vício de forma, cujo conhecimento não assegura a mais eficaz tutela dos direitos compreendidos;
d) Entende-se também, que não será conciliável o conhecimento simultâneo dos vícios de erro nos pressupostos de facto para o recurso aos métodos indiretos e o excesso na quantificação, porquanto se não se verificam os pressupostos para a tributação por métodos indiretos não fará qualquer sentido conhecer do excesso na quantificação, por prejudicado, nos termos do atual art.° 608° do CPC;
e) Independentemente do exposto, nenhum dos vícios imputados ás liquidações
impugnadas se verificam, tendo a douta sentença recorrida incorrido em erro de julgamento sobre a matéria de facto ao no considerar verificados os pressupostos
para o recurso à avaliação indireta, e critério de quantificação utilizado, e aplicado, de forma incorreta, o direito á factualidade apurada;
f) No caso em apreço entende a Fazenda Pública que a douta sentença recorrida assenta numa injustificada/infundada desvalorização do ponto 1 da matéria de facto — fundamentos apresentados pela Administração Fiscal para a realização das correções que originaram as liquidações impugnadas —, e deu como provados determinados factos que manifestamente não o poderiam ser — pontos 7, 8, 9 e 11 do probatório, como seguidamente demonstraremos;
g) Como é sabido, a Administração Fiscal, no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao principio da legalidade, cabendo-Ihe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional, designadamente, a prova da verificação dos pressupostos que determinaram a aplicação dos métodos indirectos de avaliação;
h) Entende a Fazenda Pública que, em face dos elementos recolhidos pela Administração Fiscal, é manifesta a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável, justificativa do recurso a tal método de tributação, nos termos dos art.°s 38° do CIRS (atual 39°), 84º do CIVA (atual 90°) e 87° a 90° da LGT;
i) Com efeito, a Administração Fiscal, na situação em apreço, demonstrou, á evidência, quais as irregularidades e incongruências justificativas da tributação por métodos indiretos, as quais se desdobraram em
o inventários com irregularidades, não pormenorizando as obras em curso ou acabadas, nem como foram determinados a sua valorização;
o Contratos firmados com clientes, em que o valor adjudicado pela obra é bastante superior ao faturado na contabilidade;
o Proveitos não registados no exercício correspondente;
o Requisição de eletricidade, em nome do cliente, não havendo qualquer faturação na contabilidade respeitante aquele;
o Documentos de venda furtados, segundo o impugnante, sendo que alguns daqueles foram apresentados no dia seguinte àquele em que o impugnante se justificou daquela forma;
o Falta de registo de operações financeiras, fluxos financeiros (importâncias inscritas nos recibos) relativa a prestação de serviços no reconhecidos como proveitos;
o Irregularidades quando comparados os valores das contraprestações com os valores faturados;
o Do duplicado da fatura n.° 17 (datada de 31-07-2001) pertencente á escrita do impugnante foram declaradas prestações de serviços no valor de 250.000$ e liquidado IVA no montante de 42.500$; da contabilidade do cliente A... — Padaria e Pastelaria Unipessoal, Lda., consta o original da fatura n.° 17, com outros valores (prestação de serviços no valor de 2.818.000$00 e IVA liquidado no valor de 479.060$00, datada de 19-12-2001);
j) Em face de tal factualidade entende a Fazenda Pública ser manifesto que se encontram reunidos os pressupostos para a tributação por métodos indiretos, quer por existência de erros e inexatidões na contabilização das operações e indícios fundados de que a contabilidade não reflete a exata situação patrimonial do contribuinte, quer por recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação — conforme resulta do auto de declarações, em anexo 2 ao relatório de inspeção, a fls. 44 do processo administrativo anexo aos autos, o sujeito passivo afirmou que as vendas a dinheiro foram roubadas, todavia, no dia seguinte já constavam dos elementos de escrita mais documentos ficando a faltar as faturas desde o n.° 450 ao 500, as vendas a dinheiro desde o n.° 51 ao 251, todas as guias de remessa e todos os recibos, cfr. ponto 4.3.1 do relatório de ação inspetiva;
k) Ora, tendo em atenção toda a factualidade avançada pela Administração Fiscal é manifesto que a contabilidade do impugnante não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido;
l) Por outro lado, o recurso á avaliação de matéria tributável era inevitável, na medida em que a omissão de serviços prestados impossibilita a comprovação direta e exata da matéria coletável, e a inexistência de documentos relacionados com as prestações de serviços realizadas pelo impugnante tornou impossível o apuramento direto e exato daquelas;
m) O Mmo Juiz “a quo” para decidir que no se verificavam os pressupostos para a tributação por métodos indiretos, entendeu que “do relatório inspetivo não resulta que se hajam esgotado todas as possibilidades de obtenção da informação que porventura permitisse a comprovação direta da matéria tributável”, referindo-se “concretamente ao possível e eventual contacto com os donos de obra”,
n) A apreciação efetuada pelo Tribunal “a quo” a toda a factualidade vinda de referir, enferma de erro de julgamento porque, por um lado, obras diversas poderiam ter sido realizadas pelo sujeito passivo para além das identificadas no quadro da página 9 do relatório inspetivo (falamos, designadamente, de obras que não careciam de licença camarária (veja-se o caso da requisição da eletricidade em nome de Casimiro Pereira, sem que haja qualquer faturação quanto a este Sr. nos exercícios em causa e sem que haja qualquer justificação para o efeito — ponto 4.3.4.4 do relatório de inspeção; veja-se no auto de declarações prestado pelo impugnante a menção á obra de Dinis Piedade Francisco, sem que tenha havido qualquer levantamento de licenças camarárias em tais nomes), ou de obras que poderiam ter sido requeridas por outros alvarás e executadas pelo impugnante — o próprio impugnante nos autos, em articulação com as testemunhas por si arroladas, informou que levantou licenças de obras com o seu alvará e depois não as executou, tendo sido outro construtor a fazê-lo) e, por outro lado, nenhum documento foi apresentado quer pelo impugnante, quer pelos demais donos de obras arrolados pelo impugnante (atendendo á proximidade entre aqueles, mormente relacionamento derivado da relação construtor/dono de obra, qualquer confirmação de preço de obra teria necessariamente que revestir a natureza documental, mormente orçamentos, documentos de pagamento, facturas/recibos, vendas a dinheiro, enfim informação de índole documental, que a haver teria instruído a presente petição de impugnação) pelo que qualquer confirmação de valores, meramente verbal, tal como a realizada pelo impugnante e pelos donos de obras nos presentes autos, jamais teria o condão de obviar á tributação por métodos indiretos;
o) Quanto a este argumento, a douta decisão recorrida violou o disposto nos art.°s 38° do CIRS (atual 39º), 84º do CIVA (atual 90°) e 87° a 90º da LGT;
p) Como já se anotou, ou se mostram verificados os pressupostos para a tributação indireta e então cumprirá averiguar da pertinência do critério de quantificação utilizado, incumbindo ao sujeito passivo a demonstração do erro na quantificação, ou então não se verificam os pressupostos para a tributação indireta (a administração fiscal no demonstrou os pressupostos para o recurso a este método), verificando-se, portanto, ilegal decisão de aplicação de métodos indiretos susceptível de anular todo o processado posterior;
q) Assim, caso a Administração Fiscal tenha enveredado por esse caminho — tributação indireta — só poderá ser discutido o acerto do critério de quantificação quando se verifiquem os pressupostos da tributação indiciária;
r) Tendo a douta decisão recorrida decidido simultaneamente pelo erro nos pressupostos de tributação por métodos indiretos e pela errónea quantificação, a mesma padece, nos termos expostos, de contraditoriedade;
s) Na douta decisão recorrida o Mmo Juiz “a quo” considerou existir erro na quantificação, alicerçando a sua decisão no depoimento das testemunhas arroladas pelo impugnante
— cujas respostas constituem os pontos 7, 8, 9 e 11 dos factos provados;
t) Como é sabido, a análise ao critério de quantificação na fase da aferição da existência dos pressupostos do recurso á tributação por métodos indiciários (fase da qualificação) assenta em pressupostos distintos, ao nível do ónus da prova, do que na posterior fase da quantificação;
u) Com efeito, na fase da qualificação incumbe á Administração Fiscal o ónus de demonstrar a existência de inexatidões ou omissões na contabilidade do sujeito passivo, que tais irregularidades impossibilitam a comprovação direta e exata da matéria tributável, bem como o critério de quantificação (art.° 77º n.° 4 da LGT) — compete-Ihe demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação com recurso a tais métodos;
v) Feita essa prova, e aí entramos no campo da quantificação, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso no critério de quantificação nos termos do n.° 3 do art.° 74º da LGT.
w) Por sua via, prescreve n.° 2 do art.° 100º do CPPT que “em caso de quantificação da matéria tributável por métodos indirectos no se considera existir dúvida fundada, para efeitos do número anterior, se o fundamento da aplicação daqueles consistir na inexistência ou desconhecimento, por recusa de exibição, da contabilidade ou escrita e de mais documentos legalmente exigidos ou a sua falsificação, ocultação ou destruição, ainda que os contribuintes invoquem razões acidentais”;
x) Entende a Fazenda Pública que o impugnante não demonstrou o excesso na quantificação, aliás, nem tão pouco diligenciou nesse sentido, porquanto nenhum documento carreou, mormente contabilístico, que confirmasse a relação de obras adjudicadas, o montante envolvido em cada uma, os trabalhos concluídos (sendo que nestes se englobava os valores das obras em que o mesmo terminou os seus trabalhos, embora sem as concluir), as obras que ainda se encontravam a decorrer (e que seria o mesmo a concluir), os documentos dos materiais adquiridos e imputados discriminadamente a cada obra, os documentos comprovativos da mão de obra dispendida para cada obra, os documentos de recebimento dos pagamentos efetuados e respectiva emissão de fatura, enfim, todos os documentos susceptíveis de comprovar os custos incorridos para a realização de cada obra, assim como os proveitos daí resultantes — os documentos comprovativos da factualidade alegada;
y) Refugiou-se o impugnante unicamente na prova testemunhal, arrolando alguns donos de obras que confirmaram, oralmente, a verso apresentada pelo impugnante;
z) Todavia, a prova da factualidade alegada não pode ser feita por mera prova testemunhal, devendo a mesma, necessariamente, ser complementada por idónea prova documental, a qual, a ser verdade, teria que ser revelada na contabilidade do impugnante;
aa) De realçar que nenhum documento foi apresentado pelo impugnante, nem tão pouco por tais donos de obras, assim inviabilizando, a confirmação externa do alegado;
bb) Verifica-se, portanto, uma ausência de prova que resultou da não observância dos deveres instrutórios que impendiam sobre o impugnante, nos termos do n.° 3 do art.° 74° da LGT (através de prova positiva e direta do excesso na quantificação);
cc) Ora, na situação em apreço nada disso foi demonstrado pelo sujeito passivo, como lhe incumbia, nos termos atrás expostos;
dd) A douta decisão recorrida, jamais poderia considerar injustificado/excessivo o critério de quantificação utilizado com base em hipóteses não demonstradas no caso em apreço pelo sujeito passivo;
ee) Em suma, mostram-se verificados os pressupostos para o recurso aos métodos indiretos de tributação, a Administração fundamentou o critério de quantificação utilizado, e a impugnante não demonstrou o erro ou excesso na quantificação;
ff) A douta sentença recorrida, ao não ter decidido neste sentido, violou, além do mais os artigos 74° n.° 3 da LGT e 100° n.° 2 do CPPT;
gg) De igual modo, não se verifica qualquer falta de fundamentação do recurso aos métodos indiretos, porquanto o contribuinte ficou na posse de todos os elementos de facto e de direito que conduziram á decisão, ou seja, foi-lhe dada nota do “itinerário cognoscitivo e valorativo” seguido para a tomada da decisão;
hh) Atento o exposto, forçoso será concluir pela inexistência do vício de falta de fundamentação, pois, perante os fundamentos que constam do relatório da inspeção, um destinatário normal fica em condições de saber o “itinerário cognoscitivo e valorativo” seguido pela Administração Tributária para a tomada da decisão;

Nestes termos e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente com a consequente revogação da douta sentença recorrida, como será de, JUSTIÇA!

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. PGA junto deste TCA emitiu seu parecer concluindo pela procedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.
As questões que se impõe apreciar neste recurso, delimitadas pelas conclusões formuladas, conforme dispõem os artºs 635º/4 e 639º CPC «ex vi» do artº 281º CPPT, são as seguintes:
Saber se estão verificados os pressupostos para recurso à avaliação indirecta;
Saber se houve erro de julgamento de facto;
Se foi demonstrado o excesso na quantificação.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados:
1. Com data de 17/07/2002, foi elaborado “Relatório de inspeção tributária”, por referência ao impugnante, com o seguinte teor: - cfr. fls. 21 a 52 do PA anexo aos presentes autos, que se dão por integralmente reproduzidas como as demais que abaixo se referenciam:
“(…) III - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável
3.1 - Exercício de 1999
3.1.1-IVA
O s.p. deduziu no campo 22 da DP de 9906T o montante de imposto, correspondente ao IVA evidenciado nos documentos de compra registados, ou seja, o valor de €2.954,70, o que está correcto e que corresponde à totalidade do IV A dedutível relativo às compras. Contudo neste período, foram registados quatro documentos referentes ao período anterior (com a designação de facturas em atraso, documentos internos nºs 22, 23, 24 e 25). Ao mesmo tempo que evidenciou, no livro de registo de compras, na coluna 7, o imposto a deduzir, relativo aos documentos internos nºs 22, 23, 24 e 25, também, o evidenciou na coluna 17 do referido livro, com a indicação de regularização e declarou-o no campo 40 da DP. Assim, o s.p. deduziu imposto em duplicado, no montante de €269,16.
No período de 9912T, o s.p. mencionou no campo 40 da DP o valor de €376,83, para o qual não existe suporte documental, pelo que será corrigido o imposto deduzido no montante de € 376,83.
3.2 - Exercício de 2000
3.2.1 - IRS
O s.p. registou e declarou no modelo 3, os custos a seguir apresentados, relativos a rendas (amortização financeira) de leasing:
Data
Doc.
Descrição
Valor
21/03/2000
55
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
21/03/2000
56
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
21/03/2000
57
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/04/2000
72
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/05/2000
81
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/06/2000
91
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/07/2000
108
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/09/2000
125
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
01/10/2000
139
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/10/2000
140
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/1112000
146
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
23/12/2000
157
Renda leasing
187.909$00 (€937,29)
Total
2.254.908$00
(11.247,43)

Conforme o disposto no n° 3 do artigo 23° do CIRC por remissão do artigo 32º do CIRS, não são aceites como custo ou perda, do locatário, a parte da renda destinada a amortização financeira, pelo que serão corrigidas as despesas gerais em 2.254.908$00 (€11.247,43).
3.2.2 - IVA
3.2.2.1 - O s.p. deduziu, na DP de 0012T no campo 24 - Outros bens e serviços, IVA no montante de 7.190$00 (€35,86), tendo como documento de suporte o duplicado da V.D. n° 318 de 05/09/2000 (documento interno n° 119 de 05/09/2000). O IVA deduzido com base no duplicado de um documento é deduzido indevidamente, pelo que não será aceite.

3.3 - Exercício de 2001
3.3.1 - Correcções IVA e IRS
3.2.1.1 - Da análise aos proveitos declarados em 2001 e respectivas facturas, verificámos que a factura n° 15 (datada de 15/06/2001) não se encontra registada, constando no duplicado da mesma, a indicação de anulada. Contudo não se encontra arquivado, conjuntamente, com. o duplicado o original, pois, conforme pudemos constatar, este encontra-se em poder do cliente A... - Padaria e Pastelaria Unipessoal, Lda. (NIPC 5…).
Ao não registar a factura, n° 15, quando o deveria ter feito, o s.p. afectou, negativamente, os proveitos declarados bem como o IVA a liquidar, nos montantes, respectivos de 3.920.000$00 (€19.552,88) e 666.400$00 (€3.323,99), que são, agora, objecto de correcção. A não entrega do IVA liquidado e recebido' é punível pelo artigo 105° do RGIT.
3.2.1.2 - Relativamente à factura n° 17 (datada de 31/07/2001) foram declaradas prestação de serviços, no valor de 250.000$00 e liquidado IV A no montante de 42.500$00, o que está conforme o duplicado pertencente à escrita do s.p. que evidencia " Serviços Diversos a Clientes" efectuados em "Clientes diversos". Contudo, da contabilidade do cliente A... - Padaria e Pastelaria Unipessoal, Lda. (NIPC 504.165.204), consta o original da factura n" 17, com outros valores, prestação de serviços no valor de 2.818.000$00 e IVA liquidado no valor de 479.060$00 (datada de 19/12/01). Sendo evidente que o s.p. passou o original da factura e o entregou ao cliente A..., Lda. Não tendo feito constar aquele valor do duplicado e posteriormente, o utilizou para facturar, diversos serviços que efectuou , serão os proveitos, prestação de serviços corrigida pela totalidade do original da factura, bem como o IVA a liquidar. Assim, a prestação de serviços será corrigida em 2.818.000$00 (€14.056,12) e o IV A a liquidar em 479.060$00 (€2.389,54), vide anexo 01. A conduta tida pelo s.p. indicia a intenção de diminuir as receitas tributárias. Assim sendo a omissão deste IV A será punível pelo artigo 103° do RGIT
O recebimento encontra-se suportado por sucessivos recibos que foram emitidos aquando dos recebimentos parciais (recibo n° 15, 16, 17, 18, 19,20,21), por conta da obra no Parque Industrial Sra da Ouvida.

IV Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
4.1 - No dia 11/06/02, deslocámo-nos ao domicílio fiscal do s.p., onde falámos com o s.p. B que nos informou que o s.p. A estaria numa obra em Britiande, onde nos dirigimos e contactamos com o pessoal que lá se encontrava, tendo um dos presentes informado que o s.p. estava "em cima da placa" e nós, então, solicitámos, que o informassem de que necessitávamos falar com ele. Entretanto, fomos informados de que o s.p. não estaria nesta obra, mas sim noutras. Após constatação de que o s.p. também não se encontrava nas obras designadas pelos funcionários, aguardamos junto à obra de Britiande, onde íamos tentando contactar o s.p. via telemóvel, sem quaisquer resultados.
À hora de almoço fomos contactados pelo s.p., tendo ficado a promessa de que estaria nos Serviços de Finanças de Lamego por volta das 14 horas, o que só se verificou por volta das 16 horas, altura em que o notificámos para apresentação dos elementos de escrita no dia 25/06/02, bem como, para entrega das declarações de rendimentos.
4.2 - No dia e hora marcados na notificação comparecemos no gabinete de contabilidade do Sr. Abelha ( tal como estipulava a notificação, por sugestão do s.p.), onde nos foram facultados os livros de registo. Os mesmos estavam escriturados até 31/12/99, portanto em situação de atraso, pelo que, se procedeu à notificação do s.p. na pessoa de José Joaquim Alves Abelha NIF 120.146.231, para proceder à regularização do atraso de escrita, tendo-se-Ihe concedido o prazo de 6 (seis) dias.
No dia 02/07/02, o s.p. já tinha procedido à entrega das declarações de rendimentos de 2000 e 2001 e à regularização do atraso de escrita através de registo informático dos elementos de 2000, 2001 e parte de 2002, pelo que procedemos à análise dos elementos de escrita.

4.3 - Ao longo da análise aos elementos de escrita foram detectadas irregularidades que, aqui, deixamos registadas:
4.3.1 - Da análise à facturação verificámos que embora existam outras numerações de documentos de vendas registados, somente constavam dos elementos apresentados, as facturas desde o n°1 até ao n° 50.
Deslocámo-nos, então, com o intuito de apurar quais os nºs de documentos de venda e outros requisitados, à Tipografia emitente dos documentos e verificámos que o s.p. requisitou:
10 livros de vendas a dinheiro (V.D. nº 1 até à V.D. n° 500);
10 livros de facturas (Factura n° 1 até ao n° 500);
10 livros de recibos (Recibo n° 1 ao 500);
20 livros de guias de remessa (G.R. n° 1 ao 1000).
Dado existirem documentos de venda que não foram apresentados, insistimos, quer com as funcionárias do gabinete de contabilidade quer com o S.p.2, para que os mesmos fossem apresentados, tendo o s.p. referido que os livros não poderiam ser apresentados, em virtude de terem sido furtados, conforme auto de declarações em anexo 02.
No dia seguinte, já constavam dos elementos de escrita, mais documentos, ficando a faltar as facturas desde o n? 450 ao 500, as vendas a dinheiro desde o n° 51 ao n° 251, todas as guias de remessa e todos os recibos.

4.3.2 - Registo das compras

Da análise às compras não se vislumbra qual o destino que lhes é dado, ou seja, as matérias primas adquiridas, não se sabe, em que obra ou obras foram aplicadas. Dado que o s.p. não efectua este tipo de controlo, também não nos é possível, a nós, controlar quer os custos por obra quer a sua valorização em inventário.
4.3.3 - Inventários

Os inventários não discriminam as obras, em curso ou acabadas, constando, tão somente, no livro de existências, o valor que como é óbvio não sabemos a que obra ou obras diz respeito, nem como foi determinado. Para além disso os valores em causa apresentam-se bastante elevados. Atente-se aos valores que constam nos inventários:

EXERCICIO
VALOR
1997
35.000.000$
1998
37.700.000$
1999
46.700.000$
2000
49.700.000$
2001
45.000.000$

Como já foi referido, não nos é possível saber como foi efectuado a imputação dos custos obra a obra, pois não existem meios extra contabilísticos ou contabilísticos (menção na factura do destino das compra das matérias primas) que nos permitam determinar tal conhecimento. Assim, a comprovação da valorização das obras em inventário, é impossível, para além de que a julgar pelos elevados valores estes servem propósitos de mera fuga aos proveitos (prestação de serviços), ao invés de corresponderem às obras em curso ou acabadas no final do ano.

4.3.4 - Omissão de proveitos

4.3.4.1 - Licenças de obras

Na tentativa de ficarmos a saber quais as prestações de serviços efectuadas pelo s.p., efectuámos o levantamento das licenças requeridas nas Câmaras Municipais de Lamego, Moimenta da Beira, Castro Daire e Armamar.


Assim, concluímos que foram, desde 1998, levantadas as seguintes licenças (alvará do s.p.):

LICENÇA
ANO
DATA
VALIDA
PORROGAÇ
ANO
CLIENTE
LOCAL
INICIO
Ao
FIM
134/98
1998
09-04-1998
04-03-1999
1999
M… MAGUEIJA
159/98
1998
27-04-1998
16-04-2000
2000
A…PORTO
CAMBRES
210/98
1998
29-05-1998
13-05-2001
2001
M…RUA
CALÇADA
CAMBRES
24/99
1999
12-05-1999
30-05-2001
2001
F…S.JOANINHO
GUEDES SANTOS
311/99
1999
31-08-1999
15-07-2002
2002
M…
234/99
1999
02-07-1999
25-06-2000
253 DE
2000
M…FOGUEIRA
01/08/00 ARTEIROS
ATt
23/12/00
112/99
1999
18-03-1999
14-09-1999
348 DE
2001
G…VIVENDA
01/10/99 LIMA
ATt ORTIGOSA
12/03/01
235/00
2000
14-07-2000
13-09-2000
379 DE
2001
A…RUA
14/11/00 DIOGO CALÇADA
ATÉ CAMBRES N"
13/04/01 1020 Andar
154/00
2000
05-05-2000
30-04-2001
204 de
2002
M…RUA DA
19/06/01 PONTE N"22
ATt 2" ANDAR
29/04/02
261/01
2001
26-07-2001
25-01-2002
2002
A…LUGARS.
GEAOREIDO
SOL
PENAJÓIA
306/00
2000
11-09-2000
09-03-2002
2002
E…LUGAR DA
TORRE
PENUDE
364/01
2001
15-10-2001
14-04-2002
2002
M…LUGAR
ARTEIROS
133/01
2001
29-03-2001
22-04-2002
2002
A…ZONA
INDUSTRIAL
CASTRO
DAIRE
354/01
2001
29-08-2001
29-08-2003
2003
A…CASTRO
DAIRE
41/01 2001
12-07-2001
07-01-2002
2002 A…VACALAR

4.3.4.2 - Valores facturados
Depois de conhecidas as obras realizadas ou a realizar, bem como, o seu início e fim, fomos comparar com a prestação de serviços facturada a cada cliente.
Contudo, como já foi referido, não tivemos acesso à informação constante da facturação efectuada em 1998 e 1999, pois esta corresponde às vendas a dinheiro que não foram apresentadas.
No entanto, verificámos que do livro de registo da prestação de serviços, constam, à frente do registo da venda a dinheiro, os nomes dos clientes, que a julgar correctos irão, em benefício do s.p., ser considerados. Assim, veja-se em anexo 03, o resumo e confronto do levantamento de licenças e respectiva facturação, relativamente ao qual deixamos algumas conclusões:
• Existem obras acabadas, cujas licenças de habitabilidade já foram levantadas, e relativamente às quais não foi facturada a totalidade da prestação de serviços, conforme o próprio s.p. admite no auto de declarações em anexo 02, considerando a "valor de adjudicação" constante do processo entregue na Câmara;
Exemplos:
Obra em nome de:
Valor V. facturado Ano
adjudicação
(31/12/01)
conclusão
A…
10.000.000$
5.100.000$
2000
M…* 1
4.500.000$
4.340.000$
2001
F…
3.307.500$
0$
2001
M…
6.000.000$
7.140.000$
2000
G…
3.800.000$
2.100.000$
2001
A…
1.100.000$
0$
2001
M…*2
8.000.000$
4.070.000$
2001

Embora, tenha havido uma prorrogação (19/06/01 até 29/04/02) à licença inicial (05/05/2000 até 30/04/2001), considera-se que a obra estava pronta em 2001, pois da factura nº 5 consta a indicação de que é o "resto de recebimento da obra em lalim", o que significa que a esta altura, a prestação de serviços, deveria estar toda facturada.

Do exposto, somos levados a concluir para além das irregularidades objecto de correção no ponto III deste relatório que revelam manipulação de facturação por forma a omitir proveitos existe subfacturação e até omissão de facturação face ao valor estimado.

4.3.4.3 - Valores facturados/contratos firmados/estimativas
Ficou evidente no ponto anterior que relativamente ao valor de adjudicação previsto no processo entregue na Câmara, para obtenção de licença, existe subfacturação ou omissão de facturação e dado termos verificado que, em alguns casos, esta se afasta da estimativa efectuada pelas Câmaras, quisemos comprovar e aproximarmo-nos da realidade, solicitando ao s.p. os contratos firmados com os clientes/donos da obra.
O s.p., apenas, nos apresentou um contrato, relativo à obra do cliente M… e um aditamento ao contrato, relativo ao cliente A..., Lda., os quais apresentamos em anexo 04, e que referem, em resumo, o seguinte:
• A obra de M… foi adjudicada por 13.800.000$00;
• A obra de A… foi adjudicada por 32.000.000$, sendo concluída até 31/01/2002, e que até 01/10/2001, teria o s.p. recebido (a par da correspondente prestação de serviços), o valor de 10.700.000$00
Comentários
• A obra de M… foi adjudicada por 13.800.000$002 e não por 6.000.000$00, conforme estimativa de custo constante de projecto entregue à Câmara (licença 234/99). Para além disso, a obra que está totalmente concluída, ainda não foi totalmente facturada, pois a facturação para este cliente ascende a 7.140.000$00 + IVA (valor superior à própria estimativa). Veja-se a omissão existente entre o valor de adjudicação real e o declarado pelo s.p. como sendo a estimativa de custo da obra, para o cliente.
• A obra de A… foi adjudicada por 32.000.000$00.
Até 01/10/2001, o s.p. recebeu, conforme aditamento ao contrato, o valor de 10.700.000$00, estando facturado o valor de 3.920.000$00+IVA, conforme factura n° 16, registada na escrita do s.p ..
Posteriormente, apurámos que até final do ano de 2001, conforme relação de recebimentos em anexo 05, o s.p. recebeu até final do ano de 2001 mais 5.000.000$00. Agora comparemos os valores recebidos em 2000 e 2001, no quadro a seguir apresentado, com a facturação efectuada pelo s.p. a este cliente:
Data Factura n° Valor (s/ IVA) Observações
15/06/2001 15
3.920.000$00
Da escrita somente consta o duplicado (original
está no cliente), contudo não foi registado, tendo a
indicação de anulada (correcção capítulo III deste
relatório)
16
3.920.000$00
Está registada.
19/12/2001 17
2.818.000$00
O duplicado da factura está contabilizado no s.p.
com o valor de 250.000$00+IV A e datado de
31107/01 (correcção capítulo III deste relatório).
Total 10.658.000$00
Daqui se conclui mais uma vez da existência de subfacturação e omissão de facturação3.
4.3.4.4 - Outros indícios de omissão de facturação (prestação de serviços)
Para além dos indícios já descritos, verificámos a existência de outros, através da análise às facturas da EDP ( electricidade). A título de exemplo, os documentos internos n" 13, 35 e 56 de 2000 e documento interno n? 85 de 2001, requisição de electricidade em nome de C…, Rua…- Lamego. Note-se que relativamente a este nome não existe qualquer facturação, nos exercícios cuja facturação foi analisada (1998, 1999, 2000, 2001 e 2002).
Não existe correspondência entre os custo havidos e registados e respectivo retorno.
4.4 - Situação tributária do S.p.
A própria situação tributária do s.p., situação credora de IVA e os parcos resultados para efeitos de IRS não condizentes com a realidade, a julgar pelas necessidades decorrentes dos abatimentos declarados, são reveladores da existência de omissão de proveitos.
4.5 - Em resumo, as irregularidades dos registos, são:

• Irregularidades quando comparados os valores as contraprestações com os valores facturados;
• Irregularidades quando comparados os valores as contraprestações com os valores facturados e os valores de adjudicação reais (contratos firmados com os clientes);
• Falta de registo de operações financeiras, fluxos financeiros (importâncias inscritas nos recibos) relativa a prestação de serviços não reconhecidos como proveitos;
• Irregularidades nos inventários;
• Falta de apresentação de elementos, documentos de vendas, recibos, etc;
A insuficiência de elementos quanto à actividade desenvolvida e quanto à organização escritural, impossibilitam a quantificação directa e exacta da matéria tributável, preenchendo, assim, as condições legais do artigo 88° da LGT, designadamente na sua alínea a) e d), pelo que se propõe a aplicação dos métodos indirectos.

V - Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos.
Face ao referido no capítulo anterior, donde resultou a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, propõe-se a determinação da base tributável pela aplicação das alíneas a) e b) do artigo 88° da LGT, prevista nas alíneas a), h) e i) do n" 1 do artigo 90° da LGT, conforme a seguir se apresenta:
5.l-IRS
5.1.1 - Critérios e cálculos 5.1.1.1 - Obras concluídas

- Imputação da omissão da prestação de serviços ao ano de conclusão da obra, nos casos das licenças já não se encontram válidas e cujas licenças de habitabilidade já tenham sido levantadas ou nos casos em que as licenças, ainda estando válidas, existam indicadores de que a prestação de serviços já foi concluída".
A obra em nome de M…, cuja licença estava válida até 30/04/2001, considerou-se que a prestação de serviços, relativa à obra contratada, deveria estar toda facturada em 2000, pois conforme indicação da factura nº 5 datada de 31/10/2000, o montante nela facturado corresponde ao resto de recebimento do trabalho de construção da habitação.
A omissão da prestação de serviços será determinada com base no valor estimado pelo s.p. como sendo o custo da obra, acrescido da diferença encontrada entre este e
o valor real da adjudicação (contrato elaborado entre o s.p. e o cliente M…), conforme a seguir se demonstra:
Valor real de adjudicação = 13.800.000$00
Valor de adjudicação = 6.000.000$00 x 1,17 = 7.020.000$00
Factor de omissão = 1,9658
Serviu o caso do cliente M…, para determinação da omissão existente entre o facturado e o real, não porque se tenha usado um critério discricionário, relativamente aos outros contratos elaborados entre o s.p. passivo e os clientes, mas sim, porque foi o único contrato apresentado pelo S.p., ou seja, é o único elemento que nos aproxima da realidade, já que é evidente que valor de adjudicação não corresponde ao real, como admite o s.p. em auto de declarações em anexo 02.
Assim, o valor real de adjudicação de cada obra será igual ao produto entre o valor de estimado pelo s.p. e o factor de omissão encontrado, conforme quadro a seguir apresentado:


LICENÇA
ANO CLIENTE VALOR TOTAL CM Prestação
FIM FACTURADO serviços 1999 2000 2001
presumida
134198
1999
M…
4.000.000
4.100.000 LAMEGO
7.863.332
3.763.332
159198
2000
A…
10.000.000
5.100.000
LAMEGO
19.658.330
14.558.330
210198
2001
M…
4.500.000
4.340.000
LAMEGO
8.646.249
4.506.249
24199
2001
F…
3.307.500
4.410.000
ARMAMAR
6.501.993
3.194.493
234199
2000
M…
6.000.000
7.140.000
LAMEGO
11.794.998
4.654.998
112/99
2001
G…
3.800.000
2.100.000
LAMEGO
7.470.165
5.370.165
235/00
2001
A…
1.100.000
O LAMEGO
2.162.416
1.062.416
154/00
2002
M…
8.000.000
4.070.000
LAMEGO
15.726.66411.656.664
Prestação ele serviços omitida
3.763.332
30.869.992
14.133.323

5.1.1.2 - Outros casos
Existe um outro caso que embora a obra não estivesse concluída em nenhum dos exercícios analisados, sabemos que foram efectuadas entregas por conta da prestação de serviços que o s.p. ia efectuando. É o caso do cliente A..., Padaria e Pastelaria, Unipessoal, Lda. Este cliente efectuou pagamentos ao s.p. nos montantes a seguir indicados, que não tiveram a devida correspondência em termos de facturação:

Relação de recebimentos relativos à obra de A..., Lda. NIPC
5…
Cruzamento de informações
DATA
DOCUMENTO EUROS
ESCUDOS
P.S. (ESC)
P.S. (EUROS)
IVA (ESC)
IVA EUROS)
30-12-2000
RC15
9.975,96
2.000.000
1.709.402
8.526,46
290.598
1.449,50
9.975,96
2.000.000
1.709.402
8.526,46
290598
1.449,50
10-04-2001
RC16
4.987,98
1.000.000
854.701
4.263,23
145.299
724,75
23-05-2001
RC17
12.469,95
2.500.000
2.136.752
10.658,07
363.248
1.811,87
15-06-2001
RC18
4.987,98
1.000.000
854.701
4.263,23
145.299
724,75
26-07-2001
DECLARAÇÃO ADVOG
2.992,79
600.000
512.821
2.557,94
87.179
434,85
09-07-2001
RC19
7.980,77
1.600.000
1.367.521
6.821,17
232.479
1.159,60

Conforme critérios e cálculos seguidos para efeitos de IRS, o volume de negócios omitido e presumidos nos termos do artigo 84° do CIVA e as liquidações adicionais nos termos do artigo 82° do CIV A, são as seguintes:

13-07-2001
RC20
4.987,98
1.000.000
854.701
4.263,23
145.299
724,75
30-07-2001
DECLARAÇÃO ADVOG
4.987,98
1.000.000
854.701
4.263,23
145.299
724,75
13-10-2001
RC21
9.976,00
2.000.008
1.709.409
8.526,50
290.600
1.449,50
DECLARAÇÃO ADVOG
14.963,94
3.000.000
2.564.103
12.789,69
435.897
2.174,25
68.335,35
13.700.008
11.709.409
58.406,29
1.990.600
9.929,07

No exercício de 2000, o s.p. não procedeu a qualquer facturação, relativamente aos recebimentos obtidos deste cliente, aos quais estão subjacentes a prestação de serviços. O valor recebido ascende a 2.000.000$00 (valor com IVA), que o S.p. deveria ter declarado como proveitos, prestação de serviços, o valor de 1.709.402$00 - € 8.526,46, pelo que será corrigida a prestação de serviços naquele montante.
No exercício de 2001, o S.p. recebeu deste cliente, o total de 13.700.000$00 (Valor com IVA), pelo que deveria ter declarado como proveitos, prestação de serviços, o valor de 11.709.409$00 - € 58.406,29. Conforme o descrito e corrigido no ponto III deste relatório foi facturado o valor de 10.658.000$00 - €53.161,88, sendo a prestação de serviços omitida no valor de 1.051.409$00 - €5.244,41.
5.2 –IVA

Correcções
1999
2000
2001
Ponto 5.1.1.1
3.763.332$00
30.869.992$00
14.133.323$00
Ponto 5.1.1.2
0$00
1.709.402$00
1.051.409$00
Volume negócios omitido
3.763.332$00
32.579.394$00
15.184.732$00
IVA em falta (em escudos)
639.766$00
5.538.497$00
2.581.404$00
IVA em falta (em euros)
€3.191,14
€27.625,91
€12.875,99
03T
€797,78
€6.906,47
€3.218,99
06T
€797,78
€6.906,48
€3.219,00
09T
€797,79
€6.906,48
€3.219,00
12T
€797,79
€6.906,48
€3.219,00


Regularizações efectuadas pelo S.P. no decurso da acção inspectiva.
O s.p. durante a acção inspectiva e após notificação procedeu à entrega das declarações de IVA em falta 0103T, 0106T, 0109T, 0112T e 0203T, apurando os seguintes valores:
Período
Excesso a reportar
Valor inscrito no
Apuramento
apurado
Campo 61
automático *
OlO3T
€1.652,88
€23,71
-€1.629,17
0106T
€1.706,05
€1.652,88
-€53,17
0109T
€2.190,77
€1.706,05
-€484,72
0112T
€2.191,02
€2.190,77
-€0,25
0003T
€1.355,85
€2.191,02
835,17

Procedeu, também, à entrega das declarações de rendimentos de 2000 e 2001, onde evidenciou os seguintes rendimentos:

Categoria
Exercício de 2000
Exercício de 2001 - Rend. Líquido
Categoria B - s.p. A
€4.207,85
€24.407,81
Categoria B - s.p. B
€2.144,83
€2.813,22
”.

5. Com data de 12/03/2003, a Administração Fiscal procedeu à liquidação adicional de IRS referente ao ano de 1999, com o n.º 5340024992, no montante de € 5.015,77, cuja data limite de pagamento era de 30/04/2003 – cfr. fls. 22 dos autos.

6. Com data de 31/12/2002, a Administração Fiscal procedeu à liquidação adicional de IRS referente ao ano de 2001, com o n.º 5344043818, no montante de € 24.436,37, cuja data limite de pagamento era de 19/02/2003 – cfr. fls. 23 dos autos.

7. O impugnante procedeu ao levantamento de licença de construção de habitação utilizando o seu alvará de empreiteiro, cujo dono da obra é A…, tendo pago ao impugnante 5000 contos dos 9000 que haviam acordado para a execução da obra que o impugnante não concluiu – cfr. depoimento da testemunha A…

8. O impugnante procedeu ao levantamento de licença de construção de habitação utilizando o seu alvará de empreiteiro, cujo dono da obra é M…, tendo pago ao impugnante 3000 contos porquanto o impugnante apenas executou os alicerces até à primeira placa tendo a obra sido concluída posteriormente com recurso a mão de obra de familiares – cfr. depoimento da testemunha M…

9. O impugnante procedeu ao levantamento de licença de construção de habitação utilizando o seu alvará de empreiteiro, cujo dono da obra é F…, tendo esta substituído o empreiteiro na execução da obra em face dos atrasos na sua execução quando faltava mais ou menos metade para a conclusão dos trabalhos – cfr. depoimento da testemunha F…

10. O impugnante procedeu ao levantamento de licença de construção de habitação utilizando o seu alvará de empreiteiro, cujo dono da obra é M…, tendo pago ao impugnante o valor contratado para a execução da obra que o impugnante não concluiu – cfr. depoimento da testemunha A…

11. O impugnante procedeu ao levantamento de licença de construção de habitação utilizando o seu alvará de empreiteiro, cujo dono da obra é G…, tendo pago ao impugnante entre 3000 e 3600 contos que corresponde à parte dos trabalhos executados pelo impugnante, não tendo concluído a obra em face da falta de meios económicos por parte do dono da obra, tendo este concluído a obra ao dia com recurso a mão de obra que não do impugnante, tendo gasto mais cerca de 1500 contos – cfr. depoimento da testemunha A…

12. A presente acção foi registada em 20/05/2003 – cfr. fls. 1 dos presentes autos.

Sobre a matéria não provada, a sentença registou o seguinte:
Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos.

Na motivação da decisão de facto diz-se o seguinte:
O Tribunal formou a sua convicção relativamente a cada um dos factos dados como assentes tendo por base os documentos juntos aos autos, os quais não foram objecto de impugnação e nos depoimentos das testemunhas, que se revelaram isentos e conhecedores da atividade do impugnante, principalmente as testemunhas M…, A…, M… e G…, que na qualidade de donos de obra que o impugnante executou, afirmaram que este procedeu ao levantamento das correspondentes licenças de construção com recurso ao seu alvará de empreiteiro, não concluiu aquelas obras, como também não pagaram ao impugnante o valor total da adjudicação que fizeram, sendo que, com exceção do caso da testemunha M…, o valor que as testemunhas declararam ter pago é inferior à estimativa da obra que resulta do relatório inspetivo, como também, à exceção de dois casos em que foram celebrados contratos, as adjudicações resultaram de contrato verbal e na sua maioria com pagamentos ao dia.
Quanto à testemunha M…, esposa do impugnante referiu de forma genérica a atividade do impugnante mas de concreto nada adiantou, como também do depoimento das testemunhas R… e I… nada resultou de relevante para as questões em discussão nos presentes autos. No que concerne ao depoimento da testemunha I…, Inspetora tributária que realizou a inspeção à atividade do impugnante, para além de confirmar o que resulta do respetivo relatório, afirmou que não teve oportunidade de contactar os donos das obras por ser difícil o seu contacto porque muitas das vezes não estão em casa, confirmando que, essencialmente, apurou o valor de cada uma das obras por referência aos valores declarados nos projetos de execução apresentados na Câmara Municipal, o que resulta também do relatório inspetivo e ainda que entendeu que estando a obra com licença de habitabilidade atribuída, significará que essa obra estará concluída


IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

O impugnante exerce a actividade de construção de edifícios, enquadrado na categoria B para efeitos de IRS e no regime normal trimestral, para efeitos de IVA.
Foi sujeito a fiscalização externa com incidência nos exercícios de 1999, 2000 e 2001 que culminou com a liquidação adicional de IRS e IVA, com recurso a avaliação indirecta (e correcções técnicas).
O impugnante formulou pedido de revisão, não se tendo alcançado acordo.
Impugnou as liquidações de IRS dos anos de 1999 e 2001, junto do TAF de Viseu, alegando, entre o mais, a preterição do direito de audição, falta de pressupostos para avaliação indirecta, falta de fundamentação e excesso na quantificação.

Por sentença de 20/12/2013, a impugnação foi julgada procedente e determinou-se a anulação das liquidações na parte respeitante à determinação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos.

Desta sentença vem o presente recurso.

Quanto à verificação dos requisitos para avaliação indirecta e sua fundamentação.

Nas conclusões e), f), m), n) s) x) y), z) aa) e bb) o ERFP imputa à sentença o erro de julgamento facto na dupla perspectiva em que não se aceitou estarem demonstrados os requisitos para aplicação de métodos indirectos e excesso na quantificação.

No que respeita à verificação dos pressupostos para tributação por métodos indirectos, o ERFP defende que os factos provados demonstram a verificação dos pressupostos para tal tributação. Quanto ao excesso na quantificação, a prova produzida não deveria ter conduzido sua verificação.

Vejamos agora, em primeiro lugar, se os factos provados demonstram a verificação dos pressupostos para recurso à avaliação indirecta.

Antes, porém, algumas considerações sobre a metodologia usada pelo MMº juiz «a quo» na elaboração da sentença, alvo de crítica neste recurso.

No capítulo da fundamentação jurídica da sentença, o MMº juiz começou por enunciar de forma clara os fundamentos da impugnação e as questões que lhe cabia decidir.
No primeiro caso, enunciou que
«São os seguintes os fundamentos da presente impugnação:
i) Erro nos pressupostos de facto suscetíveis de permitir o recurso à avaliação indireta da matéria colectável e consequente falta de fundamentação da decisão de aplicação dos métodos indiciários;
iii) Erro na quantificação da matéria coletável;»

E no caso segundo, referiu que
«Assim, as questões decidendas são as seguintes:
a) saber se há erro nos pressupostos de facto suscetíveis de permitir o recurso à avaliação indireta da matéria coletável
b) Saber se há erro na determinação da matéria coletável;»

Com exceção de que o erro nos pressupostos susceptíveis de permitir o recurso à avaliação indirecta não constitui, por si só, falta de fundamentação (embora esta também se possa verificar), a metodologia anunciada parece ser uma perspectiva de análise virtuosa e ordenada, capaz de enfrentar com método as questões respeitantes à avaliação indirecta da matéria tributável tendo por referência o ónus da prova que onera cada sujeito processual, à luz do disposto no art. 73º/3 da LGT: Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação.

Assim, seria de esperar uma análise consentânea com as linhas orientadoras apresentadas.
Só que a sentença parece ter-se desviado da clareza do «esquema» inicial traçado, e empreendeu na mesma análise os pressupostos de facto susceptíveis de permitir o recurso à avaliação indirecta da matéria colectável e do erro na quantificação.

Mercê desta (segunda) orientação analítica e expositiva, o MMº juiz acabou por incluir na mesma análise os pressupostos para recurso à avaliação indirecta (prova a cargo da ATA) e o erro na quantificação (ónus a cargo do sujeito passivo), como se pode ver nesta passagem: «São estas circunstâncias também que a inspeção tributária não levou em consideração e que põem em causa a decisão de tributação por métodos indiretos, quer seja por via dos seus pressupostos e atente-se que o recurso aos métodos indiretos para determinação da matéria coletável sempre deverá ser toda como última ratio.
O que vale também para o critério de quantificação que vez que obtendo-se, como no caso do relatório inspetivo em apreço, um fator de omissão com base em apenas um dos contratos e sabendo a inspeção, por exemplo que a obra do Sr. Bonifácio havia sido adjudicada por um valor que não foi questionado e não serviu para esse cálculo, ou pelo menos não se justifica esse afastamento, a par da ausência de indagação junto dos demais donos de obra do valor de adjudicação, do valor pago e dos trabalhos realmente efetuados que, como resulta dos depoimentos respetivos, não correspondem aos apurados pela inspeção tributária, impõe a conclusão de que o critério e consequentemente o fator de omissão aplicado carece de fundamento e será excessivo. Em face do que se impõe concluir que a Administração Tributária não demonstrou que não dispunha de elementos que lhe permitissem apurar os verdadeiros rendimentos dos impugnantes, sem necessidade de recurso a métodos indiretos, porquanto dos elementos apurados e trazidos ao relatório não resulta, com certeza, ser essa a verdadeira situação patrimonial do impugnante.
De resto, também por via do erro da quantificação, como se deixou expendido, a Administração Tributária não fundamentou nem se mostra inviável o apuramento de outro fator de omissão que conduzisse a resultados diferentes no apuramento da matéria coletável»

Este raciocínio está na origem da discordância do Exmo. Representante da Fazenda Pública que imputa à sentença o vício de contraditoriedade:
«p) Como já se anotou, ou se mostram verificados os pressupostos para a tributação indireta e então cumprirá averiguar da pertinência do critério de quantificação utilizado, incumbindo ao sujeito passivo a demonstração do erro na quantificação, ou então não se verificam os pressupostos para a tributação indireta (a administração fiscal no demonstrou os pressupostos para o recurso a este método), verificando-se, portanto, ilegal decisão de aplicação de métodos indiretos susceptível de anular todo o processado posterior;
q) Assim, caso a Administração Fiscal tenha enveredado por esse caminho — tributação indireta — só poderá ser discutido o acerto do critério de quantificação quando se verifiquem os pressupostos da tributação indiciária;
r) Tendo a douta decisão recorrida decidido simultaneamente pelo erro nos pressupostos de tributação por métodos indiretos e pela errónea quantificação, a mesma padece, nos termos expostos, de contraditoriedade»

A crítica é pertinente, mas não vislumbramos o vício de «contraditoriedade» na sentença porque nos parece que o MMº juiz «a quo» analisou a falta de pressupostos para recurso à avaliação indirecta, os quais, também, alargou à quantificação, assim se entendendo o que acima se expôs: «São estas circunstâncias também que a inspeção tributária não levou em consideração e que põem em causa a decisão de tributação por métodos indiretos (...) O que vale também para o critério de quantificação (…) excessivo».

Não sendo uma metodologia recomendável, também não revela qualquer «contraditoriedade» que afecte a validade da sentença.

Posto isto, vejamos então se estavam reunidos os requisitos para a avaliação indirecta desencadeada pela ATA.

Tratando-se de IRS referente ao ano de 1999 e 2001, o art.º 38º do CIRS, na redação de 1999 dizia o seguinte:
1 – A determinação do lucro tributável por métodos indiciários verificar-se-á sempre que ocorra qualquer dos seguintes factos:
a) Inexistência de contabilidade ou dos livros de registo exigidos nos artigos 111.° e 112.º bem como a falta, atraso ou irregularidade na sua execução, escrituração ou organização;
b) Recusa de exibição da contabilidade, dos livros de registo e demais documentos de suporte legalmente exigidos e, bem assim, a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;
c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com propósito de dissimular a realidade perante a Direcção-Geral dos impostos;
d) Erros ou inexactidões no registo das las operações ou indícios seguros de que a contabilidade ou os livros de registo não reflectem a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido.
2 – A aplicação dos métodos indiciários em consequência de anomalias e incorrecções da contabilidade ou dos livros de registo só poderá verificar-se quando não seja possível a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação do lucro tributável.
(…)
5 – A determinação do lucro tributável por métodos indiciários far-se-á de acordo com o disposto no artigo 52.º do Código do IRC, com as necessárias adaptações.

Em 2001 era o art. 39º do CIRS que previa a tributação por métodos indirectos nesta cédula, remetendo expressamente para os casos e condições previstos nos artigos 87º a 89º da Lei Geral Tributária e segue os termos do artigo 90º da referida Lei e do artigo 54º do Código do IRC, com as necessárias adaptações.

O art.º 54º do CIRC, por seu turno, dispunha que a determinação do lucro tributável por métodos indirectos se baseia em todos os elementos de que a administração tributária disponha, de acordo com o artigo 90º da Lei Geral Tributária e demais normas aplicáveis.

Como se vê, os pressupostos para a tributação por métodos indirectos não divergiam dos previstos na Lei Geral Tributária, em especial aqueles a que se refere os artigos 87º e 88º. O que não surpreende, tendo em conta que a LGT entrou em vigor no dia 1/1/1999 (art. 6º do Decreto - Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro)


À luz dos preceitos invocados quer no CIRS, quer no CIRC, quer ainda na LGT, o apuramento da matéria tributável calcula-se directamente segundo os critérios próprios de cada tributo através de procedimentos objectivos (art. 84º/1 LGT) com vista à determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação (art. 83º/1 LGT)

Para os rendimentos empresariais não decorrentes do regime simplificado a determinação da matéria colectável fazia-se (faz-se) com base na contabilidade (art. 28º/1,b) CIRS/2001) fiável, creditada com a presunção de verdade e boa fé.

Porém, se as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo cessa a presunção de verdade e boa fé nas declarações dos contribuintes e nos apuramentos inscritos na sua contabilidade (art.º 75º/1,2,a) LGT).

E se mercê dessa infidelidade se tornar impossível a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (art.º 87º/1,a) e 88º LGT) há lugar à avaliação indirecta.

Note-se que não são todas as omissões, imperfeições ou deficiências da contabilidade que conduzem à tributação por métodos indirectos, mas apenas aquelas cuja gravidade impossibilite a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (Art.º 87/1,b) e 88 LGT): «Como resulta do preceito legal, a pura e simples verificação das anomalias nele previstas não é, por si só, suficiente para a aplicação de métodos indirectos. É igualmente necessário, no dizer da norma, que essas anomalias “inviabilizem o apuramento da matéria tributável”. É o resultado da subsidiariedade da avaliação indirecta perante a avaliação directa» (António Lima Guerreiro Lei Geral Tributária Anotada, Rei dos Livros, 2000, pp. 371).

Quer isto dizer que se a contabilidade, mesmo imperfeita, permitir a reconstituição dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, não pode a AF lançar mão daquele meio de avaliação da matéria colectável.

Assim, cabendo à AT a demonstração de que estavam reunidos os pressupostos para avaliação indirecta, vejamos se a ATA cumpriu o seu ónus, respigando de seguida a matéria provada mais relevante.

«IV Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos

4.3.1 - Da análise à facturação verificámos que embora existam outras numerações de documentos de vendas registados, somente constavam dos elementos apresentados, as facturas desde o n°1 até ao n° 50.
Dado existirem documentos de venda que não foram apresentados, insistimos, quer com as funcionárias do gabinete de contabilidade quer com o S.p.2, para que os mesmos fossem apresentados, tendo o s.p. referido que os livros não poderiam ser apresentados, em virtude de terem sido furtados, conforme auto de declarações em anexo 02.
No dia seguinte, já constavam dos elementos de escrita, mais documentos, ficando a faltar as facturas desde o n? 450 ao 500, as vendas a dinheiro desde o n° 51 ao n° 251, todas as guias de remessa e todos os recibos.


4.3.2 - Registo das compras

Da análise às compras não se vislumbra qual o destino que lhes é dado, ou seja, as matérias primas adquiridas, não se sabe, em que obra ou obras foram aplicadas. Dado que o s.p. não efectua este tipo de controlo, também não nos é possível, a nós, controlar quer os custos por obra quer a sua valorização em inventário.

4.3.3 - Inventários

Os inventários não discriminam as obras, em curso ou acabadas, constando, tão somente, no livro de existências, o valor que como é óbvio não sabemos a que obra ou obras diz respeito, nem como foi determinado.


Como já foi referido, não nos é possível saber como foi efectuado a imputação dos custos obra a obra, pois não existem meios extra contabilisticos ou contabilísticos (menção na factura do destino das compra das matérias primas) que nos permitam determinar tal conhecimento. Assim, a comprovação da valorização das obras em inventário, é impossível, para além de que a julgar pelos elevados valores estes servem propósitos de mera fuga aos proveitos (prestação de serviços), ao invés de corresponderem às obras em curso ou acabadas no final do ano.

4.3.4 - Omissão de proveitos

4.3.4.1 - Licenças de obras

Desde 1998, levantadas as seguintes licenças (alvará do s.p.):


LICENÇA
ANO
DATA
VALIDA
PORROGAÇ
ANO
LOCAL
INICIO
Ao
FIM
134/98
1998
09-04-1998
04-03-1999
1999
MAGUEIJA
159/98
1998
27-04-1998
16-04-2000
2000
PORTO
CAMBRES
210/98
1998
29-05-1998
13-05-2001
2001
RUA
CALÇADA
CAMBRES
24/99
1999
12-05-1999
30-05-2001
2001
S.JOANINHO
311/99
1999
31-08-1999
15-07-2002
2002
234/99
1999
02-07-1999
25-06-2000
253 DE
2000
FOGUEIRA
01/08/00 ARTEIROS
ATt
23/12/00
112/99
1999
18-03-1999
14-09-1999
348 DE
2001
VIVENDA
01/10/99 LIMA
ATt ORTIGOSA
12/03/01
235/00
2000
14-07-2000
13-09-2000
379 DE
2001
RUA
14/11/00 CALÇADA
ATÉ CAMBRES N"
13/04/01 1020 Andar
154/00
2000
05-05-2000
30-04-2001
204 de
2002
RUA DA
19/06/01 PONTE N"22
ATt 2" ANDAR
29/04/02
261/01
2001
26-07-2001
25-01-2002
2002
LUGARS.
GEAOREIDO
SOL
PENAJÓIA
306/00
2000
11-09-2000
09-03-2002
2002
LUGAR DA
TORRE
PENUDE
364/01
2001
15-10-2001
14-04-2002
2002
LUGAR
ARTEIROS
133/01
2001
29-03-2001
22-04-2002
2002
ZONA
INDUSTRIAL
CASTRO
DAIRE
354/01
2001
29-08-2001
29-08-2003
2003
CASTRO
DAIRE
41/01 2001
12-07-2001
07-01-2002
2002 VACALAR
4.3.4.2 - Valores facturados
Depois de conhecidas as obras realizadas ou a realizar, bem como, o seu início e fim, fomos comparar com a prestação de serviços facturada a cada cliente.
Contudo, como já foi referido, não tivemos acesso à informação constante da facturação efectuada em 1998 e 1999, pois esta corresponde às vendas a dinheiro que não foram apresentadas.
No entanto, verificámos que do livro de registo da prestação de serviços, constam, à frente do registo da venda a dinheiro, os nomes dos clientes, que a julgar correctos irão, em benefício do s.p., ser considerados. Assim, veja-se em anexo 03, o resumo e confronto do levantamento de licenças e respectiva facturação, relativamente ao qual deixamos algumas conclusões:
· Existem obras acabadas, cujas licenças de habitabilidade já foram levantadas, e relativamente às quais não foi facturada a totalidade da prestação de serviços, conforme o próprio s.p. admite no auto de declarações em anexo 02, considerando a "valor de adjudicação" constante do processo entregue na Câmara;
Exemplos:
Obra em nome de:
Valor V. facturado Ano
adjudicação
(31/12/01)
conclusão
A…
10.000.000$
5.100.000$
2000
M…* 1
4.500.000$
4.340.000$
2001
F…
3.307.500$
0$
2001
M…
6.000.000$
7.140.000$
2000
G…
3.800.000$
2.100.000$
2001
A…
1.100.000$
0$
2001
M…*2
8.000.000$
4.070.000$
2001

Embora, tenha havido uma prorrogação (19/06/01 até 29/04/02) à licença inicial (05/05/2000 até 30/04/2001), considera-se que a obra estava pronta em 2001, pois da factura nº 5 consta a indicação de que é o "resto de recebimento da obra em lalim", o que significa que a esta altura, a prestação de serviços, deveria estar toda facturada.

Do exposto, somos levados a concluir ara além das irregularidades objecto de correção no ponto III deste relatório que revelam manipulação de facturação por forma a omitir proveitos existe subfacturação e até omissão de facturação face ao valor estimado.

4.3.4.3 - Valores facturados/contratos firmados/estimativas

Ficou evidente no ponto anterior que relativamente ao valor de adjudicação previsto no processo entregue na Câmara, para obtenção de licença, existe subfacturação ou omissão de facturação e dado termos verificado que, em alguns casos, esta se afasta da estimativa efectuada pelas Câmaras, quisemos comprovar e aproximarmo-nos da realidade, solicitando ao s.p. os contratos firmados com os clientes/donos da obra.
O s.p., apenas, nos apresentou um contrato, relativo à obra do cliente M… e um aditamento ao contrato, relativo ao cliente A..., Lda., os quais apresentamos em anexo 04, e que referem, em resumo, o seguinte:
· A obra de M… foi adjudicada por 13.800.000$00;
· A obra de A… foi adjudicada por 32.000.000$, sendo concluída até 31/01/2002, e que até 01/10/2001, teria o s.p. recebido (a par da correspondente prestação de serviços), o valor de 10.700.000$00
Comentários
· A obra de M… foi adjudicada por 13.800.000$00 e não por 6.000.000$00, conforme estimativa de custo constante de projecto entregue à Câmara (licença 234/99). Para além disso, a obra que está totalmente concluída, ainda não foi totalmente facturada, pois a facturação para este cliente ascende a 7.140.000$00 + IVA (valor superior à própria estimativa). Veja-se a omissão existente entre o valor de adjudicação real e o declarado pelo s.p. como sendo a estimativa de custo da obra, para o cliente.
· A obra de A… foi adjudicada por 32.000.000$00.
Até 01/10/2001, o s.p. recebeu, conforme aditamento ao contrato, o valor de 10.700.000$00, estando facturado o valor de 3.920.000$00+IVA, conforme factura n° 16, registada na escrita do s.p ..
Posteriormente, apurámos que até final do ano de 2001, conforme relação de recebimentos em anexo 05, o s.p. recebeu até final do ano de 2001 mais 5.000.000$00. Agora comparemos os valores recebidos em 2000 e 2001, no quadro a seguir apresentado, com a facturação efectuada pelo s.p. a este cliente:
Data Factura n° Valor (s/ IVA) Observações
15/06/2001 15
3.920.000$00
Da escrita somente consta o duplicado (original
está no cliente), contudo não foi registado, tendo a
indicação de anulada (correcção capítulo III deste
relatório)
16
3.920.000$00
Está registada.
19/12/2001 17
2.818.000$00
O duplicado da factura está contabilizado no s.p.
com o valor de 250.000$00+IV A e datado de
31107/01 (correcção capítulo III deste relatório).
Total 10.658.000$00
Daqui se conclui mais uma vez da existência de subfacturação e omissão de facturação.

4.3.4.4 - Outros indícios de omissão de facturação (prestação de serviços)
Para além dos indícios já descritos, verificámos a existência de outros, através da análise às facturas da EDP ( electricidade). A título de exemplo, os documentos internos n" 13, 35 e 56 de 2000 e documento interno n? 85 de 2001, requisição de electricidade em nome de C…, Rua…- Lamego. Note-se que relativamente a este nome não existe qualquer facturação, nos exercícios cuja facturação foi analisada (1998, 1999, 2000, 2001 e 2002).
Não existe correspondência entre os custo havidos e registados e respectivo retorno.
4.4 - Situação tributária do S.p.

A própria situação tributária do s.p., situação credora de IVA e os parcos resultados para efeitos de IRS não condizentes com a realidade, a julgar pelas necessidades decorrentes dos abatimentos declarados, são reveladores da existência de omissão de proveitos.
4.5 - Em resumo, as irregularidades dos registos, são:

• Irregularidades quando comparados os valores as contraprestações com os valores facturados;
• Irregularidades quando comparados os valores as contraprestações com os valores facturados e os valores de adjudicação reais (contratos firmados com os clientes);
• Falta de registo de operações financeiras, fluxos financeiros (importâncias inscritas nos recibos) relativa a prestação de serviços não reconhecidos como proveitos;
· Irregularidades nos inventários;
· Falta de apresentação de elementos, documentos de vendas, recibos, etc;
A insuficiência de elementos quanto à actividade desenvolvida e quanto à organização escritural, impossibilitam a quantificação directa e exacta da matéria tributável, preenchendo, assim, as condições legais do artigo 88° da LGT, designadamente na sua alínea a) e d), pelo que se propõe a aplicação dos métodos indirectos.

Parece relativamente claro que estes factos são demonstrativos de que a contabilidade da impugnante, ora recorrida, não merece credibilidade e que se torna impossível através dela comprovar directa e exactamente a matéria colectável do sujeito passivo.

O MMº juiz «a quo» também admitiu que a contabilidade da impugnante não merecia credibilidade (fls. 25 da douta sentença). Porém, considerou não terem sido esgotadas «todas as possibilidades de obtenção da informação que porventura permitisse a comprovação direta da matéria tributável. Referimo-nos concretamente ao possível e eventual contacto com os donos de obra. Apesar de a Srª Inspetora vir referir no seu depoimento que tal contacto será impossível, a verdade é que não fica demonstrado que ele haja sido tentado, como também resulta do depoimento das testemunhas donos de obra que tal contacto nunca existiu. Se, porventura ele houvesse sido feito, poder-se-iam ter obtido elementos que melhor caracterizassem a situação contributiva do impugnante.»

Sabendo-se que a contabilidade do impugnante não merecia credibilidade, e impossibilitava o apuramento da matéria colectável, não recai sobre a ATA o ónus de contactar com os donos da obra para obter a comprovação directa da matéria tributável. Isso não só não constitui encargo da ATA - genericamente falando, porque pode haver casos em que tal se justifique e imponha – como essa não poderia ser uma solução aceitável uma vez que jamais se obteria, por essa via, a comprovação directa da matéria tributável. Basta vermos o número de facturas em falta, as vendas a dinheiro, todas as guias de remessa e todos os recibos em falta. Para além de não ser possível escrutinar o destino dado às compras, os inventários não discriminarem as obras em curso e desconhecer-se – nem haver possibilidades de conhecer - como foi efectuada a imputação dos custos obra a obra.

Afigura-se-nos por isso, não ter razão o MMº juiz «a quo» quando decidiu não estarem verificados os pressupostos para a avaliação indirecta da matéria tributável.

E também não acompanhamos o MMº juiz «a quo» quando, analisando a falta de fundamentação, decidiu que «a Administração Tributária não demonstrou com clareza suficiente as razões pelas quais concluiu que não era possível quantificar de forma directa e exacta a matéria tributável porquanto não esgotou os meios de que poderia dispor para determinar a real situação tributária do impugnante, pelo que não cumpre a Fazenda Pública o ónus de prova que lhe incumbia para o efeito e em face do que não se encontra fundamentada a sua decisão de recurso a métodos indirectos para determinação da matéria coletável do impugnante.».

Tendo em conta o que acima ficou exposto, e os critérios previstos no art. 77º/1, e 2 da LGT, cremos que qualquer bonus pater familiae alcança as razões factuais e jurídicas que estão na génese do acto. A exposição revela-se clara, congruente e suficiente, habilitando o contribuinte a conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração para a determinação do acto (cfr. Ac. do STA n.º 01690/13 de 23-04-2014 (Relator: ASCENSÃO LOPES) Sumário: I - A Administração Tributária tem o dever de fundamentar os actos de liquidação impugnados de harmonia com o princípio plasmado no art. 268º da CRP e acolhido nos arts. 125º do CPA e 77 º da LGT.
II - O acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.).

Poder-se-ia questionar a valia substancial dos fundamentos para recurso à avaliação indirecta indagando se os mesmos são suficientes e (ou) verdadeiros; mas isso contende com a fundamentação substancial do acto que se reconduz a vício de violação de lei e não com a sua fundamentação (formal) (Cfr. ac do STA n.º 0494/11 de 28-09-2011 (Relator: DULCE NETO) III - O facto de, porventura, a valia substancial dos fundamentos aduzidos no discurso fundamentador ser insuficiente ou inapta, do ponto de vista legal, para suportar a correcção efectuada, é matéria que não contende com a fundamentação formal do acto, mas sim com a sua fundamentação substancial. IV - Se os elementos que a Administração aduziu no discurso administrativo fundamentador não são suficientes nem adequados para suportar a conclusão a que chegou sobre a dispensabilidade do custo e erro na sua quantificação, impedindo que se tenha como pertinente o juízo que elaborou no sentido de que o contribuinte apurou uma menos-valia superior à devida e que deduziu, assim, um custo indevido, a questão relativa à legalidade do seu agir terá de ser resolvida contra ela, o que determina a procedência da impugnação por falta de fundamentação substancial, reconduzida a vício de violação de lei por falta de verificação dos pressupostos factuais e jurídicos necessários àquela correcção.

Mas nem uma nem outra estão ausentes do discurso fundamentador da ATA, pelo que não sufragamos nesta parte a decisão do tribunal «a quo».

Quanto ao erro na apreciação da prova e ao excesso na quantificação.
Neste segmento analisaremos a aptidão da prova testemunhal para provar o excesso na quantificação, por um lado e se foi impugnada validamente a matéria de facto provada. Resolvida estas questões, veremos se o excesso na quantificação foi efectivamente provado.

Efectivamente, o ERFP pretende questionar a matéria de facto provada respeitante ao excesso na quantificação, sem pôr em causa a idoneidade das testemunhas.
Defende que a
z) (…) a prova da factualidade alegada não pode ser feita por mera prova testemunhal, devendo a mesma, necessariamente, ser complementada por idónea prova documental, a qual, a ser verdade, teria que ser revelada na contabilidade do impugnante;
aa) De realçar que nenhum documento foi apresentado pelo impugnante, nem tão pouco por tais donos de obras, assim inviabilizando, a confirmação externa do alegado;
bb) Verifica-se, portanto, uma ausência de prova que resultou da não observância dos deveres instrutórios que impendiam sobre o impugnante, nos termos do n.° 3 do art.° 74° da LGT (através de prova positiva e direta do excesso na quantificação);
cc) Ora, na situação em apreço nada disso foi demonstrado pelo sujeito passivo, como lhe incumbia, nos termos atrás expostos;

A prova em causa respeita ao cumprimento do ónus que recai sobre o contribuinte, alvo de tributação por métodos indirectos, de demonstrar o excesso na quantificação (art. 74º/3 LGT). Mas ao contrário do que parece defender o Exmo. Representante da Fazenda Pública, a lei não restringe a prova do excesso na quantificação a qualquer meio específico. Pelo contrário, neste caso como em muitos outros, são admitidos os meios gerais de prova, como dispõe o art 115º/ 1 do CPPT.

Mas se a prova testemunhal não pode ser excluída no processo judicial tributário em geral, ela terá de ser apreciada e valorada com redobradas cautelas, filtrada com sageza e contextualizada com toda a restante prova produzida, de modo a evitar que a sua reconhecida falibilidade «contamine» a decisão de uma forma inaceitável.

Essa ponderação constitui o papel inalienável do juiz na apreciação da prova com vista à descoberta da verdade material. É no apuramento da verdade relativa aos factos que (lhe é lícito conhecer) «… o juiz exercita o núcleo, a excelência, do seu múnus, é nesse momento que tem de fazer jus à sua condição de julgador, que se lhe impõe o acertado e responsável exercício do poder de julgar, aqui ao serviço da melhor, mais justa e equitativa, apreensão e tradução da realidade, da verdade, dos factos, com relação aos quais importa, sequentemente, aplicar o direito, tarefa, sobretudo, de cariz e apuro técnico (acessível, pois, a qualquer cultor do direito), determinada, condicionada, pelo quadro factual previamente traçado.» (ac. deste TCAN n.º 00482/08.2BECBR de 30-04-2014 in www.dgsi.pt)

Assim, reconhecida a admissibilidade da prova testemunhal na demonstração do excesso da quantificação, vejamos se ocorreu o erro de julgamento na apreciação dos factos relevantes e que são os provados sob os nsº 7, 8, 9 e 11 da sentença.

O erro no julgamento da matéria de facto ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto (ac. deste TCAN n.º 00390/05.9BEBRG de 30-10-2014 Relator: Cristina Flora).

O erro deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem desse erro; e fundamentar as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.

É o que resulta do art.º685-B) do CPC (correspondente ao actual 640.º/1 do NCPC, com alterações):
“1- Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento no erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.

O incumprimento destas regras, acarreta, como expressamente diz a lei, a rejeição do recurso (na parte afectada), não havendo lugar a despacho de aperfeiçoamento relativamente ao recurso da decisão da matéria de facto. Como refere António Abrantes Geraldes (in Recursos em Processo Civil – Novo Regime. Almedina, 2008, pp. 146 e segs..
A rejeição do recurso, na parte respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto;
b) Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
c) Falta de especificação dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.
d) Falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda, quando tenha sido concretamente executada pela secretaria a identificação precisa e separada dos depoimentos;
e) Falta de apresentação da transcrição dos depoimentos oralmente produzidos e constantes de gravação quando esta tenha sido feita através de mecanismo que não permita a identificação precisa e separada dos mesmos;
f) Falta de especificação dos concretos meios probatórios oralmente produzidos e constantes de gravação quando, tendo esta sido efectuada por meio de equipamento que permitia a indicação precisa e separada, não tenha sido cumprida essa exigência por parte do tribunal…»

Adianta o mesmo autor que estas exigências «..devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, próprio de um instrumento processual que visa pôr em causa o julgamento da matéria de facto efectuado por outro tribunal em circunstâncias que não podem ser inteiramente reproduzidas na 2.ª instância» (op. cit. pp 147)

Ora, tendo em conta o exposto, o recurso não pode deixar de ser rejeitado na parte em que impugna a decisão da matéria de facto por manifesta falta de cumprimento do ónus previsto no art. 685º-B do CPC.

Embora o recorrente indique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (factos n.º 7, 8, 9, e 11), não menciona quais os meios probatórios que impunham decisão diferente da recorrida, parecendo antes desconsiderar a prova testemunhal porque
a prova da factualidade alegada não pode ser feita por mera prova testemunhal, devendo a mesma, necessariamente, ser complementada por idónea prova documental, a qual, a ser verdade, teria que ser revelada na contabilidade do impugnante; De realçar que nenhum documento foi apresentado pelo impugnante, nem tão pouco por tais donos de obras, assim inviabilizando, a confirmação externa do alegado (conclusões z e aa);

Mas não é assim, como vimos.

O art.º 712 do CPC permite a alteração da decisão sobre a matéria de facto, (nalguns casos mesmo oficiosamente), mas não pode ela basear-se na mera discordância sobre a valoração da prova alegada por uma das partes. A mera discordância sobre a valoração da prova testemunhal e sobre a convicção do julgador, sem identificação ou concretização do vício lógico em que este incorreu, não autoriza uma alteração da matéria de facto. Tal alteração só poderia ocorrer em caso de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi anteriormente considerado (cfr. Ac. do TCAS n.º 07219/13 de 29-05-2014 (Relator: BENJAMIM BARBOSA).

Vejamos agora se o contribuinte logrou provar o excesso na quantificação.
Demonstrados os requisitos para a determinação da matéria colectável por métodos indirectos, o sujeito passivo pode opor-se com sucesso à liquidação mediante prova do excesso na sua quantificação (art.º 73º/3 LGT) , sem prejuízo de a partir da prova efectuada poder resultar fundada dúvida sobre a quantificação (ou existência) do facto tributário (art.º 100º/1 CPPT).

Porém a fundada dúvida sobre a quantificação não pode ser uma dúvida de «partida», mas antes o resultado de um «percurso» probatório empreendido pelas partes, no termo do qual o julgador se confronta com uma dúvida inultrapassável pela prova. Isto porque a norma do art.º 74º/3 LGT devidamente articulada com o disposto nos art.º 100º/1 CPPT e 516º do CPC ( art. 414º do NCPC), leva-nos a concluir que só após o labor probatório do onerado com vista à demonstração do excesso na quantificação se poderá concluir que esta não revela o mínimo de segurança jurídica, - por estar desfasada da realidade, ou por assentar em pressupostos infirmados, ou por o critério usado ser ostensivamente desadequado, - concluindo-se então, haver dúvida sobre a quantificação.

Antes desse esforço probatório a dúvida, como ponto de partida, não é fundada, e não se pode repercutir na validade da liquidação; deve antes ser dissipada pela ação probatória em função do ónus que cada um suporta (Como salientam Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Procedimento e de Processo Tributário comentado e anotado, Almedina, 2000, pp. 236: «A dúvida que implica a anulação do acto impugnado não pode considerar-se «fundada», se assentar na ausência ou na inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante. Este não deve limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida «a existência e quantificação do facto tributário». Cabe-lhe o ónus da prova de tais factos, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder –dever inquisitório, diligenciar também comprová-los. Só mediante a prova concludente de tais factos é que é possível concluir-se pelo fundamento daquela dúvida).

Como se refere no ac. do TCAS n.º 04335/10 de 18-10-2011 (Relator: ANÍBAL FERRAZ) 2. Sendo característico das situações apontadas por lei como de impossibilidade de avaliação directa da matéria tributável o aparecimento de dúvidas sobre a quantificação real, inerentes e consequentes da utilização de métodos indirectos, que, actuando indicadores, sempre e só podem alcançar um valor aproximado do que provavelmente a matéria tributável efectiva terá tido, só é viável e legalmente sustentável uma decisão no sentido da anulação do acto tributário impugnado, por alegado erro em sede de quantificação da matéria tributável, caso o impugnante, sem reticências ou necessários reparos, demonstre, comprove, a ocorrência de “erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada”.

3. Assim, não aproveita ao impugnante uma actuação processual e, sobretudo, probatória, direccionada e orientada pelo, simplista e preguiçoso, objectivo de suscitar dúvida, ainda que fundada, sobre a quantificação do facto tributário. É imprescindível um desempenho pautado pela concreta e circunstanciada alegação de factos que, uma vez provados, sejam idóneos a comprovar, a demonstrar, com uma certeza adequada e passível de ampla aceitação, a aduzida errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável.

Conseguiu o impugnante demonstrar a ocorrência de erro manifesto ou excesso na quantificação da matéria tributável, sem reticências ou necessários reparos?

Estamos em crer que sim, tendo em conta a prova fixada nos factos n.º 7, 8, 9 e 11.
Recorde-se que quantificação da matéria tributável a ATA aplicou o factor de omissão correspondente a 1.9658 ao valor estimado pelo sujeito passivo como sendo o custo da obra.

Assim, para a obra de A…, o valor estimado pelo sujeito passivo foi de 10.000,00 mas o valor presumido foi de 19.658.330 = (10.000x1,8658).
Para a obra de M..., o valor estimado pelo sujeito passivo foi de 4.500,00 mas o valor presumido foi de 8.846.249;
Para a obra de F… o valor estimado pelo sujeito passivo foi de 3.307.500, mas o valor presumido foi de 6.501.993.
Para a obra de G… o valor estimado pelo sujeito passivo foi de 3.800.000, mas o valor presumido foi de 7.470.165.

Provou-se no primeiro caso (A...) que o impugnante apenas recebeu 5000 contos, uma vez que não concluiu a obra (facto provado n.º 7)
No segundo caso (M...) o impugnante apenas recebeu 3000 contos. Também não concluiu a obra (facto n.º 8);
No terceiro caso (F…), o impugnante foi substituído na execução da obra (facto n.º 9).
No quarto caso (G…) o impugnante apenas recebe entre 3000 e 3600 cts. não tendo concluido a obra por falta de meios económicos do dono desta (facto n.º 11).

Ou seja, para uma matéria colectável presumida de 42.476.737, o impugnante apenas recebeu 11600 cts (desconhece-se o valor recebido de F…)

Podemos portanto, concluir de forma segura que o impugnante demonstrou com sucesso haver excesso na quantificação da matéria tributável, pelo que as liquidações enfermam de ilegalidade. Não porque a ATA não tenha fundamentado a quantificação, como a determinado passo diz o MMº juiz «a quo», mas sim porque a o impugnante logrou provar que tal quantificação foi excessiva, como de resto era seu ónus.

Assim, o recurso não poderá proceder.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e, com outros fundamentos, confirmar a sentença recorrida.

Custas pela ATA.
Porto, 16 de Abril de 2015.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira