Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 80/22.8BCLSB |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 07/14/2022 |
Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
Descritores: | ARBITRAL CONTRADIÇÃO ENTRE FUNDAMENTOS E DECISÃO PRONÚNCIA INDEVIDA OMISSÃO DE PRONÚNCIA |
Sumário: | I - Ao contrário do que decorre do regime de recurso das decisões proferidas pelos tribunais tributários de 1.ª instância, o mérito das decisões proferidas pelos tribunais arbitrais tributários é sindicável num conjunto muito limitado de situações e nunca no âmbito da sua impugnação junto do Tribunal Central Administrativo. II - Na impugnação da decisão arbitral junto do TCA, nos termos do art.º 27.º, n.º 1, do RJAT, tal decisão pode ser anulada, sendo que a impugnação pode ser apresentada considerando um dos fundamentos taxativamente elencados no n.º 1 do art.º 28.º do mesmo diploma, não podendo, pois, abranger qualquer erro de julgamento. III - Verifica-se contradição real entre os fundamentos e a decisão proferida quando o discurso argumentativo constante da decisão arbitral impugnada conduza a uma decisão distinta da que foi proferida, não se confundindo a mesma com o erro de julgamento. IV - Há nulidade por excesso de pronúncia quando tenha sido conhecida questão não suscitada pelas partes e que não seja de conhecimento oficioso, o que não ocorre quando apenas a questão invocada é a apreciada, independentemente de tal conhecimento padecer ou não de erro de julgamento. V - Há nulidade por omissão de pronúncia quando uma das questões suscitadas não tenha sido apreciada, se o seu não conhecimento não resultou prejudicado pela solução dada às demais questões. VI - Não tendo a Impugnante invocado, em sede de pedido de pronúncia arbitral, o erro sobre os pressupostos das liquidações de juros compensatórios (erro esse que se suporta em factualidade não superveniente, que apenas foi suscitado em sede de alegações e cuja verificação implica a anulabilidade do ato), o Tribunal arbitral não tinha de se pronunciar sobre o mesmo, dado não ser questão de conhecimento oficioso e passível de ser alegada a todo o tempo. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | I. RELATÓRIO
H…, S.A. (doravante Impugnante) veio apresentar impugnação da decisão arbitral proferida, pelo Tribunal Arbitral Coletivo constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo a que aí foi atribuído o n.º 770/2020-T, ao abrigo dos art.ºs 27.º e 28.º do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT). Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos: “(i) Vem a presente impugnação interposta da decisão arbitral que julgou improcedente o pedido principal de anulação do ato tributário de liquidação de IRC e consequente reposição dos prejuízos fiscais, dos atos tributário de liquidação de IVA e respetivos juros compensatórios referentes ao exercício de 2016, no valor total de €1.187.933,98. (ii) A Impugnante no seu pedido de pronúncia arbitral alegou que as liquidações em causa padeciam de erro sobre os pressupostos de facto e de direito. (iii) Os fundamentos da ilegalidade resumiam-se às questões da efetividade dos serviços de nutrição e da não acessoriedade dos mesmos quando vendidos conjuntamente com pacotes de prestação de serviços e ginásio. (iv) Fundamentos esses que foram repetida e reiteradamente formulados nos processos que correram seus termos também no tribunal arbitral sob os números: 169/2019-T; 159/2019-T; 170/2019-T; 163/2019-T; 373/2018-T; 162/2019-T; 164/2019-T; 161/2019-T; 160/2019-T; 381/2020-T; 395/2020-T; 397/2020-T; 399/2020-T; 403/2020-T; 404/2020-T; 405/2020-T; 408/2020-T; 477/2020-T; 488/2020-T; 519/2020-T; 549/2020-T; 551/2020-T; 571/2020-T; 599/2020-T (v) Onde apenas se distinguia o ano de liquidação e o sujeito passivo, embora todos os sujeitos passivos referidos nos processos supra mencionados façam parte do grupo H…. (vi) Todos os pedidos de pronúncia arbitral, sem exceção, foram julgados procedentes e anuladas as respetivas notas de liquidação. (vii) E em todos esses processos arbitrais, nomeadamente no Processo n.º 551/2020-T, em que foi Presidente do Tribunal o mesmo Juiz-Arbitro que julgou o processo arbitral cuja nulidade ora se peticiona, a questão - thema decidendum - que o Tribunal enunciou como questão a decidir reconduzia-se ao único fundamento invocado pela Administração Tributária (AT) para emitir a liquidação, ou seja, a acessoriedade dos serviços de nutrição quando vendidos conjuntamente com serviços e ginásio (viii) Não há, repita-se, no relatório de inspeção qualquer outro fundamento para a liquidação. E não foi suscitada pela ora Impugnante qualquer outra, a não ser ao transcrever decisões jurisprudenciais e diplomas legislativos (ix) Acresce ainda que, à ora Impugnante foi prestada informação vinculativa, enquanto sujeito passivo, tendo a factualidade que a Informação assumiu como relevante sido coincidente com a factualidade em causa nos presentes autos. (x) Conforme decorre do n.º 14 do artigo 68.º da LGT, o regime da informação vinculativa faz prevalecer a proteção da segurança jurídica do sujeito passivo em causa sobre a exata interpretação da lei. (xi) Nos termos da lei, uma vez prestada informação sobre a situação do contribuinte, ficam os serviços tributários vinculados a não proceder de forma diversa caso se verifiquem os factos identificados e previstos na lei, salvo em cumprimento de decisão judicial. (xii) Nesses termos, a Impugnante atuou de acordo com a informação vinculativa prestada (xiii) Sucede que, violando o disposto no artigo 68.º da LGT, bem como dos princípios da boa-fé e da proteção da confiança (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 59.º, n.º 2 e 3, alínea e) da LGT), a AT procedeu a correções e liquidações de forma contrária ao especificamente pronunciado em sede de resposta ao pedido de informação vinculativa (xiv) Aliás no caso sub iudice, a AT ao não ter aceite a ampliação da casa de pedir e o pedido, actuou em clara contradição com os princípios basilares do direito fiscal e que contendem com o principio da segurança jurídica, boa-fé e colaboração (xv) Sendo que, neste caso, não se deveria ter aplicado subsidiariamente o código de processo civil e ter feito a aplicação da norma do NCPC, que ó permite a ampliação da causa de pedir com o acordo das partes (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, processo n.º 56/21.2YRCBR.C1, de 08.07.2021) (xvi) Devendo, nestes termos, ter sido declaradas nulas as liquidações em causa (xvii) Caso assim não se entenda, o que não se concede, salvo o devido respeito, a referida decisão enferma de vícios de nulidade, e como tal enquadrável nos artigos 27º e 28º do RJAT (xviii) Desde logo, por contradição entre a matéria dada como provada e a decisão, bem como por pronúncia indevida, porquanto o Tribunal ancorou a sua decisão no Acórdão uniformizador de jurisprudência, proferido no processo n.º 77/20.2BALSB (xix) Os fundamentos do RI que levaram às correções aritméticas fundaram-se na questão da acessoriedade dos serviços de nutrição quando vendidos conjuntamente com os serviços de ginásio. (xx) Aliás, é esse o único “thema decidendum”. (xxi) Os relatórios de inspeção que deram azo ao PPA com o número de processo 770/2020-T é ipsis verbis o mesmo relatório arbitral que deu origem à decisão proferida nos autos 551/2020-T (Cfr. Doc. 3 e 4) (xxii) Os fundamentos de correção são exatamente os mesmos (xxiii) O fundamento de correção constante do relatório e nas suas conclusões baseia-se tão só na questão de acessoriedade das consultas de nutrição vendidas conjuntamente com os serviços de ginásio e facturados sob a sigla SDIET (xxiv) Contudo, nos presentes autos o Tribunal entendeu de forma diversa e, para além de se pronunciar sobre tal questão, alargou o thema decidendum à questão de finalidade terapêutica das mesmas consultas, ancorando a sua decisão no Acórdão uniformizador de jurisprudência, proferido no processo n.º 77/20.2BALSB (xxv) Com o devido respeito, não se consegue conceber, como pode o Tribunal aplicar o referido Acórdão do STA aos presentes autos e, consequentemente, concluir que as consultas de nutrição, disponibilizados por profissionais na área da dietética ou da nutrição para melhor acompanhamento dos clientes que o desejarem são complementares ou acessórios. (xxvi) Quando o acórdão uniformizador de jurisprudência apenas considera que não tem finalidade terapêutica os serviços de nutrição que visam, como forma complementar, proporcionar um melhor desempenho físico e, em geral, maximizar os benefícios prosseguidos com a própria prática física (xxvii) Se olharmos para os factos dados como provados pelo Tribunal, é percetível que a questão fáctica e de direito nos presentes autos não é idêntica à do processo supra referido. (xxviii) Pelo que, não se consegue conceber como pôde o Tribunal Arbitral aplicar a referida decisão in casu quando os factos são opostos (xxix) Desde logo, conforme temos vindo a demonstrar, não existe identidade de facto, porquanto as consultas de nutrição/dietética e que são faturadas com o código SDIET (vendidas conjuntamente com os pacotes de ginásio) são efetivamente prestadas pela Impugnante e não meramente disponibilizadas (xxx) Independentemente da denominação que lhes seja dada (SDIET ou SNUT), isto é, as consultas de nutrição quer sejam vendidas conjuntamente com os serviços de ginásio ou isoladamente, são prestadas pelos mesmos profissionais qualificados, nas mesmas condições e com os mesmos objetivos, tendo o tribunal arbitral considerado que as mesmas eram prestadas e não meramente disponibilizadas e que tinham a mesma configuração que as consultas vendidas em separado ou avulso, faturadas sobre a sigla SNUT e que não foram objecto de correção em sede de IVA (Cfr. ponto 23, 24, 27 e 31 da matéria de facto da decisão ora impugnada) (xxxi) E se assim é como pôde o Tribunal arbitral considerar que não tem finalidade terapêutica as consultas disponibilizadas que são complementares à atividade física, quando relativamente a essas mesmas consultas ficaram provado que têm a mesma duração e configuração que as consultas vendidas avulsas e em que não se coloca em causa a finalidade terapêutica (xxxii) Não faz qualquer sentido, existindo clara contradição entre a matéria dada como provada e a decisão supostamente ancorada no acórdão uniformizador (xxxiii) Conforme o Tribunal deu como provado (ponto 28), a Impugnante possibilita aos seus clientes o acesso ao ginásio, sem as consultas, bem como o inverso (xxxiv) A Impugnante dispunha de diferentes planos nas suas instalações. Alguns planos incluíam unicamente serviços de manutenção e bem estar físico, enquanto outros incluíam, além disso, acompanhamento nutricional. (xxxv) Nesta senda, decidiu o Tribunal Arbitral no processo que correu os seus termos sob o n.º 551/2020-T, no qual o Dr. José Poças Falcão foi o Presidente Árbitro, tal como nos presentes autos: “dentro das práticas comerciais atuais, não é raro, sendo antes corrente, os operadores económicos diversificarem horizontalmente a sua atividade e aglutinarem prestações de serviços em “pacotes”, suja subscrição assegura vantagens ao nível do preço para a respetiva clientela, em relação à sua contratação dispersa”. “Inclusive acrescente-se que nada indicia que, no caso, a prestação de serviços de acompanhamento nutricional permita melhorar de melhores condições dos restantes serviços de “ginásio”, indiciando-se antes que a utilização dos restantes serviços em questão no presente caso, se dará de forma idêntica para os subscritores de planos com e sem acompanhamento nutricional, bem como para os utilizadores ad hoc daqueles serviços” (xxxvi) Atento no exposto, a situação fáctica da decisão que ora se impugna não tem como fim e como forma complementar proporcionar aos seus utentes um melhor desempenho físico e, em geral, maximizar os benefícios prosseguidos com a própria prática desportiva (xxxvii) Ora, no acórdão recorrido nos autos de Uniformização de Jurisprudência a matéria de fato relevante é sem dúvida diferente (xxxviii) Veja-se alguns dos pontos mais relevantes dados como provados no acórdão recorrido nos autos de Uniformização de Jurisprudência. Alínea o): A Requerente implementou a disponibilização de um serviço com acompanhamento de nutricionista como forma complementar de proporcionar aos seus clientes um melhor desempenho físico, de lhes possibilitar complementar a actividade física com o acompanhamento nutricional e assim alcançarem mais rapidamente os objectivos (cfr.PPA, prova testemunhal e alegações da Requerente); (sublinhado nosso), situação diferente do acórdão do qual se recorre nos presentes autos e de maior relevância Alínea ee): A disponibilização dos serviços de nutrição visa possibilitar aos clientes da Requerente melhor alcançar os objectivos que têm ao aderir ao ginásio (i.e., aos serviços e ginásio - fitness), a perda de peso é o principal desses objectivos e o serviço prestado elo ginásio - fitness - faz sentido em conjugação com serviços de nutrição e de treino personalizado (cfr. PPA, prova testemunhal e alegações da Requerente); Alínea ff): O modelo de negócio da Requerente assenta na venda da disponibilização de serviços independentemente de os mesmos virem ou não a ser frequentados pelos clientes, estes quando se inscrevem no ginásio procuram essencialmente um sítio para praticar exercício físico (…)” (sublinhado nosso) Alínea jj): A Requerente podia disponibilizar serviços de nutrição a não sócios, e aos sócios que não tivessem direito aos mesmos na modalidade em que estavam inscritos, e em 2015 não houve qualquer consulta de nutrição a não aderentes do ginásio, nem foi facturada qualquer consulta de nutrição/aconselhamento nutricional isoladamente (cfr. PPA – v. 211 ponto 5, doc.s juntos, PPA e prova testemunhal). (xxxix) Olhando para a situação fáctica subjacente aos presentes autos, que se contrapõem aos factos dados como provados no Acórdão proferido no Pleno da Secção do STA, conforme se descreveu, teremos que concluir que não existe identidade fáctica e, como tal, o acórdão uniformizador não tem aplicabilidade (xl) Ora tendo o Tribunal dado como provada a situação fáctica dos presentes autos, jamais poderia ter decidido nos termos que fez, existindo, desta forma, oposição dos factos com a decisão Caso assim não se entenda, o que se concede por mera cautela de patrocínio judiciário, (xli) Cumpre atender que entendeu ainda o Douto Supremo Tribunal Administrativo que, os serviços de nutrição prestados nas condições do acórdão recorrido que lhe serviu de fundamento, não podem beneficiar da isenção prevista no artigo 9.º, alínea 1) do Código do IVA, uma vez que não têm finalidade terapêutica., conforme já temos vindo a adiantar. (xlii) Sucede que, o relatório de inspeção, que deu origem aos presentes autos, não teve como fundamento a referida finalidade terapêutica, ou a sua falta, pelo que o Tribunal Arbitral não pode decidir com base na mesma (xliii) Pelo que, ao pronunciar-se sobre esta questão, o Tribunal fá-lo indevidamente. (xliv) Conforme temos vindo a demonstrar, o PPA assentou na questão da acessoriedade, uma vez que o relatório de inspeção fundou as suas correções aritméticas nesse argumento e não na finalidade terapêutica. (xlv) Veja-se, o relatório de inspeção, na página 19: “Note-se que, é exatamente, no caráter acessório destas prestações de serviços que focamos a nossa posição e não na falta de cumprimento dos requisitos para a respetiva prática, uma vez que, nessa matéria, solicitamos elementos e pudemos assim comprovar a conformidade com os requisitos exigidos no Decreto-Lei n.º 261/93, de 24 de julho.” (xlvi) Nestes termos, nunca poderia o Tribunal Arbitral firmar a sua conclusão com base na finalidade terapêutica. (xlvii) Pelo que, também por este motivo, não pode o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência ser aplicado nos presentes autos. (xlviii) A este respeito, veja-se as mais recentes decisões do Tribunal Arbitral, nos processos que correram os seus termos sob os n.º 403/2020-T e 405/2020-T (Cfr. Doc. 5 e 6), nos quais estava em discussão a mesma questão de facto e de direito dos presentes autos (xlix) Concluindo, andou muito mal o Tribunal Arbitral ao julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral formulado por aplicação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência. (l) Nestes termos, por via da oposição dos factos com a decisão e da pronúncia indevida, está a decisão arbitral ferida de nulidade nos termos do art.º 28º do RJAT, uma vez que o referido acórdão uniformizador jamais poderia ser aplicado nos presentes autos. (li) Admitindo que os vícios supra identificados não se verificam, o que apenas se concede por mero raciocínio, sempre existirá falta de fundamento ou omissão de pronúncia quanto à legalidade dos juros compensatórios. (lii) Conforme já referido, à ora Impugnante foi prestada informação vinculativa, enquanto sujeito passivo, tendo a factualidade que a Informação assumiu como relevante sido coincidente com a factualidade em causa nos presentes autos. (liii) Uma vez que, o regime da informação vinculativa faz prevalecer a proteção da segurança jurídica do sujeito passivo em causa sobre a exata interpretação da lei, a Impugnante atuou de acordo com a informação vinculativa prestada (liv) Ora, sendo um dos pressupostos dos juros compensatórios a existência de um juízo de censura, a titulo de culpa e, por consequência, numa conduta, no mínimo, negligente, imputável ao sujeito passivo (Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 01283/07.0BEPRT, de 25.03.2021) (lv) Tendo a Impugnante atuado de acordo com a informação vinculativa que lhe foi prestada, jamais lhe poderá ser imputado um juízo de censura, a título de culpa. (lvi) Face ao exposto e sem mais delongas existiu omissão de pronúncia no acórdão arbitral ao não decidir quanto ao efeito de informação vinculativa para apreciação de legalidade das notas de liquidação dos juros compensatórios, tendo apenas decidido pela não procedência do pedido de ilegalidade, mas sem qualquer fundamento. Termos em que por todo o exposto e com mui douto suprimento deve a presente impugnação ser julgada procedente e, consequentemente, ser declarada nula a decisão arbitral, com todas as consequências legais”. Foi ordenada a notificação da Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Impugnada ou AT) para alegar, nos termos consignados no art.º 144.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 27.º, n.º 2, do RJAT, não tendo sido apresentadas contra-alegações. O Ilustre Magistrado do Ministério Público (IMMP) foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146.º, n.º 1, do CPTA. Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência.
São as seguintes as questões a decidir: a) Há nulidade da decisão arbitral, por pronúncia indevida? b) Há nulidade da decisão arbitral, por oposição dos fundamentos com a decisão? c) Há nulidade da decisão arbitral, por omissão de pronúncia, no tocante aos juros compensatórios?
II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A. Para a apreciação da presente Impugnação estão provados os seguintes factos: 1) A 17.12.2020, a ora Impugnante apresentou junto do CAAD pedido de constituição de tribunal arbitral (cfr. fls. 1 a 710 da certidão do processo arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 2) Na sequência do referido em 1), foi constituído tribunal arbitral coletivo, tendo dado origem ao processo n.º 770/2020-T (cfr. fls. 817 da certidão do processo arbitral). 3) No âmbito do processo referido em 2), foi apresentado, pela ora Impugnante, requerimento, designado como sendo de ampliação do pedido, do qual consta designadamente o seguinte: “… «Imagem no original.»
…” (cfr. fls. 829 a 1296 da certidão do processo arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 4) No âmbito do processo referido em 2), foi proferida, a 22.09.2021, a designada decisão arbitral interlocutória, na qual, nomeadamente, foi parcialmente indeferido o pedido de ampliação do pedido e da causa de pedir formulado pela ora Impugnante, constando da mesma designadamente o seguinte: “Requerimento da Requerente de 23-06-2021 para ampliação do pedido Neste requerimento a Requerente abordou a temática da alteração do pedido relativamente a 3 situações distintas: I. afirmou pretender “a ampliação do pedido nos seguintes termos:” e seguidamente não indicou que alteração pretende afinal fazer à providência que expressou e que foi a anulação de determinados atos tributários. O que a Requerente trouxe de novo no seu requerimento foram outros fundamentos que poderão levar à anulação das liquidações, designadamente a contradição com informação vinculativa. Trata-se afinal de ampliação da causa de pedir e não de alteração do pedido. II. No seu requerimento a Requerente afirma ainda que: (...) requer-se à V.Exa. que seja reconhecido que, em relação à Requerente, a Autoridade Tributária atuou, praticando os atos de liquidação impugnados, num sentido que é contrário à doutrina interpretativa veiculada pela mesma Autoridade Tributária através da Informação Vinculativa proferida no processo n.0 1573 (…) A Requerida AT não está de acordo com a ampliação do pedido nem da causa de pedir, referidas em I e em II. (…) A alteração e ampliação do pedido e da causa de pedir é regulada pelas normas dos artigos 263.º, 264.º e 265.º do Código de Processo Civil (CPC), que determinam que é possível a alteração quando haja acordo das partes e que, na falta de acordo, só é possível nos casos de confissão da requerida ou se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo. Este Tribunal Arbitral considera que, relativamente ao pedido de alteração constante de I, não está propriamente em causa o pedido, mas a causa de pedir; de todo o modo, não havendo concordância da AT, a alteração ou ampliação não pode ser deferida. Indefere-se por isso o requerimento nesta parte. No que diz respeito ao pedido de alteração referido em II, há que ter presente que este Tribunal Arbitral tem a sua competência estabelecida no RJAT, designadamente nas normas do artigo 2.º, que a circunscreve à declaração de ilegalidade de determinados atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, e de outros atos análogos mas não lhe atribui competência para apreciar e reconhecer os termos em que a requerida tenha atuado e produzir um juízo, sob forma de decisão, relativamente a essa matéria. É claro que o Tribunal pode apreciar a legalidade de determinada conduta, na medida em que a apreciação da conduta seja necessária à indagação da legalidade dos atos sub judicio. Esse juízo, a ser feito, é um fundamento da decisão e não a decisão em si mesma. Indefere-se por isso o requerimento nesta parte” (cfr. fls. 1945 a 1949 da certidão do processo arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 5) No âmbito do processo referido em 2), foram apresentadas, pela ora Impugnante, a 11.10.2021, alegações escritas, das quais consta designadamente o seguinte: “34. Caso não se conclua pela ilegalidade das notas de liquidações de IVA nos termos do disposto nº 14 do artigo 68º da LGT sempre seria de concluir por essa ilegalidade referente as notas de liquidação referentes a juros compensatórios pois não poderá haver qualquer juízo de censura ao sujeito passivo que atuou de acordo com a informação vinculativa pedida” (cfr. fls. 1974 a da certidão do processo arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 6) No âmbito do processo referido em 2), foi proferida, a 16.03.2022, decisão arbitral, da qual consta designadamente o seguinte: “…
(…)
(…)
«Imagem no original»
«Imagem no original» «Imagem no original» «Imagem no original» «Imagem no original»
(…)
” (cfr. fls. 2222 a 2244 da certidão do processo arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A sindicância das decisões proferidas pelos tribunais arbitrais tributários é limitada às situações previstas no art.º 25.º (que prevê a possibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional e para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos circunscritos aí previstos) e nos art.ºs 27.º e 28.º, todos do RJAT. Estes últimos, relativos à impugnação da decisão arbitral junto do Tribunal Central Administrativo, definem, de forma taxativa, os termos e os fundamentos dessa mesma impugnação. Resulta desta disciplina que, ao contrário do que decorre do regime de recurso das decisões proferidas pelos tribunais tributários de 1.ª instância, o mérito das decisões proferidas pelos tribunais arbitrais tributários é sindicável num conjunto muito limitado de situações (cfr. novamente o art.º 25.º do RJAT) e nunca no âmbito da sua impugnação junto do Tribunal Central Administrativo. Centrando-nos, pois, na impugnação da decisão arbitral junto do TCA, nos termos do art.º 27.º, n.º 1, do RJAT, tal decisão pode ser anulada, sendo que a impugnação pode ser apresentada considerando um dos fundamentos taxativamente elencados no n.º 1 do art.º 28.º do mesmo diploma. Assim, nos termos desta última disposição legal, a decisão arbitral é impugnável com fundamento em: “a) não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; b) oposição dos fundamentos com a decisão; c) pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia; d) violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º”. Portanto, a competência deste TCAS, neste domínio, circunscreve-se a estes casos, não podendo, pois, abranger qualquer erro de julgamento. Considerando o referido neste introito, cumpre, desde já e a título prévio, referir-se que não será apreciado o invocado a propósito da alegada ilegalidade da atuação da AT, ao não ter aceitado o pedido de ampliação da causa de pedir e do pedido e, bem assim, da inaplicabilidade das regras previstas no CPC a esse respeito, com a consequente nulidade das liquidações impugnadas, por, alegadamente, a administração ter atentado contra informação vinculativa prestada. Com efeito, o que, no fundo, a Impugnante aí pretende sindicar parte de um alegado erro de julgamento do tribunal arbitral, no despacho interlocutório proferido, de indeferimento do requerido a propósito da ampliação do pedido e da causa de pedir, e, naturalmente, da sua projeção da decisão arbitral proferida, designadamente em termos de declaração de nulidade das liquidações objeto do pedido de pronúncia arbitral. Ora, como deixamos evidenciado, trata-se de matéria que extravasa o âmbito da competência do TCAS, em matéria de impugnação arbitral, não se enquadrando em nenhuma das situações previstas no n.º 1 do art.º 28.º do RJAT (como, aliás, a própria Impugnante não enquadra), tratando-se, sim, de um eventual erro de julgamento que não nos compete apreciar. Prosseguindo.
III.A. Da nulidade por oposição dos factos com a decisão Considera a Impugnante verificar-se uma situação de nulidade da decisão arbitral por oposição dos factos com a decisão. Para o efeito, considera que os fundamentos constantes do relatório de inspeção tributária (RIT) se ativeram à questão da acessoriedade dos serviços de nutrição, quando vendidos conjuntamente com os serviços de ginásio, à semelhança do que aconteceu noutros processos arbitrais, cujo desfecho foi diametralmente oposto. No entanto, in casu, entende a Impugnante, o Tribunal arbitral alargou o thema decidedum à questão da finalidade terapêutica das consultas, sustentando-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no âmbito do processo 77/20.2BALSB, quando a questão fática subjacente não é idêntica. Ademais, a matéria de facto provada não podia conduzir à apreciação de direito efetuada, estando em contradição com a mesma. Vejamos. Atentando no art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, constitui nulidade da sentença a oposição dos fundamentos com a decisão [cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. c), do CPC]. Esta nulidade consubstancia-se na contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença (1), ou seja, na circunstância de o iter constante da sentença, na sua motivação, estar em contradição com a decisão a final proferida (2). Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 05.11.2014 (Processo: 0308/14), “… esta nulidade ocorre quando a construção da sentença é viciosa, quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao resultado oposto. Isto é, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma oposta à que logicamente deveria ter extraído: a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”. Aplicando estes conceitos ao caso dos autos, atentando no discurso argumentativo constante da decisão impugnada, conclui-se que não existe qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão. Com efeito, da leitura da decisão impugnada o que resulta é que o coletivo arbitral, depois de feita a circunscrição teórica, em torno do conceito de autonomia ou não autonomia das consultas de aconselhamento de nutrição / dietética em relação às atividades físicas praticadas em ginásios, concluiu que, no caso em concreto, as ditas consultas representavam um complemento da atividade principal. Nesse seguimento, considerou inexistir razão à ora Impugnante, indeferindo o pedido de pronúncia arbitral. Ora, desta análise resulta desde logo que não há qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão. O que, no fundo, a Impugnante pretende invocar é erro de julgamento por parte do Tribunal arbitral, considerando que não se poderia seguir o entendimento plasmado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20.10.2021 (Processo: 77/20.2BALSB) – Acórdão de Uniformização de jurisprudência n.º 1/2022, publicado no Diário da República, 1.ª Série, de 20.01.2022. A circunstância de a decisão proferida sobre a matéria de facto dever conduzir a diferente entendimento de direito ou a circunstância de o aresto mencionado não ser aplicável in casu, como defende a Impugnante, tem, pois, apenas a ver com o acerto do julgamento, não integrando, nos termos já explanados, o conceito de oposição dos fundamentos com a decisão. Da mesma forma, a eventual circunstância de, em processos arbitrais similares, ter sido proferida decisão distinta tem a ver, igualmente, com um eventual erro de julgamento, que não compete a este TCAS sindicar. Logo, não assiste razão à Impugnante, nesta parte.
III.B. Da nulidade por pronúncia indevida Considera ainda a Impugnante que a decisão arbitral padece de nulidade, por pronúncia indevida, uma vez que o RIT que esteve na origem das liquidações não teve como fundamento a existência ou inexistência de finalidade terapêutica. Nos termos do art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, há excesso de pronúncia, que consubstancia nulidade da sentença, quando haja pronúncia sobre questões de que o juiz não deva conhecer [cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC]. Adiantemos, desde já, que não assiste razão à Impugnante, dado que o alegado não se consubstancia se não em eventual erro de julgamento. Com efeito, compulsado o pedido de pronúncia arbitral, verifica-se que a ora Impugnante alegou, em suma, que proporciona, desde 2013, serviços de nutrição aos seus clientes, independentemente de estes usarem ou não a componente de ginásio, sendo prestações isentas, nos termos do art.º 9.º, 1) do Código do IVA (CIVA). Alegou, pois, que o entendimento da AT, no sentido de o serviço de nutrição ser acessório da prestação de serviço principal, que constitui o serviço de ginásio, é um entendimento incorreto. Ora, compulsada a decisão arbitral, concretamente o seu ponto III.B.2.A.19, o que dali decorre é que o coletivo de árbitros considerou que, no caso, as consultas de nutrição ou de prestação ou disponibilização de serviços dietéticos eram manifestamente complementares das atividades de ginásio e fitness. Ou seja, mal ou bem, não compete aqui aferir, a decisão arbitral apreciou o alegado, não acolhendo a posição da Impugnante. A menção à finalidade terapêutica surge, é certo, na transcrição de parte do Acórdão uniformizador já mencionado, mas a verdade é que a decisão se sustentou no facto de o Tribunal arbitral ter considerado que as prestações de serviços em causa eram manifestamente complementares das prestações entendidas como principais. Ademais, independentemente da consideração pelo Tribunal arbitral do argumento relacionado com o caráter (não) terapêutico das consultas em causa, a questão suscitada foi conhecida e não foi ultrapassada, questão essa que passaria pela consideração ou não consideração das ditas consultas como operações isentas de IVA. Refira-se ainda que, se o fundamento da falta de finalidade terapêutica não constava do RIT, essa circunstância poderia sustentar um eventual erro de julgamento, mas não qualquer pronúncia indevida, dado que, como referido, a única questão colocada foi conhecida. Ou seja, se a situação de facto foi incorretamente enquadrada pelo julgador em termos de direito, se a conclusão extraída foi errada, já estaremos perante erro de julgamento, que, reitera-se, não cabe nesta sede aferir. Como tal, não assiste razão à Impugnante quanto à alegada pronúncia indevida.
III.C. Da nulidade por omissão de pronúncia, quanto aos juros compensatórios Entende, ainda, a Impugnante que se verifica uma situação de omissão de pronúncia, no que respeita à legalidade dos juros compensatórios, por se verificar o não preenchimento do seu pressuposto subjetivo. Atentando no art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, há omissão de pronúncia, que consubstancia nulidade da sentença, quando haja falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar [cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC]. As questões que o juiz deve conhecer são ou as alegadas pelas partes ou as que sejam de conhecimento oficioso. Feito este enquadramento, apliquemos os conceitos ao caso dos autos. Compulsado o pedido de pronúncia arbitral, do mesmo decorre que, em relação às liquidações de imposto, é alegado erro sobre os pressupostos, por se entender que os serviços de nutrição prestados se subsumem ao art.º 9.º, al. 1), do CIVA, e que não existe prova da acessoriedade invocada pela AT. Alegou-se ainda, a título subsidiário, que, mesmo que se tratasse de serviços tributados em sede de IVA, se verifica um erro na quantificação. Daqui resulta que, no pedido de pronúncia arbitral, não é imputado qualquer vício autónomo às liquidações de juros compensatórios. Aliás, nem no próprio requerimento de 23.06.2021, de ampliação do pedido, ampliação essa indeferida pelo Tribunal arbitral, é imputado qualquer vício específico às liquidações de juros compensatórios. Apenas em sede de alegações escritas é suscitada, pela primeira vez, a ilegalidade das liquidações de juros compensatórios, motivada pela inexistência de juízo de censura ao sujeito passivo. Compulsada a decisão arbitral, é certo que não é feita qualquer apreciação desta questão. No entanto, tal não consubstancia omissão de pronúncia, porquanto o vício em causa não foi alegado no momento oportuno e não é questão de conhecimento oficioso. Concretizando, cumpre sublinhar que os vícios que afetem um determinado ato tributário devem ser suscitados, quando estamos perante um processo a correr termos junto do CAAD, no correspondente pedido de pronúncia arbitral, conforme decorre do art.º 10.º, n.ºs 1 e 2, do RJAT. Apenas se concebe que possa ser invocado, em momento ulterior, novo vício caso o mesmo seja de conhecimento oficioso ou caso o mesmo decorra de facto superveniente [cfr. art.º 20.º do RJAT, art.º 86.º, n.º 1, do CPTA, ex vi art.º 29.º, n.º 1, al. c), do RJAT art.º 608.º, n.º 2, do CPC ex vi art.º 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT]. Ora, in casu, nenhuma das situações ocorre. Com efeito, em termos de formas de invalidade dos atos tributários, as mesmas podem revestir a nulidade e a anulabilidade. Começando pela nulidade, considerando o disposto no art.º 162.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aplicável ex vi art.º 2.º, al. c), da LGT: “1 - O ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade. 2 - Salvo disposição legal em contrário, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade e declarada pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes para a anulação” (sublinhado nosso). Portanto, retém-se deste regime que a nulidade é a forma mais grave da invalidade, motivo pelo qual pode ser invocável ou declarada a todo o tempo. A nulidade tem, no entanto, caráter excecional. Daí que sejam circunscritas as situações de um vício ser cominado com esta forma de invalidade. Assim, nos termos do art.º 161.º do CPA: “1 - São nulos os atos para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade. 2 - São, designadamente, nulos: a) Os atos viciados de usurpação de poder; b) Os atos estranhos às atribuições dos ministérios, ou das pessoas coletivas referidas no artigo 2.º, em que o seu autor se integre; c) Os atos cujo objeto ou conteúdo seja impossível, ininteligível ou constitua ou seja determinado pela prática de um crime; d) Os atos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental; e) Os atos praticados com desvio de poder para fins de interesse privado; f) Os atos praticados sob coação física ou sob coação moral; g) Os atos que careçam em absoluto de forma legal; h) As deliberações de órgãos colegiais tomadas tumultuosamente ou com inobservância do quorum ou da maioria legalmente exigidos; i) Os atos que ofendam os casos julgados; j) Os atos certificativos de factos inverídicos ou inexistentes; k) Os atos que criem obrigações pecuniárias não previstas na lei; l) Os atos praticados, salvo em estado de necessidade, com preterição total do procedimento legalmente exigido”. Ora, considerando este enquadramento, conclui-se que a alegada ilegalidade invocada pela Impugnante não é cominada com a nulidade do ato. Com efeito, o vício invocado em sede de alegações é de erro sobre os pressupostos, no tocante aos juros compensatórios, vício que comporta, a verificar-se, a anulabilidade do ato. Assim, trata-se de vício que carece de ser alegado no momento oportuno, ou seja, in casu, no pedido de pronúncia arbitral – o que, como vimos, não ocorreu. Por outro lado, a informação vinculativa, em cuja existência a ora Impugnante sustenta o seu entendimento de que não se verifica o pressuposto subjetivo inerente à liquidação de juros compensatórios, data de 2013, momento muito anterior ao da apresentação do pedido de pronúncia arbitral. Assim sendo, não se verifica nenhuma das situações excecionais que legitimaria a Impugnante a invocar, em sede de alegações, o novo vício que nunca antes suscitara. Como tal, também o Tribunal arbitral não era obrigado a pronunciar-se sobre o mesmo. Assim, não assiste igualmente razão à Impugnante nesta parte.
Atento o valor dos autos (1.187.933,98 Eur.), cumpre considerar o disposto no art.º 6.º, n.º 7, do RCP, aplicável na presente sede. Assim, nos termos desta disposição legal, “[n]as causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”. No caso, considerando quer a conduta das partes, que se revelou sem mácula, quer a simplicidade das questões apreciadas, entende-se dever haver lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no art.º 6.º, n.º 7, do RCP.
IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: a) Julgar improcedente a presente impugnação; b) Custas pela Impugnante, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda os 275.000,00 Eur.; c) Registe e notifique. Lisboa, 14 de julho de 2022
(Tânia Meireles da Cunha) (Susana Barreto) (Patrícia Manuel Pires) ______________________________ (1) Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, 6.ª Edição, Vol. II, Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 361 e 362; José Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum à luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª Ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013, p. 333. (2) V., exemplificativamente, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.04.2013 (Processo: 0969/12) e de 15.09.2010 (Processo: 01149/09) e o Acórdão deste TCAS, de 18.06.2013 (Processo: 06121/12). |