Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00002/04 - CA |
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Secção: | 1ª - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 05/20/2004 |
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Tribunal: | TAF do Porto - 2º Juízo |
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Relator: | Dr. Lino José Baptista Rodrigues Ribeiro |
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Descritores: | INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÃO (ART. 104º CPTA) OBJECTO DEVER DE INFORMAÇÃO CERTIDÃO/CERTIFICADOS INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE |
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Sumário: | I. Esta forma processual destina-se a assegurar o direito à informação procedimental em todas as suas modalidades [direito à prestação de informações (art. 61º CPA); o direito à consulta de processos e o direito à passagem de certidões (art. 62º CPA)] e à extra-procedimental e não à obtenção de um acto administrativo que se julga devido, porquanto o facto de ter de haver necessariamente um acto contrário ao acto autorizado não implica que este processo constitua o meio adequado a obrigar a Administração a emitir esse acto, a proferir juízos sobre a situação jurídica administrativa ou a reagir contra um acto administrativo. II. Certidões são documentos emitidos por entidades públicas que atestam a existência ou inexistência de um certo documento ou registo. III. Só existe o dever de passar certidão se a entidade requerida possuir o(s) documento(s) a que se reporta a certidão pelo que apenas nesse condicionalismo o tribunal pode intimar a Administração. IV. O dever de informação abrange, além das certidões, também os certificados que são documentos autênticos através dos quais uma autoridade pública atesta a existência de factos e situações por si praticados ou por si constatados. V. O fornecimento de certos elementos do procedimento (seu início, objecto, estado ou a decisão tomada ou a falta dela – art. 63º CPA) é feito, em rigor, através de certificados e não de certidões já que se trata de revelar factos de que a autoridade tem conhecimento e não de fornecer cópias de documentos constantes do procedimento. VI. Como neste tipo de situações não há diferenças substanciais entre o certificado e a informação directa, pois, o tipo de informação que através deles se pode veicular é o mesmo, então o conhecimento de que a Administração tem de factos ou situações não vertidos em documento pode ser fornecido ao particular através de simples ofício sem que com isso este possa invocar incumprimento do dever de informação. VII. Assim, se na pendência de acção a Administração requerida, através de ofício, comunica à requerente de que não houve qualquer acto administrativo expresso sobre requerimento que a mesma havia formulado deve ter-se como cumprido o dever de informação e como tal deve julgar-se inútil a lide supervenientemente. |
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Recorrente: | A. |
Recorrido 1: | Presidente do Conselho de Administração Hospital Geral Santo António, SA |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Negar provimento ao recurso |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte 1. O Sindicato …, com sede na Av. D. Carlos I, nº …, Lisboa, interpõe recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 8 de Março de 2004, que julgou extinta a instância por satisfação do requerido na pendência do pedido de intimação para prestação de informação deduzida contra o Presidente do Conselho de Administração do Hospital de Santo António, SA. do Porto. Juntou a respectiva alegação, na qual enuncia os vícios imputados à decisão que resume no seguinte: a) A douta sentença recorrida julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, porque decidiu que o pedido já fora satisfeito uma vez que se informara que a entidade recorrida não praticou acto algum conforme se poderá atestar pelo "parecer" apropriado pela resposta; b) Só que o mesmo "parecer" alega que: «daí que, no caso "sub-judice", a única coisa que poderá certificar-se é a própria inexistência de acto a permitir a continuidade do horário acrescido em causa para além da mencionada data de 31-10-03.»; c) Contudo, sobre esta possibilidade de certificar, a douta sentença agravada não se pronuncia; d) Ora, conforme decidiu a douta sentença tirada no proc. n.° 36/04 do T.A.F.P., a não existir acto administrativo relacionado com a cessação do regime de horário acrescido que a requerente vinha fazendo, terá a entidade requerida que certificar isso mesmo; e) Isto é, a inexistência de acto administrativo a retirar o regime de horário acrescido. f) Andou mal a douta sentença agravada ao decidir que o pedido de intimação já fora satisfeito - não existe acto - e, consequentemente ao decretar a inutilidade superveniente da lide; g) Isto porque, violou, a douta sentença, o disposto no n.° 5, do art. 55º, do D.L. 437/91 de 8/11, isto é, o regime de horário acrescido devidamente autorizado só pode ser retirado com os fundamentos insertos nessa norma; h) Ou seja, terá de haver um acto contrário ao acto autorizado e nunca a existência de caducidade automática (do acto autorizado) e sem necessidade de prolação dum acto administrativo expresso, isto porque a isso se opõe o n.° 5 do art. 55° do D.L. 437/91; i) Por isso, deve ser revogada a douta sentença recorrida por ter violado os artigos 55, n.° 5, do D.L. 437/91 e art. 287, alínea i) do C.P.C. "ex vi" do art. 1 do C.P.T.A. A entidade recorrida contra-alegou, juntando decisões do TAF do Porto que em casos iguais decidiu no sentido da como a decisão recorrida. O Ministério Público junto deste tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. 2. A decisão recorrida deu como assente os seguintes factos: a) Em 2003-12-26 M…. requereu ao Presidente do Conselho de Administração do Hospital Geral de Santo António S.A. que lhe certificasse «quem foi o autor do acto que lhe retirou, ilegalmente, o regime de horário acrescido referente ao mês de Novembro de 2003; a enunciação dos factos que deram origem a esse acto de lhe retirarem o regime de horário acrescido referente ao mês de Novembro de 2003; a fundamentação de facto e de direito para tal decisão; a decisão em si; e a data em que foi praticado - cfr. doc. n° 3 junto com a p.i.; b) Em 2004-02-11 o Hospital Geral de Santo António S.A respondeu a M…, anexando fotocópia do parecer do consultor jurídico daquele Hospital informando que o «"regime de horário acrescido", ficou limitado logo de início, ao período de duração provável de 1 mês (..). Nessa continuidade a requerente beneficiou do mencionado regime de 01/10/03 a 31/10/03, data esta última a partir da qual deixou de ser apresentada qualquer proposta de atribuição de horário acrescido por parte do referido Enfermeiro Director ( ..). Assim sendo, e porque se trata de acto inexistente (cfr. art° 133°, 137° n° 1 e 139°, n° 1 alínea a), (por interpretação extensiva) do CPA), não pode o mesmo ser certificado, nem quanto ao seu autor, nem quanto ao respectivo objecto, nem quanto aos motivos que lhe estiveram subjacentes, nem quanto aos demais elementares cuja certificação se requer, já que, obviamente, não pode certificar-se aquilo que não existe, nem alguma vez existiu.» - cfr. doc. junto com a resposta. 3. O thema decidendum resume-se a duas questões: se a decisão recorrida violou o n.° 5, do art. 55º do D.L. 437/91 de 8/11 e se o direito à informação procedimental foi integralmente satisfeito. Quanto à primeira questão, entende a recorrente que tem que existir um acto administrativo expresso a retirar o regime de horário acrescido devidamente autorizado e, como não existe, andou mal a sentença ao decidir que o pedido já foi satisfeito. Mas, tendo em conta a finalidade do meio processual intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões previsto no artigo 104º do novo CPTA, não podemos seguir o raciocínio da recorrente. Na verdade, aquela forma processual destina-se a assegurar o direito à informação procedimental em todas as suas modalidades e não à obtenção de um acto administrativo que se julga devido. A função da intimação, como meio processual acessório ou autónomo, esgota-se na tutela do direito à informação procedimental e extra-procedimental regulado nos artigos 268º, nº 1 e 2 da CRP e nos 61º a 65º do CPA. Como resulta, de forma bem explícita, do artigo 104º referido, o processo de intimação destina-se exclusivamente à tutela dos “pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos”, não abrangendo, pois, a tutela da prática de um acto legalmente devido. O facto de “ter que haver, necessariamente, um acto contrário ao acto autorizado”, não implica que o processo de intimação constitua um meio adequado a obrigar a Administração a emitir esse acto. A pretensão da recorrente em continuar a exercer funções em regime de horário acrescido ou da prolação de um acto administrativo que legalmente faça cessar tal regime pode ser obtida através de formas de acção mais adequadas à tutela desses interesses. Até pode existir alguma semelhança entre o meio processual intimação e outros, como a acção administrativa comum ou a acção administrativa especial para condenação em acto devido, em que também se pode solicitar ao tribunal a imposição à Administração de determinados deveres. Mas a diferença entre eles é profunda, na medida em que a intimação para a obtenção de informação nunca é dirigida à prática de acto administrativo, nem em qualquer circunstância, envolve a uma reacção contra um acto administrativo. O que o autor pretende com esta forma de acção é apenas a obtenção de uma informação cujo cumprimento por parte da Administração envolve a prática de actos internos, operações materiais e não a prática de estatuições autoritárias. O próprio acto de recusa da informação solicitada não é visto hoje como um acto administrativo susceptível de recurso contencioso de anulação (cfr. Raquel de Carvalho, O Direito à Informação Administrativa Procedimental, pág. 258). O direito à informação administrativa traduz-se num poder de exigir da Administração o cumprimento de uma prestação de facto – a prestação de informação – e não a prática de uma acto administrativo. Por isso mesmo, o meio processual previsto na lei para a efectivação daquele direito não pode ser idóneo para obrigar a Administração a emitir juízos sobre a situação jurídica administrativa ou a praticar um acto administrativo (cfr. Ac. do STA de 14/8/96, in AD nº 422, pág. 152). Quanto à segunda questão, entende a recorrente que a entidade recorrida deve certificar a inexistência de acto administrativo a retirar o regime de horário acrescido e, por isso, não há lugar à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide. Não está em causa o direito subjectivo à informação procedimental, porque sobre esse nenhuma dúvida há que a recorrente o possui, mas o modo de cumprimento do pedido feito à Administração. Como está documentado nos autos, sobre esta questão o TAFP emitiu decisões de sentido oposto: num caso, considerou-se que a informação fornecida ao requerente de que não existia acto administrativo a retirar o horário acrescido era suficiente e noutro, apesar dessa informação, ordenou-se a intimação para passagem de certidão onde constasse a inexistência daquele acto administrativo. O CPA prevê três formas distintas de exercitar perante a Administração o direito à informação procedimental: o direito à prestação de informações (art. 61º); o direito à consulta de processos e o direito à passagem de certidões (art. 62º). A informação directa, a consulta de documento e a passagem de certidões constituem assim três modalidades do direito à informação procedimental, a que corresponde três prestações típicas através das quais a Administração o pode satisfazer. A lei não coloca estes modos de exercício do direito em planos distintos de prioridade, mas sim ao mesmo nível de utilização. O artigo 61º estabelece que os particulares têm direito a ser informados “sempre que o requeiram”, o que significa que se trata de um direito que se encontra na exclusiva vontade do seu titular. E porque depende da iniciativa do seu titular, compete-lhe escolher o modo que melhor sirva os seus desígnios. A utilização de qualquer uma das modalidades ou até de duas delas (v.g. consulta e passagem de certidões) está na disponibilidade do requerente, pois só ele sabe, afinal, qual é o meio que melhor satisfaz o seu direito à informação. Apesar de estar na disponibilidade do interessado escolher o tipo de prestação que pretende da Administração, a esta cabe, contudo, sindicar a legitimidade do requerente, verificar se existem limites ao exercício do direito e verificar se o meio pretendido corresponde à forma que legalmente deve observar. Na verdade, se o requerente não for um “directamente interessado” ou não tiver “interesse legítimo” no procedimento ou se a informação pretendida estiver contida em documentos classificados ou revelem segredo comercial ou segredo relativo à propriedade literária, artística ou artística, não está a Administração obrigada a fornecer a informação solicitada. De igual modo, não será adequado através de informação directa prestar informações que constam de certidão ou passar certidão de factos que não constem de documentos. Se o particular escolher ser informado através da passagem de certidão, naturalmente que só existe o dever de informar se a entidade requerida possuir o(s) documento(s) a que se reporta a certidão. É que as certidões são documentos emitidos por entidades públicas que atestam a existência ou inexistência de um certo documento ou registo. A entidade administrativa reproduz, transcreve ou resume total ou parcialmente (consoante seja de teor ou narrativa) o conteúdo do documento ou declara que certo documento (certidão negativa). Ora, não existirá o dever de informação para a Administração, nem o processo de intimação pode ser accionado, se for requerida certidão de factos que não estão contidos em documentos pré-constituídos e existentes nos serviço solicitado. A Administração só está vinculada a passar a certidão e o tribunal só a pode intimar se existir documento contendo a informação a certificar. Para além das certidões, o dever de informação abrange também os certificados, que são documentos autênticos através dos quais uma autoridade pública atesta a existência de factos e situações por si praticados ou por si constatados. O fornecimento de certos elementos do procedimento, como o seu início, objecto, estado ou a decisão tomada ou a falta dela (cfr. art. 63º), em rigor, é feito através de certificados e não de certidões, pois trata-se de revelar factos de que a autoridade tem conhecimento e não de fornecer cópias de documentos constantes do procedimento. Neste caso, do ponto de vista substancial, não há diferenças entre o certificado e a informação directa, pois, o tipo de informação que através deles se pode veicular é o mesmo. Em ambos os casos a Administração exprime oficialmente o conhecimento de factos ou situações que não se encontram incorporados em documentos do procedimento. Ora, como o conhecimento de que a Administração tem de factos ou situações não vertidos em documentos, embora deles decorrentes, pode ser fornecido ao particular através de simples ofício, não se pode considerar como não cumprido ou cumprido de forma suficiente se em vez do certificado for remetido ao requerente um ofício que contenha a mesma informação (ou até mais) que a pretendida através de certificado. As diferenças formais entre os dois meios de comunicação da informação não relevam para efeitos de cumprimento ou incumprimento do dever de informação. É que, o que satisfaz integralmente o direito à informação não é o “acto de certificação”, mas o facto ou situação que ele certifica. Se o cumprimento do dever de informação não é o acto certificativo mas a comunicação do facto certificado, então, se este é dado a conhecer através de ofício está cumprido aquele dever. Atenta a natureza instrumental do certificado e do ofício, a eventual irregularidade resultante da troca de um pelo outro será irrelevante sempre que mostre verificado o facto ou realizado o objectivo que mediante eles se visava atingir. No caso concreto, a recorrente solicitou “certidão” de quem foi o autor do acto que lhe retirou, ilegalmente, o regime de horário acrescido referente ao mês de Novembro de 2003, a enunciação dos factos que deram origem a esse acto, a fundamentação de facto e de direito para tal decisão, a decisão em si e a data em que foi praticado. A recorrente parte do princípio de que existe um acto e, como dele não foi notificada, requer informação sobre os elementos essências e estruturais que o compõem. Se a Administração tivesse emitido uma declaração de vontade com esse sentido, na forma escrita ou na forma oral, mas reduzida a escrito, os escritos que reproduzem essa declaração tinham que ser fornecidos por meio de certidão. Todavia a entidade recorrida, através de ofício, comunicou à recorrente na pendência da acção que não houve qualquer acto administrativo expresso a retirar-lhe o horário acrescido. Ora, para o efeito em causa, tanto faz dizer que “ informo que não houve acto administrativo” como “certifico que não houve acto administrativo”. A informação solicitada não pode ser prestada simplesmente porque o acto não existe. Neste caso, não se pode dar por não cumprido o dever de informação só porque a informação de que não existe acto foi transmitida por ofício e não através de certidão negativa. Repare-se que o requerente não solicitou que lhe fosse passada certidão de que não existia acto, mas sim certidão do acto e seus fundamentos. Portanto, a informação e esclarecimentos dados através da remessa do parecer jurídico constante de fls. 32 e 33 dos autos mostra-se suficiente para responder ao requerimento da recorrente e informá-la de que o que pediu não pode ser satisfeito porque não existe. Com esta informação, dispõe a recorrente de todos os elementos para agir judicialmente, utilizando as formas processuais adequadas à tutela do direito que diz ter sido violado, sem necessidade de através deste procurar um acto administrativo para recorrer contenciosamente. Não faltam hoje formas apropriadas à defesa de direitos lesados por condutas que não assumem à forma de acto administrativo. 4. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso jurisdicional. Sem custas (art. 73º – C, nº 2, al. b) do CCJ). Porto, 20-05-2004 Lino José B. Rodrigues Ribeiro João Beato O. Sousa Maria Isabel S. Pedro Soeiro |