Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 10/08.0BELRS |
![]() | ![]() |
Secção: | CT |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 06/26/2025 |
![]() | ![]() |
Relator: | TIAGO BRANDÃO DE PINHO |
![]() | ![]() |
Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL PRESCRIÇÃO TAXA |
![]() | ![]() |
Sumário: | 1 – Se os autos contiverem os elementos necessários, a prescrição da dívida tributária deve ser conhecida no Recurso interposto de sentença proferida em processo de Impugnação Judicial, tendo em vista a eventual extinção da instância por inutilidade superveniente da lide. 2 – O tributo cobrado como contrapartida da ligação de um prédio à rede de drenagem de águas residuais de um município tem natureza de taxa de obrigação única. 3 – Por regra, a dedução de Impugnação Judicial é um facto interruptivo do prazo de prescrição de uma taxa. 4 – Todavia, se o processo de Impugnação Judicial estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao Impugnante, o efeito interruptivo degenera em mero efeito suspensivo da prescrição. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Votação: | Unanimidade |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam na Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul: Na Impugnação Judicial n.º 10/08.0BELRS, apresentada por P... , SA, contra Município de Sintra no Tribunal Tributário de Lisboa, foi proferida sentença em 25 de fevereiro de 2021, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que, julgando-a improcedente, manteve a decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico Impróprio que aquela interpusera contra a Reclamação Graciosa que, por sua vez, deduzira contra as liquidações de tarifas de ligação de esgotos, tituladas pelas faturas n.os 1002.419.422 e 1002.148.117, emitidas pelos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Sintra. A sentença ora posta em xeque delimitou, como questão a decidir, a de “saber se as liquidações enviadas em 2001 à Impugnante são ou não devidas ou se a cobrança das tarifas em causa deveria ter sido sustada e só ocorrer após o resultado da 2.ª avaliação dos prédios melhor identificados nos autos, até porque, da 2.ª avaliação a determinadas frações dos lotes 5 e 6 resultou um valor inferior a pagar”, tendo na sua fundamentação, e no que ora interessa, considerado que, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do Código da Contribuição Autárquica, “as liquidações serão oficiosamente revistas em resultado da nova avaliação”, sendo que, por força do artigo 37.º do Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Sintra, “a suspensão da liquidação por apresentação de pedido de 2.ª avaliação não seria automática”. Inconformado, o Sujeito Passivo recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo que se julgou incompetente em razão da hierarquia e fixou a competência para conhecer do Recurso neste Tribunal Central Administrativo Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: (A) O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pela Meritíssima Juíza do tribunal a quo, que determina a absolvição do pedido da ora Recorrida por considerar que os procedimentos de segundas avaliações não são causa de suspensão das Liquidações Contestadas, motivo pelo qual são estas devidas. (B) A este respeito, o Tribunal a quo considerou que “a suspensão da liquidação por apresentação de pedido de 2ª avaliação não seria automática, mas tão só, poderia haver uma suspensão desde que autorizada pelo Conselho de Administração do SMAS Sintra, que tal como decorre do probatório, foi indeferida”. (C) Entendendo que as liquidações são oficiosamente revistas em resultado de uma nova avaliação, o que “significa que o acto de liquidação da tarifa podia ser sempre praticado e o seu pagamento seria sempre devido, embora pudesse ser revisto aquando a atribuição de novo VPT em resultado de 2ª avaliação”. (D) A Recorrente não acompanha a decisão proferida, motivo pelo qual dela recorre. (E) A título prévio, tal como resulta da factualidade dada como provada na Sentença Recorrida, refira-se que as Liquidações Contestadas foram emitidas em 22 de dezembro de 2001, e notificadas à ora Recorrente por três vezes (em 2001, em 2004 e em 2007) – cf. alíneas B), I) e S) da factualidade assente. (F) E a Recorrente insurgiu-se contra os atos de todas as vezes, sendo que da notificação ocorrida em 2004 foi apresentada reclamação graciosa (indeferida), seguida de recurso hierárquico, que foi arquivado e em que afirmou a CMS que as liquidações haviam sido corrigidas. (G) A Recorrente aguardou pois a notificação da nova liquidação desta tarifa corrigida, como de resto já havia acontecido em outras situações semelhantes (em que em face dos VPTs fixados em segunda avaliação os SMAS corrigiram e notificaram a Recorrente de novas liquidações corrigidas tomando por base o VPT definitivo). (H) Em 2006 a Recorrente solicitou certidão, à Autoridade Tributária, dos VPTs a essa data de todas as frações que compõem os Lotes 5 e 6, que naturalmente remeteu aos SMAS, e dos quais resulta uma diferença de mais de € 6 milhões de euros face aos VPTs considerados pelos SMAS nas liquidações emitidas em 2001. (I) Diferentemente, e para estupefação da Recorrente, foi esta notificada, em 2007, de liquidações contendo o mesmo exato conteúdo das anteriormente emitidas em 2001, das quais reclamou e recorreu hierarquicamente e que estão na origem dos presentes autos. (J) Porque é seu direito e interesse para a justa composição do presente litígio, invoca-se a prescrição dos tributos aqui em causa. 104. Nos termos do art.º 15.º do RGTAL, o prazo geral de prescrição de tais dívidas é de 8 anos, que contados desde o facto tributário (ocorrido em 31 de dezembro de 2000), e admitindo a sua interrupção em 15 de janeiro de 2002 pela interposição de reclamação graciosa, ocorreu em 15 de janeiro de 2010. 105. Mais, ainda que a presente impugnação (deduzida em 2 de janeiro de 2008) fosse relevada como facto interruptivo da prescrição (no que não se concede), a conclusão sobre a prescrição seria exatamente a mesma. 106. Se uma nova interrupção (que não se admite) houvesse ocorrido em 2 de janeiro de 2008, as dívidas em causa teriam prescrito em 2 de janeiro de 2016 (há mais de cinco anos). (K) Não obstante a prescrição não constituir um vício do ato de liquidação, o conhecimento da prescrição tem por efeito a declaração de extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos e para os efeitos do artigo 277.º, alínea e) do CPC ex vi artigo 2.º do CPPT, como resulta da vasta, reiterada e unânime jurisprudência sobre a questão. (L) Termos em que se requer que declare este douto Tribunal a prescrição das dívidas resultantes das Liquidações Contestadas e, consequentemente, determine a inutilidade superveniente da lide por inexigibilidade da dívida o que conduzirá à extinção imediata da instância. (M) Mesmo que as dívidas em apreço nos autos não estivessem prescritas, tornando-se assim inexigíveis e, portanto, não declarasse o presente Tribunal a inutilidade superveniente da lide, extinguindo a instância - no que não se concede e por mero dever de patrocínio se admite - sempre seria a Sentença Recorrida nula por omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT e da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT. (N) De facto, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras. (O) E dúvidas não restam de que o tribunal está obrigado a conhecer de todas as questões que lhe sejam apresentadas, onde obviamente se incluem todos os pedidos que lhe sejam formulados. (P) De uma rápida comparação entre a causa de pedir e o pedido formulados na PI apresentada pela Recorrente – que invoca e pede a declaração de nulidade das Liquidações Contestadas tal como lhe foram notificadas em 2007 por assentarem nos VPTs resultantes da primeira avaliação quando a essa data estavam já determinados os VPTs resultantes da segundo avaliação, substituindo na ordem jurídica os anteriores e ferindo de nulidade os atos contestados, como resulta da doutrina e jurisprudência superiores citadas na PI deduzida - e a decisão proferida pelo Tribunal a quo – que decide pela manutenção de tais atos com fundamento na desnecessidade da sua suspensão - resulta que que o Tribunal recorrido não conheceu se pronunciou quanto ao pedido principal deduzido, verificando-se não existir uma identidade entre a questão colocada pela ora Recorrente e a questão resolvida pelo referido Tribunal. (Q) A Sentença Recorrida simplesmente não se pronuncia sobre a nulidade invocada, o que deixa de manifesto a omissão de pronuncia aqui invocada e cujo conhecimento se requer, anulando-se com esse fundamento a decisão proferida pelo Tribunal a quo. (R) Adicionalmente, está ainda a Sentença Recorrida ferida de nulidade, por oposição entre os seus fundamentos e a solução jurídica que prescreve, nos termos e para os efeitos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT e da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT. (S) Ora, tal nulidade ocorre sempre que o tribunal apresente uma fundamentação que aponta num sentido de raciocínio, e a decisão que dela emana vai em outro, contrário ou simplesmente diferente, mas em que a fundamentação não lhe dá causa. (T) De facto, de uma rápida análise da conclusão retirada pelo Tribunal a quo na Sentença Recorrida e a fundamentação que a justifica, verifica-se a existência de uma contradição entre uma e outra, na medida em que o Tribunal a quo dá como provada a atualização dos VPTS dos Lotes 5 e 6, admitindo adicionalmente que as Liquidações Contestadas devem ser revistas aquando a atribuição de novo VPT em resultado de 2ª avaliação, mas não conclui (como conclusão lógica que se retira de tais premissas) pela ilegalidade das Liquidações Contestadas, que assentam num VPT inexistente em 2007 (e já substituído por outro em resultado das segundas avaliações). (U) Pelo contrário, determina que a realização de segundas avaliações aos Lotes 5 e 6 não é fundamento de suspensão das Liquidações Contestadas, pelo que é improcedente o pedido apresentado pela Recorrente. (V) De resto, a Sentença Recorrida entra em clara contradição quando considera provado que os VPTs vigentes em 2007 conduziriam à fixação de tarifas num valor muito inferior (que quantifica na al. R) do probatório e dá por assente), mas julga depois que as Liquidações Contestadas (que tomam por base VPTs inexistentes em 2007) devem manter-se na ordem jurídica. (W) Entende por isso a Recorrente, com o devido respeito pelo Tribunal a quo, que existe uma manifesta contradição entre os fundamentos e a decisão recorrida, pelo que se requer a declaração de nulidade da Sentença Recorrida por contradição entre a decisão e a fundamentação que lhe deu causa, nos termos do disposto no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, e na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT. (X) Caso assim não se entenda – no que não se concede e por mero dever de patrocínio se admite – sempre o presente recurso deveria, em qualquer caso, ser julgado procedente, revogando-se a Sentença Recorrida e substituindo-se esta por outra, que conheça dos vícios invocados e determine a remoção da ordem jurídica das Liquidações Contestadas. (Y) Neste sentido, sempre que seja requerida uma segunda avaliação, e porque só o resultado dessa cristaliza na ordem jurídica o valor patrimonial do imóvel, qualquer liquidação proferida com base no valor resultante da primeira avaliação é nulo, não produzindo quaisquer efeitos. (Z) Termos em que se requer que as Liquidações Contestadas sejam revogadas, emitindo-se novas liquidações que tenham por base os valores patrimoniais definitivos acima indicados - € 5.728.302,79 e € 9.020.999,51, com referência aos Lotes 5 e 6, respetivamente. (AA) Repare-se que o Tribunal a quo foi chamado a apreciar a questão de saber se as Liquidações Contestadas, emitidas inicialmente em 2001, relativamente às quais se informou a Recorrente, em 2005, que haviam sido corrigidas (assume-se que em face dos novos valores patrimoniais) e sem que se saiba por que razões foram “repristinadas” e novamente notificadas à Recorrente em 2007, deveriam ou não manter-se na ordem jurídica face à sua nulidade, decorrente do facto de estas terem sido mantidas e notificadas em 2007, quando a essa data eram sobejamente conhecidos os valores patrimoniais (em muito inferiores) resultantes das segundas avaliações das várias frações que compõem os Lotes 5 e 6. (BB) O que veio alegado pela Recorrente (no que é acompanhada por doutrina e jurisprudência relevante e citada na PI) é que não podiam os SMAS e a CMS notificá-la para pagar – em 2007 – uma tarifa fixada com base em valores patrimoniais inexistentes na ordem jurídica a essa data, por já terem sido substituídos pelos valores resultantes da segunda avaliação dos imóveis. (CC) Não se trata pois de saber se em 2001 as Liquidações Contestadas padeciam de algum vício (até porque em 2001 tais liquidações já haviam sido objeto de reclamação, como se provou nestes autos), mas de saber se em 2007, quando os SMAS decidiram manter e notificar novamente tais liquidações, estas padeciam de nulidade. (DD) É indiscutível que os VPTs dos imóveis só se firmam na ordem jurídica com o resultado das segundas avaliações requeridas, e apenas esse - o resultante das segundas avaliações - é o VPT a ter em conta para efeitos de contribuição autárquica (no que a jurisprudência é unânime). (EE) Ora, resultando provado que os VPT de todas as frações dos Lotes 5 e 6 que oram relevam foram efetivamente corrigidos em resultado das segundas avaliações (cf. ponto N da factualidade assente da Sentença Recorrida), tendo-se fixado valores manifestamente inferiores - a saber, o valor patrimonial total do Lote 5 foi alterado de € 7.630.145,03 para € 5.728.302,79; enquanto que o do Lote 6 foi reduzido de € 13.497.063,48 para € 9.020.999,51, dúvidas não restam de as Liquidações Contestadas são ilegais. (FF) Parece pois evidente que em 2007, e estando já fixados os VPTs constantes das certidões juntas e referidas nas alíneas O) e P) do probatório, eras manifestamente ilegais, a essa data, as Liquidações Contestadas, sendo irrelevante aferir se estas deveriam ou não ter sido suspensas em momento anterior. (GG) Foi em 2007, e por opção dos SMAS, que a Recorrente foi notificada de tais liquidações – que, repita-se, entendia que teriam já sido anuladas e estariam a ser corrigidas – e é por isso por referência a essa data que a sua conformidade com a lei deve ser aferida. * E contra-alegando concluiu, por sua vez, a Administração: I. A Recorrente dirige o requerimento de recurso ao Supremo Tribunal Administrativo, sem qualquer enquadramento. II. Uma vez que a recorrente vem por em causa a matéria de facto dada como provada na sentença, não se trata de um recurso com fundamento exclusivamente de direito, pelo que, o Supremo Tribunal Administrativo é incompetente, em razão da hierarquia, para o respetivo conhecimento, devendo ser remetido ao TCA Sul (artigo 280.º, n.º 1 do CPTT). III. Acresce que, a douta sentença sob recurso não padece de nenhum dos vícios que lhe são apontados pela Recorrente. IV. A Recorrente faz uma leitura distorcida dos factos provados para alcançar os seus intentos. V. Mantendo os factos provados tal como reportados na sentença, a verdade é que foi liquidada a tarifa de ligação de esgotos, notificada à recorrente em 2002. VI. Após sucessivas reclamações e recursos a ora Recorrente não pagou, pelo que veio a ser notificada novamente para pagar o valor em dívida em 2007. VII. Novamente a Recorrente interpôs recurso da notificação para pagar, que foi indeferido e é essa decisão de indeferimento que impugna no presente processo. VIII. Alega a Recorrente qua as liquidações são nulas por ter havido uma 2.ª avaliação dos prédios objeto da tarifa. IX. No entanto, a 2.ª avaliação é incompleta, como se alcança da atribuição de valor 0 e 0,001€ a várias frações dos imóveis avaliados, correspondendo a apartamentos e arrecadação dos prédios situados em Belas, Sintra. X. Pelo que as liquidações originais foram sempre mantidas, apesar das sucessivas reclamações e recursos da ora Recorrente. XI. A douta sentença sob recurso verificou a legalidade das tarifas liquidadas ao abrigo da legislação então em vigor, designadamente o Código da Contribuição Autárquica aprovado pelo Decreto-lei n.º 442-C/88, de 30 de Novembro e o Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos Serviços Municipalizados de Sintra. XII. Concluindo que o ato de liquidação da tarifa podia ser sempre praticado e o seu pagamento seria sempre devido, embora pudesse ser revisto aquando a atribuição de novo valor patrimonial, em resultado de 2ª avaliação. XIII. O mesmo é dizer que não há fundamento para revogação das decisões que incidiram sobre as reclamações e os recursos da ora recorrente, as liquidações não padecem da invalidade que lhes é assacada pela ora Recorrente e, como tal, não há motivo para declarar a sua nulidade nem para determinar a emissão de novas liquidações. XIV. O Regulamento de Drenagem atribui aos SMAS competência para fixar uma tarifa de ligação (art.º 24.º) determinada com base no valor patrimonial dos prédios, para efeitos de contribuição autárquica – atual IMI (art.º 25.º, n.º 2). XV. A tarifa em causa foi devidamente fixada ao abrigo destas disposições do regulamento. XVI. À data em que foi liquidada a tarifa de ligação de esgotos aos imóveis em causa, os serviços de finanças atribuíam-lhes um valor patrimonial sobre o qual foi determinada a referida tarifa. XVII. A ora Recorrente alega que o ato de liquidação baseado numa primeira avaliação que, entretanto, foi corrigida em resultado de 2.ª avaliação, é inválido por ter sido alterada a premissa em que aquela assentou. Consequentemente considera o ato nulo. XVIII. No caso, várias das frações que compõem os lotes em causa não têm avaliação, contribuindo o seu valor patrimonial em 0 € ou 0,01€ para a formação do valor patrimonial de cada um dos lotes., pelo que não pode considerar-se esta a avaliação definitiva. XIX. Ora, dispondo os SMAS de uma avaliação do valor patrimonial dos imóveis em causa que corresponde aos critérios fixados no regulamento de drenagem em vigor à data do facto que originou a liquidação, tendo procedido regularmente à liquidação da tarifa devida, mal se compreenderia que fosse substituída essa liquidação por outra assente em valores meramente indiciários, sujeita a infinitas correções até se atingir um valor patrimonial inicial definitivo. XX. À data da liquidação, havia um valor patrimonial regularmente fixado pelas Finanças que serviu de base à liquidação da tarifa de ligação de esgotos. XXI. Os SMAS não sabiam, nem tinham obrigação de saber que a ora A. iria requerer segunda avaliação do imóvel. XXII. Pelo que liquidaram e bem a tarifa de esgotos devida pela Recorrente, como bem conclui a douta sentença sob análise. XXIII. Só após conclusão sobre a legalidade das liquidações, o Mm.º tribunal a quo avança para a possibilidade de suspensão das liquidações até atribuição de um valor patrimonial definitivo aos imóveis, mas logo conclui que tal também não era obrigatório, dependendo de decisão do Conselho de Administração dos SMAS que legitimamente decidiu em sentido contrário. XXIV. A possibilidade de suspensão apenas foi apreciada porque levantada pela ora Recorrente, e só depois de verificada a conformidade das liquidações com a legislação em vigor, o que obsta imediatamente à pretendida declaração de nulidade e revogação das mesmas liquidações. XXV. Conforme disposto no n.º 5 do art.º 37.º do Regulamento de Drenagem, a reclamação não tem efeito suspensivo sobre o motivo ou facto que a originou, salvo decisão em contrário a proferir pelo órgão competente dos SMAS de Sintra. XXVI. Ora, conclui a douta sentença que a decisão proferida pelo Conselho de Administração dos SMAS não atribuiu efeito suspensivo à reclamação, pelo que o valor da liquidação deveria ter sido pago. XXVII. E fez esta apreciação porque a própria Recorrente, na sua petição inicial, invocou que os SMAS deveriam suspender a liquidação quando foi requerida uma segunda avaliação dos prédios e que deveriam ter procedido a revisão oficiosa das liquidações ora em crise. XXVIII. Donde, a douta sentença recorrida pronunciou-se sobre todas as questões suscitadas pela ora Recorrente, questionando a possibilidade de suspensão das liquidações, em benefício da Recorrente, apesar de válidas e legais, pese embora tenha concluído em sentido diverso. XXIX. Não é como tal correta a interpretação da Recorrente de que a questão colocada na impugnação judicial foi analisada pela sentença na perspetiva da possibilidade de suspensão das liquidações. XXX. Mais alega a Recorrente, prescrição das liquidações impugnadas, o que conduziria a inutilidade superveniente da lide. XXXI. Como resulta liquido da decisão do Supremo Tribunal Administrativo proferida no presente processo, que ali obteve o n.º 206/13-30, na sequência do recurso interposto pela ora Recorrida, a não ser a decisão do recurso administrativo o ato impugnado, a presente ação de impugnação seria intempestiva. XXXII. Assim, a data da notificação da liquidação para efeitos de contagem do prazo de prescrição tem de ser a notificação de 13.03.2007, da qual a ora Recorrente interpôs o recurso administrativo que originou o ato impugnado e não, como pretende a Recorrente, a data da liquidação de 2002. XXXIII. Nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL) aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro, “As dívidas por taxas às autarquias locais prescrevem no prazo de oito anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu.” XXXIV. O n.º 2 do mesmo artigo estabelece que “A citação, a reclamação e a impugnação interrompem a prescrição.” XXXV. Assim, o prazo de prescrição foi interrompido desde a entrada do recurso hierárquico (18.07.2007 – factos provados V) até à notificação da decisão em 30.10.2007. XXXVI. E a presente ação de impugnação deu entrada em 03.01.2008, pelo que se manteve o efeito interruptivo resultante do disposto no n.º 2 do artigo 15.º do RGTAL. XXXVII. O n.º 3 do artigo 15.º do RGTAL dispõe que “A paragem dos processos de reclamação, impugnação e execução fiscal por prazo superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, neste caso, o tempo que decorreu após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação.” XXXVIII. Ora, o processo de impugnação não esteve parado, manteve o seu curso e em 30/05/2012 foi proferida sentença pelo Tribunal de 1.ª instância. XXXIX. Nessa data ainda não tinha decorrido o prazo de prescrição, o que só viria a acontecer em 30.10.2015, caso não houvesse já fundamento para interrupção do mesmo prazo. XL. Foi a ora recorrente que não se conformou com a decisão proferida e dela interpôs recurso (em 2012), tratando-se, portanto, de facto imputável à Recorrente. XLI. Sendo a interposição de recurso um ato próprio da ora recorrente, não é aplicável o prazo de 1 ano previsto no n.º 3 do artigo 15.º do RGTAL, mantendo-se a interrupção do prazo de prescrição até à data de prolação de decisão final transitada em julgado no presente processo que continuou na sequência desse ato da ora Recorrente. XLII. Pelo que improcede o pedido de declaração de inutilidade superveniente por motivo de prescrição das dívidas da ora Recorrente. XLIII. Quanto à alegada nulidade da sentença por omissão de pronúncia, como se viu, a sentença pronunciou-se sobre toda a matéria controvertida, designadamente sobre a legalidade das liquidações e ainda sobre a não obrigação de suspensão do processo, contra o que vem alegar a Recorrente. XLIV. Pelo que não existiu qualquer omissão de pronúncia. XLV. Mais alega a Recorrente que a douta sentença sob recurso é nula por oposição entre os fundamentos e a decisão, XLVI. Designadamente quando se refere em factos provados N) que a ora Recorrente “apresentou junto da Repartição de Finanças, pedidos de certidão de valor patrimonial tributário após a sua fixação definitiva de todas as fracções dos imóveis” e mais à frente se refere a 2.ª avaliação dos imóveis. XLVII. Logicamente, o facto de a recorrente ter pedido a fixação definitiva dos valores patrimoniais dos imóveis não significa que as Finanças tenham procedido em conformidade. XLVIII. Pelo contrário, o que se verifica é que as finanças não avaliaram parte significativa das frações integrantes daqueles imóveis, atribuindo-lhes valor 0 ou 0,01. XLIX. Por outro lado, o facto de a sentença ter procedido ao cálculo dos valores totais constantes das certidões não significa que assuma aqueles valores como o valor patrimonial a considerar para efeitos de aplicação da taxa devida pela ligação de esgotos. L. Como a Recorrente bem sabe, mas não quer admitir, o valor patrimonial dos imóveis estava desvalorizado pela atribuição de valor 0 a determinadas frações e a sentença verifica isso mesmo em factos provados Y) dizendo que “Os prédios que serviram de base ao cálculo do valor a pagar de tarifa de ligação de esgotos, foram objecto de 2ª avaliação patrimonial, com excepção das fracções A-E-H-I-S-T-AB-AD-AE-AIAL do lote 5 e fracções G-AM-AQ-AV-BB pertencentes ao lote 6 (cfr. fls. 131 do p.a.). “ LI. A Recorrente distorce e omite partes da sentença para lhe imputar qualquer nulidade que não se verifica. LII. Designadamente, não se verifica a alegada contradição entre a fundamentação e a decisão. LIII. Mais alega a Recorrente erro de direito. LIV. Para tanto, continua a basear o seu raciocínio numa segunda avaliação que, como se viu, não é definitiva porque incompleta. LV. A douta sentença sob recurso deu como provado que a 2.ª avaliação pedida ficou incompleta e que a tarifa de ligação de esgotos impugnada, que tomou por base de liquidação a 1.ª avaliação patrimonial dos imóveis, é válida, legal e exigível. LVI. A Recorrente ainda chama à liça o facto de os SMAS terem procedido a revisão das tarifas relativamente a outros prédios da Recorrente, o que é completamente irrelevante para o caso dos autos e só poderia ser tido como termo de comparação se se registasse factualidade subjacente semelhante, o que não ficou demonstrado e não foi objeto da presente impugnação. LVII. Pelo que improcedem todas as alegações da Recorrente contra a douta sentença do tribunal a quo. * A Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do Recurso por entender que a sentença não padece das nulidades que lhe são assacadas nem “sofre de qualquer vício, nomeadamente os vícios que lhe são imputados”, pois “dos factos assentes e da fundamentação efetuada resulta uma correta valoração da factualidade e um correto enquadramento jurídico”.* As questões a decidir são, então, as de saber se:- A instância deve ser extinta, por inutilidade da lide; - A sentença é nula, por omissão de pronúncia; - A sentença é nula, por contradição entre os fundamentos e a decisão; - A sentença errou ao não declarar a nulidade das liquidações. * Colhidos os vistos legais, nada obsta à decisão.Em sede factual, vem apurado que: A) Em 22.12.2001 foram emitidas pelos SMAS de Sintra as faturas nº 100214922, no valor de € 94.479,44, e 1002148117, no valor de € 53.411,01, relativas a tarifa de ligação de saneamento. (Docs. 3 e 3-A juntos com a PI, a fls. 122 e 124 dos autos) B) A Impugnante foi notificada para pagar as facturas identificadas na alínea que antecede através dos ofícios nº 26558, de 27.12.2001, e nº 26636, de 26.12.2001, respetivamente. (Docs. 3 e 3-A juntos 27.12.2001com a PI, a fls. 121 e 123 dos autos) C) Em 15.01.2002, a Impugnante apresentou reclamou das liquidações mencionadas na al. A) do probatório e pediu a suspensão do pagamento das facturas até que seja definitivamente fixado o valor patrimonial dos imóveis (Docs. 4 e 5 juntos com a PI, a fls. 125 a 130 dos autos) D) Em 20/02/2002, o Conselho de Administração dos SMAS de Sintra, de que indeferiu as reclamações referidas na alínea precedente (cfr, fls. 131 dos autos); E) Por ofício de 12.03.2002 a Impugnante foi notificada da deliberação referida na alínea anterior (Doc. 6 junto com a PI, a fls. 131 dos autos); F) Em 25.03.2002 a Impugnante dirigiu ao Presidente da Câmara Municipal de Sintra recurso hierárquico impróprio da decisão mencionada na alínea que antecede, no qual pediu G) Em 15/10/2020 foi feita 2ª avaliação às seguintes fracções: Q, R, AA, AC, AI, AL, do lote 6 sito na Rua ..... (cfr. fls. 116 do p.a.); H) Em 17/12/2002 foi enviado à Impugnante, oficio a informar da 2ª avaliação referida na alínea anterior (cfr. fls. 115 do p.a.); I) Em 08.06.2004 a Impugnante foi notificada pelos SMAS nos seguintes termos: «Assunto: TARIFA DE LIGAÇÃO DE ESGOTOS (…) informa-se V. Exª que se encontra em dívida a(s) fatura(s) nº 1002148117, 100214922 e 2001009809 no valor de 53.411,01 €, 94.479,44 € e 7.541,82 € referente à Tarifa de Ligação (…). Assim, deverá V. Exª deslocar-se a um dos nossos atendimentos (…), no prazo de 30 dias úteis, a contar da receção do presente ofício, a fim de regularizar a presente situação de dívida. (…)» (Doc. 8 junto com a PI, a fls. 144 dos autos) J) Em 16.07.2004 a dirigiu novo requerimento ao Presidente dos SMAS no qual alega, nomeadamente, que: K) Em 07/09/2004 foi feita informação pelo Gabinete Jurídico do SMAS Sintra, onde se concluiu e propôs: L) A Impugnante foi notificada da resposta ao requerimento referido na alínea precedente nos seguintes termos: (cfr. fls. 146 do p.a.); M) Por despacho de 14.11.2005 foi determinado o arquivamento do recurso hierárquico, referindo-se na informação proposta nº 859/2005/DJUR da Câmara Municipal de Sintra que: «(…) Em 22 de junho de 2005, interpôs recurso hierárquico impróprio para o Presidente da Câmara Municipal de Sintra da deliberação do Conselho de Administração dos SMAS de Sintra de 28 de fevereiro de 2005, notificada à Recorrente em 19/05/05, que indefere a pretensão da recorrente de revogação da liquidação de juros efetuada por aqueles serviços, relativa a não pagamento da 1ª ligação da tarifa de ligação de esgotos dentro do prazo de pagamento voluntário. Face ao exposto e atento o decurso do tempo, pressupõe-se o desinteresse pelo recurso interposto em 2002, ficando prejudicada a sua apreciação uma vez que houve correção da liquidação objeto do recurso e pagamento, que motivaram um recurso autónomo e com fundamentação diversa. Termos em que se propõe o arquivamento do processo (…)». (Doc. 12 junto com a PI, a fls. 191 a 194 dos autos); N) Em 20/03/2007, a Impugnante apresentou junto da Repartição de Finanças, pedidos de certidão de valor patrimonial tributário após a sua fixação definitiva de todas as fracções dos imóveis (cfr. docs. 16 e 17 juntos com a p.i.); O) Em 31/12/2006, o valor patrimonial relativo ao Lote 5, inscrito na matriz sob o artigo nº 9547 é o seguinte: “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” (doc. 16 junto aos autos); P) Em 31/12/2006, o valor patrimonial do lote 6, inscrito na matriz sob o artigo nº 9638 é o seguinte: “(texto integral no original; imagem)” (cfr. doc. 17 junto aos autos); Q) Os lotes 5 e 6 são compostos por blocos e cada um deles por fracções (cfr. doc. 16 e 17 juntos aos autos); R) A soma dos valores patrimoniais constantes das alíneas anteriores resulta em: €5.728.302,79 (lote 5) e de €9.020.999,51 (lote 6), o que, aplicando a taxa de 0,7% resulta num valor de tarifa de ligação de esgotos de €40.098,12 e €63.147, valores inferiores ao liquidados pela Administração Tributária de €53.411,01 e €94.479,44, respectivamente (cfr. doc. 16 e 17 juntos com a p.i.); S) Em 13.03.2007, através do ofício nº 2007005701JUR a Impugnante foi, novamente, notificada para proceder ao pagamento das faturas identificadas em A) do probatório. (Doc. 13 junto com a PI, a fls. 195 e 196 dos autos) T) Por referência ao ofício que antecede, a Impugnante apresentou reclamação das liquidações de tarifas de ligação de esgotos em que pede a declaração de nulidade das mesmas «uma vez que já foram determinados os valores patrimoniais definitivos, resultantes das segundas avaliações requeridas» e, ainda, «a emissão de novas liquidações de tarifas de ligação relativas aos referidos imóveis, não sendo devidos quaisquer juros de mora». (Doc. 14 junto com a PI, a fls. 197 a 210 dos autos) U) Na deliberação de 14.05.2007, notificada à Impugnante por ofício de 01.06.2007, o Conselho de Administração dos SMAS de Sintra decidiu manter os efeitos do ofício identificado em J) e não reconhecer a suspensão da liquidação das tarifas de ligação. (Doc. 17 junto com a PI, a fls. 306 a 312 dos autos) V) Em 18.07.2007 a Impugnante apresentou recurso hierárquico da decisão que antecede ao Presidente da Câmara Municipal de Sintra. (Doc. 18 junto com a PI, a fls. 313 a 340 dos autos) W) Por deliberação de 24.10.2007, a Câmara Municipal decidiu manter a deliberação de 14.05.2007, do Conselho de Administração dos SMAS. (cfr. fls. 194 a 198 do processo administrativo apenso) X) A Impugnante foi notificada da decisão de indeferimento do recurso hierárquico em 30.10.2007 – cfr. o aviso de receção assinado a fls. não numeradas do processo administrativo apenso; Y) Os prédios que serviram de base ao cálculo do valor a pagar de tarifa de ligação de esgotos, foram objecto de 2ª avaliação patrimonial, com excepção das fracções : A-E-H-I-S-T-AB-AD-AE-AI-AL do lote 5 e fracções G-AMAQ-AV-BB pertencentes ao lote 6 (cfr. fls. 131 do p.a.). * Nas Conclusões (J) a (L) do Recurso, a Recorrente “invoca a prescrição dos tributos aqui em causa”, uma vez que “nos termos do art. 15.º do RGTAL, o prazo geral de prescrição de tais dívidas é de 8 anos que, contados desde o facto tributário (ocorrido em 31 de dezembro de 2000), e admitindo a sua interrupção em 15 de janeiro de 2002 pela interposição de reclamação graciosa, ocorreu em 15 de janeiro de 2010”. Admite, “ainda que a presente impugnação (deduzida em 2 de janeiro de 2008) fosse relevada como facto interruptivo da prescrição (no que não se concede), a conclusão sobre a prescrição seria exatamente a mesma”, o mesmo acontecendo caso se considerasse uma outra interrupção em 2 de janeiro de 2008 pois “as dívidas em causa teriam prescrito em 2 de janeiro de 2016”. Reconhecendo que a prescrição não constitui um vício do ato de liquidação, “o conhecimento da prescrição tem por efeito a declaração de extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos e para os efeitos do artigo 277.º alínea e) do CPC ex vi artigo 2.º do CPPT, como resulta da vasta, reiterada e unânime jurisprudência sobre a questão”. Por sua vez, a Recorrida advoga nos artigos XXX a XLII das Contra-Alegações que a dívida não se encontra prescrita por o prazo de prescrição ter sido interrompido com a interposição do Recurso Hierárquico e com a presente Impugnação Judicial que “não esteve parada, manteve o seu curso e em 30/05/2012 foi proferida sentença pelo Tribunal de 1.ª instância”, sendo o presente Recurso um “facto imputável à Recorrente”. * Como é sabido, nos termos do artigo 99.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, constitui fundamento de impugnação do ato de liquidação qualquer ilegalidade, designadamente errónea qualificação e quantificação do facto tributário, incompetência do autor, falta de fundamentação ou preterição de outra formalidade legal, sendo que os pedidos associados à pretensão impugnatória são o de anulação do ato que constitui o objeto do processo, bem como a declaração da sua nulidade ou da sua inexistência.Já a prescrição da obrigação tributária, por não contender com a legalidade da liquidação – mas apenas com a exigibilidade da dívida -, embora seja matéria de conhecimento oficioso, não é fundamento de Impugnação Judicial, mas de Oposição à Execução nos termos do artigo 204.º, n.º 1, alínea d), do CPPT, ou de Reclamação de Ato do Órgão da Execução Fiscal se for perante este suscitada e não declarada. Com efeito, o decurso do prazo de prescrição não fere a liquidação de qualquer ilegalidade, mas torna o pagamento do tributo mera obrigação natural. Daí que, verificando-se a prescrição, a lide impugnatória não tenha qualquer utilidade, pois instaurada execução fiscal para cobrança da dívida, esta logo teria que ser extinta, dado o carácter oficioso do conhecimento da prescrição. Pelo que se deve verificar se a dívida se encontra, ou não, prescrita. Cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de janeiro de 2011 – processo n.º 726/10 no qual se sumariou que “A prescrição é de conhecimento oficioso mesmo em sede de impugnação judicial tendo em vista a eventual inutilidade superveniente da lide, no pressuposto que os autos forneçam os dados necessários para o efeito e ainda não tenha transitado em julgado decisão final sobre o objecto da causa”. * Vejamos, pois:Nos termos do n.º 1 do artigo 24.º do Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos Serviços Municipalizados de Sintra, “Para fazer face aos encargos de instalação e conservação da rede de drenagem de águas residuais, os SMAS cobrarão por cada prédio, além das despesas efectuadas com a execução das obras de estabelecimento dos ramais de ligação, uma tarifa de ligação e uma tarifa de conservação”. Em causa, nos autos, estão as «tarifas de ligação» relativas aos prédios sitos na Rua .... , em Casal da Carregueira. Estamos, assim, perante um tributo bilateral local que, tendo como contrapartida efetiva a ligação à rede de drenagem das águas residuais, assume a natureza de taxa. Dispõe o artigo 48.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, o seguinte: As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. Aquelas menções a impostos periódicos e impostos de obrigação única devem entender-se como referências às dívidas tributárias, isto é, aos tributos em geral, atenta, também a epígrafe da secção III em que o artigo se insere: Prescrição da Prestação Tributária. A distinção entre tributo periódico e tributo de obrigação única, apesar de mais desenvolvida na doutrina em relação aos impostos, tem igual aplicação nos outros tributos, designadamente nas taxas. “O critério de distinção assenta na susceptibilidade de renovação dos tributos, sendo que serão periódicos ou renováveis se for de presumir que perduram no tempo e que ocorrem tendencialmente com uma periodicidade regular, tendo a lei fraccionado juridicamente a sua tributação no tempo, e serão taxas de obrigação única as que respeitam a factos ou actos ocasionais, que se caracterizam pela não regularidade da obrigação tributária, isto é, que não se repetem com carácter de periodicidade, pese embora possam ter subjacentes factos tributários que demoram certo lapso de tempo a formar-se, como acontece com taxas devidas por serviços públicos que exijam algum tempo para serem integralmente prestados” – cfr. o acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Abril de 2015 – processo n.º 1957/13. Por outro lado, à míngua de lei especial, o prazo aplicável de 8 anos previsto no artigo 48.º da LGT conta-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, pelo que – alínea b) – não se inclui o dia em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr e – alínea e) – se o prazo terminar em dia não útil transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, o mesmo sucedendo se terminar em férias judiciais se o ato sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo. Finalmente, por força do n.º 1 do artigo da LGT, na redação dada pela Lei n.º 100/99, de 26 de julho, a Reclamação e o Recurso Hierárquico interrompem a prescrição Quanto aos efeitos da interrupção, na falta de regime na lei fiscal, há que aplicar subsidiariamente o regime previsto no Código Civil. No ponto, dispõem os artigos 326.º e 327.º do CC: Artigo 326.º Efeitos da interrupção 1. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo seguinte. 2. A nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311.º. Artigo 327.º Duração da interrupção 1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo. 2. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo. 3. Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou a terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses. Resultam, assim, dos n.os 1 destes artigos 326.º e 327.º interrupções de dois tipos: “um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição)” – cfr. Jorge de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária – Notas Práticas, 2.ª edição, 2010, Áreas Editora, p. 57. As causas de interrupção da prescrição tributária “têm um efeito duradouro, eliminando o tempo decorrido e obstando ao decurso do prazo de prescrição durante a pendência do processo que provoca o efeito interruptivo, a não ser que venha a ocorrer a paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte”, isto porque pretendeu o legislador que “a suspensão do decurso da prescrição que derivava do facto interruptivo continuasse”. Deste modo, “o prazo decorrido até ao momento em que ocorreu o facto interruptivo é inutilizado (artigo 326.º, n.º 1, do CC)” - cfr. Jorge de Sousa, ob. cit., pp. 60-62. * As «tarifas» em xeque nos autos, relativas a ligações à rede de drenagem das águas residuais dos prédios sitos na Rua .... , Casal da Carregueira, efetuadas em 2001, são, assim, uma taxa de obrigação única, cujo prazo de 8 anos se interrompeu logo em 15 de janeiro de 2002 com a apresentação da Reclamação Graciosa – cfr. a alínea C) do probatório –, facto interruptivo que inutilizou todo o prazo que correra até então.O prazo prescricional de 8 anos recomeçou a correr em 20 de fevereiro de 2002 quando a Reclamação foi indeferida – cfr. a alínea D) do probatório -, tendo sido novamente interrompido, novamente com inutilização de todo o prazo entretanto decorrido, em 25 de março de 2002 com a interposição do Recurso Hierárquico – cfr. a alínea F) do probatório –, reiniciando-se em 14 de novembro de 2005, quando este foi arquivado – cfr. a alínea M) do probatório. * Entretanto, em 1 de janeiro de 2007 entrou em vigor o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais – cfr. o artigo 18.º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro – cujo artigo 15.º, epigrafado «Prescrição» veio determinar que – n.º 1 – “As dívidas por taxas às autarquias locais prescrevem no prazo de oito anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu”, sendo este prazo interrompido com – n.º 2 – “A citação, a reclamação e a impugnação”. Todavia – n.º 3 – “A paragem dos processos de reclamação, impugnação e execução fiscal por prazo superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, neste caso, o tempo que decorreu após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.* Houve, pois, uma sucessão de leis no tempo quanto aos prazos, e uma sucessão de leis no tempo quanto às causas interruptivas.Quanto à sucessão de prazos, uma vez que a lei nova fixou o mesmo prazo de 8 anos que a lei antiga já determinava, não é necessário convocar o artigo 297.º do Código Civil, epigrafado “Alteração de Prazos”, mantendo-se aplicável o prazo de 8 anos contado desde 14 de novembro de 2005. * Quanto às causas suspensivas, estipula o artigo 12.º, n. 2, parte inicial, do Código Civil que “Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos. Assim, uma vez determinado o quantitativo do prazo de prescrição (ou o prazo da lei nova ou o que decorreu mais o que falta face à lei antiga) é a lei nova a única competente para determinar os efeitos sobre o prazo de prescrição que têm os factos que ocorrerem na sua vigência” – cfr., Jorge de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária – notas práticas, 2.ª Edição, Áreas Global, 2010, pp. 101-112. * Ora, em 3 de janeiro de 2008, já na vigência do RGTAL, foi deduzida Impugnação Judicial, o que, nos termos do seu artigo 15.º, n.º 2, inutilizou o prazo que havia corrido desde 14 de novembro de 2005.No entanto, o processo não foi tramitado entre 9 de julho de 2009, data em que foi concluso para sentença no Tribunal Tributário de Lisboa (cfr. fls. 475 dos autos), e 4 de novembro de 2011, dia em que foi proferida decisão a declarar tal Tribunal incompetente em razão do território (cfr. fls. 476-480 dos autos). Deste modo, no dia 10 de julho de 2010, momento em que a Impugnação esteve parada por mais de um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, o efeito interruptivo originado pela instauração e pendência da Impugnação Judicial degenerou-se em mero efeito suspensivo, devendo, então, somar-se o tempo decorrido entre o facto tributário e a data da autuação da Impugnação, ao que decorreu desde a paragem superior a um ano até à atualidade – cfr. o predito artigo 15.º, n.º 3, do RGTAL. E, assim sendo, como é, é manifesto que o prazo prescricional de 8 anos há muito se completou, pois mesmo sem aquela primeira parcela, sempre teria prescrito em 10 de julho de 2018. Deste modo, por a dívida se encontrar prescrita, a presente lide é inútil, o que, nos termos do artigo 277.º, alínea e), segunda parte, do Código de Processo Civil conduz à extinção da instância, devendo as liquidações impugnadas ser oficiosamente anuladas pela Administração, uma vez que não podem ser cobradas coercivamente. Ficando, então, prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas no Recurso. * Termos em que se acorda declarar prescrita a dívida, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar extinta a instância, por inutilidade da lide.São devidas custas, neste TCA Sul, pela Recorrida que contra-alegou. Lisboa, 26 de junho de 2025. Tiago Brandão de Pinho (relator) – Margarida Reis – Isabel Silva |