Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1162/04.3BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 01/09/2025 |
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Relator: | JOANA COSTA E NORA |
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Descritores: | AUDIÊNCIA PRÉVIA NULIDADE PROCESSUAL |
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Sumário: | Proferida sentença a conhecer do mérito da causa sem ter sido realizada audiência prévia, sem que a mesma tivesse sido dispensada e sem que se trate de situação de não realização ex lege, ocorre nulidade processual por omissão de um acto prescrito pela lei - a realização da audiência prévia - porquanto se trata de irregularidade que influiu no exame e decisão da causa na medida em que obstou a que as partes pudessem discutir de facto e de direito a matéria dos autos sobre a qual o juiz se preparava para conhecer de mérito. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção COMUM |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO M…, LDA, intentou acção administrativa comum contra o Estado Português. Pede: “a) Seja o R., como responsável por acto legislativo lícito, condenado a reconhecer a validade da decisão da Comissão Arbitral e, em conformidade, a pagar à A. a indemnização que foi por aquela fixada, tendo em conta o que se articulou no nº 45º, ou seja, 35.894.800$00 ou 38.700.560$00, conforme da prova pericial se conclua que o valor de cada acção é de 60.366$00 ou de 63.085$70, acrescida dos juros moratórios e compensatórios desde a nacionalização até ao pagamento, tal como foi decidido pela Comissão Arbitral. E, se for entendido como mais correcto, deverá a indemnização-base ser actualizada em função dos índices de desvalorização monetária até à condenação e acrescida de juros de mora até ao efectivo pagamento. Para tanto, deverá o Tribunal julgar incidentalmente inconstitucionais as normas dos artigos 14º e 16º da Lei nº 80/77, 24º do D.L. nº 51/86 e 8º a 11º do D.Lei nº332/91 por violarem o artigo 205º da C.R.P.; b) Subsidiariamente, seja o R. condenado, como responsável por acto legislativo de nacionalização, embora lícito, a pagar à A. a justa indemnização que vier a ser apurada através de prova pericial ou liquidada em execução de sentença, em função dos princípios gerais do direito e do regime jurídico das expropriações, nos termos do disposto nos artigos 1º e 13º da Lei nº80/77, devendo o Tribunal desaplicar as normas do D.Lei nº 528/76, do D.Lei nº 786-A/77 e do D.Lei nº332/91 (artigo 1º e 11º) por serem orgânica ou formalmente inconstitucionais, e ainda materialmente inconstitucionais, na medida em que violam o direito de propriedade, o direito à protecção da confiança e o direito à igualdade, consagrados nos artigos 62º, 1º a 3º e 13º da C.R.P.; Incidentalmente deverá julgar nulos ou inexistentes os despachos normativos nºs. 16/90 e 60/92, emitidos ao abrigo de normas inconstitucionais e desaplicar a Resolução do C. Ministros nº243/80 por ofender a reserva de competência da A. República, reconhecendo que a A. tem o direito de acesso à Jurisdição Plena (artº 20º da C.R.P.). Em consequência deste primeiro pedido subsidiário, seja o R. condenado a pagar à A. indemnização que, tomará em conta todos os elementos do património, a rendibilidade e a cotação na data da nacionalização, além do goodwill, (arts. 94º e 124º) devendo essa indemnização ser em qualquer caso actualizada de acordo com os coeficientes de desvalorização da moeda na data da condenação, com juros de mora a partir daí e até ao pagamento efectivo. c) Como pedido cumulativo, seja o R. condenado a pagar à A. a indemnização pelo valor que aquele pagou ao cidadão A… por cada acção da E…., com fundamento, designadamente, nos princípios do Estado de direito democrático, da igualdade e da proporcionalidade, vertidos nos arts. 2º, 13º e 18º da C.R.P.” Pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa foi proferida sentença a julgar improcedente a acção e a absolver o réu do pedido. A autora interpôs o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões: “i. Vem a Autora recorrer do despacho de 31MAI22 que a) não admitiu a ampliação da causa de pedir, b) indeferiu o pedido de inquirição de testemunhas, c) confirmou o indeferimento do pedido de prova pericial, e, d) indeferiu o pedido de documentos em poder de terceiro; ii. e do “saneador sentença” de 31MAI22 que julgou “totalmente improcedente a presente acção, absolvendo o R. do pedido principal, bem como dos dois pedidos subsidiários”, e condenou a Autora em custas. iii. Portugal é, por determinação da Lei Fundamental, “um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, (…), no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais, e na separação e interdependência de poderes, (…)” (art.2º CRP), no qual, nomeadamente: “2. O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática.” (art.3º CRP); “1- Todos os cidadãos (…) são iguais perante a lei.” (art.13º CRP); “4- Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável, e mediante processo equitativo” (art. 20º da CRP); “1- Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar justiça em nome do povo. 2- Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.” (art. 202º da CRP); “Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei.” (art. 203º da CRP); “Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consagrados.” (art.204 da CRP); “1. As decisões dos tribunais (…) têm que ser fundamentadas nos termos da lei,” (art. 205º da CRP); - são nulas as sentenças (ou decisões), que não especifiquem as razões de facto e de direito que justificam a decisão (art. 615º, nº 1, al. b), do CPC, aplicável ex vi art. 1º do CPTA.) iv. Tanto basta para ter de concluir-se que todas as decisões recorridas são ilegais, por violação (aliás grosseira) quer normas Constitucionais, quer a Lei em geral, e por relevarem de puro e proibido arbítrio, pelo que deverão ser revogadas. v. O Tribunal a quo, com as 3 primeiras decisões recorridas, de 31MAI22, de uma penada, e sem especificar qualquer facto ou direito que as fundamente, mas tão só tão obscuras quanto notoriamente falsas conclusões/opiniões, a) por um lado, privou a Autora do direito de “alterar e ampliar a causa de pedir” na Réplica, então consagrado no invocado art.273º do CPC; sendo que a 14JUL17 havia sido proferido (pela Juiz Ana Trindade) despacho, no qual, admitindo e invocando os factos alegados pela Autora na “ampliação da causa de pedir”, e com fundamento nestes, foi decidido indeferir a excepção da prescrição arguida pelo Réu Estado; b) por outro lado, privou a Autora de toda a prova testemunhal por ela oferecida (10 testemunhas), e, desse modo, violou o direito a processo equitativo; c) depois confirmou o indeferimento da perícia requerida pela Autora; d) e por fim, indeferiu o pedido da Autora de que fosse ordenada a junção de documentos em poder de terceiro (do MP, do Ministério das Finanças e da Assembleia da República, ou tão só do Réu Estado); e) Tais decisões, por não estarem fundamentadas nem de facto nem de direito, padecem de nulidade, nulidade que desde já se argui e deve ser declarada. vi. O Tribunal a quo, com as mencionadas decisões, privou a Autora de meios de prova legalmente à disposição das partes, assim impedindo que a Autora faça prova dos factos por si alegados, e, a final, que esta tenha ganho de causa. vii. Sendo que entre as 10 testemunhas que, dessa forma, o Tribunal a quo impediu que depusessem, se encontram todos aqueles que tiveram intervenção direta nos factos relevantes alegados pela Autora, nomeadamente no Capítulo V. da PI, onde reclamou o “DIREITO DA A. À NÃO DISCRIMINAÇÃO”. viii. É notório que o depoimento das testemunhas oferecidas pela Autora não só não é “desnecessário”, como, pelo contrário, se revela indispensável à descoberta da verdade e à boa resolução da demanda. ix. Ao indeferir a inquirição das testemunhas oferecidas pela Autora, concluindo obscuramente serem as mesmas desnecessárias, o Tribunal a quo, não só violou gravemente a lei, e o direito a processo equitativo, como, sem qualquer fundamento legalmente atendível, privou a Autora de prova legalmente admissível e essencial para a boa decisão da demanda, como impediu que a Autora provasse a veracidade dos factos por si alegados na PI e demais articulados, como impediu que a Autora provasse quer a falsidade das considerações, afirmações e conclusões alegadas pelo Réu Estado nos articulados que apresentou, quer a falsidade das afirmações e conclusões feitas constar no “saneador sentença” de 31MAI22, quer a notória ilegalidade da sentença recorrida. x. E o mesmo terá de concluir-se relativamente à decisão que, alegando obscuramente serem os mesmos desnecessários, indeferiu o pedido de que fossem juntos aos autos documentos em poder de terceiro. xi. Ao indeferir a junção de documentos em poder de terceiro, concluindo obscuramente serem os mesmos desnecessários, o Tribunal a quo, não só voltou a violar gravemente a lei, como mais uma vez privou a Autora de prova legalmente admissível e essencial para a boa decisão da demanda, como mais uma vez impediu que a Autora provasse a veracidade dos factos por si alegados na PI e demais articulados, como mais uma vez impediu que a Autora provasse quer a falsidade das considerações, afirmações e conclusões alegadas pelo Réu Estado nos articulados, quer a falsidade das afirmações e conclusões feitas constar no “saneador sentença” de 31MAI22, quer a notória ilegalidade do “saneador sentença” que de seguida proferiu. xii. A sentença recorrida, na parte em que decidiu a questão “DO DIREITO À NÃO DISCRIMINAÇÃO”, porque não fundamentada nem de facto nem de direito é nula. xiii. O que forçosamente também se terá de concluir é que as verdadeiras questões suscitadas quanto “AO DIREITO DA A. À NÃO DISCRIMINAÇÃO” pura e simplesmente foram omitidos e ignorados na matéria de facto dada como provada; que, da matéria dada como provada não constam os factos relevantes alegados e provados pela Autora, e que o tribunal não extraiu dos documentos juntos aos autos as consequências que deles forçosamente tem que se extrair, xiv. Como seja: a. o facto de no Acordo celebrado entre o B…, de um lado, e A…e a S…, de outro lado, a 15ABR92, o B…se ter obrigado a pagar a A… a indemnização no valor de 10 milhões de contos “imediatamente” (cf. Ponto 2. Al. C) do Acordo junto a fls.384); b. o facto de essa indemnização não ter sido paga “imediatamente” c. mas, tão só, depois de decorrido o prazo de 60 dias estabelecido no despacho Normativo nº60/92, emitido a 15ABR92, e publicado a 07MAI92; d. E dentro do qual poderia ser impugnado o valor definitivo de indemnização pela expropriação de cada ação da E…; e. E considerando que na sentença nenhum desses factos foi dado como provados, e, em vez deles, foram dados como provados tendo na sentença recorrida sido dado como provado xv. Impugna-se a decisão quanto à matéria de facto, pois a. são irrelevantes para a apreciação da causa os factos nºs 1, 2, 15, 16 e 19; b. é obscuro o facto nº 9, que deve ser substituído pelo alegado no art. 145º da P.I.. c. o facto nº 18 é conclusivo e obscuro e nem sequer é invocada prova que o fundamente; d. relativamente aos factos dados como provados sob o nº 22 aceita-se como verdadeiro que no dia 15ABR92 o B…celebrou com A… e com a S… um Acordo sujeito à condição suspensiva da ratificação pela Assembleia Geral do B…, mas não se aceita como verdade que o B… se tenha obrigado a pagar a AC ou a quem ele designasse 10.000.000 de contos como indemnização “por prejuízos (...) reclamados em processos judiciais aí identificados”, pois que se desconhece, e não foi provado que alguma vez AC tenha “reclamado” por prejuízos, e, por outro lado, tem que passar a constar dos factos provados que o B…, neste acordo, se obrigou a pagar a indemnização de 10.000.000 de contos “imediatamente” (cfr. ponto 2, al. c) do Acordo transcrito, a fls. 394) e. os factos dados como provados sob o nº 23 só podem ser provados por certidão extraída do processo 8930/89, que não se encontra junta aos autos f. O mesmo se diga relativamente ao facto nº 24, que não tem como suporte qualquer prova efectuada nos autos; g. Nos factos dados como provados sob o nº 30 deverá constar que o prazo de impugnação do valor definitivo da indemnização fixado pelo Despacho Normativo nº 60/92 era de 60 dias, conforme consta do mesmo e se encontra junto aos autos. xvi. Quanto aos factos dados como não provados, devem os mesmos ser dados como provados, pois: a. quanto ao facto não provado nº 1, o mesmo resulta provado pelo Doc. 20 junto pela A. a fls. 349, e que não foi impugnado pelo R., sendo que, pelo Despacho de 15MAI21, a titular dos autos pediu que lhe fosse presente para consulta o processo 8930/89, que correu termos no TACL, no qual, como aqui, era réu o Estado. b. Quanto ao facto não provado nº 2, deve o mesmo também ser dado como provado, pois que o Estado, aqui R., era accionista único do B… e, consequentemente, foi o Estado que ratificou o acordo em causa; e por outro lado, jamais existiu “a identificação dos prejuízos a ressarcir” como falsamente se afirma na sentença recorrida. c. Quanto ao facto não provado nº 3, deve o mesmo também ser dado como provado, pois que o Doc. 28 junto a fls. 419 pela A. não foi impugnado pelo R., e dele textualmente resulta o que foi alegado pela A. no artigo 161º da P.I.; d. Sendo irrelevantes as demais considerações a que se entregou o Tribunal sobre a confissão de factos. xvii. As decisões pelas quais: se indeferiu a ampliação da causa de pedir; se indeferiu a prova testemunhal e se indeferiu o pedido de documentos em poder de terceiro são nulas por falta de fundamentação, por força do disposto no art. 615º, nº 1, al. b), do CPC xviii. A decisão de não admissão da causa de pedir é desde logo nula porquanto o Tribunal, apesar de se pronunciar sobre tal questão (caso contrário a nulidade seria por omissão de pronúncia – art. 615º, nº 1, d), do CPC), se limitou a tecer considerações não especificando em que norma ou normas se baseou para decidir como decidiu. xix. A A,, quando da ampliação da causa de pedir, como resulta do acima exposto, invocou expressamente que o fazia ao abrigo do disposto no art. 273º do CPC, sendo que o Tribunal a quo não refere esta ou qualquer outra disposição legal, e, tecendo obscuras considerações, não admite a ampliação da causa de pedir. Ou seja, a decisão é nula por falta de fundamentação xx. O mesmo se diga no que respeita à decisão que não admitiu a prova testemunhal, pois, além de não especificar qualquer razão de direito, ou qualquer norma jurídica, limita-se afirmar que o faz “por ser desnecessário, face ao adquirido processual, tendo por referência a factualidade essencial à decisão da causa”. xxi. Qual o adquirido processual que, no entender do tribunal, justifica a desnecessidade da prova testemunhal? E em relação a que factos? Todos? Relativamente a todos os pedidos? E qual a factualidade tida por essencial que igualmente justifica a desnecessidade da prova testemunhal? xxii. Esta decisão é obscura, ambígua, e totalmente desprovida de fundamentação juridicamente atendível, geradora da sua nulidade, xxiii. Mutatis mutandis, o que se expôs supra para as arguidas nulidades das demais decisões, vale para a decisão de indeferimento do pedido de documentos em poder de terceiro: por que razão o Tribunal entende que os documentos em poder de terceiros são desnecessários face aos factos integradores das causas de pedir invocadas? Qual a ratio factual e jurídica desta decisão? Mais a mais porquanto, como resulta supra, o Tribunal, com a mesma titular, ordenou por diversas vezes que o R. juntasse aos autos os documentos solicitados pela A., o que o R. não fez. xxiv. O Tribunal contemporizando com esta actuação ilícita e de má-fé do R., vem agora, em 31MAI22, e apesar dos apelos da A., considerar, sem mais, desnecessário tudo aquilo que anteriormente ordenou fosse junto, como se a desnecessidade adviesse de uma qualquer causa externa aos autos. xxv. Esta decisão do Tribunal mais não constitui que uma ilegal decisão-surpresa, a todos os títulos incompreensível, ditada ao arrepio de todo o comportamento anterior, com a agravante de que o Tribunal nem sequer se pronunciou sobre os requerimentos da A. apresentados na sequência dos requerimentos do R. de que não teria conseguido encontrar mais do que o juntou aos autos (v.g., requerimentos de 1JUL21, 10 e 13SET21). A decisão de indeferimento do pedido de documentos em poder de terceiro é, pois, nula. xxvi. Caso se entenda que a decisão que não admitiu a causa de pedir não é nula, o que apenas em tese se admite, então certamente o Tribunal terá proferido tal decisão em manifesto lapso quanto à norma jurídica aplicável, o que gera a sua ilegalidade. xxvii. Quando da ampliação da causa de pedir, pelo requerimento de 15NOV04, na Réplica, a disposição legal aplicável a essa questão era o art. 273º do CPC então em vigor (CPC1961), aliás expressamente invocado naquele requerimento, nos termos da qual “Na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada na réplica, se o processo a admitir ...” (nº 1), o que manifestamente era o caso. xxviii. Todos os argumentos, não estribados em qualquer norma jurídica, que o Tribunal a quo expendeu para basear a sua decisão de não admissão da ampliação da causa de pedir são inaplicáveis ao caso vertente. xxix. A decisão ora recorrida é ilegal, por violação do art. 273º, nº 1, do CPC, na versão então aplicável. xxx. Admitindo por mera hipótese académica que não ocorre a nulidade decorrente da falta de fundamentação, então sempre se dirá que a decisão de não admissão da prova testemunhal é ilegal e, ainda, que a norma que lhe subjaz, com o sentido interpretativo que ressalta da decisão, é inconstitucional. xxxi. Não só se verifica a violação do princípio do inquisitório, pelo qual o julgador tudo deve fazer e ordenar todas as diligências, mesmo oficiosamente, necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio – art. 411º do CPC, xxxii. Como ocorre ainda violação de caso julgado formal. xxxiii. De forma surpreendente face às anteriores vicissitudes processuais, a. Sem que tenha marcado audiência prévia, nem sequer se pronunciando sobre a sua dispensa ou convidando as Partes a pronunciar-se sobre tal intenção b. Sem que tenha sido dada oportunidade à A. para cumprir o despacho de 19SET17, esclarecendo qual a matéria a que pretendia fosse produzida a prova testemunhal; c. Sem que cumprisse o que fez constar no Despacho de 6ABR21, de que oportunamente daria às Partes o ensejo de actualizarem os seus requerimentos probatórios de produção de prova testemunhal, Aos 31MAI22 indefere sem mais a prova testemunhal, indefere o pedido de obtenção de documentos em poder de terceiros, xxxiv. No Saneador-Sentença, relativamente ao segundo pedido subsidiário, como referido, o Tribunal a quo, apreciou-o e decidiu-o em uma página e meia (pp. 58/59), mas em 4 parágrafos “úteis” (porquanto, no mais, tratou apenas de fazer uma síntese da alegação da A. e o pedido, qual a alegação do R. e respectiva conclusão a este respeito). xxxv. O Tribunal a quo não apreciou criticamente o extensamente alegado pela A. a propósito, limitando-se a fazer afirmações não fundamentadas e eivadas de sofismas e deturpações. xxxvi. Começando pelo último argumento: e se a A. tivesse intentado também contra o Estado uma ou várias acções e o Estado não tivesse feito transacção com a A.. O argumento manter-se-ia? O que é que a intentar acções contra o Estado tem que ver com a apreciação do tratamento desigual e desfavor relativamente à A. xxxvii. O cerne da questão é se o Estado, aqui R., beneficiou ou não o cidadão A… em detrimento da A. e outros accionistas da E…. Não é se e quem intentou uma ou várias acções. Este argumento é, pois, espúrio e não deve nem pode ser tomado como sério e/ou razoável, muito menos juridicamente atendível. xxxviii. Quanto ao primeiro dos argumentos: que o cidadão A… recebeu pelas acções de que foi titular o valor unitário fixado no Despacho Normativo nº 60/92, talqualmente se passou com a A. Este argumento é apenas meio falacioso .... xxxix. De facto, a A. recebeu, em títulos do tesouro, o correspondente ao valor unitário fixado no dito Despacho. xl. Mas ..... se a ideia fosse , como foi, beneficiar o cidadão A…, o Tribunal a quo terá para si que este receberia, desde logo, um valor unitário superior ao que os demais receberam? Se a ideia fosse beneficiar o dito cidadão, o Estado seria naïf ou o sentimento de impunidade seria de tal sorte que, sem mais, directamente, lhe atribuiria um valor superior que pudesse ser comparado objectivamente com as demais indemnizações atribuídas? xli. Como o Tribunal a quo não é certamente distraído que pudesse ter este entendimento só poderá concluir-se que o raciocínio está eivado de um grosseiro erro nos pressupostos e, portanto, não poderá ser atendível, quer à luz do senso comum quer à luz da sua relevância jurídica. xlii. Resta, pois, o segundo argumento, que, aliás, o Tribunal a quo fez questão de realçar a negrito em parte: que a indemnização de 10 milhões de contos não visou pagar nenhum complemento de indemnização do valor já recebido das mesmas ações, mas sim compensar danos patrimoniais e nãopatrimoniais decorrentes da privação de bens arrestados durante anos, além de ter findado não três processos judiciais como a A. alega, mas sim o conjunto de litígios elencados no texto do acordo acima transcrito xliii. Ora, esta é, pois, a tese do Estado. Tese essa que o Tribunal a quo perfilha e sublinha a negrito xliv. E qual o fundamento para essa certeza apodítica? Qual a fonte da verdade truística, além da palavra do R.? O Memorando de 3ABR92, parece, pois para ele se remete. xlv. O Memorando de 3ABR92 não foi mais do que um instrumento, uma ferramenta, que - no cômputo global, no verdadeiro carrossel de actos praticados pelo R. e suas filiais estatais e empresariais, no mesmo dia ou proximamente -, que aquele, R., em conjugação de esforços com o beneficiário/beneficiado cidadão A… assessorado pelos suspeitos do costume, fabricou para fazer parecer algo. E esse algo foi, precisamente, o benefício inigualitário (passe se o pleonasmo) de que o cidadão A… foi titular. xlvi. A A. pretendia, e pretende - e não se conforma com o facto de o Tribunal a quo, ilegitimamente e ao arrepio do que foi sendo praticado nos autos, coarctar a A. -, com a prova testemunhal e documental em poder de terceiro indicada para a instrução dos autos, é demonstrar que todos aqueles actos e documentos mais não foram, são, uma farsa com a qual se pretende dissimular o tratamento de favor do cidadão A… face aos demais titulares de acções da E…, como a A.. xlvii. Depois de arredar a prova testemunhal requerida pela A., com obscuras e ambíguas afirmações, desprovidas de fundamentação fáctica e jurídica – sendo que a prova testemunhal requerida era relativa aos autores materiais da documentação em causa, sendo que alguns outros, pelo tratamento dado pela Justiça a este processo e ao número de anos, 28, que levou para proferir uma decisão, foram perecendo pelo caminho -, assim como arredar a prova documental em poder de terceiros, depois de, em momentos anteriores, ter determinado ao R. que procedesse à sua junção aos autos – certamente não para praticar actos inúteis mas porque entendeu, então e bem, serem relevantes para a justa composição do litígio e para a descoberta da Verdade -, prova essa absolutamente decisiva para que a A. possa demonstrar o que alega – o tratamento de favor dissimulado por detrás de memorandos e afins -, ou seja, o tratamento desigual. xlviii. O Tribunal a quo, singelamente, acolhe a tese do R. e remete para um Memorando que é, porventura, a principal ferramenta da dissimulação do tratamento de favor. xlix. Este, pois, o estado das coisas no que à fundamentação do Tribunal a quo para considerar “soçobrante” o segundo pedido subsidiário. Difícil seria, aliás, o que quer que fosse não soçobrar depois de os meios necessários a demonstrar os seus fundamentos terem sido criteriosamente arredados do caminho. l. Esta decisão do Tribunal a quo é, pois, ilegal, não só porque assente nas acima apontadas nulidades por falta de fundamentação, ilegalidades por violação das regras processuais quanto aos meios de prova e à obrigação do julgador na prossecução das necessárias diligências para a descoberta da verdade material, li. Como, principalmente, por grosseiro erro nos pressupostos, quando retira (além das meras afirmações do R.) do Memorando de 3ABR92, a justificação para o suposto não tratamento de favor, alegadamente por a indemnização de 10.000.000 de contos ser referente a outras situações e não a um complemento de indemnização pela nacionalização da E…, complemento relativamente aos que os demais accionistas receberam por cada título de que foram espoliados pelo R.. lii. O Tribunal a quo decidiu esta questão sem fazer uma só referência normativa, ao passo que a A., para dela recorrer, tem que indicar as normas violadas, o que demonstra bem a assimetria de tratamento. liii. Se o rigor imperasse, a decisão estaria ferida do vício de falta de fundamentação, por não especificar as razões de direito em que se baseia (art. 615º, nº 1, al. b), do CPC), gerador de nulidade. liv. A decisão recorrida – e sempre sem prejuízo do douto suprimento desse Tribunal Central Administrativo (da mihi factum dabo tibi jus), viola, designadamente, os arts. 410º, 411º, 417º, 429º, 430º, 433º, do CPC. lv. Na sentença recorrida aplica-se, ainda, norma inconstitucional se interpretados os indicados artigos da lei processual com o sentido de ao julgador ser possível excluir meios probatórios requeridos por uma das partes - especialmente se durante o processo foram entendidos como necessários para a descoberta da verdade e haja sido determinado à parte contrária que procedesse à respectiva junção aos autos -, absolutamente necessários para a parte que os requereu fazer prova do que por si foi alegado e constitui causa de pedir, por violação, designadamente, dos arts. 2º, 18º, 20º, 203º, da Lei Fundamental, na medida em que estes consagram os princípios do Estado de direito democrático, o direito a processo equitativo, da descoberta da verdade material, da tutela jurisdicional efectiva, da prevalência da substância sobre a forma, da justa aplicação do direito. (…).” O recorrido Estado Português respondeu à alegação da recorrente, com as seguintes conclusões: “(…) 1) A Autora veio recorrer do Saneador - Sentença que julgou totalmente improcedente a acção, absolvendo o Réu do pedido principal e bem assim dos dois pedidos subsidiários, por discordar dessa absolvição e condenação em custas. E, de percurso, quanto à decisão de não admissão da ampliação da causa de pedir; ao indeferimento do pedido de inquirição de testemunhas; à confirmação do indeferimento do pedido de prova pericial; e, ao indeferimento do pedido de documentos em poder de terceiro. 2) Começa por convocar de modo geral e consensual a ideia do Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais, e na separação e interdependência de poderes. A igualdade dos cidadãos perante a lei, o direito ao processo equitativo, cabendo aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados, com independência e sob o primado da lei e da Constituição. E, bem assim o dever de fundamentação das decisões judiciais, mais concretamente, por referência ao postulado no art.º 615°/1-b) do CPC, aplicável ex vi art.º 1º do CPTA. Não merecendo a nossa concordância, todavia, quanto extrai daí o salto na afirmação que “todas as decisões recorridas são ilegais, por violação (aliás grosseira) de normas Constitucionais, quer da Lei em geral, relevando de puro e proibido arbítrio. 3) O tribunal recorrido não se limitou a emitir conclusões/opiniões obscuras e notoriamente falsas aquando da prolação das 3 primeiras decisões recorridas, deixando de especificar qualquer facto ou direito na respetiva fundamentação. Não privou infundadamente a Autora do direito de "alterar e ampliar a causa de pedir" na Réplica, então consagrado no invocado art.273° do CPC. Diversamente, explicou concisamente que veio invocado um conjunto de factos anteriores à propositura da ação, não tendo sido alegado nem demonstrado o conhecimento superveniente dos mesmos, tratando-se maioritariamente da referência a diplomas legais publicados no Diário da República e em parte, factos já constantes da petição inicial (p.i.), respaldando-se assim e declaradamente na aplicação do princípio da preclusão. 4) No indeferimento dos requerimentos probatórios, não foi violado o direito a processo equitativo, prevaleceu aí a perspetiva do alcance da convicção do tribunal a quo em função do tema decisório, a essa luz constando já dos autos todo o acervo probatório para a boa decisão da causa, resultando então acrescentadas as quesitadas diligências de prova. Ocorreu fundamentação suficiente que afasta o espetro da nulidade convocada pela recorrente. 5) A recorrente também veio invocar a nulidade da sentença recorrida também na parte em que decidiu a questão "Do Direito À Não Discriminação", porque, no seu entender, as verdadeiras questões suscitadas foram omitidas e ignoradas na matéria de facto dada como provada. Desse passo, dizendo que que o tribunal não extraiu dos documentos juntos aos autos as consequências que deles forçosamente tem que se extrair, impugnou expressamente a matéria de facto. 6) Semelhante discussão implica o cotejo do teor da própria decisão recorrida, para cuja fundamentação aqui remetemos por inteiro e uma vez que entendemos que operou equilibrada ponderação na decisão da matéria de facto, dada como provada (e não provada), cumprindo atentar na fundamentação valorada em sede de apreciação crítica da prova. Tida a apreciação crítica aí explanada, outra não podia ser a decisão da Mª Juiz, conforme dando o pertinente relevo à evidencia contida nos documentos trazidos aos autos e criteriosamente analisados, doutro passo asseverando com razoabilidade o motivo da reputação da indemonstração dos factos assim catalogados como não provados (1, 2 e 3). 7) Bem andou a sentença também em sede da apreciação do mérito da causa. Onde explanou a disciplina perfilhada no concernente ao modo de pagamento das indemnizações por nacionalização, convocando profícuo entendimento jurisprudencial, por referência às normas constantes do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 528/76 e dos artigos 19.° e 20.° da Lei n.º 80/77: — “feito mediante a entrega ao respectivo titular, pelo Estado, de títulos de dívida pública, distribuídos por doze classes (I a XII), consoante o menor ou maior valor global da indemnização a vagar, e correspondendo a cada uma dessas classes prazo de amortização e de diferimento progressivamante mais longo e taxa de juro decrescente — não são inconstitucionais, porque o artigo 82.° (hoje artigo 83. °) da Constituição não impõe que a lei fixe um critério único, válido para todo o tipo de casos em que são devidas indemnizações por nacionalizações de bens, antes permite ao legislador o estabelecimento de critérios diferentes que, inclusive, dêem relevo ao tipo e ao montante dos bens nacionalizados. Elas não infringem também o princípio constitucional da igualdade (artigo 13.° da Constituição). 8) Acrescentando que, “É, por isso, constitucionalmente legítimo ao legislador fixar prazos de amortização e de diferimento diferentes e taxas de juro também diferentes em função do montante global a pagar (prazos maiores e taxas de juro mais baixas, para as indemnizações de valor global mais elevado; e prazos mais curtos e taxas de juro mais elevadas, para as indemnizações de menor montante). Do mesmo modo, no plano constitucional, nada obsta a que os pequenos accionistas sejam indemnizados em dinheiro e os restantes recebam títulos de dívida pública.” Mais, “As taxas de juros dos títulos da dívida pública — que vão de 13% para a classe I a 2,5% para a classe XI —, apesar de se situarem abaixo (nalguns casos, mesmo bastante abaixo) das que são praticadas no mercado monetário e financeiro, não conduzem a uma indemnização manifestamente desproporcionada ou irrisória, pelo que não enfermam de inconstitucionalidade as normas que determinam tais taxas.” 9) Acolhendo tal entendimento e concluindo que a forma de pagamento da indemnização e a taxa de juros aplicada não merece qualquer censura. 10) Explicando também, de forma transparente, que a indemnização por nacionalização não tem que obedecer às mesmas características da indemnização por expropriação. “Se a Constituição impõe para o acto expropriativo uma compensação completa, total ou integral do dano suportado pelo expropriado (…), já o mesmo não sucede com a indemnização por nacionalização: para esta não é exigida uma _ full composition, basta apenas uma indemnização razoável ou aceitável (não meramente irrisória ou simbólica), que cumpra as exigências mínimas de justiça que vão implicadas na ideia de Estado de Direito.” 11) Não vale o princípio da reserva do juiz, em termos de ser constitucionalmente proibida à Administração a determinação, em primeira «instância», do valor da indemnização por nacionalização. “Tanto, quer se entenda que a actividade de fixação do montante da indemnização por nacionalização ainda cabe no domínio da função administrativa e não no âmbito da função jurisdicional, quer se entenda que aquela actividade não integra o núcleo duro ou essencial da função jurisdicional, antes se encontra numa zona de fronteira ou numa zona cinzenta entre as funções administrativa e jurisdicional.” 12) As normas constantes dos artigos 8.° a 11.° do Decreto-Lei n. ° 332/91 não infringem o princípio da reserva da função jurisdicional aos juízes e aos tribunais, plasmado no artigo 205.°, n.os 1 e 2, da Constituição, nem, consequentemente, o princípio da separação de poderes, consagrado no artigo 114.° da Lei Fundamental.” 13) Não colhe o argumento do tratamento desfavorável da Autora no confronto da solução conferida ao convocado contencioso paralelo. O tribunal a quo ressaltou bem, da factualidade provada (facto provado n.° 13), que A… recebeu tratamento igual ao da Autora, tendo recebido a indemnização pelas 174 031 ações que possuía na E…, pelo valor unitário de 15 498$00 fixado no Despacho n.° 16/90, o qual não divergiu do valor fixado pelo Despacho Normativo n.° 60/92, de 7 de maio. Por também demonstrar-se que a indemnização de 10 milhões de contos não visou pagar nenhum complemento de indemnização do valor já recebido das mesmas ações, visando antes compensar danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da privação de bens arrestados durante anos, além de ter findado não três processos judiciais como a A. alega, mas sim o conjunto de litígios elencados no texto do acordo acima transcrito - conforme oportunamente representado pelo Estado Réu, por ocasião da sua contestação. 14) Mais salientou ainda, que, a A. não alegou ter proposto contra o Estado qualquer processo judicial, não existindo identidade de situações de facto que reclamem identidade de tratamento, a qualquer título. 15) Não foram violados quaisquer dos invocados normativos legais ou constitucionais. 16) Pelo que bem andou a Mª Juiz recorrida, na decisão de indeferimento dos requerimentos probatórios e de absolvição do estado réu, na improcedência dos pedidos. (…).” Com dispensa de vistos dos juízes-adjuntos (cfr. n.º 4 do artigo 657.º do CPC), cumpre apreciar e decidir. II – QUESTÕES A DECIDIR Face às conclusões das alegações de recurso – que delimitam o respectivo objecto, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC -, e segundo a ordem lógica do seu conhecimento, as questões que ao Tribunal cumpre solucionar são as de saber: a) Se ocorre nulidade processual por não ter sido marcada audiência prévia, sem que o juiz se tivesse pronunciado sobre a sua dispensa ou convidado as partes a pronunciar-se sobre tal intenção; b) Se ocorre nulidade processual por não ter sido dada oportunidade à autora para cumprir o despacho de 19.09.2017, esclarecendo qual a matéria a que pretendia fosse produzida a prova testemunhal; c) Se ocorre nulidade processual por não ter sido cumprido o determinado no despacho de 06.04.2021, no sentido de possibilitar às partes actualizarem os seus requerimentos probatórios de produção de prova testemunhal; d) Se são nulos por falta de fundamentação, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, os despachos, datados de 31.05.2022, de não admissão da ampliação da causa de pedir, de indeferimento do pedido de inquirição de testemunhas, de confirmação do indeferimento do pedido de prova pericial, e de indeferimento de junção de documentos em poder de terceiro; e) Se o despacho de não admissão da ampliação da causa de pedir viola o disposto no artigo 273.º do CPC; f) Se os despachos de indeferimento do pedido de inquirição de testemunhas e de junção de documentos em poder de terceiro violaram o direito a um processo equitativo e/ou o princípio do inquisitório; g) Se o despacho de indeferimento de junção de documentos em poder de terceiro constitui uma decisão-surpresa e/ou viola o caso julgado formal; h) Saber se a sentença padece de nulidade por falta de fundamentação por não especificar as razões de direito em que assenta; i) Se a sentença padece de erro de julgamento de facto, por não constar do probatório factualidade alegada, por constarem do mesmo factos irrelevantes, não provados, conclusivos e obscuros, e por terem sido dados como não provados factos que se mostram provados; j) Saber se a sentença padece de erro de julgamento de direito por ter assentado na falta de instauração de acções judiciais por parte da autora e não ter considerado o invocado tratamento de favor ao cidadão A…. III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida fixou os seguintes factos, que considerou provados: “ 1 - Em 03NOV94, a A. instaurou contra o R. uma ação de condenação com processo ordinário, que veio a ser distribuída à 1ª secção do 11º Juízo Cível (presentemente 11ª Vara Cível) e aí registada sob o nº 12.396, tendo o R. aí sido absolvido da instância, por decisão de 25MAR01, que julgou procedente a exceção de incompetência absoluta daquele Tribunal por infração de regra de competência em razão da matéria, cf. Docs. 2 e 3 juntos à p.i.; 2 - Tal decisão veio a transitar em julgado após a decisão do Tribunal Constitucional que julgou inadmissível um dos recursos interpostos e não conheceu de outro, por inutilidade, notificada à A. por carta registada de 18.03.2004, cf. Doc. 4 junto à p.i.; 3 - A A. é uma sociedade por quotas de natureza privada e tem personalidade e capacidade judiciárias, cf. Doc.1 junto à p.i.; 4 - A 09MAI75 a A. era legítima proprietária de 800 ações nominativas da Empresa de C… (E…), então Sociedade Anónima de Responsabilidade Limitada (acordo); 5 - A 09MAI75, pelo Dec. Lei nº 221-A/75, foi nacionalizada a E…, cujo capital de 100.000 contos era representado por 500.000 ações com o valor nominal de 200$00 cada uma, cf. Doc. 5 junto á p.i.; 6 - Em 29ABR80, o Estado fixou o valor da indemnização provisória de 7.250$00 a pagar por cada ação nominativa da E…, através do Despacho Normativo n.º 145/80, cf. Doc. 6 junto à p.i.; 7 - A 09JUL81, o R. creditou a A. pelo valor de 5.800 contos, correspondente ao capital indemnizatório, acrescido de juros de 2,5% no valor de 1.931.602$58, o valor de 7 635 022$45, cf. Doc.7 junto à p.i.; 8 - A 23FEV90, pelo Despacho Normativo nº 16/90, o Governo fixou o valor definitivo da indemnização por cada ação nominativa da E…, em 15.498$50, cf. Doc. 8 junto à p.i.; 9 - Em 23.03.90, A… dirigiu ao Senhor Ministro as Finanças o requerimento constante da p. 67 a 77 do pdf junto a fls 861 do processo virtual onde refere como propugna que ovalor de cada ação da E… deveria ser 24 968$74; 10 - A 25ABR90, em conformidade com esse despacho, foi creditado à A. o valor indemnizatório de 12.398 800$00, a que foi deduzido o valor de indemnização provisória, tudo acrescido do juro à taxa de 2,5%, cf. Doc. 9 junto à p.i.; 11 - A 15ABR92, após a entrada em vigor do Dec. Lei n.º332/91, de 06SET, o Secretário de Estado do Tesouro emitiu o Despacho Normativo n.º 60/92, que decidiu que a indemnização a atribuir à A. por cada ação da E… era de 15.498$50, ou seja, o mesmo valor fixado pelo D. Normativo n.º16/90, cf. Doc.10 junto à p.i.; 12 - O R. pagou à A. as mencionadas indemnizações, tanto provisória como definitiva, em obrigações do tesouro de valor nominal de 1.000$00 e em número correspondente ao valor indemnizatório de acordo com os Mapas 151, o R. pôs à disposição da A. 5.800 O.T.’s em 09JUL81 e 6.598 em 25ABR90, no total de 12.398 O.T.’s, com o valor nominal de 1.000$00 cada, cf. doc. 7 e 9; 13 - O R. pagou a A… a indemnização de 20 262 099$51, pelas 174 031 ações que possuía na E… (rubrica 04501), cf. p.78/136 do pdf incorporado a fls 861 do processo virtual e doc. 18 junto à p.i.; 14 - Ao abrigo do Dec.-Lei nº 51/86, de 14MAR, cinco acionistas da E…, entre os quais, A…, requereram a constituição de Comissão Arbitral para determinar o valor da indemnização a atribuir por nacionalização, cf. p. 3/136 do pdf incorporado a fls 861 do processo virtual; 15 - Vieram a desistir quatro dos requerentes, só tendo mantido o requerimento , M…, cf. p. 3 e 40/136 do pdf incorporado a fls 861 do processo virtual; 16 - A A. não foi requerente da constituição da comissão arbitral mencionada; 17 - A Comissão Arbitral que se constituiu para avaliar a E…, procedeu à avaliação e apresentou o seu relatório final em 23AGO91 (cf. p. 17/136 do pdf incorporado a fls 861 do processo virtual), concluindo que cada ação da E…, valia pelo menos 60.366$00, e o valor máximo de 63.085$70, conforme fossem ou não consideradas as 500.000 ações que constituíram o capital da empresa, ou apenas 466.600, tudo acrescido dos juros moratórios e compensatórios (Doc. 12 junto à p.i. também junto pelo R. a fls 624 do processo virtual; 18 - O mencionado relatório da Comissão Arbitral não foi submetido a despacho ministerial porque estava prevista a extinção das comissões arbitrais o que ocorreu com a publicação do Dec.-Lei n.º 332/91, de 6 de setembro, tendo depois sido publicado o Despacho Normativo n.º 60/92, de 07 de maio; 19 – A A. não requereu a constituição da comissão mista prevista no art.º 11.º do Dec.-Lei n.º 332/91; 20 - Consta do mapa do ponto 4.2. (p. 14) do Relatório Final das Avaliações das Empresas do G…, datado de Setembro de 1990, não assinado, que a carteira de títulos do Sr. A… na E… - 180604 ações, no valor nominal de 11139564, pelas quais recebeu a indemnização de 2799091 – apresenta uma diferença de valor de -10.568.386 contos, cf. fls 363 dos autos em suporte de papel; 21 - O então Secretário de Estado das Finanças, Dr. E…, elaborou em 03.04.92, um “MEMORANDO” designado “CONTENCIOSO A…”, o qual veio a ser aprovado pelo então Ministro das Finanças, Dr. B…, cujos termos se dão por inteiramente reproduzidos, cf. Doc. 22 e requerimento da A. de 07.10.2014; 22 - Em 15ABR92, o B… celebrou com A… e a S… (empresa do grupo) um acordo «sujeito à condição suspensiva da ratificação» do mesmo pela assembleia geral do B…, S.A., pelo qual este se obrigou a pagar a A… ou a quem ele designasse 10 milhões de contos como indemnização por prejuízos materiais e morais reclamados em processos judiciais aí identificados e ainda todas as partes a desistir dos mesmos processos judiciais, cf. Doc. 23 e requerimento da A. de 07.10.2014 reproduzindo-se o teor do acordo em apreço: «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» 23 - À data do mencionado acordo, estava pendente na jurisdição administrativa, concretamente, no STA, o processo nº 8930/89, no qual A… pedia a condenação do Estado no pagamento de uma indemnização pelo ressarcimento dos danos decorrentes da privação dos seus bens objeto do arrolamento requerido pelo Ministério Público. Neste processo judicial, o Estado, por sentença de 15.11.91 tinha sido condenado, em 1ª instância, a pagar a A…, a indemnização a liquidar em execução de sentença, pelos danos decorrentes: a) – da privação de bens que lhe tinham sido arrolados; b) – da privação de crédito bancário em Portugal; c) do desgosto pela interrupção abrupta da sua obra empresarial em Portugal, desde que tal arrolamento ocorreu em 1976 ou 1977, até 1987 (acordo) e doc. 27 junto pela A. em 7.10.2014;. 24 – A… peticionara contra o Estado, em sede de tribunal arbitral, uma indemnização de 80 milhões de contos pelos danos decorrentes da privação de bens, provocada pelas nacionalizações, processo também pendente, à data do mencionado acordo; 25 - Pelo Despacho n.º 377/92F-DE, de 15.04.92, o então Secretário de Estado das Finanças nomeou o representante do Estado na assembleia geral do B…, S.A. a realizar no mesmo dia, a quem conferiu poderes para aprovar o acordo transcrito no ponto anterior, cf. doc. 24 junto com o requerimento da A. de 07.10.2014; 26 - No mesmo dia 15.04.92, a C…, S.A. tomou a seguinte deliberação: «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» 27 - No mesmo dia 15.04.92, foi assinado o seguinte acordo: «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» 28 - E ainda no mesmo dia 15.04.92, entre a C…, S.A. e o B…, S.A., foi celebrado o acordo cujo teor se reproduz: «Imagem em texto no original» 29 - Por carta datada de 15ABR92, mas com carimbo de entrada no B…, S.A., de 04.08.92, AC instruiu o B… no sentido de creditar “na conta da M…,SGPS” a quantia de 10 Milhões de contos que no acordo celebrado em 15.04.92, o banco se obrigou a pagar (Doc. 28, a fls 421 do processo físico); 30 - O Secretário de Estado do Tesouro (J…) assinou em 15.04.92, o Despacho Normativo n.º 60/92, de 07.05., que, nos termos do art.º 8.º do Dec. Lei n.º332/91 de 06SET, fixou o valor definitivo da indemnização devida pela expropriação das ações da E… e de mais 22 empresas nacionalizadas.” Julgou ainda o Tribunal a quo não provados os seguintes factos: “1 - A 23MAI91 AC, avaliando cada ação da E… em 74.015$40, revelou ao Estado que pela expropriação de ações se considerava credor de um “complemento de indemnização” pela nacionalização de ações da E… no valor de 10.568.386 contos (Doc. 20), cf. requerimento da A. de 07.10.2014; 2 - A 15ABR92 o B… celebrou com A… e a S… (de AC) um acordo «sujeito à condição suspensiva da ratificação» pelo Estado, através do qual o B… se obrigou a pagar «imediatamente» a A… ou a quem ele designasse 10 milhões de contos como indemnização por prejuízos materiais e morais não identificados, e ainda a desistir de 3 processos judiciais em que reclamava o pagamento de dívidas de A… e/ou da S… no valor de 8,634 milhões de contos (Doc. 23 ), cf. requerimento da A. de 07.10.2014; e 3 - O acordo celebrado a 15ABR92 entre o B… e A…, e no qual o B…se obrigou a pagar a A… 10 milhões de contos, “teve lugar no pressuposto que a Instituição receberia [do Estado] montante equivalente.” (Doc. 28).” IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A. Da nulidade processual por falta de marcação de audiência prévia sem despacho de dispensa nem convite a pronúncia das partes Sobre as nulidades processuais, o n.º 1 do artigo 195.º do CPC consagra a regra geral de que a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. Assim, para que estejamos perante uma nulidade processual, é necessário, não só (i) que ocorra a prática de um acto que a lei não admita ou que haja omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, mas também (ii) que a lei o declare ou que a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. Alega o recorrente que o Tribunal a quo não marcou audiência prévia, nem sequer se pronunciou sobre a sua dispensa nem convidou as partes a pronunciar-se sobre tal intenção. Vejamos. Estando em causa acção administrativa comum, instaurada na vigência do CPTA com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 15/2022, de 22 de Fevereiro, segue a mesma os termos do processo de declaração do Código de Processo Civil, conforme determinado no n.º 1 do artigo 42.º do CPTA com a redacção dada pela referida lei, pelo que importa atentar no teor das normas do CPC que disciplinam a audiência prévia. Nos termos do n.º 1 do artigo 591.º do CPC, “Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 2 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada audiência prévia, a realizar num dos 30 dias subsequentes, destinada a algum ou alguns dos fins seguintes: a) Realizar tentativa de conciliação, nos termos do artigo 594.º; b) Facultar às partes a discussão de facto e de direito, nos casos em que ao juiz cumpra apreciar exceções dilatórias ou quando tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa; c) Discutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate; d) Proferir despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º; e) Determinar, após debate, a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º; f) Proferir, após debate, o despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º e decidir as reclamações deduzidas pelas partes; g) Programar, após audição dos mandatários, os atos a realizar na audiência final, estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e designar as respetivas datas.” O n.º 1 do artigo 592.º estabelece os casos em que não se realiza a audiência prévia: “a) Nas ações não contestadas que tenham prosseguido em obediência ao disposto nas alíneas b) a d) do artigo 568.º; b) Quando, havendo o processo de findar no despacho saneador pela procedência de exceção dilatória, esta já tenha sido debatida nos articulados.” Sobre a “Dispensa da audiência prévia”, dispõe o artigo 593.º o seguinte: “1 - Nas ações que hajam de prosseguir, o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) no n.º 1 do artigo 591.º. 2 - No caso previsto no número anterior, nos 20 dias subsequentes ao termo dos articulados, o juiz profere: a) Despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º; b) Despacho a determinar a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º; c) O despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º; d) Despacho destinado a programar os atos a realizar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respetivas datas. 3 - Notificadas as partes, se alguma delas pretender reclamar dos despachos previstos nas alíneas b) a d) do número anterior, pode requerer, em 10 dias, a realização de audiência prévia; neste caso, a audiência deve realizar-se num dos 20 dias seguintes e destina-se a apreciar as questões suscitadas e, acessoriamente, a fazer uso do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 591.º.” Assim, em regra, concluídas as diligências resultantes da prolação de despacho pré-saneador, se a elas houver lugar, é convocada audiência prévia, destinada a algum ou alguns dos fins previstos no n.º 1 do artigo 591.º do CPC. Porém, a audiência prévia não se realiza “a) Nas ações não contestadas que tenham prosseguido em obediência ao disposto nas alíneas b) a d) do artigo 568.º; b) Quando, havendo o processo de findar no despacho saneador pela procedência de exceção dilatória, esta já tenha sido debatida nos articulados.” – cfr. artigo 592.º, n.º 1, do CPC. E, nas acções que hajam de prosseguir, o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) no n.º 1 do artigo 591.º (proferir despacho saneador, despacho a determinar a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, despacho de identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, e/ou despacho destinado a programar os actos a realizar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respectivas datas) – cfr. artigo 593.º, n.ºs 1 e 2, do CPC. Notificadas as partes, se alguma delas pretender reclamar dos despachos previstos nas alíneas b) a d) do n.º 2 do artigo 593.º do CPC (a determinar a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, despacho de identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, e/ou despacho destinado a programar os atos a realizar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respectivas datas), pode requerer a realização de audiência prévia, caso em que a audiência prévia se deverá realizar para apreciar as questões suscitadas e, acessoriamente, fazer uso do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 591.º (discutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate) – cfr. artigo 593.º, n.º 3. No caso em apreço, compulsada a tramitação do mesmo, constata-se que, tendo sido marcada data para a realização de audiência prévia no despacho proferido em 25.11.2016, foi lavrada cota a dar sem efeito a diligência, tendo, em 14.07.2017, sido proferido despacho “pré-saneador” a julgar improcedente a prescrição e a determinar o seguinte: “Oportunamente deverão os autos ser conclusos para marcação da Audiência Prévia”. No despacho de 15.05.2021 é ainda referido que o pedido de junção de procedimentos de inquérito e consulta dos mesmos (deduzido pela autora a fls. 593 do SITAF) “Será apreciado e decidido na audiência prévia”. Sucede que, não obstante a audiência prévia ter sido marcada e anunciada e não ter sido dispensada, foi proferida sentença a conhecer do mérito da causa sem que a mesma se tivesse realizado. Não se trata de situação de não realização de audiência prévia ex lege, nos termos do artigo 592.º, n.º 1, do CPC, pois que houve contestação e o processo não findou pela procedência de excepção dilatória. Assim sendo, e não tendo o juiz a quo dispensado a realização da audiência prévia, a omissão de tal diligência constitui incumprimento da regra plasmada no n.º 1 do artigo 591.º do CPC, pelo que estamos perante a omissão de um acto prescrito pela lei, a realização da audiência prévia. Ora, a falta de realização de audiência prévia sem que a mesma tenha sido dispensada por despacho do juiz – sendo certo que tal diligência já havia sido marcada, dada sem efeito e novamente anunciada - obstou a que as partes exercessem o direito potestativo de requerer a sua realização, nos termos do n.º 3 do artigo 593.º do CPC, levando a que as mesmas fossem surpreendidas com a prolação de sentença a conhecer do mérito da causa sem lhes ter sido dada a possibilidade de discutir de facto e de direito a matéria dos autos sobre a qual o juiz se preparava para conhecer de mérito. Assim, concluímos que a irregularidade traduzida na omissão da realização de audiência prévia sem despacho a dispensá-la e sem que se trate de situação de não realização da mesma nos termos da lei, influiu no exame e na decisão da causa, pelo que estamos perante uma nulidade processual, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 195.º do CPC – no mesmo sentido, cfr. o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12.09.2019, proferido no processo n.º 1780/14.1BESNT, bem comos os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 28.01.2022, proferido no processo n.º 917/16.0BEBRG, e de 07.05.2021, proferido no processo n.º 104/16.8BEMDL (in www.dgsi.pt). Ante o exposto, concedendo provimento ao recurso, impõe-se a anulação da sentença recorrida e, com vista ao suprimento da nulidade processual, determinar que o Tribunal a quo proferira o despacho omitido, de convocação de audiência prévia, no prazo que se fixa de dez dias, seguindo-se os ulteriores termos processuais, ficando prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos do recurso. * Vencido, é o recorrido responsável pelo pagamento das custas, nos termos dos artigos 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.V – DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso e, em consequência, anular a sentença recorrida, determinando a prolação de despacho de convocação de audiência prévia, no prazo de dez dias. Custas pelo recorrido. Lisboa, 09 de Janeiro de 2025 Joana Costa e Nora (Relatora) Marta Cavaleira Mara de Magalhães Silveira |