Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02105/11.3BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/05/2012
Tribunal:TCAN
Relator:Maria do Céu Dias Rosa das Neves
Descritores:SUSPENSÃO EFICÁCIA
ART. 120.º CPTA
PERICULUM IN MORA
ANTECIPAÇÃO JUÍZO PRINCIPAL - ART. 121.º CPTA
Sumário:I – Não se mostra preenchido o requisito previsto na al. a), do nº 1, do artº 120º do CPTA, quando as ilegalidades apontadas ao acto suspendendo não se apresentam como flagrantes, antes obrigando o julgador a proceder a uma tarefa peculiar de escrutínio e a um trabalho de análise, o que, por si só é demonstrativo da falta de evidência da procedência das mesmas.
II – Igualmente não se mostra preenchido o requisito previsto na al. b) do mesmo normativo – prejuízos de difícil reparação – quando a alegação é demasiado genérica [… o Aviso de abertura, a subsequente admissão/aprovação (…) e a sua inclusão na “lista final”, bem como, a designação do seu destino (refª ao centro de emprego que lhe foi distribuído) … implicou rescisão e celebração de contratos de arrendamento e mudanças de estabelecimentos escolares dos filhos … e que os danos que … resultarão, necessariamente da não adopção da providência, serão relevantes, desmesurados e, pela natureza das coisas, irreparáveis ou de difícil reparação”].
III – Para que se antecipe a tutela cautelar em tutela final urgente é necessário que se mostrem preenchidos os seguintes requisitos:
a) um requisito substantivo que se traduz na natureza das questões colocadas e gravidade dos interesses em presença permitirem concluir que existe uma “manifesta urgência na resolução definitiva do caso”;
b) um requisito processual que impõe que após contraditório, com a audição das partes e posições pelas mesmas manifestadas, o tribunal se sinta em condições de decidir a questão de fundo por dispor de “todos os elementos necessários para o efeito”.
IV – Inexistindo acção principal, por não ter sido intentada, é manifesta a inverificação dos referidos requisitos, pois que se não pode antecipar uma decisão final do processo principal se este não existe.*
*Sumário elaborado pelo Relator
Data de Entrada:05/24/2012
Recorrente:I. ... e outros
Recorrido 1:Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Nega provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Deverá ser negado provimento ao recurso
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO:
IT. …, AB. …, SR. …, MO. …, MS. …, OF. …, MC. …, SL. … e LO. …, devidamente identificados nos autos, interpuseram recurso jurisdicional da sentença proferida no TAF de Braga em 30/03/2011, que “… indeferiu o pedido de suspensão de eficácia da deliberação proferida pelo Conselho Directivo do Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P., em 14 de Novembro de 2011, nos termos da qual foi deliberado revogar parcialmente a deliberação proferida pelo referido órgão em 20 de Dezembro de 2010, que havia homologado a lista de classificação final do concurso destinado ao preenchimento de 70 postos de trabalho na carreira de técnico superior, excluir os ora requerentes da referida lista de classificação final, bem como homologar nova lista de classificação final do referido concurso”.
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Formulam para o efeito as seguintes CONCLUSÕES que aqui se reproduzem:
«1 – O acto impugnado (deliberação de 14.11.2011, do IEFP) é - conforme decorrerá, designadamente, do aduzido supra nos pontos 4 a 11; 12 a 14; 14; 15 - nulo, sendo que um acto nulo é equiparável, nos seus efeitos, à inexistência jurídica, podendo ser conhecida (v.g.) por qualquer tribunal perante o qual a nulidade do acto seja invocada, mesmo que incidentalmente (ponto 16), podendo a nulidade do acto administrativo ser conhecido oficiosamente (ponto 17).
II - O Meritíssimo Juiz a quo, não obstante ter discorrido doutamente sobre os factos relacionados com a nulidade da deliberação em crise (de 14.11.2011), dela não conheceu expressamente. Todavia, o tribunal de recurso poderá, agora, fazê-lo, nos termos e ao abrigo, v.g., do disposto no artº 149ºdo CPTA.
III - Atento o aduzido no ponto 17 das presentes alegações, a pretensão dos ora Recorrentes (suspensão da eficácia da deliberação do IEFP, de 14.11.2011), porque subsumível à previsão da al. a), do nº 1, do artº 120º, CPTA, deveria (deverá) ser julgada procedente.
IV - Assim como procedente deveria ter sido (deverá ser) à luz das previsões do citado artº 120º, nº 1, als. b) e c) – pontos 18º e 19º das presentes alegações.
V - Salvo o devido respeito, aos recorrentes parece ocorrerem, no caso, razões para proceder-se à convolação da tutela cautelar em tutela final, que deverá concretizar-se na antecipação da decisão final, nos termos e ao abrigo do disposto no artº 120º, nº 1, al. a), CPTA.
VI - A tese sustentada pelos ora recorrentes justificar-se-á, até, como corolário do princípio da tutela jurisdicional efectiva (artº 2º CPTA).
VII - Decidindo como decidiu, a douta decisão recorrida além de outras expressões legais, terá violado os artºs 100º, 133º, 134º, 135º, 136º, 140º, 141º, 142º e 145º, CPA, e artºs 120º e 121º, CPTA, e ainda artº 267º, nºs 1 e 5, CRP, normas que deveriam ser aplicados ao caso sujeito e interpretadas no sentido da procedência da pretensão dos requerentes».
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O recorrido Instituto do Emprego e Formação Profissional - IP, contra alegou no sentido da improcedência do recurso, formulando as seguintes conclusões:
I. «As providências cautelares têm por função assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal, impedindo que a decisão que vier a ser proferida neste processo fique desprovida do seu poder regulador em virtude da alteração da realidade de facto entretanto verificada (vide artigo 112º do CPTA).
II. O processo cautelar não só tem natureza precária – visto regular provisoriamente os interesses envolvidos no litígio desenhado no processo principal – como depende “da causa que tem por objeto a decisão sobre o mérito, podendo ser intentado como preliminar ou como incidente do processo respetivo”, sem prejuízo da sua tramitação ser autónoma em relação a este (cfr. nºs 1 e 2 ambos do artigo 113º do CPTA).
III. No caso dos presentes autos, foi requerida uma providência cautelar conservatória, consubstanciada no pedido de suspensão de eficácia da deliberação do Conselho Diretivo deste Instituto de 14 de novembro de 2011, que determinara a audiência prévia aos opositores ao procedimento concursal com intenção de os excluir do mesmo;
IV. Os recorrentes não propuseram, pelo menos tempestivamente, a correspondente ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo cuja suspensão de eficácia requereram na providência cautelar.
V. Deste modo, cessam os efeitos desta providência cautelar conservatória, já que a sua finalidade de assegurar a utilidade da sentença proferida no processo principal, não poderá ser alcançada, atenta a caducidade do direito de ação dos recorrentes.
VI. A apreciação do presente recurso jurisdicional não terá qualquer efeito útil uma vez que, mesmo que eventualmente vier a ser decretada a providência requerida, terá de se considerar que a mesma havia caducado.
VII. Não tendo os recorrentes instaurado a ação principal dentro do prazo de que legalmente dispunham para o fazer, deve ser declarado extinto o processo cautelar por caducidade do direito de ação no processo principal.
VIII. O ato administrativo suspendendo, notificado aos recorrentes, mais não é que o projeto de decisão final, no âmbito do procedimento administrativo em que são interessados, em conformidade com o artigo 100º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo.
IX. Assim, trata-se de um ato administrativo endoprocedimental inimpugnável contenciosamente.
X. No caso dos autos, como bem sustentou a douta sentença, claramente não estamos perante uma situação em que seja evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, pois que não está em causa a impugnação de um ato manifestamente ilegal, de ato de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de ato idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente, nem qualquer situação semelhante a estas, elencadas, de forma meramente exemplificativa, na alínea a), do nº 1 do artigo 120º do CPTA.
XI. Neste caso, a procedência da pretensão dos requerentes não é manifesta, id est, não é previsível com elevado grau de certeza, já que se cingem a invocar a ilegalidade da deliberação do Conselho Diretivo do recorrido sem explicitarem em que consiste essa ilegalidade ou que normas ou princípios terão sido postergados.
XII. Há, evidentemente, muita controvérsia sobre esta matéria, atenta a posição adotada pelo recorrido, que está longe de ser errada.
XIII. De harmonia com a alínea b) do nº 1 e com o nº 2, ambos do artigo 120º do CPTA, são três os critérios de decisão de que depende a concessão de uma providência com as características desta, e cuja verificação é cumulativa: (a) o periculum in mora, (b) o fumus boni iuris e (c) a prevalência dos interesses privados face ao interesse público.
XIV. O periculum in mora consiste no fundado receio de que se constitua uma situação de facto consumado ou se produzam prejuízos de difícil reparação para os interesses que os requerentes pretendem ver reconhecidos no processo principal.
XV. A existência de fundado receio depende ou da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que os requerentes visam assegurar no processo principal, que, no caso vertente, não identificaram de forma palpável e concreta e individualizadamente para cada um dos requerentes.
XVI. No caso dos autos, não se verifica uma situação de facto consumado, visto que, ainda que não fosse decretada a presente providência cautelar, nada impedia que, através da ação principal (se esta houvesse sido proposta), se lograsse o efeito pretendido com esta providência.
XVII. Assim, se ação principal fosse proposta, poderia muito bem suceder que, mediante a anulação da Deliberação do Conselho Diretivo do IEFP, I. P., de 14 de novembro de 2011, exarada na Informação de Serviço nº 914/OE-PE/2011, de 2 de novembro, tudo regressasse ao estado anterior à prática desse tal ato administrativo, isto é, à fase de instrução do procedimento administrativo.
XVIII. Os únicos prejuízos alegadamente de difícil reparação invocados pelos Recorrentes, comuns a todos eles - lesão dos seus direitos, prejuízos na carreira profissional, preenchimento das vagas por outros concorrentes e alteração nas suas vidas, com o cumprimento de obrigações que assumiram à sombra do questionado concurso e subsequentes desenvolvimentos devidamente contratualizados - nem sequer expressamente concretizados e, consequentemente, não provados, não são evidentemente de difícil reparação.
XIX. Os recorrentes apenas expressam os seus receios de forma claramente genérica, vaga e evasiva, sem qualquer tipo de demonstração, atenta a enunciação dos prejuízos alegados: prejuízos na carreira profissional, preenchimento das vagas por outros concorrentes e alteração nas suas vidas, com o cumprimento de obrigações que assumiram à sombra do questionado concurso e subsequentes desenvolvimentos devidamente contratualizados.
XX. Desconhece-se que prejuízos teria, cada um dos recorrentes na sua carreira profissional, que danos cada um dos recorrentes, teria com o preenchimento das vagas por outros concursados que obrigações assumiu, cada um dos recorrentes, à sombra deste procedimento concursal, etc.
XXI. Ergo, não se verifica o periculum in mora, tal é a evidência da possibilidade de reconstituição total da situação ex ante e a insusceptibilidade de produção de efeitos externos lesivos deste ato administrativo endoprocedimental.
XXII. Caberia aos recorrentes demonstrar, ainda que sumariamente, que não seria evidente que a ação principal - se tivesse sido proposta - não seria improcedente, justificando assim a tutela conferida pelo decretamento da providência cautelar.
XXIII. O recorrido não solicitou parecer prévio à abertura do procedimento concursal a Sua Excelência o Senhor Ministro das Finanças.
XXIV. O recorrido solicitou o referido parecer na fase do recrutamento, com vista à admissão dos 20 trabalhadores provenientes de órgãos ou serviços das Administrações regionais e autárquicas.
XXV. O parecer foi desfavorável, em razão de este não ter sido pedido em momento prévio à fase anterior à abertura do procedimento concursal, com solicitação expressa, de que o mesmo seria dirigido também a trabalhadores da Administração Autárquica e Regional.
XXVI. Ainda que o Parecer de Sua Excelência o Secretário de Estado do Orçamento fosse positivo, constata-se que estes trabalhadores apenas poderiam ser recrutados, ou seja, ocupar os lugares em questão, se não existissem trabalhadores em funções públicas titulados com contrato de trabalho por tempo indeterminado, vinculado a qualquer outro órgão da administração central, ainda que estes tenham uma classificação final inferior.
XXVII. In casu, existem trabalhadores da administração central graduados nesta lista final homologada.
XXVIII. Tendo em conta o Parecer negativo de Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado do Orçamento, importou facultar a audiência prévia aos concursados com a intenção de excluir deste procedimento todos os candidatos nesta situação, nos quais se incluem os recorrentes, revogando parcialmente o ato de homologação de ordenação final dos candidatos, repetindo-se todas as operações subsequentes, em conformidade com a deliberação suspendenda.
XXIX. A intenção de revogação teve como fundamento a preterição de formalidade essencial o que conduz à sua anulabilidade e pode ser feita, nos termos do disposto no artigo 141º do Código do Procedimento Administrativo, no prazo de um ano a contar da data da sua prática, sob pena de, decorrido tal prazo, o ato tornar-se válido por sanação do seu vício.
XXX. Após a prática da deliberação suspendenda, consubstanciada no projeto de revogação parcial da deliberação do Conselho Diretivo, na parte que se reporta à homologação da lista unitária final de ordenação final dos candidatos oriundos da administração local, procedeu-se à notificação dos candidatos excluídos, facultando-lhes a audiência prévia, para, querendo, dizer por escrito o que se lhe oferecesse.
XXXI. E, no âmbito da audiência prévia dos interessados, exerceram o seu direito de participação procedimental, todos os recorrentes, cujas pronúncias se encontram em apreciação.
XXXII. A deliberação suspendenda, atendendo ao seu carácter de projeto de decisão final, revela-se adequada, necessária e proporcional.
XXXIII. O critério de decisão do fumus boni iuris tão-pouco se encontra preenchido.
XXXIV. A suspensão da eficácia do ato suspendendo paralisaria a apreciação das respostas à audiência prévia apresentadas pelos recorrentes, obstava à decisão final do procedimento e ampliaria a morosidade na negociação das posições remuneratórias com candidatos admitidos e, em consequência, a celebração dos respetivos contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.
XXXV. É facto público e notório que, com a crise económica e social que o país atravessa, o desemprego aumenta para níveis inusitados, com a consequente procura dos Centros de Emprego, por parte dos desempregados.
XXXVI. Tendo em conta as competências dos Centros de Emprego, a exigência da melhoria contínua do seu modus operandi, a crescente procura dos seus serviços, a heterogeneidade dos desempregados e a necessidade de um estreito acompanhamento personalizado dos utentes, os 70 trabalhadores revelam-se imprescindíveis para fazer face a um elevado número de atividades a desenvolver, face a um mercado de emprego cada vez mais complexo.
XXXVII. A suspensão da eficácia do ato suspendendo e a paralisação do procedimento administrativo desencadeado oficiosamente pelo recorrido, tendente à reposição da legalidade no procedimento concursal, provocaria impactos negativos nas respostas dadas pelos Centros de Emprego, integrados na área geográfica de intervenção da Delegação Regional do Norte aos seus utentes.
XXXVIII. Com a decretação da presente providência cautelar conservatória, os prejuízos para o interesse público são, por isso, incomensuráveis e terão impacto no atendimento, o acompanhamento dos desempregados e nas respostas encontradas;
XXXIX. Os critérios de decisão enunciados no artigo 120º do CPTA, devem verificar-se cumulativamente para que o requerimento seja procedente e devem ser invocados com factos concretos e não com meras abstracções ou conclusões.
XL. A falta de um dos critérios de decisão do artigo 120º do CPTA logo que detetada, torna inútil a indagação da verificação dos restantes e obsta ao deferimento do pedido de suspensão de eficácia, pelo que não deverá ser julgada procedente a presente pretensão recursória.
XLI. Existe uma circunstância que obsta ao conhecimento de mérito na ação principal, isto é, a caducidade do direito de instauração da pertinente ação administrativa especial, pelo que se impõe a improcedência da presente providência cautelar.
XLII. Na verdade, no caso dos presentes autos, a ação principal nem sequer foi proposta.
XLIII. Acresce que os requisitos da convolação tão-pouco estavam verificados.
XLIV. No caso vertente, à inexistência de um critério de fumus boni iuris qualificado acresce a falta de interposição da ação principal que impede, por si só, a convolação do processo cautelar em processo principal».
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A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal notificada nos termos e para os efeitos previstos nos artºs 146º e 147º do CPTA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso nos termos que constam de fls. 284 a 288.
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Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no artº 36º, nºs 1 e 2 do CPTA, os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.
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2 - FUNDAMENTOS
2 – 1 - MATÉRIA DE FACTO

Da decisão recorrida resultam assentes os seguintes factos:
«A) Através de anúncio publicado na II Série do DR nº 222, de 16 de Novembro de 2009, foi publicitada a abertura de procedimento concursal comum para preenchimento de 70 postos de trabalho na carreira técnica superior, na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado. – cfr. doc. 8 junto com o requerimento inicial, que se dá por reproduzido.
B) De acordo com o ponto 2 do aviso de abertura do concurso o recrutamento seria feito entre os trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida.
C) No dia 17 de Fevereiro de 2010, o júri do concurso em apreço deliberou aprovar as listas de candidatos admitidos e excluídos, constando os ora requerentes da lista de candidatos admitidos. – cfr. doc. 11 junto com o requerimento inicial.
D) O Conselho Directivo do requerido, no dia 20 de Dezembro de 2010, deliberou homologar a lista de classificação final do concurso referido em A), tendo todos os requerentes sido graduados em lugar inferior ao septuagésimo – cfr. doc. 4 junto com o requerimento inicial.
E) No dia 14 de Agosto de 2011, o Secretário de Estado da Administração Pública, exarou sobre informação gizada por técnica da Direcção Geral da Administração e Emprego Público, despacho com o seguinte teor:
“1) Visto, não é emitido parecer favorável com referência à admissão dos 20 trabalhadores provenientes de órgãos e serviços das Administrações regionais e autárquicas em razão de não ter sido solicitado parecer prévio ao MEF em fase anterior à abertura do procedimento concursal, com solicitação expressa, de que o mesmo seria dirigido t/b a trabalhadores da Administração Autárquica e Regional (…)” – cfr. fls. 40 dos autos.
F) No dia 2 de Novembro de 2011 foi elaborada por técnico superior assessor do requerido infº nº 94 da qual se extrai o seguinte:
(….)
“6. Contudo e pese embora as disposições legais acima citadas, previamente à abertura do procedimento concursal acima referenciado, aliás, dos 18 procedimentos concursais comuns, autorizados por deliberação do Conselho Directivo, de 25 de Agosto de 2009, exarada sobre a Informação nº 666/DE-PE/2009, de 10 de Julho, e abertos, em Novembro de 2009, com vista ao preenchimento de 166 postos de trabalho de Técnico Superior vagos em unidades orgânicas do IEFP, não foi solicitado parecer às Finanças.
(….)
14. Assim, e em face de todo o exposto, propõe-se:
a) A revogação parcial da deliberação do Conselho Directivo, de 20 de Dezembro de 2010, exarada sobre a informação nº 1324/0E-PE/2010, de 20 de Dezembro, na parte que reporta à homologação da lista unitária de ordenação final dos candidatos.
b) A exclusão dos candidatos do procedimento concursal comum Refª A9 – Rede de Centros de Emprego da Delegação Regional do Norte, IT. …, AB. …, SR. …, MO. …, MS. …, OF. …, MC. …, SL. … e LO. …, em virtude de ser oriunda da administração local.
c) A notificação dos candidatos da decisão de exclusão do procedimento, com conhecimento do prazo de audiência prévia, para, querendo, dizer por escrito o que se lhe oferecer.
d) Homologação de nova lista unitária de ordenação final dos candidatos, findo aquele prazo.” – cfr. doc. 1 junto com o requerimento inicial.
G) O Conselho Directivo do requerido, no dia 14 de Novembro de 2011 proferiu deliberação com o seguinte teor:
“Visto em CD que, atento o informado, e despachos exarados, deliberou concordar com:
a revogação parcial da deliberação desde Conselho, datada de 2010.12.20, exarada sobre a informação nº 1324/OE-PE/2010, de 20 de Dezembro, na parte que se reporta à homologação da lista unitária de ordenação final dos candidatos.
a exclusão dos candidatos identificados na alínea b) do ponto 14 da presente informação.
a notificação dos candidatos da decisão de exclusão do procedimento, nos termos propostos.
a homologação de nova lista unitária de ordenação final dos candidatos (deliberação suspendenda)».
Ao abrigo do disposto no artº 712º do CPC aplicável ex-vi artº 140º do CPTA, adita-se o seguinte facto:
H) – De acordo com informação prestada pelo TAF de Braga, em 27/06/2012, ainda não tinha dado entrada naquele tribunal a acção principal correspondente a este processo cautelar.
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2.2 - O DIREITO:
O recurso jurisdicional interposto pelos recorrentes será apreciado à luz dos parâmetros estabelecidos nos artºs 660º, nº 2, 664º, 684º, nº 3 e 4, e 685º-Aº todos do CPC aplicáveis ex-vi artº 140º do CPTA.
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QUESTÕES A DECIDIR:
Vejamos, então, se a decisão recorrida errou no julgamento que fez acerca do não preenchimento dos pressupostos, de verificação cumulativa, previstos nas als. a) e b) do nº 1 do artº 120º do CPTA.
2.1 - AL. A), DO Nº 1, DO ARTº 120º DO CPTA:
Na análise deste requisito, há que não esquecer que a evidência das ilegalidades apontadas deve ser palmar, não necessitando por isso de eloquentes indagações. E abdicaremos de tecer quaisquer considerações jurisprudenciais e doutrinais, dado que a este respeito não se suscitam dúvidas, partindo assim para a análise singela dos factos apurados e sua interpretação à luz da norma prevista na al. a), do nº 1, do artº 120º do CPTA, sendo que os recorrentes se limitam, na petição inicial apresentada, a alegar que a deliberação suspendenda padece de violação de lei, por extemporaneamente, revogar um acto constitutivo de direitos (artº 140º e 141º do CPTA), violação dos princípios da legalidade, protecção dos direitos dos cidadãos, da igualdade e da proporcionalidade, da justiça e da boa fé e, agora, em sede de recurso jurisdicional, alegam, ex novo, a falta de audiência prévia.
No entanto, sempre se dirá que, em moldes de sumaria cognitio, não é evidente a procedência da pretensão principal, ou seja, não é patente nestes autos, a ilegalidade do acto suspendendo, pois não são manifesta ou inequivocamente evidentes, os fundamentos nos quais os requerentes/ora recorrentes assentam a sua pretensão.
Aliás, da própria petição inicial apresentada, é difícil descortinar o que levou os recorrentes a afirmarem [sem concretizar devidamente] que a deliberação suspendenda padece da violação dos princípios jurídicos administrativos supra enunciados.
Mas, mesmo que, com algum esforço, se concretizem estas ilegalidades, não resultam do confronto dos articulados que as mesmas se apresentem como evidentes ou palmares, não sendo por isso, possível, descortinar a evidência manifesta de qualquer ilegalidade, apanágio deste normativo legal, o mesmo sucedendo em relação à inovatória e acerbada alegação da falta de audiência prévia [que aliás, ao invés, na nossa óptica, diferentemente do que concluiu o tribunal de 1ª instância, mas que não vem sindicado devidamente, resulta da documentação junta aos autos que se verificou].
Por conseguinte, e contrariamente à tese sufragada pelos recorrentes, não vislumbra este Tribunal que ocorra o necessário carácter de evidência exigido pelo artº 120º, nº 1, al. a) do CPTA para a decisão da existência das “ilegalidades” apontadas à deliberação suspendenda, uma vez que obrigam o julgador a proceder a uma tarefa peculiar de escrutínio e um trabalho de análise, o que, por si só é demonstrativo da falta de evidência da procedência das mesmas.
Por conseguinte, atento o acervo argumentativo de natureza jurídica que os recorrentes esgrimem, apresenta-se claro que não é evidente a procedência da pretensão principal, inexistindo, por essa razão, fundamento para o decretamento da providência requerida a coberto da al. a), do nº 1 do artº 120º do CPTA, concluindo este tribunal de recurso, como já decidido no tribunal a quo pela inexistência do alegado erro de julgamento na apreciação deste requisito do especial fumus boni iuris.
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2.2. - DO ERRO DE JULGAMENTO [AL. B) DO Nº 1 DO ARTº 120º DO CPTA – VERTENTE PERICULUM IN MORA]:
No âmbito desta alínea, permite-se que a providência cautelar conservatória seja concedida caso “haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora) e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito (fumus non malus juris)”.
Nesta análise, o requisito do fumus non malus juris [alínea b)] não é tão exigente, não impondo um juízo de certeza sobre o bom ou mau direito, sendo suficiente a formulação de um juízo negativo sobre a aparência de mau direito.
Por outro lado, através do requisito do periculum in mora, pretendeu-se impedir que durante a pendência da acção principal a situação de facto se altere e se consolide de forma a que, a sentença nela proferida, sendo favorável, se esvazie de eficácia prática.
Ou seja, se se verificarem os demais requisitos para a concessão da providência cautelar, a mesma terá de ser concedida, como refere o Prof. Aroso de Almeida, in “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 4ª edição, págs. 299 e 300 “desde que os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade - é este o sentido a atribuir à expressão facto consumado”.
Igualmente deverá ser concedida sempre que, não se prevendo que a impossibilidade de reintegração devido à demora do processo principal, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação no caso da providência ser recusada e isto, quer porque a reintegração no plano dos factos se perspectiva difícil, seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar, total ou parcialmente – cfr. neste sentido a obra supra citada do Prof. Aroso de Almeida.
Daí que, como refere o Prof. Vieira de Andrade, in Justiça Administrativa, 8ª edição, pág. 348 “o julgador deverá fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por entretanto se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dele deveria beneficiar, que obstem à reintegração específica da sua esfera jurídica”.
A prova, ainda que sumária, quer do fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, pertencem ao requerente da providência - cfr. artº 342º, nº 1, do Código Civil.
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Aqui chegados, revertamos ao caso concreto, analisando então o periculum in mora, na vertente dos prejuízos de difícil reparação, uma vez que, a decisão recorrida apenas analisou este requisito julgando-o inverificado e, deste modo, julgando prejudicado o conhecimento dos restantes [de atentar que são de verificação cumulativa].
E, a nosso ver, bem.
Na verdade, não é suficiente alegar, como fazem os recorrentes que … o Aviso de abertura, a subsequente admissão/aprovação (…) e a sua inclusão na “lista final”, bem como, a designação do seu destino (refª ao centro de emprego que lhe foi distribuído) … implicou rescisão e celebração de contratos de arrendamento e mudanças de estabelecimentos escolares dos filhos … e que os danos que … resultarão, necessariamente da não adopção da providência, serão relevantes, desmesurados e, pela natureza das coisas, irreparáveis ou de difícil reparação”.
Esta alegação é demasiado genérica e, por isso, não pode nunca conduzir ao desiderato consagrado na al. b), do nº 1 do artº 120º do CPTA.
Faltou, pois, demonstrar, no concreto e devidamente individualizado para cada requerente/recorrente, quais os danos que efectivamente sofrerão se não for decretada a suspensão de eficácia da deliberação em causa, o que, manifestamente não foi feito, sendo certo que as situações concretas de cada um dos recorrentes, não serão iguais para todos.
Se todos, já tiveram de encontrar novas residências e novas escolas para os filhos, quais os factos concretos que suportam estas conclusões? Nada é dito a este respeito e, era imprescindível, a sua individualização de molde a aferir do preenchimento deste requisito.
E nesta sede de recurso também não acrescentam quaisquer factos ou argumentos que permitam a este Tribunal analisar se, efectivamente, o não decretamento da providência poderá causar prejuízos de difícil reparação ou sequer traduzir uma situação de facto consumando [que manifestamente não existe], não sendo suficiente, alegar generalidades, que naturalmente só mediante factos poderão ser concretizados.
Deste modo, nada há a apontar ao decidido na 1ª instância, pois, não só os recorrentes nada adiantam, como este tribunal de recurso não vislumbra que tenha ocorrido qualquer erro de direito na apreciação feita acerca da não verificação deste requisito do periculum in mora, pelo que, também este segmento do recurso se mostra votado ao insucesso.
Atento o exposto e porque não se justificam quaisquer outras considerações, mantém-se, na íntegra, o decidido a este respeito na decisão recorrida.
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Por outro lado, e apesar do recorrido tentar ressuscitar a questão prévia decidida no tribunal a quo da inimpugnabilidade contenciosa da deliberação suspendenda, importa ter em conta que esta alegação se mostra desgarrada neste recurso jurisdicional, uma vez que, o mesmo não fez uso, nem do recurso subordinado, nem da ampliação do objecto do recurso, expressamente previstos nos artºs 684º-A e 682º ambos do CPC, mostrando-se, por isso, definitivamente julgada esta questão prévia, além de que a mesma sempre deveria ser conhecida em sede de apreciação do requisito do fumus non malus iuris, previsto na parte final da al. b) do nº1, do artº 120º do CPTA, sendo que, como vimos, o seu conhecimento ficou prejudicado pela inverificação do periculum in mora, versado na 1ª parte desta alínea.
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Mas, nesta sede de recurso, vêm os recorrentes requerer ex novo a convolação da presente tutela cautelar em tutela final, através da antecipação da decisão final, por entenderem que estão reunidos os respectivos requisitos [urgência na resolução definitiva e existência de todos os elementos necessários para o efeito].
Mas, sem razão, como infra se verá.
Com efeito, estando em causa a possibilidade de antecipação da decisão final no processo principal, há que, averiguar, antes de mais, se a situação concreta permitiria tal antecipação, ou seja, se estão reunidos os requisitos/pressupostos exigidos no artº 121º do CPTA, sob a epígrafe “Decisão da causa principal" que dispõe:
“Quando a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, permita concluir que a situação não se compadece com a adopção de uma simples providência cautelar e tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal" - (nº 1), sendo que a “… decisão de antecipar o juízo sobre a causa principal é passível de impugnação nos termos gerais …” (nº 2) - sublinhado nosso.
Este normativo constitui, pois, uma das inovações, em sede das providências cautelares, no âmbito da reforma do contencioso administrativo de 2004.
Trata-se duma situação de convolação da tutela cautelar em tutela final urgente que se concretiza na antecipação da decisão final, a qual é emitida ainda no âmbito da providência cautelar sem perder o carácter urgente e que está sujeita a condições legais rigorosas - urgência manifesta na resolução definitiva, insuficiência da medida cautelar, natureza das questões e gravidade dos interesses envolvidos, estar assegurado o contraditório entre as partes e dispor o Tribunal de todos os elementos necessários à decisão.
Daí que, seja necessário que se mostrem preenchidas as condições referidas, as quais se resumem, a final, a 2 (dois) requisitos fundamentais, a saber:
a) um requisito substantivo que se traduz na natureza das questões colocadas e gravidade dos interesses em presença permitirem concluir que existe uma “manifesta urgência na resolução definitiva do caso”;
b) um requisito processual que impõe que após contraditório, com a audição das partes e posições pelas mesmas manifestadas, o tribunal se sinta em condições de decidir a questão de fundo por dispor de “todos os elementos necessários para o efeito”.
No caso dos autos, inexistindo acção principal – cfr. ponto H) dos factos provados – é manifesta a inverificação dos referidos requisitos, pois que se não pode antecipar uma decisão final do processo principal se este não existe – cfr. Ac. deste TCAN proferido em 08/03/2012, in rec. 685/11.2BEAVR.
Porém, sobre estes requisitos e sua verificação, bem como, à caracterização deste regime jurídico, ainda nos permitimos aqui citar o Ac. deste TCAN de 18/06/2009, proferido in rec. nº 1313/08 onde se escreveu:
"Esta solução legal, inspirada no princípio da tutela jurisdicional efectiva e em razões de economia processual, vem permitir que o juiz cautelar, ouvidas as partes, se declare, de forma fundamentada, apto a antecipar no processo cautelar o juízo sobre o mérito da causa principal. Tratar-se-á, neste caso, de uma decisão prévia, pela qual o julgador [à semelhança do que acontece no despacho saneador quando se considera apto a conhecer imediatamente do mérito da causa - ver artigos 510º nº 1 alínea b) do CPC e 87º n.º 1 alínea b) do CPTA], resolve convolar a decisão do processo cautelar na decisão do processo principal, como que compactando os dois processos. E esta convolação, no caso de ocorrer, será seguida do julgamento da causa principal, que poderá ser no sentido da procedência ou da improcedência da pretensão formulada pelo demandante.
Temos, assim, que este demandante [requerente e autor], caso não concorde com o decidido pelo tribunal, poderá recorrer quer da decisão prévia de antecipar o juízo sobre a causa principal quer do mérito do próprio julgamento que na sequência dessa decisão foi efectuado. A primeira impugnação deverá basear-se somente no não preenchimento, no caso concreto, dos requisitos de que depende a decidida antecipação do julgamento. A segunda impugnação deverá ser efectuada nos termos gerais, com invocação das nulidades e dos concretos erros de facto e de direito imputáveis à sentença.
No caso de proceder o recurso da decisão prévia de antecipar o julgamento da acção principal, o tribunal ad quem deverá revogar tal decisão e ordenar que o tribunal a quo aprecie a providência cautelar requerida, ficando sem efeito o julgamento efectuado sobre o fundo da causa - (…).
O artigo 121º nº 1 do CPTA permite, por conseguinte, que o tribunal antecipe a decisão sobre o mérito da causa principal para o momento em que lhe cumpre decidir o processo cautelar.
Esta antecipação do juízo sobre a causa principal, que tudo indica poder ser da iniciativa do tribunal ou suscitada pelas partes, atendendo aos princípios gerais e à sua razão de ser, depende do preenchimento cumulativo de dois requisitos: primo, deve haver manifesta urgência na resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, de modo a poder-se concluir que a situação não se compadece com a adopção de uma simples providência cautelar; secundo, o tribunal deve sentir-se em condições de decidir a questão de fundo, por constarem do processo todos os elementos necessários para o efeito.
Aquele primeiro requisito diz respeito à situação substantiva que legitima o tribunal a equacionar a hipótese de antecipação do juízo sobre a causa principal, enquanto o segundo requisito respeita às condições processuais que na resolução definitiva do caso exige interpretação e aplicação exigentes, e exige especial cuidado e grande prudência por parte do julgador, a qual só excepcionalmente se deve decidir pela convolação.
Este expediente só encontrará justificação, pois, em situações de urgência qualificada, nas quais se revele insuficiente o decretamento de uma providência cautelar, designadamente por os limites resultantes da sua natureza provisória obstarem à concessão de uma providência apta a evitar uma situação irreversível.
Os interesses relevantes envolvidos, para efeitos desta aferição de manifesta urgência, não terão a ver, pelo menos directamente, com a protecção de direitos, liberdades e garantias, uma vez que a intimação urgente prevista nos artigos 109º a 111º do CPTA [que pode ser urgentíssima], já permitirá uma protecção adequada dos mesmos, mas antes com a protecção de outros direitos e valores importantes, designadamente os valores constitucionais referidos no artigo 9º nº 2 do CPTA [ambiente, saúde pública, património cultural, ordenamento do território, entre outros].
O segundo referido requisito, de ordem processual, ao exigir que o julgador só avance para a antecipação do juízo sobre a causa principal quando tiver no processo todos os elementos necessários para o efeito, significa que o tribunal não deve antecipar a decisão sobre o mérito da causa, mas decidir a providência cautelar, sempre que seja possível admitir que poderão ser trazidos ao processo principal elementos relevantes para a decisão de fundo. Isto significa, além do mais, que será muito difícil perspectivar uma situação de antecipação do juízo sobre a causa principal antes de esta ter sido intentada. Trata-se de exigência, cuidado e prudência, impostas pelo princípio dispositivo e pelo princípio do processo equitativo, que permitem às partes fazer uma legítima previsão de riscos [ver artigo 20º nº 4 da CRP] - (…).
Nas palavras de Vieira de Andrade, apesar de as condições legais serem bem rigorosas - urgência manifesta na resolução definitiva e consequente insuficiência da medida cautelar provisória, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, posse de todos os elementos necessários, contraditório das partes - e de se determinar a impugnabilidade da decisão de antecipação, é preciso um especial cuidado, porque o conhecimento do juiz nestes processos é, por definição, sumário. […] Deve haver uma interpretação exigente dos pressupostos legais e uma grande prudência por parte do tribunal, que só excepcionalmente deve decidir-se pela convolação - isto é, pela substituição do juízo cautelar por um juízo de mérito - quando os interesses envolvidos sejam de grande relevo e esteja seguro de possuir todos os elementos de facto relevantes para a decisão, situação que poderá ocorrer mais facilmente quando esteja em causa apenas uma questão de direito ou quando a providência tenha sido requerida como incidente do processo principal (…).
…nada na lei nos permite concluir que a decisão prévia de antecipar o julgamento da causa principal exija um qualquer juízo positivo sobre a viabilidade do êxito da pretensão judiciária requerida no processo principal. Este tipo de avaliação positiva apenas tem relevo para efeito de adopção da providência cautelar antecipatória [artigo 120º nº 1 alínea c) do CPTA].
Tudo indica, aliás, atendendo sobretudo às razões de economia processual que também subjazem à possibilidade de antecipação do julgamento da causa principal, que essa antecipação, verificados que sejam os legais e cumulativos requisitos, tanto possa ser efectuada no caso de ser perspectivada a procedência como a improcedência da causa principal. Efectivamente, uma vez verificada a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, e constando do processo todos os elementos indispensáveis para o juiz o poder decidir, não faria sentido que este ficasse inibido da possibilidade de o fazer pelo simples facto de perspectivar uma improcedência da causa principal, alimentando, assim, e sem razões válidas, uma lide inglória para o demandante …”- cfr. ainda no mesmo sentido os Acs deste TCAN proferidos em 26/07/2007 e 18/03/2011, in recs. nº 03160/06.3BEPRT e 1924/10.2BEPRT, respectivamente.
Revertendo, de novo, ao caso dos autos, temos que nenhum dos requisitos legais se mostra preenchido, inexistindo, por isso, qualquer fundamento para a antecipação da decisão de mérito na acção principal, pelo que, não se pode antecipar algo que ainda não existe, nem se sabe se irá existir.
Na verdade, basta atentar no facto de, de acordo com o facto aditado à matéria de facto, ainda não ter dado entrada em juízo a acção principal.
Entender de outra forma, seria subverter as regras processuais e substanciais subjacentes aos processos cautelares a que supra nos referimos.
Atento o exposto, improcede, sem necessidade de ulteriores considerações, o recurso interposto.
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3 - DECISÃO:
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo dos recorrentes.
Notifique.
DN.
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 138º, nº 5 do CPC “ex vi” artº 1º, do CPTA).

Porto, 05 de Julho de 2012


Ass. Maria do Céu Neves

Ass. Ana Paula Portela

Ass. José Augusto Araújo Veloso