Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:01853/07
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/02/2007
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. ADUANEIRO. OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO. ANÁLISE CRÍTICA. INCONSTITUCIONALIDADE. LEI APLICÁVEL.
Sumário:1.Não padece do vício formal de omissão de pronúncia e de contradição entre os fundamentos e a decisão, a sentença recorrida que não deixa de conhecer de todas as questões suscitadas, embora não conheça de todos os argumentos ou raciocínios invocados, bem como a sua decisão mais não é do que a conclusão lógica, necessária, das premissas em que assenta e consideradas provadas;
2. Não padece do vício de falta de análise crítica das provas, a sentença recorrida que no fim de cada alínea do probatório fixado indica os concretos elementos probatórios em que assenta, bem como no final indica por que deu como provada certa matéria e não outra, indicando os concretos meios probatórios que a tal conduziram, ainda que, porventura, tal juízo se possa mostrar errado, o que integraria o errado julgamento da matéria de facto efectuado que não o citado vício;
3. Não padecem de qualquer inconstitucionalidade as normas dos art.ºs 8.º e 19.º do Dec-Lei n.º 117/92, ao estabelecerem taxas máximas para as franquias e presumirem a temperatura do teor de 20.ºC para a medição do álcool;
4. A facto tributário ocorrido em 1999 é-lhe aplicável a lei então vigente – Dec-Lei n.º 117/92 – que não o CICE aprovado pelo Dec-Lei n.º 566/99, que só entrou em vigor em 1.2.2000, e que não é de aplicação retroactiva.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
2. A... – Fabricação de Embalagens e Embalamento de Álcool, Lda, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


1. A douta sentença recorrida é nula por não se ter pronunciado sobre questões de que devia conhecer.
2. A douta sentença recorrida é omissa quanto ao valor das existências reais de álcool que terá considerado existir no entreposto fiscal da Impugnante, ora Recorrente, em 31.12.1999 e em 20.03.2000.
3. Com efeito, a douta sentença recorrida apenas deu por provado, no ponto 5 da matéria de facto dada por provada, que os serviços de inspecção fizeram constar do projecto de conclusões do relatório o que deste consta.
4. Não deu por provado o que dele consta como sendo verdadeiro.
5. Sem conceder, a considerar-se que deu por provado os factos relatados nesse documento da Entidade Impugnada, a verdade é que a douta sentença recorrida não esclarece quais os elementos de prova, os factos concretos e o iter logico a partir dos quais retirou que as existências reais, as saídas de álcool e as diferenças entre saldos contabilísticos e existências reais eram as indicadas pelas Autoridades Aduaneiras.
6. A análise crítica da prova efectuada pela douta sentença recorrida é, pois, também manifestamente insuficiente.
7. De qualquer modo, da prova documental junta aos autos e da testemunhal produzida resulta claramente que a diferença entre as supostas existências reais e o saldo contabilístico do entreposto fiscal da Impugnante (em 31.12.1999 ou em 20.03.2000) nunca é de 18.900 litros de álcool na base de 96% de vol.
8. Como consta expressamente da douta sentença recorrida, a diferença de 18.900 litros de álcool etílico é a diferença entre o número de litros de álcool mencionado numa factura (na n.º 22) e o constante da correspondente inscrição na contabilidade de existências (em sistema de inventário permanente).
9. Como resulta da douta sentença recorrida, tal diferença foi causada por um lapso na inscrição efectuada na contabilidade de existências.
10. Como resulta claramente da factualidade dada por provada na douta sentença recorrida, os 18.900 litros de álcool etílico correspondentes à referida diferença não saíram, assim, do entreposto fiscal de armazenagem da Recorrente.
11. Não subsiste, pois, a factualidade que fundamentou a douta liquidação impugnada e, por isso, também não pode ser considerada válida.
12. Ao decidir do modo diferente, a douta sentença recorrida acabou também por incorrer em nulidade, uma vez que existe oposição dos fundamentos da mesma com a decisão (artigo 125.º n.º 1 do C.P.P.T.).
13. O único varejo efectuado ao entreposto fiscal da ora Recorrente e que serviu para fundamentar os cálculos da Entidade Impugnada ocorreu em 20.03.2000.
14.Tal varejo foi incorrectamente realizado, não tendo sido medida a temperatura do álcool etílico.
15. Deste modo, não se sabe qual era o volume de álcool etílico, na base de 96% e de 100%, à temperatura de 20° C., existente em entreposto.
l6. A medição da temperatura do álcool era absolutamente essencial uma vez que quer o volume, que o teor alcoólico, variam em função da temperatura.
17. Com efeito, o mesmo álcool a determinada temperatura tem um teor alcoólico e um volume diferentes a outra temperatura (daí que seja sempre medida a temperatura do álcool e, usualmente, retiradas amostras para a medição posterior do seu teor em laboratório).
18. O facto de a Impugnante não ter levantado qualquer questão (mais: não se sabendo por que o não fez) quanto à temperatura do álcool aquando do varejo é absolutamente irrelevante para a questão da legalidade ou ilegalidade da liquidação.
19. Não compete aos particulares (e muito menos aquando de uma operação técnica a realizar por outros e não estando acompanhados de qualquer técnico) orientar, fiscalizar ou suprir as deficiências das operações de determinação da base tributável do I.A.S.B.A. que, por lei, cabem às autoridades aduaneiras.
20. É inconstitucional, por violação dos princípios da necessidade, da proporcionalidade, da justiça e da boa fé a que estão sujeitos os órgãos e agentes administrativos (art. 18.º, n.º 2, e 266.º, n.ºs 1 e 2, da C.R.P.), a norma resultante da interpretação dos artigos 8.º e 19.º do D.L. n.º 117/92 ou dos artigos 39.º e 56.º do C.I.E.C. segundo a qual o volume e o teor do álcool etílico medidos aquando de um varejo, em que não foi medida a temperatura do mesmo, se consideram como sendo os que existiriam à temperatura de 20º C., designadamente se o titular do entreposto fiscal nada disse aquando desse varejo e não se saibam as razões por que nada disse.
21. A determinação da base tributável do imposto liquidado foi, pois, incorrectamente realizada, o que implica a ilegalidade e invalidade do acto de liquidação impugnado.
22. A liquidação impugnada assenta, assim, também em errados pressupostos de facto.
23. Ao entender de modo diferente, a douta sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação da lei, designadamente do disposto nos artigos 8.º e 19.º do D.L. n.º 117/92 ou dos artigos 39.º e 56.º do C.I.E.C. que assim violou.
24. Sem conceder, o facto que fundamenta a liquidação impugnada é a alegada existência de faltas ou perdas de álcool etílico ou de saídas a mais do entreposto fiscal da Impugnante.
25. Essa suposta realidade apenas pode (em termos científicos) e deve (em termos legais, por força do princípio da certeza) ser determinada com base na comparação entre o saldo contabilístico (existências iniciais + entradas saídas contabilisticamente registadas) e as existências reais, apuradas fisicamente por varejo, na data deste.
26. Assim, no caso dos autos, só poderiam ser apuradas faltas ou perdas de álcool etílico, para efeitos de eventual determinação da base tributável e liquidação de I.A.B.A., na data de 20.03.2000.
27. 0ra, nessa data, as normas em vigor para esse efeito eram já as do C.I.E.C. (artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro) que não foram aplicadas pela Entidade Impugnada e que a douta sentença, erradamente, não considerou aplicáveis.
28. Tais normas foram assim violadas pela liquidação impugnada (incorrendo em vício de violação e lei) e pela douta sentença recorrida (incorrendo em erro de direito).
29.A douta sentença recorrida violou, pois, entre outras, as normas consagradas nos seguintes artigos:
125.º, n.º 1 do C.P.P.T;
8.º e 19.º do D.L. n.º 117/92;
39.º e 56.º do C.I.E.C.;
4.º do Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro e 12.º do Código Civil;
18.º, n.º 2, e 266.º, n.ºs 1 e 2, da C.R.P.
30. A douta sentença recorrida deverá, assim, ser revogada, julgando-se a impugnação deduzida procedente, por provada, com as demais consequências daí advenientes.

Nestes termos, deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e julgando-se procedente a impugnação judicial deduzida, com as demais consequências dai advenientes,
Assim se fazendo JUSTIÇA!


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também o Exmo Representante da Fazenda Pública (RFP) veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


1- A Douta Sentença ora recorrida, decidiu em conformidade com a matéria de facto e de Direito constante nos presentes autos;
2- A ora recorrente impugnou a liquidação decorrente de uma acção inspectiva levada a cabo pela DGAIEC ao seu entreposto fiscal de armazenagem de álcool;
3- Essa liquidação teve como pressuposto a falta de 18.900 litros de álcool etílico a 96° sanitário, constatada através do confronto do livro de contabilidade de existências do entreposto fiscal com o registo contabilístico de vendas da A... - Fabricação de Embalagens e Embalamento de Álcool Lda;
4- Essa falta foi confirmada através de varejo físico efectuado ao referido entreposto em 20.03.2000;
5- Foi identificado o momento da saída do referido entreposto fiscal pela equipe inspectiva, como tendo sido o dia 30.06.1999 a "coberto" da factura nº 22 emitida em nome de Almacenes e Hijos S.L., empresa esta que recebeu apenas 6.300 litros daquele produto, conforme confirmação prestada pelas entidades competentes castelhanas, através do instituto da Assistência Mútua Administrativa;
6- O principal responsável daquele entreposto fiscal presenciou aquele varejo tendo inclusivamente assinado o respectivo auto de inventário;
7- Desde logo, foi imputada essa falta, ao erro de lançamento na contabilidade de existências do entreposto fiscal, por parte de um seu ex-­funcionário;
8- A ora recorrente pretendeu comprovar que aquela quantidade, apesar de erradamente lançada no respectivo livro de contabilidade não tinha sido introduzida irregularmente no consumo ou autoconsumida, pois que serviu para encher com uma capacidade superior em cerca de 6 ml., vários lotes de frascos de álcool de 250 ml. cada;
9- Apenas pretendeu justificar tal falta em data muito posterior ao referido varejo, em 28.07.2000;
10- Apresentou a ora recorrente, cerca de doze meses depois, medições daquele tipo de frascos efectuadas por empresa não credenciada, referentes a lotes de álcool sanitário a 96° embalados no ano de 2000;
11- A ora recorrente, na figura do seu principal responsável, calibrava as máquinas de enchimento livremente;
12- Aquelas máquinas nunca foram devidamente calibradas e certificadas por empresa credenciada, conforme exigência legal;
13- A empresa detentora daquele entreposto fiscal não procedeu internamente ao inventário trimestral que lhe competia por força de Lei, o que lhe teria permitido sanar atempadamente o alegado "erro de escrita";
14- Escudou-se ainda a ora recorrente, no facto de não ter sido medida a temperatura dos seus depósitos à data do referido varejo;
15- Não provou a ora recorrente, que naquele dia de Março a temperatura ambiente era de tal ordem que influenciava a quantidade de álcool verificada;
16- Não provou a ora recorrente que os seus depósitos não estavam apetrechados tecnicamente dos meios de segurança exigíveis, para que o produto neles contidos, pudessem sofrer variações que determinassem um erro de apuramento semelhante à quantidade em falta;
17- A Douta Sentença ora recorrida, não peca de forma alguma pela omissão de pronúncia sobre determinados factos alegados, atendendo ao critério da livre apreciação da prova a que está vinculado o Tribunal "ad quo";
18- A Douta Sentença ora recorrida não tinha que apurar a quantidade que serviu de base à liquidação do imposto devido, apenas tinha que dar por verdadeiro ou falso, tal requisito;
19- Foi apurado que aquela quantidade em falta de álcool reportava-se á data da emissão da factura n° 22 de 30.06.1999, pelo que a legislação em vigor, bem como a taxa aplicável era a da data do facto, ou seja o D.L. n° 117/92 de 22 de Junho;
20- É entendimento do RFP que a Douta Sentença ora recorrida deve ser mantida, determinando-se por conseguinte a sua confirmação, assim se fazendo a devida e pretendida
JUSTIÇA.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por o erro de facturação ter ocorrido na contabilidade da ora recorrente que na do entreposto fiscal.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida padece dos vícios formais de omissão de pronúncia e de contradição entre os seus fundamentos e a decisão proferida, causa da sua nulidade; E não padecendo, se a mesma deixou de fazer a análise crítica das provas; Se à liquidação em causa eram aplicáveis as normas do CIEC aprovado pelo Dec-Lei n.º 566/99; E se as normas dos art.ºs 8.º e 19.º do Dec-Lei n.º 117/92 ou 39.º e 56.º do CIEC, são inconstitucionais.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1- A sociedade A... - Fabricação de Embalagens e Embalamento de Álcool, Lda., foi constituída em 1 de Junho de 1998, com o CAE 74820, sendo titular do entreposto fiscal de armazenagem n° 39950393 com início de funcionamento em 27 de Novembro de 1998, tendo adquirido, em consequência o estatuto de depositário autorizado n° 1504190270 (cfr. fls. 10 do processo de cobrança à posteriori n° 42/00 em apenso cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
2- Com data de 30 de Junho de 1999 foi emitida pela A... - ­Fabricação de Embalagens e Embalamento de Álcool, Lda., a factura n° 22 dirigida a Almacenes Delgado e Hijos, S.L., na qual consta a quantidade de 25.200 unidades de álcool sanitário 96° e o valor ilíquido de 1.821.960$00 (cfr. teor de fls. 65 do apenso).
3- No documento simplificado de acompanhamento e com referência à factura n° 22 consta a quantidade de 6.300 litros de álcool etílico 96° sanitário (cfr. teor de fls. 66).
4- À ora impugnante foi efectuada uma acção de inspecção levada a efeito pela Direcção de Serviços de Prevenção e Repressão da Fraude com o objectivo de "averiguar a regularidade das transacções efectuadas pela empresa, nomeadamente quanto a produtos em suspensão de IEC, movimentados através do entreposto fiscal de armazenagem de que é titular e consequente detecção de eventuais irregularidades havidas. O período de análise determinado incluía o ano de 1999 e tendo em conta a data do início de actividade da empresa, então a acção inspectiva centrou-se, essencialmente, entre 4 de Agosto de 1998 e 31 de Dezembro de 1999" (cfr. fls. 8 do processo de cobrança à posteriori em apenso).
5- Os serviços de inspecção fizeram constar do projecto de conclusões do relatório que "(...} face aos registos e documentos disponibilizados constatou-se que a A... apenas apresentava compras e vendas de álcool a partir de Janeiro de 1999. Assim a partir daqueles elementos foi efectuado o levantamento das compras e vendas de álcool durante o ano de 1999. Dessa análise constatou-se que a grande maioria do álcool adquirido pela A... e que deu entrada no seu entreposto fiscal de armazenagem, durante o ano de 1999, além de álcool etílico 96° desnaturado com bitrex (12 636 litros} e álcool "Q.I." 90° marcado (3.116 litros} foi o designado álcool etílico 96° (puro}, totalizando as correspondentes compras 500.590 litros (...} Constatou-se igualmente que no decorrer do ano de 1999 a A... vendeu, com saída do seu entreposto fiscal de armazenagem (além de 692 litros de álcool etílico 96° desnaturado com bitrex), álcool etílico 96° sanitário (444 984 litros) álcool etílico 96% puro (6.500 litros) e álcool etílico 70° (3.000 litros) totalizando estas três últimas quantidades 454.484 litros. (...) Obtidos os montantes totais de álcool transaccionado pela A... em termos de compras e vendas efectuadas até 31 de Dezembro de 1999, de acordo com os registos e suportes contabilísticos disponibilizados, procurou-se então efectuar o cruzamento de tais dados com outros elementos, a começar pela contabilização das existências do próprio entreposto fiscal de armazenagem, durante o ano de 1999, elaborada em sistema de inventário permanente (...) Da análise efectuada concluiu-se que, em termos totais nos registos contabilísticos da empresa se verifica a saída total de 454 484 litros de "álcool etílico 96° sanitário", enquanto que na contabilização das existências do próprio entreposto fiscal, para o mesmo período e tipo de álcool, se constata a saída total de 473.384 litros, existindo assim, entre os dois registos, uma diferença de 18.900 litros. (...) Uma vez que já estavam consideradas as perdas efectivas, na altura não se alcançava uma justificação plausível para os 18.900 litros de álcool dados como saídos a mais, nos registos do entreposto fiscal. Efectuada uma análise mais pormenorizada aos dois registos referidos, constatou-se então que, relativamente à factura de venda n° 22 de 30-06-99, foram fornecidos e registados contabilísticamente 6 300 litros do referido álcool, enquanto que na contabilidade de existências do entreposto fiscal foi considerado como tendo saído 25 200 litros do mesmo produto, ou seja uma diferença de 18900 litros como atrás se refere. (...) a fim de se procurar determinar se eventualmente podiam existir outras justificações plausíveis para a diferença de quantidades registadas quanto à transacção da aludida factura n° 22, foi efectuado ainda um apuramento físico das existências reais no entreposto fiscal de armazenagem, à data em que decorria a inspecção (20 de Março de 2000), bem como foram analisadas todas as compras e vendas de álcool efectuadas pela A..., entre 1 de Janeiro e 20 de Março de 2000, cujas quantidades foram total e formalmente confirmadas em auto de declarações, pelo representante (procurador) da A..., tendo ainda declarado qual o montante total de perdas efectivas havidas naquele período. Assim, da análise efectuada, constatou-se que, em termos de saldo final, as quantidades apresentadas sobre a contabilidade de existências do entreposto fiscal, são idênticas às que foram detectadas através do apuramento físico das existências reais. (...) Tenha-se ainda em conta que as perdas efectivas de álcool já estão consideradas na contabilidade de existências do entreposto fiscal, as quais foram indicadas pela própria empresa e achadas conforme, quer até 31 de Dezembro de 1999 quer posteriormente, até à data do apuramento físico das existências (20 de Março de 2000)." (cfr. fls. 24/26 do apenso).
6- A ora impugnante apresentou à Alfândega de Setúbal para o período de Janeiro a Outubro de 1999 a relação sobre o "controlo de stocks" de álcool etílico sanitário 96° no qual consta a referência à factura n° 22 de 30 de Junho de 1999 e à quantidade de 25.200 litros saídos ( cfr. teor de fls. 78)
7- Em 20/03/2000 foi lavrado o auto de inventário das existências físicas das mercadorias que se encontravam naquela data no Entreposto Fiscal de Armazenagem n° 39950393 e no qual é mencionado "Na presença e com a colaboração dos responsáveis da empresa, foi efectuada uma contagem de todas as qualidades de álcool armazenado à data de 20 de Março de 2000 quer em depósitos quer já embalado para serem comercializadas, formalizando-se o correspondente "auto de inventário" (...) Dessa contagem constatou-se que existia no referido entreposto fiscal:
- álcool etílico 96° puro -- 12.336 litros
- álcool etílico 96° sanitário - 20.498 litros
- álcool etílico 70° sanitário -- 1.092 litros
- álcool etílico 96° desnaturado com bitrex --- 11.910 litros
- álcool etílico 90° Q.I. marcado -- 2.095 litros" (cfr. fls. 20 e auto de inventário de fls. 70/72 do apenso).
8- Em 07/04/2000 foi lavrado o auto de declarações de Luís Filipe Antunes Casanova Ferreira, na qualidade de procurador, da ora impugnante, nos termos do qual consta que "perguntado sobre as quantidades de álcool etílico de origem agrícola a 96° em percentagem por volume, que foram transaccionadas através do entreposto fiscal referido, entre 1 de Janeiro e 20 de Março do corrente ano, bem como as perdas efectivas desse álcool, ocorridas naquele período, respondeu que: Recebeu e deram entrada no aludido entreposto fiscal oito remessas de álcool etílico agrícola a 96°, num total de 243.645 litros sendo provenientes: sete remessas da Azucarera del Guadalfeo e uma remessa da Sofécia. Por outro lado vendeu e deu saída no mesmo entreposto fiscal de sete remessas de álcool etílico agrícola a 96°, parcialmente desnaturado com cetrimida, embalado, para fins terapêuticos ou sanitários, em frascos de 0,25 litros cada à Bicarboquímica num total de 187.889 litros e mais catorze remessas de álcool etílico agrícola a 96° (puro) sendo três remessas para a Lecifarma, oito remessas para a Solusif, duas remessas para a Maialab e uma remessa exportada para Angola, num total de 39.885 litros e ainda duas remessas de álcool a 90° QI, totalmente desnaturado, à Bicarboquímica, num total de 6.155 litros, equivalente a álcool a 96° a 5.770 litros. Ou seja, em termos de total geral de álcool etílico agrícola, referenciado a 96° em percentagem por volume, vendeu e saiu do citado entreposto fiscal de armazenagem no período em causa, 233.544 litros. Mais declara que durante o período a que nos vimos referindo, houve um total de perdas efectivas de álcool etílico agrícola a 96° de 2.511 litros" (como consta do teor de fls. 74/75 do apenso)
9- Foi indagado junto das autoridades aduaneiras espanholas através do instituto de assistência mútua administrativa, tendo sido comunicado que inexistiam divergências quanto às quantidades transaccionadas (cfr. fls. 22 do apenso).
10- Com data de 06/08/2000 foi emitido o ofício n° 846 da Direcção de Serviços de Prevenção e Repressão da Fraude dirigido à Alfândega de Setúbal no qual é mencionado que .. ( . . .) constatou-se que nos registos de movimento do álcool no entreposto fiscal de armazenagem da A... para o ano de 1999, relativamente à aludida transacção foram contabilizados como tendo saído 25.200 litros do referido álcool. Além disso foi ainda declarado à Alfândega de Jurisdição (Setúbal), através de relação, remetida pela A..., sobre o 'controlo de stocks" do álcool etílico sanitário 96°, referente ao movimento deste produto entre Janeiro e Outubro de 1999 que, para aquela transacção tinham saído 25.200 litros. Nesta conformidade existe uma diferença de 18.900 litros, contabilizados a mais no movimento de saídas do entreposto fiscal de armazenagem, para os quais nem mesmo se vislumbra justificação plausível, em termos de eventuais erros, omissões ou faltas, uma vez que, tal diferença não transparece no saldo de existências finais (quer nos registos de movimento do entreposto fiscal quer no apuramento físico das existências reais), e todas as perdas efectivas de álcool foram consideradas na contabilidade de existências do entreposto fiscal, as quais foram indicadas pela própria empresa e achadas conforme. Este facto constitui a firma A...- Fabricação de Embalagens e Embalamento de Álcool, lda., como sujeito passivo de ISA, nos termos da alínea a) do art. do Decreto-lei n° 117/92 de 22 de Junho, por álcool saído de depósito fiscal ou autoconsumidos, de acordo com o n° 3 do artigo 19° do mesmo diploma legal. Assim, a contabilização em termos de saída do entreposto fiscal de armazenagem de mais 18.900 litros de álcool etílico 96°, do que aquele que foi efectivamente vendido, constitui facto gerador de ISA, nos termos da alínea c) do artigo do referido Decreto-lei n° 117/92, sendo aplicáveis as taxas em vigor à data da emissão da factura comercial de venda. O montante de ISA devido (provisoriamente calculado) ascende a 29.611.008$00 acrescido dos juros compensatórios aplicáveis." (cfr. fls. 1/2 do apenso).
11- Em 28/09/2000 foi a ora impugnante notificada do teor do ofício n° 2062 de 21/09/2000 no qual consta que “(...) saíram do entreposto fiscal de armazenagem, de que V: Exas são titulares, ou foram autoconsumidos, 18.900 litros de álcool etílico a 96%, sem qualquer justificação válida, constitui essa empresa como sujeito passivo de ISA, nos termos da alínea a) do artigo do Decreto-lei n° 117/92 de 22 de Junho, de acordo com o disposto no n° 3 do art. 19° do mesmo diploma legal. Nestes termos foi apurada a dívida aduaneira de 32.155.221 $00, referentes a 100$00 de impresso, 29.611.008$00 de ISA e 2.544.113$00 de juros compensatórios calculados de 1 de Julho de 1999 a 20 de Setembro de 2000 à taxa de 7%. Dado o exposto e para cumprimento da alínea a) do n° 1 do art. 60° da lei Geral Tributária (...), é concedido a V. Exa o prazo de dez dias para efeitos do exercício do direito de audição prévia, conforme o n° 5 do mesmo artigo" (como consta do teor dos documentos de fls. 97 e 97 /verso).
12- A impugnante exerceu por escrito o seu direito de audição como consta do teor de fls. 99/108 do apenso.
13- Por despacho de 5 de Dezembro de 2000 do Director da Alfândega de Setúbal foram mantidas as conclusões do relatório e a proposta de cobrança do imposto sobre o álcool acrescido de juros compensatórios (cfr. teor dos documentos de fls. 115/127 do apenso e cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
14- Em 04/12/2000 foi efectuada a liquidação de imposto sobre o álcool e juros compensatórios no montante total de 29.792.830$00 (cfr. fls. 130 do apenso).
15- Em 14/12/2000 foi emitido o ofício n° 2813 dirigido ao ora impugnante para efeitos de notificação da liquidação referida no ponto anterior, sendo o prazo para realizar o seu pagamento de 5 dias a contar da data da recepção do referido ofício (cfr. fls. 128/129 do apenso).
16- A ora impugnante foi notificada do teor do ofício n° 2813 em 18/12/2000 como consta da assinatura do aviso de recepção de fls. 129/verso do apenso.
17- Em 23/03/2001 foi apresentada junto da Alfândega de Setúbal a petição de impugnação de fls. 1/53.
18- Os frascos eram enchidos inicialmente com 250 ml mas em 2004 começaram a encher os frascos de álcool com 255 ou 256 ml (cfr. depoimento de Sónia Calado, embaladora da A... e melhor identificada na acta de inquirição de fls. 133/136).
19- Foi registado por lapso no inventário permanente a quantia de 25.200 litros em vez de unidades como consta da factura n° 22 (cfr. depoimento prestado por Saul Neves, empregado da A... ao tempo e melhor identificado da acta de inquirição de fls. 133/136).
20- No inventário permanente constava uma coluna com as perdas no valor de 7,5 por mil que era sempre registada (cfr. depoimento da testemunha Saul Neves).
21- O valor das perdas referidas no ponto anterior era meramente contabilístico (cfr. depoimento da testemunha Saul Neves).
22- Em 1999/2000 a A... dispunha de dois depósitos; um vertical com capacidade de 20.000/22.000 litros, e um horizontal com capacidade de 10.000 litros onde se processava a desnaturação do álcool (cfr. depoimento de João Botelho, funcionário da DGAIEC melhor identificado a fls. 135).
23- Os inspectores da Alfândega não mediram a temperatura do álcool em 20/03/2000, por naquele dia não existir nem calor nem frio excessivo, e não ter sido suscitada qualquer questão relacionada com a temperatura do álcool por parte dos elementos da A... que acompanharam a contagem do álcool, que justificasse a medição da temperatura (cfr. depoimento de Manuel Martins, funcionário da DGAIEC que ao tempo realizou a acção de inspecção e melhor identificado na acta de inquirição de fls. 154/155).
* *
A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo e dos depoimentos das testemunhas acima expressamente referidos em cada um dos pontos do probatório.

Os trabalhadores da impugnante que foram ouvidos em audiência de inquirição não souberam precisar as datas em que existiu alteração ao transporte do álcool passando do transporte em cisternas e bidões para o transporte em camiões. Também não souberam precisar a existência de calibragem das máquinas de embalamento/enchimento do álcool.

-XXX-
- Nos termos do disposto no art.º 712.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art.º 2.º, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), oficiosamente, elimina-se do probatório a matéria do seu ponto 19.º, já que, em conjunto com a demais matéria provada a mesma se revela contraditória, como com a matéria do seu ponto 6., bem como se revela contraditória com outras provas constantes dos autos, como com a apurada no varejo efectuado, não se podendo dar como provado que a diferença entre as menções daqueles dois meios de escrita – inventário permanente do armazém 25.200 litros, e contabilidade de vendas da impugnante 6.300 litros – se deva a mero lapso, sem correspondência com a realidade a indicada no inventário permanente.


4. Tendo sido imputados à sentença recorrida os vícios formais de omissão de pronúncia e de contradição entre os seus fundamentos e a decisão – cfr. matéria dos seus pontos 1. e e 2. e 7. a 12 das conclusões do recurso, embora a final se “tenha esquecido” de formular o correspondente pedido já que apenas pede a sua revogação - a existir, conducente à declaração da sua nulidade, porque os mesmos a ocorrerem gerarem, na realidade, a nulidade desta, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alíneas d) e c), 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer em primeiro lugar, destas invocadas nulidades.

Aquela primeira nulidade só ocorre, nos termos daquelas normas citadas em primeiro lugar, quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra(s), como constitui jurisprudência abundante(1).

Como sabiamente invocava o Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 142 e segs - «Esta nulidade está em correspondência directa com o 1.º período da 2.ª alínea do art.º 660.º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras....
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».

Contudo, não substancia, no caso, a recorrente, tal omissão de pronúncia, quer na referida conclusão, quer mesmo na sua anterior alegação de que aquele deveria ser um sua súmula ou síntese(art.º 690.º n.º1 do CPC), e na alegação, pontos 58 a 62), antes se escuda em argumentos e raciocínios por que entende que a quantidade de álcool constante da sua contabilidade se encontrava errada, por virtude de um errado lançamento da factura n.º 22, que nela consta como 25.200 unidades, que entende que se reportam ao número de frascos de 250cc cada um, que não a esse número de litros de álcool, questão que não deixou de ser devidamente analisada na sentença recorrida, como resulta do seguinte trecho da mesma peça decisória:
(...)
Quanto aos fundamentos invocados pelo impugnante para justificar que o valor de 18.900 litros de álcool etilico, equivalente a l8.144 litros de álcool na base de 100% vol., não corresponde a qualquer falta, perda ou diferença sujeita a imposto, do probatório resultou que os serviços de inspecção da Direcção de Serviços de Prevenção e Repressão da Fraude apuraram uma diferença de 18.900 litros de álcool etílico sanitário 96° (que corresponde a 18.144 litros de álcool a 100% de vol.), entre os registos contabilísticos da sociedade A... - Fabricação de Embalagens e Embalamento de Álcool, Lda., e o registo das existências do entreposto fiscal. Dado que já se encontravam consideradas as perdas efectivas, os serviços de inspecção não encontraram justificação para a existência de 18.900 litros registados como saídos a mais, nos registos do entreposto, tendo então aqueles serviços detectado a divergência de registos resultantes da factura n° 22 de 30/06/1999, porquanto foram registados contabilisticamente 6.300 litros de álcool etílico 96° sanitário e na contabilidade de existências do entreposto fiscal foi considerado como tendo saído 25.200 litros do mesmo produto.
A impugnante invocou ter existido um erro por parte de um seu funcionário no lançamento da factura n° 22 no registo do entreposto fiscal tendo o referido funcionário registado 25.200 unidades (mencionadas na factura) como 25.200 litros.
O erro no lançamento da factura foi assumido em audiência de inquirição pelo funcionário da impugnante como consta do ponto 18 do probatório.
No entanto os serviços de inspecção efectuaram um apuramento físico das existências reais no entreposto fiscal de armazenagem, à data em que decorria a inspecção (20 de Março de 2000) , tendo ainda sido analisadas todas as compras e vendas de álcool efectuadas pela ora impugnante entre 1 de Janeiro e 20 de Março de 2000 tendo as quantias sido total e formalmente confirmadas pelo representante (procurador) da A..., tendo ainda declarado o montante total de perdas efectivas havidas naquele período.
Os serviços de inspecção apuraram ainda que em termos de saldo final as quantidades apresentadas sobre a contabilidade de existências do entreposto
eram idênticas às detectadas através do apuramento físico das existências reais.
Salienta-se ainda o facto vertido no ponto 4 e 9 do probatório, de que a ora impugnante apresentou à Alfândega de Setúbal para o período de Janeiro a Outubro de 1999 a relação sobre o "controlo de stocks" de álcool etílico sanitário 96° no qual consta a referência à factura n° 22 de 30 de Junho de 199 e a quantidade de 25.200 litros saídos.
Em face do exposto resulta provada a efectiva diferença de 18.900 litros de álcool sanitário a 96°.
(..)
pelo que não pode ter ocorrido a apontada omissão de pronúncia.

A invocada contradição entre os fundamentos da sentença e a respectiva decisão - cfr. matéria dos mesmos pontos - a existir, constituiria causa de nulidade da sentença subsumível às normas dos art.ºs 144.º do CPT, hoje 125.º n.º1 do CPPT e 668.º n.º1 c) do CPC - Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão - conducente à declaração da sua nulidade.

Entende a mais autorizada doutrina (v. Prof. J. A. Reis, CPC Anotado, Vol. V, pág. 141 e A. Varela, J. M. Bezerra e Sampaio e Nora, CPC Anotado, pág. 686) que este vício afecta a estrutura lógica da sentença, por contradição entre as suas premissas, de facto e de direito, e a conclusão - os fundamentos invocados pelo juiz não conduziriam ao resultado expresso na decisão; conduziriam logicamente, isso sim, a resultado oposto. Ou seja, existe aqui um vício real no raciocínio do julgador, uma real contradição entre os fundamentos e a decisão que se analisa em que a fundamentação aponta num determinado sentido e a decisão segue caminho oposto, ou, pelo menos, direcção diferente.

Lendo e analisando toda sentença recorrida dela se vê, sem margem para dúvidas que, por ter sido dada como provada a diferença dos referidos 18.900 litros de álcool entre a contabilidade de vendas e a real existência apurada, através, além do mais, pelo varejo efectuado, é que constituiu a matéria tributável base do imposto, tendo por isso e em concordância, sido a impugnação judicial julgada improcedente com a manutenção da liquidação efectuada que naquela diferença repousava, já também nenhuma outra circunstância se mostrava provada que afastasse tal liquidação, sendo esta conclusão não mais que a consequência lógica, coerente e normal das premissas em que repousa, não podendo assim a mesma sentença padecer do invocado vício formal.


Improcede assim a matéria das conclusões sobre os invocados vícios formais da sentença recorrida.


4.1. Na matéria das conclusões dos seus pontos 3. a 6., vem ainda a recorrente insurgir-se com a sentença recorrida, por a mesma ter efectuado uma análise crítica da prova, manifestamente insuficiente, ao não ter esclarecido os elementos de prova e os concretos factos que a levaram a aceitar como verdadeiros os elementos adiantados pelas autoridades aduaneiras que chegaram à conclusão das saídas de álcool e que culminou naquele valor em falta de 18.900 litros.

Nos termos do disposto no art.º 123.º n.º2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.
E a norma do art.º 659.º n.º3 do CPC, dispõe que o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos, ou por confissão reduzida escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.

Também nesta matéria, carece de razão a ora recorrente.
Na verdade, no probatório fixado na sentença recorrida não deixou a M. Juiz do Tribunal “a quo” de fixar os factos provados, subordinados a números, indicando à frente de cada um deles o documento que servia para essa prova, como no final explicitou, que se nos afigura assaz desenvolvido face às pertinentes questões a decidir, bem como justificou alguma da factualidade que entendeu não provada, por referência ao concreto quadro da prova existente nos autos, tendo depois mesmo na aplicação do direito voltado a fundamentar, de forma minuciosa, por que considerava provada a efectiva diferença de 18.900 litros de álcool, base fundamental da liquidação impugnada, não se podendo afirmar, como faz a recorrente, que a mesma deixou de fazer a pertinente análise crítica, tendo depois fundamentado com o direito que no caso entendeu aplicável cujas normas citou, pelo que a sentença recorrida jamais poderia ter incorrido neste invocado vício.

Quanto aos factos assim fixados no probatório da mesma sentença, com a análise crítica efectuada que como tal os considerou, bem poderia a ora recorrente reagir, através do presente recurso jurisdicional, invocando os concretos pontos que considera incorrectos julgados e quais os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, a fim de permitir a este Tribunal reapreciar tal julgamento da matéria de facto efectuado, nos termos do disposto no art.º 690.º-A do CPC, o que a mesma não fez.

Também a transcrição de grande parte do relatório da inspecção, onde foram apurados pelos inspectores aqueles factos descritos, permitia à ora recorrente ter infirmado algum ou alguns deles, e na ausência de prova em contrário, como a M. Juiz do Tribunal “a quo” bem concluiu, na fundamentação seguinte, os mesmos não podem deixar de se darem como provados, por constituírem indícios, fortes, sérios, de que a quantidade de álcool em falta provenha da diferença entre o constante naquela factura n.º 22 e o documento simplificado de acompanhamento (que refere 6.300 litros, mas que até se mostra com algarismos rasurados) – fls 65 e 66 do apenso I – sendo de concluir pela apontada diferença dos referidos 18.900 litros de álcool em falta.

Aliás, a ora recorrente teria ao seu dispor um meio de prova extremamente expedito para demonstrar que aquela factura n.º 22 se referia às 25.200 unidades de embalagens de 250ml de álcool sanitário a 96º, que não de 25.200 litros, bastando para tal ter vindo provar que o preço daquele álcool por litro, então não era de 72$30 As restantes facturas apresentam um preço por litro superior ao desta factura, cerca do dobro, mas sem nunca atingir o valor de 289$20/litro (72$30x4), como resultaria se este preço se referisse à unidade de 1/4. , como nela consta, antes sendo este o preço de uma embalagem de 250ml, não sendo crível que a empresa destinatária lhe tenha pago 25.200 litros de álcool quando só lhe tenham sido fornecidos 6.300 litros, prova que a mesma não fez, nem articula qualquer argumentação neste sentido, quer na sua petição inicial de impugnação, quer na presente alegação.

Por outro lado ainda, das restantes 39 facturas emitidas pela ora recorrente no ano de 1999, cujas cópias constam de fls 80 a 119 do anexo Doc., quanto a tal álcool, todas se reportam a UNI – LT, que não a unidades de 1/4 de álcool embalado, e mesmo no que é vendido embalado consta esta menção em litros, sendo certo que nenhuma explicação a ora recorrente veio avançar para esta diferença de tratamento apenas na denominação da factura n.º22, referida.


Improcede assim, também, a matéria das supra-indicadas conclusões do recurso.


4.2. Na matéria dos pontos 13. a 20. das suas conclusões do recurso, vem a ora recorrente invocar a violação das normas dos art.º 8.º e 19.º do Dec-Lei n.º 117/92 ou dos art.ºs 39.º e 56.º do CIEC, na medida em que presumem certos teores de perdas, por violação dos princípios da necessidade, da proporcionalidade, da justiça e da boa fé, consagrados nos art.ºs 18.º n.º2 e 266.º n.ºs 1 e 2 da CRP.

As normas dos art.ºs 8.º e 19.º do Dec-Lei n.º 117/92, aplicável no caso como adiante se verá, têm a seguinte redacção:
8.º - É de 150$ a taxa aplicável por litro de álcool na base de 100% vol. a 20C.
19.º (Faltas ou perdas admissíveis)
1 – Entende-se por faltas ou perdas admissíveis de álcool o limite máximo de diferenças para menos regularmente considerado como aceitável, sem necessidade de justificação, salvo prova bastante em contrário.
2 – O limite máximo previsto no número anterior é fixado em 7,5%º do volume de álcool produzido ou armazenado, conforme o caso, em cada ano civil.
3 – As faltas ou perdas de álcool verificadas nos processos de produção ou de armazenamento até à saída da fábrica ou depósito fiscal e que excedam as admissíveis, serão consideradas, salvo prova bastante me contrário, como álcool fabricado e saído da fábrica ou depósito fiscal ou autoconsumido, dando lugar à liquidação e pagamento do imposto correspondente.

Desde já se poderá avançar não vermos como a existência daquelas presunções contidas nas citadas normas possam ofender as citadas normas constitucionais por violação dos citados princípios, quando as mesmas sempre podem ser afastadas caso a caso, mediante prova bastante em contrário, como a própria lei expressamente veio a consagrar no art.º 73.º da LGT, pelo que as mesmas não se impõem, inelutavelmente, a qualquer contribuinte, sendo—lhe sempre facultada a possibilidade de vir afastar aquelas perdas-padrão fixadas na lei, pelo que não pode deixar também de improceder a matéria atinente a tais conclusões do recurso.


4.3. Na matéria dos pontos 24. a 28 das suas conclusões do recurso, pretende a mesma ora recorrente que, em todo o caso, sempre seria de aplicar ao álcool em falta as normas dos art.ºs do CIEC aprovado pelo Dec-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro, já em vigor em Março de 2000, que não as normas do Dec-Lei n.º 117/92, de 22 de Junho, anteriormente vigentes.

Como bem se fundamenta na sentença recorrida também quanto a esta matéria, o facto tributário ocorreu em 1999, ou seja por referência àquela factura n.º 22, de 30 de Junho de 1999, pelo que foi nesta altura que se preencheram todos os pressupostos da liquidação, sendo-lhe aplicável a lei então vigente - o citado Dec-Lei n.º 117/92 – (por força do princípio geral tempus regit actum e da norma expressa do art.º 12.º n.º1 da LGT que assim o dispõe), que não o CIEC, só posteriormente entrado em vigor, concretamente em 1.2.2000, por força do disposto no n.º1 do art.º 4.º do Dec-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro, por cujo art.º 1.º aprovou o referido CIEC, independentemente da data posterior em que realmente a mesma liquidação veio a ter lugar, improcedendo também a matéria destas conclusões.


Improcedem assim, todas as conclusões do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em doze UCs.


Lisboa, 02/10/2007

EUGÉNIO SEQUEIRA
VALENTE TORRÃO
LUCAS MARTINS



(1) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491.