Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:13749/25.6BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:11/20/2025
Relator:LINA COSTA
Descritores:INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL
DOCUMENTOS
CAUTELAR
NULIDADES
REMOÇÃO DE ESPLANADA
FUMUS BONI IURIS
Sumário:I. Do disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 143º do CPTA resulta especificado que os recursos interpostos de decisões respeitantes a processos cautelares são meramente devolutivos, pelo que, no caso em apreciação, não está na disposição do juiz do processo fixar efeito diferente;
II. Decorre do nº 1 do artigo 651º do CPC que, depois do encerramento da discussão e em caso de recurso, só a título excepcional e devidamente justificado, é admitida a junção de documentos com as alegações e exclusivamente aqueles cuja apresentação não tenha sido possível anteriormente ou quando a sua junção se tenha tornado necessária por causa do julgamento proferido em 1ª instância;
III. Conforme previsto no nº 1 do artigo 118º do CPTA a circunstância de as partes requererem a produção de prova testemunhal não significa que o juiz fique obrigado a realizar as diligências correspondentes ou impedido de efectuar outras que entenda necessárias para poder decidir a providência requerida;
IV. A nulidade da sentença, ou de despacho, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do nº 1 do referido artigo 615º e nº 3 do artigo 613º, do CPC, exige que a falta de fundamentação, de facto e/ou de direito, seja absoluta, não bastando que se mostre deficiente, incompleta ou não convincente;
V. Estipula a alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
VI. A nulidade por omissão de pronúncia, prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, verifica-se quando o tribunal não se pronuncia, em absoluto, sobre questões - matérias respeitantes ao/s pedido/s, à/s causa/s de pedir e à/s excepção/ões invocadas - que devesse apreciar/conhecer, quer sejam de conhecimento oficioso quer sejam colocadas à apreciação/decisão do tribunal pelos sujeitos processuais, sem que a sua decisão se encontre prejudicada pela solução, eventualmente, dada a outras (cfr. alínea d) do nº 1 do artigo 615º e nº 2 do artigo 608º, do CPC, ex vi artigo 1º do CPTA);
VII. Novos argumentos, razões de invalidade do acto suspendendo não invocadas perante o tribunal a quo e, consequentemente, não apreciadas na sentença recorrida que é o objecto do presente recurso, não devem ser conhecidas por este tribunal ad quem;
VIII. O artigo 5º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de Abril, foi revogado pela alínea m) do artigo 13º do Decreto-Lei nº 10/2015, de 16 de Janeiro, que entrou em vigor em 1 de Março do mesmo ano, pelo que inexiste previsão legal que atribua o efeito de deferimento tácito ao decurso do prazo legal, sem decisão, do pedido de licenciamento zero;
IX. Os critérios de decisão das providências cautelares, previstos no artigo 120º do CPTA são de verificação cumulativa, significando que a não verificação do fumus boni iuris impossibilita, desde logo, o decretamento da providência requerida.
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:N..., Lda., devidamente identificada como requerente nos autos de outros processos cautelares, instaurados contra a Freguesia de Arroios, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença, proferida em 15.5.2025, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou improcedente o presente processo cautelar, indeferindo a providência requerida [de suspensão da eficácia da deliberação, de 7.2.2025, que aprovou a Proposta nº 107/2025, elaborada pela Sra. Presidente da Junta de Freguesia de Arroios que determinou o encerramento da esplanada do seu estabelecimento].
No requerimento de recurso a Recorrente refere que o mesmo sobe com efeito suspensivo e, nas alegações, indica o proc. nº 13338/25.5BELSB e como Recorrente C..., Lda., formulando as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«I. – Vem o presente recurso interposto da Sentença de Fls., que indeferiu providência cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo, com a qual da Recorrente não quer, nem pode conformar-se. Senão vejamos,
II.– Desde logo, por despacho do Mmo. Juíz a quo, que antecedeu imediatamente a sentença datada de 15/05/2025, o qual não foi notificado às Partes, foi dispensada a produção de prova testemunhal, que tinha sido requerida pela Requerente no Requerimento Inicial da providência cautelar, considerado que os autos dispunham de todos os elementos necessários à decisão a proferir. Ora,
III. - Salvo sempre o devido respeito que é devido, considera-se que o Tribunal recorrido realizou uma menos correcta interpretação e aplicação do Direito ao caso concreto.
IV. – O supra identificado Despacho, que antecedeu imediatamente a Sentença, não foi notificado nem à Requerente, nem à Entidade Requerida.
V. - Significa isto que, a falta de notificação para o efeito da Recorrente se pronunciar sobre a possibilidade de conhecimento imediato do litígio, implica, assim, uma verdadeira decisão surpresa, atentatória do princípio do contraditório ínsito no artigo 3.º, n.º 3 do CPC e do princípio do processo justo e equitativo, constitucionalmente consagrado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa;
VI. - O Tribunal não explica a razão pela qual não vislumbra a necessidade de produção de prova testemunhal, não explicando o iter cognitivo que o levou a chegar a tal conclusão;
VII. - O despacho em crise é, assim, smo, nulo por falta de fundamentação; e, porque,
VIII. - Nele se fez errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do artigo 118°, n.ºs 3 e 5 do CPTA, que se mostra, assim, violado.
IX.– Por exemplo, a Requerente alegou o pedido de licenciamento da sua esplanada, ainda antes das denominadas medidas extraordinárias caducarem, através do procedimento do Licenciamento Zero, procedimento esse que foi indicado não só à ora Recorrente, como aos demais comerciantes, pela própria Entidade requerida, que agora alega não ser o procedimento adequado.
X. – Factos que a Recorrente pretendia provar, designadamente através da produção de prova testemunhal.
XI.- No entanto, tal prova enunciada e a cargo da Recorrente, foi inviabilizada pelo próprio Tribunal "a quo" ao indeferir a produção de prova, e designadamente a produção de prova testemunhal, o que determinou, a final, que não se tivesse conseguido estabelecer, em concreto, se estavam verificados, ou não, os prejuízos de difícil reparação invocados pela Recorrente. Ou seja,
XII. - O Tribunal a quo, em primeiro lugar recusa a produção de prova, para depois afirmar que a Recorrente não demonstrou os factos, atinentes ao “fumus boni iuris”,
XIII. - Todos os meios de prova legítimos são, pois, admissíveis e, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo só poderia ter dispensado a produção da prova testemunhal se tivesse concluído que ela era manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária. Neste sentido, Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha, no "Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos", em anotação ao artigo 118° do CPTA e Aresto do TCA Norte, Proc. n° 276/11.8BEV1S, 2 Sec. do Cont. Tribut., de 12.01.2012.
XIV. - O poder discricionário, que é concedido ao julgador cautelar por via do art.º 118.°, n.° 3, do CPTA, não poderá ser um poder discricionário tout court, sendo antes um poder-dever, ou seja, um poder que está vinculado, à exigência da busca da verdade material e ao respeito pelo princípio da tutela jurisdicional efectiva.
XV. - Face ao exposto, é modesto entendimento da Recorrente, que a recusa da produção de prova e a recusa de inquirição das testemunhas por si arroladas acarreta a violação do disposto no artigo 118°, n° 3, do CPTA, e implica a anulação da sentença recorrida (Cfr. Acórdão do TCA Sul de 15.09.2011, R°07957/11).
XVI. - A Recorrente discorda igualmente da sentença recorrida, por considerar que esta incorre em deficiente interpretação e aplicação do Direito ao caso concreto.
XVII. - In casu, a Recorrente alegou estarem preenchidos os critérios de concessão da providência previstos no art.º 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, mas o tribunal a quo, entendeu ter-se por inverificado o fumus boni iuris, primeiros dos critérios que analisou.
XVIII. - A Recorrente não alcança a razão pela qual entendeu o Tribunal a quo não ter sido demonstrado o fumus boni iuris, quando ele próprio dispensou a produção de prova ao abrigo do n.° 3 do artigo 118° do CPTA.
XIX. – A delegação de competências, efectua-se mediante acordo entre a Câmara Municipal e as freguesias interessadas, nos termos previstos na Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de janeiro, pelo Decreto-Lei n.º 268/2003, de 28 de outubro, pela Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, e pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, acordo que não resultou da matéria de facto provada nos autos.
XX. - Tanto assim é, que não podemos concordar com a decisão do Tribunal Recorrido, por existir vício na matéria de competência entre os diversos órgãos da Administração Local;
XXI. - Se, efetivamente a competência está delegada à Freguesia de Arroios, por separação de poderes, e independência dos atos administrativos, e conforme decorre da legislação aplicável, Decreto-Lei N.º 57/2019 de 30 de Abril, então, salvo melhor opinião em contrário, não poderia a Autarquia em nenhum momento conceder a autorização, uma vez tratar-se de matéria exclusiva da Freguesia, o que desde já demonstra a existência de vício quanto à matéria de competência da entidade emissora do título de ocupação (vide Acórdão Supremo Tribunal Administrativo, Relator Juiz Conselheiro Valadas Preto).
XXII. - Está, por isso, em causa, a confiança o cumprimento dos princípios basilares do Direito Administrativo, sobre os quais a Recorrente acredita, e faz fé, sendo a Recorrida uma pessoa de bem, o que, pela análise, da Jurisprudência sobre esta matéria, esclarece que está em causa o mérito quanto às atribuições delegadas do Município de Lisboa para a Freguesia de Arroios, as quais não tem a aqui Recorrente conhecimento, nem foi disponibilizado no Processo instrutor;
XXIII. - A questão da incompetência, traduz-se na prática de ato por órgão que, para efeito, não dispõe de poder legal e pode ser absoluta ou relativa.
XXIV. - No caso em apreço, estamos perante incompetência absoluta, a qual consubstancia-se na prática por um órgão de uma pessoa coletiva pública de um ato incluído nas atribuições de outra pessoa coletiva pública, gerando, por isso, a nulidade de todas as decisões levadas a cabo pela entidade Requerida, aqui Recorrida;
XXV. - Logo, salvo o devido respeito que nos é devido, o Tribunal de 1.ª Instância, seguiu mal na apreciação da matéria relacionada com a competência atribuída às entidades, provocando a falsa crença na Recorrente, de que a sua realidade estava totalmente legal e cumpria a legislação, demonstrando que, pela apreciação, a Freguesia de Arroios é manifestamente incompetente na emissão deste atos, não tendo existido diferenciação desde a emissão da autorização na época, pelo que, somente a Autarquia de Lisboa poderá iniciar o procedimento administrativo, e não a Freguesia, existindo até usurpação de competências.
XXVI. – No que concerne ao Licenciamento Zero, e bastando-se com as afirmações proferidas pela Entidade Requerida, ora Recorrida, entende o Tribunal a quo que, não assiste razão à Recorrente, “ (...) porquanto a ocupação do espaço público afeto à circulação automóvel e para estacionamento não pode ser concedida por via do «Licenciamento Zero» (…), sendo que foi deste regime que a Requerente [erradamente] se socorreu (…)” (negritos e sublinhados nossos).
XXVII. - Salvo o devido respeito, não podemos anuir, porquanto, a todos os comerciantes com esplanadas, cuja autorização foi concedida pela Câmara Municipal de Lisboa, a Junta de Freguesia solicitou, no final do ano de 2023, que estas requeressem a renovação do licenciamento, através do procedimento que resulta do Licenciamento Zero, a que a Recorrente não foi excepção.
XXVIII. – Atente-se na matéria de facto considerada provada pela Sentença recorrida, sob pontos 8 a 10, os quais se dão por integralmente reproduzidos.
XXIX. – Dali resulta, por um lado, a competência da Câmara Municipal de Lisboa, nesta matéria, como tem vindo a ser defendido pela Recorrente e, por outro lado, também como defendido pela Recorrente, a provisoriedade do pagamento devido pelo local de estacionamento objecto da licença para a instalação da esplanada e não a provisoriedade da esplanada, conforme alegado pela Recorrida e acolhido pelo Tribunal a quo.
XXX. – Acresce que, em nenhum momento da matéria considerada provada, resulta qualquer comunicação enviada pela Recorrida à Recorrente, informando que o procedimento utilizado do “Licenciamento Zero” não era o correcto para o objectivo pretendido alcançar pela Recorrente.
XXXI. - Aliás, pese embora, a Recorrente, neste conspecto não tenha prova escrita explicita das instruções dadas pela Recorrida, no sentido de se socorrer do procedimento do Licenciamento Zero (um dos factos que a Recorrente pretendia provar com a prova testemunhal), o que é facto é que o Tribunal a quo não podia ignorar tal facto, na medida em que,
XXXII. - Por um lado, porque resulta da matéria de facto provada que o requerimento apresentado pela Recorrente foi recebido pela Recorrida e enviado para a CML e, em momento algum resulta dos autos ou da matéria de facto provada, que aquele procedimento não era o correcto.
XXXIII. - Por outro lado, não podemos deixar de chamar à colação outros procedimentos cautelares de suspensão da eficácia do acto, de semelhante teor, que se encontram a ser julgados pelo Tribunal a quo;
XXXIV. - Neste sentido, veja-se o Proc. n.º 13338/25.6BELSB, em que é Requerente C..., LDA, onde resultou provado, de fls. 6 a 9, 11 a 16 e 17 a 20 do PA junto aos Autos, que a Recorrida não só compeliu à utilização do formulário do Licenciamento Zero, como pediu a sua correcção à Requerida, para posterior envio à CML. Mais,
XXXV. - O Proc. N.º 12901/25.9BELSB, em que é Requerente P…, UNIPESSOAL, LDA., donde resulta sob doc. 12 junto ao requerimento inicial, que a Requerida, através dos seus serviços, esclarece que: “Considerando que a delegação de competências da Junta de Freguesia de Arroios unicamente se limita às áreas de calçada, qualquer manutenção de esplanadas na via pública, mais concretamente em áreas de antigos parqueamentos automóveis, ou simples áreas de betuminoso, carece de prévia autorização da CML. Assim, após rececionarmos o vosso formulário, iremos enviar para a CML-DMM (Direção Municipal de Mobilidade) para colher parecer desse organismo, e após recebermos parecer, se for favorável, é que estes serviços irão emitir parecer técnico por parte da JFA, para posterior decisão superior.” (negritos e sublinhados nossos).
XXXVI. - Por fim, encontra-se ainda em curso no Tribunal a quo, o Proc. N.º 12768/25.7BELSB, em que é Requerente V…, LDA., em que a Recorrida vai mais longe e, para não deixar por escrito a instrução fornecida à Recorrente, para utilização do procedimento do Licenciamento Zero, envia email a esta, onde pede que esta entre em contacto telefónico, cfr. resulta da factualidade ali ínsita nos arts. 24.º a 27.º do requerimento inicial e respectivo doc. 15. Ora,
XXXVII. - Salvo o devido respeito, ao abrigo do princípio do inquisitório, não deve, nem pode o Tribunal a quo, ignorar esta forma de actuação da Recorrida.
XXXVIII. – Efectivamente, estamos perante uma Entidade que, junto dos administrados, cria a confiança e a expectativa de que tudo se resolveria, i.e. que as esplanadas ficavam licenciadas, se recorressem ao procedimento do licenciamento zero, para, depois, uma vez em sede judicial, vir alegar em sede de oposição ao procedimento cautelar que o referido procedimento não é o correcto, consubstancia, salvo o devido respeito, venire contra factum próprium.
XXXIX. - O princípio venire contra factum proprium, no Direito Administrativo, significa que a Administração Pública, não pode exercer uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente. Por outras palavras, a Administração não pode negar uma situação que ela mesma criou ou reconheceu previamente.
XL. - Este princípio visa, assim, garantir a confiança e a segurança jurídica, impedindo que a Administração Pública adote posições contraditórias que gerem prejuízos aos administrados, alterando de forma imprevista e injusta, decisões ou comportamentos anteriores que criaram expectativas legítimas nos administrados.
XLI. Acresce ainda que, resulta da matéria de facto provada sob o ponto 14., que, de acordo com a Proposta n,º 130/2025, de 07/02/2025, elaborada pela Senhora Presidente da Junta de Freguesia de Arroios, que o ruído causado pelo funcionamento das esplanadas em lugares de estacionamento não é causa ou fundamento da decisão de remoção.
XLII. – Também aqui não podemos anuir, na medida em que, conforme Ofício remetido pela Assembleia Municipal de Lisboa, mediante email datado de 04/06/2025, resulta que o ruído é fundamento para a remoção das esplanadas, cfr. Docs. 1 e 2, que apenas agora se juntam, ao abrigo do disposto no artigo 651º, nº 1 do CPC e os artigos 425º e 423º do mesmo Código, aplicáveis ex vi art.º 1.º do CPTA, em virtude de apenas ter sido notificado à Recorrente na presente data, o que impossibilitou a sua junção, em data anterior ao presente recurso.
XLIII. - Por outro lado ainda, dos arts. 40.º e 41.º da oposição deduzida ao procedimento cautelar, a Entidade Requerida, admite que (i) o pedido de licenciamento formulado pela Recorrente, consubstancia um pedido de comunicação prévia com prazo e, que (ii) até à presente data, a Recorrida não obteve resposta ao pedido de parecer, que formulou junto da CML. Ora,
XLIV. – Se atentarmos ao regime do Licenciamento Zero, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/2011, de 1 de abril, maxime ao disposto no art.º 5.º, os n.ºs 1 e 2, resulta que o mesmo prevê o deferimento tácito, conforme ao art.º 130.º, n.º 1 do Código de Procedimento Administrativo, no caso da autoridade administrativa não se pronunciar, decorrido o prazo de 20 dias,.
XLV. Nesta medida, também aqui fenece a argumentação aduzida na Sentença recorrida, quando esta afirma que o deferimento tácito não é aplicável ao caso dos autos. Ora,
XLVI. - Não tendo a Recorrida recebido resposta ao parecer solicitado à CML, presume-se o seu deferimento tácito, nos termos do art.º 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48/2011, de 1 de abril e do art.º 130.º do CPA.
XLVII. - Desta forma, se o Tribunal a quo tivesse admitido a inquirição das testemunhas indicadas, teria conseguido apurar que a Recorrente, a par de todos os outros comerciantes que o fizeram, recorreu ao procedimento do Licenciamento Zero, por expressa indicação da Recorrida, não tendo a Recorrente, motivos para desconfiar que assim não fosse.
XLVIII. - Assim, enferma a sentença recorrida de deficiência instrutória, violando designadamente o disposto no art.º 114.º, n.º 3, al. g) e 118.º, n.º 3 do CPTA.
XLIX. - A contradição entre uma decisão que dispensa a audição de testemunhas e que depois julga não provados determinados factos que estas mesmas testemunhas poderiam provar já foi, de resto, identificada e condenada pelo STA, cfr. Acórdão de 02/11/2007, no âmbito do Recurso 471/07.
L. – A sentença é, assim, salvo o devido respeito nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, als. C) e d) do CPC, na medida em que, por um lado, uma correcta apreciação da matéria de facto provada, conduziria a uma decisão diversa; e,
LI. Por outro lado, porque, por despacho do Mmo. Juíz a quo, que antecedeu imediatamente a sentença datada de 15/05/2025, dispensou a produção de prova testemunhal, sem que disso tivesse notificado as Partes, dando-lhes oportunidade de se pronunciarem, e sem explicar o iter cognitivo que o levou a chegar a tal conclusão.
Termos em que, nos melhores de Direito e sempre com o mui Douto suprimento de V. Exa., deve o presente recurso ser procedente por provado e, em consequência, ser a sentença recorrida, substituída por outra que decrete a providência de suspensão da eficácia do acto, conforme requerido.»

Notificada para o efeito, a Recorrida contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
«A. Ocorre deserção por falta de alegações dirigidas aos autos ou, sem conceder, inutilidade superveniente da lide recursiva porquanto, que se saiba, até ao momento a Requerente não impugnou por via de ação administrativa a decisão objeto do procedimento cautelar e não invocando qualquer nulidade – nem a mesma existindo – relativamente a tal decisão administrativa, mostra-se decorrido o prazo de 3 meses para a sua impugnação, previsto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do CPTA.
Ainda sem conceder,
B. Deve ser atribuído ao presente recurso efeito meramente devolutivo, ao contrário do afirmado pela Requerente, de conformidade com o disposto no artigo 143.º, n.º 2, alínea b) do CPTA, que expressamente atribui efeito meramente devolutivo aos recursos interpostos de quaisquer decisões respeitantes a processos cautelares e respetivos incidentes.
C. O presente procedimento cautelar parte de um erro de base e de uma omissão factual da Requerente.
D. A Requerente, nos artigos 42.º e 45.º do seu requerimento inicial sustentou ter existido uma autorização para a instalação da sua esplanada, mas não invocou os seus termos, nem procedeu à sua junção.
E. Simplesmente porque essa autorização, atribuída no processo ENT/957/DMM/CML/20 claramente permite a instalação de esplanada em lugar de estacionamento na via pública a “título precário no contexto da Proposta 273/CM/2020” uma esplanada a título de “ocupação excecional e provisória de um lugar de estacionamento longitudinal para implementação de esplanada aberta, de acordo com a Proposta 273/CM/2020, de 21 de Maio, aprovada pela Assembleia Municipal de Lisboa”.
F. A qual continha medidas excecionais e transitórias de mitigação de contágios no âmbito da Covid 19, que caducaram por decurso do tempo definido para a qual foram adotadas.
G. É dessa precariedade, bem clara na autorização emitida e que foi junta com o processo administrativo, que a Recorrente pretende manter sine die essa esplanada na via pública afeta ao estacionamento automóvel (lugar de estacionamento), já há mais de 19 meses ilegalmente, invocando de seguida, em completa antinomia (e confissão), que o designado regime de “Licenciamento Zero” não é aplicável ao licenciamento de esplanadas em lugares de estacionamento, sendo ao invés aplicável o regime de licenciamento e concessão de uso exclusivo de domínio público, para arrematar que tem direito a manter essa esplanada porque iniciou um procedimento de Licenciamento Zero (o procedimento inaplicável), que não teve decisão!
H. É neste quadro de completa ausência de fundamentos de facto e de direito no procedimento cautelar dos autos, que a Requerente agora pretende que seja atribuído efeito suspensivo do seu recurso e procura conceber uma alegada e inexistente nulidade no douto despacho proferido ao abrigo do disposto no artigo 118.º do CPTA.
I. Sabendo que nenhuma razão lhe assiste e que a douta Sentença em recurso é exemplar na seleção dos factos pertinentes para a decisão da causa e na aplicação do direito.
J. O douto despacho interlocutório de 15-05-2025 que dispensou a produção de prova testemunhal devia ser notificado às partes, após a sua prolação, porque sendo um despacho interlocutório, que prepara a decisão final, é suscetível de recurso, com a decisão final, nos termos do disposto no artigo 644.º, n.º 3 do CPC e do artigo 142.º, n.º 5 do CPTA.
K. Não tendo tal sucedido, como invocado pela Requerente, ocorre uma irregularidade processual por falta de notificação mas a Requerente dele tomou conhecimento e dele reagiu mediante a interposição do presente recurso, pelo que tal irregularidade secundária de falta de fundamentação e tornou irrelevante e em nada interferiu no exame e decisão da causa.
L. O douto despacho proferido pelo tribunal recorrido, ao abrigo do disposto nos n.º 1 e 5 do artigo 118.º do CPTA, não carece de prévia pronúncia das partes, sendo proferido ao abrigo de um poder-dever de gestão processual, de ponderação da suficiência da matéria factual dos autos e de recusa de diligências dilatórias, cuja gravidade é acrescida em processo cautelar, dada a especial celeridade que é exigível, compaginável com a natureza perfunctória da prova.
M. O contraditório, pedra basilar de um processo justo e equitativo, é efetuado pela impugnação desse despacho a final, no recurso da decisão final, como decorre do disposto nos artigos 644.º n.º 3 do CPC e 142.º, n.º 5 do CPTA.
N. Ao contrário do que afirma a Requerente, que opta por omitir esse douto despacho, o tribunal afirmou já dispor de todos os elementos necessários à boa decisão da causa e afirmou que as questões a decidir são de direito tendo, portanto, por desnecessária e ao abrigo do n.º 5 do artigo 118.º do CPTA, dispensado a produção de prova testemunhal.
O. Ao contrário do que se afirma, o Tribunal a quo proferiu despacho a dispensar a produção de prova adicional, para o que apresentou justificação adequada e suficiente, ainda que sucinta.
P. Nem tal juízo incorre em erro de julgamento.
Q. Não existe uma única conclusão recursiva sobre impugnação da matéria de facto, nem a identificação concreta de qualquer facto relevante, cuja instrução e prova pudesse efetivamente alterar o decidido.
R. A douta Sentença em recurso, que selecionou adequadamente a matéria de facto necessária à decisão que tomou e que “se limita” a julgar inexistir fumus boni iuris, como requisito necessário ao decretamento do procedimento cautelar, não tinha de dar como provada toda a factualidade alegada pela Requerente, designadamente respeitante ao periculum in mora – no qual as suas contradições e insuficiências são igualmente notórias – pois que julgou como não verificado o primeiro dos critérios decisórios plasmados no artigo 120.º do CPTA: a aparência de direito favorável à pretensão deduzida.
S. A douta Sentença em recurso decidiu, por fim, de direito, concluindo pela não verificação de fumus boni iuris, enquanto primeiro dos requisitos e critérios decisórios dos procedimentos cautelares, de forma clara, congruente e suficiente, não merecendo a mesma qualquer censura.
T. A Requerida dá aqui por reproduzida a sua alegação e os fundamentos doutos apresentados na Sentença em recurso, que são plenamente demonstrativos de que o procedimento e o presente recurso não têm qualquer fundamento de facto ou de direito.».

O juiz a quo, reconhecendo que o despacho que dispensou a prova testemunhal não foi notificado às partes, refere que tal se traduz numa irregularidade por omissão de uma formalidade que a lei prescreve, que devia ser arguida mediante reclamação e que esse despacho não padece de nulidade por falta de fundamentação. E admitiu o recurso com efeito meramente devolutivo.

A Recorrente veio requerer a rectificação dos meros lapsos de escrita ocorridos na primeira folha das alegações de recurso, o que foi admitido pelo juiz a quo.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Sem vistos, por se tratar de processo urgente (cfr. o nº 2 do artigo 36º do CPTA), mas com divulgação prévia do projecto de acórdão aos Exmos. Juízes-Adjuntos, vem o mesmo à sessão para julgamento.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se o despacho que dispensou a prova testemunhal é nulo por falta de fundamentação e fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 118º, nºs 3 e 5 do CPTA, e se a sentença recorrida é nula nos termos das alíneas c) e d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, e se incorreu em erros de julgamento ao não decretar a providência requerida por falta de fumus boni iuris.
A título prévio importa aferir do efeito de subida do recurso, da admissibilidade dos documentos juntos com as alegações.

Das questões prévias

i) Do efeito de subida do recurso

Por força do disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 143º do CPTA os recursos interpostos das decisões respeitantes a processos cautelares e respectivos incidentes têm efeito meramente devolutivo, significando que a sentença proferida é imediatamente exequível na 1ª instância ainda que a título provisório, por poder ser alterada no âmbito do recurso.
Considerando que a Recorrente se limita, no requerimento de recurso, a referir que o mesmo sobe com efeito suspensivo e que o tribunal recorrido fixou o efeito como meramente devolutivo, por aplicação estrita do disposto na referida alínea b) do nº 2 do artigo 143º, ou seja, ope legis, não havendo que aplicar o disposto no nº 4 do mesmo artigo [que pressupõe que o efeito meramente devolutivo tenha sido fixado por despacho (e não por imposição legal, como se verifica no presente caso) para além da alegação e comprovação de danos que a Recorrente não invoca], nada mais há a acrescentar, mantendo-se o decidido.

ii) Da admissão de documentos

A Recorrente requer a junção às alegações de recurso de dois documentos que consistem, o primeiro, num email, de 5.6.2025, da Assembleia Municipal de Lisboa dirigido ao seu gerente, remetendo-lhe, o segundo, o ofício OF/1034/AML/25, de 2.6.2025, de resposta ao ofício OF/446/ALM/25 – Remoção de Esplanadas em Arroios, por só agora lhe terem sido notificados.

De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 651º do CPC as partes podem juntar documentos às alegações ou contra-alegações, nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425º, ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.
O referido artigo 425º prevê que: “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
A saber, depois do encerramento da discussão e em caso de recurso, só a título excepcional e devidamente justificado, é admitida a junção de documentos com as alegações e exclusivamente aqueles cuja apresentação não tenha sido possível anteriormente ou quando a sua junção se tenha tornado necessária por causa do julgamento proferido em 1ª instância.
Na situação em apreciação o recurso foi interposto da sentença, de 15.5.2025, que julgou improcedente o presente processo cautelar, por falta de fumus boni iuris, sendo que a Recorrente vem alegar que no facto nº 14., indiciariamente provado, relativo à Proposta nº 130/2025, de 7 de Fevereiro, da Sra. Presidente da Junta de Freguesia de Arroios, consta, designadamente, que o eventual ruído causado pelo funcionamento das esplanadas em lugares de estacionamento não é causa ou fundamento da decisão de remoção, com o que não pode anuir pois dos documentos, cuja admissão pretende, resulta que o ruído gerado é um dos factores que as Juntas de Freguesia têm em consideração na apreciação da possibilidade de permanência ou não, das esplanadas.
Analisado o requerimento inicial [r.i.] constata-se que na parte relativa ao preenchimento do requisito da ponderação dos interesses em presença, mormente nos artigos 137º a 140º, a Requerente alega, em suma, que a existência da sua esplanada não significa, só por si, aumento do ruído, que até ao momento, não lhe foi dada a conhecer qualquer queixa, e que o eventual ruído que possa pôr em causa o sossego dos moradores deve ser combatido através de acções de sensibilização e fiscalização, pelo que o interesse público em causa não assume uma relevância preponderante que implique a recusa da providência.
No referido facto 14., relativo à proposta da Recorrida que viria a ser aprovada, nos seus exactos termos, consubstanciando o acto suspendendo [v. facto 15.], consta expressamente que o ruído causado pelo funcionamento da esplanada não é o fundamento da proposta/acto suspendendo, o que vai de encontro ao que a Requerente/recorrente alega no r.i.
Donde, não se vê qual o interesse que a Recorrente possa ter na junção de documentos da AML, que não é parte nos autos, e que de forma genérica enuncia os factores que as Juntas de Freguesia - e não especificamente a Recorrida - têm em consideração na apreciação da possibilidade de permanência ou não, das esplanadas, entre os quais figura o ruído gerado pelo respectivo funcionamento, quando o que pretende é desvalorizar esse ruído ou que o mesmo não seja considerado pelo tribunal como uma razão para dar prevalência ao interesse público da Recorrida, na ponderação do critério previsto no nº 2 do artigo 120º do CPTA.
Assim, apesar da superveniência dos referidos documentos face à data em que a sentença recorrida foi proferida, inexiste fundamento relevante que justifique, a título excepcional, a sua admissão com as alegações de recurso, pelo que devem os mesmos ser desentranhados e devolvidos à apresentante.

Do recurso do despacho que dispensou a produção de prova testemunhal

No ponto I.3 da sentença recorrida é feita referência a este despacho - “Nesta data, foi dispensada a produção de prova testemunhal”.
No recurso, vem alegado, em suma, que: o despacho, antecedeu imediatamente a sentença e não foi notificado às partes; dispensa a produção de prova testemunhal, “considerado que os autos dispunham de todos os elementos necessários à decisão a proferir”; porque não sabia da possibilidade do conhecimento imediato do litígio, ocorre uma verdadeira decisão surpresa, em violação do artigo 3º, nº3 do CPC, do processo justo e equitativo previsto no artigo 20º da CRP; o tribunal não explica porque dispensa a prova requerida, pelo que o despacho é nulo por falta de fundamentação; e porque efectuou uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 118º, nºs 3 e 5 do CPTA; por exemplo pretendia provar com as testemunhas arroladas o que alegou quanto ao pedido de licenciamento da sua esplanada, antes das medidas extraordinárias caducarem, ao abrigo do Licenciamento Zero, procedimento indicado pela Requerida que agora alega não ser o adequado; a dispensa da prova testemunhal inviabiliza demonstrar se estavam ou não verificados os prejuízos de difícil reparação que alegou; todos os meios de prova são legítimos e admissíveis, pelo que a prova requerida só poderia ter sido dispensada se o tribunal recorrido tivesse concluído que a mesma era manifestamente impertinente, inútil e desnecessária; o poder discricionário do juiz por via do artigo 118º nº 3 é um poder-dever, vinculado à busca da verdade material e ao respeito pelo princípio da tutela jurisdicional efectiva.
No despacho proferido após apresentação do requerimento do recurso e das contra-alegações, o juiz a quo reconhece que o despacho em referência não foi notificado às partes, que tal se traduz numa irregularidade por omissão de uma formalidade que a lei prescreve, a qual devia ser arguida mediante reclamação, que esse despacho não padece de falta de fundamentação, pelo que não se verifica a arguida nulidade do mesmo.
Apreciando.
Dispõe o artigo 118º do CPTA, com a epígrafeProdução de prova”, que:
“1 - Juntas as oposições ou decorrido o respetivo prazo, o processo é concluso ao juiz, podendo haver lugar a produção de prova, quando este a considere necessária.
2 - Na falta de oposição, presumem-se verdadeiros os factos invocados pelo requerente.
3 - O juiz pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias, não sendo admissível a prova pericial.
4 - O requerente não pode oferecer mais de cinco testemunhas para prova dos fundamentos da pretensão cautelar, aplicando-se a mesma limitação aos requeridos que deduzam a mesma oposição.
5 - Mediante despacho fundamentado, o juiz pode recusar a utilização de meios de prova quando considere assentes ou irrelevantes os factos sobre os quais eles recaem ou quando entenda que os mesmos são manifestamente dilatórios.
(…).”
O juiz a quo proferiu despacho sobre os requerimentos de prova testemunhal, formulados pelas partes, dispensando a sua produção, incorporou-o no sistema informático dos tribunais administrativos imediatamente antes da sentença recorrida, conforme alega a Recorrente. Esta foi notificada às partes. Aquele não – porque o juiz não escreveu “notifique” ou a unidade orgânica se esqueceu de fazer referência na notificação da sentença ao despacho proferido, não sabemos, apenas se sabe pelo alegado pela Recorrente e o admitido pelo juiz a quo, que foi praticado o acto processual que a lei exige, mas omitida a formalidade de o levar ao conhecimento dos respectivos destinatários.
Omissão que pode surpreender por não ser usual, mas que não implica, como alega a Recorrente que a sentença que se lhe seguiu deva ser considerada como uma decisão surpresa, prolatada em momento da tramitação que a não admitia por ainda não terem ocorrido as diligências de prova requeridas pelas partes e que se impunham ao tribunal realizar antes e para poder proferir sentença, em observância de princípios como os do contraditório e da tutela jurisdicional efectiva, no acesso ao direito e a um processo justo e equitativo.
Conforme resulta do disposto no nº 1 do artigo 118º, reproduzido, a circunstância de as partes requererem a produção de prova testemunhal não significa que o juiz fique obrigado a realizar as diligências correspondentes ou impedido de efectuar outras que entenda necessárias para poder decidir a providência requerida.
Mais, a falta de notificação de um despacho constitui uma irregularidade na tramitação do processo, que, se puder consubstanciar uma nulidade processual nos termos do disposto no artigo 195º do CPC, deve ser objecto de reclamação.
A não ser que, como no caso em apreciação, a Recorrente tenha tomado conhecimento da existência do despacho não notificado, eventualmente pela leitura da sentença recorrida, e mesmo do seu teor (como resulta da sua reprodução parcial no recurso), certamente pela sua consulta nos autos em suporte electrónico, pelo que pôde dele recorrer, em conjunto com o recurso da sentença proferida, como efectivamente sucedeu, na prossecução do pretendido processo justo e equitativo.
Alega a Recorrente que não percebe porque o juiz a quo considerou que os autos dispunham de todos os elementos necessários à decisão a proferir, pelo que o despacho em referência é nulo por falta de fundamentação.
Mas não lhe assiste qualquer razão.
Com efeito, a nulidade da sentença, ou de despacho, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do nº 1 do referido artigo 615º e nº 3 do artigo 613º, do CPC, exige que a falta de fundamentação, de facto e/ou de direito, seja absoluta, não bastando que se mostre deficiente, incompleta ou não convincente.
No despacho em referência - «Da produção de prova testemunhal: considerando que o Tribunal dispõe [já] de todos os elementos necessários à boa decisão da causa, reconduzindo-se as questões a decidir a questões meramente de direito, dispensa-se, por desnecessária, e ao abrigo do disposto no artigo 118º, nº 5, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a produção de prova testemunhal.» - são indicadas as razões pelas quais o juiz a quo entendeu dever dispensar a prova testemunhal requerida.
O que é suficiente para concluir que não se verifica a arguida nulidade.

E é porque o despacho recorrido se encontra fundamentado que a Recorrente vem invocar que o mesmo padece de erro de julgamento na interpretação e aplicação do referido artigo 118º, mormente nos respectivos nºs 3 e 5.
Vejamos.
Do teor do respectivo nº 1 resulta que, nas providências cautelares, a abertura de uma fase de instrução, a seguir ao recebimento dos articulados, depende do livre-arbítrio do juiz titular do processo quanto à sua necessidade.
Nos respectivos articulados cumpre às partes observar os ónus de alegação/defesa e prova, sendo que a apresentação de oposição, num processo cautelar obsta a que os factos alegados no requerimento inicial possam ser presumidos como verdadeiros [cfr. a contrario o nº 2 do artigo 118º] e os respectivos requerimentos de prova testemunhal indiciam que consideram que existe factualidade alegada controvertida.
Contudo, a circunstância de terem indicado testemunhas não altera o afirmado, ou seja, não implica qualquer obrigatoriedade para o juiz em promover a respectiva inquirição.
Com efeito, recebidos os articulados cumpre ao juiz proceder a uma análise dos factos essenciais que constituem a causa de pedir cautelar e, face à posição assumida sobre os mesmos pela parte contrária e à prova documental produzida nos autos, sumariamente considerada, efectua um juízo perfunctório sobre os factos indiciariamente admitidos e os controvertidos e se estes são ou não relevantes para o preenchimento de cada um dos critérios de decisão das providências, vertidos no artigo 120º do CPTA (ou de apenas um, se conduzirem ao seu não preenchimento, uma vez que esses critérios são de verificação cumulativa), decidindo então se é de admitir ou recusar os pedidos de produção de prova testemunhal, mediante despacho fundamentado.
A exigida fundamentação sobre a necessidade ou não de realizar diligências instrutórias constitui o limite do referido livre-arbítrio do juiz, do tal poder-dever a que a Recorrente se referiu.
Voltando ao caso em apreciação, o juiz a quo proferiu o exigido despacho sobre os requerimentos probatórios das partes, resultando da respectiva fundamentação que, efectuada uma análise prévia, perfunctória e sumária dos factos alegados e da prova produzida, concluiu que já dispõe dos elementos necessários a decidir, ou seja, a prova documental produzida nos autos é suficiente para suportar os concretos factos alegados nos respectivos articulados e as questões a resolver são de direito, pelo que dispensou, por desnecessária, a produção da prova testemunhal requerida.
O mesmo é dizer que qualificou a matéria alegada nos articulados das partes ou como provada pelos documentos constantes nos autos ou como irrelevante para a decisão cautelar a proferir, pelo que, por desnecessária e dispensável, indeferiu a produção da prova testemunhal que requereram.
No que fez uma adequada interpretação e aplicação do disposto no nº 5 do referido artigo 118º.
A discordância manifestada pela Recorrente, na sua maioria em termos genéricos e abstractos, não é suficiente para abalar este entendimento por não evidenciar a indispensabilidade da inquirição das testemunhas arroladas, face à prova documental já existente nos autos, nem explicar para o efeito de dar por verificado o requisito do fumus boni iuris, que factos alegados ficaram por provar e porque precisava provar, como alega a título de exemplo, que foi a Recorrida que lhe indicou o procedimento do Licenciamento Zero e agora vem defender a sua inadequação, qual a relevância que tal facto tem para o juízo de que será provável que a acção principal, de que a presente providência é instrumental, irá ser julgada procedente.
Pelo que, quanto a este despacho, não pode proceder o recurso.

Da sentença recorrida

Com relevo para a decisão a proferir, o juiz a quo considerou indiciariamente provados os seguintes factos:

«1. Em 2020, a ora Requerente apresentou um pedido de ocupação - a título excecional e provisório -, através da colocação de uma esplanada, de um lugar de estacionamento localizado em frente ao seu estabelecimento comercial, sito na rua dos Anjos, na freguesia de Arroios, na sequência e ao abrigo da Proposta 273/CM/2020 [aprovada pela Assembleia Municipal de Lisboa por via das Deliberação 151/AML/2020] - cf. fls. 1 do processo administrativo;

2. Sobre o referido pedido incidiu a seguinte análise:
«Trata-se de um pedido de ocupação excecional e provisória de um lugar de estacionamento longitudinal, para implementação de esplanada aberta, de acordo com a Proposta 273/CM/2020, de 21 Maio, aprovada pela Assembleia Municipal de Lisboa. Dimensões da esplanada (1,80x4,80=8,64m2), de forma a não ultrapassar os limites do estacionamento. Vai ter de ser feito estrado e guardar corpos de modo a cumprir todas as condições de segurança pedonal e viária. O pedido está em condições de ser aprovado, desde que cumpra as alterações acima especificadas» - cf. fls. 1 do processo administrativo;

3. Na sequência daquela, foi proferido despacho com o seguinte teor:
«Aprovado a título precário no contexto da Proposta 273/CM/2020, de 21 de maio» - cf. fls. 1 do processo administrativo;

4. Por mensagem de correio eletrónico, remetida em 03-06-2020, a Câmara Municipal de Lisboa comunicou à Entidade Requerida o seguinte:
«Exmos. Senhores
Junta de Freguesia de Arroios
Na sequência do V. e-mail de 27 de maio, que mereceu a nossa melhor atenção, cumpre-nos informar que a Direção Municipal de Mobilidade autorizou a instalação de esplanada aberta, nos termos constantes da ficha de apreciação do pedido de aumento extraordinário e temporário de esplanadas, em anexo.
Mais informamos que o pedido foi aprovado temporariamente e a título precário, pelo período de duração constante na proposta nº 273/CM/2020» - cf. fls. 2 do processo administrativo;

5. Em 19 de setembro de 2021, a Requerente remeteu uma mensagem de correio eletrónico para «Licenciamento Espaço Público» e «c…@jfarroios.pt» com o seguinte teor:
«Vimos por este meio entregar a planta/desenho da renovação da esplanada (T...-Esplanada-Planta.pdf), acompanhada por uma memória descritiva (T...-Esplanada-Memoria_Descritiva.pdf) conforme solicitado na notificação de referência ENT/957 /DMM/CML/20 de 09/09/2021.
Gostaríamos ainda de solicitar o agendamento de uma reunião presencial de forma a garantir que estamos em conformidade com o autorizado» - cf. fls. 4 do processo administrativo;

6. Consta da memória descritiva aludida na mensagem de correio eletrónico cujo teor se levou ao probatório no ponto anterior o seguinte:
«A presente Memória Descritiva pretende descrever o projeto para a renovação da esplanada do restaurante T..., conforme solicitado pela JF Arroios.
Solução a desenvolver
A esplanada do Restaurante T... irá ocupar o espaço da via pública, imediatamente em frente ao restaurante, e o lugar de estacionamento confinante, conforme desenho em anexo.
O lugar de estacionamento será delimitado por um guarda-corpos constituído por paletes com 0.8m de altura, pintadas de cor verde e branco, em conformidade com a cor da fachada do prédio que acolhe o restaurante T.... A tinta a utilizar nas paletes será adequada a aplicação em madeiras para espaços exteriores. As paletes serão encimadas por floreiras em todo o seu comprimento.
O chão será revestido por um estrado de madeira, solidário com o guarda-corpos tipo palete de forma a conferir maior robustez à estrutura» - cf. fls. 5 do processo administrativo;

7. Por ofício com data de 01-11-2023, a Entidade Requerida comunicou à Requerente o seguinte:
«Conforme é do conhecimento de Vª. Exª., nos termos das propostas de deliberação 273/CM/2020, 729/CM/2020 e 820/CM/2022, aprovadas pela Assembleia Municipal de Lisboa, no âmbito das medidas com vista à prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por Covid 19, foram aprovadas medidas excecionais e transitórias destinadas a apoiar a retoma económica, nomeadamente, a isenção de taxas para as esplanadas e áreas expositivas exteriores já existentes, assim como, para ampliação ou criação de novas e ainda o acesso, também excecional, a lugares de estacionamento na via pública para instalação dos equipamentos acima referidos.
Também como é do conhecimento de Vª. Exª. e no atual circunstancialismo, tal medida excecional acima referida, e de utilização temporária do espaço público, termina a 31 de dezembro de 2023.
Nestes termos e sem prejuízo do exercício da faculdade da submissão de pedido de licenciamento, nos termos da Lei 75/2013 de 12 de setembro, da Lei nº. 56/2012 de 08 de novembro e do Regulamento Geral de Mobiliário Urbano e Ocupação de Via Pública e do Regulamento de Infraestruturas em Espaço Público, fica Vª. Exª. notificado com referência à estrutura Rua Andrade em frente ao número 9/11 na Freguesia de Arroios, com referência ao estabelecimento Massa Fresca, de que deverá proceder à sua remoção até 31 de Dezembro de 2023 por já não subsistirem os fundamentos legais que permitiram a sua existência, sendo que se tal não acontecer e porque a partir dessa data tais estruturas serão ilegais, a Junta de Freguesia de Arroios irá, nos termos permitidos pela Lei, proceder à sua remoção com custos imputáveis a Vª. Exª., bem como a adoção de quaisquer outros procedimentos legais que se considerem pertinentes e adequados à situação» - cf. fls. 8 do processo administrativo;

8. Em 21-12-2023, a ora Requerente remeteu à Entidade Requerida um «Formulário Licenciamento Zero», ao qual juntou um anexo [anexo I], formulário através do qual comunicou a esta a ocupação do espaço público [lugar de estacionamento] aludido em 1), por via [designadamente] da esplanada [destacada] aí referida - cf. fls. 10 a 14 do processo administrativo;

9. Em 27-12-2023, a Entidade Requerida remeteu à Câmara Municipal da Lisboa uma mensagem de correio eletrónico com o seguinte teor:
«Por incumbência do Senhor Chefe de Divisão do Espaço Público da Junta de Freguesia de Arroios, Arq. Eduardo Simões, junto se envia em anexo pedido para manter esplanada em lugar de estacionamento, lugares atribuídos pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) em 2020/2021).
No âmbito de várias deliberações da Assembleia Municipal da CML, essas autorizações para aumento extraordinário e temporário de esplanadas foram atribuídas a título excecional e provisório.
Assim, e sendo que essas ocupações seriam pontuais e efémeras, solicitamos parecer a V. Exas. sobre a pertinência de se manter a referida ocupação durante o ano de 2024, face aos critérios de mobilidade urbana definidos pela CML, por forma a poder a junta pronunciar-se também» - cf. fls. 15 do processo administrativo;

10. Em 07-06-2024, foi elaborada pela Senhora Presidente da Junta de Freguesia de Arroios a Proposta nº 256/2024, com o seguinte teor:
«O Município de Lisboa, no âmbito das medidas com vista à prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por COVID-19 aprovou, desde o início da Pandemia, medidas extraordinárias de apoio aos estabelecimentos comerciais, designadamente, a medida que se traduzia na suspensão temporária do pagamento devido pela ocupação do local de estacionamento objeto de licença para a instalação da esplanada ou exposição (propostas de deliberação 273/CM/2020 e 729/CM/2022).
Com o intuito de manter esta medida para o Ano de 2023, a Assembleia Municipal de Lisboa, após proposta da Câmara Municipal de Lisboa, aprovou a suspensão temporária do pagamento devido pela ocupação do local de estacionamento objeto de licença para a instalação de esplanada ou exposição desde 01.01.2023 até 31.12.2023, na sequência da Proposta n.º 820/2020.
A mencionada medida, de carater excecional e transitória, proposta pela Câmara Municipal de Lisboa e aprovada pela Assembleia Municipal de Lisboa, tinha um tempo de aplicação limitado, tendo terminado no dia 31 de dezembro de 2023.
Nos dias 01/11/2023 e 26/01/2024 foram enviadas missivas para os proprietários dos estabelecimentos na área territorial da Freguesia de Arroios, que tinham usufruído desta isenção, para removerem as respetivas esplanadas que ocupassem locais de estacionamento, sendo concedido um prazo para esse efeito.
Foram destinatários desses ofícios: […] N..., Lda […].
Vários estabelecimentos comerciais não aceitaram a solicitação desta Junta de Freguesia, mantendo a ocupação do espaço público.
A ocupação de espaços públicos está sujeita a uma Mera Comunicação Prévia, nos termos do Decreto-Lei n.º 48/2011, de 01 de abril, na sua redação atual, cabendo às Juntas de Freguesia o licenciamento, cobrança das taxas, bem como de notificar os proprietários dos estabelecimentos que ocupam o espaço público com esplanadas ou outros equipamentos ilegalmente e sem autorização ou licenciamento. Além do mais, também é da competência da Junta verificar se a esplanada cumpre com as devidas exigências legais.
A ocupação dos locais de estacionamento não se enquadra, atualmente, como uma forma admissível de ocupação do espaço público nos termos da referida Lei, incumprindo, igualmente, o previsto no Anexo IV do Regime Legal do Licenciamento Zero.
Esta ocupação de via pública, prevista no artigo 48.º do Regulamento Geral de Estacionamento e Paragem na Via Pública, já não se encontra isenta de pagamento nos termos das propostas aprovadas em Assembleia Municipal de Lisboa, não foi renovada por via de novos pedidos de licenciamento após a data de 31 de dezembro de 2023, nem foi aprovada pela Freguesia.
Considerando a factualidade exposta, os proprietários foram notificados previamente para procederem à remoção voluntária das esplanadas que ocupam ilegalmente espaço público.
Nos termos do artigo 48.º-A do Regime Jurídico dos Ilícitos de Mera Ordenação Social, podem ser provisoriamente apreendidos pelas autoridades administrativas competentes os objetos que serviram ou estavam destinados a servir para a prática de uma contraordenação, ou que por esta foram produzidos, e bem assim quaisquer outros que forem suscetíveis de servir de prova.
Por sua vez, e uma vez que este mobiliário urbano ocupa o espaço público ilicitamente, e nos termos do artigo 26.º e 27.º do Decreto-Lei n.º 48/2011, de 01 de abril, na sua redação atual, notificado o infrator, podem ser removidos ou por qualquer forma inutilizados os elementos que ocupem o espaço público em violação das normas reguladoras da ocupação de espaço público, ficando os encargos com a remoção de elementos que ocupem o espaço público, ainda que efetuada por serviços públicos, a ser suportados pela entidade responsável pela ocupação ilícita.
Considerando a factualidade exposta, e a manutenção ilegal de esplanadas em ocupação dos parques de estacionamento por parte dos proprietários de vários estabelecimentos na Freguesia de Arroios não obstante ser do conhecimento dos mesmos que a medida em vigor era temporária e que findou a 31 de Dezembro de 2023, a caducidade das medidas excecionais e transitórias que tiveram origem na situação epidemiológica COVID-19 pelo que, atualmente, não subsistem as circunstâncias de facto que sustentaram a prolação destas medidas excecionais, tendo sido já notificados em duas ocasiões para a remoção voluntária das esplanadas, propõe-se a esta Junta de Freguesia que sejam notificados os proprietários dos estabelecimentos comerciais para removerem voluntariamente as esplanadas no prazo de 5 dias úteis, sob pena de, findo este prazo, serem as esplanadas e demais mobiliário urbano, apreendido e removido coercivamente, ao abrigo dos artigos mencionados supra, com os custos inerentes imputados aos estabelecimentos em causa» - cf. fls. 17 a 19 do processo administrativo;

11. Tal proposta viria a ser aprovada, nessa mesma data, pela Junta de Freguesia de Arroios, nos seguintes termos:
«Atenta a proposta da Senhora Presidente, de 07 de junho de 2024, que propõe com os fundamentos nela expressos que sejam notificados os proprietários dos estabelecimentos comerciais […] para remover as esplanadas que ocupam parques de estacionamento no território da Freguesia de Arroios num prazo de 5 dias úteis, sob pena de, não o sendo feito neste prazo, serem as esplanadas e demais mobiliário urbano apreendido e removido coercivamente, ao abrigo dos artigos mencionados supra, com os custos inerentes imputados aos estabelecimentos em causa, em concordância com a mesma, determina-se a notificação dos proprietários nos termos indicados, devendo ser removidas as esplanadas e demais mobiliário urbano caso não sejam voluntariamente removidos no prazo concedido.
Mais ficam os proprietários e/ou exploradores dos estabelecimentos em causa notificados de que poderão exercer o direito de audiência prévia, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados do termo do prazo para remoção voluntária, mediante exposição dirigida à Junta de Freguesia de Arroios, sendo que decorrido este prazo se converterá em definitivo o projeto de decisão ora comunicado de remoção coerciva das esplanadas e demais mobiliário urbano caso não sejam voluntariamente removidos no prazo acima concedido» - cf. fls. 21 do processo administrativo;

12. Por ofício com data de 21-06-2024, a Entidade Requerida comunicou à Requerente o seguinte:
«Fica V. Ex.ª notificado, na qualidade de titular do estabelecimento comercial acima Indicado, que por proposta da Senhora Presidente da Junta de Freguesia de Arroios, de 07-06-2024, foi deliberado pela Junta de Freguesia de Arroios, na mesma data, conceder a V. Ex.ª um último prazo de 5 dias úteis para a remoção voluntária da esplanada e mobiliário urbano ilegalmente existentes em espaço público afeto a lugar de estacionamento, devendo o mesmo ser deixado limpo e desimpedido.
Caso tal remoção não ocorra voluntariamente no prazo agora concedido, fica igualmente notificado para no prazo de 15 dias úteis se pronunciar, querendo, sobre o projeto de decisão de remoção coerciva da referida esplanada e mobiliário urbano, correndo nesse caso todos os custos e encargos por conta de V. Ex.ª.
Mais se comunica que findo o prazo concedido e não havendo pronúncia ou não contendo a mesma elementos que possam inverter o projeto de decisão, se converterá em definitivo o projeto de decisão de remoção coerciva ora notificado, procedendo-se à mesma, passando o mesmo a dever ser considerado como a decisão final» - cf. fls. 25 a 27 do processo administrativo; Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa

13. Em 01-07-2024, na sequência do ofício aludido no ponto anterior, a ora Requerente remeteu à Entidade Requerida a «exposição» a fls. 29 e seguintes do processo administrativo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido - cf. fls. 28 a 31 do processo administrativo;

14. Em 07-02-2025, foi elaborada pela Senhora Presidente da Junta de Freguesia de Arroios a Proposta nº 130/2025, com [além do mais] o seguinte teor:
«Tendo sido, uma vez mais, como decorre da factualidade evidenciada na própria proposta de 07-06-2024, notificado o titular do estabelecimento em referência, por ofícios expedidos em 24-06-2024, para a morada do estabelecimento e para a sede da sociedade titular, do teor da proposta e da deliberação acima transcritas, bem como para no prazo de 5 dias úteis proceder à remoção voluntária da esplanada e mobiliário urbano ilegalmente existentes em espaço público afeto a lugar de estacionamento defronte do respetivo estabelecimento comercial, na morada indicada, devendo o mesmo ser deixado limpo e desimpedido.
Pelo mesmo ofício, foi notificado para, não efetuando a remoção voluntária, se pronunciar, querendo, no prazo de 15 dias úteis, sobre o projeto de decisão de remoção coerciva da referida esplanada e mobiliário urbano, correndo nesse caso todos os custos e encargos pelo obrigado.
Ainda pelo mesmo ofício, foi notificado de que findo o prazo concedido e não havendo pronúncia ou não contendo a mesma, elementos que permitam inverter o projeto de decisão, se converterá em definitivo o projeto de decisão de remoção coerciva ora notificado, procedendo-se à mesma, passando o mesmo a ser considerado como a decisão final.
Tendo a comunicação enviada para a sede da titular do estabelecimento sido devolvida ao remetente, foi enviada a 09-07-2024 comunicação de idêntico teor.
Tendo o destinatário respondido em direito de audição por comunicação datada de 03-07-2024, cujo teor se dá por reproduzido.
Antes, em 06-11-2023, tinha sido enviado ofício a determinar a remoção da esplanada e todo o mobiliário até 31-12-2023 pelas razões e sob pena das consequências aí indicadas.
Deu entrada em 21-12-2023 na Junta de Freguesia de Arroios pedido do titular do estabelecimento, datado de 20-12-2023, para "Licenciamento Zero" da referida esplanada em lugar de estacionamento, remetido para parecer da C. M. de Lisboa em 27-12-2023.
Em síntese e sem prejuízo de as mesmas se terem por reproduzidas, nas pronúncias apresentadas em audiência prévia pelo visado e também por outros titulares de estabelecimentos com esplanadas destacadas em lugares de estacionamento, foi invocado, no essencial, o seguinte:
a) Não existe ruído nem queixas ou reclamações da vizinhança, havendo violação do princípio da igualdade.
b) As esplanadas representam um investimento significativo para a sua instalação e um volume considerável da faturação, criam postos de trabalho, são a razão de continuidade do negócio ou geram grande impacto e são espaços de convívio, dinamização da freguesia, combate ao isolamento, promoção do turismo e do bem-estar social e económico.
c) As esplanadas inserem-se arquitetonicamente no espaço urbano, não havendo ocupação ilícita de espaço de estacionamento.
d) O prazo de 5 dias para remoção voluntária é insuficiente, devendo ser prorrogado.
e) A deliberação de 7 de junho de 2024 não está assinada, não sendo válida ou estava ausente de notificação do ato obrigacional, contemplando somente a proposta de deliberação apresentada junto dos órgãos competentes e a respetiva deliberação.
f) A competência para autorização recai sobre a jurisdição da Câmara Municipal de Lisboa (Direção Municipal de Mobilidade) sendo a Junta de Freguesia parte ilegítima, mas, por outro lado, em 2023 foi apresentado junto dos serviços da Junta de Freguesia o pedido de licenciamento o qual não foi respondido em 90 dias deduzindo-se a aceitação tácita do pedido de licenciamento.
Ora,
Nos termos do artigo 34.º do CPA e do artigo 57.º do Regime jurídico das autarquias locais, aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12-09, da deliberação da Junta de Freguesia, de 07-06-2024, foi emitido extrato, rubricado pela presidente do órgão mas a deliberação foi tomada e a ata foi efetivamente assinada pelos membros presentes, juntando-se a esta proposta cópia da deliberação assinada, sendo válida a deliberação tomada e não tendo nenhum dos interessados solicitado, como poderia fazer, a notificação de qualquer elemento que entendesse estar em falta, nos termos do disposto no artigo 60.º do CPTA.
Por outro lado, o eventual ruído causado pelo funcionamento das esplanadas em lugares de estacionamento não é causa ou fundamento da decisão de remoção, mas apenas a ilegalidade da manutenção das esplanadas por caducidade da medida excecional e transitória que as legitimava.
Também não decorre de qualquer pedido de licenciamento de esplanadas em lugar de estacionamento, apresentado após a caducidade da autorização anterior e em violação das normas legais aplicáveis, que adiante se evidenciarão, qualquer dever de decisão e, muito menos, a formação de um ato tácito de deferimento.
Ademais, pelas razões já aduzidas na proposta de 07-06-2024 e que ora se renovam, deverá ser mantido o projeto de decisão:
Fruto do surgimento e da necessidade de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por COVID - 19, foram aprovadas pelo Município de Lisboa, desde o início da Pandemia, medidas extraordinárias, de caráter excecional e transitório, de apoio aos estabelecimentos comerciais, designadamente, a medida que se traduzia na suspensão temporária do pagamento devido pela ocupação do local de estacionamento objeto de licença para a instalação da esplanada ou exposição (propostas de deliberação 273/CM/2020 e 729/CM/2022).
Com o intuito de manter esta medida para o Ano de 2023, a Assembleia Municipal de Lisboa, após proposta da Câmara Municipal de Lisboa, aprovou a suspensão temporária do pagamento devido pela ocupação do local de estacionamento objeto de licença para a instalação de esplanada ou exposição desde 01.01.2023 até 31.12.2023, na sequência da Proposta n.º 820/2020.
A mencionada medida, de caráter excecional e transitória, proposta pela Câmara Municipal de Lisboa e aprovada pela Assembleia Municipal de Lisboa, tinha um tempo de aplicação limitado, tendo terminado no dia 31 de dezembro de 2023.
Os lugares de estacionamento no domínio público constituem uma importante solução de mobilidade urbana que urge repor com normalidade.
Em termos de adequação e proporcionalidade não é possível outra solução que não a de serem retiradas ou removidas tais esplanadas na via pública, em lugares de estacionamento.
Nos dias 01/11/2023 e 26/01/2024 foram enviadas missivas para os proprietários dos estabelecimentos na área territorial da Freguesia de Arroios, que tinham usufruído desta isenção, para removerem as respetivas esplanadas que ocupassem locais de estacionamento, sendo concedido um prazo para esse efeito.
A comunicação desta Junta de Freguesia não foi acatada, mantendo-se a ocupação com esplanada do espaço público afeto a estacionamento, ilicitamente.
Foram reportadas a esta Freguesia situações de comerciantes com esplanadas em espaço de estacionamento que terão solicitado licenciamento das mesmas à Câmara Municipal, sem resposta.
A ocupação de espaços públicos está sujeita a uma Mera Comunicação Prévia, nos termos do Decreto-Lei n.º 48/2011, de 01 de abril, na sua redação atual, cabendo às Juntas de Freguesia o licenciamento, cobrança das taxas, bem como de notificar os proprietários dos estabelecimentos que ocupam o espaço público com esplanadas ou outros equipamentos ilegalmente e sem autorização ou licenciamento. Além do mais, também é da competência da Junta verificar se a esplanada cumpre com as devidas exigências legais.
A ocupação dos locais de estacionamento não se enquadra, atualmente, como uma forma admissível de ocupação do espaço público nos termos da referida Lei, incumprindo, igualmente, o previsto no Anexo IV do Regime Legal do Licenciamento Zero.
Esta ocupação de via pública, prevista no artigo 48.º do Regulamento Geral de Estacionamento e Paragem na Via Pública, já não se encontra isenta de pagamento nos termos das propostas aprovadas em Assembleia Municipal de Lisboa, nem foi renovada por via de novos pedidos de licenciamento após a data de 31 de dezembro de 2023.
Esteve na origem de tais autorizações transitórias e excecionais, por um lado, a menor circulação de pessoas e, portanto, a redução da necessidade de estacionamentos na via pública capazes de assegurar a adequada mobilidade dos cidadãos e, por outro, a constatação da necessidade de assegurar um maior distanciamento e arejamento no acesso a estabelecimentos de restauração e bebidas, como medida de mitigação de contágios, situações que já não se justificam como é público e notório.
Nos termos das disposições dos artigos 1.º, n.º 2, alínea b), 10.º, n.º 1, alínea b) e 12.º, n.º 1, alínea b), todos do DL n.º 48/2011, de 1 de abril, que simplificou o regime de acesso e de exercício de diversas atividades económicas no âmbito da iniciativa «Licenciamento zero», a ocupação do espaço público em lugares de estacionamento existentes e/ ou delimitados na via pública não está abrangida pelo regime de mera comunicação prévia, vigorando outrossim quanto a tal ocupação, o regime geral de ocupação do domínio público das autarquias locais, como decorre do artigo 10.º, n.º 4 do referido diploma.
O regime geral de ocupação do domínio público, incluindo o das autarquias locais, é hoje regulado DL n.º 280/2007, de 7 de agosto, na sua redação em vigor, que aprovou o Regime Jurídico do Património Imobiliário Público.
Como resulta do disposto no artigo 27.º deste regime, sob a epígrafe de "Títulos de utilização privativa", "os particulares podem adquirir direitos de uso privativo do domínio público por licença ou concessão."
Já do normativo do artigo 21.º se extrai a cominação de que, relativamente a ocupações não tituladas, a administração tem, naturalmente, a obrigação de ordenar aos particulares que a cessem e reponham a situação anterior, devendo impor coercivamente a sua decisão, nos termos do Código do Procedimento Administrativo e demais legislação aplicável.
Importa, ainda, ter presente o Regulamento Geral de Mobiliário Urbano e Ocupação da Via Pública, publicado por Edital n.º 101/91, do qual decorre, no seu artigo 6.º, a obrigatoriedade de licenciamento para a colocação de mobiliário urbano no espaço público.
Pode, pois, concluir-se em qualquer margem para dúvida que:
1) A ocupação do espaço público de lugares de estacionamento para fim diverso, como a instalação de esplanadas, está sujeita a licença, a qual determina o pagamento de taxas e, ainda, encargos para compensação à EMEL.
2) A instalação e funcionamento de esplanadas destacadas em lugares de estacionamento autorizadas ao abrigo de normas excecionais e transitórias que se extinguiram por mero decurso do tempo (31-12-2023) não possuem qualquer suporte legal.
Por outro lado,
A Lei n.º 56/2012, de 8 de novembro, que procedeu à reorganização administrativa de Lisboa, estabelece no seu artigo 12.º, n.º 1, alínea g) que passam a ser competências das Juntas de Freguesia: “g) Atribuir licenças de utilização/ ocupação da via pública, licenças de afixação de publicidade de natureza comercial, quando a mensagem está relacionada com bens ou serviços comercializados no próprio estabelecimento ou ocupa o domínio público contíguo à fachada do mesmo, licenças de atividade de exploração de máquinas de diversão, licenças para recintos improvisados e licenças de atividades ruidosas de caráter temporário que se encontrem previstas nos regulamentos municipais e nos termos aí consagrados, e cobrar as respetivas taxas aprovadas em Assembleia Municipal."
Rege ainda a Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto, Lei-quadro da transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais, que no seu artigo 21.º atribui aos órgãos municipais a competência para a gestão de todas as estradas nos perímetros urbanos e dos equipamentos e infraestruturas neles integradas.
Mas que, logo em seguida, no seu artigo 38.º, n.º 2, alínea g), transfere dos municípios para as freguesias competências em matéria de "Utilização e ocupação da via pública".
Em execução deste diploma legal, o Decreto-Lei n.º 57/2019, de 30 de abril, concretizou a transferência de competências dos municípios para os órgãos das freguesias, determinando-se no seu artigo 2.º, n.º 1, alínea g), que é da competência das freguesias a matéria da "utilização e ocupação da via pública", sendo esta competência própria das Juntas de Freguesia - artigo 3.º.
É certo, por fim, que o artigo 48.º do Regulamento Geral de Estacionamento e Paragem na Via Pública (RGEPVP), já acima referido, publicado por aviso n.º 3856/2021 em DR, 2.ª Série, de 02-03-2021 estabelece que:
1 - A licença para a ocupação da via pública para a execução de quaisquer atividades temporárias, que impliquem a ocupação de lugares de estacionamento em ZEDL, Bolsas de Estacionamento, ZAAC e Bolsas de Carga e Descarga compete à Câmara Municipal, nos termos da regulamentação aplicável, sendo comunicada à EMEL.
2 - Às taxas aplicáveis à ocupação de via pública e devidas à Câmara Municipal acresce o pagamento à EMEL de uma compensação relativa aos lugares de estacionamento cuja ocupação for licenciada ou autorizada, calculada pela tarifa de estacionamento aplicável na Área Tarifada da situação dos lugares ocupados, pelo período de ocupação e horário de exploração.
Existe, assim, aparentemente, uma contradição entre todas as disposições legais acima evidenciadas e a norma transcrita do Regulamento Geral de Estacionamento que indica como competente para o licenciamento a câmara municipal.
Tal contradição é meramente aparente, pois que decorre expressamente do artigo 2.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 57/2019, de 30 de abril que "consideram-se feitas às freguesias as referências efetuadas aos municípios nos diplomas legais que regulam o exercício das competências transferidas no âmbito do presente decreto-lei", para além de que um regulamento administrativo, como o é o Regulamento Municipal de Estacionamento, em caso algum, derrogaria as disposições legais que sobre ele prevalecem (artigo 143.º, n.º 1 do CPA).
Assim, a Junta de Freguesia é competente para atribuir todas e quaisquer licenças de utilização ou ocupação da via pública, mesmo relativamente a tipos de ocupação que extravasam o regime de "licenciamento zero" e de mera comunicação prévia.
Pelo que, para além da competência de fiscalização e contraordenacional, tal como previsto no n.º 2 do Decreto-Lei n.º 48/2011, de 1 de abril, a Freguesia possui poderes de autotutela, ou seja, de impor coercivamente a sua decisão, nos termos do artigo 21.º do Regime Jurídico do Património Imobiliário Público devendo, para tanto, lançar mão dos procedimentos previstos no artigo 175.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo.
Há urgente necessidade pública nesta remoção das esplanadas em lugares de estacionamento, para permitir a já aludida mobilidade urbana e a liberdade de circulação, pelo que já tendo sido exercido o direito de audiência prévia na fase declarativa da remoção e no projeto de remoção coerciva e vindo a mesma a ser solicitada desde o final do ano de 2023 e, ademais, atenta a urgência da efetivação da remoção, não se procede a nova audiência prévia para a remoção coerciva.
Ante tudo o exposto e sendo, após 31-12-2023, ilegal a ocupação do espaço público com as esplanadas em lugares de estacionamento na Freguesia de Arroios, por caducidade da medida temporária, excecional e transitória que permitiu tal ocupação, de todos conhecida com tal natureza e tendo a Junta de Freguesia o dever e a competência para decidir a sua remoção e impor coercivamente a sua decisão, proponho a esta Junta de Freguesia que delibere o seguinte:
a) Por improcedência de todos e cada um dos argumentos aduzidos em sede de audiência prévia (também por outros titulares que não apenas o ora visado mas que lhe aproveitam) e nos termos da fundamentação de facto e de direito da presente proposta, delibere ordenar a remoção da esplanada e demais mobiliário urbano instalados em lugar de estacionamento na via pública junto ao estabelecimento comercial identificado acima, deixando tal espaço livre, devoluto e limpo em condições para que possa ser utilizado para o fim a que se destina.
b) Que o proprietário do estabelecimento comercial seja, pela última vez, tendo presente a decisão final e declarativa de remoção, proposta em a) supra, notificado para em 5 dias úteis remover, ainda voluntariamente e sem custos, a esplanada e demais mobiliário urbano instalados em lugar de estacionamento na via pública junto ao seu estabelecimento comercial, deixando tal espaço livre, devoluto e limpo para que possa ser utilizado para o fim a que se destina.
c) Que a Junta de Freguesia desde já decida executar coercivamente a decisão de remoção de esplanada em lugar de estacionamento acima indicado, caso não seja tal decisão executada voluntariamente no prazo razoável acima indicado e que há muito vem sendo consecutivamente concedido, a realizar diretamente ou por intermédio de terceiro logo que decorridos os 5 dias úteis acima referidos, sendo em qualquer um dos casos solicitada colaboração à Polícia de Segurança Pública ou, não sendo possível, à Polícia Municipal, para remoção de todos os objetos que integram a esplanada, colocados na via pública, em local de estacionamento, sem autorização e que impedem a utilização, passagem e circulação para os respetivos fins e em segurança, nos termos conjugados do artigo 21 .º do Decreto-Lei n.º 280/2007, de 7 de agosto, dos artigos 175.º e seguintes do CPA, do artigo 28.º da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto e do artigo 4.º, n.º 1, alínea c) da Lei da Polícia Municipal, aprovada pela Lei n.º 19/2004, de 20 de maio.
Decida igualmente advertir que todos os objetos a remover coercivamente e que ocupam o espaço público em violação das normas reguladoras da ocupação de espaço público, ficarão inutilizados ou destruídos e a sua remoção gerará despesas, incluindo indemnização, que são suportados pelo obrigado ou entidade responsável pela ocupação ilícita» - cf. fls. 37 a 47 do processo administrativo;

15. Tal proposta viria a ser aprovada, nessa mesma data, pela Junta de Freguesia de Arroios, «nos seus exatos termos e com todos os seus fundamentos» - cf. fls. 35 e 36 do processo administrativo;

16. Por ofício com data de 11-02-2025, foi comunicado à Requerente, pela Entidade Requerida, o seguinte:
«Fica V. Ex.ª notificado, na qualidade de titular do estabelecimento comercial acima indicado, que por proposta da Senhora Presidente da Junta de Freguesia de Arroios, de 07 de fevereiro de 2025, foi deliberado pela Junta de Freguesia de Arroios, na mesma data, aprovar integralmente tal proposta com os seus fundamentos e conceder a V. Ex.ª, novamente, um último prazo de 5 dias úteis para a remoção voluntária da esplanada e mobiliário urbano ilegalmente existentes em espaço público afeto a lugar de estacionamento, devendo o mesmo ser deixado limpo e desimpedido para o fim a que se destina.
Caso tal remoção não ocorra voluntariamente no prazo perentório e final agora concedido, fica igualmente notificado de que foi proferida a decisão final de remoção coerciva da referida esplanada e mobiliário urbano, correndo nesse caso todos os custos e encargos por V. Ex.ª.
Para melhor conhecimento do autor, data e fundamentos das decisões agora notificadas, junta-se em anexo cópia da referida proposta e das deliberações tomadas» - cf. fls. 50 e 51 do processo administrativo.

IV.2. Factos não provados
Inexistem factos com relevo para a decisão a proferir que se devam considerar como não provados.

IV.3. Motivação da decisão da matéria de facto
A expendida em cada uma das alíneas do probatório.».

Das nulidades da sentença
i) Da alegada contradição dos fundamentos e a decisão:

Dispõe a alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
A contradição entre os fundamentos e a decisão, referida na primeira parte da alínea c) reproduzida, é de natureza lógica «(…) como referia J. Lebre de Freitas, que entre “os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja juridicamente correta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial” [in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2.º, pág. 670] (v. acórdão do STA, de 28.4.2016, proc. 0978/15, in www.dgsi.pt).
A obscuridade resulta de a sentença conter algum passo cujo sentido seja ininteligível, por não se perceber o que o juiz quis dizer (v. o mesmo acórdão).
A ambiguidade ocorre quando alguma passagem da sentença se preste a interpretações diferentes e mesmo opostas, em que não se sabe ao certo qual o pensamento do juiz (idem).
De qualquer modo só ocorre nulidade da sentença recorrida se resultar prejudicada a compreensão da decisão nela contida.
No caso em apreciação é invocada a nulidade por contradição entre os fundamentos de facto da sentença recorrida, por ter sido dispensada a inquirição das testemunhas arroladas e a decisão recorrida julgar não provados factos que a produção daquele meio de prova visava demonstrar. Mais e se bem se entendeu o que vem alegado no recurso, a Recorrente pretenderia provar nos presentes autos, através da inquirição das testemunhas que indicou, que pediu a renovação do licenciamento da sua esplanada ao abrigo do procedimento do Licenciamento Zero por que foi o que a Recorrida lhe disse para fazer, a si e aos demais comerciantes com esplanadas na zona, criando-lhe a convicção, a expectativa de que ia ficar tudo bem, ia manter a esplanada licenciada, e que agora no presente processo vem defender o contrário, que aquele procedimento não é o adequado, com o que o tribunal concorda.
No que não tem qualquer razão.
Primeiro porque as razões da dispensa da produção de prova testemunhal, expendidas no despacho que antecedeu a sentença, têm a ver com a suficiência, face ao alegado, da prova documental produzida nos autos para a decisão a proferir e por esta se prender com matéria de direito.
Depois porque, na decisão sobre a matéria de facto (não impugnada) encontra-se expressamente especificado que «Inexistem factos com relevo para a decisão a proferir que se devam considerar como não provados».
A saber, o tribunal não dispensou a inquirição de testemunhas e a seguir, na sentença, considerou que a Requerente não logrou provar algum dos factos alegados no r.i. que poderiam ter sido demonstrados por via dos depoimentos daquelas.
Acresce que a Recorrente não indica ou concretiza em que parte da fundamentação de direito o juiz a quo escreveu que não é provável que qualquer dos vícios que imputou ao acto suspendendo venha a ser julgado procedente na acção principal por não se ter provado que pediu a renovação do licenciamento da sua esplanada ao abrigo do procedimento do Licenciamento Zero por que foi o que a Recorrida lhe disse para fazer, criando-lhe a convicção de que ia manter a esplanada licenciada.
Compulsada a sentença recorrida também não encontramos qualquer referência a esse alegado facto, quer na parte do relatório onde é sumariado o que foi alegado no r.i., quer na fundamentação de direito.
Da factualidade indiciariamente provada na sentença recorrida – que, repete-se, não foi objecto de impugnação no presente recurso - resulta que: em 2020 a Requerente foi autorizada pela Câmara Municipal de Lisboa [CML] a instalar, a título excepcional e temporário [até 31.12.2023], esplanada em lugar de estacionamento longitudinal; por ofício de 1.11.2023 a Requerida notificou a Requerente para proceder à remoção da esplanada até 31.12.2023, sob pena de remoção coerciva; em 21.11.2023 a Requerente remeteu à Requerida Formulário de Licenciamento Zero da esplanada, em referência nos autos; em 27.12.2023 a Requerida remeteu à CML o pedido que antecede e solicitou parecer sobre a pertinência de manter a referida ocupação durante o ano de 2024; em 7.6.2024 foi elaborada pela Presidente da Requerida a Proposta nº 256/2024, para remoção da esplanada em cinco dias úteis, sob pena de remoção coerciva, que viria a ser aprovada pela Requerida; a Requerente não removeu a esplanada, no prazo indicado, e apresentou exposição/pronúncia; em 1.7.2024 a Presidente da Requerida elaborou a Proposta nº 130/2025, novamente para remoção da esplanada em cinco dias ou remoção coerciva; Proposta que viria a ser aprovada por deliberação da Requerida que consubstancia o acto suspendendo.
Com base nestes factos e no direito aplicável, o juiz a quo apreciou cada um dos vícios que entendeu que a Requerente imputou ao acto suspendendo – de incompetência da Recorrida, do deferimento tácito do pedido de licenciamento zero, da violação de princípios gerais que indica e da falta fundamentação da notificação do acto suspendendo -, considerando que não lhe assiste razão ou, mais concretamente, que não é provável que a acção principal venha a ser julgada procedente com fundamento na verificação dos mesmos.
Concluindo pelo não preenchimento do requisito do fumus boni iuris forçoso era julgar, como sucede na sentença recorrida, pela improcedência do presente processo cautelar, por não poder ser decretada a providência requerida.
Donde, inexiste a arguida nulidade da sentença recorrida por contradição entre a fundamentação e o decidido.

ii) Da omissão de pronúncia
A Recorrente conclui que a sentença é nula nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d) do CPC por (se bem percebemos) enfermar de deficiência instrutória porque o tribunal deveria ter admitido a inquirição das testemunhas indicadas o que lhe teria permitido apurar que recorreu ao licenciamento zero por indicação expressa da Recorrida, não tendo motivos para desconfiar que assim não fosse.
A nulidade por omissão de pronúncia, prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, verifica-se quando o tribunal não se pronuncia, em absoluto, sobre questões - matérias respeitantes ao/s pedido/s, à/s causa/s de pedir e à/s excepção/ões invocadas - que devesse apreciar/conhecer, quer sejam de conhecimento oficioso quer sejam colocadas à apreciação/decisão do tribunal pelos sujeitos processuais, sem que a sua decisão se encontre prejudicada pela solução, eventualmente, dada a outras (cfr. alínea d) do nº 1 do artigo 615º e nº 2 do artigo 608º, do CPC, ex vi artigo 1º do CPTA).
Não ocorre nulidade por omissão de pronúncia quando o tribunal não se pronuncia sobre cada um dos motivos, argumentos, opiniões, razões, invocados pelas partes em defesa da respectiva pretensão (v. sumário do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 24.10.2018, no proc. nº 01096/11.5BELRA 0677/17 in www.dgsi.pt).
O despacho, também aqui recorrido, proferido a abrigo do artigo 118º do CPTA, dispensou a produção de prova testemunhal em momento da tramitação do presente processo cautelar anterior ao da prolação da sentença, tendo sido incorporado no sistema informático separadamente desta. Logo, o indeferimento dos meios de prova requeridos pelas partes não constitui questão que ao juiz cumpra conhecer na sentença.
As questões que lhe cumpriam conhecer na sentença recorrida eram as de saber se estavam preenchidos os pressupostos previstos nesse artigo 120º para que a providência requerida pudesse ser decretada. E foi nesse pressuposto que fixou a matéria de facto que considerou indiciariamente provada – que, voltamos a repetir, não foi impugnada nos presentes autos - e aplicou à mesma os critérios de decisão, previstos no artigo 120º do CPTA.
Dito de outro modo, apurar se a Requerente recorreu ao licenciamento zero por indicação expressa da Recorrida, não tendo motivos para desconfiar que assim não fosse, poderia consubstanciar uma razão, um argumento para suportar a pretensão cautelar deduzida pela Recorrente, mas não uma questão que, caso não fosse apreciada na sentença recorrida seria determinante da respectiva nulidade.
Em face do que também não procede o recurso nesta parte.

Dos erros de julgamento
Alega a Recorrente que: não entende porque o tribunal deu como não verificado o fumus boni iuris quando dispensou a produção de prova testemunhal; a delegação de competências, efectua-se mediante acordo entre a Câmara Municipal e as freguesias interessadas, nos termos previstos na Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, actualizada, acordo que não resultou da matéria de facto provada nos autos; se a competência está delegada na Recorrida, então não poderia a Autarquia, em nenhum momento, conceder a autorização; está em causa a confiança no cumprimento dos princípios basilares do Direito Administrativo, a delegação de competências do Município de Lisboa na Recorrida, de que não tem conhecimento nem está no processo instrutor; estamos perante incompetência absoluta que gera a nulidade das decisões da Recorrida; o tribunal recorrido decidiu mal na apreciação da matéria da competência, provocando a falsa crença em si de que estava legal e cumpria a legislação; a Recorrida é manifestamente incompetente na emissão destes actos, somente a Autarquia poderá iniciar o procedimento administrativo, não a Freguesia, existindo usurpação de competências; errou o tribunal a quo ao considerar que a ocupação do espaço público afecto à circulação automóvel não pode ser concedida por via do Licenciamento Zero, regime de que se socorreu, porque a todos os comerciantes com esplanadas com autorização da CML, em que se inclui, a Recorrida solicitou no final de 2023 que requeressem a renovação do licenciamento através do Licenciamento Zero, indicando outros processos cautelares em curso em que tal se alega e comprova; nos pontos 8. a 10. dos factos provados resulta a competência da CML na matéria e a provisoriedade do pagamento devido e não da esplanada; da referida factualidade não resulta qualquer comunicação da Recorrida informando-a de que o procedimento de Licenciamento zero não é o correcto; o pedido que formulou foi remetido pela Recorrida à CML, não resultando que o mesmo não era o correcto; ao abrigo do princípio do inquisitório o tribunal a quo não pode nem deve ignorar esta forma de actuação da Recorrida, criando junto dos administrados a expectativa de que tudo se resolveria, que as esplanadas ficariam licenciadas se recorressem ao licenciamento zero, para depois, em sede judicial, vir alegar que não é o procedimento correcto, consubstanciando venire contra factum proprium, princípio que visa garantir a confiança e segurança jurídica; ou seja, a Administração não pode negar uma situação que ela mesma criou ou reconheceu previamente; no facto 14. resulta que o ruído não é causa ou fundamento da decisão de remoção, no que não concorda porque a Assembleia Municipal de Lisboa, em ofício que pretendeu juntar às alegações refere que o ruídos é um dos factores ponderados para o efeito; a Recorrida, na sua oposição, admite que o pedido de licenciamento que apresentou consubstancia pedido de comunicação prévia com prazo e que ainda não obteve resposta ao pedido de parecer que formulou junto da CML, pelo que o mesmo foi tacitamente deferido, cfr. artigo 5º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de Abril e artigo 130º do CPA.
Vejamos.
Como já referimos o juiz a quo no despacho que antecedeu a sentença considerou que os autos já dispõem dos elementos necessários a decidir, ou seja, a prova documental produzida pelas partes é suficiente para suportar os concretos factos alegados nos respectivos articulados e as questões a resolver são de direito, sendo, por isso, desnecessária, a produção da prova testemunhal requerida.
O requisito do fumus boni iuris, visa que o juiz, mediante um juízo de prognose, perfunctório, de verosimilhança, de mera previsibilidade ou razoabilidade, averigúe, apure se é provável que a pretensão formulada ou a formular na acção principal venha a ser julgada procedente.
Donde, estando em causa a aparência do bom direito é normal que esse juízo não dependa do depoimento de testemunhas que visa provar factos.
Em razão do que, é alegação da Recorrente de que não entende porque o tribunal deu como não verificado o fumus boni iuris quando dispensou a produção de prova testemunhal, que não se percebe ou tem razão de ser.
Sobre o vício de incompetência, consta da sentença recorrida o seguinte:
«12. Neste campo, a Requerente começa por alegar que: a Entidade Requerida sempre a informou que «a decisão» pertencia à Câmara Municipal de Lisboa, o «que faz sentido, uma vez que a licença emitida na época foi emanada pelo Município de Lisboa»; não pode concordar com «esta notificação», uma vez que as juntas de freguesia ao seu redor enviaram a decisão de remoção para os serviços do Município de Lisboa.
13. Vemos aqui invocado um alegado vício de incompetência.
14. Não assiste razão, porém, à Requerente, como decorre, conjugadamente, do disposto nos seguintes preceitos: artigo 12º, nº 1, alínea g), da Lei nº 56/2012, de 8 de novembro [Reorganização administrativa de Lisboa]; artigos 21º, nº 1, e 38º, nº 2 da Lei nº 50/2018, de 16 de agosto [Lei-quadro da transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais]; artigos 2º, nº 1, alínea g), e nº 5, e 3º do Decreto-Lei nº 57/2019, de 30 de abril [Concretiza a transferência de competências dos municípios para os órgãos das freguesias]; artigo 48º, nº 1, do Regulamento Geral de Estacionamento e Paragem na Via Pública; artigo 6º do Regulamento Geral de Mobiliário Urbano e Ocupação da Via Pública; artigos 21º e 27º do Decreto-Lei nº 280/2007, de 7 de agosto [Estabelece o regime jurídico do património imobiliário público]; artigo 10º, nº 4, do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril [Simplifica o regime de acesso e de exercício de diversas atividades económicas no âmbito da iniciativa «Licenciamento zero», no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 49/2010, de 12 de novembro, e pelo artigo 147.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro].
A saber, o juiz a quo considera que não se verifica o “implícito” alegado vício de incompetência pelas mesmas razões de direito invocadas e explicadas na fundamentação do acto suspendendo, reproduzidas no facto 14. e que aqui se reiteram por entendermos que não padecem de erro notório ou grosseiro na interpretação e aplicação das normas aí indicadas ao caso em apreciação.
E porque o alegado no recurso não permite infirmá-las.
Com efeito, a Recorrente discorda do decidido pelo tribunal recorrido, de forma genérica e abstracta, invocando diplomas legais e conceitos que não alegou no r.i. - apresentado depois de, em 1.11.2023, 26.1.2024 e 21.6.2024 já ter sido notificada pela aqui Recorrida para remover a sua esplanada do lugar de estacionamento em que se encontra [v. teor dos factos 7., 10. e 12.], tendo inclusive apresentado pronúncia sobre esta última notificação [v. facto 13] – onde, no que respeita à incompetência da Recorrida para a prática do acto suspendendo, apenas alega o que está referido na sentença, ou seja, que esta sempre lhe respondeu/informou que o licenciamento e autorização devida para instalação da esplanada competia à Autarquia de Lisboa. A saber, nada consta desse articulado sobre a necessidade de um qualquer e concreto acordo que teria de haver entre o Município de Lisboa e a Recorrida para poder haver transferências de competências do primeiro para a segunda, nem que tal acordo deveria estar no processo administrativo instrutor ou ser de conhecimento público, ou sobre a incompetência absoluta ou relativa ou em qual delas enquadraria o presente caso, ou que o acto suspendendo foi praticado com usurpação de competências.
Trata-se de novos argumentos, razões de invalidade do acto suspendendo não invocadas perante o tribunal a quo e, consequentemente, não apreciadas na sentença recorrida que é o objecto do presente recurso, pelo que não devem ser conhecidas por este tribunal ad quem.

Sobre o procedimento de licenciamento zero e o deferimento tácito do pedido que a Recorrente formulou, ao abrigo do mesmo, em 2023, extrai-se da sentença recorrida que:
«14. Alega, no entanto, e num segundo momento, a Requerente que: a sua esplanada foi devidamente licenciada pelo Município de Lisboa, pretendendo que a mesma seja mantida mediante o pagamento das taxas a que houver lugar; a Entidade Requerida parece confundir a provisoriedade das esplanadas com a provisoriedade de isenção do pagamento de taxas; a possibilidade legal de existência de esplanadas em lugares de estacionamento sempre existiu, mediante licenciamento e o pagamento das respetivas taxas; não são as esplanadas que são provisórias e que estão ilicitamente instaladas, uma vez ultrapassada a pandemia; é a isenção do pagamento de taxas associadas ao seu licenciamento que é provisória; a ocupação do espaço público em lugares de estacionamento existentes e/ou delimitados na via pública não está abrangida pelo regime de mera comunicação prévia, vigorando, quanto a tal ocupação, o regime geral de ocupação do domínio público das autarquias locais, como decorre do artigo 10º, nº 4, do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril; a colocação de mobiliário urbano no espaço público está, assim, sujeita à obrigatoriedade de licenciamento; renovou o seu pedido de licenciamento em 20-12-2023, ainda antes do alegado terminus da medida provisória de isenção do pagamento de taxas associadas ao licenciamento, sem que até ao momento tenha sido proferida qualquer decisão em relação a esse pedido; decorrido mais de um ano sobre a sua apresentação, o mesmo encontra-se tacitamente deferido, «nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 128º e 130º do Código do Procedimento Administrativo», o que significa que a sua esplanada se encontra licitamente instalada.
15. Não lhe assiste, porém, e novamente, razão, porquanto: a ocupação do espaço público afeto à circulação automóvel e para estacionamento não pode ser concedida por via do denominado «Licenciamento Zero» [cf., designadamente, o disposto nos artigos 10º, nº 1, alínea b), e nº 4, e 12º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril; artigo 6º, nº 1, alínea a), do Anexo IV ao decreto-lei em apreço; artigo 27º do Decreto-Lei nº 280/2007, de 7 de agosto; artigo 6º do Regulamento Geral de Mobiliário Urbano e Ocupação da Via Pública], sendo que foi deste regime que a Requerente [erradamente] se socorreu [cf. ponto 8) da factualidade provada]; a decisão de permissão de ocupação [em causa nos presentes autos cautelares] não foi renovada para lá de 31-12-2023, tendo a mesma ficado condicionada à data de vigência das Propostas de Deliberação 273/CM/2020, 729/CM/2020 e 356/CM/2021 [aprovadas pela Assembleia Municipal de Lisboa por via (respetivamente) das Deliberações 151/AML/2020, 357/AML/2020 e 241/AML/2021] - a ocupação em causa foi aprovada «título precário no contexto da Proposta 273/CM/2020, de 21 de maio»] [cf. pontos 1) a 3) da factualidade provada]; apenas «[e]xiste deferimento tácito quando a lei ou regulamento determine que a ausência de notificação da decisão final sobre pretensão dirigida a órgão competente dentro do prazo legal tem o valor de deferimento» [cf. o disposto no artigo 130º, nº 1, do CPA], o que não se verifica no caso dos autos.».
Discorda a Recorrente reiterando a argumentação expendida no r.i. e acrescentando que o tribunal recorrido não pode ignorar a actuação da Recorrida, que criou a convicção junto de si, dos administrados de que tudo se resolveria, as esplanadas ficariam licenciadas se recorressem ao licenciamento zero para depois, no processo judicial, vir dizer que não era o correcto, negando uma situação que ela mesmo criou, em venire contra factum proprium.
Nada vindo alegado no respectivo articulado a este propósito, trata-se, mais uma vez, de argumentação nova que não cumpre a este tribunal apreciar no âmbito do presente recurso.
Quanto ao mais que consta do r.i. e no recurso, a alegação de que o procedimento de licenciamento zero é o correcto porque foi o indicado pela Recorrida a todos os comerciantes com esplanadas autorizadas pela CML no final de 2023, não pode proceder por carecer de base legal e não resultar da factualidade indiciariamente provada na sentença recorrida (não impugnada no recurso, repete-se) que assim sucedeu.
Acresce que a Recorrida, independentemente do entendimento expendido na fundamentação do acto suspendendo e na oposição apresentada nos autos, sobre a inadequação deste regime de licenciamento zero no caso em apreciação, recebeu o correspondente formulário, apresentado pela Recorrente em 21.12.2023, remeteu-o em 27.12.2023 à CML para parecer e, de acordo com o admitido no artigo 59º do r.i., informou verbalmente a Recorrente em conformidade, pelo que verifica-se que, tal como consta da sentença recorrida, a decisão de permissão de ocupação em causa nos presentes autos cautelares não foi renovada para lá de 31.12.2023, termo do prazo de autorização concedida excepcionalmente e a título temporário pela CML em 2020.
A alegação de que assim não é porque o pedido de 21.12.2023 foi tacitamente deferido, ao abrigo do artigo 5º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de Abril, não pode proceder porquanto tal norma foi revogada pela alínea m) do artigo 13º do Decreto-Lei nº 10/2015, de 16 de Janeiro, que entrou em vigor em 1 de Março do mesmo ano.
Assim, tal como entendeu o juiz a quo, na falta de previsão legal que atribua o efeito de deferimento tácito à não pronúncia da Administração num determinado prazo, contado da apresentação do correspondente requerimento que lhe imponha o dever legal de decidir, tal como dispõe o artigo 130º do CPA, não pode a Recorrente considerar aquele seu pedido de licenciamento como deferido tacitamente.
Por fim, quanto ao que a Recorrente alega sobre o ruído, pelas razões já indicadas na apreciação da admissibilidade dos documentos que requereu juntar com as alegações de recurso, não pode a mesma ser atendida por carecer de qualquer interesse ou utilidade.
Com efeito, na fundamentação do acto suspendendo o ruído provocado na utilização da esplanada não é considerado como causa ou fundamento da decisão de remoção, pelo que irreleva que a Recorrente venha alegar que não concorda com esse entendimento por num ofício, de data posterior à sentença recorrida, a AML vir dizer que as Juntas (e não apenas a Recorrida) o têm considerado como um dos factores atendidos para o efeito.
A AML não é parte nos autos e o que a Recorrente vem dizer no recurso é que, ao contrário do que alega a Recorrida o ruído é factor preponderante na remoção da esplanada, sem daí retirar qualquer efeito ou vantagem para a pretensão cautelar que deduz nos presentes autos ou obter a pretendida revogação da sentença recorrida que, por prejudicado não apreciou o critério da ponderação de interesses a propósito do qual a questão do ruído foi alegada.

Em face do que a sentença recorrida não enferma dos erros de julgamento que a Recorrente lhe imputa.

Os critérios de decisão das providências cautelares, previstos no artigo 120º do CPTA são de verificação cumulativa, significando que a não verificação de um deles impossibilita desde logo o decretamento da providência requerida.
Assim, faltando no caso em apreciação o do fumus boni iuris, fica prejudicada a apreciação do periculum in mora e da ponderação dos interesses em presença por este tribunal ad quem.

A Recorrente, por ter decaído no recurso, é a responsável pelas custas [cfr. artigo 527º, nº 1 do CPC].


Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul, em:

- não admitir a junção dos dois documentos às alegações de recurso, devendo os mesmos ser desentranhados e devolvidos à apresentante;

- negar provimento ao recurso, e, em consequência, manter a sentença recorrida na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 20 de Novembro de 2025.


(Lina Costa – relatora)

(Ana Cristina Lameira)

(Ricardo Ferreira Leite)